Anda di halaman 1dari 8

GRUPO DE ESTUDOS E

PESQUISAS DE GEOGRAFIA
HISTÓRICA
POR GEOHISTORICA | 31/05/2015 · 20:28

A teoria do valor Tupinambá, por Jorge Caldeira


Interessante artigo de Jorge Caldeira, que contrapõe as visões de natureza (através da ideia de valor) dos índios
Tupinambás, do capitalismo (por Adam Smith) e do marxismo. O contraponto da consideração da natureza como sem
valor, estoque ilimitado para a produção de mercadorias, visão tanto do liberalismo, como do marxismo é feito através da
obra “Dialética do Esclarecimento”, de Theodor Adorno e Max Horkheimer.

A TEORIA DO VALOR TUPINAMBÁ

O lugar da natureza nas ideias econômicas

Jorge Caldeira
Folha de São Paulo, 31/05/2015

RESUMO A partir de relato do século 16 sobre a visão econômica de um velho tupinambá, o ensaísta expõe como as
teorias do valor dominantes no Ocidente conceberam o papel da natureza. De Aristóteles a Marx, as concepções se
modificaram até que, nas últimas décadas, parecem ter reencontrado a ideia central do indígena.

O francês Jean de Léry passou um bom tempo na baía de Guanabara na década de 1560. Descreveu assim a principal
atividade econômica local:

“Quanto ao pau-brasil, direi que tem folhas semelhantes às do buxo, embora de um verde mais claro, e não dá frutos.
Quanto ao modo de carregar os navios com essa mercadoria, direi que tanto por causa da dureza, e consequente
dificuldade em derrubá-la, como por não existirem cavalos, asnos ou outros animais de carga para transportá-la, é ela
arrastada por muitos homens. Se os estrangeiros que por aí viajam não fossem ajudados pelos selvagens não
poderiam, nem sequer em um ano, carregar um navio de tamanho médio”.

O termo “ajudados” é bondoso em relação a seus compatriotas. O processo de trabalho quase não tinha participação
francesa:

“Os selvagens, em troca de algumas roupas, camisas de linho, chapéus, facas, machados, cunhas de ferro e demais
ferramentas trazidas por franceses e outros europeus, cortam, serram, racham, atoram e desbastam o pau-brasil,
transportando-os nos ombros nus às vezes por duas ou três léguas de distância, através de montes e sítios escabrosos
até chegarem à costa, junto aos navios ancorados, onde os marinheiros o recebem”.

Enquanto observava tudo isso, Léry registrou as ideias de um ancião tupinambá:

“Uma vez um velho perguntou-me: ‘Por que vindes vós outros, maírs e perôs [franceses e portugueses] buscar lenha
de tão longe para vos aquecer? Não tendes madeira em vossa terra?’. Respondi que tínhamos muita, mas não daquela
qualidade, e que não a queimávamos, como ele o supunha, mas dela extraíamos tinta para tingir, tal qual o faziam eles
com os seus cordões de algodão e suas plumas”.

“Retrucou o velho imediatamente: ‘E porventura precisais de muito?’. ‘Sim’, respondi-lhe, ‘pois no nosso país existem
negociantes que possuem mais panos, facas, tesouras, espelhos e outras mercadorias do que podeis imaginar e um só
deles compra todo o pau-brasil com que muitos navios voltam carregados’. ‘Ah!’, retrucou o selvagem, ‘tu me contas
maravilhas’, acrescentando depois de bem compreender o que eu lhe dissera: ‘Mas esse homem tão rico de que me
falas não morre?’. ‘Sim’, disse eu, ‘morre como os outros’.”

“Mas os selvagens são grandes discursadores e costumam ir em qualquer assunto até o fim, por isso perguntou-me de
novo: ‘E quando morrem, para quem fica o que deixam?’. ‘Para seus filhos, se os têm’, respondi. ‘Na falta destes, para
os irmãos ou parentes mais próximos’. ‘Na verdade’, continuou o velho, que, como vereis, não era nenhum tolo, ‘agora
vejo que vós outros maírs sois grandes loucos, pois atravessais o mar e sofreis grandes incômodos, como dizeis
quando aqui chegais, e trabalhais tanto para amontoar riquezas para vossos filhos ou para aqueles que vos
sobrevivem! Não será a terra que vos nutriu suficiente para alimentá-los também? Temos pais, mães e filhos a quem
amamos; mas estamos certos de que, depois da nossa morte, a terra que nos nutriu também os nutrirá, por isso
descansamos sem maiores cuidados’.”

A reprodução do argumento inteiro a respeito de assuntos complicados como economia era extremamente rara nos
tempos de Jean de Léry. Tão rara que este é um dos únicos textos do século 16 capazes de permitir um registro
respeitável das ideias tupinambás.

Esse trecho, especificamente, contém o núcleo do coração do pensamento econômico: uma teoria do valor completa.
Para o velho tupinambá, o axioma máximo da economia era a preservação dos bens na Terra, capaz de guardar como
ninguém os tesouros para alimentar e nutrir as gerações futuras. Sendo esta preservação o objetivo maior da atividade
econômica, o ato de acumular bens sem necessidade aparecia como insano, contrário à razão –daí sua classificação
dos europeus como “grandes loucos”, que correriam o mundo fazendo saques contra a felicidade de seus
descendentes.

O emprego da preservação como ente de razão em economia permite tornar inteligíveis os outros pontos da teoria do
valor tupinambá. A alocação de trabalho para produzir ficava subordinada a ele –e não oposta. A diferença é
importante por causa do modo de perceber europeu: nunca faltou quem qualificasse os tupis de preguiçosos ou
indolentes.

AMBIENTE Basta o trecho de Léry descrevendo os trabalhos necessários para o corte e transporte do pau-brasil
para perceber que as coisas não eram bem assim. Aliás, o trabalho aplicado pelos tupis na natureza era altamente
produtivo. Essa produtividade começava pelo domínio tecnológico do ambiente ao redor –tão sofisticado que apenas
no século 20 foi devidamente avaliado por cientistas.

Na época de Léry, os europeus apenas se espantaram com o imenso conhecimento que os índios da floresta tropical
tinham das propriedades e usos farmacêuticos das plantas. Vindos de uma sociedade que mal começava a dominar
com mais eficácia as fórmulas medicinais vegetais, os recém-chegados não podiam acreditar nas prescrições
medicinais indígenas –muito mais sofisticadas.

Era uma diferença espantosa. Os europeus conheciam o uso de algo como uma centena de espécies; os nativos
manipulavam cerca de 3.000 –que hoje são tesouro da humanidade.

Além disso, os tupi-guaranis (os tupinambás eram parte deste grupo) obtiveram outro diferencial tecnológico
importante: a domesticação de espécies e seu cultivo. Desenvolveram técnicas de cruzamento e hibridação para obter
melhores sementes e variedades mais produtivas. Criaram a tecnologia de cultivo de alguns produtos agrícolas hoje
básicos de toda a humanidade: milho, algodão, amendoim e tabaco se espalharam por todo o planeta a partir dos
cultivares domesticados por eles.

Além dessas culturas universais, foram responsáveis pela domesticação, cultivo e posterior difusão do uso de dezenas
de produtos, muitos deles parte da dieta de todos os seres humanos: mandioca, feijão, abóbora, pepino, chuchu,
batata-doce, berinjela, alcachofra, pimentas, abacate, abacaxi, caju, mamão, maracujá e cacau são os mais conhecidos.

TEMPO LIVRE A combinação da capacidade tecnológica com o princípio maior da preservação determinava o ritmo
de vida. Os tupis conseguiam viver de maneira confortável –isto é, produzindo além do necessário para sobreviver,
mantendo estoques seguros de alimentos– com um número pequeno de horas de trabalho.

Estudos realizados por antropólogos no século 20 mostraram que o número médio de horas diárias de trabalho
necessárias para a manutenção deste padrão de vida não excedia três. Por isso, os tupis tinham muito tempo livre.
Não vendo nenhum sentido lógico em se extenuar para acumular bens e prejudicar descendentes, eles empregavam
esse tempo para pensar na vida, descansar –e em seus ricos rituais cerimoniais e festas, onde parte dos excedentes era
consumida.

Neste ponto de sua evolução os tupinambás passaram a fazer negócios regulares com os europeus e a discutir
economia com pessoas como Jean de Léry –um momento no qual a Europa se transformou a partir do contato com a
América.

Também os europeus tinham então uma teoria do valor dominante –que não era exatamente aquela que domina hoje
no Ocidente. O teórico com domínio indisputado no campo econômico era Aristóteles. E sua teoria do valor não se
pautava exatamente pelo norte da acumulação de bens. Pelo contrário, ele considerava necessário um limite para a
acumulação, por razões que expunha:

“As pessoas cujo objetivo é uma vida agradável perseguem-na medindo-a pelos prazeres do corpo, de tal forma que,
como esses parecem depender da posse de bens, todas suas energias se concentram na atividade de enriquecer. Como
seus desejos e prazeres são excessivos, se não conseguem obtê-los tentam chegar até eles por outros meios quaisquer,
usando cada uma de suas faculdades de maneira contrária à natureza. Tais pessoas transformam todas essas
faculdades em meios de proporcionar riqueza, na convicção de que a riqueza é o fim a atingir e que tudo mais deve
contribuir para a consecução deste fim”.

Devido a esta tendência para o excesso, Aristóteles acreditava na necessidade de colocar freios no enriquecimento.
Entre outras medidas para isso, propunha que os comerciantes e mercadores fossem excluídos do rol dos cidadãos
eleitores e que os governantes fossem escolhidos entre nobres que não tivessem interesse na riqueza, de modo que
estes poderiam tolher os interesses dos ricos. Sendo bem-sucedido o controle, seria preservada a diferença essencial
entre a economia natural –aquela que produz bens de uso sem o emprego da moeda e a possibilidade de acumulação
financeira– e a economia artificial, aquela que emprega o dinheiro.

Assim a conversa entre Léry e o chefe tupinambá era uma conversa entre adeptos de duas teorias do valor diversas,
mas não totalmente incompatíveis no que se refere ao lugar de uma noção central: “natureza”. Para ambos, ela
aparecia como algo central, criação frutuosa cuja preservação deveria ser o próprio objetivo da atividade econômica.

DIREÇÃO Mas os próprios navios carregados na América provocaram uma mudança real na direção do
enriquecimento –não só como fato da vida econômica mas como valor para pensar a economia.

O maior expoente dessa reavaliação foi Adam Smith. O economista escocês foi o responsável pela formulação da
vertente econômica das ideias iluministas –mas, sobretudo, por sua fundamentação moral. Na base da mudança
estaria uma ideia do que seria “natural” em economia, inteiramente oposta à de Aristóteles:

“A divisão do trabalho é a consequência necessária, embora muito lenta e gradual, de uma certa tendência ou
propensão existente na natureza humana: a propensão a intercambiar, permutar ou trocar uma coisa pela outra. Não
é nossa tarefa investigar aqui se essa propensão é simplesmente um dos princípios originais da natureza humana,
sobre a qual nada mais restaria a dizer ou se –como parece mais provável– é uma consequência necessária das
faculdades de raciocinar e falar”.

Surge assim uma nova definição do que seja troca –e desaparecem as diferenças entre permuta (modo de cambiar
excedentes na economia natural) e comércio a dinheiro (modalidade da economia artificial). A troca é aquilo que
permite aos humanos construir uma civilização conforme sua natureza –que já é muito diferente da natureza de
Aristóteles, com seus senhores e escravos:
“Numa sociedade civilizada, o homem tem a necessidade quase constante da ajuda dos semelhantes, e é inútil esperar
esta ajuda simplesmente da benevolência alheia. Ele terá maior probabilidade de obter o que quer caso consiga
interessar a seu favor a autoestima dos outros, mostrando que é vantajoso para eles fazer-lhe ou dar-lhe aquilo de que
ele precisa. É isso que faz toda pessoa que propõe negócio a outra. Dê-me aquilo que eu quero e você terá aquilo que
você quer –esse é o significado de qualquer oferta desse tipo”.

Para que a tendência da natureza humana possa se realizar mais plenamente, é necessária uma instituição social
capaz de apoiá-la:

“Como é o poder de troca que leva à divisão do trabalho, a extensão desta divisão deve ser sempre limitada por esse
poder, ou, em outros termos, pela extensão do mercado. Quando o mercado é muito reduzido, ninguém pode se sentir
estimulado a dedicar-se inteiramente a uma ocupação, porque não poderá permutar toda parcela de excedente que
ultrapassa seu consumo pessoal pela parcela de produção do trabalho alheio, da qual tem necessidade”.

A riqueza pela troca nos mercados, longe de ser algo condenável como era para Aristóteles, constitui agora o elemento
moral mais importante. Por ela os homens se tornariam iguais, independentes por seu trabalho especializado e se
relacionariam entre si através de contratos justos, pois capazes de atender a seus interesses. Assim a ideia central do
Iluminismo se estendeu da esfera política para a econômica: o mercado passa a ser pensado como o próprio contrato
social em atividade permanente.

Nessa versão, o sentido moral da economia também se torna o oposto da definição do filósofo grego. A virtude estaria
não em limitar as trocas no mercado, mas em produzir o mais possível para a troca. Além de contratual, a produção de
mercadorias seria virtuosa:

“Existe um tipo de trabalho que acrescenta algo ao valor do objeto sobre o qual é aplicado, e existe outro tipo, que não
tem este efeito. O primeiro, pelo fato de produzir valor, pode ser considerado produtivo; o segundo, trabalho
improdutivo. Assim o trabalho de um manufaturador geralmente acrescenta algo ao valor dos materiais com os quais
trabalha: o de sua própria manutenção e o lucro de seu patrão. Ao contrário, o trabalho de um criado doméstico não
acrescenta valor algum a nada. Uma pessoa enriquece mantendo muitos operários, e empobrece mantendo muitos
domésticos”.

O primeiro tipo de trabalho contém virtude porque o valor que cria é permanente: “O trabalho do manufaturador fixa-
se e realiza-se num objeto específico ou mercadoria vendável, a qual perdura, no mínimo, algum tempo após
encerrado o trabalho. É, por assim dizer, uma certa quantidade de trabalho estocado e acumulado”.

A possibilidade de conter valor acumulado daria ao trabalho produtivo uma virtude maior até que o maior dos cargos
públicos:

“O soberano, por exemplo, com todos os oficiais de Justiça e guerra que servem sob suas ordens, todo o Exército e
Marinha, são trabalhadores improdutivos. Servem ao Estado, sendo mantidos por uma parte da produção anual dos
outros cidadãos. Seu serviço, por mais honroso, útil ou necessário que seja, não produz nada com que igual
quantidade de serviço possa ser obtida”.

Enquanto para Aristóteles a virtude do governo estava no controle dos negociantes pelos proprietários, ela agora
aparece em outro lugar. O maior objetivo da vida social passa a ser o de criar grandes mercados, que fariam a riqueza
das nações. Para isso, no âmbito público, o governo improdutivo deve ser limitado, e os esforços individuais de
produzir pela troca devem ser incentivados. De ponto mais alto da sociedade, o ponto essencial para Aristóteles, o
governo caía para uma posição secundária, a de esfera a ser limitada pelo mercado.

MARX Quando produzir se torna tudo no pensamento econômico, “natureza” passa a ser quase nada. Esta será a
definição dominante de Adam Smith –mas não apenas dele. Karl Marx iria ainda mais longe. “O Capital” começa com
as seguintes palavras:

“A riqueza das sociedades onde impera o regime capitalista de produção aparece como um imenso arsenal de
mercadorias, e a mercadoria é sua forma elementar. Por isso nossa análise começa pela análise da mercadoria”.
E, nessa análise que tem o capitalismo, forma avançada de produção de mercadorias, como premissa, o primeiro
ponto tratado sobre a mercadoria é o da separação entre a “materialidade” e as “medidas sociais para expressar
quantidades”. A primeira constituirá o valor de uso das mercadorias, a segunda, medida pelo “número de horas de
trabalho socialmente necessárias para a produção” constituirá o valor de troca. Essa última forma é de tal ordem
dominante na sociedade capitalista que Marx emprega como sinônimo dela apenas o substantivo “valor”.

Nessa categoria definida segundo a forma capitalista, “natureza” –ao contrário do que para Aristóteles ou Adam
Smith– passa a ser algo que se define pela falta completa de valor, é algo que está fora da teoria do valor. A dominação
completa da produção para o mercado tira qualquer sentido econômico maior para ela:

“A terra em geral, bem como todas as forças naturais, não têm um valor, porque não representam nenhum trabalho
materializado nelas”.

Com todo o valor advindo do trabalho, capital e rendas não passam de deduções deste, através da apropriação de
mais-valia do trabalho assalariado, durante o processo de distribuição. E a instância em que essa apropriação
acontece, o mercado, ganha uma conceituação bastante diversa daquela de Adam Smith. No lugar do centro onde os
homens realizam sua natureza própria através de contatos justos, para satisfazer seus interesses, aparecerá como um
limite para a acumulação:

“A distribuição do trabalho social, no intercâmbio das matérias por ele produzidas, encontra uma travação social
submetida à ação fortuita dos produtores capitalistas. Como tais produtores só se enfrentam como produtores de
mercadorias, com cada um tentando vender pelo preço mais alto, resulta que a mercadoria só se impõe pela
competição, pela pressão mútua exercida por uns sobre os outros, o que faz compensar mutuamente as divergências.
A lei do valor só atua aqui como lei interna, que os agentes individuais consideram uma lei natural. É essa lei que
impõe o equilíbrio social da produção em meio a flutuações fortuitas”.

Tanto as flutuações das crises como essa lei arcaica, em aparência natural, eventualmente poderiam ser eliminadas da
economia, com a substituição da instância do mercado por algo mais racional:

“A liberdade só pode consistir em que o homem socializado, ou os produtores associados, regulem racionalmente o
intercâmbio de matérias com a natureza, e o coloquem sob seu controle comum em vez de deixarem-se dominar por
ele como um poder cego, e façam isso com o menor gasto possível de forças e nas condições mais adequadas e dignas
de sua natureza humana.”

A virtude econômica, aqui, aparece em âmbito muito diferente da pujança dos mercados preconizada por Adam
Smith: no emprego ainda maior da razão. Só ele permitiria ultrapassar os limites primitivos e irracionais do mercado
–e assim chegar ao que seria a realização da verdadeira natureza racional humana. Esta não teria a propensão para a
troca como conteúdo, mas a dignidade capaz de presidir o controle justo do intercâmbio de matérias com a natureza
não humana, para além da selvageria do mercado.

Nesse sentido, as categorias de Marx apontam para uma contratualidade ainda maior que aquela tida como máxima
por Adam Smith, a das trocas no mercado. O regime da liberdade seria o da extensão do mundo dos contratos entre
seres livres por sobre o domínio irracional do mercado, com a razão controlando a produção social.

FONTE Aqui se chega ao extremo oposto da teoria do valor tupinambá: a natureza seria apenas uma fonte de
matérias sem valor próprio, sobre a qual o homem aplicaria suas ideias de justiça, tendo como instrumento o
intercâmbio. Assim a produção social se ampliaria em escala ainda maior que na produção mercantil do capitalismo,
tirando o homem do reino da necessidade, da luta conta a natureza, das limitações das trocas com ela –e isto seria a
realização do socialismo, o reino da liberdade.

Antes que o prometido reino chegasse, no entanto, houve quem visse a solução como problema. Num texto de 1947,
Theodor Adorno e Max Horkheimer notaram:

“Assim a relação entre a necessidade e o reino da liberdade ficou sendo puramente quantitativa, mecânica. A
natureza, definida como algo totalmente alheio, tornou-se totalitária, como na primeira mitologia, e absorveu a
liberdade junto com o socialismo”.
A questão tratada em “Dialética do Esclarecimento” é mais ampla que aquela do socialismo. Trata-se de uma reflexão
sobre o Iluminismo como um todo, sobre o processo secular que levou à inversão completa da relação entre natureza e
valor.

Se Marx, como iluminista que era, era otimista e queria libertar totalmente o homem do reino da necessidade, Adorno
e Horkheimer notaram que a possibilidade de ampliar quase infinitamente a produção material existia, passara a ser
apenas um problema técnico –mas isso não levava exatamente ao reino da liberdade:

“A matéria pode ser efetivamente dominada, sem apelo a forças ilusórias que a governem ou que nela habitem, sem
apelo a propriedades ocultas. Uma vez que pode se desenvolver sem ser perturbado pela opressão externa, nada mais
há que possa lhe servir de freio. O Iluminismo se torna totalitário”.

Nesse admirável mundo novo, a liberdade viraria prisão:

“O mito passa a ser iluminação e a natureza, mera objetividade. O preço que os homens pagam pela multiplicação de
seu poder é a sua alienação daquilo sobre o que exercem o poder. O Iluminismo se relaciona com as coisas como o
ditador se relaciona com os homens. Este os conhece na medida em que pode manipular; o homem de ciência conhece
as coisas na medida em que as pode produzir”.

Na época em que o livro foi escrito (foi editado em 1944) não havia ainda uma crítica à noção iluminista –pressuposto
tanto de Adam Smith como Marx– de que “natureza” seria, além de fonte gratuita, um repositório infinito sobre o
qual o homem sacaria para produzir mercadorias com seu trabalho. Mas, desde os anos 1970, cientistas começaram a
se debruçar sobre a hipótese de que o limite quantitativo para sacar sobre a natureza estava sendo atingido.

Torna-se cada vez mais senso comum a impressão de que as trocas entre homem e natureza não são gratuitas e
infinitas –e isso nos leva de volta ao ponto central da teoria do valor tupinambá: preservar deve ser um ente de razão
econômica. A noção de “natureza”, como se vê, tem uma história que muda.

FONTE: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrissima/221018-teoria-do-valor-tupinamba.shtml
Anúncios

Report this ad

Report this ad

Share this:

 Twitter  Facebook 1  E-mail  Google

Curtir

Seja o primeiro a curtir este post.

Relacionado

MINICURSO "A TEORIA DOS


DOIS CIRCUITOS DA
ECONOMIA URBANA: DA
PROPOSTA À
OPERACIONALIZAÇÃO"
Em "Grupo de Estudos de
Geografia Histórica"

Relatório da Reunião do 6º
Grupo de Estudos de
Geografia Histórica (2012-2)
do dia 23/10/2012
Em "06º GEGH 2012-2"

Balanço de participação do
Grupo de Estudos e Pesquisas
de Geografia Histórica na
Agenda Acadêmica da UFF
2016
Em "Geohistórica -
participação em eventos"

MINICURSO "A TEORIA DOS


DOIS CIRCUITOS DA
ECONOMIA URBANA: DA
PROPOSTA À
OPERACIONALIZAÇÃO"
Em "Grupo de Estudos de
Geografia Histórica"

Relatório da Reunião do 6º
Grupo de Estudos de
Geografia Histórica (2012-2)
do dia 23/10/2012
Em "06º GEGH 2012-2"

Balanço de participação do
Grupo de Estudos e Pesquisas
de Geografia Histórica na
Agenda Acadêmica da UFF
2016
Em "Geohistórica -
participação em eventos"

Os comentários estão desativados.

Anda mungkin juga menyukai