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Nunca na história desse país...

Roberta Traspadini
Professora do curso de relações internacionais da UNILA
“Nunca na história desse país a cultura popular foi tão desvirtuada pelos meios de
comunicação, o território popular tão apresentado como periferia, do mal, e o popular
tão desconfigurado em seu sentido”
Nunca...
Nunca devemos ter ilusões plasmadas desde discursos sem materialidade concreta.
Nunca devemos acreditar que a vida é estática, sem possibilidade de mudança.
Nunca devemos construir nossas histórias, sobre bases frágeis de inclusão aparente, de
artificialismo hegemônico, de vida mecanizada pela compra e venda, em um abandono
concreto do que de fato tem valor para além do capital.
Nunca estivemos tão distantes de um projeto societário alternativo ao capitalismo como
hoje. E nunca como esquerda estivemos tão distantes de uma unidade de classe, a partir
das nossas diferentes lutas com um foco comum na formação política dirigida na
estratégia e tática de consolidação do poder popular.
Nunca o capitalismo foi tão explícito sobre suas concretas relações materiais de poder
ancoradas na inclusão de alguns poucos e na exclusão de muitos no acesso à vida em
geral. Nem os mandatários do poder no sistema capitalista foram tão verdadeiros no seu
domínio sobre o mundo, na sua condição miserável de estereotipar e negar a vida em
suas diversas formas à maioria.
Nunca na história recente do capitalismo a ética protestante foi tão associada a
desumana naturalização de um processo socialmente construído como a exclusão, a
criminalização, frutos da propriedade privada sobre a vida e sobre a morte. A
cotidianidade da violência é tal que, não é necessário ler textos sobre as desigualdades
para que qualquer um de nós a veja em todas as partes do globo.
Nunca, apesar das múltiplas crises cotidianas protagonizadas pelo capital, foi tão difícil
acreditar em mudança como na conjuntura atual do mundo. Nem o medo foi tão
vitorioso, a solidão e o abandono e a tristeza tão reais como no dia a dia de nossas vidas.
Nunca o trabalho foi tão desvalorizado, as mulheres tão violentadas dentro e fora de
casa, nem as dívidas tão estratosféricas para nós que vivemos na era da especulação e da
miserável condição humana atrelada a ela.
Nunca na história...
Nunca na história da América Latina e do Caribe tivemos a oportunidade de ter
exemplos tão explícitos sobre o que é a dialética, a contradição, a desigualdade
estrutural. Sem precisar ler Marx, Engels, Lênin, Rosa, é possível falar sobre a dialética
no dia a dia, tamanho o fosso entre os que têm a partir do saqueio dos que com nada
ficaram.
Nunca na história da América Latina e do Caribe o extrativismo foi tão degradador e
violento contra os povos originários, e contou com tanta tecnologia a seu favor para as
expulsões e os crimes e castigos de nossos tempos. Nunca também o agronegócio foi
tão pop, tão tudo, como na sanguinária capacidade de envenenar a terra e os alimentos
responsáveis por fazer das espécies seres capazes de se reproduzirem em seus habitats
naturais e sociais.
Nunca na história recente da América Latina a dependência estrutural se agigantou tanto
a partir da era da dívida como carro-chefe da sociedade especulativa, e o imperialismo
comprou tanta terra no campo, terreno nas cidades e representantes na política. Nunca
também o ideário de revolução foi tão necessário e ao mesmo tempo figurou como tão
distante de nosso cotidiano como agora.
Nunca na história contemporânea tivemos tantos condenados da terra, tantos cativeiros
revelados e tanto pavor ao convívio social. Nem tivemos tantas perdas, assassinatos e
violências generalizadas, sem julgamentos (crimes dos mandatários do capital), em
contrapartida a ausência de defensoria pública para um grupo massivo de sujeitos da
classe trabalhadora, suspeito de algo que ainda não foi julgado, mas que mofam no
sistema prisional aguardando uma absolvição que não chega, com base em uma
suposição, não confirmada, sobre os furtos, e/ou atentados sobre patrimônios e pessoas.
Nunca na história contemporânea havíamos chegado a tão alto nível de dependência
econômica, social, psíquica e química como agora. Nunca na história contemporânea
havíamos nos deparado de forma tão aberta para a condição de compreensão cotidiana
sobre a prática do poder de uma classe sobre a outra e para o significado concreto sobre
o papel do estado de direito em uma sociedade de classes.
Nunca na história recente havíamos tido tão rapidamente, dada a velocidade técnico-
científica da geração online (4g), acesso às regras do poder e seus usos políticos a partir
de seus aparelhos ideológicos, na condução da vida de todos a partir de seus preceitos
(i)morais. Nunca, na historia recente do capitalismo, havíamos aprendido tão
rapidamente qual o papel da educação, da religião e da família: educar para uma
individualidade desmedida, para uma concorrência atroz, para um consumo sem freios e
para um futuro a partir de um presente sem história, sem passado, sem encontros.
Nunca na história da humanidade foi tão difícil definir a condição humana, reforçar
valores ético-morais com primazia para o ser, e não para o ter, e valorizar as relações
afetivas como ato político de quem constrói relações sociais cotidianas.
Nunca na historia desse país...
Nunca na história desse país o medo e a letargia tinham vencido tão rapidamente a
esperança, os gritos e os sonhos. Nunca na história desse país nós trabalhadoras e
trabalhadores, havíamos estado tão órfãos de projetos, de representações e de acesso às
disputas como agora.
Nunca na história desse país o extermínio da população pobre e negra, a judicialização
dos trabalhadores e movimentos sociais e a criminalização dos oprimidos foram tão
massivos no massacre, em um período dito democrático, como na civilizada ordem
burguesa atual. Nunca na história desse país um político, com seu histórico discurso de
esquerda, havia se vendido tanto para o capital a partir das coligações efetuadas em
nome de uma ideia de progresso e desenvolvimento. Tampouco havia sido tão
defendido pelos movimentos de massa, como na história recente.
Nunca na história desse país a cultura popular foi tão desvirtuada pelos meios de
comunicação, o território popular tão apresentado como periferia, do mal, e o popular
tão desconfigurado em seu sentido. Nunca na história desse país a educação foi tão
financiada por grupos de interesses mercantis, abrigados nas asas do moderno estado de
direito. Nem homens e mulheres da classe trabalhadora haviam vivenciado a exposição
de suas vidas, suas ideias tão ridicularizadas e seus dorsos tão curvados como agora.
Nunca na história desse país a mídia foi tão rapidamente manipuladora e os agitadores
da direita foram tão ofensivos na sua capacidade de manejar o leme do navio sobre os
diversos corpos atirados na água devido às migrações forçadas.
Nunca na história desse país o sistema prisional foi tão robusto: 726 mil presos, sendo
mais de 50% jovens e 65% negros, dados atuais do Levantamento Nacional de
Informações Penitenciárias (2017).1
Nunca na história desse país a periferia foi tão grande nas cidades e tão obrigada e
remoções forçadas como agora2. Nunca na história desse país os transgênicos foram tão
hegemônicos, os enlatados a forma de consumo central e o sistema prisional dos
condomínios com projeção ampliada frente a morte dos espaços públicos.
Nunca na história desse país ficamos tão distantes de um projeto e de um poder
realmente popular. Nunca como hoje foi tão evidente a necessidade de sermos muitos e
organizados para frear a sanguinária máquina mortífera do capital sobre e contra a
classe trabalhadora.
As condenações
A famosa frase dita pelo ex-presidente em diversas ocasiões, sempre esteve demarcada
por uma postura ideológica com aparência de nova (neodesenvolvimentismo)3, mas sua
essência não tirou o capital dos trilhos de sua bonança, servirá de guia dialógica para a
reflexão.
O dia 24 de janeiro de 2018 entra para a história do Brasil como mais um momento de
consolidação, na coerção, da brutal ofensiva do capital sobre o trabalho. A centralidade
da judicialização sem provas, a criminalização dos que lutam e a primazia do direito
penal e civil sobre os direitos sociais, o capitalismo no Brasil segue fluindo de vento em
poupa.
Demarcado pelo julgamento do ex-presidente Lula, em uma acelerada correria para não
legitimar sua candidatura às eleições de 2018, a condenação foi muito mais do que um
juízo político sobre um indivíduo e/ou um partido político. Foi a explicitação de que a
luta de classes se acirra e com ela a potencialidade do aparelho do Estado armado contra
o trabalho, em benefício do capital transnacional, são a única feitura possível em tempos
de queda da taxa de lucro para o capital.
O dia 24 de janeiro entra, pois, para a história do Brasil como mais uma cena macabra,
ao longo da jovem república burguesa, de brutalidade e violência escancaradas contra os
trabalhadores. Porque não se tratava somente de uma condenação cujas provas são
frágeis, mas de um processo explícito de esvaziamento de qualquer outro tipo de poder,
que não o dos senhores da casa grande do passado e do presente.
O judiciário segue sendo o território dos donos das algemas objetivas e simbólicas e
ascendeu o alerta vermelho na possibilidade de terremotos sociais. Agora, após este e

1
Relatório disponível em: http://dados.mj.gov.br/dataset/infopen-levantamento-nacional-de-
informacoes-penitenciarias/resource/5652dceb-d81a-402f-a5c8-e4d9175241f5 Acesso em 23 de janeiro
de 2018.
2
Ver relatório final do Observatório das remoções da USP, 2017. Disponível em:
https://www.observatorioderemocoes.fau.usp.br/observatorio-de-remocoes-apresenta-o-relatorio-
final-de-projeto/ Acesso em 21 de janeiro de 2018.
3
Para um estudo mais profundo sobre o período Lula, sugerimos a coletânea de artigos que compõem o
livro organizado por Maria Orlanda Pinassi e Mariano Féliz (Org). La farsa neodesarrolista y las
alternativas populares em América Latina y caribe. Buenos Aires: Herramienta, 2017.
outros atos sumários, o judiciário está apto, a partir das regras feitas por ele mesmo,
para armar-se contra a classe trabalhadora e a favor das contrarreformas. Processos estes
que definem a estrutura jurídico-política inerente ao contínuo exercício militar
historicamente dirigido contra os trabalhadores.
Ante o cenário de barbárie política, definida como ascensão, na base da força, via
intensificação da superexploração da força de trabalho e da agudização da precarização,
nunca na história desse país foi tão necessário recobrar as energias para lutar e
conformar projetos políticos em unidade.
Porque nunca na história desse país4, foi tão explícita a necessidade de consciência
sobre o que está em jogo no desmonte desta nação. Processo que não foi interrompido
no período de governo do PT, tampouco o será nos próximos anos de continuidade, sem
freios, das políticas neoliberais que tentam contrarrestar a estrutural situação de crise
inerente ao capital.
Sempre! Sempre na história! Sempre na historia desse continente e desse país
encontramos brechas para sair adiante, levantar a poeira, dar a volta por cima. E, se não
a encontramos, a criamos. Porque nunca, nunca na história desse país, deixou de haver
movimentos de resistências, luta cotidiana nos territórios e mídias alternativas5
relatando outros mundos necessários e possíveis em meio à desordem do capital. Porque
sempre nossa história foi o palco da luta de classes. E da capacidade de nos
reinventarmos como esquerda atuante sem deixar de lutar.

4
Vale a pena a reflexão contida no livro “Nunca antes na história desse país. Um balanço das políticas
do governo lula. Organizado por Marilene de Paula (2017), RJ: Fundação Heinrich Boll Stiftung.
Disponível em: http://www.inesc.org.br/biblioteca/textos/livros/nunca-antes-na-historia-desse-pais-
um-balanco-das-politicas-do-governo-lula Acesso em 20 de janeiro de 2018.
5
Alguns importantes exemplos de mídias alternativas e comprometidas:
observatoriodasveiasabertas.com.br; marxismo21.org; lemondediplomatique.org.br; midianinja.org

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