Mauro Meirelles1
Wrana Panizzi2
Resumo: O presente texto busca pensar a vida na cidade enquanto uma experiência
estética e sensível. Neste sentido, explora múltiplas estéticas e sensibilidades a partir de
um olhar intersticial que transita pela filosofia, sociologia, antropologia e pelo
urbanismo. Um olhar que busca perceber a cidade como um fenômeno perceptivo total
que envolve relações afetivas, histórias de vida, relações estas, que os sujeitos
estabelecem com a cidade. Desta feita, no desenvolvimento de nosso argumento
partimos do pressuposto que todo olhar é condicionado e que nenhuma forma de
perceber a cidade está livre de recortes e julgamentos diversos ligados aquilo que
consideramos belo e feito, agradável e desagradável, bom e ruim.
Introdução
1
Curso de História do Unilasalle, Mestrado em Memória Social e Bens Culturais / Programa de Pós-
Graduação em Educação, ambos do Unilasalle, Doutor em Antropologia Social. Pesquisa apoiada e
financiada pelo CNPq. Professor Adjunto do Unilasalle. E-mail: mauromeirelles@icloud.com.
2
Faculdade de Arquitetura da UFRGS, Doutora em Doutorado de III Cycle en Urbanisme et
Amenagement pela Universite de Paris XII (Paris-Val-de-Marne) e Doutorado em Science Sociale pela
Université Paris 1 (Panthéon-Sorbonne). . Pesquisa apoiada e financiada pelo CNPq. Professora Titular
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. E-mail: wrana@terra.com.br.
1. Preâmbulo epistêmico
Contudo, para se pensar o modo como esses sentidos e adjetivações são e/ou
foram construídos ao longo dos anos envolve reconhecer a natureza polissêmica que
envolve o modo como a cidade é entendida e a aceitação tácita de que existe uma
distinção básica entre aquilo que se vê e aquilo que se olha na medida em que, olhar,
pressupõe um ato mecânico enquanto que, ver, pressupõe certo julgamento e validação
no interior de teias de significado que são dadas pelo sujeito que faz de sua experiência
e da vivência o princípio epistêmico de seu julgamento e modo de perceber aquilo que
olha e, seleciona, para ver (MEIRELLES E PEDDE, 2014; AUMONT, 1993).
Movimento esse que, por um lado, se ocupa daquilo que diz respeito ao ente, ao
imanente, ao fenomênico e se atém somente no superficial e naquilo que todo mundo vê
(princípio ôntico) e, por outro, naquilo que está para além do fenomênico, que o
condiciona, que está por trás daquilo que todo mundo vê, mas que, nem todos veem
(princípio ontológico). Isto, algo que materializa-se naquilo que chamamos de cidade e
que neste texto a partir de diferentes enlaces entre a sociologia, antropologia, direito e o
urbanismo buscamos perscrutar e explorar enquanto uma categoria de pensamento,
enquanto um epifenômeno do real e, também, enquanto categoria social e culturalmente
construída.
O ver não é algo mecânico/biológico, mas está interligado ao ente que olha. O
olhar não é discricionário. O ver, portanto, está conectado a experiência vivida pelo
espectador, por suas crenças, por sua classe social, por sua instrução, por sua cultura. O
ver é definido pela intencionalidade daquele que olha (AUMONT, 1993). Numa
analogia bastante simples, o ver nada mais é que aquilo que destacamos na paisagem,
ou seja, aquilo que está em foco e que colocamos em evidência em função de nossos
interesses subjetivos. Contudo, os seres humanos são movidos por paixões e, é essa
paixão, esse perceber diferente, que faz com que em meio a uma grande multidão que
anda pela rua caoticamente, vejamos aquela pessoa que nos interessa. É esse olhar
interessado – o ver – que faz com que prendamos nossa atenção a determinado modelo
de carro, a um quadro específico, a traços da arquitetura, etc.
Mas não é somente o olhar interessado que se constituí no ato de ver. O ato de
ver é, portanto, ato instituinte do mundo (BAKHTIN, 2012) e elemento constituinte de
nossa doxa (BOURDIEU, 1977). Contudo, sua tangibilidade e presença concreta
dependerá do sentido que atribuímos aquilo que vemos e o valor que aquilo que é visto
Considerações Finais
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