2017
ANA CLARA MENEZES PETERSEN E IRLEIDIANE DE JESUS SANTOS
2017
A NECESSIDADE DA IMPLANTAÇÃO DE LIBRAS COMO COMPONENTE
CURRICULAR OBRIGATÓRIO EM CURSOS DE SAÚDE PARA FORMAÇÃO
DE PROFISSIONAIS MAIS HUMANIZADOS
A partir disso, podemos inferir que, como todas as línguas foram formadas a
partir da necessidade dos indivíduos de se comunicar, as línguas orais evoluíram porque
os indivíduos de determinada sociedade oralizavam e precisavam se entender entre si,
assim como as línguas de sinais são a forma de entendimento entre as comunidades
surdas do mundo.
Gesser (2009) relata em seu livro que apesar da língua de sinais não ser
universal, ou seja, ser a mesma em todo o mundo, pode-se afirmar que é universal a
necessidade que os indivíduos tem de se comunicar, por isso a língua de sinais nasceu
como uma forma natural de se comunicar de um grupo cultural do povo surdo.A Língua
Brasileira de Sinais (LIBRAS) é utilizada pela comunidade surda brasileira como
primeira forma de comunicação.
Apesar de existirem tais leis que garantem a inclusão dos surdos na sociedade
atual, ainda encontram-se dificuldades no diálogo entre eles e os ouvintes. Isso acontece
pela dificuldade que a sociedade ouvinte tem de aceitar e estudar a língua de sinais e,
por isso, muitas vezes, nos deparamos com situações em que culpabilizamos e
marginalizamos o surdo por uma limitação nossa. Esse preconceito está enraizado
socialmente, muito devido à antiga proibição do uso da língua de sinais no Brasil.
Até o século XV, os surdos eram considerados como ineducáveis, até que teve
início a educação dos surdos, tendo como berço a França. Em 1857, no Brasil Império, a
língua de sinais foi trazida para ser implementada uma educação surda no território
brasileiro. Apesar das inúmeras proibições relacionadas ao uso da língua de sinais no
Brasil, em 2002, a LIBRAS foi finalmente reconhecida como uma língua oficial
brasileira. (MONTEIRO, 2006). Segundo Gesser (2009): “Cada língua de sinais tem
suas influências e raízes históricas a partir de línguas de sinais específicas. [...] Tanto a
língua americana de sinais (americansignlanguage - ASL), quando a língua brasileira de
sinais (LIBRAS) tem suas origens na língua francesa de sinais.”.
[...] ser Surdo (com “S” maiúsculo) é reconhecer-se por meio de uma
identidade compartilhada por pessoas que utilizam língua de sinais e não
vêem a si mesmas como sendo marcadas por uma perda, mas como
“membros de uma minoria linguística e cultural com normas, atitudes e
valores distintos e uma constituição física distinta.
“Que todos os que vão lidar com o público, estejam preparados para lidar
com esse público, seja ele qual for. A pessoa com deficiência ou não; o mais
pobre, o mais rico. Estarem preparados para lidar com esta pessoa e respeitar
a diferença quando encontrar uma pessoa diferente deles, no caso – isso é
muito importante. Respeitar, entender, ter uma postura ética– eu acho isso
muito importante” (entrevistada)
Dessa forma, é necessário que o profissional esteja preparado para atender a todo
o público de maneira adequada, inclusive o indivíduo surdo.
É relatado ainda pelos profissionais de saúde que eles precisam conhecer mais a
pessoa surda e o ideal seria que não houvesse intérpretes, mas não há um curso de
LIBRAS para eles, sendo que esse seria essencial. (CHAVEIRO et al., 2010). Essa
limitação dos profissionais poderia diminuir se, em cursos de saúde fosse implementado
o ensino de LIBRAS como componente curricular obrigatório, assim como o é na
formação de professores, segundo o capítulo II do Decreto nº 5.626, de 22 de Dezembro
de 2005:
Art. 3º A Libras deve ser inserida como disciplina curricular obrigatória nos
cursos de formação de professores para o exercício do magistério, em nível
médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiologia, de instituições de ensino,
públicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos sistemas de ensino dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
§ 1º Todos os cursos de licenciatura, nas diferentes áreas do conhecimento, o
curso normal de nível médio, o curso normal superior, o curso de Pedagogia
e o curso de Educação Especial são considerados cursos de formação de
professores e profissionais da educação para o exercício do magistério.
§ 2º A Libras constituir-se-á em disciplina curricular optativa nos demais
cursos de educação superior e na educação profissional, a partir de um ano da
publicação deste Decreto.
Tais explanações deixam evidente que não são os surdos que precisam saber
oralizar ou ler lábio para um acolhimento bem feito nos locais de saúde, mas sim a
sociedade que precisa adaptar-se às necessidades desse grupo, para assim, incluí-lo no
cuidado em saúde. (CHAVEIRO; ALVES BARBOSA, 2005, p. 420). Fica perceptível a
necessidade dos surdos serem compreendidos pelos profissionais de saúde na seguinte
fala de uma paciente surda:
‘Tive apendicite (...). Meu esposo também é surdo, (...). No primeiro hospital
que fui deram-me remédio e falaram que podia voltar para casa que não era
nada sério. A dor só aumentava, procuramos outro hospital, não conseguiram
nos entender, aplicaram uma injeção (...). Já não suportava de tanta dor, foi
quando chegou em casa nossos amigos, um casal de surdos, eles tinham
carro, fomos buscar uma sobrinha minha, ouvinte, para ir junto ao hospital,
só assim recebi atendimento. Fui operada, o apêndice supurou. Fiquei
internada 9 dias, ninguém pôde ficar comigo, estava sozinha, os profissionais
do hospital não sabiam conversar comigo, passei mal, chorei, tudo sozinha.
(S3)’ (CHAVEIRO; ALVES BARBOSA, 2005, p. 421).
Dessa forma, é possível notar, pela bibliografia encontrada, que a assistência que
prestada ao indivíduo surdo hoje ainda é muito precária, mesmo ele tendo seus direitos
garantidos por lei. Isso se deve, em muito, a uma falta de capacitação dos recursos
humanos que hoje trabalham nos espaços de saúde do SUS. Por isso, é de suma
importância a implantação da disciplina de LIBRAS como componente curricular
obrigatório em cursos de saúde, para que o cuidado com as pessoas surdas seja
completo.
2%
8,90% Sim
Não
Talvez
89,10%
Além disso, através de estudos, Chaveiro et al. (2008, p. 581) afirmam que a
população surda que usa linguagem gestual é linguisticamente e culturalmente um
grupo minoritário, porém a maior parte dos cursos na área de saúde singulariza a surdez
como uma condição patológica, não considerando a população surda como um grupo
cultural dessa minoria.
34,70% Surdo
35,60%
Surdo-Mudo
Deficiente auditivo
Mudinho
26,70%
Outra
De acordo com isso, a maioria das pessoas respondeu que utiliza a terminologia
deficiente auditivo (35, 6%) e, em segundo lugar, surdo (34,7%). Porém 26,7% utilizam
o termo surdo-mudo, o que exprime que há uma falta de conhecimento em relação à
cultura surda e as denominações corretas a serem utilizadas.
Essas três palavras resumem muito bem a formação acadêmica humanizada que
vem sendo proposta nos últimos anos, como no curso de Bacharelado Interdisciplinar
em Saúde. O acolhimento está “[...] baseado no estabelecimento de relações solidárias e
de confiança entre os profissionais e as pessoas que procuram os serviços, para resolver
seu problema de saúde, tornando-se aspecto importante para que ocorra o vínculo,
contribuindo para a resolubilidade do problema.” (TEDESCO; JUNGE, 2013, p. 1686).
O “respeito”, segundo Santos e Souza (2000) está diretamente relacionado com atitudes
ena consideração de que essas atitudes, por sua vez, relacionam-se estreitamente ao
modo como interpretamos e definimos as diferenças, e qual a representação que
fazemos delas. Já empatia é a “[...] habilidade de se colocar no lugar das pessoas, para
que uma pessoa possa visualizar e sentir na mesma perspectiva as experiências
vivenciadas por outra(s) — atitude fundamental para o bem-estar físico e mental de
ambas.” (TEREZAM; REIS-QUEIROZ; HOGA, 2017, p.697).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
BENTES, Iratyenne Maia da Silva; VIDAL, Eglídia Carla Figueirêdo; MAIA, Evanira
Rodrigues. Percepção da pessoa surda acerca da assistência à saúde em um município
de médio porte: estudo descritivo-exploratório. Online braz. j. nurs.(Online), v. 10, n.
1, 2011.
BISOL, Cláudia; SPERB, Tania Mara. Discursos sobre a surdez: deficiência, diferença,
singularidade e construção de sentido. Psicologia: Teoria e Pesquisa, v. 26, n. 1, p. 7,
2010.
CHAVEIRO, Neuma et al. Atendimento à pessoa surda que utiliza a língua de sinais, na
perspectiva do profissional da saúde. Cogitare Enfermagem, v. 15, n. 4, 2010.
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Ensaio sobre a origem das línguas. São Paulo: Abril
Cultural, 1978. (Coleção Os Pensadores).