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TECENDO REDES:

CONEXÃO ENTRE SABERES


PARA EDUCAÇÃO

Organizadora
Dileni Freitas

Rio de Janeiro, 2007


AGRADECIMENTOS

A você que possui nosso livro em suas mãos.


À força do bem, solidariedade e cientificidade pre-
sentes para surgimento deste trabalho, sobretudo as
heranças do ontem.
© Dileni Freitas/E-papers Serviços Editoriais Ltda., 2007.
Todos os direitos reservados a Dileni Freitas/E-papers Serviços Editoriais Ltda.
É proibida a reprodução ou transmissão desta obra, ou parte dela, por qualquer
meio, sem a prévia autorização dos editores.
Impresso no Brasil.

ISBN 85-7650

Projeto gráfico, diagramação e capa


Livia Krykhtine

Foto da capa

Revisão
Elisa Sankuevitz
Helô Castro

Esta publicação encontra-se à venda no site da


E-papers Serviços Editoriais.
http://www.e-papers.com.br
E-papers Serviços Editoriais Ltda.
Rua Mariz e Barros, 72, sala 202
Praça da Bandeira – Rio de Janeiro
CEP: 20.270-006
Rio de Janeiro – Brasil
SUMÁRIO

7 APRESENTAÇÃO

9 NA VOZ DA ORGANIZADORA

11 PREFÁCIO

13 A EXPRESSÃO ORAL COMO RECURSO DIDÁTICO


NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM
Angela Garcia e Dileni Freitas

35 A HUMANIZAÇÃO PELA EDUCAÇÃO


Considerações sobre a gravidez na adolescência
e a violência no ambiente escolar
Lílian Conceição Xavier Cardozo e Débora Alessandra de Souza

61 A ESCOLA PROMOVENDO HÁBITOS ALIMENTARES


SAUDÁVEIS
Uma estratégia educacional para a promoção da
alimentação saudável na rede de ensino infantil e
fundamental
Maria de Lourdes Ferreirinha Rodrigues, Juliana Rezende
Melo da Silva, Renata Bernardon, Nina Amorim, Elisabetta
Recine, Renata Monteiro e Patrícia Martins

83 FONOAUDIOLOGIA E EDUCAÇÃO
Em busca de uma voz saudável
Mary V. Andrianopoulos e Bianca Noé LaRose
111 ÁGUA: UMA QUESTÃO DE SAÚDE
A educação ambiental e a lutapela melhoria na
qualidade de vida
Glaucia Aparecida Rosa Cintra Peretti

123 A EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO FILOSOFIA


DE VIDA
João Abrahão da Silva

139 ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA DE ORGANIZAÇÕES


DE ENSINO
Hamilton Souza

151 COLABORADORES
APRESENTAÇÃO

Fui convidado para apresentar o livro: Tecendo redes: conexão


entre saberes para educação, organizado pela professora Dileni
Freitas reunindo uma equipe competente de colaboradores.
Sabemos todos que a questão da educação sugere uma
série de problemas para países como o nosso. Porém a pala-
vra “problema” implica uma ilusão: “que a dificuldade que
estamos tendo tem limites definidos”.
Neste livro, somos convidados a pensar que NÃO é preci-
so criar limites quando todas as coisas estão vinculadas. Seja
no terreno dos imprecisos limites multidisciplinares ou no li-
mite das práticas profissionais, o que importa é a capacidade
de criar conexões.
O livro ensina mais: os problemas não nos escolhem. Se
a situação nos atormenta, vamos resolver o tormento. Ou
de outra forma: a maneira como encaramos um problema
indica freqüentemente como estamos alimentando esse pro-
blema.
Por certo os textos aqui reunidos possuem a riqueza dos
relatos de experiências, das boas práticas e da reflexão que faz
avançar o conhecimento. Possuem, entretanto, algo mais, tra-
zem uma constatação exposta em uma desafiadora expressão:
“Não morda meu dedo, olhe para onde estou apontando.”
A organizadora e os colaboradores sofreram para organi-
zar e expor suas idéias, mas é oportuno afirmar que “Crescer”
tende a ser uma atividade sofrida. Alcançaram seu objetivo e
a questão não está em ter ou não objetivo. A questão é saber
se é um objetivo “agora” ou um objetivo “depois”.
Se vamos em frente e fazemos, isto surte um efeito em
tudo o mais que continuamos desejando fazer. Como a ara-
nha que continua tecendo sua teia interminavelmente, aque-
les que se dedicam à construção do conhecimento precisam


continuar a tecer as necessárias e ilimitadas conexões para
transformar a educação em nosso País.

Maurício Castanheira
Doutor em Filosofia e
Professor do Mestrado em Educação,
Universidade Católica de Petrópolis

 TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO


NA VOZ DA ORGANIZADORA

Refletindo sobre a velocidade do avanço tecnológico, os


modos de vida produzidos pela modernidade e a premente
necessidade de atenção às questões ambientais, deparo-me
com a indagação:
A educação vem acompanhando essas transformações,
buscando parceria com os diversos saberes científicos, para
aprimoramento da vivência educativa com qualidade e res-
peito ao ser humano?
Assim, o livro foi planejado visando reunir apontamentos
com a finalidade de colaborar com o desenvolvimento do
sistema educacional brasileiro, considerando-se algumas das
inúmeras contribuições oriundas da: Educação Ambiental,
Administração, Psicologia, Nutrição e Fonoaudiologia.
O objetivo precípuo é questionar as várias possibilidades
de sua interação com outros conhecimentos, redimensionar
práticas profissionais e o cotidiano educacional, tendo em
vista a alteridade e a melhoria da sociedade, tornando-a mais
coesa, ética, humana, consciente e sustentável.
BOA LEITURA!

Dileni Freitas


PREFÁCIO

Este livro nos traz a ousada e necessária proposta de pen-


sar a Educação, seja em espaços formais ou não-formais de
ensino, para além das amarras do modelo disciplinar da Mo-
dernidade. Para tanto, os autores circulam por temas que ex-
pressam a busca daquilo que vem sendo negligenciado nas
ações pedagógicas – a humanização.
A procura por uma prática mais humanizada é narrada a
cada capítulo, a partir de temas que vêm se constituindo em
demandas feitas aos atores da Educação: prevenção à gravi-
dez precoce; novos recursos didáticos e administrativos para
o espaço escolar; alimentação saudável; melhor uso da voz e
educação ambiental.
De maneira primorosa, os autores nos levam por cami-
nhos que revelam um conceito de humanização que não
pode ser resumido apenas às ações assistencialistas e carita-
tivas, representativas de um sujeito-indivíduo, “sujeitado” ao
saber do outro – especialista. A humanização que circula pe-
las palavras dos autores é denunciadora de um sujeito crítico,
constituído nas redes sociais das ações coletivas.
O cenário aqui apresentado, que expõe o trabalho e a for-
mação profissional na contemporaneidade diante de novos
questionamentos, revelando atores que exercem suas práti-
cas para além das determinações disciplinares de uma área
de conhecimento, nos remete também ao conceito de inter-
disciplinaridade. Esse conceito se constitui nas ações dos pro-
fissionais, que aqui se tornam autores, não a partir da nega-
ção do saber teórico e da técnica específicos de uma área de
conhecimento (Fonoaudiologia, Psicologia, Nutrição, entre
outras), mas por meio da afirmação da complementaridade
de métodos e conceitos, que fundam os diversos saberes já
instituídos.

11
E mais do que isso, as “vozes ouvidas” nos discursos dos
autores nos revelam a necessidade de construção de um novo
operador ético, que aponta para a resistência ao já instituído,
às formas de dominação. Essa luta não se funda na ação in-
dividual, mas na produção coletiva que se forma nas práticas
institucionais.
Ou seja, o desafio é produzir novas relações humanas,
pautadas no reconhecimento do outro, que não apenas o es-
pecialista; parafraseando Foucault, é criar formas que permi-
tam que o sujeito “invente a si mesmo como obra-de-arte”;
é tecer redes... Esse é o convite dos autores, dos quais me
aproximo para desejar a todos, que anseiam por uma recons-
trução de suas práticas profissionais – boa leitura e grandes
questionamentos.

Luiza Rodrigues de Oliveira

. Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo e Coordenadora do Curso


de Mestrado Profissional em Ensino de Ciências da Saúde e do Ambiente do Centro
Universitário Plínio Leite.

12 TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO


A EXPRESSÃO ORAL COMO
RECURSO DIDÁTICO
NO PROCESSO ENSINO-
APRENDIZAGEM

INTRODUÇÃO
O ser humano se diferencia dos outros animais principal-
mente pela capacidade de comunicação por meio dos códi-
gos lingüísticos. Desde a Antiguidade essa capacidade comu-
nicativa foi objeto de estudo e sempre muito valorizada. Até
o século IV acreditava-se que falar bem era um dom natural.
Foi Aristóteles, filósofo grego, o primeiro a deixar um legado
escrito a respeito da oratória e da retórica, a Arte Retórica. A
partir desta época até os dias de hoje, a busca por uma comu-
nicação eficaz ainda é um desejo e uma necessidade.
A Fonoaudiologia, na última década, tem avançado seus
estudos na área da expressão oral. Livros, artigos e teses bus-
cam desvendar a utilização da voz, da fala e de todos os fato-
res que envolvem o ato de se comunicar. Dentro deste tema
abrangente, existe um segmento específico que é dedicado
ao estudo da expressão oral de profissionais. Entre os profis-
sionais que utilizam a expressão oral como veículo básico de
seu trabalho, podemos citar os profissionais das artes (canto-
res e atores), do marketing (vendedores e teleoperadores), do
jornalismo (locutores, telejornalistas e radialistas), do direito
(juízes e promotores), da educação (professores, coordenado-
res), entre outros (FERREIRA, 1995).
As realidades de cada profissão são diferentes e peculia-
res. O mundo de vivências e o contexto sociocultural em que
cada um desses profissionais está imerso são diversos entre

13
si. Estudos sobre a expressão oral de atores e locutores são
distintos, pois envolvem contextos diferentes. Vejamos um
exemplo: um ator necessita projetar a voz para que todos no
teatro possam escutá-lo, mas um locutor radiofônico não tem
essa necessidade. O ator trabalha com a interpretação corpo-
ral além da vocal; o locutor deverá dizer com autenticidade
sua mensagem valendo-se unicamente da voz falada. Essas
observações óbvias e simples demonstram a diferença entre
o uso que profissionais podem fazer da expressão oral.
Nosso objetivo é demonstrar como a Fonoaudiologia
pode contribuir para a Educação mediante o aperfeiçoamen-
to da comunicação oral do professor. Ser um bom falante traz
vantagens tanto na vida pessoal quanto na profissional. Pela
comunicação, o indivíduo se faz pessoa, indo do ser singular
para a relação plural. A comunicação compõe o processo bá-
sico para a prática das relações humanas, assim como para
o desenvolvimento da personalidade e para toda a troca de
conhecimentos e aprendizagens (POLISTCHUK e TRINTA,
2003).
Quando um indivíduo usa a comunicação profissional-
mente, é necessário que ele adquira um domínio das estra-
tégias que podem ser usadas no ato comunicativo. Em vá-
rias profissões, saber se comunicar torna-se uma necessidade
para que o profissional alcance o sucesso. Ser professor im-
plica, em termos vocais, falar e falar sempre e muito. É pela
comunicação oral que ele motiva, ensina, educa, conversa,
orienta seus alunos.
Segundo Roy (2001), são os professores que apresentam
maior incidência de queixas vocais específicas e de descon-
forto físico, quando comparados a outros profissionais. Um
professor com voz fraca ou que passe o tempo de aula senta-
do atrás da mesa, sem expressão corporal, poderá não moti-
var seus alunos a aprender.
A formação de um professor é ao mesmo tempo diver-
sificada, no que se refere às diversas correntes do saber hu-
mano, e setorizada, no que se refere ao conhecimento espe-
cífico daquilo que vai ensinar. Mas ele é sempre o indivíduo
intermediador e facilitador entre o conhecimento e o aluno,

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além de ter a incumbência de motivar e aguçar a vontade
de saber. Para exercer essa atividade, além dos estudos de
conteúdos específicos à ciência que ele pretende ministrar,
o professor desenvolve, em seu currículo de formação, ma-
térias específicas de preparação para a sua futura atividade,
como, por exemplo, Psicologia. Estas matérias pretendem
fornecer-lhe recursos para motivar e compreender seus alu-
nos. Qualquer que seja sua formação, o professor prepara-se
intelectualmente para o exercício da profissão. Exercício esse
que vai exigir-lhe, também, o uso da comunicação oral, para
o que ele, em geral, qualquer que seja sua formação, não é
preparado. Em nossa experiência clínica, temos verificado
que é enorme a quantidade de professores que precisam se
afastar das salas de aula por problemas com sua voz falada.
Outros sentem desconforto vocal após algumas horas de tra-
balho, ou então, relatam que sua fala não prende a atenção
dos alunos, que sua voz é monótona ou não tem projeção
adequada (GARCIA, 1996). Essas questões interferem negati-
vamente na qualidade de vida do professor, repercutindo no
processo ensino-aprendizagem. Acreditamos que, por meio
das práticas fonoaudiológicas aplicadas à expressão oral, es-
tamos contribuindo para que os professores possam encon-
trar uma forma mais eficaz e menos desgastante de exercer
sua função: ensinar.

COMPORTAMENTO DE COMUNICAÇÃO ORAL


Dentre os muitos modos de comunicação utilizados pelo Ho-
mem, podemos ressaltar a Comunicação Oral. Ela é manifes-
tada através da voz falada. Os comportamentos comunicati-
vos estão presentes no ser humano e também nos animais.
Comportamentos ruidosos ou sonoros são as manifestações
comunicativas de animais para uma ameaça a seu território,
o chamamento sexual e as informações de alerta e perigo. No
ser humano, esse comportamento ruidoso ou sonoro apre-
senta-se caracterizado pelo gesto vocal. Podemos perceber no
bebê as manifestações de dor, fome, frio, e outras emoções,
mediante o choro. Esta é a primeira manifestação comuni-

TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO 15


cativa que aparece na espécie humana e o que já podemos
denominar como voz. No adulto o gesto vocal que traduz
a emoção pode ser sentido pelas entonações. O desenvolvi-
mento do Sistema Nervoso Central, estimulado pelas vivên-
cias sociais do Homem, evolucionou o gesto vocal primitivo
em voz articulada, surgindo a fala. A fala, voz articulada, é o
veículo de manifestação do pensamento e da linguagem e ao
mesmo tempo estimulador destes (BRANDI, 1990).
Ao estabelecer comunicação, cada ser humano o faz mo-
tivado por suas experiências e intenções. É por meio de sua
voz falada que ele age sobre o outro e sobre o mundo (FER-
REIRA, 1992). A voz falada, como um comportamento hu-
mano, integra três sentidos: um expressional-vocal-corporal,
entendido como a produção de voz e fala, bem como toda a
expressão corporal envolvida no ato de comunicar; um lin-
güístico-verbal-simbólico, representado pela cognição, pen-
samento e linguagem; e um sociocultural-histórico no qual
cada indivíduo mediante a fala, escreve sua história, no seu
grupo social, e é influenciado por ela.
O comportamento de comunicação oral é um atributo
próprio do ser humano, caracterizado pelo uso de elementos
lingüísticos e verbais, que compõe a mensagem ou discurso;
de elementos vocais que vão constituir o subjetivo, a inten-
ção e a emoção; de elementos não-verbais, como a mímica,
o olhar e as variações tônico-posturais, e de elementos histó-
rico-sociais, que refletem a origem, a cultura e o momento de
vida do falante.
Segundo Filho (2005), a voz tem a mesma origem social
da palavra que objetiva. A voz é imprescindível ao discurso
oral e participa deste, estabelecendo a comunicação entre o
mundo e a consciência de quem fala. Assim como a cons-
trução da linguagem é realizada ao longo das experiências
e encontros com o mundo social, a voz também o é. Esses
encontros convertem seus protagonistas em falantes e recep-
tores, que seriam outros, fosse outra a existência e a trajetória
do mundo. A voz que usamos é indissociável do espaço so-
cial e necessita dessas relações para se constituir. A voz de co-
mando de um general aos seus subalternos não se caracteriza

16 TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO


como uma transgressão, pois é esperada pelos comandados
e reflete a posição de comando. Essa voz, usada em outro es-
paço social, poderia ser inaceitável. Sendo a voz construída e
incorporada ao longo da trajetória social, condiciona habitus
vocal. O habitus vocal é um tipo de saber prático, um tipo
de conhecimento voltado para a ação. Se esse habitus é in-
compatível com a posição ou com a situação social, o falante
estará deslocado, inadequado em seu discurso. Para o autor
a voz é indissociável do discurso e reflete a trajetória social
do indivíduo sendo passível de mudanças por intermédio de
novos encontros e novas aprendizagens.
Todos nós falamos. O uso da comunicação no cotidiano
será o mesmo em uma situação profissional? Será que ao
apresentarmos uma conferência ou quando vamos fazer um
discurso utilizamos a mesma linguagem, os mesmos recursos
vocais e gestos de quando estamos falando com nossos fa-
miliares ou amigos? O que será que torna um comunicador
melhor do que o outro? O que faz essa diferença?
A fala é aprendida de forma natural e espontânea quando,
ainda, somos pequenos. Imitamos nossos pais, mas, quando
vamos utilizá-la profissionalmente, ela passará a ser utiliza-
da com intenções específicas. Ela deve estar constituída de
ação, movimento e força, tanto em seus componentes verbais
quanto sonoros, a fim de provocar uma reação naquele que
nos escuta (BARBA e GAYOTTO, 1997). Para Pânico (2005) é
chamada de fala construída. Construir a fala não é dotá-la de
artificialidade, mas, sim, conhecendo os processos comunica-
tivos e utilizando recursos disponíveis torná-la mais eficien-
te, com naturalidade e individualidade. É fazer da expressão
oral um elemento a mais para o sucesso profissional.
A comunicação oral desempenha um papel fundamen-
tal para a aprendizagem. No binômio ensinar e aprender, o
modo utilizado pelo professor para comunicar-se, por meio
da voz, da fala, de entonações e da mímica corporal pode agir
como um facilitador ou ser um empecilho à aprendizagem.
É comum lembrarmos da voz dos nossos melhores professo-
res ou daqueles com os quais mais aprendemos. A expressão
oral sugestiona, induz, traz à consciência pensamentos que

TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO 17


estavam submersos no inconsciente e que são responsáveis
por sentimentos de prazer e desprazer em seres humanos.
Ao associarmos Fonoaudiologia e Educação, poderemos
promover um encontro de possibilidades para o fortaleci-
mento da estrutura educacional, visto que ambas preconizam
o pleno desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem,
o incentivo da cidadania crítica, a participação social ativa e
a busca de conquistas individuais e/ou coletivas em parceria
com valores éticos que culminam na formação plena do indi-
víduo e em sua qualidade de vida (FREITAS, 2005).

CARACTERÍSTICAS DE UM BOM COMUNICADOR


Nos modelos de comunicação tradicionais, temos o falante
ou quem fala, o receptor ou para quem se fala, a mensagem ou
o que se fala e os ruídos que podem interferir na comunicação.
Vamos além deste modelo, incluindo aí os meios utilizados
e as intenções do comunicador ou como se fala. A comunica-
ção oral não profissional, viabilizada mediante a voz falada,
é “a voz que se transforma em fala para realizar aqui e agora
o pensamento, é a fala impregnada pelo caráter subjetivo,
profundo de motivos, intenções, necessidades e emoções. É a
síntese da pessoa transfigurada na voz com que fala” (BRAN-
DI, 1990). Já o uso profissional da expressão oral precisa de
outros elementos que permitam ao profissional apropriar-se
do processo comunicativo conscientemente, para que pos-
sa alcançar suas intenções e interagir adequadamente com o
meio social em que se encontra.
Ao comunicador, à pessoa que se comunica profissional-
mente, é imprescindível o domínio intelectual daquilo que
pretende falar. Se não há um conhecimento amplo do assun-
to sobre o qual se vai falar, surgirão às inibições, as tensões, a
presença de pausas desnecessárias, que vão transmitir insegu-
rança a quem escuta. Adicionalmente, quem fala precisa ter
desenvolvido as habilidades lingüísticas que tornem sua fala
fluente e objetiva. São requisitos essenciais: um vocabulário
adequado ao público para o qual se fala e uma boa organiza-
ção do pensamento, o que significa ter uma linha de pensa-

18 TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO


mento que inicie o assunto, desenvolva as relações necessárias
e conclua com um fechamento da proposta inicial. Coerência
e lógica são fundamentais. A preparação prévia do conteúdo
a ser transmitido traz segurança, organiza seqüencialmente
o discurso, permite adequações prévias, auxiliando a mini-
mizar imprevistos. Uma estratégia que utilizamos em nossa
prática com professores é sugerir que preparem seu plano
de aula com antecedência, escolham os recursos audiovisuais
que utilizarão, leiam os textos que serão objetos de discussão
em sala. O preparo prévio favorece a segurança e o domínio
da situação, permitindo que ele observe melhor seus alunos
e a si mesmo enquanto fala. A expressão facial dos alunos, a
atenção e as atitudes deles em sala podem revelar o efeito da
fala do professor sobre eles e como a aprendizagem está se
realizando. Por isso, quando se organiza previamente, o pro-
fessor pode monitorar sua fala, percebendo melhor o tom, as
pausas e as modulações vocais que devem ser utilizadas. Para
os mais inseguros ou inibidos, pode-se solicitar que treinem
suas aulas antes de ministrá-las. Recurso muito importante
para os que iniciam a carreira.
O receptor vai receber a mensagem e compreende-la.
Para que esse processo aconteça, é necessário que o falante
conheça o público para quem fala e adapte seu vocabulário a
ele. Nem sempre o ouvinte estará atento ou receptivo ao que
vai ser dito. Ao escutarmos uma mensagem, estamos sempre
associando-a ao nosso contexto ou interpretando-a do modo
como gostaríamos de ouvi-la. Cabe ao falante, mediante es-
tratégias comunicativas, atrair a atenção do ouvinte e conven-
cê-lo com os seus argumentos. Quem ouve também constrói
uma imagem do falante, que poderá ser positiva ou negativa.
Behlau e Pontes (1995) explicam que é comum imaginarmos
o interlocutor pela impressão que a voz transmite. Denomi-
nam este fenômeno de psicodinâmica vocal. Através das ca-
racterísticas vocais e da fala, podemos supor a idade, o sexo,
a personalidade e o estado emocional do falante. Assim, uma
voz rouca transmite uma sensação de estresse, esgotamento;
a voz soprosa causa a impressão de fraqueza, falta de potên-
cia ou, então, pode despertar sensualidade; a voz áspera e

TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO 19


tensa confere agressividade, caráter rígido; uma voz monó-
tona não cativa o ouvinte e o falante pode ser considerado
chato; a voz infantilizada não inspira respeito e denota falta
de amadurecimento. Do mesmo modo, indivíduos que falam
com forte intensidade podem transmitir sensação de vitalida-
de e franqueza, como também, podem intimidar; já o oposto,
a intensidade fraca, gera sentimentos de fraqueza, timidez.
No binômio ensinar e aprender, percebemos que a voz
age contundentemente de forma a propiciar este processo
e, sobretudo o vínculo professor-aluno. Cabe ao professor
oferecer uma expressão oral que facilite esse dinamismo.
Glória (2003) demonstra a importância da afetividade-pro-
fessor-aluno-conhecimento, afirmando que não se trata de
adotar relações superficiais de simpatia e antipatia e nem de
concessões sedutoras, mas, sim, de uma relação sustentada
para a construção do conhecimento. A autora utiliza o con-
ceito relações intersubjetivas para designar o trabalho árduo
na construção do conhecimento por meio de obrigações e
disciplina. Em contrapartida, defende as relações dialógicas
na qual a afetividade não é o único elemento a facilitar a
aprendizagem, mas também o diálogo que, nas palavras da
autora “gera a abertura e a compreensão de si, do outro e
de suas relações recíprocas. É uma relação que se reveste
de gratidão entre pessoas que atribuem significado à própria
existência: é, por isso, relação geradora que na intersubjetivi-
dade revela intencionalidades (...)”. O professor poderá, por
meio de sua voz, influenciar o aluno a tornar-se atencioso ao
seu discurso, acessível à escuta de uma voz, que se torna um
elemento a mais para facilitar a assimilação e a construção do
conteúdo apresentado. Tal afirmativa demonstra a amplitude
da atividade do professor. Em nossas visitas a escolas e na
escuta de professores, pudemos observar que indivíduos que
recorrem a vozes em forte intensidade para disciplinar ou
falam em velocidade muito rápida queixam-se de ter turmas
bem agitadas e, às vezes, indisciplinadas. Isto nos leva a pen-
sar em como a fala do professor pode influenciar a conduta
da classe.

20 TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO


Acreditamos que o item mais importante na construção
de um bom comunicador é o modo como se fala. Incluímos
aí os recursos vocais e a preservação da saúde vocal, que po-
dem modificar a vida do professor em sala de aula.
Na produção da voz falada está envolvido o sistema res-
piratório, representado pela coluna aérea, que vai encontrar
uma barreira à sua passagem: as pregas vocais em adução.
Forma-se assim, uma pressão abaixo das pregas vocais. Ao
ultrapassar essa barreira, o ar faz vibrar a mucosa das pregas
vocais gerando o tom, a freqüência fundamental da voz. Caso
essas pregas vocais estejam hiper ou hipoaduzidas ou existam
patologias laríngeas, o tom da voz será alterado configurando
uma disfonia. Continuando o processo de produção de voz
falada, esse tom gerado na laringe é direcionado em forma
de som ao sistema ressonancial. As cavidades ressonanciais
são: rinofaringe, cavidade nasal, orofaringe, cavidade oral e
hipofaringe. Nesse trajeto, o som da voz poderá se amplificar
e projetar ou se abafar. Isso dependerá de como o indivíduo
utiliza seu foco ressonancial. Finalmente, concomitante à res-
sonância, o sistema articulador transforma o som em fone-
mas, utilizando para isso língua, lábios, dentes, abertura da
mandíbula e outros articuladores.
Nesse processo, a qualidade da voz falada, pode ser altera-
da por vários desvios de emissão, de origem comportamental
e/ou orgânica. Quando são comportamentais, não existe uma
alteração nas estruturas do trato vocal, apenas representam
manifestações, sintomas ou sinais de conteúdos submersos
de personalidade. Por exemplo, indivíduos de personalidade
rígida, de difícil adaptação às situações, podem demonstrar
esse comportamento por condutas de esforço ao falar, por
apresentar vozes ásperas ou pela intensidade forte. Ressal-
tamos que, na maior parte das vezes, o professor não tem
conhecimento desta conduta (GARCIA, 2000). Outras vezes
são desvios provocados pela interação de situações viven-
ciais pouco favoráveis, exigências do meio externo. São os
indivíduos que, por necessidade do trabalho adotam vozes
de altura tonal mais grave e intensidade mais forte do que
normalmente utilizariam. As retenções respiratórias provo-

TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO 21


cadas por estados de ansiedade ou de estresse podem levar o
indivíduo à não liberar o ar adequadamente durante a fala,
gerando voz com esforço e tensão ou sem a adequada pro-
jeção. O estresse pode ser responsável pela emissão vocal
com esforço, pela intensidade vocal forte ou muito fraca, pela
velocidade de fala rápida e por outros tantos problemas de
qualidade da voz. Já as desordens orgânicas e/ou de saúde
física, podem ser causadas por crises freqüentes de alergia,
que levam a abafamento da sonoridade e diminuição da pro-
jeção vocal (CORSI, CASTRO, ANTILA e BEHLAU, 2001) ou
ainda por outros problemas de saúde, como cardíacos e gás-
tricos, pelo uso de medicamentos e por problemas posturais
(BEHLAU e PONTES, 2001).
No caso dos professores, o nódulo é a patologia mais co-
mum das pregas vocais. A formação de um nódulo não é
imediata. Existem sinais e sintomas na conduta de emissão
que, quando percebidos precocemente, podem evitá-los. Na
formação dos nódulos é comum inicialmente encontrarmos
o professor queixando-se de cansaço vocal ou leve ruído na
voz, ao final da semana de trabalho. Se ele procura um fono-
audiólogo ou médico, nesse período, é muito provável que,
após tratamento rápido e/ou aconselhamentos, o problema
regrida. Se isso não acontece, teremos uma segunda etapa na
evolução dos nódulos, caracterizada pela permanência quase
constante, ao final de um dia de trabalho, das queixas acima.
Esse quadro irá evoluindo para perdas temporárias da voz,
podendo chegar à afonia, que é a ausência da voz (GARCIA,
2002; FAWCUS, 2001). A grande maioria dos professores só
procura auxílio quando já perdeu a voz ou já tem uma pa-
tologia na prega vocal. Quando lidamos com esses profissio-
nais, que fazem intenso uso da voz falada, o conhecimento
dos fatores de prejuízo à emissão e suas interferências sobre
a voz são ainda mais importantes. A qualidade da voz do
professor é uma questão primordial para a qualidade de vida
deste profissional, assim como para a aprendizagem de seus
alunos (REINHOLD, 1996).
Outra característica importante que deve estar presente
em um bom comunicador é a entonação. Resultado da in-

22 TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO


teração entre fenômenos acústicos da voz falada, realizam-
se pelas variações do tom e da intensidade da voz e pela
velocidade da fala durante a emissão, proporcionando uma
certa melodia, a modulação ou prosódia da fala. Uma voz
com tom mais agudo e intensidade mais forte pode chamar
a atenção dos alunos, mas não poderá ser usada constante-
mente, pois induz ao cansaço vocal. Diminuir a intensidade
e falar mais pausadamente pode ter o mesmo efeito e ser
um excelente recurso para explicar conceitos novos. Servi-
lha (2000) analisou a voz de professores em sala, de aula,
buscando identificar modos pelos quais as variações das ca-
racterísticas vocais participariam da mediação pedagógica.
Concluiu que tanto os professores quanto os alunos utilizam
mudanças na qualidade da voz para estabelecerem um jogo
interativo facilitando a aprendizagem. Observou que as mo-
dulações da voz do professor buscam organizar ocorrências
da sala de aula e obter a atenção do aluno, e que diferentes
modulações são empregadas dependendo do objetivo a ser
atingido. Nesse jogo dialógico, as entonações de professores
e alunos convidam, afastam, aproximam, concordam e dis-
cordam, questionam e fazem acordos para viabilizar a aula e
a aprendizagem dos conteúdos didáticos.
Utilizar uma articulação precisa facilita a projeção da voz
no ambiente e evita esforço, além de ser fator fundamental
para a compreensão da mensagem. Marcar as palavras de va-
lor ou dar ênfase diferente a determinadas partes do discurso
são recursos fundamentais para atrair ou manter a atenção do
ouvinte. Servem também para marcar conceitos na explana-
ção e diferenciar assuntos. Todas essas técnicas são utilizadas
nos treinamentos de profissionais, oferecendo-lhes recursos
para a eficiência comunicativa.
O corpo também fala. As expressões corporais são funda-
mentais na construção de um bom orador. Gestos manuais,
mímicas faciais e até o modo como andamos também trans-
mitem sentimentos e constroem a imagem de quem fala. É
comum percebermos o medo de um orador pela força com
que segura o microfone ou pela postura que adota ao falar.
A postura corporal e os gestos utilizados como complemento

TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO 23


da mensagem tanto podem visar à facilitação da aprendiza-
gem, como também podem prevenir dores nas costas e mi-
nimizar o cansaço corporal. Evitar falar enquanto está escre-
vendo no quadro, procurar sentar-se com o eixo retificado,
evitar curvar-se sobre as mesas baixas, realizar alongamentos
rápidos, durante a aula, nas regiões de pescoço e ombros
são exemplos práticos que podem ser altamente preventivos
quer para a voz, quer para a saúde geral do professor (DRA-
GONE, 2000).
Acreditamos que é por meio do diálogo, essa troca da qual
a comunicação oral é o alicerce e deve estar sempre presente,
que se realiza o processo ensino-aprendizagem, bem como
a relação docente-discente. Encontramos na visão psicana-
lítica (KUPFER apud AQUINO, 1996) a explicação da com-
plexidade e importância da relação professor-aluno, em cuja
interação a voz tem papel coadjuvante. Os autores tecem a
seguinte consideração:
Operando uma extensão dos conceitos psicanalíticos
ao campo educacional, destaca-se o caráter inexo-
ravelmente relacional do encontro pedagógico (...)
Não há ensino sem o professor porque aprendizagem,
em qualquer circunstância, pressupõe a autoridade.
Portanto, a relação professor-aluno seria condição
imprescindível do ensino. A noção de transferência
– pedra angular do processo psicanalítico – nos re-
mete ao processo entre pais e filhos, correlato à rela-
ção professor-aluno.

Os autores mostram que essa transferência acontece me-


diante a admiração, o respeito e a união que são transferi-
dos da figura do pai para o professor. Os professores podem
se tornar figuras para quem serão endereçados os interesses
e desejos do aluno porque são objetos de uma transferên-
cia. Mrech (1999) alerta que a transferência é um fenômeno
freqüente, podendo acontecer a todos os sujeitos e que as
relações professor-aluno fundamentam-se de acordo com as
relações afetivas, cujos alicerces formam-se a partir de con-
teúdos oriundos da transferência positiva (relação de amor e

24 TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO


aceitação) ou negativa (relação de ódio, afastamento, rejei-
ção, desrespeito, ataque). Reforça ainda que o conhecimento
da transferência surge nos estabelecimentos de ensino para
identificar as relações familiares que os alunos comumente
transportam para o contexto escolar. Tricoli (2002) explica
que o professor é um elemento imprescindível na dinâmica
educacional, cuja voz poderá favorecer e conduzir esse pro-
cesso de aproximação e construção da aprendizagem. Em
suas palavras:
O professor na escola tem uma função muito impor-
tante em relação aos alunos, pois seu contato é direto.
Este auxilia na solução de problemas, é um amigo,
confidente, substituto da mãe e do pai, por fim, é um
transmissor de informações.

Procuramos entrelaçar a visão da psicanálise sobre a


transferência para a melhor compreensão da importância da
psicodinâmica da voz no processo ensino-aprendizagem. En-
fatizamos que, mediante um trabalho de aprimoramento da
expressão oral do professor, pode-se estimular e facilitar o en-
sino para os discentes, bem como contribuir na relação pro-
fessor-aluno (DRAGONE, 2000; SERVILHA, 2000). Portanto,
no momento de explanar o conteúdo, a expressão oral deve
ser lembrada como recurso que facilita ao professor conven-
cer e aproximar o aluno, proporcionando-lhe o aprendizado
e estimulando-o quanto à necessidade de desbravar novos
caminhos de conhecimento.

DOCÊNCIA, QUALIDADE DE VIDA E SAÚDE VOCAL


A docência encontra-se inserida no rol de profissões que
necessitam da comunicação oral, para que os docentes de-
sempenhem plenamente suas funções. As anormalidades na
qualidade vocal no professor contribuem desfavoravelmente
para seu desempenho ocupacional, o que configura um abalo
na performance de ensinar (HERMES e NAKAO, 2003). Até a
década de 1990, eram poucos os estudos sobre as condições
do trabalho docente no Brasil. Os professores somam dois

TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO 25


milhões de trabalhadores, na sua maioria mulheres, capaci-
tadas para sua função, porém acometidas por patologias que
afetam seu trabalho e sua qualidade de vida, definida como
a autopercepção do indivíduo sobre seus objetivos, expecta-
tivas, padrões e preocupações relacionados ao contexto da
cultura e aos sistemas de valores em que vive (Grupo WHO-
QOL, 1998). Nos últimos anos, a Fonoaudiologia tem pro-
curado pesquisar os problemas de voz nos professores como
um processo relacionado também ao cotidiano e à qualidade
de vida. Vários estudos têm demonstrado que as relações en-
tre os eventos sócio-ocupacionais interferem na qualidade de
vida e da voz.
Grillo e Penteado (2005) pesquisaram o impacto da voz
na qualidade de vida de 120 professores de ensino funda-
mental de escolas públicas. Revelam que a maioria dos pro-
fessores pesquisados são mulheres, têm uma carga horária
elevada, com média de 32 horas/aula semanais, e que, por
serem mulheres, acumulam as funções domésticas e docen-
tes, redobrando a demanda vocal. Apesar de a maioria dos
entrevistados avaliarem sua voz como de boa qualidade, en-
frentam dificuldades para falar forte em ambientes ruidosos
e o ar acaba rápido, precisando se reabastecer várias vezes
enquanto fala.
Delcor e cols. (2004) descreveram as condições de traba-
lho e saúde dos professores da rede particular de ensino da
cidade de Vitória da Conquista na Bahia. Foram coletadas
informações de 250 professores de 10 escolas. As queixas de
saúde mais freqüentes estavam relacionadas à postura cor-
poral, à saúde mental e as relacionadas à voz. A prevalência
de Distúrbios Psíquicos Menores (DPM) estava fortemente
(41,5%) associada a longos períodos de intensa concentra-
ção em uma mesma tarefa e volume excessivo de trabalho,
evidenciando desgaste psicológico do educador. As queixas
relacionadas à postura corporal foram dor nos braços/om-
bro (52,1%), dor nas costas (51,4%) e dor nas pernas/formi-
gamento (47,5%). Quanto aos problemas relacionados ao uso
da voz 45,7% referiram-se a dor na garganta, 92,6% ao uso
intensivo da voz, 62,3% cansavam-se para falar e 57% faziam

26 TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO


força para ser ouvidos. Casos de rouquidão nos últimos seis
meses foram citados por 59,2% dos professores.
Penteado (2003) investigou as relações entre qualidade de
vida e saúde vocal de professores. Os resultados demonstram
que a qualidade de vida global é regular. Os aspectos da qua-
lidade de vida mais comprometidos são: as condições e a
organização do trabalho docente, como levar trabalho para
casa, a falta de recursos audiovisuais e a disciplina dos alu-
nos; as condições salariais insuficientes para cobrir as neces-
sidades pessoais e profissionais, o que leva o professor a ter
dois ou mais empregos e não permite que ele se atualize na
compra de material ou em cursos; o desgaste físico e psíquico
ocasionado por dupla/tripla jornada, o trabalho em casa, a
desvalorização do trabalho docente, o baixo reconhecimento
social dado à profissão e as relações sociais no trabalho. O
impacto da voz na qualidade de vida foi considerado bom,
apesar dos resultados indicarem problemas com resistência
vocal, projeção da voz em sala, intensidade fraca e dificulda-
des na coordenação pneumofônica.
Freitas (2005) revela que os professores assumem traba-
lhar por 12 horas, com uso intenso da voz, o que nos leva
a reforçar que a profissão pode proporcionar um alto nível
de desgaste físico, repercutindo em sua voz – seu suporte de
trabalho.
Outro dado a ser destacado, segundo Codo e Menezes
(2002), é que o professor vive sob uma administração insen-
sível às questões profissionais do docente. Além das atribui-
ções naturais da docência, o professor deve fazer trabalhos
administrativos, como matrículas, aulas extras de recupera-
ção, relatórios, participar de reuniões, reciclagens, zelar pelo
recreio e merenda, e ser responsável pelas falhas e insucessos
advindos desse processo. Nesse particular, ressaltamos a con-
sideração de Leiter e Maslach (1999) ao afirmar que “quando
um ambiente organizacional é insensível aos indivíduos, as
suas aspirações, as suas limitações e a maneira como traba-
lham, o desgaste físico e emocional crônico é o resultado ine-
vitável”.

TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO 27


A Organização Pan-Americana de Saúde e a Organização
Mundial de Saúde advertem que o ruído pode gerar interfe-
rências no trabalho, no descanso, no sono e, sobretudo, na
comunicação dos seres humanos, podendo abalar a audição
e proporcionar reações psicológicas, fisiológicas e até pato-
lógicas (FIORINI, 2004). Em um ambiente ruidoso, temos a
tendência de tentar superar este ruído elevando a intensida-
de e o tom da voz. Esse fenômeno físico é chamado de Efeito
Lombard. O professor, ao conviver em um espaço de polui-
ção sonora, poderá alterar seu padrão vocal para conseguir
superar o ruído da classe. Quando isto é realizado com esfor-
ço, sem conhecimento da técnica adequada e sem um bom
suporte respiratório acabará sacrificando o aparato fonador,
pelo esforço vocal exercido. A avaliação audiológica em pro-
fessores é essencial para aferir o funcionamento das compe-
tências auditivas que automaticamente contribuem para o
dinamismo do processo comunicativo. Entretanto, outro as-
pecto a ser considerado é na acústica da sala de aula. Freitas
(2005) cita que 23% dos professores entrevistados conside-
ram que a acústica de suas salas não favorece a voz, levando-
os a aumentar a intensidade vocal para melhor entendimento
do discurso. Segundo Garcia (1996), as dimensões e forma
das salas de aula deveriam ser projetadas para contribuir
com as condições de reflexão, reverberação e inteligibilidade
perfeita do som ou das palavras. É comum, além do ruído
interno da classe, encontrarmos ruídos externos, provenien-
tes de corredores, de pátio e até de lanchonetes, por onde
circulam muitas pessoas. Enfatiza ainda que “a engenharia
moderna vem se preocupando cada vez mais em harmoni-
zar as construções com os aspectos de saúde dos indivíduos.
Mas é comum verificarmos que os problemas relacionados à
acústica de salas de aula por vezes ficam negligenciados”. So-
brinho (2002) aponta que no trabalho docente não deveriam
ser esquecidos o mobiliário escolar, a iluminação das salas de
aula, o isolamento acústico, o nível de ruído e a temperatu-
ra ambiente, porque esses aspectos podem contribuir para a
qualidade de vida no trabalho.

28 TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO


A falta de repouso adequado é vista como colaboradora
para ocorrência da fadiga vocal, já que o ato de falar requer
uma energia significativa (SAPIDR, KEIDER e MATHER-SCHI-
MIDT, apud BEHLAU e PONTES 2001). Um organismo neces-
sita, em média de 8 horas de sono por noite para recuperar
as energias. É importante que o professor respeite seu orga-
nismo, favorecendo assim a redução de sintomas de fadiga
vocal ocasionada pelo dia de trabalho e contribuindo para a
saúde geral e da voz. Reinhold (1996) relata que os sintomas
de estresse mais freqüentes na avaliação dos professores são
o desgaste físico e mental ao fim de um dia de trabalho; a ten-
são de lidar com os alunos diariamente causando ansiedade,
nervosismo, exaustão física e dores nas costas.
Carlotto e Palazzo (2006) reportam que, tanto na natu-
reza do trabalho do professor quanto no contexto no qual
ele exerce suas funções, existem diversos agentes estressores,
que se persistirem, podem levar à Síndrome de Burnout, ca-
racterizada por sinais e sintomas de exaustão física, psíquica
e emocional, em decorrência da má adaptação do indivíduo
a um trabalho prolongado, altamente estressante e com gran-
de carga tensional. Acompanha-se de um sentimento de frus-
tração em relação a si e ao trabalho. Em seu estudo, revelam
que os estressores associados ao Burnout em professores, são
o mau comportamento dos alunos em sala, a falta de partici-
pação nas decisões institucionais e as expectativas familiares
em relação ao trabalho docente. Explicam que com a modi-
ficação na dinâmica familiar e o aumento do trabalho femi-
nino, os pais delegaram parte da função educativa à escola e
aos professores, sentindo-se desobrigados de educar em casa.
Grillo e Penteado (2005) explicam que o impacto do desgas-
te vocal na qualidade de vida e do trabalho ainda é pouco
percebido pelos professores e que são necessárias ações que
levem em conta a relação entre voz e qualidade de vida.
As profundas transformações no mundo do trabalho têm
sido marcadas por uma deteriorização crescente da qualidade
de vida nos diversos ambientes do trabalho humano. Conse-
qüentemente, estas mudanças abalam o mundo, o trabalho e
o trabalhador, refletindo-se no contexto social e econômico

TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO 29


mundial das últimas décadas. Os estabelecimentos de ensino
sofrem um impacto direto dessas mudanças, produzindo efei-
tos perversos na vida dos professores (GOMES, 2002). Existe
uma necessidade urgente de o sistema educacional buscar a
qualidade de vida no trabalho do professor, mediante ações
multiprofissionais, que se refletirirão na dimensão do ensino-
aprendizagem. Nakao e Hermes (2003) reforçam que “entre
os problemas vocais, a disfonia apresenta-se como sintoma
comum no cotidiano do professor (...) Os problemas vocais
possuem relações estreitas com as condições de trabalho do
professor”.
A ergonomia integra os conhecimentos fisiológicos e
psicológicos para estudar o homem inserido no seu ofício,
buscando familiarizar-se com elementos críticos que descon-
figurem sua saúde e segurança no trabalho, para que assim
construam-se recomendações de melhoria das condições de
trabalho, respeitando e desenvolvendo instrumentos pedagó-
gicos para resguardar e qualificar os trabalhadores (ANTUNES
e ASSUNÇÃO, 2003). Seguindo esse prisma, pensamos que,
como medida ergonômica, os estabelecimentos de ensino
poderiam disponibilizar ao professor, o uso de amplificação
sonora, a fim de contribuir para a sua saúde vocal. Figueire-
do (2004) por meio da Legislação Brasileira (Direito do Tra-
balho), Seção IV, art. 166, elucida que “a empresa é obrigada
a fornecer aos empregados, gratuitamente, equipamento de
proteção individual adequado ao risco, em perfeito estado de
conservação e funcionamento (...) contra riscos de acidentes
e danos à saúde”. Podemos classificar como medida ergo-
nômica, que estrategicamente contribui para a qualidade de
vida do professor, o uso de microfones e amplificadores auxi-
liando na preservação da saúde vocal (MARTIM, 2004).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Embora as novas tecnologias e recursos educativos possam
oferecer oportunidades e caminhos diversos para a aprendiza-
gem, a comunicação oral, por meio da voz e da fala, exercerá
sempre o domínio no lecionar, pois é o diálogo que nos permi-

30 TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO


te expressar nossos pensamentos e sentimentos, construindo
assim as relações psicossociais necessárias à evolução humana
e, principalmente, ao ofício do professor. Técnicas e estraté-
gias utilizadas na expressão oral podem propiciar condições
de assimilação para o processo ensino-aprendizagem, tornan-
do a comunicação da mensagem um elemento de socialização
do saber e da produção do conhecimento. A sinergia em prol
da aprendizagem faz-se presente mediante o diálogo, em um
encontro infinito de possibilidades, levando a descobertas e
ao crescimento intelectual. Para tanto este diálogo requer uma
relação presencial e confiante entre os envolvidos, na qual a
troca de experiências e elaborações fundamenta-se pela ex-
pressão oral. Desenvolver programas de atenção à saúde da
voz e de aperfeiçoamento da expressão oral devem ser as me-
tas da Fonoaudiologia e precisam focar não só o profissional
que já está atuando, como também aqueles que ainda estão em
formação. Julgamos que a preparação da comunicação dos fu-
turos professores poderá reduzir os afastamentos e insucessos
na carreira dos docentes.
À Fonoaudiologia cabe entender que os problemas vocais
encontrados em professores devem ser vistos em uma pers-
pectiva dinâmica, que leva em conta o trabalho, o cotidiano,
a saúde física e psíquica e a teia de relações sociais que envol-
vem o ser professor. Essas alterações não podem ser compreen-
didas em sua gênese somente como resultado de condições
biológicas e ambientais, mas sim como o resultado de um
contexto histórico e social. As condições das escolas quanto à
disciplina, à organização pedagógica, às relações entre patrão
e empregado e entre pais, professores e direção, e às condi-
ções salariais são alguns pontos que podem estar levando os
professores a se desestruturarem tendo repercussões na vida
pessoal, profissional e também na sua voz.
Acreditamos que a abordagem à comunicação oral do
professor deva ser realizada por meio de equipes multiprofis-
sionais, posto que não cabe mais uma visão reducionista das
alterações vocais, entendendo-se que elas podem ocultar um
vínculo das relações do indivíduo com o trabalho. É necessá-
rio que pensemos na saúde do professor de forma humanísti-

TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO 31


ca com uma proposta não só de saúde vocal, mas também no
âmbito das relações de trabalho e sociais.

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34 TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO


A HUMANIZAÇÃO PELA EDUCAÇÃO
Considerações sobre a gravidez
na adolescência e a violência
no ambiente escolar
Lílian Conceição Xavier Cardozo
Débora Alessandra de Souza

A necessidade de localizar qual a real tarefa da escola e de


criar estratégias para colocar em prática esses objetivos vem
mobilizando muitos profissionais, promovendo discussões e
reflexões em todo mundo. Redefinir as finalidades da escola
é fundamental, quando buscamos uma educação que ofereça
respostas eficientes à crise em que se encontra nossa socie-
dade. Ao longo dos anos, a escola vem sendo apresentada
como um espaço de produção de conhecimentos, educando
pessoas para que vivam bem. Assim, para que a escola con-
siga cumprir o seu papel, é preciso estabelecer um padrão
de linguagem que respeite a subjetividade de seus alunos
(CALDART, 2002). O olhar diferenciado, buscando estabe-
lecer uma ponte entre os conteúdos escolares e a realidade
cotidiana dos alunos, vem sendo apresentado como forma
humanizada de construir uma escola participativa, atenden-
do às necessidades da clientela assistida.
O termo Humanização tem sido utilizado com freqüência
em vários segmentos de nossa sociedade. É considerado a
base de um conjunto de objetivos de ação ampla mas, não
tem uma definição única e consensual. Geralmente, desig-
na a forma de atenção que valoriza o acolhimento, o respei-
to à individualidade e a comunicação. Segundo Deslandes
(2004), a comunicação é o principal viés humanista, pois é
por meio dela que se estabelecem as relações, possibilitando

35
expressões de sentimentos que necessitam ser reconhecidos
e compreendidos, indo assim contra a violência, já que esta
representa o oposto do diálogo, caracterizando a negação
do outro. Podemos então, caracterizar a humanização como
a oposição à violência, seja física, psicológica ou simbólica,
que se apresenta pela dor de não ter a compreensão de suas
demandas e expectativas.
A busca pela humanização nas escolas não considera so-
mente as necessidades dos alunos, mas, junto a esta preocupa-
ção se destaca a importância do cuidado com os profissionais
e funcionários, promovendo a humanização, também, nas
relações de trabalho. Para que este processo seja legitimado,
é preciso uma reflexão coletiva sobre a visão de mundo e de
sua identidade, sendo considerada uma questão de atitude e
não pode ser identificada somente pelo que se sabe, mas sim
como se utiliza o saber.
A escola deve assumir a tarefa de fortalecer a auto-estima,
respeitando os direitos, a subjetividade e a cultura de seus alu-
nos, ajudando a construir e fortalecer identidades, desenhar
rostos e formar sujeitos críticos e participativos. É urgente
a necessidade de reflexões sobre a tarefa que cabe à escola,
quais os saberes especificamente escolares que podem ajudar
na produção e apropriação cultural de seus alunos. Questio-
namentos constantes se levantam sobre a formação integra-
dora e humanizada que a escola se propõe. Para isso, destaca
Calvart (2002), a escola não pode ceder ao isolamento insti-
tucional, tornando-se alheia às necessidades de seus alunos.
É preciso identificar as possíveis contradições entre o que
esperam os alunos e professores e o que conseguem fazer.
A educação é um processo de apropriação da realidade,
que propõe o enfrentamento de desafios, descobertas de no-
vas possibilidades de transformação e revalorização da reali-
dade. Neste sentido, o indivíduo pode compreender seu pre-
sente, assumir e conduzir sua história. A escola é um espaço
que recebe uma diversidade expressivo de pessoas, dentre
elas um número muito grande de adolescentes. Assim, seu
currículo necessita ser construído com temas que apontem
para a realidade de sua população, escolhidos após um diag-

36 Lílian Conceição Xavier Cardozo e Débora Alessandra de Souza


nóstico do perfil da clientela assistida e que façam parte de
seu universo, tornando possível a interação dos alunos no
cenário escolar.
Portanto, destacamos neste capítulo temas que, segundo
dados do IBGE (2000), são constantes no universo escolar e
apontam para a urgência em conhecer e responder à nova re-
alidade social em que estamos inseridos, criando estratégias,
habilidades e procedimentos que favoreçam uma readapta-
ção dos conteúdos curriculares para que as demandas sejam
respeitadas, principalmente quanto aos adolescentes que pos-
suem características muito específicas e a minimização da vio-
lência se torne possível, caminhando a partir disso, para uma
escola humanizada que tenha o intento de atender e auxiliar as
necessidades detectadas em nossos alunos e professores.
Visualizamos então a importância de discorrermos sobre
o que vem a ser violência e como a mesma é percebida no
cenário escolar, bem como a compreensão dos aspectos que
envolvem estar grávida sendo adolescente. Acreditamos que
o conhecimento sobre os aspectos que envolvem estes fenô-
menos possibilitará ações humanizadas e integradoras dentro
do universo escolar.

VIOLÊNCIA NO CENÁRIO ESCOLAR


A violência é hoje o grande fantasma que assombra a existên-
cia do ser humano, desestabilizando toda a sociedade. Acon-
tecem intermináveis debates, discussões e questionamentos,
posto que, a insegurança e o pânico têm se instalado freneti-
camente no cotidiano, fazendo com que o indivíduo se torne
cada vez mais refém do seu próprio medo, ficando impedido
de vivenciar sua própria liberdade.
A vida urbana mudou de um pólo a outro, o que revela
a instalação de um conflito social e também individual, já
que muitas vezes o indivíduo se violenta e é violentado pela
sociedade (SOUZA, 2005).
O momento social em que vivemos nos coloca diante de
uma multiplicidade de escolhas, com as mais diversificadas
possibilidades em torno de nós mesmos e do mundo. Ques-

A HUMANIZAÇÃO PELA EDUCAÇÃO 37


tões como o crescimento industrial e tecnológico, a integração
de diversas culturas, as diferentes concentrações de renda, a
diversificação religiosa, o culto ao corpo, o consumismo, as
várias organizações familiares e as mudanças nos aspectos
éticos e morais revelam uma modificação estrutural e tam-
bém existencial da sociedade e do próprio indivíduo.
Com o aumento da violência, ambientes que anterior-
mente julgávamos protegidos (lar, escola, shopping e outros)
também vêm sendo abalados, tornando-se difícil encontrar
um espaço onde a mesma não tenha se instalado.
Com isso, muitas vezes percebemos a violência escolar,
como reprodução da violência social já que não temos como
considerá-la de forma parcial, estanque da situação viven-
ciada pela atual sociedade. Em contrapartida, podemos vi-
sualizar o ambiente escolar também como gerador de sua
própria violência e, por isso, necessitamos buscar meios de
minimizá-la, pelo menos nesse espaço estrutural.
A instituição escolar não pode ser vista apenas como re-
produtora das experiências de opressão, de violência e de
conflitos do plano macroescutrutural. É importante argumen-
tar que, apesar dos mecanismos de reprodução sociocultural,
as escolas também produzem sua própria violência e sua pró-
pria indisciplina (GUIMARÃES apud AQUINO, 2000).
Assim, observamos que as eclosões de violência no cená-
rio escolar envolvem aspectos externos e internos, tornando-
se difícil delimitá-los.
Muitas vezes as depredações estão relacionadas com a di-
ficuldade de o aluno sentir-se alguém reconhecido e respei-
tado pela sociedade. Vendo-se fora do contexto social, sente-
se então marginalizado. Com isso, ao depredar esse espaço,
passará a se reconhecer, a se perceber e a fazer com que os
outros o enxerguem e o percebam como indivíduo integran-
te da escola e da sociedade.
Quebra-quebra é um grito e tem como objetivo... obter
um reconhecimento por meio deste ato violento, que
anuncia a voz daqueles indivíduos destituídos, que
as elites consideram de segunda classe (DA MATTA
apud LUCINDA e Col., 2001).

38 Lílian Conceição Xavier Cardozo e Débora Alessandra de Souza


Vale ressaltar, que de acordo com cada momento histó-
rico, haverá diferentes definições e entendimentos do que é
violência. Na atual sociedade, é possível pensá-la e senti-la a
partir dos danos físicos e psicológicos que causa na existência
do indivíduo, pois é na atualidade que o indivíduo passa a
existir como sujeito, sujeito esse que pode ser contextualiza-
do e conceituado diante do mundo e sobre o qual se pode
e se deve pensar. Por isso, torna-se crescente a necessidade
de pensar, repensar, refletir, discutir, falar, indagar e tentar
compreender os conflitos da humanidade.
Necessitamos entender que sujeito vem sendo produzido,
fruto das atitudes violentas. Que desejo de destruição é esse?
Por que o aniquilamento do outro e de si mesmo, vem se
manifestando em sua linguagem cotidiana?
Segundo Costa (2003) violência é o “emprego desejado
de agressividade com fins destrutivos. Esses podem ser vo-
luntários, deliberados, racionais e conscientes, ou podem ser
inconscientes, involuntário e irracional” (p. 39). Pode-se en-
tender que, para uma situação ser considerada violenta deve
existir o propósito de destruição.
Dentro do espaço escolar percebemos essa destruição e
agressividade não somente pelas brigas e depredações, mas
também nas relações professor-aluno e no próprio sistema
educacional.
“A educação escolar, produz regimes de representação do
mundo que visam obter o consenso em torno dos interesses
hegemônicos em uma dada sociedade” (COSTA, 2003:93).
Sendo assim, apreendemos que a escola busca universalizar
e normatizar pensamentos e conhecimentos conforme com
uma determinada classe. Podemos então concluir que, se a
escola universaliza e normatiza de acordo com seus interes-
ses, os que não fazem parte da classe que a fundamenta tor-
nam-se excluídos, porque são “forçados” a absorver concei-
tos e conhecimentos que não fazem parte da sua realidade. E
assim o indivíduo perde sua identidade, não se reconhecen-
do dentro desse ambiente, seus gostos, seus interesses, seus
desejos passam a não existir, ficando à margem do ensino
proposto. Observa-se, portanto, um desprezo e indiferença,

A HUMANIZAÇÃO PELA EDUCAÇÃO 39


pela experiência e conhecimento trazido pelo aluno perten-
cente a cada prolongamento social. Logo, depreendemos
que a depredação, o vandalismo, o desrespeito, as agressões
físicas, verbais e simbólicas, constituem um protesto instituí-
do no âmbito escolar, para reivindicar a própria existência e
o reconhecimento como sujeito nesse espaço e na sociedade.
Deste modo, visualizamos uma violência velada dentro do
espaço escolar.
Se não atentarmos contra a vida alheia de modo
explícito, podemos fazê-lo de modo indireto, por
exemplo, violando a integridade alheia, por meio de
constrangimentos velados ou uma infinidade de mi-
croagressões sacralizando, assim, as protagonistas da
ação escolar. Ou então, mais indiretamente ainda,
corrompendo e sabotando a auto-estima a autocon-
fiança do outro, fazendo-o se sentir inadequado, in-
capaz, impostor (AQUINO, 2000:164-5).

As expressões faciais, o tom de voz, o toque físico e o pró-


pria organização do sistema escolar são linguagens que mui-
tas vezes transmitem ao aluno uma violência simbólica, que
o mesmo não consegue decodificar conscientemente. A pró-
pria estrutura escolar, com suas regras e rotinas atendendo a
interesses da hegemonia, transmite e instaura uma violência
simbólica. Entretanto, esta nem sempre compreendida pelo
aluno, pois esse só reconhece a violência quando há agressão
ou dano físico, ocasionando dor ou sofrimento. Dificilmente
o dano emocional causado por uma atitude do professor ou
de outro agente do espaço escolar é reconhecido como ação
violenta.
Toda imposição de enunciados sobre o real que leve
a criança a adotar com referencial exclusivo de sua
orientação no mundo à interpretação fornecida pelo
detentor do saber. O indivíduo cronifica a posição de
dependência e perde a capacidade de criar seu próprio
elenco de significados. O funcionamento mental do
sujeito simbolicamente violentado na infância torna-
se inibido, paralisado e/ou distorcido, em maior ou

40 Lílian Conceição Xavier Cardozo e Débora Alessandra de Souza


menor extensão, conforme a natureza e a intensidade
da violência (COSTA, 2003:97-8).

Destacamos aqui a adolescente grávida, que vivencia co-


tidianamente a violência verbal, e a simbólica na escola e
também no espaço macrossocial. A partir do momento em
que as escolas de hoje não se estruturaram para absorver essa
demanda populacional, não criando estratégias para que a
adolescente grávida possa permanecer estudando durante
e após a gestação, detectamos, uma exclusão velada, confir-
mando uma violência simbólica.
Com isso, reforçamos a necessidade de estarmos atentos aos
mecanismos que envolvem o processo de aprendizagem escolar
e buscamos meios para lidar com a diversidade de aconteci-
mentos, mesmo cônscios de que isso não será o bastante.
Não queremos, com isso, acusar somente o professor, nem
sobrecarregá-lo de responsabilidades diante desse fenômeno,
mas esclarecer que é preciso estar atento ao cotidiano escolar
e às relações estabelecidas entre seus protagonistas e agentes
e, principalmente quanto às posturas que são tomadas pelos
mesmos. Acreditamos na dualidade desse fenômeno, tanto
o professor quanto o aluno são fontes de explosões ou im-
plosões agressivas, descarregando no outro, suas frustrações,
seus medos, suas angústias e insatisfações. “Os professores
conhecem bem os impulsos agressivos de seus alunos, sejam
latentes ou manifestos, e às vezes se vêem obrigados a en-
frentar explosões agressivas ou uma criança que é agressiva”
(WIUNICOTT, 1999:94).
Notamos, por conseguintes, que a violência não é unilate-
ral, porque encontra-se presente em todo sistema educacio-
nal, de todos os lados e por todos os ângulos. Por isso, torna-se
importante buscar meios para minimizá-la dentro do cenário
escolar e, conseqüentemente, na sociedade. É imprescindível
que a escola seja um lugar de reflexão sobre si mesmo e do
outro e, que não só o aluno, mas também o professor e to-
dos os protagonistas e agentes desse espaço possam exercitar
sua atuação e posturas éticas. Somente dessa forma, a unila-
teralidade dos discursos será banida e cada qual poderá se

A HUMANIZAÇÃO PELA EDUCAÇÃO 41


perceber como responsável e co-responsável pelo processo
educacional. Conforme menciona Costa (1997:62):
Sem um esforço para conceber novas formas de rela-
ções familiares; novas modalidades de relações afeti-
vas, sexuais e amorosas; novos estilos de convivência
e sociabilidade, novas atitudes diante do progresso
científico-tecnológico; novas posturas diante da trans-
missão do saber e da tradição cultural democrático-
humanista que é a nossa, dificilmente vamos poder
produzir o encantamento necessário a ação transfor-
madora capaz de restituir a figura do próprio sua
dignidade moral. O caminho é longo e penoso.

Assim, o resgate dos valores éticos, o respeito à individua-


lidade, à singularidade, o abandono do discurso defensivo, o
olhar para si e para o outro são fatores favoráveis a retomada
de um ambiente escolar menos agressivo. A escola precisa
rever suas posturas. Atualmente, ela não pode ter uma atu-
ação apenas conteudista, distante da realidade inerente ao
aluno. É preciso renovar e ampliar sua visão e a atenção for-
necida a sua clientela, sem com isso se tornar paternalista.
Complementamos essa questão com o que é dito por Ortega
e Del Rey (2002:27):
A escola vai além de um cenário de instituição, um
âmbito de convivência, cada vez mais é preciso en-
tender que seus efeitos não devem se limitar a saberes
concretos, mas que se necessita também estar atento
para seus efeitos na formação geral da personalidade
individual e social de seus protagonistas e agentes.

Podemos, portanto, questionar esse universo escolar que


muitas vezes com sua estrutura, seu conteúdo e seu planeja-
mento, impossibilita adolescentes grávidas de permanecerem
estudando e participando de atividades na escola. Ressalta-
mos, a necessidade de realizar uma prática escolar que fun-
cione, diminuindo o número de evasão e desinteresse dessas
adolescentes, no momento que mais necessitam de esclareci-
mento, informação.

42 Lílian Conceição Xavier Cardozo e Débora Alessandra de Souza


Reforçamos então a necessidade de reestruturação da es-
cola, para que nenhum indivíduo se sinta deslocado, à mar-
gem ou excluído. Entendemos que essa tarefa não é fácil,
porém como dito anteriormente, é urgente que a escola se
modifique para atender à diversidade de demandas trazidas
pelo indivíduo da atual sociedade.
Visualizamos nessa direção, os parâmetros curriculares
nacionais discorrendo em torno dos pontos aqui dimensio-
nados, trazendo a possibilidade de a escola trabalhar o posi-
cionamento ético, tirar a cidadania do papel e fazer do sujeito
um agente transformador do ambiente, um critico capaz de
contribuir efetivamente para o conhecimento de si mesmo
e, para a valorização da pluralidade. Contudo, vale ressal-
tar que o caminho a percorrer é longo, difícil e penoso, pois
é uma cartilha que não está escrita, sua inscrição no real é
complexa, dolorosa, mas necessária para que a escola seja de
fato um lugar de transformação do indivíduo e da sociedade,
principalmente no âmbito da violência.
O papel da escola, então, passa a ser o de fermentar a
experiência do sujeito perante a incansável aventura
humana de desconstrução e reconstrução, no campo
do pensamento, dos fatos cotidianos, na interessante
busca de uma visão mais dilatada de suas múltiplas
determinações e dos diferentes pontos de vista sobre
eles. Isso, a nosso ver, define o conhecimento em seu
sentido último (AQUINO, 2000:97).

Para mudar, se adaptar à nova demanda social, acredi-


tamos que o primeiro passo a ser dado é o de reconhecer e
conhecer a sua clientela, para que, a partir disso, o cenário
escolar possa realizar suas devidas modificações. Sem conhe-
cer os protagonista que construirão essa história, ficará difícil
promover uma modificação dentro desse espaço. Observa-
mos que o teatro, os jogos, o esporte, são fatores primordiais,
hoje em evidência para que a escola seja um palco menos
violento e mais humanizado, porém essas atividades de nada
valerão se não estiverem adaptadas ao público ao qual se
destinam. Sendo assim, ressalvamos que as adolescentes grá-

A HUMANIZAÇÃO PELA EDUCAÇÃO 43


vidas, nesse caso, ainda estariam à margem, excluídas, fora
desse cenário, pois até então não se pensou na possibilidade
de uma atividade lúdica que pudesse incluí-las, de forma sa-
tisfatória, dentro da escola.
Vemos então, a necessidade de conhecermos o público
que aqui destacamos e, visualizarmos possibilidades de fa-
vorecermos a minimização da violência, por meio de uma
escola mais humanizada e conhecedora dos indivíduos que
dela fazem parte, criando estratégias para lidar com as diver-
sidades.

PADRÕES DE COMPORTAMENTO DO ADOLESCENTE


O Brasil possui uma proporção grande de jovens. Segundo
levantamento realizado pelo Datasus (2001), a população do
Brasil era composta por 22% de adolescentes, caracterizan-
do o Brasil como um País de jovens. É notória, a interferên-
cia dos adolescentes em nossa sociedade, não só em termos
quantitativos, mas também pelos reflexos que ocasionam,
tendo em vista a necessidade da construção da identidade
social, psicológica e sexual. Assim, a adolescência é consi-
derada a faixa do ciclo vital de maior complexidade pelas
múltiplas mudanças e pela busca de novas experiências.
Essa busca estimula questionamentos de valores, acentu-
ando a predisposição de vivenciar comportamentos de risco,
nos quais buscam testar novas situações que podem resultar
em envolvimento com drogas, violência, acidentes e gravi-
dez não planejada, podendo trazer repercussões negativas
para a vida futura desses jovens.
Neste sentido, Aquino e colaboradores (2003), definem
comportamento de risco como a adoção de um estilo de vida
sem reconhecer seus perigos e conseqüências. O autor atri-
bui à sociedade, educadores, pais e profissionais de saúde
papel importante na prevenção de comportamentos de ris-
co. Os trabalhos realizados pelo autor apontam para a maior
tendência de adolescentes adotarem estilos de vida perigosos
e violentos quando não têm um canal de diálogo e indicam
a necessidade da criação de espaços “acolhedores” para se

44 Lílian Conceição Xavier Cardozo e Débora Alessandra de Souza


tratar de assuntos de interesse dos adolescentes. Sobre com-
portamento de risco, pontuamos as conseqüências graves ou
até mesmo irreversíveis que as ações imediatistas e inconse-
qüentes podem trazer para a vida futura desses jovens.
Neste período, dá-se o início da atividade sexual, caracte-
rizando a capacidade reprodutiva, essa constatação preocupa
muito, por ser esse tema um dos mais difíceis de ser abordado
pela família e pela escola. A dificuldade de se falar sobre sexo
interfere no trabalho de orientação sexual, podendo ocorrer
de forma inadequada. A educação sexual tem de acontecer
também na família e assumir um caráter de orientação sobre
as questões que envolvem a sexualidade. A escola deve trans-
mitir as informações necessárias para que, juntos, escola e
família possam formar uma atitude consciente e responsável
sobre sexualidade, enfatizando não apenas o comportamento
de risco ligado à atividade sexual, mas o prazer, afetividade
e envolvimento, que vão ao encontro das expectativas dos
adolescentes.
No Brasil existe uma grande heterogeneidade na traje-
tória juvenil, afirma Santos (2003), no que diz respeito aos
processos de escolarização e inserção no mercado de traba-
lho. Entre os grupos sociais mais favorecidos, percebe-se um
prolongamento da juventude, com o aumento do tempo de
estudo e a manutenção da coabitação com os pais. Nas clas-
ses populares, continua o autor, a juventude tende a ser mais
breve, com a interrupção dos estudos e a entrada precária no
mercado de trabalho. As desigualdades sociais se articulam
com as de gênero, indicando papéis distintos para homens e
mulheres. Os jovens brasileiros vivem em um contexto forte-
mente marcado pelas desigualdades de gênero e sociais, em
que a maternidade se apresenta não apenas como destino,
mas como reconhecimento de status social para as jovens que
não têm um projeto de vida.
Para se ter um melhor entendimento sobre o que é
ser adolescente, é preciso reconhecer a suscetibilidade
e as modalidades de atuação comuns a este grupo.
Esse conhecimento, de acordo com Campos (2002),
é fundamental para que se possam criar programas

A HUMANIZAÇÃO PELA EDUCAÇÃO 45


que atendam às reais necessidades desta fase da vida,
evitando atitudes de rejeição e críticas inadequadas
que possam interferir prejudicialmente no processo de
atenção ao adolescente.

A adolescência deve ser analisada sob aspectos mul-


ticausais, considerando que, para cada fase da vida
temos características peculiares de condutas e con-
flitos específicos. A diversidade de alternativas e a
urgência avassaladora, dentro da visão imediatista
do adolescente forçam o indivíduo jovem a escolhas
que podem resultar em situações ameaçadoras ao seu
equilíbrio biopsicossocial, dentre as quais está gravi-
dez não planejada.

Compreender os padrões evolutivos comuns a esta


fase e reconhece-lo e sua atitude de omissão, preco-
cidade do início das relações sexuais e o incentivo da
mídia, são fundamentais para que possamos atuar
sobre os indicadores que apontam o aumento da pro-
porção expressiva nos jovens brasileiros que engra-
vidam precocemente. Portanto, estaremos discutindo,
a seguir, aspectos importantes para melhor entender
sobre estar grávida na adolescência.

ASPECTOS BIOPSICOSSOCIAIS
DA GRAVIDEZ EM ADOLESCENTE
Por longos anos, a gravidez na adolescência não era tema
passível de discussão, por ser considerada um acontecimento
habitual para os padrões e costumes vigentes. A Revolução
Industrial e a Primeira Guerra Mundial, segundo Furtado
apud Santos (2003), trazem mudanças relevantes, eviden-
ciando um novo personagem, o adolescente que debutava
no mercado de trabalho. O autor ainda aponta a questão so-
cial em que a gravidez passou a ser encarada como obstáculo
ao sucesso profissional e comprometia a estrutura econômica
familiar.
Os trabalhos a esse respeito, segundo Gama (2004), aju-
daram a descortinar alguns pontos importantes sobre o as-

46 Lílian Conceição Xavier Cardozo e Débora Alessandra de Souza


sunto. É notória a polêmica quando se trata de discutir as
repercussões e os riscos presumíveis de uma gestação em um
organismo que iniciou as suas funções reprodutivas. Buscas
ávidas por soluções estão sendo realizadas, para minimizar
os problemas que envolvem estar grávida na adolescência
nos dias atuais, porém muito pouco se tem conseguido para
suprimir as estatísticas representativas desta questão.
No início da adolescência, a condição de menina é substi-
tuída pela de mulher. A motivação para a prática sexual tor-
na-se exacerbada por fatores fisiológicos, psíquicos e sociais.
O início da atividade sexual ocorre sem motivação justificá-
vel e, com freqüência, é iniciada sem o preparo adequado e
em momento inoportuno. Dessas condições advêm conseqü-
ências variadas, dentre elas a gravidez não planejada.
A gravidez é vista por Monteiro (1998), como um período
de mudanças físicas e emocionais, que cada mulher vivência
de forma distinta. A imaturidade psicológica e a anatomia
fisiológica das jovens mães podem ser apontadas como fato-
res de risco para a gravidez na adolescência. Prematuridade
e baixo peso com freqüência são associados a adolescentes
que engravidam entre os 10 e os 14 anos (SABROZA, 2004).
Os riscos da gravidez precoce também são apontados por
Andrade cols. (2004), que indicam o fator social como poten-
cializador desses riscos.
A adolescente da classe popular tem aumentado o risco
de marginalidade, devido ao número restrito de oportunida-
des de vida e à falta de absorção pelo mercado de trabalho,
marcando o abandono da trajetória escolar. Neste cenário,
Sabroza e colaboradores (2004), constatam que as famílias
chefiadas por adolescentes acabam alimentando o ciclo de
pobreza, tornando a situação socioeconômica ainda mais
precária, ampliando a exposição a outros riscos sociais. A
gravidez na adolescência reduz a possibilidade de sucesso
profissional, e constitui um facilitador para a permanência
em situação de pobreza.
Os aspectos psicológicos que envolvem a gestação na
adolescência são acrescentados por Sabroza e colaborado-
res (2004), que citam distúrbios de ordem afetiva, tanto em

A HUMANIZAÇÃO PELA EDUCAÇÃO 47


relação à mãe quanto ao bebê. A auto-estima debilitada e
depressão também são encontrados com freqüência.
Gama (2002), corrobora as considerações acima e aponta
a gravidez em adolescentes em idade precoce como um ris-
co, pois em sua maioria leva a possibilidades de intercorrên-
cias devido às desvantagens sociais, imaturidade biológica e
comportamento não-saudável. A continuidade dos estudos
durante o período gestacional, segundo Schor (1996), tem
correlação direta com projetos profissionais, associando-se à
possibilidade “de se ser alguém na vida”, acreditando-se que
o estudo é caminho para se alcançar um futuro melhor.
O tema gravidez na adolescência começa a receber noto-
riedade a partir do século XIX, quando se iniciaram as con-
siderações na literatura médica. A visão de que a gravidez
na adolescência era um problema exclusivamente familiar e
que seria resolvido com o casamento foi modificada. O fato
passou a ser observado como um problema de saúde pública,
devido ao impacto que se pode trazer para a saúde materno-
infantil e para os aspectos socioeconômicos do País.
A fecundidade no Brasil vem declinando de forma acentu-
ada, porém as taxas de natalidade entre adolescentes em ida-
de cada vez mais precoce vêm crescendo significativamente,
segundo dados do IBGE no último censo (2000). Pesquisas
realizadas pela Unesco sobre juventude e sexualidade no Bra-
sil no ano de 2000 comprovam que em cada 10 estudantes,
uma engravida entre 10 e 18 anos. As pesquisas realizadas
pela Comissão de Assuntos da Criança, do Adolescente e do
Idoso da ALERJ, indicou o número de 532 mil adolescentes
dessa faixa etária grávidas no ano de 2001.
Esses dados permitem-nos constatar o aumento contínuo
da taxa de gravidez na adolescência em idades cada vez mais
precoces, o que constitui uma preocupação técnica e gover-
namental, pelos aspectos biológicos, emocionais, sociais, eco-
nômicos e demográficos Este fenômeno tem se apresentado
em todas as classes sociais, todavia foi identificado por Gama
(2002), como de maior incidência nas classes populares. A
autora ainda sinaliza para o fato de que as adolescentes que
foram mães em idades mais precoces apresentarem os piores

48 Lílian Conceição Xavier Cardozo e Débora Alessandra de Souza


indicativos de condição de vida, incluindo abandono dos es-
tudos, dificuldades de inserção no mercado de trabalho, pro-
les numerosas e vulnerabilidade para cuidar da sua própria
saúde e de seu bebê.
Santos (2003), afirma que a complexidade da gravidez
na adolescência não pode ser encarada de forma fragmen-
tada, sem a inclusão do pai do bebê e dos seus familiares
e da escola. É importante que se considere este evento sob
o aspecto biopsicossocial, e que se ofereçam programas de
atendimento especializados e diferenciados, buscando um
entendimento das múltiplas extensões e implicações de estar
grávida nesta fase da vida.
A necessidade de uma intervenção efetiva e de profissio-
nais habilitados para trabalhar com as questões que envol-
vem o universo do adolescente durante o pré-natal, parto e a
recém-maternidade é fundamental para o bem-estar da mãe
adolescente e de seu bebê. Por conseguinte, é preciso uma
ação técnica e governamental concernente a esta situação
para que se criem políticas públicas que possam representar
a efetiva contribuição para o enfrentamento deste problema.
A gravidez na adolescência não pode ser encarada de for-
ma fragmentada. É imprescindível o aprofundamento de estu-
dos nesta direção, não só pela grande incidência deste evento
em nossa sociedade mas, especialmente pela necessidade de
compreensão dos significados de estar grávida no universo do
adolescente. O reconhecimento desta visão, segundo Cardo-
zo (2005), favorece lidar com esse assunto, porque considera
todas as implicações que pode esta gestação trazer, dentre os
quais se destaca o abandono escolar, que se tornou uma rea-
lidade entre as adolescentes grávidas, tendo em vista a difícil
conciliação entre a maternidade recente e a escola.

A DIFÍCIL CONCILIAÇÃO ENTRE GRAVIDEZ


NA ADOLESCÊNCIA E A ESCOLA
Ao longo da história, a maternidade era considerada como
produto da construção da feminilidade. O parto era visto
como rito de passagem para a condição de adulta, pelo qual

A HUMANIZAÇÃO PELA EDUCAÇÃO 49


a mulher era investida de autoridade por ter adquirido um
poder inacessível ao homem (TORNQUIST, 2003). O com-
portamento feminino frente à maternidade varia de acordo
com o contexto social e os interesses econômicos e políticos
(TRINDADE e ENUMO, 2002).
Nossa sociedade valoriza a maternidade, que e instituída
como responsabilidade e dever da mulher, o que em parte
se fundamenta em sua condição de engravidar, parir e ama-
mentar. Essa capacidade favorece a apropriação social do
corpo feminino para o exercício da maternidade, trazendo
situações de dissonância ou de conflito, em virtude das deter-
minações e limitações pessoais.
O ideal materno em nossa cultura, segundo Trindade e
Enumo (2002), considera importante para o exercício satisfa-
tório da maternidade o apoio social, incluindo a participação
do pai do bebê. A busca pela unidade mãe-filho também é
idealizada como forma única de sustentação para a sobrevi-
vência do bebê.
A maternidade é vista pela cultura judaico-cristã como
um tema sagrado. Essa visão integra o imaginário popular,
idealizando a figura da mãe numa concepção de perfeição
e amor total, o que foge à realidade cotidiana das mães. A
maternidade é vivida pela mulher com intensos sentimentos
contraditórios e ambivalentes. A mulher, ao longo do tempo,
foi concebida como um instrumento destinado à reprodução
e devia amar, proteger e criar a prole, confundindo-se o pa-
pel de mulher com o de mãe. A maternidade era vista como
obrigatória e exigia exclusividade, o que trazia dificuldades
para o desempenho de outros papéis.
A teoria das representações sociais tem cumprido impor-
tante papel para desvendar o sentido e o significado que cons-
tituem o pensamento social. Neste sentido, Valla (1999:122),
escreve: “As representações sociais exprimem a relação de
um sujeito com o objeto, relação que envolve uma atividade
de construção, de mobilização e de simbolização.”
Se olharmos a história, podemos perceber a representação
social sobre a maternidade, considerada um processo natural
da mulher, cujas condições biológicas a destinam a ser mãe.

50 Lílian Conceição Xavier Cardozo e Débora Alessandra de Souza


Quando a mulher não consegue vivenciar este processo,
surgem sentimentos de incapacidade. Reafirmando as con-
siderações apresentadas anteriormente, Trindade e Enumo
(2002), indicam como principais elementos do campo repre-
sentacional em mulheres que não podem ter filhos à tristeza,
a frustração, a solidão e os sentimentos de inferioridade.
Essas representações são justificadas por Trindade e Enu-
mo (2002:201), da seguinte forma:
Se olharmos a história, observamos que o lugar e a
valorização da maternidade no âmbito sociocultural
se modificam e variam em função das diferentes épo-
cas e contextos, respondendo a interesses econômicos,
demográficos e políticos.... sem dúvida, parece evi-
dente que, em toda a sociedade patriarcal, a mulher
entra na ordem simbólica apenas como mãe.

Na adolescência, principalmente nas classes populares, a


maternidade é idealizada e concebida como um salto qua-
litativo no contexto sociocultural, como afirmam Trindade
e Enumo (2002:196). “Ser mãe é um valor feminino maior,
o par mãe-filho parece representar o ideal de beleza e felici-
dade.” Essas representações sociais sobre a maternidade são
indicadas como fator de risco para a gravidez precoce, prin-
cipalmente em adolescentes em que mãe e amigas tiveram
seus filhos também na adolescência, constatação que é cor-
roborada por Moscovici (1978), quando mostra que a relação
do indivíduo com um grupo vai proporcionar a reprodução
de valores e determinar comportamentos.
Para discutir e entender a gravidez na adolescência, é
indispensável reconhecer a representação deste fenômeno
para o grupo em que a jovem está inserida. Trindade e Enu-
mo (2002), apontam para o fato de que existe uma imposição
social da maternidade para a “mulher normal”. Essa tendên-
cia é evidenciada na sociedade ocidental como possibilidade
de transformação, tornando as mulheres generosas e extre-
mamente satisfeitas. Em adolescentes de classes populares,
essa imposição social é vinculada ao sentimento de exclusão,
caso suas irmãs ou amigas estejam grávidas e ela não, posto

A HUMANIZAÇÃO PELA EDUCAÇÃO 51


que é vista como uma possibilidade de mudança de status
social. Logo as representações sociais poderão ser utilizadas
como material de análise social, gerando ações pedagógicas
e políticas públicas.
A escola não pode mais postergar a necessidade de se
considerar a gravidez na adolescência como parte do coti-
diano. O aumento dos casos de gestação entre adolescentes
aumenta consideravelmente e faltam políticas que estimu-
lem a permanência de jovens mães em sala de aula. Quando
engravidam, muitas adolescentes se sentem pressionadas a
sair da escola, apresentando como justificativa a dificuldade
de acompanhar os horários escolares normais, o mal-estar
causado pelos enjôos, vergonha ou desestímulos. A situação
escolar dessas adolescentes levantada em pesquisa por Car-
dozo (2005), aponta para o fato de que 49% abandonam a
escola, das quais 30% no primeiro trimestre e 19% após o
nascimento do bebê. Revela ainda que as jovens que conti-
nuam os estudos possuem o apoio social, caracterizado pela
família, o pai do bebê e a escola.
Diante desses dados, percebemos o quanto a escola exer-
ce uma violência velada/simbólica, destituindo a adolescente
do seu lugar de aluna e empurrando-a para o lugar de mãe
sem lhe pedir permissão, a partir do momento, em que é
obrigada a abandonar os estudos. Isso não quer dizer que a
mesma não será mãe, mas esse não é o único papel que lhe
cabe assumir. É urgente a adequação da escola as exigências
da gravidez e da recém-maternidade, minimizando a evasão
escolar e a exclusão social que diminuem as chances de segui-
rem o caminho da educação formal. Segundo levantamento
da agência Andi (2005), o Ministério da Educação não tem
nenhum programa específico para mães adolescentes, cons-
tatação que confirma a dificuldade para a permanência das
jovens mães na escola, pois não contam com serviços públi-
cos de creches que poderiam cuidar de seus filhos no horário
escolar, com a flexibilização das faltas, aulas de recuperação
e além de apoio psicológico para a menina grávida e as cole-
gas de sala de aula. Manter essas jovens na escola caracteriza
uma necessidade, tendo em vista a associação da gravidez

52 Lílian Conceição Xavier Cardozo e Débora Alessandra de Souza


precoce com o baixo índice de escolaridade. O fato de não
terem perspectiva de futuro nem um ideal profissional, se-
gundo Campos (2002), aumenta a vulnerabilidade da gravi-
dez precoce e a reincidência gestacional ainda na adolescên-
cia. É preciso criar projetos que incentivem a permanência
dos jovens pais na escola, possibilitando a subsistência dos
pais adolescentes e seus filhos.
A gravidez faz parte de um processo natural do desenvol-
vimento e necessita de reestruturação e reajuste em várias
dimensões. Vivências emocionais sem precedentes ocorrem
principalmente em primíparas. Maldonado (2000), afirma que
a complexidade desta vivência emocional torna-se ainda mais
acentuada quando se é adolescente e se tem como pensamen-
to hegemônico da sociedade e da saúde pública que a gravi-
dez na adolescência é indesejada. Desta forma, destaca Schor
(1996:8), “são evidenciadas somente as conseqüências negati-
vas, colocando-se neste fenômeno um rótulo de problema”.
Cardozo (2005), verifica em sua pesquisa que as repercus-
sões emocionais estão associadas ao significado da gravidez
para a adolescente embora ele possa não ser único ou defi-
nitivo e está relacionado ao apoio social que a adolescente
recebe, principalmente do pai do bebê e da família.
Repercussões emocionais desfavoráveis – como autova-
lorização do lado negativo, baixa expectativa de futuro e de-
pressão – estiveram presentes com mais freqüência em mães
adolescentes em que a interação com a família e com o pai
do bebê não foram consideradas boas. Maldonado (2000) e
Sabroza e colaboradores (2004), apontam que o apoio so-
cial é fundamental para a forma como a adolescente vivencia
a gravidez. Esse apoio pode interferir nas emoções ligadas
às alterações corporais, as quais podem ser vistas como um
desabrochar, trazendo orgulho do corpo grávido ou visuali-
zando a gravidez como uma desestrutura e deformação do
próprio corpo.
Estudos indicam que a qualidade do pré-natal interfere
significativamente para o sucesso do parto e no cuidado com
o bebê. Não é, porém, o único aspecto determinante deste
sucesso. O estado emocional também vai ter importância no

A HUMANIZAÇÃO PELA EDUCAÇÃO 53


processo segurança-tranqüilidade-equilíbrio, contribuindo
para uma boa evolução do parto e favorecendo o vínculo
afetivo entre mãe e filho (ODENT, 2002).
Deste modo, sob o olhar da intervenção psicológica em
gestantes adolescentes, faz-se necessário uma abordagem que
constitua a preparação para a maternidade e a paternidade.
É preciso trabalhar a dialética vivência-informação, funda-
mental para o entendimento dos processos gestacionais e do
amadurecimento emocional. A integração de técnicas com
dinâmicas grupais que abarquem a discussão e a elaboração
das questões pessoais, familiares e profissionais com os casais
grávidos e suas famílias, até o puerpério, é considerada de
essencial relevância no caso de adolescentes. Oferecer apoio
psicológico durante a gravidez, o parto e o pós-parto, pro-
porciona a reflexão necessária, segundo Maldonado (2000),
para o amadurecimento frente à nova condição de pais ado-
lescentes.
O presente trabalho propôs discutir, a partir da atualidade
e sob a ótica da adolescente, o tema gravidez na adolescência.
Buscamos um olhar abrangente para a compreensão sobre o
significado de estar grávida sendo adolescente. Pretendemos
ainda refletir, a respeito da representação social sobre o im-
pacto da gravidez com um foco biopsicossocial.
Constatamos com esse trabalho que o apoio social – ca-
racterizado pela adolescente como família, equipe do pré-
natal, escola e principalmente o apoio do pai do bebê – de-
sempenha papel importante na aceitação da gravidez por ela,
assim como na sua conduta durante o período gestacional e
na recém-maternidade.
Em seu estudo, Cardozo (2005), sugere que existem dife-
rentes formas de se vivenciar a maternidade. Encontramos
relatos nos quais a maternidade foi identificada como po-
sitiva, sendo considerada uma experiência enriquecedora,
com ganhos emocionais e aceitação social, como podemos
evidenciar no relato a seguir: “Ser mãe é bom, sem muitos
filhos... não tinha muitos sonhos, meu maior sonho era ser
alguém... e sou: sou mãe.” (C, 15 anos). Em outro grupo, a
maternidade foi considerada difícil, com relatos de sofrimen-

54 Lílian Conceição Xavier Cardozo e Débora Alessandra de Souza


to e privação. Tais, constatações nos fazem pensar que o re-
conhecimento dos impactos da gravidez está relacionado à
representação social que esta gestação terá para o grupo em
que se insere a adolescente.
Na esfera da saúde pública, encontramos discursos que
tratam a gravidez na adolescência como um problema que
precisa ser cuidado com urgência. Essa visão causal pode di-
ficultar uma reflexão mais abrangente e não traduzir de forma
fidedigna as dimensões complexas desta temática. É preciso
que este fenômeno seja visto como multicausal, trazendo-se
à tona todas as possibilidades que envolvem ser mãe adoles-
cente. Seus aspectos de dificuldade deverão ser considera-
dos, bem como as possibilidades de felicidade inseridas neste
contexto. A abordagem deverá ser feita não tratando o fato
só como “um desastre”, e sim, como uma situação que pre-
cisa ser analisada com olhar amplo e consciente, levando-se
em conta as situações que podem ser deflagradas e a repre-
sentação da maternidade para essas adolescentes.
A forma como a adolescente vivencia a maternidade está
ligada ao apoio e à representação social. Por isso o sucesso
das intervenções humanizadas, que buscam a diminuição dos
impactos biopsicossociais, está associado ao apoio que mães
adolescentes recebem. Neste sentido, não devemos focar a
atenção somente na gestante, mas também nas pessoas que
constituem o grupo de apoio social.
Precisamos localizar as representações que o impacto da
gravidez provoca na vida das adolescentes, de seus familia-
res e da sociedade, o que é fundamental para que possamos
proporcionar o entendimento e o amadurecimento da jovem
mãe e da sociedade, buscando estratégias para lidar com essa
nova situação.
Não pretendemos com este trabalho tornar ilegítimas as
preocupações da sociedade em relação ao bem-estar da mãe
adolescente e de seu filho. Sugerimos uma visão ampla, evi-
tando um olhar reducionista sobre a gravidez na adolescên-
cia, que pode construir restrições e implicações na atuação
dos profissionais e da sociedade diante deste fenômeno.

A HUMANIZAÇÃO PELA EDUCAÇÃO 55


CONSIDERAÇÕES FINAIS
Propomos, com este capítulo, uma reflexão sobre gravidez
na adolescência e violência na escola, por entendermos, que
um maior conhecimento destes temas favoreceriam a criação
de ações humanizadas na busca de modificações no ambien-
te escolar, tornando-o não somente um meio de instrumen-
talização, mas também, um espaço que se preocupará com
a formação global do indivíduo, favorecendo sua interação
dentro da escola e na sociedade. A padronização da dinâ-
mica cotidiana no meio escolar atua no sentido de excluir a
parcela da sociedade que não se reconhece como parte desta
organização e reivindica seu reconhecimento, muitas vezes
mediante atitudes violentas que ajudam a engrossar o índice
de evasão escolar, principalmente, entre as jovens mães, ex-
cluídas e pressionadas a sair da escola por não conseguirem
acompanhar as normas estabelecidas.
Apontamos para a urgência em responder às novas neces-
sidades que o cotidiano, principalmente o escolar nos apre-
senta e, para isso não bastam somente teorias elaboradas.
Precisamos também de estratégias, habilidades e procedi-
mentos humanizados, que possibilitem responder na prática
as necessidades educativas detectadas.
Evidenciamos a premência de mudança de atitudes, toda
mudança de atitude, além de conhecimento, requer motiva-
ção e desejo. É preciso ampliar o campo de ação da escola,
inaugurando novas formas de organizar o espaço e o tem-
po de acordo com a necessidade e interesse de seus alunos.
Considerar a história dos alunos possibilita a descoberta de
caminhos diversos para estabelecer ações que se integrem ao
universo escolar.Essas ações vão além do adestramento e da
submissão às regras do academicismo.
A escola não pode mais fundamentar suas ações repetin-
do respostas, e sim formulando perguntas sobre a responsa-
bilidade de assegurar, sem discriminação, o direito de todos
permanecerem nela. Deve ainda promover uma educação
pautada em justiça e respeito pelos direitos humanos, com o
objetivo de alcançar uma escola e uma sociedade mais huma-
nizadas e menos violentas.

56 Lílian Conceição Xavier Cardozo e Débora Alessandra de Souza


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A HUMANIZAÇÃO PELA EDUCAÇÃO 59


A ESCOLA PROMOVENDO
HÁBITOS ALIMENTARES SAUDÁVEIS
Uma estratégia educacional para a
promoção da alimentação saudável na
rede de ensino infantil e fundamental
Maria de Lourdes Ferreirinha Rodrigues
Juliana Rezende Melo da Silva
Renata Bernardon
Nina Amorim
Elisabetta Recine
Renata Monteiro
Patrícia Martins

CENÁRIO EPIDEMIOLÓGICO MUNDIAL E BRASILEIRO


As diversas transformações ocorridas no Brasil, tanto no
campo socioeconômico-cultural, quanto no campo da saúde
da população brasileira, frente à crescente modernização e
urbanização do processo de desenvolvimento do País, pro-
vocaram mudanças no estilo de vida da população e em seus
hábitos alimentares, contribuindo para os agravos à saúde e
para o crescente fenômeno da transição epidemiológica.
A transição epidemiológica é caracterizada pelas mu-
danças ocorridas ao longo do tempo nos padrões de morte,
morbidade e invalidez que caracterizam uma população es-
pecífica e que, em geral, ocorrem em conjunto com outras
transformações demográficas, sociais e econômicas, como:
habitação e saneamento, hábitos alimentares, níveis de ocu-
pação e renda, dinâmica demográfica, acesso e uso social das
informações, escolaridade, utilização dos serviços de saúde,
aquisição de novos estilos de vida e outros desdobramentos.

61
A Organização Mundial da Saúde (OMS) vem apresen-
tando ao longo do tempo as doenças crônicas como principal
causa de mortalidade e incapacidade do mundo. O Informe
de Saúde da OMS (2002) revela que, no ano de 2001, estas
doenças foram responsáveis por 60% dos 56,5 milhões de
óbitos no mundo, representando cerca de 46% da carga glo-
bal de doenças, com estimativas de chegar a 2020 com 57%.
Mais da metade das mortes atribuídas às enfermidades crôni-
cas deve-se as doenças cardiovasculares. Entretanto a obesi-
dade e a diabetes ocupam posição de destaque nestas estatís-
ticas, devido a sua tendência ascendente, principalmente de
forma cada vez mais precoce. De acordo com dados do Mi-
nistério da Saúde, as DCNT respondem pela maior parcela
dos óbitos no País e das despesas com assistência hospitalar
no SUS, totalizando cerca de 69,1% dos gastos com atenção
à saúde em 2002.
No Brasil, a transição epidemiológica não tem ocorrido
de acordo com o modelo experimentado pela maioria dos
países industrializados (Estados Unidos, Inglaterra) e mesmo
por nossos vizinhos latino-americanos como o Chile, Cuba
e Costa-Rica. Na realidade brasileira coexiste uma super-
posição entre as etapas nas quais predominam as doenças
transmissíveis (infecciosas e parasitárias) e as crônicas não
transmissíveis (obesidade, câncer, doenças cardiovasculares,
diabetes, entre outras). Esta transição vem acontecendo tam-
bém devido ao aumento do consumo de alimentos altamente
energéticos e à diminuição da oferta de frutas, legumes, ver-
duras e cereais, caracterizando o que se denomina de transi-
ção nutricional.

A TRANSIÇÃO NUTRICIONAL
E SUA RELAÇÃO COM A OBESIDADE
A transição nutricional também não vem ocorrendo exata-
mente no mesmo período de tempo e ritmo em todos os pa-
íses, embora se identifiquem elementos comuns na dieta das
populações, tendo como principais aspectos o alto teor de
açúcar, de gorduras (principalmente de origem animal), de

62 M. de L. F. Rodrigues, J. R. M. da Silva, R. Bernardon, N. Amorim, E. Recine, R. Monteiro e P. Martins


alimentos refinados até a redução dos alimentos que são fon-
tes de carboidratos complexos e fibras. Esta ocorrência tem
sido associada ao aumento da prevalência de DCNT, princi-
palmente das doenças relacionadas ao aparelho circulatório,
às neoplasias e a diabetes.
O relatório mundial da saúde da OPAS/OMS (2003)
ratifica que as DCNT são de etiologia multifatorial e com-
partilham inúmeros fatores de risco modificáveis, como o
tabagismo, a inatividade física, a alimentação inadequada, a
obesidade e a dislipidemia. Neste cenário, merece especial
atenção a obesidade que, além de ser uma doença crônica,
também é um fator de risco para outras enfermidades, como
hipertensão, diabetes, doenças cardiovasculares, dislipide-
mias e até alguns tipos de câncer.
A obesidade é caracterizada pelo Consenso Latino Ame-
ricano de Obesidade como uma enfermidade crônica não-
transmissível, progressiva e recorrente, devido a uma alte-
ração na composição corporal, com excesso significativo do
tecido de gordura. Já o sobrepeso é definido como a pro-
porção relativa de peso maior que o desejável em relação à
estatura, sem que haja mudanças substanciais na composição
do compartimento de gordura. Não há, necessariamente, um
excesso de peso.
No Brasil, são escassos os dados epidemiológicos sobre
obesidade. Todavia, quando comparamos os dados de obe-
sidade e sobrepeso do Estudo Nacional da Despesa Fami-
liar (ENDEF – 1974/75) com o último inquérito nacional da
Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição (PNSN – 1989),
uma situação preocupante é revelada: houve um aumento
de 100% na prevalência de obesidade entre os homens e de
70% entre as mulheres, considerando todas as faixas etárias
nesse período. Esta questão torna-se ainda mais relevante ao
considerarmos que, apesar de estar distribuída em todas as
regiões do País e nos diferentes estratos socioeconômicos da
população, a tendência deste aumento é proporcionalmente
mais elevada nas famílias de baixa renda. Dados mais recen-
tes, (2002/2003), da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF),
mostram que houve um aumento do sobrepeso e obesidade

A ESCOLA PROMOVENDO HÁBITOS ALIMENTARES SAUDÁVEIS 63


na população brasileira ao longo do tempo, cujos valores atu-
ais chegam a 40,6% dos adultos com excesso de peso e 11,1%
com obesidade.
Mesmo não tendo sido observadas modificações signifi-
cativas na obesidade infantil, tanto no inquérito do ENDEF
(1974/75), quanto na PNSN (1989), percebe-se que, no decor-
rer do tempo, este cenário também mudou. Atualmente, existe
um aumento da prevalência do excesso de peso das crianças,
estritamente ligado a mudanças em seus estilos de vida. Fato-
res oriundos da civilização moderna podem estar associados a
este quadro de mudanças epidemiológicas na infância e ado-
lescência, destacando-se como exemplo: o lazer e brincadeiras
infantis atuais, em que a criança dispõe de mais tempo dedica-
do à televisão e ao computador e a maior dificuldade de brin-
car na rua, uma das conseqüências da falta de segurança pú-
blica. Outro fator importante a ser considerado na questão da
obesidade é que, hoje, há um maior apelo comercial, incenti-
vando o consumo dos produtos ricos em carboidratos simples,
gorduras e calorias, divulgados na mídia, pelas encantadoras
campanhas comerciais dos biscoitos recheados, dos salgadi-
nhos fritos, dos refrescos, das diversas guloseimas (chocolates,
chicletes, balas...), dos refrigerantes e outros produtos.
Desta forma, o atual estilo de vida, também se caracteri-
za pelo sedentarismo e pelo elevado consumo de tabaco e
álcool, associados à prática alimentar com consumo predo-
minante de alimentos industrializados, ricos em sal, açúcar e
gorduras hidrogenadas e pobres em carboidratos complexos,
fibras e micronutrientes, fatores que favorecem o desenvol-
vimento das DCNT. Conseqüente a esse estilo de vida atual,
alguns pesquisadores chamam a obesidade de “doença da ci-
vilização”, uma vez que tem sido provocada pelo fenômeno
da urbanização/globalização nos países desenvolvidos e em
desenvolvimento.

POLÍTICAS PÚBLICAS EM ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO


A Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN) do
Brasil, aprovada no ano de 1999, atesta o compromisso do

64 M. de L. F. Rodrigues, J. R. M. da Silva, R. Bernardon, N. Amorim, E. Recine, R. Monteiro e P. Martins


Ministério da Saúde com o combate dos males relacionados
à escassez alimentar e à pobreza, sobretudo a desnutrição
infantil e materna, bem assim com o complexo quadro dos
excessos, já configurado no Brasil pelas altas taxas de pre-
valência de sobrepeso e obesidade na população adulta. As
sete diretrizes do PNAN têm, como fio condutor; o Direito
Humano à Alimentação e à Segurança Alimentar e Nutricio-
nal, o estímulo a ações intersetoriais, com vistas ao acesso
universal aos alimentos, a garantia da segurança e qualidade
dos alimentos, o monitoramento da situação alimentar e nu-
tricional, a promoção de práticas alimentares e estilos de vida
saudáveis, a prevenção e controle dos distúrbios e doenças
nutricionais, a promoção do desenvolvimento de linhas de
investigação e o desenvolvimento e capacitação de recursos
humanos em saúde e nutrição.
O conceito de segurança alimentar, que anteriormente era
limitado ao abastecimento na quantidade apropriada, foi am-
pliado, incorporando também o acesso universal aos alimen-
tos, o aspecto nutricional e, conseqüentemente, as questões
relativas à composição, à qualidade e ao aproveitamento bio-
lógico. O Brasil adotou esse novo conceito a partir de 1986,
com a realização da I Conferência Nacional de Alimentação
e Nutrição, e o mesmo foi consolidado na I Conferência Na-
cional de Segurança Alimentar realizada em 1994.
Entende-se Segurança Alimentar e Nutricional como o direi-
to de todos a uma alimentação saudável, acessível, de qualidade,
em quantidade suficiente e de modo permanente, com base em
práticas alimentares promotoras de saúde, sem comprometer o
acesso a outras necessidades essenciais, nem o sistema alimentar
futuro, devendo realizar-se em bases sustentáveis.

PROMOÇÃO DA SAÚDE E EDUCAÇÃO EM SAÚDE


COMO ESTRATÉGIA DE AÇÃO
A promoção da saúde e a educação em saúde, como parte in-
tegrante da primeira, representam uma estratégia promissora
para enfrentar os múltiplos problemas pós-transacionais que
afetam as populações, anteriormente citadas.

A ESCOLA PROMOVENDO HÁBITOS ALIMENTARES SAUDÁVEIS 65


Partindo de uma concepção ampla do processo saúde-do-
ença e seus determinantes, a promoção da saúde propõe a
articulação de saberes técnicos e populares e a mobilização
de recursos institucionais e comunitários, públicos e priva-
dos, de diversos setores, para o enfrentamento e a resolução
dos problemas de saúde e seus determinantes.
Nos últimos 25 anos, o conceito de promoção da saúde
e sua aplicação surgiram e se desenvolveu no decorrer de
quatro importantes Conferências Internacionais sobre Pro-
moção da Saúde. Nessas conferências, em Ottawa, Adelaide,
Sundsval e Jakarta, foram definidas as bases conceituais e
políticas da promoção da saúde. Em 1992, na América Lati-
na, realizou-se a Conferência Internacional de Promoção da
Saúde, em Bogotá/Colômbia, trazendo formalmente o tema
para o contexto sub-regional. Com o passar dos anos, o as-
sunto foi tomando vulto e importância social, incorporando-
se então uma série de valores ao termo promoção da saúde,
tais como: qualidade de vida, saúde, solidariedade, eqüidade,
democracia, cidadania, desenvolvimento, participação e par-
ceria, entre outros que são imprescindíveis para um melhor
entendimento e resolução dos problemas de saúde.
Esse termo relaciona-se, também, a uma série de estra-
tégias: ações do Estado (políticas públicas saudáveis), da
comunidade (reforço de ação comunitária), de indivíduos
(desenvolvimento de habilidades pessoais), do sistema de
saúde (reorientação do sistema de saúde) e de parcerias in-
tersetoriais. Isto é, trabalha com a idéia de responsabilização
múltipla, tanto para os problemas, quanto para as soluções
propostas para os mesmos.
A promoção da saúde deve consistir em atividades diri-
gidas à transformação dos comportamentos dos indivíduos,
focando nos seus estilos de vida e localizando-os no seio das
famílias e no ambiente social e cultural em que se encontram.
Neste caso, os programas ou atividades de promoção da saú-
de tendem a concentrar-se em componentes educativos, pri-
mariamente relacionados com riscos comportamentais passí-
veis de mudanças, que estariam, pelo menos em parte, sob o

66 M. de L. F. Rodrigues, J. R. M. da Silva, R. Bernardon, N. Amorim, E. Recine, R. Monteiro e P. Martins


controle dos próprios indivíduos, por exemplo: o hábito de
fumar, o hábito alimentar e a atividade física praticada.
A Educação em Saúde, entendida como o processo para a
promoção da saúde, visa capacitar os indivíduos a agir cons-
cientemente diante da realidade cotidiana, com aproveita-
mento de experiências anteriores, formais e informais, tendo
sempre em vista a integração, a continuidade, a democratiza-
ção do conhecimento e o progresso no âmbito social.
Inserida nesta abordagem da Educação em Saúde, a
Educação Nutricional atua, por intermédio do Nutricionista
como agente facilitador do processo de aprendizagem, sobre
o tema da promoção da alimentação saudável, com o obje-
tivo de colaborar para a melhoria das condições de saúde
que vêm sendo apresentadas em dados epidemiológicos em
todo o mundo. Diversos órgãos internacionais recomendam
que se utilize a Educação em Saúde como instrumento de
transformação das práticas inadequadas de saúde, quer para
os indivíduos, quer para os próprios profissionais.

ESCOLAS PROMOTORAS DA ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL


A partir dessas recomendações, a proposta das Escolas Pro-
motoras de Saúde e, nesse contexto, das “Escolas Promotoras
da Alimentação Saudável”, é formar futuras gerações com
conhecimentos, habilidades e destrezas necessárias para pro-
mover e cuidar de sua saúde, de sua família e de sua comu-
nidade, assim como criar e manter ambientes saudáveis de
estudo e convivência.
De acordo com a OMS, a definição de escolas promoto-
ras de saúde foi elaborada em resposta às mudanças do papel
da escola, dentre os quais se destacam: educação em saúde e
formação de ambiente escolar saudável.
No Brasil, as iniciativas em promover a alimentação sau-
dável nas escolas estão sendo estimuladas pelo fortalecimen-
to dos parâmetros curriculares nacionais, os quais vêm tra-
tando a educação em saúde como um tema transversal a ser
trabalhado de forma integrada com outras disciplinas. Esse
enfoque é fundamental para que a valorização de hábitos e

A ESCOLA PROMOVENDO HÁBITOS ALIMENTARES SAUDÁVEIS 67


estilos de vida saudáveis perpasse por todas as áreas de estu-
do escolares, desde os textos literários, informativos e jorna-
lísticos até os científicos.
Além da inserção do tema no currículo escolar, é tam-
bém necessária a participação de toda a comunidade escolar
para buscar a promoção da saúde. Este aspecto fomentou
a necessidade de se realizar projetos que visem atingir esse
objetivo. Inserido neste contexto, com a missão de promo-
ver e introduzir práticas alimentares saudáveis nas escolas de
Educação Infantil e do Ensino Fundamental da rede pública
e privada do Distrito Federal (DF), com a aliança entre a pes-
quisa acadêmica e a prática da promoção da saúde pública,
surgiu o projeto “A Escola Promovendo Hábitos Alimentares
Saudáveis”.

PROJETO “A ESCOLA PROMOVENDO HÁBITOS


ALIMENTARES SAUDÁVEIS”: VIVÊNCIAS E EXPERIÊNCIAS
Esta iniciativa foi desenvolvida no ano de 2000, a partir de
um projeto-piloto, realizado em uma escola da rede pública
por uma equipe de alunos da disciplina Educação Nutricio-
nal do curso de graduação em Nutrição da Universidade de
Brasília (UnB), e cuja finalidade foi reforçar a inserção do
tema alimentação e nutrição no cotidiano escolar utilizando-
se de atividades pedagógicas.
Em 2001, as atividades pedagógicas desenvolvidas e tes-
tadas na escola foram aperfeiçoadas e passaram a compor o
kit educativo do projeto. Além de materiais educativos, como
jogos sobre a escolha alimentar saudável, o kit também é
composto por um CD Rom com manuais técnicos, textos de
apoio e planos de aulas dirigidos aos educadores, e o caderno
de atividades elaborado para os alunos. Desde a implantação
do projeto, esses kits já foram entregues a aproximadamente
400 escolas no Distrito Federal.
Foi realizada ampla divulgação do projeto para cerca de
600 escolas públicas e privadas do DF, convocando-as para
conhecerem as atividades que o mesmo se propunha a re-
alizar no ambiente escolar. Diante da vasta procura, foi se-

68 M. de L. F. Rodrigues, J. R. M. da Silva, R. Bernardon, N. Amorim, E. Recine, R. Monteiro e P. Martins


lecionado o primeiro grupo de escolas para a condução da
proposta. As estratégias de atuação consistiam no desenvol-
vimento de atividades educativas para os alunos, pais e/ou
responsáveis, oficinas de formação em alimentação e nutri-
ção com os educadores e realização da avaliação nutricional
(peso, altura e consumo alimentar) com os alunos.
Com o passar do tempo, o projeto adquiriu experiências
importantes e foi reestruturado em três eixos de atuação:
Escolas Tipo A, em que pelo menos 70% dos professores de
cada uma delas deveria estar ativamente envolvido com as
ações do projeto. Essas escolas recebiam visitas mensais da
equipe para apresentação de atividades pedagógicas com os
educadores, crianças e pais ou responsáveis; Escolas Tipo B,
nas quais os educadores interessados participavam de ofici-
nas de formação em alimentação e nutrição na Universida-
de de Brasília, com carga horária de 40 horas, assumindo o
compromisso de desenvolver e multiplicar em suas escolas as
atividades de promoção da alimentação saudável e, por fim,
o último eixo de ação, a “Cantina Escolar Saudável”, cuja
atuação compreendia a participação dos responsáveis pelas
lanchonetes em encontros para discutir ações que permitis-
sem a implantação dos “10 Passos para a Cantina Saudável”.
Além disso, a equipe, composta por nutricionistas e alunos
do curso de graduação em Nutrição da Universidade de Bra-
sília, prestava assessoria às lanchonetes, visando à melhoria
da qualidade nutricional e higiênico-sanitária nos lanches
produzidos e distribuídos pelos estabelecimentos.
Ao longo de 2 anos consecutivos (2003 e 2004), as me-
todologias (ou eixos) descritas anteriormente foram avalia-
das comparativamente quanto a sua eficiência diante dos
objetivos a serem alcançados. Esta avaliação revelou que os
resultados do eixo das Escolas Tipo B (oficinas de formação)
superaram os das Escolas Tipo A (atividades pedagógicas rea-
lizadas pela equipe do projeto nas escolas), por ser esta uma
metodologia cuja demanda de recursos (financeiro e pesso-
al) para sua realização. No ano de 2005, com o propósito
de melhorar a aplicação dos recursos disponíveis, decidiu-se
concentrar as atividades no eixo Escolas Tipo B, denominadas

A ESCOLA PROMOVENDO HÁBITOS ALIMENTARES SAUDÁVEIS 69


mais adiante como “Formação de Educadores”, além da con-
tinuidade do eixo “Cantina Escolar Saudável”.

FORMAÇÃO DE EDUCADORES E CANTINA ESCOLAR


SAUDÁVEL: PRÁTICAS ATUAIS
As Oficinas de Formação para Professores de Educação In-
fantil e do Ensino Fundamental (1a a 4a séries), desenvolvi-
das desde 2005, apresentam uma abordagem caracterizada
como socioconstrutivista, interdisciplinar e em conformida-
de com os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Essas
Oficinas pretendem sensibilizar a comunidade escolar para a
adoção de estratégias propiciadoras de mudanças conceituais
e práticas, propondo o desenvolvimento de uma alimentação
saudável e da responsabilidade individual e coletiva em rela-
ção à Educação Nutricional. Buscam também a realização de
atividades interdisciplinares, contextualizadas socialmente a
cada escola.
As atividades realizadas e sugeridas pela equipe do proje-
to, bem como aquelas que são criadas por iniciativa de cada
educador, representam o desafio em função do desenvol-
vimento integrado entre Universidade e Escola, Nutrição e
Educação. Outro aspecto importantíssimo neste processo de
formação é o fantástico intercâmbio de experiências e idéias,
de modo a permitir uma contribuição significativa na mudan-
ça de atitudes e condutas em relação à alimentação, à desmis-
tificação de antigos conhecimentos e percepções adquiridos
a partir de contextos e experiências negativas, à criação de
uma consciência coletiva pertinente aos problemas alimen-
tares individuais ou coletivos e à reavaliação de escalas de
valores e práticas de alimentação.
A equipe do projeto atua como facilitadora da informa-
ção para os educadores, ao fazer uso de diferentes técnicas,
tais como: dinâmicas, jogos, entrevistas e minifóruns, instru-
mentos de suporte para a criação de novas metodologias de
ensino e de preparo para a disseminação de conhecimentos.
Dentro dessa linha de ação, são trabalhados os seguintes mó-
dulos ao longo do ano letivo (Quadro 1).

70 M. de L. F. Rodrigues, J. R. M. da Silva, R. Bernardon, N. Amorim, E. Recine, R. Monteiro e P. Martins


A gente aprende a comer da melhor forma, tendo
então uma vida mais saudável em todos os sen-
tidos, ela possibilitou pra gente conhecimentos
pra gente passar tanto para os alunos quanto
pra nossa vida mesmo (Educadora do ensino
fundamental, Oficina Educadores, 2005).

Para a elaboração e execução das atividades desenvolvi-


das pelos educadores ao longo das oficinas, foi criado pela
equipe do projeto o “Plano de Ação”, que consiste no instru-
mento utilizado para construir e desenvolver as atividades
que serão trabalhadas em sala de aula ou em qualquer outro
ambiente da escola. O referido instrumento apresenta como
base técnica os temas explanados durante as Oficinas de Ca-
pacitação, com o objetivo de estabelecer uma sistematização
das atividades propostas. O plano de ação é elaborado pe-
los próprios educadores, permitindo uma melhor adequação
dos temas abordados com a realidade da sua escola e tam-
bém um apoio ao professor, em seu trabalho no processo de
conscientização dos seus alunos sobre os diferentes assuntos
abordados, como Saúde, Nutrição e Alimentação Saudável
na escola.

Módulo 1: Princípios da Alimentação Saudável


(4 encontros)
Subtemas:
 A importância da alimentação na fase pré-escolar e escolar.
 Lanches saudáveis: fazendo escolhas saudáveis em casa e na
escola com base na pirâmide alimentar.
 A importância do consumo de frutas, sucos e hortaliças.
 Introdução aos Micronutrientes.
 Doenças da má alimentação.
 Respeito à Cultura, à Saúde e ao Prazer.
 Apresentação da proposta de atividades anuais do Projeto A
Escola Promovendo Hábitos Alimentares Saudáveis.

A ESCOLA PROMOVENDO HÁBITOS ALIMENTARES SAUDÁVEIS 71


Módulo 2: Higiene Pessoal, Alimentar e Ambiental
(3 encontros)
Subtemas:
 Fontes de contaminação.
 Fatores de multiplicação dos microrganismos.
 Higienização de hortaliças e das mãos.
 Escolha e compra dos alimentos.
Módulo 3: Produção de Alimentos
(3 encontros)
Subtemas:
 Horta/Sistema Agroflorestal.
 Fome e Desperdício dos Alimentos.
 Aproveitamento de Alimentos.
 Culinária experimental para aproveitamento total dos
alimentos.
Módulo 4: Rotulagem Nutricional
(1 encontro)
Subtemas:
 Como entender as mensagens dos rótulos.
 Saiba montar lanches saudáveis olhando a informação
nutricional presente nos rótulos de alimentos.
 Alimentos Transgênicos.

Este plano de ação também propõe atividades sobre os


módulos trabalhados nas oficinas com os pais e/ou responsá-
veis dos (de) seus alunos. Sugere-se a realização de encontros
periódicos com os pais, atividades pedagógicas para serem
desenvolvidas em casa, feira de ciências realizada pelos fi-
lhos, permitindo que os pais acompanhem o desempenho
e o engajamento das crianças com relação à temática da ali-
mentação saudável, folder informativo com dicas para uma
alimentação saudável, entre outras atividades.

72 M. de L. F. Rodrigues, J. R. M. da Silva, R. Bernardon, N. Amorim, E. Recine, R. Monteiro e P. Martins


Foi muito bom o plano de ação,... Nos ajudou
muito, um plano de ação é imprescindível. Ele
é importante porque assim é uma meta que eu
tenho que atingir ...com aquele plano de ação
eu vou avaliar se eu atingi aquela meta, se eu
não atingi, né, é um direcionamento... No pla-
no de ação eu determino o objetivo, né, e faço o
possível para alcançá-lo. Nos ajudou muito a
organizar nossas idéias, a gente estabelece nossos
objetivos e depois que a gente colocou tudo em
prática a gente pode ver se a gente conseguiu
obter aquilo que nós tínhamos colocado a prin-
cipio (Educadora do ensino fundamental,
Oficina Educadores, 2005).

As atividades desenvolvidas nas escolas em que atuam os


educadores participantes das oficinas trazem respostas, men-
sagens e aprendizados enriquecedores sobre as experiências
vividas no ambiente escolar e, de modo especial, com as
crianças. A partir desta vivência, a equipe do projeto sugeriu
que cada participante elaborasse o seu “Portfólio Demonstra-
tivo”, contendo os planos de ação e os principais resultados
alcançados, com o objetivo de registrar as atividades desen-
volvidas, além de observar a evolução de todo o processo
formativo sobre os temas trabalhados nas oficinas.

Eu posso ver o crescimento deles e o meu também


e as falhas. A gente viu que muita coisa foi pas-
sada, que a gente recebeu muita coisa de retorno
e também o portfólio, assim a gente vai tendo
todo o feed back né, todo o retorno do que o alu-
no conseguiu assimilar durante esse período de
trabalho, então acho que o portfólio é a vitrine
né (Educadora do ensino fundamental, Oficina
Educadores, 2005).

A ESCOLA PROMOVENDO HÁBITOS ALIMENTARES SAUDÁVEIS 73


A linha de ação do eixo “Cantina Escolar Saudável” con-
siste em cursos de capacitação para os donos de cantina esco-
lar e em desenvolver atividades com os mesmos, no Distrito
Federal, acompanhando a implantação propriamente dita da
Cantina Escolar Saudável. Para viabilizar suas ações, o eixo,
conta com a matriz de implantação denominada “10 Passos
para uma Cantina Saudável” (Quadro 2), criada pelo proje-
to e que está pautada nas orientações para a elaboração de
programas de educação nutricional e nas recomendações de
promoção da alimentação saudável. A referida matriz consis-
te em um seqüenciado de critérios necessários para a efetiva
implantação de uma cantina escolar promotora da alimenta-
ção saudável.
Os 10 passos foram construídos na perspectiva de garantir
as etapas e os aspectos fundamentais para a transição da can-
tina escolar em uma cantina escolar saudável. Cada etapa de-
manda uma série de responsabilidades, atitudes e ações, que
visam, além do seu aspecto operacional, fortalecer a integração
da comunidade escolar e fomentar o envolvimento dos diver-
sos atores envolvidos no processo de educação nutricional.
Quadro 2
10 Passos para uma Cantina Saudável
1o) Participar de cursos em alimentação saudável com
assessoria de um profissional nutricionista para a instrução do
fornecimento de lanches saudáveis.
2o) Contatar a escola e explicar as mudanças desejadas e
almejadas pela lanchonete.
3o) Contatar os pais de alunos e explicar as mudanças almejadas
pela lanchonete.
4o) Promover cursos sobre a manutenção das boas práticas de
fabricação de alimentos.
5o) Reduzir a venda de alimentos ricos em gorduras e açúcares.
6o) Diagnosticar os gostos e preferências de sua clientela
mediante questionário.
7o) Desenvolver um cardápio de lanches ou refeições saudáveis,
de acordo com o diagnóstico dos gostos e preferências da sua
clientela.

74 M. de L. F. Rodrigues, J. R. M. da Silva, R. Bernardon, N. Amorim, E. Recine, R. Monteiro e P. Martins


8o) Elaborar cartazes sobre nutrição e promover incentivos aos
alunos para o consumo de lanches saudáveis.
9o) Formar um grupo de apoio com outros donos de lanchonetes
para troca de experiências.
10o) Estimular a Escola a desenvolver um programa de educação
nutricional contínuo durante todo o ano letivo.

O curso de capacitação em alimentação e nutrição para


proprietários de cantina escolar é realizado na Faculdade de
Ciências da Saúde da Universidade de Brasília, em cinco sá-
bados consecutivos, com duração de 30 horas, sendo 20 horas
destinadas aos encontros e 10 horas para trabalho de campo
a ser executado pelos proprietários de cantina escolar.
O curso é composto por cinco módulos básicos, com te-
mas sobre alimentação saudável, lanches saudáveis, higiene
ambiental e dos alimentos, rotulagem nutricional e como im-
plantar uma cantina saudável. Cada módulo está estruturado
conforme um contexto técnico adequado, segundo a literatu-
ra atualizada, utilizando-se de dinâmicas, vivências e proble-
matização da realidade para a transmissão do conhecimento
técnico e científico. Além disso, durante o curso é abordada
a Lei no 3.695, de 8/11/2005, que dispõe sobre a promoção
da alimentação saudável nas escolas da rede de ensino do
Distrito Federal, bem como a sua aplicabilidade e viabilidade
dentro do ambiente escolar.
Após o curso, durante o período de um ano realizam-se
encontros mensais ou bimestrais, com os proprietários das
cantinas participantes do curso, com o objetivo de monitorar
o processo de implantação da cantina escolar saudável. Datas
e horários dos encontros são definidos com o grupo de parti-
cipantes. Nestes encontros, é possível identificar as principais
dificuldades para a implantação e sugerir possíveis soluções
para que o processo ocorra efetivamente. Esta estratégia ca-
racteriza-se também como um excelente espaço para estimu-
lar a união, cooperação e parceria do grupo de proprietários
de cantinas escolares saudáveis. Como sustentáculo de todo
o processo de implantação e garantia da motivação para a

A ESCOLA PROMOVENDO HÁBITOS ALIMENTARES SAUDÁVEIS 75


mudança de atitudes, após o curso são feitas visitas técnicas
periódicas às cantinas participantes.

Sei que sou uma gota em meio a um oceano, mas


irei fazer a minha parte na reeducação alimen-
tar das crianças da escola das quais me sinto
responsável. Gostei muito de ter participado do
curso ele foi de grande valia para mim (Dona
de cantina – Riacho Fundo I / DF).

Em Brasília, foi regulamentada a Lei no 3.695, de


8/11/2005, oriunda do Projeto de Lei no 1.770/2005, que
contou com a participação efetiva da equipe do projeto A Es-
cola Promovendo Hábitos Alimentares Saudáveis. A referida
lei dispõe sobre a promoção da alimentação saudável nas
escolas da rede de ensino do Distrito Federal e obriga a ad-
ministração da cantina escolar a se capacitar sobre aspectos
de alimentação e nutrição, por no mínimo 15h/aula, minis-
tradas por nutricionistas, devendo o conteúdo programático
conter aspectos de higiene e valor nutricional dos alimentos,
importância dos nutrientes para a promoção da saúde, méto-
dos adequados de preparo de alimentos para a promoção da
saúde, boas práticas de serviços de alimentação, aprovadas
pela RDC no 216, de 2004, da Agência Nacional de Vigi-
lância Sanitária (ANVISA). Essa capacitação será condição
necessária para a concessão de alvará de funcionamento do
estabelecimento.
A lei proíbe a comercialização de determinados produ-
tos no ambiente das escolas de educação infantil, de ensino
fundamental e médio das redes pública e privada de ensino,
bem como a presença de ambulantes nos arredores da escola.
Os alimentos proibidos são balas, pirulitos, gomas de mascar,
biscoitos recheados, refrigerantes, sucos artificiais, salgadinhos
industrializados, frituras em geral, pipoca industrializada, be-
bidas alcoólicas, alimentos industrializados, cujo percentual de
calorias provenientes de gordura saturada ultrapasse 10% das
calorias totais, e alimentos preparados com utilização de gor-

76 M. de L. F. Rodrigues, J. R. M. da Silva, R. Bernardon, N. Amorim, E. Recine, R. Monteiro e P. Martins


dura vegetal hidrogenada. Além das proibições citadas acima,
diariamente a cantina escolar terá de oferecer para consumo
pelo menos uma variedade de fruta da época in natura, inteira
ou em pedaços, ou em forma de suco.
Ainda segundo esta lei, não só as cantinas escolares deve-
rão atuar na promoção da alimentação saudável. As escolas
também deverão adotar em seu conteúdo pedagógico e man-
ter em exposição materiais de comunicação visual sobre os
seguintes temas: alimentação e cultura; refeição balanceada,
grupos de alimentos e suas funções; alimentação e mídia; há-
bitos e estilos de vida saudáveis; preparo e consumo de frutas
e hortaliças, bem como sua importância para a saúde; a ques-
tão da fome e da segurança alimentar; dados científicos sobre
os malefícios do consumo de alimentos cuja comercialização
é vedada. Caberá a escola promover curso de capacitação
para o corpo docente, por meio de profissionais qualificados,
tendo em vista a abordagem multidisciplinar e transversal
desses conteúdos.

No início tive resistência e a lei veio para proi-


bir tudo o que eu vendia na lanchonete. Já tinha
vontade de mudar e o curso foi um apoio para eu
conseguir. Foi como no dito popular: sabendo que
não era impossível fui lá e fiz. Estou muito satis-
feito (Dono de Cantina – Samambaia/DF).

PARCEIROS E VÍNCULOS INSTITUCIONAIS DO PROJETO


Este projeto está vinculado à Universidade de Brasília e
constitui-se em uma das principais linhas de pesquisa do
Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutri-
ção (OPSAN), do Núcleo de Pesquisa em Políticas Públicas
(NP3) da Universidade de Brasília (UnB), e tem o apoio da
Coordenação Geral de Políticas de Alimentação e Nutrição
(CGPAN)/Ministério da Saúde.

A ESCOLA PROMOVENDO HÁBITOS ALIMENTARES SAUDÁVEIS 77


Para a execução de suas atividades, o projeto conta com a
participação de professores do curso de nutrição, nutricionis-
tas, alunos do curso de graduação em nutrição, bolsistas de
projetos de extensão e a assessoria técnica de um pedagogo.

PERSPECTIVA PARA O FUTURO


O projeto vislumbra como cenário futuro, a criação da Esco-
la Saudável e tem envidado esforços para que isso aconteça,
utilizando-se da vasta experiência adquirida no desenvolvi-
mento de metodologias realmente eficientes em promover a
alimentação saudável com toda a comunidade escolar.
Este novo cenário metodológico, conseqüência de um
longo caminho percorrido, utilizará uma abordagem integra-
da das ações e temas sobre alimentação, nutrição e atividade
física, trabalhados no âmbito escolar em que representam a
unidade principal do projeto. A equipe técnica realizará di-
versas atividades com a comunidade escolar, com o intuito
de formar uma rede de ações conjuntas para a promoção da
alimentação saudável na escola. Os atores sociais envolvidos
atuarão juntos na construção da “Escola Saudável”, propi-
ciando a formação de indivíduos conscientes sobre o tema
alimentação e nutrição, capazes, portanto, de tomar decisões
mais saudáveis, no que se refere à escolha dos alimentos e a
sua alimentação propriamente dita.
Essa nova fase apresentará, como diferencial das linhas
de ações atuais do projeto, a inserção e a interação contínuas
e constantes de toda a equipe do ambiente escolar, e a for-
mação de uma rede de apoio entre os atores sociais (direção,
funcionários, pais, educadores, crianças, proprietários de
cantina escolar), fortalecendo assim as linhas de ação traba-
lhadas pelo projeto (Cantina escolar e Formação de educado-
res), prevendo melhores resultados na busca de uma alimen-
tação mais adequada e nutritiva para todos os atores sociais
envolvidos neste trabalho. Além disso, o desenvolvimento
da metodologia Escola Saudável respalda-se na Portaria In-
terministerial no 1.010, de 8 de maio de 2006, que institui
as diretrizes para a Promoção da Alimentação Saudável nas

78 M. de L. F. Rodrigues, J. R. M. da Silva, R. Bernardon, N. Amorim, E. Recine, R. Monteiro e P. Martins


Escolas de educação infantil, fundamental e de nível médio
das redes públicas e privadas, em âmbito nacional.

E eu acho que poderia ter uma presença de vocês


na escola uma vez ou outra, ir na escola com o
teatro de vocês, participassem de mais reuniões
com os pais, o primeiro encontro na escola com os
pais vocês deveriam ir. Vocês poderiam estar jun-
tos na escola, o apoio de vocês a presença na escola
ajudaria, dá uma credibilidade melhor para os
professores e seria melhor para os meninos porque
seriam pessoas diferentes (Educadora do ensi-
no infantil, Oficina Educadores, 2005).

As linhas de ação do Projeto Escola Saudável poderão ser


aplicadas em outras localidades do Brasil, já que as mudanças
no perfil epidemiológico atual da população brasileira e o seu
padrão alimentar, com predominância de uma alimentação
densamente calórica, reforçam a premência de se colocar em
prática medidas que promovam a alimentação saudável, como
as apresentadas neste capítulo. Porém, para intensificar as ações
do projeto em Brasília-DF e nas demais localidades que se mos-
trarem interessadas, é evidente a necessidade do fortalecimento
da interação entre nutrição e pedagogia na execução das ações,
visando a auto-sustentabilidade das diversas atividades realiza-
das nas escolas. Além disso, é imprescindível a busca pelo es-
treitamento de relações com outros campos do saber, como, por
exemplo, comunicação, artes cênicas, estatística em saúde, bem
como procurar identificar as ações do governo para que esta
estratégia educacional seja inserida em um contexto de políti-
ca pública que possa também contribuir na constituição de um
novo cenário de saúde para a população brasileira.

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A ESCOLA PROMOVENDO HÁBITOS ALIMENTARES SAUDÁVEIS 81


FONOAUDIOLOGIA E EDUCAÇÃO
Em busca de uma voz saudável
Mary V. Andrianopoulos
Bianca Noé LaRose

INTRODUÇÃO À PRODUÇÃO VOCAL


E AOS DISTÚRBIOS DA VOZ
A fala é uma atividade única e complexa, mediante a qual os
indivíduos expressam seus pensamentos, emoções e idéias.
E são estas construções abstratas que geram no indivíduo a
necessidade e intenção de se comunicar. A fala é usada para
interação e controle do ambiente humano, é uma ferramenta
valiosa, que permite o seu uso não apenas para a comunica-
ção em geral, mas também para fins ocupacionais, e requer
a integração de vários processos. Para a formação da fala, os
processos lingüísticos de cognição são convertidos em unida-
des semântica, sintática e fonológica, que são, então, trans-
formados nos mecanismos da fala, no planejamento vocal,
e em programas necessários à organização sensório-motora,
coordenação, precisão, e, finalmente, na execução motora da
fala e musculatura vocal. O resultado final da comunicação
mediante a fala envolve a interação entre os seguintes pro-
cessos: fonação, articulação, ressonância e respiração.
A vibração das pregas vocais é a fonte sonora para a fala
e a geração dos sinais acústicos. Este processo, conhecido
como fonação, é a ação física da produção do som por meio
da interação das pregas vocais (ppvv) com o ar expirado. A
fonação depende da força respiratória proveniente dos pul-
mões e da musculatura respiratória. Articulação é a modela-
ção da fonte sonora ou sinal acústico, em formas distintas de
vogais e consoantes e combinações afinadas pelas estruturas
oral, lingual, faríngea e laríngea. Ressonância é a absorção

83
e projeção de moléculas de ar ou sinais acústicos, que mi-
gram por meio dos tubos vocal, oral e nasal. A ressonância
contribui para aspectos únicos da fonação, mediante sons
que são reforçados ou prolongados quando refletem em ou-
tras estruturas do trato vocal. Respiração é a fonte de força
que coloca as moléculas de ar em movimento e as ppvv em
vibração. Uma quebra em um ou em todos estes processos
contribuirá para uma desordem da comunicação. Desordens
da Comunicação são diagnosticadas e tratadas por fonoau-
diólogos/as. Os aspectos médicos e fisiológicos encontrados
em cada desordem da comunicação são tratados por vários
especialistas médicos conforme a natureza do problema, as
desordens específicas e os mecanismos patológicos envolvi-
dos. As especialidades comumente agregadas ao trabalho dos
fonoaudiólogos/as são: clínica médica, otorrinolaringologia,
neurologia, pneumologia, psicologia, psiquiatria, alergologia
e educadores especiais, entre outros. Nos problemas rela-
cionados à voz, fonoaudiólogos trabalham em parceria com
otorrinolaringologistas e professores de técnica vocal para o
estabelecimento do diagnóstico diferencial e a reabilitação
dos distúrbios vocais. Assim também ocorre no treinamento
de profissionais da voz, como cantores, atores e tantos outros
que usam a voz como principal instrumento de trabalho.
De acordo com Titze (1995), nossas vozes revelam quem
somos e como nos sentimos, expondo consideravelmente a
estrutura, funcionamento e saúde do corpo humano. Perkins
(1968) sugeriu que da voz de uma pessoa podemos extrair in-
formações como: saúde física e mental; personalidade; identi-
dade; talento vocal, e outras orientações básicas. Além disso,
nossas vozes são como uma planta arquitetônica, não im-
portando o quanto agradável ou desagradável cada voz soa.
A planta arquitetônica dos sinais acústicos de um indivíduo
pode ser descrita de forma subjetiva (perceptiva) ou objetiva.
As propriedades acústico-perceptivas da voz humana inclui
como a voz soa e a maneira pela qual o ouvinte a percebe.
Em um nível subjetivo, a voz pode ser descrita como muito
aguda ou muito grave, de intensidade muito alta ou muito
baixa, tensa ou comprimida, instável, rouca, soprosa, meló-

84 Mary V. Andrianopoulos e Bianca Noé LaRose


dica, ou monótona. Estas características acústico-perceptivas
são consistentes com vários problemas vocais que possuem
implicações fisiológicas e biomecânicas na vibração e fun-
ção das pregas vocais. A fonação também pode ser medida
objetivamente com gravações acústicas e várias análises de
sinais acústicos como o das estruturas formadoras (freqüência
de ressonância), freqüência fundamental (pitch), intensidade
(volume), ruído (proporção harmônico-ruído), rouquidão
(freqüência de perturbação, jitter), soprosidade (amplitude de
perturbação, shimmer), tremor (contrações alternadas de mes-
ma intensidade nas pregas vocais), e outras aperiodicidades
em geral (número de subharmônicas e ruído espectral).
Segundo Aronson (1990), a voz é percebida como normal,
contanto que esteja de acordo com certas expectativas asso-
ciadas à comunidade, à sociedade, à cultura, à raça, à idade,
ao sexo, e à profissão ou ocupação do indivíduo. A desordem
vocal ou diferença de voz existe quando a qualidade, pitch,
intensidade e flexibilidade da voz de uma pessoa difere das
vozes de outras pessoas de um grupo similar em idade, sexo,
cultura e raça. Os critérios para julgar uma voz como normal,
anormal ou pertencente a um grupo cultural ou racial em
particular dependem do treinamento e orientação da pessoa
que fará este julgamento, da maneira pela qual as medidas
foram obtidas e dos limites normais ou “dados normativos”
aos quais a informação obtida será comparada (ANDRIA-
NOPOULOS, DARROW, CHEN, 2001; ANDRIANOPOULOS,
DARROW, CHEN, 2001). Dados normativos objetivos da mé-
dia de freqüência fundamental têm sido obtidos a partir de
grandes amostras de adolescentes e adultos norte-americanos
caucasianos, do sexo masculino, atuando em várias ativida-
des (BAKEN e ORLIKOFF, 2000). Diferenças de sexo e idade
na freqüência fundamental em adolescentes e adultos nor-
te-americanos caucasianos do sexo feminino encontram-se
disponíveis numa menor escala (MICHEL, HOLLIEN, 1968;
HOLLIEN, PAUL, 1969; MCGLONE, HOLLIEN, 1963; LINKE,
1973; SAXMAN, BURKE, 1967, STOICHEFF, 1981, BAKEN,
1987; NITTROUER, MCGOWAN, MILENKOVIC, BEEHLER,
1990). Diferenças da freqüência fundamental da fala e outras

FONOAUDIOLOGIA E EDUCAÇÃO 85
características vocais obtidas em várias línguas nativas têm
sido apresentadas por algumas culturas e raças, mas ainda
assim os dados são escassos e limitados (WHEAT, HUDSON,
1988; MAYO, MANNING, 1994; WALTON, ORLIKOFF, 1994;
MAYO, GRANT, 1995; TRENT, 1995; AWAN, MUELLER, 1996;
XUE, MUELLER, 1996; SAPIENZA, 1997; XUE, FUCCI, 2000;
ANDRIANOPOULOS, DARROW, CHEN, 2001; XUE, NEELEY,
HAGSTROM, HAO, 2001; XUE, HAGSTROM, & HAO, 2002;
ALTENBERG, FERRAND, 2005). Existe claramente a necessi-
dade de se estabelecer uma database internacional de dados
normativos de medição vocal padrão para que especialistas
da voz e fonoaudiólogos/as possam comparar dados objeti-
vos instrumentais para idade, sexo, cultura e raça, com o pro-
pósito de estabelecer uma distinção entre diferenças vocais e
distúrbios vocais clínicos. Medições instrumentais de função
vocal e saúde vocal também são obtidas através do uso de
imagem estroboscópica da laringe e ppvv, medidas aerodinâ-
micas, eletroglotografia (EGG) e eletromiografia (EMG).
Profissionais que fazem uso extensivo da voz em suas ocu-
pações precisam entender os mecanismos e manutenção do
estado saudável do seu instrumento vocal, para que possam
então usá-lo efetiva e eficientemente. Entre estes profissionais
estão incluídos cantores, atores, professores, vendedores, te-
lemarketers, telefonistas, palestrantes, advogados, técnicos es-
portistas e outros. Quanto mais um indivíduo depende da
voz para fins ocupacionais, mais devastadores são os efeitos
dos problemas vocais na qualidade de vida desta pessoa, não
importando a gravidade do problema. A Tabela 1 enume-
ra várias categorias de problemas vocais, exemplificando
problemas de base neurogênica, problemas sistêmicos que
afetam a voz e a laringe, mudanças estruturais afetando os
tecidos da laringe e das ppvv, distúrbios devido ao mau uso
e abuso da voz, contribuindo com fonotraumas, lesões trau-
máticas, problemas de base psicogênica ou de personalidade,
entre outros transtornos vocais e laríngeos.

86 Mary V. Andrianopoulos e Bianca Noé LaRose


Tabela 1. Categorias dos problemas vocais
Distúrbios vocais associados ao sistema nervoso
Distúrbios motores
 Apraxia da fala
da fala
 Disartria
 Espástica: paralisia pseudobulbar,
neurônio motor superior bilateral
 Hipocinética: doença de Parkinson
 Hipercinética: distonia, coréia
 Flácida: miastenia grave
 Mista: esclerose múltipla, ELA
 Paralisia unilateral ou bilateral das
pregas vocais
 Nervo faríngeo: ressonância nasal
Paralisia das pregas
 Nervo superior laríngeo: músculo
vocais
cricotireóideo
 Nervo laríngeo recorrente: adutor/
abdutor
Disfonia espasmódica  Adutor, abdutor, ou mista
 Gânglios da base ou envolvimento
Tremor vocal
cerebelar
Distúrbios sistêmicos que afetam a mucosa laríngea
e as pregas vocais
 Hipertiroidismo, hipotiroidismo,
hiperpituitária
Endócrinos  Amiloidose
 Hormônio de crescimento;
Desequilíbrio de hormônios sexuais
 Alergias
Imunológico
 Artrite reumatóide
Refluxo ácido  Refluxo laringo-faríngeo (RLF)
 Respiratória
Doenças infecciosas
 Bacterial ou viral
Mudanças estruturais que afetam a mucosa laríngea
e a das pregas vocais
Lesões vasculares  Hemorragia, variz
 Nódulos, pólipos, papiloma
Lesões benignas
 Granuloma, úlcera de contato
Edema de Reinke  Degeneração polipoidea

FONOAUDIOLOGIA E EDUCAÇÃO 87
Inflamatória  Laringite, aguda ou crônica
 Hiperplasia, leucoplasia,
Mudanças epitelianas
hiperqueratose
Congênita ou
 Diafragma laríngeo
adquirida
Processo de
 Presbifonia
envelhecimento
Sulco Vocal  Congênita ou adquirida
Distúrbios vocais secundários do uso vocal
Fonotrauma  Mau uso/Abuso vocal
Uso excessivo da voz  Fadiga vocal
 Disfonia por Tensão Muscular (DTM
Tensão muscular
– I-IV)
Mudanca de sexo  Transexual
Traumática
Cirúrgica ou por
 Dano direto ou indireto do Nervo vago
injúria
Problemas psicogênicos
Psicossomático  Disfonia psicogênica
Estresse  Ambiental ou mental
Personalidade  Identidade ou tratos de caráter pessoal
Outros  Problemas de identidade
Problemas laríngeos e respiratórios
Obstrução aguda das  Movimentos Paradóxicos de Pregas
vias aéreas superiores Vocais (MPPV)
Problemas congênitos
 Estenose subglótica, laringomalácia
das vias aéreas
Irritação laríngea  Tosse crônica, pigarro, MPPV, RLF

RISCOS OCUPACIONAIS QUE


AFETAM A VOZ DO PROFESSOR
Herrington-Hall et al. (1988) constataram que, entre 73 dife-
rentes ocupações em uma amostra de 1,262 clientes atendidos
pela otorrinolaringologia nos Estados Unidos, os 10 grupos
atendidos com mais freqüência eram: aposentados, traba-
lhadores do lar, operários, desempregados, administradores
executivos, professores, estudantes, secretários, cantores, e

88 Mary V. Andrianopoulos e Bianca Noé LaRose


enfermeiros. Todos os 10 grupos, com exceção dos aposenta-
dos, exibiram problemas vocais primariamente causados por
mau uso e abuso vocal. Em um outro estudo epidemiológico
conduzido por Fritzell (1995), de 1.484 clientes atendidos por
especialistas em foniatria na Suécia, professores foram identi-
ficados como os profissionais mais comuns nos atendimentos
de problemas relacionados à voz. De acordo com Titze, Le-
mke, & Montequin (1997), professores apresentam a maior
incidência de distúrbios vocais e estão na categoria de maior
risco de depredação de suas carreiras e ocupações, dada à
demanda vocal de sua profissão.
A prevalência de distúrbios vocais nos Estados Unidos
está estimada entre 3% e 9% da população geral. Estimati-
vas sobre a prevalência de distúrbios vocais em professores
varia consideravelmente. Roy et al. (2004) relataram numa
amostra de população de 2,531 indivíduos nos Estados Uni-
dos, que a prevalência de distúrbios vocais em professores
(11,0%) era significantemente maior quando comparada a
não-professores (6,2%). Estes autores também sugeriram que
a prevalência de distúrbios vocais na vida destes indivíduos
era significantemente maior em professores do que em não-
professores (57,7% vs. 28,8%, respectivamente). Neste estu-
do de prevalência, Roy et al. (2004) também relataram que
aproximadamente 14,3% de professores comparados a 5,5%
de não-professores, visitaram um médico ou fonoaudiólogo
para avaliação e tratamento de distúrbios vocais.
Com respeito à diferença entre sexos, Smith et al. (1998)
constataram que professoras (38%), comparadas a professo-
res (26%), reportaram significantemente mais sintomas de
distúrbios vocais, apesar da similaridade de responsabilidade
de ensino e anos de trabalho entre os dois grupos. Miller e
Verdolini (1995) relataram achados similares, no que diz res-
peito à diferença entre sexos, nos quais professoras de canto
estavam duas vezes mais propensas a relatar distúrbios vocais
passados quando comparadas a professores do sexo oposto, e
indivíduos mais jovens estavam mais propensos a relatar dis-
túrbios vocais passados quando comparados a indivíduos de
mais idade. Mais recentemente, Roy et al. (2004) relataram

FONOAUDIOLOGIA E EDUCAÇÃO 89
diferenças entre sexos em 46,3% de mulheres comparadas
a 36,9% de homens, na qual elas não somente tiveram uma
prevalência mais alta de distúrbios vocais durante a vida,
como também tiveram uma prevalência significantemente
mais alta de distúrbios vocais crônicos, com duração de mais
de quatro semanas.
No decorrer da década passada, numerosos estudos em-
píricos publicados relataram os problemas negativos rela-
cionados ao magistério como uma ocupação e o início de
problemas vocais. Smith et al. (1998) constataram que 38%
de 554 professores/as se queixaram de que esta profissão tem
afetado negativamente suas vozes e que 39% tiveram de re-
duzir a carga horária de ensino direto como resultado. Nesta
investigação, Smith et al. (1998) relataram que 20% dos pro-
fessores/as neste estudo faltaram ao trabalho devido a distúr-
bios vocais, durante o ano de emprego anterior. Ausências no
trabalho devido a distúrbios vocais também foram relatados
por Sapir, Keidar, & Mathers-Schmidt (1993). Estes autores
constataram que, entre 237 professores, mais que um terço
deles perderam dias de trabalho devido a distúrbios vocais.
Ortiz et al. (2004) investigaram a prevalência de distúrbios da
voz no Brasil, utilizando um protocolo de diagnóstico multi-
disciplinar para descartar disfonia em usuários de voz pro-
fissional. Estes autores relataram que 40% dos participantes
afirmaram que o início da disfonia estava relacionado com o
trabalho, dada à demanda vocal de suas profissões. Ortiz et
al. (2004) ressaltaram que distúrbios vocais no ambiente pro-
fissional têm aumentado e que a produção econômica tem
sido afetada.
Evidências empíricas claramente apóiam que o início de
problemas relacionados à voz é um significante risco ocupa-
cional para professores. O desencadeamento de distúrbios
vocais não só põe em risco a carreira e a qualidade de vida
do professor, como também afeta negativamente a econo-
mia nacional do País, com respeito à perda de trabalho e às
despesas médicas impostas tanto ao cliente quanto às com-
panhias de seguro e aos convênios de saúde. Verdolini e Ra-
mig (2001) relataram que aproximadamente 25% ou mais da

90 Mary V. Andrianopoulos e Bianca Noé LaRose


força trabalhista nos Estados Unidos, ou aproximadamente
28.000.000 de pessoas, dependem da voz como um crítico
aspecto de suas ocupações. Estes autores também estimaram,
baseados em dados publicados pelo censo, que o custo cole-
tivo de distúrbios vocais somente entre professores fica em
torno de US$2,5 bilhões anualmente.
Os fatores que contribuem para a voz anormal mais fre-
qüentemente relatados incluem o mau uso e abuso da voz ou
comportamento fonotraumático, como: falar alto, gritar, cho-
rar com força, ataque glótico brusco, cantar e falar fora dos
limites fisiológicos aceitáveis para cada indivíduo, falar em
ambiente ruidoso, limpeza freqüente e excessiva da gargan-
ta, tossir, falar excessivamente, gargalhar alto e com força,
e falar quando tecidos das ppvv e laringe estão inflamados
( JOHNSON, 1994). Em um estudo com 1.243 professores e
1.279 não-professores, Roy et al. (2004) relataram que profes-
sores vivenciaram significantemente mais sintomas relacio-
nados à voz, assim como à laringe e à faringe, do que os não-
professores. Os sintomas mais freqüentemente relatados por
professores neste estudo incluíram: rouquidão, fadiga vocal,
problemas para falar ou cantar; dificuldade de projetar a voz;
desconforto durante a fala; voz monótona; esforço para falar,
dor de garganta; e garganta seca crônica, pigarro freqüente,
gosto amargo ou azedo, dificuldade para engolir, e voz instá-
vel ou trêmula (ROY et al., 2004). Muitos dos problemas de
voz vivenciados por professores eram de natureza ocupacio-
nal ou relacionados de alguma forma com o trabalho.
Thomas et al. (2006) estudaram a associação entre vários
fatores de risco e queixas de voz em 457 estudantes do ma-
gistério do sexo feminino e 144 indivíduos do mesmo sexo
da população em geral. Fatores de risco associados com o
aparecimento de queixas de voz em estudantes do magisté-
rio que foram comparados ao grupo de controle incluíram
os seguintes: problemas de abastecimento vocal (uso da voz
por > 20 horas por semana e número de parceiros de comu-
nicação por semana), fatores físicos (diminuição de audição,
queixas de pescoço e ombro, queixas de coluna lombar, pro-
blemas da mucosa e deterioração de condições em geral),

FONOAUDIOLOGIA E EDUCAÇÃO 91
fatores ambientais (acústica da sala, umidade, temperatura
e substâncias irritativas) e fatores psicoemocionais (estresse,
emoção, composição de grupos e pressão no trabalho). Os
impactos coletivos e econômicos de problemas relacionados
à voz entre professores sem dúvida afetam a atuação no tra-
balho, a freqüência e possivelmente a escolha de carreira.
Parece lógico que educação, prevenção e tratamento precoce
de problemas da voz relacionados ao trabalho seja a aborda-
gem ideal e de baixo custo para minimizar estes problemas
em professores. A seguir, serão revisadas várias abordagens
terapêuticas que têm sido utilizadas por profissionais que fa-
zem extensivo uso da voz e apresentam disfonia.

ABORDAGENS TERAPÊUTICAS RECOMENDADAS PARA


ALIVIAR PROBLEMAS DE VOZ EM PROFESSORES
Para melhor prevenção e reabilitação da voz profissional, o
profissional deverá distinguir a diferença entre mau uso vocal
e seus sintomas e abuso vocal e sintomas associados a este.
O mau uso vocal consiste nos seguintes comportamentos e
sintomas vocais e laríngeos: tensão aumentada e voz compri-
mida, ataque glótico, posicionamento demasiadamente ele-
vado da laringe, compressão ântero-posterior da laringe e/ou
compressão supraglótica das paredes laterais da laringe em
direção a linha mediana, nível de freqüência inapropriado,
glottal fry (vibração das pregas vocais em freqüência abaixo
do normal) ou registro pulsatório persistente, monotonia e
fala excessiva. O abuso vocal ou comportamento laríngeo
abusivo, comumente referidos como comportamento fono-
traumático, consiste em: altura excessiva e prolongada da
voz, uso excessivo e tenso da voz durante processos infla-
matórios das ppvv e laringe, tosse excessiva, pigarro e grito.
Patologias vocais, como nódulos, pólipos e cistos nas ppvv
podem ser o resultado do mau uso ou abuso vocal intenso ou
de longo prazo (COLTON e CASPER, 1996).
Os potenciais efeitos colaterais de vários medicamentos
(prescritos ou não) podem também exacerbar problemas vo-
cais e laríngeos em usuários da voz profissional. Professores

92 Mary V. Andrianopoulos e Bianca Noé LaRose


devem estar alerta a estes efeitos colaterais e também aos
efeitos sistêmicos de vários medicamentos e outros produtos,
assim como drogas ilegais que possam estar tomando. Por
exemplo, estimulantes do Sistema Nervoso Central (SNC),
depressantes do SNC e anestésicos podem afetar a coordena-
ção e propriocepção da fala e do sistema fonatório. Broncodi-
latadores e constrictores podem afetar o fluxo aéreo, enquan-
to diuréticos, decongestionantes e corticóides podem afetar
a hidratação da mucosa e tecidos das ppvv. Vários agentes
desidratantes, como anti-histamínicos e antiespasmódicos, e
agentes hidratantes, como expectorantes, alteram as secre-
ções no trato superior. Andrógenos, para o aumento de mas-
sa muscular em halterofilistas e tratamento de desequilíbrio
hormonal, podem afetar a estrutura ou massa das ppvv e a
qualidade vocal resultante. Os efeitos do refluxo gastroesofá-
gico (GER) e refluxo laringo-faríngeo (RLF) sem dúvida po-
dem irritar o tecido das ppvv e a camada externa dos tratos
laríngeo e faríngeo, alterando a qualidade vocal. Por último,
gotejamento pós-nasal (secreção nas vias respiratórias supe-
riores), histórico familiar de problemas vocais, consumo de
tabaco e álcool têm sido percebidos como fatores que intensi-
ficam ou aumentam o risco de um indivíduo vir a apresentar
problemas vocais. Fonoaudiólogos que tratam de professores
com problemas vocais deveriam questionar sobre o uso de
todo e qualquer medicamento.
A terapêutica de problemas vocais em professores pode
ser idealizada focando três áreas principais: 1) Educação vo-
cal; 2) prevenção de problemas da voz; e 3) reabilitação de
sintomas e problemas irregulares da voz. A abordagem mul-
tidisciplinar, utilizando conhecimentos da otorrinolaringolo-
gia, fonoaudiologia e outras especialidades médicas quando
necessário, é o passo inicial para o diagnóstico diferencial
de problemas da voz. O tratamento deverá ser formatado
conforme a necessidade do professor e cliente, dependendo
da natureza do problema e problemas associados. A Tabela 2
ilustra a tradicional abordagem organizada de acordo com o
uso do método sintoma por sintoma que elimina e reabilita os
problemas vocais mais freqüentemente relatados e observa-

FONOAUDIOLOGIA E EDUCAÇÃO 93
dos em professores. A eficácia de muitos destes tratamentos
terapêuticos para remediar problemas vocais em professores,
não tem sido estabelecida até o momento.
Tabela 2. Problemas mais freqüentemente relatados em professores
e exemplos de abordagens utilizadas para eliminação e alívio de
sintomas de voz e laringe, associados com o mau uso e abuso vocal
relacionados ao trabalho
Sintoma vocal e problema Abordagem terapêutica
Fatores de mau uso vocal/ Fatores de tensão muscular
 Postura elevada da laringe  Técnica manual
 Aumento de tensão e circunlaríngea
compressão vocal  Pressão laríngea + massagem
 Aperto A-P da laringe +  Rotação de cabeça +
PPVV alongamento
 Aperto supraglótico látero-  Técnicas gerais de
medial relaxamento
 Dores crônicas de laringe  Bocejo-expiração alta e lenta
 Dificuldade de engolir  Efeitos sonoros de lábio e
estrutura oral
Fatores fonatórios
 Fadiga vocal  Exercícios de aquecimento
vocal
 Exercícios de função vocal
 Hidratação
 Nível de pitch inapropriado  Exercícios de função vocal
 glottal fry persistente ou  Terapia de ressonância vocal
registro pulsatorio  Perfil de limite vocal
 Ausência de variação de pitch (Phonetograma)
 Rouquidão  Imagens
 Fala/Canto fora do limite  Chanta – Fala
individual
 Problemas para falar ou
cantar
 Voz monótona
Abuso vocal
 Fala excessiva  Higiene vocal, economia de
fala
 Altura excessiva e  Amplificação da voz
prolongada

94 Mary V. Andrianopoulos e Bianca Noé LaRose


 Uso excessivo e comprimido  Descanso da voz e higiene
da voz durante processos vocal
inflamatórios
 Tosse e limpeza de garganta  Higiene vocal
excessivos  Hidratação
 Gritar  Início gentil da fala
 Ataques glotais bruscos
Fatores ambientais
 Acústica da sala  Amplificação da voz
 Eliminação do nível de
ruídos ambientais
 Irritantes  Eliminação dos irritantes na
atmosfera
Fatores psicoemocionais
 Estresse: emocional e mental  Aconselhamento,
 Pressão no trabalho relaxamento em geral
 Grupos de apoio, suporte
pessoal próprio
Equilíbrio de fluido/Fluid balance
 Garganta seca crônica  Hidratação
 Explorar os efeitos colaterais
de medicamentos
Fatores sistêmicos
 Gosto amargo ou ácido  Administração medicamentosa
do refluxo-ácido
 Mudanças de dieta + estilo
de vida
Nota: a. Recitar repetidamente uma melodia monotonal.

A EFICÁCIA DA ABORDAGEM TERAPÊUTICA


PARA PROFESSORES
Fadiga vocal é o risco ocupacional mais comum em profes-
sores e ocorre quando um indivíduo coloca intensa demanda
no mecanismo vocal, normalmente através do uso excessi-
vo. Como resultado, a fadiga vocal pode ser definida como
exaustão da voz e mecanismo vocal após extensivo uso. La-
ringe e faringe secas são sintomas comuns de fadiga vocal
(STEMPLE et al., 1995). Alguns pesquisadores têm investiga-

FONOAUDIOLOGIA E EDUCAÇÃO 95
do métodos para aliviar a fadiga vocal em profissionais que
fazem uso intenso da voz usando programas de hidratação e
aquecimento vocal. Resultados publicados referentes à eficá-
cia destas abordagens variam em termos de evidências em-
píricas da eficácia dos mesmos. No entanto, a maioria dos
indivíduos que usaram estes métodos relatou uma redução
significante nas condições causadas pela fadiga vocal (ROY
et al., 2001).
Milbrath e Solomon (2003) relataram resultados clínicos
não conclusivos a respeito dos benefícios dos exercícios de
aquecimento vocal no alívio da fadiga vocal. Existe uma
variedade de técnicas de aquecimento relatadas na literatu-
ra. No entanto, as que têm recebido maior atenção incluem
Exercícios de Função Vocal (EFV), desenvolvidos por Stem-
ple et al. (1994), que foram planejados para balancear os sub-
sistemas fonatório, respiratório e ressonantório. Estes autores
revelaram uma melhora ocorrida após um período de quatro
a seis semanas de repetidas práticas diárias do EFV em adul-
tos jovens saudáveis e de vozes normais.
A duração dos exercícios de aquecimento vocal no trata-
mento varia significantemente. Blaylock (1999) demonstrou
que o aquecimento vocal administrado por um período de
pouco mais de quatro meses e meio foi efetivo no tratamento
de indivíduos com desordens relacionadas à voz. Outros in-
vestigadores têm mostrado que os exercícios de aquecimento
são efetivos imediatamente após a administração dos mes-
mos (MILBRATH & SOLOMON, 2003). Baseado nestes acha-
dos considera-se que os exercícios de aquecimento apresen-
tam melhores resultados imediatamente após sua execução e
também quando executados por um período regular.
Terapia de hidratação é outra técnica que tem sido usada
para reduzir a fadiga vocal. Titze (1983) sugeriu que a onda
de mucosa, uma camada tecidual na superfície das ppvv, tem
um papel muito importante em manter a voz saudável. A
facilidade da vibração das ppvv é diretamente relacionada
com a estrutura da camada mucosa, e como resultado, hi-
dratação própria e adequada do fluido corporal é necessária
(VERDOLINI-MARSTON et al., 1990). Estes autores enfatizam

96 Mary V. Andrianopoulos e Bianca Noé LaRose


a importância da hidratação do tecido das ppvv para otimizar
a saúde vocal. Verdolini-Marston et al. (1994) avaliaram um
grupo de seis mulheres com nódulos vocais e trataram cada
uma com a terapia de hidratação, seguido por um período
em que elas receberam um tratamento de placebo. Estes au-
tores sugeriram que terapia de hidratação é útil e efetiva no
alívio da fadiga vocal e distúrbios vocais. Yiu e Chan (2003)
demonstraram que a hidratação foi uma técnica muito útil no
alívio da fadiga vocal em 20 cantores amadores de karaokê,
que receberam terapia de hidratação, comparados a um gru-
po-controle.
No entanto, pesquisas publicadas sobre a terapia de hi-
dratação tem proporcionado resultados divergentes. Os re-
sultados da investigação de Solomon e DiMattia (2000) su-
geriram que a terapia de hidratação é benéfica, no entanto,
a inconsistência nos resultados obtidos por estes autores e a
falta de uma significante estatística levantaram algumas ques-
tões sobre a efetividade deste tratamento. Em uma testagem
clínica aleatória de 15 participantes normais, designados em
um de três grupos de tratamento, Donohue, Andrianopoulos,
& Whitmal (2006) demonstraram que a terapia de hidrata-
ção aliviou muito mais a fadiga vocal do que os exercícios
de aquecimento vocal, comparados ao grupo-controle sem
tratamento. Diferenças significantes entre os grupos apóiam
os benefícios da terapia de hidratação, dado que participan-
tes deste grupo mostraram menor deterioração vocal seguida
de atividades de demanda vocal intensiva, comparadas aos
grupos de exercícios de aquecimento vocal e aos sem trata-
mento.
Evidências empíricas publicadas têm mostrado alguns
benefícios no tratamento de problemas relacionados à voz
em professores, utilizando técnicas como amplificação vocal
e exercícios de função vocal. Numa série de testagens clíni-
cas, Roy et al. (2001, 2002, 2003) compararam os benefícios
dos efeitos da combinação de técnicas de reabilitação vocal
para professores, que incluem: amplificação vocal, usando o
amplificador portátil ChatterVox, instruções de higiene vocal,
Exercícios de Função Vocal (EFV), Terapia de Ressonância

FONOAUDIOLOGIA E EDUCAÇÃO 97
(TR), e Treinamento da Musculatura Respiratória (TMR).
Em uma testagem clínica aleatória envolvendo 58 professo-
res designados em um de dois grupos de tratamento (higiene
vocal versus exercícios de função vocal), Roy et al. (2001) re-
lataram diferenças significantes entre grupos de tratamento
designados com o EFV. Estes autores afirmaram que o EFV
deveria ser considerado como uma útil alternativa ou com-
plemento aos programas de higiene vocal no tratamento de
distúrbios vocais em professores. Em outro estudo de contro-
le, também aleatório, por Roy et al. (2002), 44 professores
com problemas de voz foram designados em um de três gru-
pos de tratamento: amplificação vocal usando o aparato de
amplificação ChatterVox, higiene vocal, e um grupo-controle
sem tratamento. Os professores designados para o grupo de
amplificação vocal revelaram significante melhora nas me-
dições resultantes no pós-tratamento, comparadas aos dados
obtidos antes do tratamento. Estes achados apóiam a utili-
dade clínica da amplificação vocal como alternativa para o
tratamento de problemas vocais em professores.
Por último, Roy et al. (2003) compararam os efeitos bené-
ficos de três abordagens de tratamento: amplificação vocal
usando o ChatterVox, Terapia de Ressonância (RT) e Treina-
mento da Musculação Respiratória (TMR) em 64 professores
com problemas de voz. Nesse estudo, o grupo de professores
designados a abordagem de amplificação vocal demonstrou
significativa melhora geral da voz, maior claridade vocal, e
maior facilidade de fala após o tratamento. Estes estudos são
apenas um passo na direção certa para a constatação estatística
da eficácia de alguns programas de tratamento freqüentemen-
te administrados em professores com problemas de voz.
Embora muitos estudos empíricos demonstrassem signifi-
cância estatística, a maioria das investigações tem falhado em
conduzir medições estatísticas de Tamanho do Efeito (TE)
para demonstrar significância clínica de seus achados sobre
tratamentos. Isto significa que ainda que uma investigação
tenha demonstrado diferenças estatísticas entre grupo ou for-
ma individual pós-tratamento, comparadas às mudanças do
pré-tratamento, o tamanho do efeito, ou significância clínica

98 Mary V. Andrianopoulos e Bianca Noé LaRose


ou prática, destas diferenças são desconhecidas. É difícil de-
terminar se estas diferenças nas abordagens terapêuticas são
um resultado de chance ou mudança devido a outros fatores
que não seja o próprio tratamento. Além do mais, não se
sabe o quanto de sobreposição ocorreu entre os grupos expe-
rimental e de tratamento nestes estudos empíricos sem evi-
dência de TE, mesmo que a evidência empírica tenha identi-
ficado os benefícios de algumas destas técnicas de tratamento
como amplificação vocal, exercícios de aquecimento vocal,
exercícios de função vocal, e terapia de hidratação, existe a
necessidade de demonstrar os benefícios destas abordagens
terapêuticas numa série de estudos em testagens clínicas de
larga escala que incluam medições de TE e outras proprieda-
des de testes psicométricos.

PRÁTICA BASEADA EM EVIDÊNCIA NA FONOAUDIOLOGIA


Prática baseada em evidência (PBE) está rapidamente trans-
formando pesquisas e práticas atuais e futuras num nível in-
ternacional, envolvendo o campo da fonoaudiologia. Esta
prática originou-se no campo da Medicina por volta da me-
tade do século XIX e desde então tem se diversificado para
incluir a Fonoaudiologia e muitas outras profissões centrali-
zadas no cliente, que reconhecem o valor do uso de pesquisas
de alta qualidade para dar base a métodos clínicos existentes
(SACKETT et al., 1996). Com estes métodos geralmente ques-
tionados por convênios de saúde e revisões de jornais acadê-
micos, fonoaudiólogos têm sido progressivamente forçados a
mostrar evidência empírica para dar base e substância ao uso
de vários métodos de tratamentos. Assim, experiência clínica
e opinião de especialistas somente não são mais adequados
para servir de base ao uso de certas práticas terapêuticas para
desordens em particular. A prática de considerar a opinião
de especialistas na base da reputação ou recomendação está
rapidamente sendo trocada por um sistema consciente que
luta para incorporar experiência clínica, evidência científica
predominante e valores dos clientes no processo clínico de
tomada de decisões (ASHA, 2004a).

FONOAUDIOLOGIA E EDUCAÇÃO 99
Sackett et al. (1996) definiram PBE como
o uso consciente, explícito, e judiciário de melhores
evidências atuais na tomada de decisões sobre o cui-
dado de pacientes individuais…por integrar expe-
riência clínica individual com a melhor evidência
clínica externa disponível provenientes de pesquisas
sistemáticas (p. 1).

Diferentes tipos de evidências podem ser avaliados apli-


cando certas regras básicas à eficácia do tratamento em ques-
tão, para determinar se a pesquisa, diagnóstico ou abordagem
terapêutica tem cumprido com sucesso ou não os critérios
recomendados para PBE. Andrianopoulos, Whitmal, & As-
tin (2005) organizaram e publicaram uma lista de critérios
recomendados, para ajudar na determinação de como iden-
tificar se publicações acadêmicas no campo da voz estão de
acordo com os requisitos para demonstrar PBE nos últimos
10 anos. Os autores ressaltaram que pesquisas de alta quali-
dade deveriam atender a todos ou pelo menos a quase todos
os critérios recomendados e publicados e que, por meio des-
tes critérios, o leitor possa estabelecer o nível com que este
estudo satisfaz os requerimentos recomendados para PBE
e a qualidade de explicações e significância destes critérios
no processo da pesquisa. Andrianopoulos, Whitmal e Astin
(2005) selecionaram os seguintes critérios ou variáveis para
estudo, de maneira a avaliar cada artigo publicado (referen-
te a tratamentos vocais) entre o período de 1998 e 2005: 1)
planejamento do grupo do estudo (revisão prospectiva versus
retrospectiva); 2) seleção subjetiva de critérios (selecionados
aleatoriamente, critérios de inclusão versus exclusão); 3) nú-
mero de indivíduos e grupos de indivíduos; 4) descrição da
etiologia ou desordem sendo tratada; 5) presença e descrição
de variáveis dependentes e independentes; 6) uso do proce-
dimento cego; 7) se de alguma forma melhoras relacionadas
às variáveis independentes foram observadas; 8) se teste de
significância foi conduzido e qual a correspondência dos va-
lores de significância; e 9) se a pesquisa incluiu medições de

100 Mary V. Andrianopoulos e Bianca Noé LaRose


tamanho do efeito, confiabilidade, validade e intervalos de
confiança.
Os autores conduziram uma revisão da literatura, usando
inúmeras formas de procura para localizar todos os artigos
de estudos da voz, relatando abordagens terapêuticas que fo-
ram administradas por fonoaudiólogos para reabilitação de
distúrbios vocais, publicados durante o período de 1998 a
2005. No decorrer dos últimos 10 anos, os investigadores lo-
calizaram um total de aproximadamente 90 artigos publica-
dos em jornais de Medicina e Fonoaudiologia, relacionados à
reabilitação vocal. No entanto, os pesquisadores eliminaram
os estudos empíricos que envolviam intervenções cirúrgicas,
médicas e farmacológicas, que não são administradas por fo-
noaudiólogos. Uma vez que os artigos irrelevantes foram ex-
cluídos, o número final de artigos revisados para PBE foi de
49 artigos. As questões de pesquisa nesta investigação foram
as seguintes: 1) Existe evidência empírica para apoiar PBE no
que diz respeito a práticas de tratamento de terapia vocal
publicadas e administradas por fonoaudiólogos em pacientes
com desordens vocais? e 2) Usando uma lista de critérios ou
variáveis (mensuráveis) recomendados, qual a evidência em-
pírica que existe para apoiar PBE na fonoaudiologia?. Entre
os 49 estudos revisados, 96% eram de planejamento prospec-
tivo e 4% eram estudos retrospectivos. A Tabela 3 ilustra os
resultados obtidos que cada estudo empírico revisado rela-
tou: a) critério de seleção de indivíduos no que diz respeito
a critérios de inclusão e exclusão; b) utilização ou não de se-
leção aleatória de indivíduos designados nos grupos de trata-
mento e procedimento cego em cada estudo. Como se pode
notar, na Tabela 3, 90% das investigações não empregaram
procedimento cego e 71% não selecionaram aleatoriamen-
te os participantes para os vários regimes de tratamento em
seus estudos.

FONOAUDIOLOGIA E EDUCAÇÃO 101


Tabela 3. A porcentagem e número de estudos entre os 49 estudos
revisados que estavam de acordo com os critérios para PBE
Critério Resposta Percentual Número
(%) de estudos
Critérios de seleção Somente inclusão 67 33
de indivíduos Inclusão + exclusão 33 16
Sim 29 14
Sistema aleatório
Não 71 35
Procedimento Sim 10 15
cego Não 90 44

A Tabela 4 identifica, dentre os 49 estudos revisados, o


número de estudos que estava de acordo com os seguintes
critérios psicométricos para PBE, como relatado por autores
em cada estudo: 1) cálculo e relato da medição do tamanho
do efeito; 2) intervalos de confiança; 3) significância estatísti-
ca; 4) medições de confiabilidade; e 5) se os autores de cada
investigação empírica indicaram ou não que os efeitos do
tratamento de voz, no seu estudo em particular, proporcio-
naram efeitos benéficos à amostra clínica de população com
problemas de voz.
Tabela 4. A porcentagem e número de estudos dentre os 49 estudos
revisados que estavam de acordo com os critérios relativos ao teste de
propriedade psicométrica para PBE
Critério Sim Número Não Número
Relato de medição do TE 12% 6 88% 43
Relato de intervalos de confiança 6% 3 94% 46
Relato de significância estatística 71% 35 29% 14
Relato de medição de
29% 14 71% 35
confiabilidade
Validade 0% 0 100% 49
Relato de mudanças percebidas
94% 46 6% 3
pelos autores do estudo empírico

Como pode ser observado na Tabela 4, a maioria dos


autores demonstraram significância estatística e relataram
impressões subjetivas de melhora nos grupos de tratamento

102 Mary V. Andrianopoulos e Bianca Noé LaRose


experimental. No entanto, os autores da maioria destes es-
tudos empíricos não mensuraram o tamanho do efeito, nem
os intervalos de confiança, confiabilidade, e medições de va-
lidade para estabelecer evidências psicométricas. Em suma,
esta investigação revelou que, entre os 49 estudos empíricos
revisados sobre os efeitos benéficos de alguns tratamentos de
voz, revelou que 94% dos investigadores relataram mudan-
ças secundárias aos seus programas de tratamento adminis-
trados a grupos experimentais; 71% dos estudos empíricos
referiram significância estatística, somente 12% dos estudos
calcularam e expuseram medições de tamanho do efeito; 6%
dos estudos informaram intervalos de confiança; 29% fizeram
constar medições de confiabilidade; e 0% calculou e incluiu
medições de validade.
Como profissão, a Fonoaudiologia tem evoluído bastante,
quanto à significância estatística de dados de pesquisa em vá-
rios estudos empíricos, tentando provar os efeitos benéficos
dos tratamentos de problemas vocais. No entanto, embora
um estudo possa demonstrar significância estatística, este não
demonstra significância prática, a não ser que determine o Ta-
manho do Efeito (TE) obtido. Isto é, uma investigação empí-
rica pode ter significância estatística e não ser significante na
prática. Por exemplo, um TE de 1.0 tem uma sobreposição
de 45% entre grupos de controle e experimental. Quanto me-
nor o TE, maior a sobreposição e menor a diferença entre
grupos no resultado do tratamento. A Tabela 5 enumera me-
dições de tamanho do efeito e significância clínica de vários
tamanhos do efeito e a porcentagem de sobreposição entre
os grupos de controle e experimental em qualquer testagem
clínica ou investigação.
Tabela 5. Pontuações de tamanho do efeito e porcentagem estimada
de sobreposição entre grupos de controle e experimental e chance
de acertar associação de grupo baseando-se em pontuações únicas
(adaptado do MELINE e PARADISO, 2003)
A B C D
0.0 50 100 50%
0.2 58 85 54%

FONOAUDIOLOGIA E EDUCAÇÃO 103


A B C D
0.4 66 73 58%
0.6 73 62 62%
0.8 79 53 66%
1.0 84 45 69%
1.2 88 38 73%
1.4 92 32 76%
1.6 95 27 79%
1.8 96 23 82%
2.0 98 19 84%
Legenda:
A. Tamanho do Efeito
B. % indivíduos no grupo de controle abaixo da média de indivíduos no grupo
tratado
C. Percentual de sobreposição
D. Chance de acertar associação de grupo baseando-se em pontuações únicas

Concluindo, evidências empíricas têm documentado o


efeito significante na saúde, atuação no trabalho, condições
psicológicas, e qualidade de vida entre os pacientes disfôni-
cos, especialmente professores, causados por problemas da
voz. A educação, a prevenção e identificação precoce de
professores que correm maior risco de adquirirem proble-
mas vocais devido à demanda vocal de suas ocupações, são
medidas necessárias, que reduziriam não somente o impac-
to de problemas vocais nesta profissão, mas também o peso
econômico no sistema governamental de saúde.

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FONOAUDIOLOGIA E EDUCAÇÃO 109


ÁGUA: UMA QUESTÃO DE SAÚDE
A educação ambiental e a luta
pela melhoria na qualidade de vida
Glaucia Aparecida Rosa Cintra Peretti

INTRODUÇÃO
Nunca é demais, nos tempos atuais, realçar a importância da
questão ambiental. Neste início de século, em que o mundo
vem passando por um importante processo de reorganiza-
ção, a questão ambiental tenta resgatar sua essência frente às
relações sociedade/natureza.
A atual problemática ambiental demonstra que há um de-
sequilíbrio na relação sociedade/natureza, e a inquirição da
origem desse fato nos conduz a uma concepção de natureza
enquanto recurso, o que ocorreu principalmente nos séculos
XVII e XVIII, com a revolução tecno-científica.
Desde o surgimento do homem na Terra a freqüência e os
tipos de impactos têm aumentado e se diversificado muito.
Na verdade, o primeiro impacto causado pelo ser humano
deve ter derivado do domínio do fogo. Assim, à medida que
ele foi desenvolvendo novas tecnologias e ampliando seu po-
der de controlar os elementos da natureza, os impactos am-
bientais aumentaram em intensidade e extensão.
O homem primitivo dependia da natureza, principalmen-
te como fonte de alimentos, o que o obrigava a ser nômade,
vivendo continuamente em busca de frutos, animais e outros
alimentos. Com o advento da agricultura e da pecuária, ele
deixa de ser nômade, tornando-se sedentário, hábito que o
levou a desenvolver certas tecnologias para melhor se apro-
priar dos recursos da natureza.

111
Vê-se, que o objetivo tecnológico sempre foi o de apro-
priação e domínio da natureza, para que o homem se liber-
tasse da dependência do meio.
Ao longo dos séculos, com o crescimento da população, o
consumo dos recursos renováveis e não-renováveis foi cres-
cendo, consideravelmente. Isso significa que novas tecnolo-
gias foram surgindo e aumentando de forma expressiva o
ritmo de expropriação da natureza.
Com a industrialização moderna do século XVIII, a na-
tureza passou a ser consumida de forma acelerada, os danos
naturais tornaram-se crescentes e o ciclo da reposição natural
foi brutalmente quebrado.
Segundo Bernardes e Ferreira, apud Cunha e Guerra
(2003:24):
...Desde o início do século XIX, a Ciência é vista
como intervenção na natureza com objetivos práti-
cos e econômicos. Estamos diante de uma relação
homem/natureza de absoluta externalidade a tudo o
que não é matemático, mecânico, sendo a natureza
vista como meio a atingir um fim, consagrando a
capacidade humana de dominar a natureza.

Desta forma, as sociedades industriais modernas criaram


um complexo e diversificado sistema econômico, que pertur-
ba profundamente o meio ambiente, pois é necessário reti-
rar a energia e a matéria-prima do meio ambiente, para que
ocorra a produção industrial, atividade poluidora do ar, do
solo e da água.
Desde o final do século passado, a deterioração da quali-
dade de vida, tanto no meio rural como no urbano, colocou
o problema da conservação ambiental como um fato político
que precisa ser analisado e refletido por toda a população
mundial.
A expansão industrial dos séculos XIX e XX veio para
suprir as necessidades da população, que crescia de maneira
rápida e desorganizada, impulsionada principalmente pelos
capitalistas, em sua incessante busca de lucro.

112 Glaucia Aparecida Rosa Cintra Peretti


O século XIX será o triunfo desse mundo pragmático,
antropocêntrico, consagrando a capacidade cada vez maior
do homem em dominar a natureza, tida como objeto a ser
possuído e dominado por ele. Assim, qualquer tentativa de
pensar sobre o homem e a natureza, de uma forma orgânica
e integrada, torna-se mais difícil.
Os custos econômicos e ambientais desse crescimento só
se fazem aparentes quando o meio ambiente não consegue
mais absorver os danos causados ao ar, ao solo e a água,
colocando em risco a própria vida humana. Alguns aconte-
cimentos marcantes no século XX contribuíram para uma
tomada de consciência sobre os riscos da industrialização e
do uso indiscriminado da tecnologia.
De acordo com Bernardes e Ferreira, apud Cunha e Guer-
ra (2003:29):
...A primeira grande preocupação com o potencial
técnico-científico destrutivo da humanidade e da na-
tureza acontece no final da Segunda Guerra, quando
o mundo foi surpreendido com o lançamento da bom-
ba atômica em Hiroshima (66 mil mortos) e Naga-
saki (39 mil mortos).

Outro caso marcante a ser destacado foi os efeitos nega-


tivos da industrialização no campo onde os pesticidas pare-
ciam vencer para sempre os problemas das pragas, até que,
em 1962, a jornalista e bióloga Rachel Carson, em seu livro
Primavera silenciosa, retratava os efeitos destrutivos dos inseti-
cidas como o DDT. Num sentido mais amplo, o livro descre-
via como todo o ambiente do Planeta corria risco por causa
da poluição espalhada pela indústria e por práticas agrícolas.
A influência de Carson aumentava e as pessoas passaram a
observar o meio ambiente sob um feixe de luz mais amplo.
A partir dessas e de outras catástrofes ambientais, os cien-
tistas começaram a denunciar a ação predatória do homem e
a alertar a sociedade mundial sobre o fato de que a natureza
já estava alcançando o seu limite.
No Brasil, a questão ambiental começou a ser mais defen-
dida a partir da década de 1980 com a Lei da Política Nacio-

ÁGUA: UMA QUESTÃO DE SAÚDE 113


nal do meio Ambiente – Lei no 6.938/8, e com a Constituição
Federal de 1988.
A Constituição Federal em seu art. 225 estabelece
que todos têm direito ao ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial
à vida sadia e à qualidade de vida, impondo-se ao
Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Percebe-se, que o legislador teve a intenção de mostrar


que todo cidadão tem direito a esse ambiente equilibrado,
mas em contrapartida, tem a responsabilidade de proteger e
conservar todas as formas de vida.
Para alcançar a sustentabilidade ambiental proposta pelo
artigo supracitado, é indispensável que os homens se cons-
cientizem da importância do ambiente para as presentes e
futuras gerações. Tal conscientização só é possível por meio
de um processo educacional também tutelado pela Constitui-
ção Federal de 1988.
Para fortalecer ainda mais a determinação constitucio-
nal, surge a Política Nacional de Educação Ambiental, defi-
nida pela Lei no 9.795/99 e regulamentada pelo Decreto no
4.281/2002, com o objetivo de dar eficácia aos arts. 205 e 225
(constitucionais), §1o, VI, da Lei Maior Brasileira.
Na legislação sobre a Educação (Lei no 9.394/96 que dis-
põe sobre as Diretrizes e Bases da Educação Nacional), a
Educação Ambiental também é colocada como base curri-
cular do ensino Fundamental, na modalidade de tema trans-
versal.
A partir da Tutela Constitucional, o processo educativo
relacionado com o ambiente adquire uma dimensão trans-
cendental, visto que se associa às finalidades do Estado, quer
como representante da própria sociedade, quer como de-
corrência de um pacto social. Vê-se assim que a Educação
Ambiental é uma exigência constitucional e deve colaborar
na formação de uma consciência ecológica capaz de formar
cidadãos comprometidos com o ambiente e revestidos de

114 Glaucia Aparecida Rosa Cintra Peretti


vontade de reverter o processo de destruição gradual e reite-
rada do Planeta.

A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO BRASIL: ALGUMAS


CONSIDERAÇÕES
Logo após a Revolução Industrial do século XVIII, alguns
estudiosos, como o escocês Patrick Geddes, já começaram a
demonstrar uma grande preocupação com as conseqüências
da industrialização, tanto para o meio urbano como para o
meio rural.
No Brasil, essa preocupação começou recentemente. En-
quanto alguns países, já no final do século XX, discutiam
maneiras de conservar o ambiente, aqui se iniciava um cres-
cimento desenfreado, que não se preocupava com a questão
ambiental e incentivava o processo industrial, por meio de
indústrias estrangeiras e de projetos como Carajás, a Usina
Hidrelétrica de Tucurí e outros.
A Conferência de Estocolmo, realizada em 1972, é sem
dúvida um dos principais acontecimentos relacionados à re-
flexão sobre a questão ambiental. Além de chamar a atenção
para os problemas ambientais de todo o mundo, a Confe-
rência estabeleceu que os países desenvolvidos deveriam li-
mitar seu desenvolvimento, por serem os maiores responsá-
veis pela destruição dos recursos naturais. Por outro lado, os
países subdesenvolvidos iniciariam uma política de controle
de natalidade, já que o grande crescimento populacional era
considerado outro grave problema ambiental.
O Brasil não concordou com as recomendações da Con-
ferência e até chegou a afirmar que não se importaria em pa-
gar o preço da degradação ambiental, desde que o resultado
fosse melhorar a economia, com a geração de empregos e o
aumento do Produto Interno Bruto.
Tal participação gerou conseqüências para o Brasil. O
Banco Mundial e as instituições financeiras pressionaram o
país a iniciar políticas de preservação ambiental. Com isso,
em 1973, foi criada no Brasil a Secretaria do Meio Ambiente
– SEMA.

ÁGUA: UMA QUESTÃO DE SAÚDE 115


Em 1975, seguindo as orientações da Conferência de Esto-
colmo, os princípios e objetivos da Educação Ambiental foram
formulados. Infelizmente, por parte dos setores de Educação
no Brasil, não existiu nenhum interesse dos políticos dominan-
tes em iniciar no País ações de Educação Ambiental.
Entretanto, começaram a surgir no Brasil movimentos
ecológicos que passam a denunciar a degradação ambiental
do País e a pressionar o governo a iniciar projetos educacio-
nais que dessem mais importância à Educação Ambiental.
Entrementes, por força dos órgãos ambientais, a dis-
ciplina “Ciências Ambientais” passaria a ser obri-
gatória nos cursos de Engenharia, e diversos cursos
voltados à área ambiental seriam criados nas univer-
sidades brasileiras, porém em inúmeras faculdades
de Educação do país o assunto era ignorado, como
continua a sê-lo em sua maioria (DIAS, 2003:81).

Com a Conferência de Tbilisi, realizada em 1975, os prin-


cípios e objetivos da Educação Ambiental foram definidos,
recomendando que, para se analisar a questão ambiental,
todos os aspectos deveriam ser estudados (políticos, econô-
micos, sociais, naturais, científicos, tecnológicos e éticos) e
que a Educação Ambiental deveria ser o resultado de um
processo interdisciplinar, em que todas as disciplinas estives-
sem articuladas e integradas. Assim, a Educação Ambiental,
além de proporcionar conhecimento às pessoas também lhes
possibilitaria mudanças de comportamento, de atitudes e de
valores, tornando-as capacitadas a buscar alternativas para a
problemática ambiental, a fim de minimizá-las, objetivando a
melhoria da qualidade de vida de toda população mundial.
Diante disso, em 1976, o MEC publicou o documento
“Ecologia – uma proposta para o Ensino de 1o e 2o graus”
que segundo Dias (2003), não foi bem aceito porque a sua
abordagem reducionista condicionava a Educação Ambien-
tal às ciências biológicas, sem dar ênfase às questões sociais,
culturais, éticas e políticas.
Assim, apenas em 1981, com a Política Nacional do Meio
Ambiente, e posteriormente com a promulgação da Consti-

116 Glaucia Aparecida Rosa Cintra Peretti


tuição Federal de 1988, a questão ambiental passou a ser vista
como da maior importância, embora a Educação Ambiental
continuasse sem ocupar o papel de destaque que merecia.
As iniciativas de ações em educação ambiental continua-
vam a ser esporádicas, sem compromisso, sem participação
das instituições governamentais. No final de 1989, o MEC
criaria um grupo de Trabalho em Educação Ambiental, e o
Ibama, os Núcleos de Educação Ambiental.
Entretanto, essas iniciativas não se consolidaram e duran-
te a década de 1990 as atividades relacionadas à Educação
Ambiental foram drasticamente diminuídas e somente com
a Lei no 9.795/99, que trata da Política Nacional de Educação
Ambiental é que realmente o Brasil tem um grande avanço,
tornando-se o único país da América Latina a possuir uma
política voltada para a Educação Ambiental. Sem dúvida,
essa foi uma grande conquista para todos aqueles que dese-
jam um ambiente de melhor qualidade. A luta, porém, não
terminaria aí. Iniciaria uma nova fase de implantação de pro-
gramas e projetos de Educação Ambiental, no âmbito formal
(escolas) e informal (comunidade). Um grande desafio para
os educadores ambientais...

O PROJETO DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A MELHORIA


DA QUALIDADE DE VIDA: ÁGUA UMA QUESTÃO DE SAÚDE
Com base em uma reflexão sobre a importância da Educação
Ambiental como uma das principais formas de se resolver a
problemática ambiental da atualidade e por meio de uma aná-
lise da relação hodierna entre sociedade/natureza, a EE 18 de
Junho de Presidente Epitácio resolveu elaborar e executar um
projeto capaz de sensibilizar a população epitaciana e planejar
ações para solucionar alguns problemas do município.
O Município de Presidente Epitácio (SP), está localizado
na região oeste do Estado de São Paulo, na divisa com o
Estado do Mato Grosso do Sul, às margens do rio Paraná
e pertence à Região Administrativa de Presidente Prudente
(SP). Como todo município brasileiro, apresenta muitos pro-
blemas relacionados ao ambiente.

ÁGUA: UMA QUESTÃO DE SAÚDE 117


A escolha do tema água ocorreu devido ao fato de a es-
cola estar num município banhado por uma das maiores e
mais importante bacias hidrográficas do mundo e também
por ser a água transmissora de doenças e ambiente criadouro
de mosquitos. Portanto, o tratamento e o uso correto da água
pela população epitaciana, era e é uma questão de saúde.
O objetivo do projeto foi alertar a comunidade epitaciana
sobre a importância do recurso natural água e os perigos que
esse recurso pode trazer à saúde, se não houver tratamento e
conscientização da população, no que tange a eliminação dos
focos de mosquitos transmissores das doenças. Por isso, apesar
de ser um projeto escolar dirigido aos alunos de 5a e 6a séries,
o público ultrapassou os muros escolares e buscou sensibilizar
a comunidade de Presidente Epitácio sobre a temática.
Procurou-se desenvolver o projeto de maneira interdisci-
plinar. Jupiassu (1976:74), afirma que “a interdisciplinaridade
caracteriza-se pela intensidade das trocas entre os especia-
listas e pelo grau de integração real entre as disciplinas no
interior de um mesmo projeto de pesquisa”.
Percebe-se que, para que haja a concretização da interdis-
ciplinaridade, não basta a justaposição de duas ou mais disci-
plinas, com seus objetivos múltiplos. É necessário que duas ou
mais disciplinas se interessem por um tema ou uma aborda-
gem específica e busquem vínculos que as unam entre si.
A própria “educação ambiental” já é interdisciplinar, por-
que existe uma ampla interdependência entre o ambiente
natural e aquele elaborado pelo trabalho humano, exigindo
pela sua complexidade, uma visão integradora que aproveite
a especificidade de cada disciplina, sem o que não é possível
a visualização globalizadora de todos os problemas decor-
rentes dessa relação sociedade/natureza.
Sendo assim, o projeto “Água: uma questão de saúde” foi
realizado buscando alcançar essa concepção holística e partici-
pativa que a Educação Ambiental exige. Por isso as disciplinas
Geografia, Ciências, Português e Matemática se integraram na
execução do projeto, que se iniciou em março de 2002.
O tema água foi enfocado por meio da análise da poluição
do rio, nas aulas de Geografia, pelos alunos de 6a série.

118 Glaucia Aparecida Rosa Cintra Peretti


De início, os alunos receberam o mapa da bacia hidro-
gráfica da região Sudeste e foram construindo alguns con-
ceitos básicos, tais como: bacia hidrográfica, origem do rio,
afluentes, foz e outros. Os alunos localizaram no mapa os
rios principais da região de Presidente Epitácio e também as
usinas hidrelétricas.
Após este trabalho, os alunos receberam um texto sobre
bacia hidrográfica e a questão energética do Brasil e discuti-
ram as causas e conseqüências da crise energética atual.
A poluição dos rios também foi abordada utilizando o re-
curso musical. Para sensibilizar os alunos, a música O Rio, dos
autores César Augusto/Mario Marcos, foi cantada e analisa-
da. Após isso, eles fizeram um livro ilustrado sobre a música,
no qual demonstraram, por meio de desenhos, como os rios
brasileiros estão sendo poluídos e mal-tratados pela popula-
ção e pelo Poder Público.
Outro assunto enfocado no projeto foi a importância do
tratamento de água e esgoto para evitar diversas doenças
infecciosas. Assim, durante os meses de junho e agosto de
2002, os alunos da 6a série pesquisaram em livros e jornais
vários problemas relacionados à água.
Dando continuidade ao trabalho, em setembro, os alunos
fizeram uma visita técnica à Estação de Tratamento Água
(ETA) e à Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) de Presi-
dente Epitácio, a fim de conhecerem os processos de trata-
mento e se conscientizarem sobre a importância deste trata-
mento.
Após estas visitas, os alunos verificaram que o município
tem um bom gerenciamento ambiental da água, pois, qua-
se 100% delas é tratada e praticamente 100% das casas têm
acesso ao esgoto, o que representa um excelente saneamento
básico. Diante dos dados, confeccionaram maquetes das es-
tações de tratamento e cartazes informativos, indicando as
doenças que se adquirem com água não tratada.
Outra importante pesquisa foi realizada pelos alunos da 5a
e 6a séries referindo-se às diferentes ações para o combate à
dengue, doença que muito preocupa a saúde local pela exis-

ÁGUA: UMA QUESTÃO DE SAÚDE 119


tência de muitos focos e pela quantidade de pessoas infecta-
das pelo mosquito.
Primeiramente, os alunos da 5a e 6a séries realizaram um
trabalho de campo, visitando várias casas, para sentirem a re-
alidade da comunidade em relação à dengue. Os resultados
dessas visitas foram transformados em gráficos, que demons-
traram que a população epitaciana não estava consciente da
gravidade da doença e nem mesmo sabiam como esta era
transmitida, porque durante as visitas, os alunos encontraram
vários focos do mosquito nas casas e aproveitaram para ex-
plicar aos moradores que não se deve deixar a água limpa se
acumular em garrafas, pneus e vasos de plantas.
A realização desse projeto foi altamente positiva. Em
primeiro lugar, porque houve uma valorização dos alunos
que participaram ativamente da execução do projeto, tendo
um grande envolvimento, mostrando-se, no final, seres mais
conscientes sobre as questões ambientais do seu município.
Em segundo, porque também houve a participação e o en-
volvimento da comunidade, que os recebeu com presteza e
aprendeu muito com eles. E, finalmente, porque o resultado
final de toda a pesquisa realizada foi exposto e a comunidade
pôde analisar a questão da água em Presidente Epitácio e
no mundo, tendo como refletir sobre a poluição da água, a
importância do seu tratamento e a prevenção da dengue. É
válido ressaltar que todo o trabalho foi filmado e transforma-
do em um documentário, exibido na Diretoria de Ensino de
Santo Anastácio, tornando público o trabalho dos alunos de
5a e 6a séries da Escola Estadual 18 de Junho de Presidente
Epitácio (SP).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Educação Ambiental é, sem dúvida, um dos maiores desa-
fios do século XXI, mas não é utopia realizá-la. Por meio de
projetos simples, muitas escolas do Brasil já vêm conscien-
tizando seus alunos sobre a importância de se preservar o
ambiente para as presentes e futuras gerações.

120 Glaucia Aparecida Rosa Cintra Peretti


Na verdade, por ser um processo contínuo e permanente,
a Educação Ambiental deve se pautar na promoção da digni-
dade humana e na sustentabilidade do Planeta, baseando-se
em uma nova ética, que veja o mundo de maneira sistêmica
e que reconheça os limites de uso dos recursos naturais.
A Educação Ambiental é um desafio na medida em que
objetiva incentivar às pessoas a mudar o seu modo de vida, a
ser menos consumistas e a voltar a contemplar o céu, a lua, as
estrelas, o mar, as plantas... e a se reconhecer como agentes
de transformação.
No caso específico da EE 18 de Junho, de Presidente Epi-
tácio, o papel da Educação Ambiental foi fundamental para a
transformação dos alunos e professores, fazendo com que eles
se tornassem cidadãos mais conscientes e participativos. Isso
ocorreu porque as ações buscaram integrar a equipe escolar
com todos procurando atingir um único objetivo: sensibilizar
o grupo escolar e a comunidade epitaciana despertando-lhes
a consciência ambiental.
O melhor de tudo é que as ações voltadas à Educação Am-
biental, continuaram a existir na escola e começaram a fazer
parte da pauta das reuniões pedagógicas e de planejamento,
havendo sempre um novo tema ambiental para refletir e ana-
lisar. Hoje, a questão ambiental faz parte do cotidiano da EE
18 de Junho de Presidente Epitácio no Estado de São Paulo.
Mãos à obra... Temos muito a construir...

BIBLIOGRAFIA
DIAS, G. F. Educação Ambiental Princípios e Práticas. São Paulo: Gaia,
1993.
CUNHA, S. B.; GUERRA, A. J. (org.). A Questão Ambiental. Dife-
rentes Abordagens. Rio de Janeiro: Bertrand, 2003.
JUPIASSU, H. Interdisciplinaridade Patologia do Saber. Rio de Janei-
ro: Imago, 1976.
MILARÉ, E. Direito do Ambiente: doutrina, jurisprudência e glossário.
3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.
PHILIPPI JR., A.; PELICIONI, M. C. Educação Ambiental: Desen-
volvimento de Cursos e Projetos. 2. ed. Universidade de São Paulo.

ÁGUA: UMA QUESTÃO DE SAÚDE 121


Faculdade de Saúde Pública. Núcleo de Informações em Saúde
Ambiental. São Paulo: Signus Editora, 2002.
—. Educação Ambiental e Sustentabilidade. São Paulo: Manole, 2005.

122 Glaucia Aparecida Rosa Cintra Peretti


A EDUCAÇÃO AMBIENTAL
COMO FILOSOFIA DE VIDA
João Abrahão da Silva

Formar uma consciência coletiva sobre as questões do meio


ambiente é, antes de mais nada, um dever de todos aqueles
que desse conhecimento se apropriaram, uma vez que a Edu-
cação Ambiental, como tema interdisciplinar lida com a re-
alidade sociocultural, econômica e ecológica de cada região,
de cada sociedade, e de cada indivíduo o que certamente
facilita o desenvolvimento e permite a compreensão da natu-
reza complexa do meio ambiente, resultante das interações
de seus aspectos biológicos, físicos, sociais e culturais.
Para concretizar o intento de divulgar tais informações,
fomos buscar apoio no Projeto Grumetes Mirins, como área
de atuação, acreditando que ao interiorizar a idéia de defesa
do meio ambiente junto ao público-alvo ali localizado (crian-
ças de sete a 14 anos), certamente estes seriam os próprios
multiplicadores dessa idéia junto a seus parentes, amigos e
comunidade, contribuindo dessa forma para a consecução
do objetivo maior, que é a vivência plena da Educação Am-
biental como uma filosofia de vida.
Quando o biólogo alemão Ernest Haeckel criou o ter-
mo ecologia em 1866 (LAGO, PÁDUA, 1984) para designar
uma disciplina científica que estudaria as relações entre as
espécies e o seu ambiente orgânico e inorgânico, provavel-
mente não imaginou que o termo alcançaria à proporção que
hoje verificamos, abrangendo tantas áreas do conhecimento
humano, ultrapassando as fronteiras da Biologia e ganhan-
do amplitude como movimento social. No campo fértil das
idéias ecológicas, a maneira de viver e se relacionar com o
mundo em que habitamos fez florescer nos diversos segmen-

123
tos das ciências, uma preocupação maior com a Educação
Ambiental (EA).
A Educação Ambiental, como tema interdisciplinar lida
com a realidade e adota uma abordagem que considera to-
dos os aspectos que compõem a questão ambiental e socio-
cultural. Realizar um trabalho de ensino/aprendizagem com
o olhar voltado para a realidade sociocultural, econômica e
ecológica de cada região, de cada sociedade, de cada indiví-
duo, certamente facilitará o desenvolvimento do indivíduo,
permitindo-lhe compreender a natureza complexa do meio
ambiente, resultante das interações de seus aspectos biológi-
cos, físicos, sociais e culturais.
Dias (2003), em seu livro Educação ambiental: princípios e
práticas, afirma que as premissas da Educação Ambiental sur-
gidas de observações, conceitos, estratégias e objetivos so-
ciais, discutidos em conferências e encontros, permitem-nos
avaliar que as evoluções social e cultural são mais rápidas
do que a evolução biológica. Portanto, esta não é capaz de
acompanhar os desequilíbrios ambientais produzidos pela
ação do homem. A história da implementação da Educação
Ambiental no Brasil é recente, e o conhecimento dessa re-
alidade é um processo que demanda tempo para atingir a
população de modo geral. Aliada a essa demora, verifica-se
o desinteresse e o descaso com o assunto por parte de alguns
políticos e empresários que visam somente os lucros que po-
derão deixar de obter.
O resultado disso reflete-se na educação de modo geral.
Sabe-se que, até a década de 1970, pouco ou nada se fazia
pela pesquisa, estudo e divulgação das questões ambientais
no Brasil. Em alguns momentos, defendia-se até a tese de
que tais questões faziam parte do jogo de interesse dos países
desenvolvidos, que exauriram suas riquezas, seus recursos
naturais e queriam impedir o nosso desenvolvimento.
No ano de 2002, na Estância Turística de Presidente Epitá-
cio, teve início uma ação social de enfrentamento à exclusão
social de uma parcela da população representada por crian-
ças e adolescentes que, em situação de risco pessoal e so-
cial, necessitavam ter resgatadas sua auto-estima, cidadania,

124 João Abrahão da Silva


autodesenvolvimento, integração com a sociedade, reorga-
nização familiar, entre outras necessidades. Com o apoio da
Secretaria Estadual de Assistência e Desenvolvimento Social
do Estado de São Paulo, a Prefeitura Municipal da Estân-
cia Turística de Presidente Epitácio e o Centro Social São
Pedro deram início ao projeto “SOS Bombeiros no Resgate
da Cidadania”. O nome do projeto deve-se a uma parceria
firmada entre os órgãos citados e o Corpo de Bombeiros do
município, por meio da qual seriam ministradas aulas de pri-
meiros socorros e noções de higiene.
Em 2004, os Bombeiros saíram do Projeto, e, por meio
da Delegacia Fluvial de Presidente Epitácio, foi firmado um
convênio com a Marinha do Brasil, que passou a apoiar o
Projeto com aulas de natação, marinharia, primeiros socor-
ros e ordem unida.O projeto, então, passou a ser denomi-
nado Grumetes Mirins e atualmente atende a 60 crianças e
adolescentes de ambos os sexos, na faixa etária de sete a 14
anos de idade, cujas famílias são consideradas carentes, com
renda per capita abaixo do salário mínimo.
O atendimento é realizado nos turnos da manhã e da tar-
de, com 30 crianças por turno, tendo aulas de reforço esco-
lar e atividades lúdicas, entre outras. O programa conta com
uma equipe bem estruturada, formada por cinco funcionárias
de nível superior e duas de nível médio, a saber: duas assis-
tentes sociais, uma pedagoga, uma nutricionista, uma psicó-
loga, uma professora (nível médio) e uma auxiliar de cozinha
(nível médio).
No entanto, percebemos que as crianças e os adolescentes
atendidos pelo programa ainda não estavam sendo contem-
plados com aulas de Educação Ambiental, tema que enten-
demos ser primordial no desenvolvimento da consciência
coletiva da preservação do ambiente em que vivemos, prin-

. Marinharia: arte ou profissão de marinheiro.


. Ordem unida: exercício físico-militar de repetição de movimentos que confere
certa disciplina aos participantes.
. Grumetes: praça da Marinha de graduação inferior a marinheiro e superior a
aprendiz de marinheiro.

A EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO FILOSOFIA DE VIDA 125


cipalmente nessa comunidade que reside sob a chancela de
Estância Turística.
Desta forma, aventamos a hipótese de que a implantação
de aulas de Educação Ambiental favoreceria a difusão de
uma mentalidade mais crítica e o inter-relacionamento com
o meio ambiente social, culminando com a preservação do
próprio ambiente. Destarte, propusemos à Coordenação do
Projeto a implantação das aulas de EA a partir do mês de
abril de 2005, com o objetivo de avaliar a aceitação do pro-
grama junto às crianças que freqüentavam o projeto social
Grumetes Mirins.
A ação desta proposta priorizou a formação da consciên-
cia em relação ao meio ambiente, a valorização dos recursos
naturais existentes em Presidente Epitácio e principalmente a
correta utilização dos recursos oferecidos pelo rio Paraná.
Com o objetivo de identificar o nível de conhecimento
e interesse nas questões ambientais, foi aplicado um ques-
tionário fechado para um grupo de 60 crianças e 60 pais ou
responsáveis, num total de 120 questionários distribuídos
no mês de maio de 2005. O resultado nos impulsionou no
prosseguimento desta pesquisa, como podemos verificar a
seguir.

RESULTADOS
Dos 60 questionários distribuídos aos pais ou responsáveis,
somente 38 foram respondidos. Representados no Gráfico I,
visualizamos o total de 98 indivíduos participantes do ques-
tionário.
Quando perguntados se já ouviram falar sobre Educação
Ambiental, do universo de 60 crianças, 6% dos indivíduos
responderam de forma negativa; 37 pais (ou responsáveis)
responderam ao questionário de forma positiva e um de for-
ma negativa, num total de 11 respostas negativas. Consta-
tou-se, então, que num universo de 98 indivíduos do grupo
pesquisado, 0,9% desconhecia o tema Educação Ambiental.
Quanto à importância do rio Paraná para a cidade de Pre-
sidente Epitácio, 90% dos alunos o consideraram importante

126 João Abrahão da Silva


e 100% dos pais firmaram opinião positiva quanto à relevân-
cia do rio para a cidade. Na identificação dos pontos turísti-
cos da cidade, 61,7% dos alunos e 5,3% dos pais responderam
de forma negativa. Quanto à conservação do meio ambiente
pelo Poder Público, mais de 50% de pais e alunos conside-
ram insatisfatórias as medidas adotadas.
Com relação à coleta de lixo, 96,7% dos alunos afirmaram
haver coleta de lixo onde moram, 53,3% admitiram não sa-
ber o destino do lixo, 11,7% não ouviram falar sobre a coleta
seletiva e 18,3% não realizam a separação do lixo em suas
residências. Sobre a vontade de conhecer um pouco mais a
questão da preservação ambiental, 93,3% responderam de
forma positiva e 96,7% declararam-se dispostos a participar
de um mutirão para a limpeza de seu bairro, caso fossem
convocados.
Gráfico – Respostas dos Grumetes e responsáveis sobre questões de EA

À guisa de esclarecimento, o gráfico em tela, retrata o


comportamento demonstrado pelos pesquisados em suas res-
postas. As barras azuis representam as respostas positivas dos
alunos e as barras vermelhas suas respostas negativas. Já as

A EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO FILOSOFIA DE VIDA 127


verdes refletem as respostas positivas dos 38 pais ou respon-
sáveis e as barras pretas as respostas negativas.
O eixo horizontal representa as 10 perguntas formuladas e
o eixo vertical o índice de respostas positivas ou negativas.
Analisando os resultados obtidos pela pesquisa anterior,
concluímos que este seria um campo fértil para o prossegui-
mento do trabalho de inserção de idéias de uma convivên-
cia pacífica e harmoniosa com o meio ambiente, haja vista
o percentual de 93,3% de respostas positivas relacionadas à
vontade de se obter mais conhecimentos a respeito das ques-
tões ambientais.
Durante a fase exploratória, idealizamos nosso campo de
pesquisa junto aos alunos do projeto Grumetes Mirins, uma
vez que identificamos como um problema o fato de as crian-
ças não estarem sendo contempladas com aulas de EA. Ao
construirmos a hipótese, vislumbramos que a possibilidade
da implantação das aulas de EA junto a esse público-alvo
certamente faria dele multiplicadores da necessidade de uma
consciência coletiva de preservação do meio ambiente.
Na etapa de seleção da amostra deu-se a formação de dois
grupos. O primeiro no turno da manhã, com 30 alunos, e
o segundo no turno da tarde, também composto de 30 alu-
nos. Para esses alunos, foi ministrado pela Professora Glaucia
Rosa Cintra Peretti um curso de EA que teve a duração de
quatro dias, totalizando 12 horas/aula. A intenção era intervir
positivamente no processo, para que as crianças estivessem,
ao final do curso, capacitadas a atuar como multiplicadores
das idéias referentes ao meio ambiente, junto à sua própria
família e à comunidade. O curso teve início no dia 5 de julho
de 2005 e seguiu a seguinte proposta: Curso de Educação
Ambiental – Grumetes Mirins.

Objetivo geral:
 Despertar e formar a consciência ambiental das crianças e
adolescentes dos Grumetes Mirins, a fim de que se trans-
formem em verdadeiros agentes ambientais do Município
de Presidente Epitácio, informando à população epitacia-

128 João Abrahão da Silva


na sobre a importância de se conservar o ambiente sadio
para melhorar a qualidade de vida de todos.

Objetivos específicos:
 Informar aos Grumetes Mirins o verdadeiro significado e
a importância da Educação Ambiental.
 Construir uma proposta de “Agenda 21” para o Município
de Presidente Epitácio.
 Encaminhar a proposta à Câmara de Vereadores de Pre-
sidente Epitácio, para que se discutam as propostas e para
que elas sejam devidamente aplicadas na comunidade
epitaciana.

Procedimentos metodológicos:
No primeiro dia de aula, 5 de julho de 2005, foi realizado um
diagnóstico sobre o tema Educação Ambiental, com a apli-
cação de dois questionários para serem respondidos respecti-
vamente em grupo e de forma individual. Em conjunto com
os alunos, foi construído um conceito de EA. Explicou-se a
importância, os objetivos e as finalidades do curso de Edu-
cação Ambiental, que resultariam na aquisição de novos co-
nhecimentos, valores e atitudes necessárias para melhorar o
ambiente. A proposta era a formação de uma nova consciên-
cia ambiental com a participação da comunidade, resultando
numa mudança de comportamento baseada no respeito ao
meio ambiente.
Como trabalho de campo, foi proposto que a turma obser-
vasse as condições ambientais de seus bairros e também pes-
quisasse o motivo que estava tornando o planeta mais quente.
No dia 6 de julho de 2005, deu-se o intercâmbio entre os
Grumetes Mirins e cerca de 80 adolescentes da Guarda Mi-
rim Ambiental de Teodoro Sampaio. Neste dia, o Delegado
Fluvial de Presidente Epitácio ministrou uma palestra sobre
a preservação ambiental nos rios Paraná e Paranapanema,
bem como de uma parte do Atlântico Sul a que o Brasil tem
direito e precisa preservar, e que a Marinha do Brasil vem

A EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO FILOSOFIA DE VIDA 129


insistentemente chamando de Amazônia Azul. Esta área, so-
mada aos cerca de 3.500.000 km² da Zona Econômica Exclu-
siva, perfaz um total de 4.400.000 km², o que corresponde,
aproximadamente, à metade do território terrestre nacional,
ou, ainda comparando, a uma nova Amazônia, conforme
ilustração e registro fotográfico a seguir.
Ilustração do mar territorial a ser preservado

Fonte: http://www.mar.mil.br/Marinha_do_Brasil/amazonia_azul.htm

130 João Abrahão da Silva


Palestra do delegado fluvial de Presidente Epitácio

Ainda no dia 6 de julho, como parte das atividades de


integração entre os Grumetes Mirins e a Guarda Mirim Am-
biental de Teodoro Sampaio, a professora Glaucia Peretti mi-
nistrou uma palestra sobre o Meio Ambiente e o Turismo
em Presidente Epitácio, e um grupo de jovens epitacianos
apresentou uma peça teatral também sobre o mesmo tema.
No dia 7 de julho, foram verificados os problemas am-
bientais detectados pelos Grumetes Mirins. Realizou-se um
estudo sobre conferências, encontros e seminários a cerca de
Educação Ambiental, destacando-se a Rio/92. Também fo-
ram estudados aspectos da Agenda 21.
No dia 8 de julho, explicou-se o significado de um plano
de ação e iniciou-se então a elaboração de um plano de ação
de Presidente Epitácio para a EA informal, priorizando seto-
res da sociedade.
No dia 11 de julho, finalizou-se a Agenda 21 de Presiden-
te Epitácio, montando-se uma equipe de trabalho de EA e
preparando-se a apresentação da proposta à Câmara Muni-
cipal. Cabe ressaltar que a atividade supramencionada não
foi enviada à Câmara Municipal, uma vez que as propostas
careciam de um melhor amadurecimento das idéias.
Durante o desenvolvimento das ações, foram programa-
das visitas de intercâmbio ao Município de Teodoro Sam-

A EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO FILOSOFIA DE VIDA 131


paio, que já desenvolvia programas ambientais e possuía re-
servas naturais a serem conhecidas, além de visitas ao Horto
Florestal de Presidente Epitácio e às Unidades de Conser-
vação Ambiental do Município, com o intuito de propiciar
aos alunos o contato direto com os ecossistemas naturais do
Município, e assim, promover meios de fazê-los reconhecer
as ameaças que os afetam e permitir uma reflexão sobre os
impactos e ações que possam contribuir para resolver ou mi-
nimizar os efeitos danosos de tais ameaças. Também foram
ministradas as seguintes palestras temáticas: O ciclo da água
e sua distribuição; O rio Paraná e suas riquezas; A estação de
tratamento de água; e O valor social da água.
Precedendo as palestras supracitadas, os Grumetes Mirins
visitaram a Estação de Tratamento de água de Presidente Epi-
tácio, onde puderam observar o sistema de captação, decanta-
ção, filtragem e colocação de produtos químicos, como cloreto
férrico, hidróxido de cálcio, flúor e cloro, para o tratamento da
água e sua posterior distribuição aos consumidores.
Em uma visita à Estação de Tratamento de esgoto, os
Grumetes Mirins verificaram, in loco, a chegada do esgoto,
através da rede coletora; as estações elevatórias de esgoto;
o gradeamento, onde as águas servidas correm para retirar
os materiais grosseiros que tenham passado pelas bombas; a
lagoa de estabilização, onde efetivamente o esgoto será trata-
do por meio das atividades das bactérias; a caixa de contato,
onde o esgoto recebe uma carga de cloro com a finalidade
de torná-lo sem organismos patogênicos; o leito de secagem
e finalmente a água tratada sendo devolvida ao rio Paraná.
Seguiram, então, visitas ao Aterro Sanitário e à Usina de Re-
ciclagem de lixo.
Naquele momento (janeiro de 2006) os Grumetes Mirins
cultivavam uma horta no espaço onde recebem as instruções
e já colhem verduras e legumes, que são consumidos nas re-
feições servidas no Projeto. O trabalho de pesquisa ora reali-
zado procurou enfocar a participação da comunidade, tendo
em vista a necessidade de continuidade das ações. Durante
a realização do trabalho de campo, pudemos observar o en-
volvimento de professores, alunos e segmentos da sociedade

132 João Abrahão da Silva


epitaciana na participação e no registro das atividades desen-
volvidas pelos Grumetes Mirins. Um exemplo do supramen-
cionado envolvimento foi à matéria publicada no periódico A
Fronteira de 17 de agosto de 2005, na qual o autor ressaltava o
trabalho de Educação Ambiental que vinha sendo desenvol-
vido junto aos Grumetes Mirins, com destaque para palestras
e visitas às Estações de Tratamento de água e esgoto. Assim,
pudemos dimensionar o grau de envolvimento e o espírito
de responsabilidade de cada elemento que se propunha a
conhecer e auxiliar na implantação do projeto. As atividades
práticas e as experiências pessoais aliadas à perseverança de
quem acredita no potencial da Educação Ambiental, certa-
mente foram os incentivos para que essa participação intensa
e franca se efetivasse.
O envolvimento dos alunos e seu interesse pelo projeto
podem ser facilmente percebidos quando observamos os
trabalhos por eles confeccionados após as palestras e visitas
realizadas. A expressividade dos desenhos e dos questiona-
mentos por si só evidenciam uma mudança de atitude. Fo-
ram produzidos cerca de 107 trabalhos sobre o tema Meio
Ambiente, realizados em grupo ou individualmente, e, atra-
vés desses trabalhos apresentados por cartazes e desenhos,
pudemos perceber todo o sentimento de defesa e amor à
natureza que ficou interiorizado nas crianças do Projeto Gru-
metes Mirins.
Junior e Pelicioni (2002) afirmam que:
a Educação Ambiental é um processo de educação
política que possibilita a aquisição de conhecimentos
e habilidades, bem como a formação de atitudes que
se transformam necessariamente em práticas de cida-
dania que garantem uma sociedade sustentável.

E continuam, afirmando que:


se a educação implica em adesão voluntária, ou seja,
se o indivíduo só incorpora aquilo em que acredita e
que corresponde às necessidades sentidas, o papel do
educador é extremamente importante na medida em
que vai criar condições para que os educandos se moti-

A EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO FILOSOFIA DE VIDA 133


vem e passem a agir de maneira desejável. A Educação
Ambiental, mais do que uma disciplina, é uma ideo-
logia bastante clara, que se apóia num ideário, num
conjunto de idéias, que conduz à melhoria da qualida-
de de vida e ao equilíbrio do ecossistema para todos os
seres vivos. Assim, além de ser efetivo instrumento de
gestão, ela deve ser uma filosofia de vida.

Tais afirmações puderam ser constatadas ao longo des-


ta pesquisa, pois a população participante engajou-se de tal
forma aos objetivos propostos que a própria comunidade de
Presidente Epitácio já cogita a formação de uma Guarda Mi-
rim Ambiental no município.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Atualmente, tem-se questionado muito as formas de implan-
tação, objetivos, necessidades e resultados de programas de
Educação Ambiental. Entre as condições básicas evidencia-
das, observa-se que, para serem efetivos, programas e proje-
tos devem promover, simultaneamente, o desenvolvimento
de conhecimentos e as mudanças de atitudes, comportamen-
tos e habilidades necessários à preservação e à melhoria da
qualidade do meio ambiente, conforme afirma Jackson Mul-
ler ( JUNIOR, PELICIONI, 2002).
Analisando as ações desenvolvidas, podemos, de maneira
bastante positiva, afirmar que a implantação do Projeto foi ao
encontro dos anseios, da necessidade de conhecimento, de
mudança de hábitos e de atitudes da comunidade que nele
se envolveu. Os próprios funcionários, professores e alunos
perceberam comportamentos diferentes no relacionamen-
to com o meio ambiente. E isso aconteceu não só no trato
com a natureza em si. Concebeu-se uma dimensão ampla
de participação ativa e responsável de cada indivíduo e da
coletividade, percebeu-se que a Educação Ambiental ia mais
além do que o simples ato de plantar árvores ou preservar
determinada área. Verificou-se que a caracterização da EA se
dá também pela incorporação das dimensões ética, socioeco-
nômica, científica, política, cultural e histórica. Percebeu-se

134 João Abrahão da Silva


ainda que manter e melhorar a qualidade ambiental não é
apenas responsabilidade dos órgãos ambientais, por meio da
elaboração de normas e do cumprimento de leis, mas tam-
bém, e principalmente, da comunidade que, participando,
pode acionar os instrumentos de que dispõe para a defesa de
seus direitos constitucionais.
Para Genebaldo Dias (1993) (apud JUNIOR, PELICIONI,
2002), essa comunidade deve estar atenta para a “qualida-
de do ar que respira, da água que ingere, dos alimentos que
come, das áreas de lazer que freqüenta, enfim da preservação
do seu patrimônio ambiental”.
A avaliação que fazemos da efetiva implantação da Edu-
cação Ambiental junto aos Grumetes Mirins é que a inter-
venção educacional levada a termo com as ações executadas
mudou positivamente o rumo das práticas de relacionamento
daquele público-alvo com a natureza. Verificou-se que o co-
nhecimento e o entendimento das questões ambientais con-
duziu aqueles indivíduos a uma postura proativa em favor
da modificação de valores e de comportamentos adequados
para a melhoria da qualidade do meio ambiente e conse-
qüentemente, da vida das pessoas.
Porém, apesar de todo o otimismo que se percebe, há que
se questionar quanto à continuidade das ações. Sabemos que
as dificuldades surgirão e, como escreveu Saint Exupery,
“você se torna responsável por aquele que cativa”. A respon-
sabilidade da continuidade do projeto de EA junto aos Gru-
metes Mirins está nas mãos de todos nós que iniciamos essa
empreitada. E, como pesquisadores e responsáveis pela idéia
de implantação do Projeto, estamos conscientes do dever a
ser cumprido.
As perspectivas de apresentação a Câmara Municipal,
pelos Grumetes Mirins, de uma Agenda 21 para a Estância
Turística de Presidente Epitácio é um indício real de que a se-
mente plantada germinou e o crescimento será devidamente
acompanhado por todos, resultando em excelentes frutos que
haverão de ser colhidos por essa e pelas próximas gerações.
Consideramos, dessa forma, a partir dessa avaliação posi-
tiva, que a implantação de projetos de EA em ambientes não-

A EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO FILOSOFIA DE VIDA 135


formais de ensino, podem e devem ser incentivados cada vez
mais. Temos consciência das dificuldades financeiras, sociais,
de formação e informação que, por vezes ou quase sempre,
nos desestimulam, porém entendemos que “navegar é preci-
so”, só precisamos corrigir o rumo.

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136 João Abrahão da Silva


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A EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO FILOSOFIA DE VIDA 137


ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
DE ORGANIZAÇÕES DE ENSINO
Hamilton Souza

INTRODUÇÃO
Como a educação se fundamentará no século XXI? Que ca-
racterísticas devem ter as organizações de ensino para que se-
jam perenes? Afinal, o que as organizações de ensino devem
fazer para estruturar as suas atividades?

A EDUCAÇÃO NO SÉCULO XXI


O tão esperado século XXI iniciou-se. Muitas pessoas e mui-
tas organizações esperam ver para crer, mas ainda não sabem
exatamente o que realmente querem ver. Muitas pessoas e
muitas organizações esperam a mudança, mas não pensam
em mudar nem a si mesmas e nem as suas organizações. É
necessário entender que a mudança começa primeiro com a
nossa própria mudança.
O ritmo acelerado das mudanças tornou-se parte inerente
do contexto das pessoas e das organizações contemporâneas,
mas o motivo para a preocupação não deve ser apenas o fato
de haver mudanças, mas a velocidade acelerada que o pro-
cesso de mudança assumiu nesse início de século.
As organizações que atuam na área de educação nem
sempre percebem que os seus alunos constituem, na verda-
de, mercados que estão sempre mudando. As exigências dos
alunos estão em uma constante dinâmica de mudança e, a
cada período de poucos anos, suas necessidades, tanto de
conteúdo quanto de estrutura de ensino, mudam significa-
tivamente remodelando o ambiente de negócios na área de
educação.

139
Muitos profissionais que atuam na área de educação ainda
não pararam para pensar que educação é um negócio como
qualquer outro negócio, porém com características especiais
de prestação de serviços à sociedade como um todo e não
no sentido mercantilista, como alguns empresários de outros
setores econômicos praticam.
Surge, então, o dilema da educação: ser ou não ser um ne-
gócio? Na verdade, a educação sempre foi um negócio, mas
as organizações de ensino nem sempre pararam para pensar
nesse contexto como uma base fundamental para o aprimo-
ramento da educação. A verdadeira razão de existência das
organizações de ensino é cumprir uma missão: educar e esta-
belecer uma reciprocidade de lucro, no sentido de evolução
dos investimentos, tanto dos alunos como da própria organi-
zação de ensino.
Por um outro lado, os alunos estão se conscientizando
de sua importância no processo de educação e, atualmente,
querem ser considerados como clientes e não como meros
alunos. Não querem mais ser “sem luz”, como o próprio sig-
nificado do termo aluno (FERREIRA, 1986), mas exigem ser
clientes, não no sentido de “quem compra, ou quem conso-
me”, e sim de “pessoa protegida”, como o próprio significado
do termo cliente (FERREIRA, 1986). Este nosso paradigma re-
velou um novo e grande problema, segundo Garden (2006):
a diluição do rigor da educação.
Os professores passaram a ser classificados sob o ponto de
vista de o quanto os alunos gostam pessoalmente deles e da
disciplina em que atuam. Essa perspectiva tornou o professor
refém de uma situação insustentável: ser professor ou ser um
show man?
Diante desse dilema, o professor começou a se preocupar
com o conceito de cliente no sentido de “quem compra, ou
quem consome”. Garten (2006) compreende que esse con-
ceito é pernicioso, pois presume que os alunos sabem julgar
melhor que tipo de ensino devem receber. Esse contexto,
gerado pelo aprisionamento da relação “contratante e con-
tratado”, permitiu que os alunos percebessem que poderiam
impor o ritmo das aulas e manipular o conteúdo conforme

140 Hamilton Souza


suas conveniências pessoais ou, até mesmo, segundo seus
julgamentos de certo ou errado. Além disso, os alunos per-
deram a disciplina, a ordem e o método em seus estudos, o
que os fez perderem a capacidade de saber que é necessário
trabalhar arduamente para ter sucesso.

A EDUCAÇÃO ENQUANTO UM SERVIÇO DIFERENCIADO


Um fator deve ser claro para a educação no século XXI: ela
é um serviço como qualquer outro ofertado pelo mercado.
Segundo Kotler e Keller (2006), “serviço é qualquer ato ou
desempenho, essencialmente intangível, que uma parte pode
oferecer a outra e que não resulta na propriedade de nada”.
Dessa forma, podemos compreender que a educação é um
serviço com características especiais, projetado para atender
às expectativas mais amplas da sociedade, por meio de uma
oferta diferenciada de conhecimentos amplos e específicos,
que permitem a evolução humana nos sentidos material e
espiritual.
A essência do pensamento apresentado nesse trabalho
fundamenta que educação é um serviço de uma oferta dife-
renciada. Portanto, os alunos são clientes não apenas porque
pagam para adquirir um serviço, mas também porque devem
ser protegidos, ou seja, devem ser apoiados e acompanhados
de perto no seu processo de “aquisição” – no sentido de ab-
sorção – do conhecimento. Todavia, a noção simplista de que
o aluno é um cliente pelo fato de pagar o que adquire – no
sentido de consumo – afeta profundamente a qualidade do
ensino. Ver o aluno simplesmente como cliente que paga é di-
ferente de vê-lo como cliente que adquire uma informação e
gera um conhecimento. Apesar de pagar, o aluno deve seguir
uma disciplina, uma ordem e um método, para criar e sus-
tentar valores em uma sociedade, mediante o conhecimento
aplicado. Pensar no aluno como cliente que simplesmente
paga para ter o direito de “consumir” alguma “coisa” que vai
lhe conferir algum “título”, mesmo que ele não saiba exata-
mente o que representa e a que se destina esse título, torna o
professor, que é o verdadeiro agente da transformação edu-

ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA DE ORGANIZAÇÕES DE ENSINO 141


cacional de uma sociedade, um refém das condições e dos
interesses mais diversos dos alunos. A visão deturpada dos
alunos como clientes pelo fato de terem “direitos” meramen-
te porque pagam por “algo” que ninguém sabe exatamente o
que é e para que serve, mas que todos “concordam” que deve
ser “certificado” no final do curso, pode levar a atuação do
professor em sala de aula a ter uma conotação idiotizante do
seu próprio conteúdo educacional, por exigência do aluno,
um agente que não domina o conhecimento científico e ain-
da quer torná-lo de todo amorfo ou objeto de um propósito
tecnicista (GARTEN, 2006). Para que a educação seja efetiva,
temos de acreditar que são os professores, e não os alunos, os
agentes das diretrizes da educação.
Ver o aluno como cliente não tem relação nenhuma com
o seu atendimento de acordo com os seus interesses parti-
culares, até porque quem não domina um contexto não tem
como estruturá-lo e aplicá-lo a determinadas circunstâncias
da vida pessoal e profissional. É, isto sim, respeitá-lo como
um ser inteligente, que demanda uma grande necessidade
de evolução de conhecimento, é estabelecer uma relação es-
tável, honesta e duradoura, que permitirá o seu desenvolvi-
mento material e profissional, que, conseqüentemente, pos-
sibilitará o estabelecimento de uma reciprocidade lucrativa
– no sentido de evolução – entre o aluno e a sua organização
de ensino, pela conscientização do valor da educação oferta-
da e não pelo seu preço.
Diante desse contexto, o professor assume a sua verda-
deira função: a de orientador educacional. É ele quem deve
pensar, julgar e estabelecer que tipo de ensino vai ofertar.
Portanto, somente dessa forma fica desmistificada a visão do
aluno como “cliente consumidor” – e cliente é quem adqui-
re, e não quem apenas compra, paga e consome. Os alunos
têm direitos, sim, mas tão-só depois de cumprirem os seus
deveres, que constituem em estudar aquilo que foi concebi-
do cientificamente pelos professores e viabilizado estrutural-
mente pelas organizações de ensino.
As organizações de ensino, diante do dilema de ser ou não
um negócio estruturado e dos novos paradigmas da educa-

142 Hamilton Souza


ção, despertaram para a necessidade imperativa e imediata
de construírem uma nova proposta de organização de ensino,
fundamentada na administração estratégica e em uma oferta
diferenciada de serviços, como exige a sociedade atual.
Mas como criar e sustentar uma oferta diferenciada de
serviços na área da educação? A administração, como ciên-
cia social aplicada, pode colaborar com o processo educa-
cional por meio de seus fundamentos e práticas. E como a
administração pode fazer isso? Simples, muito simples: dei-
xando bem claro que administração é para administrador e
educação é para educador. O educador deve se preocupar
com a qualidade da educação e o administrador com a quali-
dade do negócio educacional.
O termo “negócio” não significa produção indiscriminada
ou desvirtuamento de crenças, mas sim atuar sobre a dinâ-
mica competitiva em que a organização está inserida, isto
é, estabelecer um conjunto de ações cientificamente estru-
turadas para criar bem-estar social. Negócio não é heresia, é
competitividade – é fato inerente ao capitalismo. Então se-
ria necessário acabar com o capitalismo para acabar com a
competitividade e, conseqüentemente, com a necessidade de
gerar lucros para manter um projeto educacional? Não, de
jeito nenhum. Pelo contrário: temos de aperfeiçoar a prática
do capitalismo para que a competição se estabeleça pela qua-
lidade e não pela mediocridade.

AS ORGANIZAÇÕES DE ENSINO E O NOVO PARADIGMA EM


EDUCAÇÃO: ADMINISTRAÇÃO É PARA ADMINISTRADOR
E EDUCAÇÃO É PARA EDUCADOR
A administração constitui uma atividade essencial, relevante
e imperativa em uma sociedade fundamentada em coope-
ração mútua entre organizações e pessoas. É a ciência das
decisões. Administrar é objetivar resultados que estabeleçam
a perenidade das organizações e a sua tarefa básica é realizar
as coisas por meio de pessoas, de modo a obter os melhores
resultados para ambos. Eis, portanto, os objetivos de todas

ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA DE ORGANIZAÇÕES DE ENSINO 143


as organizações, tenham ou não fins lucrativos. A busca pelo
resultado é o que caracteriza a dinâmica das organizações.
Administrar é uma ciência, um conjunto organizado de
conhecimentos relativos a um determinado objeto, espe-
cialmente os obtidos mediante a observação, a experiência
dos fatos e a um método próprio (FERREIRA, 1986). Mais
especificamente, é uma ciência social que se caracteriza por
um conteúdo teórico (um conjunto sistemático de idéias e
conhecimentos), prático (exige a verificação concreta do seu
funcionamento) e aplicado (existem diversos meios de atu-
ação sobre um mesmo fenômeno, com vistas a um mesmo
objetivo) (FERREIRA, 1986).
Como toda ciência, administrar implica teoria e prática. A
teoria consiste um conjunto de conhecimentos não ingênuos,
que apresentam graus diversos de sistematização e credibi-
lidade, e que se propõem explicar, elucidar, interpretar ou
unificar um dado domínio de fenômenos ou de acontecimen-
tos que se oferecem à atividade prática (FERREIRA, 1986).
Uma teoria explica um fenômeno, uma opinião ou um sis-
tema científico destinados a orientar uma ação (FERREIRA,
1986), e seu papel principal é possibilitar que se compreen-
dam determinados aspectos graças ao conhecimento do seu
conteúdo geral, antecipando-se à sua ocorrência e, mediante
observação, modificá-los. Já a prática é a aplicação da teoria
na execução do trabalho, o saber oriundo da experiência.
Vale ressaltar que a prática só vem antes da teoria no dicio-
nário. Se praticarmos antes de teorizarmos algo, de desenvol-
vermos um conjunto de conhecimentos não especulativos,
certamente estaremos desperdiçando recursos e energias.
Para a administração realizar melhor os seus objetivos, ela
deve ter uma orientação estratégica, deve buscar um caminho
como um todo, para a organização atingir os seus objetivos
(RICHERS, 2000). Seu direcionamento estratégico estabelece
um estado especial de administração: a administração estra-
tégica orientada para o valor. Mas, afinal, o que é valor? No
contexto organizacional, valor é um conjunto de característi-
cas de desempenho e de atributos que uma organização cria,
em forma de produto ou serviço, e que pelos quais os clientes-

144 Hamilton Souza


alvo estão dispostos a pagar (HITT, IRELAND, HOSKISSON,
2003). A capacidade de criar e sustentar valor é essencial
para a competitividade de uma organização e é o âmago do
sucesso da administração estratégica. A administração estra-
tégica orientada para o valor é uma filosofia organizacional
que se concentra em criar, sustentar, potencializar e entregar
valor superior para os clientes, como uma forma de alcançar
os objetivos da própria organização.
As organizações de ensino orientadas para o valor devem
se basear nos seguintes fundamentos:
 Liderança fundamentada em ética e responsabilidade social: a
administração estratégica orientada para o valor exige que
os administradores liderem os seus negócios fundamenta-
dos em valores éticos e em atitudes com responsabilida-
de social. O modelo de administração estratégica ética e
responsável socialmente acredita que “o exemplo vem de
cima”, ou seja, que não se pode exigir o que não se dá. Os
administradores devem exercer sua liderança consideran-
do as pessoas, o meio ambiente, as demais organizações e
as leis da sociedade.
 Empreendedorismo: os administradores de uma organização
não ficam simplesmente sentados atrás de uma mesa, em
meio a um monte de papéis, ou interagindo com o com-
putador, ou mesmo resolvendo apenas problemas “bu-
rocráticos”. A administração estratégica orientada para o
valor faz com que os administradores realizem as coisas
por meio das outras pessoas da organização. O modelo
de administração estratégica empreendedora fundamenta
que os administradores devem identificar oportunidades,
antecipar-se aos fatos e à concorrência, assumir riscos
conscientes e responsáveis, criar projetos viáveis e com-
patíveis com os recursos da organização, estabelecer infra-
estrutura, desenvolver processos, agregar pessoas visioná-
rias e compromissadas e implementar algo que gere valor
para a sociedade como um todo, desde que gere lucros
(sociais ou financeiros) para a organização. Em resumo: o
administrador empreendedor vê o que ninguém viu e faz
o que ninguém ainda fez.

ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA DE ORGANIZAÇÕES DE ENSINO 145


 Pensamento estratégico dinâmico: a administração estratégi-
ca orientada para o valor faz com que os administrado-
res pesquisem, analisem e avaliem o mercado para criar
novos negócios ou melhorar a atual posição competitiva
de sua organização em relação aos seus concorrentes. O
modelo de administração estratégica dinâmica fundamen-
ta que os administradores devem pensar e agir de forma
holística, conduzindo a organização aos seus objetivos e à
conquista da sua perenidade.
 Foco no mercado e nos clientes: a administração estratégica
orientada para o valor esclarece que toda a infra-estrutura
e todas as pessoas da organização devem se concentrar
em atividades e produtos ou serviços focados no merca-
do-alvo e nos clientes-alvo. O modelo de administração
estratégica voltada para o mercado e os clientes estabelece
que os administradores devem pensar orientados pelo e
para o mercado e os clientes.
 Foco nos stakeholders: stakeholders são indivíduos ou gru-
pos que podem influenciar ou serem influenciados pelas
decisões administrativas de uma organização. A adminis-
tração estratégica orientada para o valor, ainda que deva
enfocar o cliente, não pode ignorar os outros públicos de
uma organização. O modelo de administração estratégi-
ca focalizada nos stakeholders esclarece que a organização,
além de ter o cliente como o centro de seus negócios, deve
também se concentrar em atividades e produtos ou servi-
ços voltados para os objetivos estratégicos dos stakeholders:
acionistas e proprietários da organização, fornecedores,
financiadores, órgãos governamentais, grupos de pressão
(sindicatos, entidades de classe etc.), concorrentes, comu-
nidades locais e a sociedade em geral.
 Foco em resultados: a administração estratégica orientada para
o valor fundamenta-se em fixar e atingir objetivos, reduzir
custos e aumentar receitas. O modelo de administração es-
tratégica focada em resultados não admite, sob nenhuma
hipótese, que os objetivos determinados pela organização
não sejam cumpridos da forma certa e em tempo hábil pe-
los administradores e demais funcionários.

146 Hamilton Souza


 Foco em pessoas: a administração estratégica orientada para
o valor educa, motiva e desenvolve a cultura participativa
entre seus colaboradores. O modelo de administração es-
tratégica focada em pessoas investe em talentos humanos
como princípio, meio e fim de toda e qualquer ação orga-
nizacional. Acredita que a administração de organizações
acontece com as pessoas e para as pessoas. Além disso,
acredita que patrimônio, máquinas e equipamentos são
importantes, mas não criam nada – só as pessoas criam,
e só as pessoas inteligentes e preparadas justificam a exis-
tência de qualquer empreendimento.
 Foco em tecnologia: a administração estratégica orientada
para o valor investe continuamente em atualização tecno-
lógica. O modelo de administração estratégica focada em
tecnologia investe continuamente em atualização tecnoló-
gica de infra-estrutura, máquinas e equipamentos, proces-
sos, produtos ou serviços, projetos e em educação orienta-
da para o trabalho e para a cultura geral, enfim, investe no
processo de mudança e aprimoramento tecnológico como
diferencial competitivo da organização.
 Foco em inovação: a administração estratégica orientada para
o valor investe continuamente em inovação. O modelo
de administração estratégica focada em inovação investe
continuamente em inovação organizacional, de processos
e de produtos ou serviços. A combinação de valor com
inovação produz uma expressão interessante, denomina-
da inovação de valor, que torna a competição irrelevante
quando oferece aos mercados existentes um valor novo e
superior, além de possibilitar que o cliente crie valor para
ele mesmo. Portanto, a inovação de valor é uma fonte de
vantagem competitiva. Uma efetiva inovação de valor
institui um valor radicalmente diferente e maior para os
clientes, em vez de simplesmente criar aumentos incre-
mentais de valor. Para que a inovação de valor seja possí-
vel, a organização precisa ser capaz de transformar aquilo
que aprendeu em conhecimento competitivo e, com isso,
transformar o conhecimento em fonte para o desenvolvi-
mento de novas competências essenciais.

ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA DE ORGANIZAÇÕES DE ENSINO 147


 Foco em aprendizado e conhecimento: a administração estraté-
gica orientada para o valor investe maciçamente em apren-
dizado contínuo e renovado da organização. O modelo
de administração estratégica focada em aprendizado e co-
nhecimento considera a organização que aprende como
aquela que se ocupa em criar, adquirir e transferir conhe-
cimentos e alterar comportamentos humanos com base
em novos conhecimentos. As organizações que aprendem
se preocupam com a solução sistemática de problemas,
a experimentação de novas idéias, o aprendizado a par-
tir da experiência e de fatos históricos, o aprendizado a
partir de fatores externos e a rápida transferência de co-
nhecimentos dentro da organização como um todo. Além
disso, preocupam-se com a administração desses conheci-
mentos como diferencial competitivo da organização.
 Foco em visão e ação global: a globalização é um fato dinâmi-
co e complexo que está promovendo uma nova revolução
em termos de paradigmas e de negócios. O modelo de
administração estratégica orientada para o valor entende
e considera que a organização deve examinar a possibi-
lidade de internacionalizar o seu sistema produtivo e a
captação e aplicação de investimentos.

CONCLUSÃO
As organizações de ensino precisam refletir sobre suas práti-
cas de negócios. Já não é mais possível insistir em um modelo
de ação sem um modelo de administração. As organizações
de ensino não podem mais pensar que em educação tudo é
diferente do mundo empresarial. Devem, é claro, repensar
com critérios, posto que por não serem diferentes das demais
organizações, não significa que devam ser organizações de
produção mecanicista.
Para Guedes e Vieira (2006), ”a riqueza dos indivíduos,
das empresas e dos países, na nova sociedade do conheci-
mento, vai ter de passar por uma valorização da educação”.
O conhecimento, resultante do investimento em educação é
um ativo cada vez mais valioso. Em termos de negócios, o

148 Hamilton Souza


setor econômico da educação representa, praticamente, 15%
do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro (GUEDES, VIEIRA,
2006), o que denota o valor econômico e social de investir
em educação.
O momento é delicado, e, como todo momento de mu-
dança, gera perplexidades. O importante é entender a di-
nâmica do negócio da educação e suas novas necessidades.
As organizações de ensino devem estabelecer um modelo
de administração estratégica focada na criação e na susten-
tabilidade de valor para o mercado, para o cliente e para a
sociedade como um todo. No século XXI, as organizações
de ensino necessitam ser visionárias; livres de preconceitos,
costumes e dogmas; descentralizadas, desverticalizadas, fle-
xíveis; adaptáveis, dinâmicas e rápidas, enfim, precisam ser
“leves” e estar sempre prontas para as rápidas mudanças de
contextos e conceitos. Além disso, devem estar preparadas
para rupturas drásticas, já que, com a introdução de novas
tecnologias, seu negócio e seus serviços podem desaparecer
celeremente. Guedes e Vieira (2006) sintetizam o atual mo-
mento da educação identificando que “há muita competição,
o que baixa os preços, um excesso de regulamentação e um
choque de tecnologia chegando. Mas é fundamental para o
futuro, apesar de estar desorganizado, acreditarmos na opor-
tunidade da reestruturação”.
Hoje vemos o surgimento da organização de ensino estra-
tégica. O mercado mutante já não premia o crescimento sem
foco. Por isso, as organizações de ensino devem reformular
suas atividades em busca do foco estratégico, concentran-
do-se nos negócios que podem criar valor sustentável com
a aplicação de suas competências básicas para proporcionar
vantagem competitiva. Portanto, conclui-se que a adminis-
tração estratégica, no contexto das organizações de ensino,
tornou-se uma atitude de adequação das atividades de uma
organização ao ambiente em que ela opera e a seus próprios
recursos.
Às organizações de ensino e aos profissionais envolvidos
em sua administração e operacionalização, cabe estabelecer
uma administração profissional executada por profissionais

ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA DE ORGANIZAÇÕES DE ENSINO 149


competentes, da área de administração, e profundamente
orientada pelas bases filosóficas da educação. O Brasil preci-
sa de educação de qualidade para deixar de ser subadminis-
trado e proporcionar bem-estar social à sua população.

BIBLIOGRAFIA
CHURCHILL JR., G. A.; PETER, J. P. Marketing: criando valor
para o cliente. São Paulo: Saraiva, 2000.
HOLANDA FERREIRA, A. B. de. Novo Dicionário da Língua Por-
tuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
HITT, M. A.; IRELAND, R. D.; HOSKISSON, R. E. Administra-
ção estratégica. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2003.
GARTEN, J. Reviravolta em Yale. São Paulo: HSM Management,
2006.
KOTLER, P.; KELLER, K. L. Administração de marketing. São Pau-
lo: Prentice-Hall, 2006.
LEVITT, T. (1960). Miopia em marketing. In: Coleção Harvard de
Administração, v. 1. São Paulo: Nova Cultural, 1986.
RICHERS, R. Marketing: uma visão brasileira. São Paulo: Negócio
Editora, 2000.
VIEIRA, C. Educação é foco de fundo da Fidúcia. In: Valor Econô-
mico, 10 de agosto de 2006, p. C5.

150 Hamilton Souza


COLABORADORES

ANGELA ALBUQUERQUE GARCIA


Fonoaudióloga Clínica. Doutora em Fonoaudiologia pela
Universidade del Museo Social Argentino. Especialista em
Voz pelo CFFa. Professora-adjunta do curso de Fonoaudiolo-
gia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

BIANCA NOE LAROSE


Tradutora do texto: inglês para português. Fonoaudióloga
pela Universidade Estácio de Sá/RJ. Nos EUA, trabalhou
como voluntária nos setores de cardiologia pediátrica do
hospital universitário da Universidade de Michigan e no de
Fonoaudiologia do Hospital Cooley Dickinson, em Massa-
chusetts. Atualmente, atua como fonoaudióloga em escolas
públicas e privadas em Massachusetts. Mestranda do progra-
ma de Desordens da Comunicação na Universidade de Mas-
sachusetts – Amherst.

DÉBORA ALESSANDRA DE SOUZA


Psicóloga Educacional. Mestre Profissionalizante em Ensino
de Ciências da Saúde e do Ambiente. Centro Universitário
Plínio Leite – UNIPLI.

DILENI FREITAS DOS SANTOS (Organizadora)


Fonoaudióloga. Professora Universitária – Faculdade Pesta-
lozzi – ESEHA. Mestre Profissionalizante em Ensino de Ci-
ências da Saúde e do Ambiente – Centro Universitário Plínio
Leite – UNIPLI. Pós-graduada em Marketing – Universidade

151
Cândido Mendes. Especialização em Fonoaudiologia Hospi-
talar – UNESA. Especializanda em Voz – Núcleo de Estudos
da Voz Falada e Cantada – CLINVOZ.

ELISABETTA RECINE
Nutricionista. Doutora em Saúde Pública. Professora-adjun-
ta da Universidade de Brasília/Departamento de Nutrição.
Coordenadora do Observatório de Políticas de Segurança
Alimentar e Nutrição.

GLAUCIA APARECIDA ROSA CINTRA PERETTI


Professora. Mestre em Geografia pela Universidade Júlio
de Mesquita Filho – Faculdade de Ciência e Tecnologia de
Presidente Prudente (SP). Advogada especialista em Direito
Ambiental e Desenvolvimento Sustentável pela Pontifícia Uni-
versidade Católica – PUC – Londrina (PR). Professora de Ge-
ografia da EE 18 de Junho de Presidente Epitácio. Professora
Universitária da UNIESP – Faculdade de Presidente Epitácio
(SP). Professora Substituta da Unesp de Rosana (SP). Douto-
randa no Curso de Pós-graduação em Geografia “Organização
do espaço Geográfico” na UNESP de Rio Claro (SP).

HAMILTON DE SOUZA PINTO


Professor Universitário. Mestre em Administração pelo Cen-
tro Universitário Metodista Bennett e Mestrando em Siste-
mas de Gestão pela Universidade Federal Fluminense.Espe-
cialista lato-sensu em marketing e em gestão estratégica pela
Universidade Cândido Mendes. Administrador pelo Centro
Universitário Metodista Bennett.

JOÃO ABRAHÃO DA SILVA


Professor Universitário da Faculdade de Presidente Epitácio
(SP) – UNIESP. Mestre Profissionalizante em Ensino de Ciên­
cias da Saúde e do Ambiente no Centro Universitário Plínio
Leite – UNIPLI. Oficial Superior da Marinha do Brasil.

152 TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO


JULIANA REZENDE MELO DA SILVA
Nutricionista. Pesquisadora Associada do Projeto “A Escola
Promovendo Hábitos Alimentares Saudáveis”. Observatório
de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição/UnB. Espe-
cializanda em Obesidade e Emagrecimento.

LILIAN CONCEIÇÃO XAVIER CARDOZO


Psicóloga. Mestre Profissionalizante em Ensino de Ciências
da Saúde e do Ambiente. Centro Universitário Plínio Leite
– UNIPLI.

MARIA DE LOURDES CARLOS FERREIRINHA RODRIGUES


Nutricionista. Professora da Universidade de Brasília/Depar-
tamento de Nutrição. Doutoranda da Universidade Federal
da Bahia/Instituto de Saúde Coletiva. Pesquisadora Associa-
da do Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e
Nutrição. Coordenadora de Projetos de Pesquisa fomentados
pelo CNPq.

MARY ANDRIANOPOULOS
Professora. Doutora associada da Universidade de Massachu-
setts – Amherst. Seus interesses de pesquisa e experiência clíni-
ca são nas áreas de desordens sensório-motoras da fala, análise
de voz e medidas quantitativas acústico-perceptivas, diagnós-
ticos diferenciados e reabilitação de desordens sensório-moto-
ras da voz e da fala, fundamentos neurológicos das desordens
da comunicação, e novos paradigmas do aprendizado motor.
Pós-doutorado em Fonoaudiologia Hospitalar com enfoque nas
patologias da fala na Clínica Mayo, em Rochester, Minnesota.
Autora de várias publicações em jornais acadêmicos, capítulos
de livros e manuais de ensino, e tem apresentado suas pesquisas
internacionalmente. Atua revisando artigos para: Jornal Ameri-
cano de Fonoaudiologia (American Journal of Speech Language Patho-
logy), Linguagem, Fala e Audição nas Escolas (Language Speech and
Hearing in the Schools), e para o novo Programa de Investigadores da

TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO 153


Fundação da Voz (Investigators Program for the Voice Foundation). Re-
cebeu inúmeros prêmios de qualidade de ensino e serve como
membro adjunto no Departamento de Ciências da Cognição da
Universidade de Atenas, na Grécia.

NINA FLÁVIA DE ALMEIDA AMORIM


Nutricionista. Responsável técnica do Projeto “A Escola Pro-
movendo Hábitos Alimentares Saudáveis”. Observatório de
Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição” – UnB. Espe-
cializanda em Administração e Planejamento de Projetos
Sociais. Consultora da Organização das Nações Unidas para
Agricultura e Alimentação – FAO.

PATRÍCIA MARTINS FERNANDEZ


Nutricionista. Professora do Centro Universitário UniCEUB
e Faculdades JK/Departamento de Nutrição.
Mestre em Nutrição Humana pela Universidade de Brasília.
Pesquisadora associada à diretoria regional de Brasília da
Fundação Oswaldo Cruz – DIREB/FIOCRUZ.

RENATA ALVES MONTEIRO


Nutricionista. Assessora Técnica da Secretaria de Atenção à
Saúde – Ministério da Saúde. Especialista em Saúde Coletiva
– Educação em Saúde/UnB. Especialista em Políticas Públi-
cas e Gestão em Saúde/UNICAMP. Mestrado em Nutrição
Humana/UnB. Pesquisadora Associada Júnior do Departa-
mento de Nutrição/NUT.

RENATA BERNARDON
Nutricionista. Responsável técnica do Projeto “A Escola Pro-
movendo Hábitos Alimentares Saudáveis”. Observatório de
Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição” – UnB. Espe-
cialista em Nutrição Clínica e Esportiva pela Universidade
Católica de Goiás.

154 TECENDO REDES: CONEXÃO ENTRE SABERES PARA EDUCAÇÃO

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