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Labor ou temor?

:
Reflexões sobre a categoria trabalho

Rute da Conceição Machado

Ao refletir sobre o cotidiano de um trabalhador, Zé Geraldo inicia a canção


“Cidadão” proferindo os seguintes versos:

Tá vendo aquele edifício, moço?


Ajudei a levantar
Foi um tempo de aflição
Eram quatro condução
Duas pra ir, duas pra voltar
Hoje depois dele pronto
Olho pra cima e fico tonto
Mas me chega um cidadão
E me diz desconfiado, tu tá aí admirado
Ou tá querendo roubar?
Meu domingo tá perdido
Vou pra casa entristecido
Dá vontade de beber
E pra aumentar o meu tédio
Eu nem posso olhar pro prédio
Que eu ajudei a fazer

A leitura desses versos faz-me refletir sobre as precarizações e desigualdades


presentes nas relações de trabalho. Alguma vez reconhecemos a importância do trabalho
daqueles que, na maioria das vezes, são ignorados socialmente? As empregadas
domésticas, as faxineiras, os pedreiros, os operários, os garis, os motoristas de ônibus,
dentre outros, são profissionais cujos frutos do trabalho alicerçam diversas atividades em
nossa sociedade. Apesar disso, seus esforços e contribuições não são reconhecidos, sendo,
pelo contrário, vistos como uma categoria inferior. Você já ouviu alguém desejar tornar-se
uma empregada ou um pedreiro? Dificilmente, não! Agora, imagine um mundo onde
existam apenas médicos, advogados, empresários e engenheiros. Quem iria construir os
edifícios, conduzir os transportes públicos e limpar os ambientes, tornando-os locais
agradáveis para se está?

Do que adianta ter pessoas capazes de elaborarem projetos extraordinários se não


há alguém que possa torná-los reais? Por que o trabalho daqueles que gastam suas forças,
que suam arduamente para concretizar os projetos arquitetados por outros profissionais é
considerado inferior? Eles trabalham duramente, porém seu salário é bem menor que o dos
demais. Seria, por acaso, seu saber inferior? Acredito que não! Os resultados de seus
trabalhos são, geralmente, desfrutados por outras pessoas. Seu criador, porém, dificilmente
terá a possibilidade de consumi-lo algum dia. Assim como o trabalhador da música de Zé
Geraldo, muitos profissionais não podem sequer contemplar sua obra-prima, fruto de seu
trabalho. O interessante é que essa rejeição ao trabalho braçal não é própria da sociedade
contemporânea. Desde tempos remotos, há um repúdio a esse tipo de trabalho, o qual
ficava a cargo das pessoas consideradas inferiores, quais sejam servos, escravos, mucamas
e camponeses, os quais foram modernizados pela figura dos operários, das domésticas,
dentre outros.

Vinícius de Moraes retrata, em seu poema O Operário em Construção, as


contradições que circundam o trabalho de um operário que vivia alienadamente, aceitando
as injustiças praticadas em seu emprego. Um dia, porém, este operário passou a notar
acontecimentos que até então não notava. Ele passou a refletir criticamente sobre sua
posição diante desses fatos, deixando de enxergar apenas, como diria Platão, as sombras
dos fenômenos. Como proclama Vinicius:

[...] foi assim que o operário


Do edifício em construção
Que sempre dizia sim
Começou a dizer não.
E aprendeu a notar coisas
A que não dava atenção:

Notou que sua marmita


Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.

Ao refletir sobre essas contradições presentes no mundo do trabalho, Marx expõe


que o trabalho deixou de representar sua função de criação, isto é, de transformação dos
fenômenos da natureza. A categoria fundante do ser social passa a ser um meio de
acumulação, isto é, de produção exacerbada, visando à mais-valia. Nessa concepção, o
trabalhador e o trabalho passam a ser coisificados. Não é a toa que, muitas vezes, o labor
causa dor e temor. Apesar de muitos defenderem que o trabalho dignifica o homem,
comumente, estes o associam ao sofrimento e ao cansaço. A música Capitão de indústria,
do Paralamas, expressa esta situação ao pronunciar a seguinte estrofe:
Eu acordo prá trabalhar
Eu durmo prá trabalhar
Eu corro prá trabalhar
Eu não tenho tempo de ter
O tempo livre de ser
De nada ter que fazer
É quando eu me encontro perdido
Nas coisas que eu criei

É importante ressaltar que, no mundo hipermoderno no qual vivemos, as pessoas


não trabalham arduamente apenas pelo acúmulo de dinheiro, como fazia João Romão,
personagem de O Cortiço, de Aluízio de Azevedo. A lógica hodierna mudou! A sociedade
deixou de ser sólida e passou a ser líquida, como nos lembra Bauman, em seu livro Vida
para o Consumo. Segundo essa lógica, não basta ter, é preciso ostentar. Essas relações
afetam diretamente no modo das pessoas encararem o trabalho, o qual passa a ser visto
como um meio para obter os objetos almejados. O consumo ostentado desses objetos
transmite uma sensação passageira de prazer.

Outro fator presente na hipermodernidade seria a transformação das pessoas em


mercadoria. Os indivíduos não apenas consomem os objetos, eles se transformaram em
mercadorias e buscam tornarem-se vendáveis, isto é, serem objetos atrativos, desejáveis
aos olhos dos outros. Nessa concepção, o “ter” se sobrepõe ao “ser”. Essa ideologia afeta
as pessoas, até mesmo, durante a escolha do curso que desejam fazer. Existe uma cobrança
extrema em relação aos jovens, quando eles pensam sobre a carreira que exercerão. Apesar
de haver exceções, a norma é: “escolha um curso que possibilite um bom emprego”. Mas o
que é qualificado como “bom emprego”? Obviamente, um emprego é considerado bom
dependendo do status social e da quantidade monetária que ele oferece. A qualidade de
trabalho, a identificação e o bem-estar também são considerados, mas o dinheiro é o
principal parâmetro. Trabalhamos para conseguir dinheiro, que possibilita consumir
objetos, que por sua vez nos transformam, pelo menos aparentemente, em mercadorias
atrativas, interessantes e vendáveis. Por trás desses objetos, tão desejados, existe o trabalho
de profissionais que os elaboraram, apesar de eles dificilmente serem lembrados,
permanecendo em sua invisibilidade.

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