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“O tempo é da alma”

Por | Herbert de Souza


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A vida do homem se conta em décadas. São raros os que chegam a um centenário, e quando essa
proeza é alcançada, despedem-se da vida antes mesmo do primeiro decênio. Por esse aspecto temporal,
viver é triste porque finito. A percepção dessa fugacidade existencial quase nunca se dá antes dos 40.
Até esse momento, acreditamos que tudo pode nos acontecer, exceto deixar de existir. Quando nos
apercebemos da real e fatídica realidade do fim, do nosso fim, vez por outra apanhamo-nos em
reminiscências: a infância aqui e ali se faz presente, e as dores e delícias da juventude já têm nomes,
por certo alguns doces e coloridos e outros, nem tanto.

É a partir dos cinquenta que os contornos da queda começam a se delinear, mostrar suas curvas, quase
todas descendentes. Para muitos, é o começo do fim. Por mais que se tente disfarçar, haverá alguém
a nos lembrar e a nos chamar de senhoras ou senhores em qualquer ambiente em que estejamos,
formal ou informal, de trabalho ou de lazer… Se é possível disfarçar os quarenta – e muitos até
conseguem –, os cinquenta já têm jeito próprio, independência, personalidade, certezas demais…

Por que necessitamos tanto negar a idade que temos? E para quem?

A resposta é simples e concisa: para nada nem para ninguém! O tempo, contradizendo todas as nossas
vontades, passará. E para todos. Assim como a morte, ele é inexorável. Somos levados a querer
perpetuar a juventude porque nos ensinaram desde cedo que o bacana é ser jovem e para sempre.
Tudo neste mundo é criação, eterna (re)invenção, (re)construção, inclusive o tempo e a ideia de jovem
e seus derivados juvenis. O mundo inventou a eterna juventude e a mídia criou e divulgou a cartilha
do forever young: James Dean, Presley, o Elvis, índigo blue (velho e desbotado), paz e amor!, sexo,
drogas, rock and roll… Acreditar nisso é uma lástima, porque a juventude não se eterniza nos corpos.
É preciso negar a forma e seguir vivendo.

Aliás, se bem pensarmos como os estoicos (helenistas do século III a. C), tanto o passado quanto o
futuro são tempos que não existem no mundo. Tudo é presente! A memória que trago de uma vida
que se foi, de um outrora, nada mais é do que a reconstrução personificada e presentificada do que já
aconteceu. O antes somente existe para o eu quando ele o recupera e o traz para o agorinha do instante,
para o aqui e agora. O tempo é da alma, como diz Santo Agostinho.
É preciso aceitar-se em seu tempo e abraçar o novo que chega, não importa se aos vinte, quarenta,
cinquenta… Para os muito jovens, decerto, o novo tem sempre cara de novidade, e nada que lhes
aconteça – exceto as auguras corriqueiras da tenra idade – causa-lhes questionamentos existenciais
do tipo "o-que-será-a-partir-de-agora, oh Deus?!" Já para os com mais estações, no entanto, quando
esse senhor tão bonito, como diz o Caetano, começar a deixar suas marcas nos corpos e clarear as
têmporas, o espírito – andarilho de muitas trilhas – deve se refestelar e agradecer ao Deus, no altar
que melhor lhe aprouver, por ter lhe permitido protagonizar cenas dos próximos capítulos dessa
tragicomédia em quatro estações (acreditem, muitos hoje não conseguem sequer viver suas
primaveras!).

Com um pouco de sorte, inteligência, criatividade e elegância (porque não há almas deselegantes no
paraíso) – quando alforriados das demandas e obrigações comuns que a rotina laboral, social e
familiar tanto nos consome –, a vida a partir de então poderá ser bem melhor do que já foi um dia. É
possível mesmo reverter a curvatura temporal descendente em ascendente e transformar a artrite
reumatoide imobilizante em leveza de asas de anjos. Para tal, basta tão somente percebermos que são
as rugas de dentro as que de fato incomodam quem as têm e quem as veem, e para essas o bisturi
cirúrgico jamais será capaz de extirpar. É preciso livramo-nos dela para ontem. O verdadeiro elixir
de uma vida longeva e jovial é a justeza do caráter, o andar de mãos dadas de amantes e amigos, a
música que se canta com e para o ser amado, a reza em prece para os que deixaram lembranças, o
passo do dia, sem pressa e sempre compassado, a poesia da Coralina, você e eu, eu e você …

Ah, meu caro amigo, apenas isso é suficiente para recebermos, pela luz dos olhos de outrem, ao
cruzarmos muitas esquinas que a vida ainda há de nos conceder, numerosos "nossa, como você está
lindo!", "nossa, como você está linda!". Acredite, é assim que a coisa funciona, e se ainda não está
nesse ponto para você, faça acontecer.

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