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Universidade Federal do Piauí – UFPI

Campus Ministro Reis Velloso

Docente: Milaynne Christina Barros Do Nascimento

Curso: Psicologia

Bloco/Período: 8°

Ponciá Vivêncio e Carolina Maria de Jesus sob o prisma da clínica ampliada.

Gabriel Aleksander

Parnaíba – PI,

13 de Novembro de 2017
A ponte entre os sentidos é um arco-íris.

Gabriel Aleksander de Moura Sousai

Perpetuar histórias através das narrativas literárias usando o intrigante


recurso da escrita e suas interessantes formas de acessar de maneira
imprevisível esse leitor que pode estar tão distante em sua vivência pessoal da
realidade ali contada, sendo a atmosfera descrita no enredo uma forma de
facilitar esse encontro entre mundos. A experiência de se conectar com as
histórias de Carolina Maria de Jesus em seu livro “Quarto de Despejo” e as de
Ponciá Vivêncio e seus familiares na obra escrita por Conceição Evaristo, se
estabeleceu em minha trajetória de vida como o momento em que pude entrar
em contato com aquilo que pessoas que têm suas existências negadas
diariamente na sociedade na qual vivo tinham para contar sobre a vida e os
sentidos que atribuem a elas.

Nessa relação com a escrita que Carolina de Jesus pauta momentos


marcantes de sua vida onde o papel, proveniente do seu trabalho como catadora,
era o campo seguro para despejar tudo aquilo que se acumulava em sua vivência
na favela, era a partir do exercício da escrita que Carolina encontrava seu espaço
para dar seus gritos de desespero, raiva, desesperança e sua indignação política
acerca da manutenção das desigualdades de poder presentes na sociedade
desde aquela época e que também são encontrados na novela escrita por
Conceição Evaristo.

Em “Ponciá Vivêncio” nos deparamos com a trajetória da protagonista que


nomeia a obra desde sua infância até a vida adulta e os momentos em que viveu
em uma aldeia em terras de senhores brancos, caracterizando um regime
escravista mesmo após da simbólica abolição da escravatura, que em sua
realidade apenas passa por uma repaginação das estruturas de poder dispostas
socialmente. A partir do momento que Ponciá decide sair de sua aldeia e
adentrar outros territórios da cidade em busca de oportunidades para melhorar
a vida é que ela se depara com estruturas físicas e simbólicas de exclusão
existentes para uma mulher, pobre e negra, reforçando um conjunto de novas
violências. Conceição Evaristo ilustra em sua obra como as linhas de produção
das subjetividades de seus personagens interferem diretamente em suas formas
de ser no mundo, inclusive, desafiando o leitor a tentar encaixar Ponciá em uma
categoria de diagnóstico, deixando durante a maior parte do enredo como um
mistério a ser resolvido, mesmo que no final nos mostre que na verdade isso não
importa e sim todo o percurso da personagem até ali.

Tanto Carolina quanto Ponciá nos convidam a repensar a importância dos


atravessamentos que um indivíduo experiencia em sua trajetória de vida e as
interferências existentes aos sentidos atribuídos, como por exemplo, a história
infantil acerca das propriedades mágicas que um arco-íris possui em possibilitar
que uma pessoa ao passar por baixo dele torne-se um homem. Ponciá
demonstra sua relação com essa lenda como algo que a amedronta em sua
infância mas que passa a se tornar objeto de seu desejo após ser vítima das
violências de gênero as quais sofreu durante sua vida. Enquanto Carolina relata
sobre uma conversa com sua mãe onde ela não entendia o porquê a
transformação do seu sexo não acontecia quando a mesma concluía a sua
travessia por baixo da cintilante cobra de cores que risca o céu, visto que naquela
época esse símbolo estava relacionado ao fato de pessoas do sexo masculino
poderem servir o exército e proteger o país, o qual ela passa a analisar de forma
diferente anos depois ao escrever seus diários correlacionando com a distância
presente entre os habitantes do quarto de despejo e os políticos eleitos e
detentores do poder.

Perceber a forma como os sentidos são modificados e os significados que


uma lenda infantil toma na vida dessas pessoas após serem expostas a faces
demoníacas de seus algozes sociais nos ajuda a pensar sobre a importância de
ouvir de forma ativa e sensível os relatos de um indivíduo para o qual algumas
instâncias do sistema viraram as costas, no entanto, com os quais o
compromisso social de profissionais da saúde deveriam estar mais engajados,
principalmente ao falarmos sobre trabalhadores que são regidos por diretrizes
de sistemas como o SUS e SUAS que prezam pela universalidade e
contextualização do indivíduo em relação a sua questão problema, o que ilustra
a distância existente entre o ideal e o real nas práticas profissionais e como esse
elemento fortalece as supressões de direitos dos menos abastados de poder.

Ao falarmos sobre uma perspectiva de um fazer clínico reformulado e


ampliado, também precisamos refletir acerca da vulnerabilidade que a clínica
ampliada tem em termos de execução em meio a um sistema neoliberal pautado
em uma lógica supressora de subjetividades, a qual facilitam muito mais a
execução de práticas ainda voltadas para um modelo conservador do exercício
biomédico e até mesmo do assistencialismo pontual atravessado por interesses
daqueles que estão no topo da cadeia alimentar social. Portanto, ao propor uma
aproximação do discurso das minorias que possuem suas existências
depositadas em quartos de despejo da nossa sociedade é a oportunidade do
exercício da clínica ampliada em termos de conhecer a territorialização dos
espaços de fala e produções de sentido desses indivíduos.

Apesar da grandiosidade das obras de Conceição Evaristo e Carolina


Maria de Jesus, ainda é perceptível a invisibilidade dessas autoras na
comercialização de suas obras em grande escala e o conhecimento acerca das
contribuições que as mesmas oferecem para a literatura e a sociedade, mesmo
no caso da autora de “Quarto de Despejo” que teve sua obra comercializada em
grande escala e traduzida em várias línguas, mas que caiu em esquecimento em
relação as suas outras produções, e que até quando se trata de seu grande
sucesso de vendas, o mesmo é posto em questionamento até hoje acerca de
sua veracidade de fatos relatados e sua validação enquanto literatura. Desse
modo torna-se notório as reformulações das violências e exclusões
constantemente produzidas por nós enquanto sociedade, ao mesmo tempo em
que, essas autoras nos passam uma mensagem importante: somos produtos e
produzimos realidades, os simbolismos e significados são construídos e,
portanto, podem ser desconstruídos, tendo como o primeiro passo a implicação
acerca do que nos faz movimentar em âmbito individual e comunitário.

Portanto, ao finalizar a experiência de escutar as vozes que são


representadas pelas narrativas presentes nas duas obras colocadas sob
perspectiva pude produzir questionamentos acerca da minha motivação
enquanto um profissional da atenção básica de saúde em formação, e sobre a
importância em desconstruir a barreira simbólica que existe entre o lugar de onde
falo para o lugar com o qual falo na busca de me movimentar na direção da
construção de uma ponte que possibilite a criação do fluxo entre essas múltiplas
formas de existências com a minha, mesmo em meio a um turbilhão de percalços
existentes na prática de tal discurso.
Referências:

JESUS, Carolina Maria de. Quarto de Despejo. São Paulo: Ática, 1999.
EVARISTO, Conceição. Ponciá Vicêncio. Belo Horizonte: Mazza Edições,
2013

i
Acadêmico do curso de Bacharelado em Psicologia, 8° período, Universidade Federal do Piauí- UFPI,
Campus Ministro Reis Velloso - Parnaíba.

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