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2/18/2018 Revista Coletiva

Número 5 | jul/ago/set 2011

Velho, terceira idade, idoso ou aposentado? Sobre


diversos entendimentos acerca da velhice

Guita Grin Debert


Aposentado, terceira idade e idoso são modos de tratamento das pessoas em etapas mais
avançadas da vida que apontam a relação da velhice com diferentes dimensões da
experiência social, como o preconceito e a discriminação, a atribuição de status
e prestígio, a
conquista de direitos sociais, a definição de formas adequadas de consumo e a valorização de
estilos de vida.

Hoje, preferimos usar expressões como “idoso” ou “terceira idade”, em vez de “velho”, para
evitar ofender ou melindrar nosso interlocutor. A “melhor idade” é uma nova fórmula de
denominação, encontrada por clubes ou programas que reúnem pessoas com 60 anos ou
mais. Falar da aposentadoria, por sua vez, é traçar a história do conjunto de transformações
ocorridas na segunda metade do século 19, quando a indústria segrega os operários
considerados velhos e esses são atendidos por um conjunto de instituições neste momento
criadas para garantir a sua sobrevivência. A partir do fim do século 19, e com mais força nos
países europeus, após o fim da 2ª Guerra Mundial, a aposentadoria entra na pauta das
reivindicações operárias, fornecendo uma identidade a uma população até então associada à
pobreza, invalidez e incapacidade de produzir e diferenciando-a de outros grupos alvos da
assistência social.

A expressão “Terceira Idade” surge na década de 1970, quando foi criada na França a
primeira Universidade para a Terceira Idade, sinalizando mudanças no significado da velhice.
Trata-se, agora, de celebrar a velhice como um momento privilegiado para o lazer e para as
atividades livres dos constrangimentos da vida profissional e familiar: daí a ideia da “melhor
idade”. A invenção da terceira idade indicaria, assim, uma experiência inusitada de
envelhecimento, em que o prolongamento da vida nas sociedades contemporâneas ofereceria
aos mais velhos a oportunidade de dispor de saúde, independência financeira e outros meios
apropriados para tornar reais as expectativas de realização e satisfação pessoal próprias a essa
etapa. A velhice, assim, perde a conotação negativa de perda de statussocial e ganha o
caráter positivo de etapa privilegiada pela garantia de um rendimento mensal, a aposentadoria
– tanto em países de capitalismo avançado quanto em países como Brasil – e pelas novas
experiências próprias a esse momento do curso da vida.

Junto à terceira idade, há um conjunto de práticas, instituições e agentes especializados


encarregados de definir e atender as necessidades dos mais velhos, população caracterizada
como vítima da marginalização e da solidão. Uma nova linguagem, empenhada em alocar o
tempo dos aposentados, é ativa na construção das etapas mais avançadas da vida como
uma fase dinâmica em oposição à ideia da aposentadoria como um momento de
desengajamento passivo de uma vida ativa.

A velhice como construção histórica e social

As diversas formas de nomear a velhice e os significados que tais nomes ganham em


diferentes períodos históricos dão o ponto de partida à reflexão sociológica sobre a
construção histórica e social da velhice. Assim, estabelece-se uma distinção entre um fato
universal e natural – o ciclo biológico, que envolve o nascimento, o crescimento e a morte – e
um fato social e histórico, que é a variabilidade da forma pela qual o envelhecimento é
concebido e vivido. As representações sobre a velhice, a posição social dos velhos e o
tratamento que lhes é dado pelos mais jovens, portanto, ganham significados particulares em
contextos históricos, sociais e culturais distintos.

Assim como no caso da velhice, os estudos antropológicos e históricos sobre os períodos da


vida, como a infância, a adolescência e a juventude mostram como um processo biológico é
elaborado simbolicamente com rituais que definem fronteiras entre idades pelas quais os
indivíduos passam e que não são necessariamente as mesmas em todas as sociedades. Isso
exige um rompimento com os pressupostos da psicologia do desenvolvimento que concebe o
curso da vida como uma sequência unilinear de etapas evolutivas em que cada etapa, apesar
das particularidades sociais e culturais, seriam estágios pelos quais todos os indivíduos normais
deveriam passar.

Como ressalta o sociólogo francês Pierre Bourdieu, é um reflexo profissional do sociólogo


lembrar que as idades da vida são uma criação arbitrária. Na produção das categorias de
idade, conclui o autor, está envolvida uma verdadeira luta política pela redefinição dos poderes
ligados a grupos sociais distintos em diferentes momentos do ciclo da vida.

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Afirmar que as categorias de idade são construções culturais e que mudam historicamente
não significa dizer que elas não tenham efetividade. Elas são constitutivas de realidades sociais
específicas, uma vez que operam recortes no todo social, estabelecendo direitos e deveres
diferenciais no interior de uma população, definindo relações entre as gerações e distribuindo
poder e privilégios. Assim, na nossa sociedade, a idade cronológica – que é um sistema de
datação ausente em muitas outras sociedades – é um mecanismo fundamental na
organização social, porque determina entre outras coisas a maioridade civil, o início da vida
escolar, a entrada e a saída do mercado de trabalho.

A velhice, como as categorias etárias, étnicas, raciais ou de gênero, é uma forma de


segmentar e classificar uma população, mas também de construir uma hierarquia entre
diferentes segmentos assim constituídos.

A Gerontologia e as mudanças na pirâmide etária

A Gerontologia é a ciência que estuda a velhice, e as primeiras perspectivas desses estudos


consideravam que os problemas enfrentados pelos idosos eram tão prementes e semelhantes
que minimizavam as diferenças em termos de etnicidade, classe, gênero e religião. A velhice
era então pensada através da ideia de “roless role” – a sociedade moderna não prevê um
papel específico ou uma atividade para os velhos, abandonando-os a uma existência sem
significado. Essa hipótese, que considerava a velhice como uma experiência homogênea, foi
revista, e as pesquisas sobre o tema demonstravam que as clivagens socioeconômicas e
outras diferenças davam à experiência de envelhecimento conteúdos distintos que
mereceriam investigação. Disso surgiram pesquisas preocupadas com a elaboração de
mediadores sofisticados e com a definição de instrumentos capazes de avaliar a qualidade de
vida e uma série de outras dimensões da velhice.

A preocupação da sociedade com o processo de envelhecimento deve-se, sem dúvida, ao


fato de os idosos corresponderem a uma parcela da população cada vez mais representativa
do ponto de vista numérico. Tal como ocorreu nos países europeus e na América do Norte,
temos no Brasil também um crescimento demográfico da população mais velha. Falar em
envelhecimento populacional é chamar a atenção para o prolongamento da vida humana e
também para a redução da taxa de natalidade, o que leva a um achatamento da pirâmide
etária, na medida em que a proporção dos idosos se iguala ou aumenta em relação aos
jovens e às crianças.

A visibilidade alcançada pela velhice não é, contudo, uma consequência automática do


envelhecimento populacional. Requer também uma atenção para o duplo movimento que
acompanha sua transformação em uma preocupação social.

Assistimos, por um lado, a uma socialização progressiva da gestão da velhice; por muito
tempo considerada como própria da esfera privada e familiar, uma questão de previdência
individual ou de associações filantrópicas, ela se transforma numa questão pública. Um
conjunto de orientações e intervenções, muitas vezes contraditório, é definido e
implementado pelo aparelho de Estado e outras organizações privadas. A gerontologia como
um campo de saber específico cria profissionais e instituições encarregados da formação de
especialistas no envelhecimento. Como consequência, uma nova categoria cultural é
produzida: os idosos, como um conjunto autônomo e coerente que impõe outro recorte à
geografia social, autorizando a colocação em prática de modos específicos de gestão.

Nesse movimento que surge no século 19, a visão da velhice como um processo contínuo de
perdas e de dependência é responsável por imagens negativas que lhes são associadas, mas é
também elemento fundamental para a legitimação de direitos sociais, como a universalização
da aposentadoria.

Por outro lado, faz parte desse movimento de socialização o que venho chamando de
processos de reprivatização, que transformam a velhice em responsabilidade individual – e,
nestes termos, ela poderia desaparecer do nosso leque de preocupações sociais.

A velhice como problema social e a reprivatização do envelhecimento

A tendência contemporânea é rever os estereótipos associados ao envelhecimento. A ideia de


um processo de perdas tem sido substituída pela consideração de que esse é um momento
propício para novas conquistas, guiadas pela busca do prazer. As experiências vividas e os
saberes acumulados são ganhos que oferecem oportunidades de explorar novas identidades,
realizar projetos antes abandonados, estabelecer relações mais profícuas com o mundo dos
mais jovens e dos mais velhos.

No Brasil proliferaram, na última década, programas voltados para os idosos, como as “escolas
abertas”, as “universidades para a terceira idade” e os “grupos de convivência de idosos”.
Encorajando a busca da autoexpressão e a exploração de identidades de um modo que era
exclusivo da juventude, eles abrem espaços para que uma experiência inovadora possa ser
vivida coletivamente, e indicam que a sociedade brasileira é hoje mais sensível aos problemas
do envelhecimento. Contudo, o sucesso dessas iniciativas é proporcional à precariedade dos
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mecanismos de que dispomos para lidar com a velhice avançada. A nova imagem do idoso
não oferece instrumentos capazes de enfrentar a decadência de habilidades cognitivas e
controles físicos e emocionais que são fundamentais, na nossa sociedade, para que um
indivíduo seja reconhecido como um ser autônomo, capaz de um exercício pleno dos direitos
de cidadania. Os problemas são então dissolvidos nas novas representações da terceira idade
e o envelhecimento é reprivatizado, fechando-se o espaço para situações de abandono e
dependência, na medida em que os mais velhos se tornam protagonistas de experiências
inovadoras e bem-sucedidas e as perdas próprias do envelhecimento passam a ser vistas
como maus resultados de suas escolhas quanto aos estilos de vida e consumo adotados.

É, portanto, ilusório pensar que essas mudanças são acompanhadas de uma atitude mais
tolerante em relação às idades. É marcante nesse processo a juventude como valor, em que
a promessa da eterna juventude é um mecanismo fundamental de constituição de mercados
de consumo – e nele não há lugar para a velhice.

A oferta constante de oportunidades para a renovação do corpo, das identidades e


autoimagens encobre problemas como o declínio inevitável do corpo, o corpo ingovernável
que não responde às demandas da vontade individual, o qual é, antes, percebido como fruto
de transgressões – como fumar, beber, não fazer exercícios, negligenciar a própria saúde – e
por isso não merece piedade.

O prolongamento da vida humana é, claro, um ganho coletivo, mas também uma ameaça à
reprodução da vida social, num risco para o futuro da sociedade. As projeções sobre os
custos da aposentadoria e da cobertura médica e assistencial do idoso são apresentados
como um problema nacional, indicador da inviabilidade de um sistema que em futuro próximo
não poderá arcar com os gastos de atendimento. Nas situações em que o desemprego e o
subemprego atingem contingentes cada vez maiores da população mais jovem, os custos
implicados na velhice, especialmente aqueles envolvidos nas fases mais avançadas da vida,
crescem na mesma proporção dos avanços tecnológicos postos em ação para prolongar a
vida humana. A imaginação dos experts
em contabilidade pública não vai além da sugestão de
que quatro tipos de medidas devem ser tomados simultaneamente para garantir a viabilidade
do sistema: diminuição dos gastos públicos, aumento dos impostos, diminuição dos
vencimentos dos aposentados e aumento da idade da aposentadoria. Como mostrou a
antropóloga Mary Douglas, cada sociedade tem seu portfólio de riscos e estabelece uma
combinação específica de confiança e medo, e na seleção dos perigos que merecem ser
temidos está sempre envolvida uma estratégia de proteção e exclusão de valores e estilos de
vida particulares.

Cabe, portanto, perguntar se a velhice permanecerá sendo um segredo desagradável que,


como Norbert Elias mostrou, não queremos conhecer e para a qual encontramos formas
cada vez mais sofisticadas de negar a existência. É possível, também, sugerir caminhos
alternativos para enfrentá-la. O sonho que os avanços na pesquisa científica ofereçam
soluções para o envelhecimento das células humanas ou que a tecnologia encontre formas
capazes de minimizar os problemas da dependência na velhice ganha cada vez mais
concretude.

O crescimento do número de aposentados foi seguido do aumento do seu poder político, de


sua capacidade de exigir mais e implementar demandas políticas. Mas trabalhar, ter trabalhado
ao longo da vida – no momento em que desenvolvimento econômico não significa aumento
da demanda por mão de obra e em que a engenharia empresarial impõe que racionalizar é
reduzir empregos – pode se transformar num privilégio e não mais um desgaste que merece
compensação.

Serão os velhos vistos como seres sedentários e inativos que consomem de maneira
avassaladora tanto as heranças que poderiam ser alocados para grupos mais jovens na família
quanto os recursos públicos que deveriam ser distribuídos para outros setores da sociedade?
Transformar os problemas da velhice em responsabilidade individual e apontar a inviabilidade
do sistema de financiamento dos custos da idade avançada é recusar a solidariedade entre
gerações.

Certamente o nosso leque de escolhas de como viver o envelhecimento foi ampliado com o
conjunto de novas práticas que acompanham a invenção da terceira idade. É preciso
reconhecer, no entanto, que se a responsabilidade individual pela escolha é igualmente
distribuída, os meios para agir de acordo com essa responsabilidade não o são. A liberdade de
escolha, mostra o sociólogo Zygmunt Bauman, com toda a razão, é um atributo graduado:
acrescentar liberdade de ação à desigualdade fundamental da condição social, impondo o
dever da liberdade sem os recursos que permitem uma escolha verdadeiramente livre é, numa
sociedade altamente hierarquizada como a brasileira, uma receita para uma vida sem
dignidade, repleta de humilhação e autodepreciação.

Para saber mais:

Uma versão mais ampla deste artigo foi publicada em Debert, G. G. Metamorfoses da Velhice,
In Botelho, A. e Schwarcz (orgs) Agenda brasileira – temas de uma sociedade em
mudança, São Paulo, Companhia das Letras, 2011: 542-553. As colocações feitas neste
texto são apresentadas de maneira mais detalhada no livro: G. G. Debert, A Reinvenção da
Velhice, EDUSP, 2004. O livro organizado por Myiram Moraes Lins de Barros, intitulado “Velhice

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ou Terceira Idade”, FGV, 1998, traz artigos muito interessantes, sobre diferentes dimensões
da velhice, de Alda Britto da Motta, Cornelia Eckert, Theophilos Rifiotis, Clarice Peixoto,
Deborah Stucchi, Julio Assis Simões e da organizadora da coletânea.

Guita Grin Debert


Professora Titular do Departamento de Antropologia da Universidade de
Campinas (Unicamp) e pesquisadora do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

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