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Resumo da Lei Maria da Penha – Lei nº 11.

340/06
Livro: BRASILEIRO, Renato. Legislação Criminal Especial Comentada. 3ª ed.
Juspodivm: Salvador, 2015.
1. Fundamento constitucional e convencional
o
Art. 1 Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e
o
familiar contra a mulher, nos termos do § 8 do art. 226 da Constituição Federal,
da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a
Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência
contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República
Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica
e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às
mulheres em situação de violência doméstica e familiar.
O fundamento constitucional é extraído do art. 226, §8º. Contudo, não é
apenas a Constituição que fundamenta a edição desta lei. Inúmeros tratados
internacionais vêm sendo firmados desde a 1ª Conferência Mundial sobre a
Mulher, ocorrida no ano de 1975, no México. A partir dela, firmou-se a
Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra
as Mulheres, ou simplesmente Convenção da Mulher, além da Década das
Nações Unidas para a Mulher (1975-1985).
A iniciativa rendeu frutos e começou a enraizar nos países convencionados as
chamadas ações afirmativas ou discriminações positivas, que são “políticas
especiais e temporárias que buscam reduzir ou minimizar os efeitos
intoleráveis da discriminação em razão de gênero, raça, sexo, religião,
deficiência física, ou outro fator de desigualdade”.
Seguidamente, foram realizadas a 2ª e a 3ª Conferência Internacional sobre a
Mulher, além da Conferência de Direito Humanos das Nações Unidas,
realizada em Viena, Áustria, onde ficou formalmente definida a violência contra
a mulher como espécie de violação aos direitos humanos. Em sede regional,
adotamos a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a
Violência Doméstica, conhecida como Convenção de Belém do Pará, no ano
de 1994.
Fenômeno do processo de especificação do sujeito de direito: meio pelo qual
o sistema geral de proteção aos direitos humanos passa a coexistir com um
sistema especial, por força do qual determinados grupos específicos também
passam a gozar de uma proteção especial e particularizada em virtude de sua
própria vulnerabilidade.

2. Origem da Lei Maria da Penha


O nome que identifica a Lei 11.340/06 advém de um caso de grave violação de
direitos humanos ocorrido no Brasil, levado à Comissão Interamericana de
Direitos Humanos, em que Maria da Penha Maia Fernandes sofreu graves
agressões de seu marido, ficando consignado no relatório que “a ineficácia
judicial, a impunidade e a impossibilidade de a vítima obter uma reparação
mostra a falta de cumprimento do compromisso assumido pelo Brasil de reagir
adequadamente ante a violência doméstica”. Cinco anos mais tarde surgiria a
Lei Maria da Penha, com o objetivo de coibir e reprimir a violência doméstica e
familiar contra a mulher.
3. Direitos e garantias fundamentais da mulher
o
Art. 2 Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação
sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos
fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as
oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e
mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social.
o
Art. 3 Serão asseguradas às mulheres as condições para o exercício efetivo
dos direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à
moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à
liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.
o
§ 1 O poder público desenvolverá políticas que visem garantir os direitos
humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido
de resguardá-las de toda forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão.
o
§ 2 Cabe à família, à sociedade e ao poder público criar as condições
necessárias para o efetivo exercício dos direitos enunciados no caput.
Aparentemente redundantes, estes dispositivos, na verdade, guardam extrema
importância, pois não se resumem a positivar direitos que já são de titularidade
de qualquer ser humano, mas reafirmam, isto sim, a igualdade material que
se busca entre homens e mulheres, para acelerar a igualdade substantiva
entre os gêneros, ao invés da mera igualdade formal que se tem ainda hoje.
4. Interpretação da Lei Maria da Penha
o
Art. 4 Na interpretação desta Lei, serão considerados os fins sociais a que ela se
destina e, especialmente, as condições peculiares das mulheres em situação de
violência doméstica e familiar.
As disposições da Lei 11.340/06 devem ser sempre interpretadas em
homenagem às mulheres em situação de vulnerabilidade, ou seja, que são
vítimas de violência doméstica, familiar ou em relação íntima de afeto e jamais
em sentido contrário.
5. Violência doméstica e familiar contra a mulher
TÍTULO II
DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
o
Art. 5 Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar
contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause
morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou
patrimonial: (Vide Lei complementar nº 150, de 2015)
I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de
convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as
esporadicamente agregadas;
II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por
indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por
afinidade ou por vontade expressa;
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou
tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem
de orientação sexual.
A proteção conferida pela Lei Maria da Penha é voltada para a mulher tida
como vulnerável quando inserida em situações legais específicas elencadas
alternativamente no art. 5º: a) ambiente doméstico; b) ambiente familiar; c)
relação íntima de afeto.
Por conseguinte, a proteção diferenciada para o gênero feminino terá
incidência apenas quando a violência contra a mulher for executada em tais
situações de vulnerabilidade. A contrario sensu, se a violência contra a mulher
for executada em ambiente que não seja doméstico, familiar ou em qualquer
relação íntima de afeto, afigura-se indevida a aplicação da Lei 11.340/06 (ex.:
ambiente de trabalho, briga entre vizinhos, etc.).
Deve-se restar claro que não há necessidade de vínculo familiar entre
agressor e vítima no caso de violência doméstica, pois o dispositivo faz
referência ao espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem
vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas.
Ademais, a violência doméstica e familiar contra a mulher, disposta no art. 5º,
consiste em qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause
morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou
patrimonial. Além disso, o art. 7º define as diversas formas de violência como
qualquer conduta. Daí surge a dúvida: qual a natureza do elemento subjetivo
necessário para fins de incidência da Lei Maria da Penha? Apenas infrações
penais dolosas, ou dolosas e culposas?
Apesar de aparentemente os referidos dispositivos não apresentarem qualquer
distinção, não se pode concluir que as condutas culposas recebam a incidência
da Lei 11.340/06. Para a incidência da Lei Maria da Penha é fundamental
que a conduta perpetrada seja dolosa. A conduta culposa não tem desvalor
suficiente para a aplicação da LMP e consequente rejeição dos benefícios da
Lei 9.099/95. Apesar disso, o STF entende que a lesão corporal leve ou
culposa praticada contra mulher no âmbito doméstico é de ação penal pública
incondicionada, por não ser aplicável a Lei 9.099/95 aos crimes cometidos com
violência doméstica e familiar contra mulher (art. 41 da LMP).
Em síntese, conclui-se que a aplicação da LMP está condicionada à presença
de três pressupostos cumulativos (e não alternativos):
1) Sujeito passivo mulher;
2) Prática de violência física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral: para fins de
incidência da LMP, basta o cometimento de qualquer uma das hipóteses de violência;
3) Violência dolosa praticada no âmbito da unidade doméstica, no âmbito da família, ou
em qualquer relação íntima de afeto, ou seja, situações em que se presume maior
vulnerabilidade da mulher.
5.1. Sujeito ativo
Para a caracterização da violência doméstica e familiar contra a mulher, não é
necessário que a violência seja perpetrada por pessoas de sexos distintos. O
agressor pode ser um homem (união heterossexual) ou uma mulher (união
homossexual). Assim, lésbicas, travestis, transexuais e transgêneros de
identidade feminina estão ao abrigo da LMP, quando a violência for perpetrada
entre pessoas que possuem relações domésticas, familiares e íntimas de afeto.
Doutrina minoritária: sustenta que não se justifica a aplicação da LMP
quando a violência for perpetrada por uma mulher contra a outra, por inexistir
uma pressuposta superioridade de forças e, portanto, vulnerabilidade.
O autor se filia à corrente que defende que apenas há presunção absoluta de
vulnerabilidade na relação entre homens e mulheres. Para ele, quando a
relação é entre mulheres, há presunção relativa, somente e aplicando a LMP
se a vítima estiver em situação de hipossuficiência física ou econômica, em
condição de vulnerabilidade. O STJ já decidiu que não configura hipótese de
incidência da LMP (que tem como objeto a mulher numa perspectiva de gênero
e em condições de hipossuficiência) a ofensa entre irmãs.
5.2. Sujeito passivo
Para ser sujeito passivo da LMP há exigência de qualidade especial: ser
mulher. Por isso, a LMP protege não apenas esposas, companheiras, amantes,
namoradas ou ex-namoradas, como também filhas e netas do agressor, sua
mãe, sogra, avó, ou qualquer outra parente do sexo feminino com a qual haja
uma relação doméstica, familiar ou afetiva.
Não é possível a aplicação da LMP nas hipóteses de violência contra pessoas
do sexo masculino, mesmo quando originadas no ambiente doméstico ou
familiar, e ainda que a vítima seja vulnerável em relação homoafetiva.
Para o autor, não se justifica a aplicação da LMP tampouco ao transexual que
se submeta à cirurgia de reversão genital (neovagina), obtendo a alteração do
sexo em seu registro de nascimento por meio de decisão transitada em
julgado, pois não se pode querer equipará-lo a uma mulher para fins de
incidência da LMP, já que continua a ser geneticamente homem.
Na agressão contra vítimas de sexos diversos, estará sujeita à LMP apenas a
vítima do sexo feminino, porém, os processos poderão tramitar conjuntamente,
em virtude da conexão probatória entre os dois delitos, no Juizado de Violência
Doméstica e Familiar contra a Mulher. Os benefícios da Lei 9.099/95 poderão
ter incidência para o homem, em virtude da regra do art. 60, § único, desta lei:
Lei 9.099/95: Art. 60. O Juizado Especial Criminal, provido por juízes togados ou
togados e leigos, tem competência para a conciliação, o julgamento e a execução
das infrações penais de menor potencial ofensivo, respeitadas as regras de
conexão e continência.
Parágrafo único. Na reunião de processos, perante o juízo comum ou o
tribunal do júri, decorrentes da aplicação das regras de conexão e continência,
observar-se-ão os institutos da transação penal e da composição dos danos civis.
O fato de a vítima ser figura pública renomada não afasta a competência do
Juizado da Mulher para processar e julgar o delito. É irrelevante a condição
pessoal da mulher para aplicação da LMP, pois a situação de vulnerabilidade e
de hipossuficiência revela-se ipso facto.
5.3. Âmbito da unidade doméstica
A primeira situação diz respeito ao “âmbito da unidade doméstica,
compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou
sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas”. A expressão
com ou sem vínculo familiar deixa claro que a existência de laços familiares ou
de uma relação íntima de afeto entre agressor e vítima não é condição sine qua
non para o reconhecimento da violência abrangida pela LMP. Nessa hipótese, o
legislador presume a vulnerabilidade da mulher levando em conta o aspecto
espacial em que foi praticada a conduta.
No entanto, é indispensável que agressor e vítima façam parte dessa mesma
unidade doméstica, ainda que esporadicamente agregados, pois o legislador
faz referência ao espaço de convívio permanente de pessoas.
No tocante a empregadas domésticas, será necessária a demonstração do
convívio permanente para a incidência da LMP. Dessa forma, não é possível
dizer que uma diarista que eventualmente presta serviços na residência seja
abarcada pela LMP, ao contrário de uma empregada que mora na casa da
família e é tratada por todos como integrante da casa.
5.4. Âmbito familiar
A segunda hipótese que autoriza o reconhecimento da violência doméstica e
familiar contra a mulher ocorre quando a agressão é cometida no âmbito da
família, “compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou
se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por
vontade expressa”.
Ao contrário da hipótese anterior, o fator determinante aqui é a existência de
vínculos familiares, pouco importando o local de cometimento da violência,
que não necessariamente precisa ser o espaço caseiro. A violência familiar
contra a mulher estará caracterizada se ocorrida na unidade doméstica ou em
qualquer outro ambiente, independentemente de coabitação entre o agente e a
ofendida. Por isso mesmo o irmão que vai até a casa da irmã para ameaçá-la
deve ser julgado no âmbito do Juizado da Mulher.
A violência no âmbito da família engloba as pessoas unidas por vínculo jurídico
de natureza familiar, podendo ser conjugal (casamento), parentesco (linha reta
ou por afinidade) ou por vontade expressa (adoção). A definição alcança
igualmente a filiação socioafetiva, uma vez que o estado de filho afetivo faz
com que as pessoas sintam-se aparentadas.
5.5. Qualquer relação íntima de afeto, independentemente de
coabitação.
A última situação diz respeito à existência de “relação íntima de afeto, na qual
o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de
coabitação”. Trata-se de um inciso muito polêmico, em virtude de a LMP ter
ultrapassado os limites conceituais de violência doméstica estabelecidos na
norma internacional albergada pelo Brasil.
Com efeito, a Convenção de Belém exigia a coabitação, presente ou pretérita,
para que fosse configurada violência doméstica ou familiar contra a mulher. A
LMP, contudo, dispensa a coabitação, notadamente pela expressão
“independentemente de coabitação”.
Para o autor, a balbúrdia resolve-se pelo pela aplicação do princípio pro
homine, segundo o qual, em matéria de direitos humanos, deve sempre
prevalecer a norma mais favorável. Sendo assim, entre a norma de direito
internacional e a norma de direito interno, há de ser aplicada aquela que
confere maior proteção à mulher vítima de violência, qual seja, aquela
constante na LMP, que dispensa a coabitação entre agressor e ofendida para
fins de reconhecimento de uma relação íntima de afeto.
A jurisprudência (STJ) tem trilhado nesse sentido, entendendo ser
desnecessária a coabitação para configuração da relação íntima de afeto.
Com relação ao termo “relação íntima de afeto”, nota-se a opção do legislador
em apenas abarcar relações estreitas entre duas pessoas. Para o autor, a
norma deve ser interpretada restritivamente, para abranger apenas relações de
conotação sexual ou amorosa. Uma simples amizade, por mais próxima que
seja, não pode se etiquetada como relação íntima de afeto, não estando
presente o requisito da vulnerabilidade da mulher.
Com relação ao namoro como espécie de relação íntima de afeto, o STJ
entende que deve ser analisado o caso concreto. Não se pode ampliar o termo
para abarcar um relacionamento passageiro, fugaz ou esporádico. Todavia,
verificando-se nexo de causalidade entre uma conduta criminosa e a relação
de intimidade existente entre agressor e ofendida, há de se reconhecer a
incidência da LMP, pouco importando tenha havido ou não a coabitação.
6. Violência doméstica e familiar contra a mulher como uma
das formas de violação dos direitos humanos
o
Art. 6 A violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas
de violação dos direitos humanos.
O fato de o art. 6º da LMP considerar a violência doméstica e familiar contra a
mulher como uma das formas de violação dos direitos humanos não significa
dizer que, por força do art. 109, V-A, da CF, a competência para julgamento
seria da Justiça Federal.
O chamado incidente de deslocamento de competência criado pela EC 45
não fixou a competência exclusiva da JF para os crimes contra os direitos
humanos. Pelo contrário, reafirmou a competência dos Estados, ficando a
competência da JF condicionada ao preenchimento dos requisitos do §5º:
a) A existência de crime praticado com grave violação aos direitos humanos;
b) Demonstração concreta de risco de descumprimento de obrigações decorrentes de
tratados internacionais firmados pelo Brasil, resultante da inércia, negligência, falta de
vontade política ou de condições reais do Estado-membro, por suas instituições, em
proceder à devida persecução penal.
Ainda que a violência doméstica e familiar contra a mulher funcione como uma
das formas de violação dos direitos humanos, subsiste a competência da
Justiça Estadual para o julgamento desses processos. Somente será
deslocada a competência para a JF se ficar evidenciada a inércia do Estado-
membro em proceder à persecução penal.
7. Formas de violência contra a mulher
CAPÍTULO II
DAS FORMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR
CONTRA A MULHER
o
Art. 7 São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre
outras:
Ao contrário do significado tradicional do Direito Penal, a violência para a Lei
Maria da Penha tem outra conotação. Enquanto no CP a violência é somente a
física ou corporal (vis corporalis), excluindo-se a grave ameaça ou a violência
imprópria, na LMP utiliza o termo “violência” em sentido amplo, ou seja,
abarcando não apenas a violência física, como também a violência psicológica,
sexual, patrimonial e moral.
Além disso, a LMP utiliza o termo violência moral diferente daquele utilizado no
Código Penal. Enquanto no CP a violência moral é equivalente à grave
ameaça, na LMP esta é utilizada para se referir às condutas que configurem
calúnia, difamação e injúria. Por outro lado, optou pela expressão “violência
psicológica” para se referir à qualquer espécie de ameaça contra mulher.
A caracterização da violência contra mulher não exige que sejam perpetradas
todas as modalidades do art. 7º. Para o reconhecimento, basta a presença de
um dos incisos, ou seja, uma das modalidades de violência, desde que
combinado com um dos pressupostos do art. 5º (âmbito doméstico, âmbito
familiar ou relação íntima de afeto).
Para o reconhecimento da violência não há necessidade de habitualidade,
basta qualquer ação ou omissão para configurar violência (art. 5º).
Discute-se na doutrina se o rol de violência contra mulher é taxativo (numerus
clausus) ou exemplificativo (numerus apertus):
Doutrina do numerus clausus: para esta doutrina (minoritária), por se tratar de
regime jurídico mais gravoso, ou seja, norma restritiva de direitos, conferindo
proteção diferenciada ao gênero feminino, a norma não pode ser interpretada
extensivamente. Logo, a expressão “entre outras” deve ser entendida em função
da configuração aberta das definições contidas em cada um de seus incisos, e
não de modo a permitir a ampliação das formas de violência contra a mulher;
Doutrina do numerus apertus: doutrina majoritária entende que, como o art. 7º
fala “entre outras”, não se trata de rol taxativo. É perfeitamente possível o
reconhecimento de outras formas de violência contra a mulher, já que o legislador
não poderia prever, de antemão, todas as situações de violência que podem
ocorrer no âmbito de uma relação doméstica, familiar ou íntima de afeto. Tem-se aí
verdadeira hipótese de interpretação analógica.
7.1. Violência física
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua
integridade ou saúde corporal;
Trata-se do emprego de violência física (vis corporalis) visando causar lesão à
integridade, tal como fraturas, equimoses, queimaduras, escoriações,
luxações e hematomas, ou à saúde corporal, tal como perturbações
fisiológicas (desarranjo no funcionamento de órgão) ou mentais (alteração
prejudicial da atividade cerebral).
7.2. Violência psicológica
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause
dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o
pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações,
comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento,
humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição
contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de
ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à
autodeterminação;
Por vezes, a utilização da violência psicológica é mais grave do que a violência
física, buscando o agressor causar danos emocionais à mulher, por meio de
ameaças, ridizularizações, humilhações, prejudicando seu desenvolvimento.
São delitos que materializam este tipo de violência o sequestro, o cárcere
privado, o constrangimento ilegal e a ameaça. Em caso concreto, o STJ
entendeu que houve violência psicológica do agressor contra sua irmã, quando
ele fez ameaças de causar mal injusto e grave, provocou danos materiais no
carro, com o objetivo de forçá-la a abrir mão do controle da pensão de sua
mãe, malgrado não houvesse coabitação entre ambos.
7.3. Violência sexual
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante
intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a
utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer
método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à
prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite
ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
Esta espécie de violência poder ser concretizada mediante os crimes de
estupro, estupro de vulnerável, violação sexual mediante fraude, favorecimento
da prostituição, satisfação de lascívia mediante presença de criança ou
adolescente, entre outros Crimes contra a dignidade sexual.
O fato de estes delitos terem sido praticados mediante violência doméstica e
familiar contra a mulher não tem o condão de alterar a espécie de ação
penal, que continua sendo pública condicionada à representação. A Lei
11.340/06 não faz qualquer ressalva em relação ao assunto, mantendo-se o
tratamento normal. Evidentemente, se o crime for praticado contra menor de 18
anos ou pessoa vulnerável, ou se dele resultar lesão corporal grave ou morte, a
ação penal será pública incondicionada.
Na mesma linha, como a LMP não traz qualquer ressalva, a majorante do art.
226, II, do CP, continua sendo aplicável apenas para os crimes sexuais
praticados por ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge,
companheiro, tutor, curador, preceptor, ou empregador da vítima ou por pessoa
que, por qualquer outro título, tenha autoridade sobre ela. Como se percebe,
esta causa de aumento de pena é mais restrita do que o conceito de violência
doméstica e familiar contra a mulher, que abrange qualquer tipo de parentesco.
Ex.: estupro praticado por primo no âmbito da unidade familiar, por mais que se
trate de violência familiar contra a mulher, não será possível a incidência da
causa de aumento do art. 226, II, CP.
7.4. Violência patrimonial
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure
retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de
trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos,
incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
Exemplos de crimes que materializam este tipo de violência são os delitos
contra o patrimônio. Este tipo de violência não pressupõe o emprego de vis
corporalis ou grave ameaça (ex.: furto, apropriação indébita, estelionato).
Há controvérsia doutrinária acerca da aplicação das escusas absolutórias e
relativas (arts. 181 e 182 do CP) para os crimes patrimoniais praticados contra
a mulher sem o emprego de violência ou grave ameaça:
Doutrina protetiva da mulher: Maria Berenice Dias e outros afirmam que as
escusas absolutórias e relativas não são aplicáveis às hipóteses de violência
doméstica e familiar contra a mulher. Como a violência patrimonial é uma forma de
violência doméstica e familiar contra a mulher, quando a vítima for mulher e
mantiver com o autor da infração vínculo de natureza familiar, não será possível a
aplicação das referidas imunidades. Destarte, não será mais tolerado o furto nas
relações afetivas;
Doutrina legalista: Renato Brasileiro e outros afirmam que, diante do silêncio da
LMP, que não veda a aplicação das escusas absolutórias e relativas, é de se
concluir que elas continuam a ser aplicáveis às infrações penais praticadas no
contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher. Quisesse o legislador
afastar tal incidência, faria como o Estatuto do Idoso, que expressamente
adicionou o inciso III ao art. 183 do CP, vedando a incidência das escusas nos
crimes cometidos contra idosos (maiores de 60 anos).
7.5. Violência moral
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia,
difamação ou injúria.
Competência do Juizado de Violência contra a Mulher
Os três crimes apontados acima têm penas máximas inferiores a dois anos, o
que poderia levar a crer que seriam julgados pelos Juizados Especiais
Criminais. Contudo, o art. 41 da LMP é expresso ao vedar a aplicação da Lei
9.099/95 aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a
mulher, independentemente da pena prevista. Portanto, conclui-se que,
presente uma das hipóteses do art. 5º (âmbito doméstico, familiar ou relação
íntima de afeto), não se admite a aplicação dos institutos despenalizadores da
Lei dos Juizados, recaindo sobre o Juizado de Violência Doméstica e
Familiar contra a Mulher a competência para processo e julgamento de tais
delitos.
8. Atendimento pela autoridade policial
Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito
o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os
seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo
Penal:
O art. 12 da LMP descreve algumas providências que deverão ser tomadas
pela autoridade policial, de imediato, tratando-se de rol meramente
exemplificativo. Algumas providências são obrigatórias, como a oitiva da vítima,
e outras discricionárias, como a determinação do exame de corpo de delito.
8.1. Oitiva da vítima
I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a
termo, se apresentada;
A palavra da vítima, nos crimes com violência contra mulher, é de suma
importância para o deslinde do caso, sobretudo por conta de que os crimes
deste tipo são cometidos geralmente às ocultas.
O art. 201 é aplicado subsidiariamente à LMP, possibilitando à autoridade
policial determinar a condução coercitiva da vítima que não comparecer,
quando intimada para este fim, salvo nas hipóteses de ação privada ou
condicionada à representação, em que a própria deflagração da persecutio
criminis fica condicionada à manifestação da vontade da vítima.
8.2. Colheita de outras provas
II - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas
circunstâncias;
Este inciso confirma a discricionariedade do trabalho investigatório da
autoridade policial no curso de um inquérito policial.
8.3. Remessa do pedido de medidas protetivas de urgência formulado
pela vítima
III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz
com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência;
O delegado tem até 48 horas para remeter ao juízo competente o pedido da
ofendida para concessão das medidas protetivas de urgência.
Este pedido deve ser tomado a termo e deverá conter:
o
§ 1 O pedido da ofendida será tomado a termo pela autoridade policial e
deverá conter:
I - qualificação da ofendida e do agressor;
II - nome e idade dos dependentes;
III - descrição sucinta do fato e das medidas protetivas solicitadas pela
ofendida.
§ 2o A autoridade policial deverá anexar ao documento referido no § 1o o
boletim de ocorrência e cópia de todos os documentos disponíveis em posse da
ofendida.
§ 3o Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários
médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde.
Percebe-se que o boletim de ocorrência deverá ser anexado ao pedido
formulado pela ofendida.
8.4. Determinação de realização de exame de corpo de delito da
ofendida e outros exames periciais necessários
IV - determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e
requisitar outros exames periciais necessários;
Este dispositivo deve ser interpretado conjuntamente ao art. 12, §3º, da LMP,
que diz o seguinte: “Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários
médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde ”. Se de um lado o dispositivo se filia
ao sistema da prova tarifada, impondo ao delegado que proceda ao exame de
corpo de delito (direto ou indireto) da ofendida, nos casos em que a infração
deixar vestígios, por outro lado, o art. 12, §3º, dispõe que serão admitidos
como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por
hospitais e postos de saúde.
A interpretação de parte da doutrina no sentido de que o art. 12, §3º, diz que os
laudos e prontuários médicos somente podem ser usados para embasar a
denúncia ou fundamentar medidas protetivas de urgência, e nunca para
fundamentar a sentença, é incabível, pois torna inócua a própria previsão legal
do dispositivo, que claramente faz referência aos laudos e prontuários médicos
como meios de prova.
Em síntese, em se tratando de violência doméstica e familiar contra a mulher,
subsiste a importância do exame de corpo de delito, cuja realização deve ser
determinada ex officio pelo delegado de polícia. No entanto, em clara
mitigação ao sistema de prova tarifada, o art. 12, §3º, permite a prolação da
sentença e a consequente comprovação da materialidade delitiva atestada
única e exclusivamente por laudos ou prontuários médicos.
8.5. Oitiva do agressor e das testemunhas
V - ouvir o agressor e as testemunhas;
Essa oitiva obedece ao disposto no capítulo referente do CPP.
Apesar de a oitiva judicial demandar a presença do defensor do acusado, a
oitiva pela autoridade policial não segue a mesma linha. Com efeito, a
presença do defensor é um direito do acusado, que poderá invocá-lo no
momento da sua oitiva, mas não é uma obrigatoriedade no inquérito policial.
Portanto, não se faz necessária a presença de advogado quando da oitiva do
indiciado em sede de investigação preliminar. Ademais, é normalmente
aplicável a este ato o princípio do nemo tenetur se detegere, não sendo
obrigado o investigado a produzir prova contra si mesmo.
Ausente a necessidade de curador para o menor de 21 anos, ante a revogação
tácita do art. 15 do CPP. Subsiste, no entanto, a necessidade de curador para o
índio não aculturado, assim como para o inimputável do art. 26, caput, do CP.
8.6. Identificação do indiciado e juntada da folha de antecedentes
criminais
VI - ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de
antecedentes criminais, indicando a existência de mandado de prisão ou registro
de outras ocorrências policiais contra ele;
Há quem diga que este dispositivo criou uma nova hipótese de identificação
criminal compulsória, para além das previstas no art. 3º da Lei 12.037/09.
Contudo, para o autor, a LMP não instituiu a obrigatoriedade de identificação
criminal do sujeito ativo da violência doméstica e familiar contra a mulher. O
principal argumento é o de que a Lei 12.037/09 dispõe acerca dos casos de
identificação criminal de maneira taxativa, ao afirmar que o civilmente
identificado não será submetido a identificação criminal, “salvo nos casos
previstos nesta Lei”, excluindo outras possibilidades e trancando o rol.
Portanto, a identificação de que trata a LMP no seu art. 12, VI, é a civil,
passível de ser satisfeita por meio dos documentos enumerados no art. 2º da
Lei 12.037/09 (identidade, trabalho, profissional, passaporte, funcional, militar).
8.7. Remessa ao juiz e ao Ministério Público
VII - remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao Ministério
Público.
Por fim, deve o delegado remeter ao juiz e ao MP, no prazo legal, o inquérito
policial. O prazo legal aqui é o prazo do CPP, previsto no art. 10º: dez dias para
o indiciado preso em flagrante ou preventivamente; 30 dias para o indiciado
solto, mediante fiança ou sem ela.
9. Aplicação subsidiária do CPP, do CPC, do ECA e do Estatuto
do Idoso
Nos casos não regulados pela LMP, o art. 13 permite que sejam aplicados,
subsidiariamente, as normas do CPP, do CPC, do ECA e do Estatuto do Idoso.
10. Juizados de violência doméstica e familiar contra a
mulher
Com o objetivo de evitar a repetição da lentidão constatada no caso Maria da
Penha, o legislador criou os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra
a Mulher. Apesar do nome, nada tem a ver com os Juizados Especiais, afinal,
os Juizados da Mulher não aplicam, de forma nenhuma, a Lei 9.099/95. Melhor
seria se o legislador usasse o nome Varas ao invés de Juizado, mas tudo bem.
Caracterizada hipótese de violência doméstica e familiar contra a mulher, a
competência deste juizado abrange crimes e contravenções penais, além de
causas cíveis. Trata-se de competência cível e criminal. No âmbito da
competência criminal, as contravenções penais, tal como as vias de fato,
quando cometidas com violência doméstica e familiar contra a mulher, são de
competência do Juizado da Mulher, e não do Juizado Especial.
Aliás, quando constatada a violência doméstica e familiar contra a mulher, a
competência será do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher, independentemente da pena cominada para o crime ou
contravenção.
Estes Juizados funcionam, em regra, perante a Justiça Estadual, com
competência cível e criminal (cumulativa) para o processo, o julgamento e
execução das causas decorrentes de violência contra a mulher.
Importante a disposição do art. 33 da LMP, que prevê uma regra de transição
permitindo que varas criminais cumulem as competências cível e criminal para
processar e julgar as causas decorrentes da violência doméstica e familiar
contra a mulher, enquanto não houver a estruturação desses Juizados.
10.1. Crimes dolosos contra a vida praticados no contexto de
violência doméstica e familiar contra a mulher
No tocante especificamente aos crimes dolosos contra a vida, praticados no
contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher, o STF já decidiu que
a competência para o julgamento do judicium accusattionis (1ª fase do
procedimento do júri) pode ser atribuída aos Juizados de Violência Doméstica
e Familiar contra a Mulher. Isto porque a competência para o julgamento destes
crimes, até o momento da pronúncia, não é privativa do Tribunal do Júri,
podendo ser outorgado aos Juizados da Mulher.
A competência legislativa para outorgar este tipo de competência aos
Juizados da Mulher é privativa do Estado-membro, mais especificamente
através da Lei de Organização Judiciária, que poderá definir a competência
do Juizado da Mulher para processamento e julgamento da supervisão das
investigações (medidas cautelares, convalidação do flagrante, etc.) e primeira
fase do procedimento do júri, até a decisão de pronúncia.
A segunda fase do procedimento bifásico do Júri, contudo, é de competência
exclusiva do Tribunal do Júri.
11. Foro de eleição para os processos cíveis
Art. 15. É competente, por opção da ofendida, para os processos cíveis regidos
por esta Lei, o Juizado:
I - do seu domicílio ou de sua residência;
II - do lugar do fato em que se baseou a demanda;
III - do domicílio do agressor.
Apenas para os processos cíveis regidos pela LMP, a ofendida poderá optar
pela competência do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher do seu domicílio (ou da sua residência), do lugar do fato em que se
baseou a demanda, ou do domicílio do agressor. Esta possibilidade de
escolha está restrita aos processos cíveis. Em relação aos processos criminais,
continuam válidas as regras do CPP, que determinam a competência territorial
com base no lugar da consumação da infração penal.
De todo modo, nos casos de exclusiva ação privada ou de ação privada
personalíssima, o querelante poderá preferir o foro de domicílio do réu, ainda
quando conhecido o lugar da infração (CPP, art. 73). É o chamado foro de
eleição no processo penal. Contudo, sendo a ação pública, condicionada ou
incondicionada, ou mesmo privada subsidiária da pública, o foro de eleição não
se aplica.
12. Ação penal nos crimes de lesão corporal leve e lesão
corporal culposa praticados no contexto de violência
doméstica e familiar contra a mulher
Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de
que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em
audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da
denúncia e ouvido o Ministério Público.
A Lei 9.099/95 trouxe a necessidade de representação para o processamento
de ações penais relativas aos crimes de lesão corporal leve e lesão corporal
culposa. Contudo, o art. 41 da LMP define que a Lei 9.099/95 não é aplicável
aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher.
Sendo assim, os crimes de lesão corporal leve e de lesão corporal culposa,
praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, segundo o STF,
são de ação pública incondicionada, pois a Lei 9.099/95 não é aplicável a tais
tipos de crime, inclusive o seu art. 88.
Sendo assim, o STF, na ADIN nº 4.424, deu interpretação conforme a CF para
assentar a natureza incondicionada da ação penal nos casos de lesão corporal
leve e/ou culposa envolvendo violência doméstica e familiar contra a mulher.
Quanto ao art. 16, concluiu o Supremo que subsiste a necessidade de
representação para crimes dispostos em leis diversas da 9.099/95, como o de
ameaça e os cometidos contra a dignidade sexual.
13. Retratação da representação nos crimes praticados no
contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher
Em relação à representação, vale o princípio da oportunidade ou da
conveniência, segundo o qual o ofendido pode optar pelo oferecimento (ou
não) da representação. Como desdobramento dessa autonomia da vontade, a
lei prevê que o ofendido pode se retratar da representação, contudo, há um
limite temporal para esta retratação. A retratação da representação só pode ser
feita até o oferecimento da denúncia pelo MP. Note que este marco temporal
não se confunde com o recebimento da denúncia pelo magistrado. A
representação será irretratável depois de oferecida a denúncia, nos termos
do CPP.
A retratação não se confunde com a renúncia. Esta ocorre quando alguém
abre mão de um direito que ainda não fora exercido. Retratar-se significa voltar
atrás, arrepender-se; pressupõe o prévio exercício de um direito. Apesar de o
legislador utilizar a expressão renúncia, o fez impropriamente. O art. 16 refere-
se, na verdade, à retratação da representação, que pressupõe o prévio
exercício da representação, condição necessária para o início da persecutio
criminis.
Como o STF reconheceu que as lesões leves e culposas são de ação pública
incondicionada, a aplicação do art. 16 fica restrita a outros crimes, cuja
persecução exige o oferecimento da representação, tais como a ameaça e os
crimes contra a dignidade sexual.
Diferentemente do CPP, que não exige qualquer formalidade para a retratação
da representação, exceto que ocorra antes do oferecimento da denúncia, o art.
16 da LMP exige determinadas condições para que a retratação da
representação produza efeitos regulares:
1) Manifestação da vítima perante o juiz em audiência especialmente
designada com tal finalidade: a retratação até pode ser feita perante o
delegado de polícia, contudo, para que produza seus efeitos regulares,
fica subordinada à confirmação do arrependimento perante o
magistrado;
2) Oitiva do Ministério Público;
3) Limite temporal – até o recebimento da denúncia: diferentemente do
CPP, a LMP, nos casos de violência doméstica e familiar contra a
mulher, permite que a retratação da representação seja feita até o
recebimento da denúncia, em audiência especialmente designada com
tal finalidade, assegurada a presença do juiz e ouvido o MP. No CPP o
limite temporal é até o oferecimento da denúncia, na LMP, até o seu
recebimento.
14. Desnecessidade de designação da audiência para
ratificação da representação anteriormente oferecida
Note-se que a audiência de retratação da representação somente será
designada caso a ofendida tenha se manifestado, perante a autoridade policial
ou o promotor de justiça, antes do recebimento da denúncia, demonstrando
sua intenção de retratar-se da representação oferecida.
Não é admissível que tal audiência seja designada ex officio pelo magistrado,
tampouco que seja designada com o intuito de obter uma ratificação da
representação. Caso não tenha havido qualquer manifestação da vítima
quanto ao seu interesse em se retratar, não há qualquer nulidade decorrente da
não realização da referida audiência, já que a lei não exige sua realização ex
officio para ratificação da representação anteriormente oferecida. Tal audiência
não é uma condição de abertura da ação penal.
Em síntese, sua realização não pode ser determinada de ofício pelo juiz como
forma de constranger a vítima a ratificar representação anteriormente
oferecida.
15. Vedação à aplicação de penas de cesta básica ou outras
de prestação pecuniária
Art. 17. É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra
a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como
a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.
Antes do advento da LMP existia uma crítica à legislação, que permitia que o
agressor pagasse um valor para ver-se livre da prisão, configurando o princípio
de que, para bater na esposa ou companheira bastava pagar. Com o objetivo
de coibir esta prática, a LMP passou a prever a impossibilidade de aplicação de
penas de cesta básica ou outra que implique somente o pagamento de
pecúnia, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado
de multa.
No tocante à pena de multa, é importante ressaltar que o dispositivo veda
apenas a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.
Interpretando-se a contrario sensu o dispositivo, conclui-se que é perfeitamente
possível a aplicação de pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos
diversa da prestação pecuniária, cumuladas (ou não) com eventual pena de
multa, já que o art. 17 veda apenas a substituição da pena que implique o
pagamento isolado da multa, e não sua aplicação cumulativa com outras
espécies de pena.
O descumprimento de uma pena restritiva de direitos diversa da prestação
pecuniária poderá implicar na conversão em prisão, ao contrário do que ocorre
com a pena de multa, cujo não pagamento não autoriza a conversão em pena
privativa de liberdade, pois se trata de dívida de valor.
16. Medidas protetivas de urgência
O rol de medidas protetivas de urgência é meramente exemplificativo, pois o
próprio art. 22, §1º da LMP aduz que as medidas previstas neste artigo não
impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a
segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo ser
comunicado o MP. O princípio que rege as medidas protetivas de urgência é o
da atipicidade, conferindo margem de liberdade ao magistrado para se valer,
em cada caso concreto, da medida mais adequada para alcançar o resultado
almejado, ainda que a medida não esteja prevista em lei (poder geral de
cautela aplicado ao processo penal – art. 798 do CPC/73 e 297 do NCPC).
16.1. Natureza jurídica
De nada valeria uma sentença condenatória à pena privativa de liberdade, se o
acusado já tivesse evadido do distrito da culpa; de nada valeria criar
instrumentos destinados a coibir a violência doméstica contra a mulher, se o
agressor pudesse continuar praticando agressões contra sua companheira
durante o curso das investigações. Por tais razões, é evidente que as medidas
protetivas de urgência têm a natureza jurídica de medidas cautelares, pois se
mostram necessárias para instrumentalizar a eficácia do processo.
16.2. Pressupostos
Provimentos cautelares que são, as medidas protetivas de urgência se
submetem à presença do fumus comissi delicti e do periculum libertatis.
Em se tratando de medidas concedidas incidentalmente no processo penal,
não há falar em fumus boni iuris, mas sim em fumus comissi delicti. Ora, se o
delito é a própria negação do direito, como se pode afirmar que a decretação
de uma cautelar está condicionada à comprovação da fumaça do bom direito?
Não é a fumaça do bom direito que determina ou não a prisão de alguém, mas
sim a comprovação por elementos objetivos dos autos que o delito foi cometido
aparentemente por aquela pessoa. Daí o uso da expressão fumus comissi
delicti, entendido como a plausibilidade do direito de punir, ou seja,
plausibilidade de que se trata de um fato criminoso, constatada por elementos
que confirmem a presença da prova da materialidade e de indícios de autoria.
O periculum in mora, por sua vez, dá lugar ao periculum libertatis, pois não é
a demora no curso do processo que pode tornar ineficaz ou inócua a prestação
jurisdicional definitiva. Em se tratando de medidas protetivas de urgência, o
perigo não deriva do lapso temporal entre o provimento cautelar e o definitivo,
mas sim do risco emergente da situação de liberdade absoluta do agente, ou
periculum libertatis, a ser compreendido como o perigo concreto que a
permanência do suspeito em liberdade acarreta para a investigação criminal, o
processo penal, a efetividade do direito penal ou a segurança social.
Por fim, em face do caráter urgente da medida cautelar, só é exigível do juiz
uma mera cognição sumária, ou seja, é inviável exigir-se que o juiz
desenvolva atividade cognitiva exauriente, no mesmo grau de profundidade
desenvolvido no provimento definitivo.
16.3. Procedimento para aplicação das medidas protetivas de
urgência
16.3.1. Aplicação isolada ou cumulativa das medidas
O art. 19, §2º é claro ao afirmar que as medidas protetivas de urgência
previstas na LMP podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente. Sendo
assim, pode ser cumulada com o afastamento do lar a medida de fixação do
limite mínimo de distância entre a ofendida e o agressor.
As medidas cumuladas podem, inclusive, ser provenientes de diplomas
distintos. É o caso da medida de distanciamento do agressor (LMP) cumulada
com o monitoramento eletrônico (CPP).
Obviamente, quando decretada a prisão preventiva do agressor, esta não
poderá ser cumulada com nenhuma outra cautelar, haja vista o grau máximo de
restrição de liberdade.
16.3.2. Decretação das medidas protetivas de urgência pela
autoridade judiciária competente
O princípio da jurisdicionalidade determina que a decretação de toda e
qualquer espécie de provimento cautelar está condicionada à manifestação
fundamentada do Poder Judiciário. A CF (art. 5º) prevê uma miríade de normas
que enfatizam a necessidade de apreciação do Poder Judiciário para a
decretação de qualquer medida cautelar.
Não pode outro motivo, a LMP dispõe, em seu art. 19, que as medidas
protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do MP
ou a pedido da ofendida. Portanto, a restrição de liberdade (absoluta ou
relativa) do agressor deve resultar não simplesmente de uma ordem judicial
(jurisdicionalidade em sentido amplo), mas de um provimento resultante de um
procedimento qualificado por garantias mínimas, como a independência e
imparcialidade do juiz, o contraditório e ampla defesa, o duplo grau de
jurisdição, a publicidade e, sobretudo, a obrigatoriedade da motivação.
Resumindo, respeitar o princípio da jurisdicionalidade em sentido estrito
(juiz + garantias mínimas).
Destarte, tendo em vista que estas medidas afetam a liberdade do sujeito,
podendo inclusive ser convertidas em prisão preventiva diante do seu
descumprimento, não se admite que possam ser decretadas por outras
autoridades que não o juiz competente (ex.: CPI).
16.3.2.1. Decretação de medidas protetivas de urgência ex
officio pelo juiz
Por ter acolhido o sistema acusatório na CF/88, o sistema processual penal
veda a decretação de medidas cautelares pelo juiz de ofício durante a fase
investigatória. Antes de iniciado o processo, deve o juiz se abster de promover
atos de ofício.
Este entendimento foi adotado expressamente pelo CPP quando da sua
reforma pela Lei 12.403/11, constando que, durante a fase investigatória, a
decretação de medidas cautelares pelo juiz só poderá ocorrer mediante
provocação da autoridade policial, do MP ou do ofendido (nos crimes de ação
privada). Estas mudanças promovidas no CPP também têm incidência na LMP,
inclusive no tocante à possibilidade de decretação da prisão preventiva ex
officio pelo juiz, outrora prevista no art. 20 da LMP.
Por conseguinte, na fase investigatória da LMP, não mais se admite a
decretação ex officio de qualquer medida cautelar, seja ela protetiva de
urgência, cautelar diversa da prisão ou a própria prisão preventiva.
De todo modo, desde que o magistrado seja provocado, é possível a
decretação de medida cautelar, inclusive aquela que não foi requerida, desde
que mais adequada ao caso concreto, haja vista a fungibilidade que vigora com
relação a elas. Ex.: o MP requer a prisão preventiva, mas o juiz defere uma
medida protetiva de urgência. Também é lícito ao magistrado, durante a
investigação, substituir ou revogar medidas concedidas anteriormente, inclusive
de ofício, pois a revogação ou substituição recaem sobre medida anteriormente
decretada pelo próprio juiz, em relação à qual fora anteriormente provocado.
Contudo, uma vez provocada a jurisdição por denúncia do MP ou queixa-crime
da vítima, a autoridade judiciária passa a ter os poderes inerentes à jurisdição
penal, podendo decretar, substituir ou revogar as medidas cautelares, inclusive
de ofício.
16.3.3. Legitimidade para o requerimento de decretação de
medida cautelar
As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a
requerimento do MP ou a pedido da ofendida.
Trata-se de uma grande novidade trazida pela LMP, permitir que a aplicação
das medidas protetivas de urgência seja postulada pela própria vítima
perante a autoridade policial. Por mais que a LMP assegure, no art. 28, o
acesso da vítima aos serviços da DPE ou da Assistência Judiciária Gratuita, o
pedido por ela formulado de decretação da medida protetiva de urgência em
sede policial não precisa ser necessariamente subscrito por advogado.
Não é outra a redação do art. 27:
Art. 27. Em todos os atos processuais, cíveis e criminais, a mulher em situação de
violência doméstica e familiar deverá estar acompanhada de advogado,
ressalvado o previsto no art. 19 desta Lei.
Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a
requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida.
16.3.4. Contraditório prévio à decretação das medidas
cautelares
Tradicionalmente, a decretação da medida cautelar era uma providência
inesperada, que não exigia o contraditório prévio, ou seja, podia ser decretada
inaudita altera pars.
Contudo, com o advento da Lei 12.403/11, o CPP adotou expressamente, como
regra, a necessidade de contraditório prévio até mesmo para decretação das
medidas cautelares. Portanto, em face da representação da autoridade policial,
do requerimento do MP, ou do requerimento do querelante ou do assistente, o
juiz deve chamar a parte contrária para opinar.
A mudança no procedimento da decretação de medidas cautelares, apesar de
ter sido efetuada unicamente no CPP, não deve se limitar ao seu âmbito. Com
efeito, o mesmo tratamento do CPP deve ser transposto para a LMP, que
infelizmente ainda faz referência ao contraditório diferido como regra.
De todo modo, apesar de a Lei 12.403/11 ter instituído o contraditório prévio
como regra, o art. 282, §3º, do CPP, ressalta que, nos casos de urgência ou de
perigo de ineficácia da medida, o provimento cautelar poderá ser determinado
pelo magistrado sem a prévia oitiva da parte contrária. É claro! Se houver
probabilidade de que o agressor possa empreender fuga, a decretação da
prisão preventiva ou qualquer outra medida cautelar deve ser feita inaudita
altera pars, fazendo com que a surpresa seja um fator decisivo para a eficácia
da medida imposta.
16.3.5. Descumprimento injustificado das obrigações
inerentes às medidas protetivas de urgência
Verificado o descumprimento injustificado das medidas protetivas de urgência,
é possível que o juiz determine a substituição da medida, a imposição de outra
em cumulação, ou, em última hipótese, a própria prisão preventiva. O
magistrado não está obrigado a seguir esta ordem, devendo decretar a mais
adequada para o caso.
Ademais, é importante destacar que o descumprimento injustificado das
medidas protetivas de urgência não caracteriza o crime de desobediência
(CP, art. 330). Isso porque a própria LMP já prevê as consequências
decorrentes do descumprimento dessas medidas, sem fazer ressalva expressa
quanto à possibilidade de responsabilização criminal por desobediência.
“Quando a lei extrapenal não traz previsão expressa acerca da possibilidade de cumulação do
crime de desobediência com outras sanções extrapenais, como ocorre na hipótese em
questão, é firme o entendimento jurisprudencial no sentido da impossibilidade de tipificação do
referido delito”. BRASILEIRO, Renato.
16.3.6. Revogabilidade e/ou substitutividade das medidas
protetivas de urgência
As medidas protetivas de urgência, cautelares que são, estão sempre sujeitas
à cláusula rebus sic standibus, ou seja, sua permanência está vinculada à
manutenção da situação fática que ensejou sua decretação. São medidas
cautelares situacionais, pois tutelam uma situação fática de perigo. A mudança
do estado de fato subjacente ao momento de sua decretação ou mesmo o
surgimento de novas provas que alterem o convencimento judicial sobre o
fumus comissi delicti ou o periculum libertatis podem levar à necessidade de: 1)
revogação da medida; 2) substituição da medida por outra, mais gravosa ou
mais benéfica; 3) reforço da medida, por acréscimo de outra em cumulação; 4)
atenuação da medida, pela revogação de uma das medidas anteriormente
imposta cumulativamente com outra.
16.3.7. Recursos adequados
Para o autor, a sistemática recursal a ser utilizada pela LMP deve ser buscada
no âmbito do CPP, uma vez que as medidas protetivas de urgência tem
natureza processual penal, inclusive sendo julgadas pelas varas criminais,
quando ausente o Juizado temático da Mulher.
Indeferimento das medidas protetivas de urgência:
Sendo assim, o art. 581 do CPP consagra o RESE como recurso cabível contra
a decisão que indeferir o pedido de prisão preventiva ou revogá-la, conceder
liberdade provisória ou relaxar a prisão em flagrante. Portanto, são hipóteses
geralmente utilizadas pela acusação. Estas hipóteses de RESE devem ser
transpostas para os casos de indeferimento do pedido de medidas protetivas
de urgência, uma vez que o CPP/LMP silenciou acerca dos recursos cabíveis
quando se tratar de medidas cautelares/medidas protetivas de urgência.
Este recurso não é dotado de efeito suspensivo, portanto, uma vez revogada
a medida protetiva de urgência, cessam os efeitos da medida anteriormente
concedida, podendo o agressor, por exemplo, se reaproximar da vítima, mesmo
durante o trâmite do RESE. Nesse caso, parece plenamente admissível a
impetração do mandado de segurança, haja vista que este é cabível quando
se tratar de decisão judicial da qual não caiba recurso com efeito suspensivo
(interpretação a contrario sensu do art. 5º, II, da Lei 12.016/09).
Deferimento de medidas cautelares de urgência:
O CPP não prevê recurso para a hipótese de decretação do pedido de medidas
cautelares de urgência ou prisão preventiva, tampouco para as decisões que
indeferem o pedido da defesa de revogação destas. Não obstante, o indivíduo
poderá impetrar um habeas corpus.
Note-se que, neste particular, o habeas corpus não é cabível somente contra a
decisão que decreta a prisão preventiva (medida extrema), mas também é
cabível contra as decisões que decretam medidas protetivas de urgência
(meras restrições à liberdade de locomoção), por dois motivos básicos:
1) Porque a decretação de certas medidas protetivas de urgência acarreta algum
tipo de constrangimento à liberdade de locomoção do agressor, abrindo a
possibilidade de habeas corpus;
2) Porque o descumprimento injustificado de uma dessas medidas pode ensejar a
decretação da prisão preventiva com fundamento no art. 313, III, do CPP, o que
acaba por evidenciar a existência de um risco, ainda que potencial, à liberdade
de locomoção.
17. Prisão preventiva
Art. 20. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a
prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do
Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial.
Parágrafo único. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no curso do
processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo
decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.
Além de prever a prisão preventiva no seu art. 20, a LMP alterou o art. 313, IV,
do CPP para incluir a possibilidade de prisão preventiva quando descumpridas
as medidas protetivas de urgência. Contudo, a Lei 11.403/11 revogou este
inciso IV, porém adicionou o inciso III ao mesmo artigo, com a seguinte
redação:
Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da
prisão preventiva:
III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança,
adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução
das medidas protetivas de urgência;
Sendo assim, o conteúdo do revogado inciso IV foi transportado para o inciso
III, com o acréscimo de outras possíveis vítimas de violência doméstica e
familiar, pouco importando se do sexo feminino ou masculino: (a) criança; (b)
adolescente; (c) idoso; (d) enfermo; (e) pessoa com deficiência.
Estas hipóteses de decretação de prisão preventiva só se coadunam com a
prática de crime doloso, uma vez que, em se tratando de violência de gênero,
deve ficar evidenciado o dolo do agente de atingir uma das vítimas vulneráveis
ali enumeradas, bem como a sua intenção deliberada de violar as medidas
protetivas de urgência decretadas contra si, o que não se compatibiliza com
crimes culposos.
O dispositivo, no entanto, não faz diferença quanto à natureza da pena do
crime doloso, portanto, independentemente da espécie de pena cominada para
o delito (reclusão ou detenção) e do quantum de pena, a prisão preventiva
pode ser adotada como ultima ratio, compelindo o agente à observância das
medidas protetivas de urgência, desde que presentes um dos fundamentos
do art. 312.
O fato de as medidas protetivas de urgência só estarem tipificadas
(exemplificativamente) na LMP e não nas legislações protetivas da criança,
adolescente, enfermo, idoso e deficiente, não induz à conclusão de que a
prisão preventiva só poderia garantir a execução destas medidas cautelares
quando aplicadas à violência contra mulher. Entendimento pacificado do STJ
salienta que as medidas da LMP podem ser aplicadas por meio de analogia em
toda e qualquer hipótese de violência de gênero, ou seja, desde que presente
situação de hipossuficiência. Portanto, as medidas protetivas da LMP podem
ser aplicadas para as outras vítimas, e se descumpridas podem acarretar na
decretação da preventiva, caso presente um dos fundamentos do art. 312.
Mesmo nos casos de violência doméstica e familiar contra mulher, criança,
adolescente, idoso, enfermo ou deficiente, a decretação da prisão preventiva
também está condicionada à demonstração de um dos fundamentos do art.
312.
Por fim, curial salientar que a prisão preventiva só se justificará se o
descumprimento de uma medida protetiva de urgência estiver relacionado à
prática de um delito (ex.: tentativa de homicídio). Assim, se a medida protetiva
de urgência foi decretada sem um substrato criminoso, ou seja, se não houve
delito que justifique a medida (hipótese não penal de desobediência), não será
possível a decretação da preventiva, sob pena de se instalar uma nova e
inconstitucional modalidade de prisão civil. Neste caso, a LMP prevê a
possibilidade de o juiz se valer da tutela específica (art. 22, §4º).
18. Possibilidade de concessão de fiança pela autoridade
policial
A fiança pode ser conceituada como uma caução real destinada a garantir o
cumprimento das obrigações processuais do acusado. Após a Lei 11.403/11, a
fiança passa a funcionar de duas maneiras distintas: como medida de
contracautela substitutiva da prisão em flagrante ou como medida cautelar
autônoma. O afiançado tem interesse, pelo menos em tese, em se apresentar,
em caso de condenação, para obter a devolução da caução. Outro objetivo
importante da fiança é o de garantir o pagamento das custas, da indenização
do dano causado pelo crime e também da multa.
A Lei 11.403/11 também possibilitou que a autoridade policial arbitre fiança
nos casos de prisão em flagrante por crime cuja pena privativa de liberdade
máxima não seja superior a 4 (quatro) anos.
Caso a autoridade policial negue a concessão da fiança, o interessado
poderá dirigir petição diretamente ao juiz competente. Nos casos em que a
fiança for cabível, a autoridade que a denegar pode responder por crime de
abuso de autoridade (Lei 4.898/65, art. 4º, e). Esta negativa constitui
constrangimento ilegal e é sanável por habeas corpus.
Por fim, note que a autoridade policial não pode negar a concessão de fiança
sob o simples argumento de que o crime fora praticado no contexto de
violência doméstica e familiar, uma vez que lei apenas proíbe a concessão da
fiança quando presentes os motivos que autorizam a preventiva (art. 312).
19. Intimação da vítima
Art. 21. A ofendida deverá ser notificada dos atos processuais relativos ao
agressor, especialmente dos pertinentes ao ingresso e à saída da prisão, sem
prejuízo da intimação do advogado constituído ou do defensor público.
Parágrafo único. A ofendida não poderá entregar intimação ou notificação ao
agressor.
Nota-se que o legislador utilizou o termo deverá, retirando qualquer
discricionariedade por parte do julgado quanto à necessidade de comunicação
dos atos processuais à vítima. No entanto, como a vítima não é parte na
relação processual, salvo se assistente da acusação ou na ação penal privada,
eventual ausência de comunicação dos atos à ofendida não acarreta
nulidade do processo.
Por fim, a aplicação subsidiária do CPP impõe que, por opção da vítima, esta
comunicação pode ser feita por meio eletrônico:
o
Art. 201, § 3 As comunicações ao ofendido deverão ser feitas no endereço por
ele indicado, admitindo-se, por opção do ofendido, o uso de meio eletrônico.

20. Intimação do agressor


Reconhecendo que a comunicação dos atos processuais é atribuição do Poder
Judiciário ou da própria Polícia, conforme a fase procedimental, o art. 21 da
LMP passa a dispor que a ofendida não poderá entregar intimação ou
notificação ao agressor, sob pena de revitimização.
21. Medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor
Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher,
nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto
ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
21.1. Suspensão da posse ou restrição do porte de armas
Em situações de violência doméstica e familiar conta a mulher, o fato de o
agressor ter fácil acesso a uma arma de fogo pode potencializar o risco à
integridade física da mulher. Daí o art. 22, I, prever que o juiz pode determinar
a suspensão ou restrição do porte de armas, com comunicação dos órgãos
competentes. Caso o agressor seja membro de um dos órgãos de segurança
pública do art. 144 da CF, o juiz comunicará a determinação ao respectivo
órgão, corporação ou instituição, ficando o superior imediato do agressor
responsável pelo cumprimento da determinação judicial.
Tal medida pressupõe que o agressor tenha a posse ou porte da arma de
maneira regular, devidamente registrada. Nesse caso, o desarmamento será
solicitado pela vítima e autorizado judicialmente. Na hipótese de posse ou porte
irregular da arma, o agressor estará cometendo delito previsto nos arts. 12, 14
ou 16 da Lei 10.826/03, devendo ser a arma apreendida independentemente
de autorização judicial.
A redação do dispositivo abrange duas medidas distintas:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao
o
órgão competente, nos termos da Lei n 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
a) Suspensão da posse de armas: o agente será privado temporariamente da
possibilidade de manter ou possuir sob sua guarda arma de fogo, acessório ou
munição, no interior de sua residência, ou mesmo no seu local de trabalho;
b) Restrição do porte de armas: a palavra restrição tem o sentido de limitar,
diminuir. Portanto, o juiz poderá determinar que o policial porte sua arma
apenas quando efetivamente em serviço, deixando-a no local de trabalho ao
final da jornada, evitando que a leve para o lar. Esta obrigação deverá ser
cumprida pelo superior imediato.
21.2. Afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a
vítima
Será estudado pormenorizadamente mais adiante (item 22).
21.3. Proibição de aproximação da ofendida, de seus familiares e
das testemunhas
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o
limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
O afastamento do lar às vezes não é suficiente, pois as ameaças e agressões
continuam no local de trabalho ou em lugares por ela frequentados. Por tais
motivos, o juiz pode determinar que o agressor fique proibido de se aproximar
da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando um limite mínimo
de distância entre eles. É perfeitamente possível a fixação, em metros, da
distância a ser mantido pelo agressor da vítima.
21.4. Proibição de contato com a ofendida, seus familiares e
testemunhas
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de
comunicação;
O dispositivo diz expressamente que poderá ser determinada a proibição de
contato por qualquer meio de comunicação, o que não descarta a possibilidade
de utilização da medida para fins de se impedir eventuais contatos telefônicos e
via internet.
A presente medida tem dois objetivos fundamentais: proteger determinada
pessoa em colocada em situação de risco em virtude do comportamento do
agressor; impedir que, em liberdade total e absoluta, possa o agente influenciar
o depoimento da vítima, de seus familiares, ou de uma testemunha, causando
prejuízo à descoberta dos fatos.
A inobservância da medida decretada pelo juiz pode dar ensejo à decretação
da prisão preventiva, se atendidos os seus requisitos. Contudo, não deve o juiz
proferir sua decisão baseado única e exclusivamente na palavra da vítima,
deve levar em consideração os demais elementos probatórios, consoante seu
livre convencimento motivado. Ademais, para que fique caracterizado o
descumprimento da medida, é necessário que o acusado tenha se aproximado
conscientemente da pessoa com a qual devia evitar o contato, não tendo sido o
encontro involuntário.
21.5. Proibição de frequentar determinados lugares
c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e
psicológica da ofendida;
Apesar de se referir apenas à vítima, o autor entende que a medida também
pode ser decretada a fim de que o agressor não frequente determinados
lugares frequentados por familiares da vítima ou testemunhas. Da mesma
maneira, apesar de o legislador se referir à “frequentação”, passando uma ideia
de frequência, o certo é que o agressor não poderá sequer ter acesso ao lugar
determinado, no sentido de lhe ser vedado a simples ação de entrar ou
ingressar.
A lei não dispõe sobre qual o lugar proibido, justamente para que o juiz defina
de acordo com os locais em que a vítima costuma frequentar. O certo é que o
lugar proibido deve ser determinado, ou seja, o magistrado deve especificar
quais os lugares que o acusado não pode frequentar, sendo inadmissível a
proibição de frequência a locais em termos genéricos.
21.6. Restrição ou suspensão de visitas
IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a
equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
Restrição tem o sentido de limitar as visitas aos dependentes menores,
podendo o juiz determinar que as visitas sejam realizadas em local diverso da
residência da vítima, ou de forma supervisionada, sem contato com a ofendida.
Suspensão, por sua vez, tem o sentido de privação temporária do direito de
visitas. Em ambas as hipóteses, a medida tem natureza temporária,
perdurando apenas enquanto houver ameaça de reiteração dos atos de
violência.
Em ambas as hipóteses é necessária a oitiva da equipe de atendimento
multidisciplinar.
21.7. Prestação de alimentos provisionais ou provisórios
V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
A fixação de alimentos deve ser feita dentro do binômio necessidade de quem
os pleiteia versus possibilidade de quem os deve prestar, ou nos termos do
CC/02: “na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da
pessoa obrigada”.
Quanto à finalidade, a doutrina classifica os alimentos da seguinte forma:
a) Alimentos definitivos ou regulares: são aqueles fixados definitivamente, por
meio de acordo de vontades ou de sentença judicial transitada. Obviamente,
eles podem ser alterados em caso de mudança na situação financeira das
partes (exoneração, redução ou majoração);
b) Alimentos provisórios: fixados de imediato na ação de alimentos sob o rito da
Lei 5.478/68. Tais alimentos têm fundamento na obrigação alimentar,
necessitando de prova pré-constituída do parentesco ou do casamento, fixados
em cognição sumária antes mesmo de ouvir o réu;
c) Alimentos provisionais: fixados em outras ações que não seguem o
procedimento especial acima mencionado, tem como objetivo manter o
requerente no curso da lide. Geralmente são fixados por antecipação da tutela
ou em liminar concedida em medida cautelar de separação de corpos em
ações que não há prova pré-constituída (dissolução de união estável).
A Lei Maria da Penha prevê como espécie de medida protetiva de urgência
(cautelar por natureza) prestar alimentos provisionais ou provisórios.
O beneficiário dos alimentos não é limitado à ofendida, podendo os alimentos
ser prestados em favor dos seus dependentes. Isso porque representaria uma
revitimização da ofendida se ela tivesse que, em decorrência da violência que
suportou, passar a experimentar sozinha as despesas com a manutenção dos
filhos.
Para o autor, como se trata de alimentos provisionais ou provisórios, e não
definitivos, incumbe ao alimentando (ou credor) propor, no prazo de 30 dias
(art. 308, NCPC), a ação principal, seja ela de alimentos, propriamente dita, de
divórcio, dissolução de união estável, etc. Esta ação principal deverá ser
proposta no juízo cível competente, que não é a Vara de Violência contra a
Mulher, sob pena de esta usurpar a competência da Vara de Família para
julgar, por exemplo, ação de divórcio.
21.8. Tutela específica
§ 4o Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no
caput e nos §§ 5o e 6º do art. 461 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973
(Código de Processo Civil).
O princípio da primazia da tutela específica das obrigações de fazer e de não
fazer gera consequências na LMP. Para este princípio, o resultado a ser
alcançado no processo deve corresponder exatamente ao resultado previsto
pelo direito material, ou seja, corresponder àquilo que seria obtido se não
houvesse a necessidade de ir ao Judiciário. Em outras palavras, a obrigação
deve ser cumprida in natura, e não ser convertida em ressarcimento pecuniário.
Para tanto, o legislador possibilitou que as regras processuais para a satisfação
da tutela específica sejam adotadas pela LMP no tocante às medidas protetivas
de urgência, tais como a periodização de multa arbitrada pelo juiz, busca e
apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras, entre outras.
22. Medidas protetivas de urgência à ofendida
Das Medidas Protetivas de Urgência à Ofendida
Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:
I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou
comunitário de proteção ou de atendimento;
II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao
respectivo domicílio, após afastamento do agressor;
III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos
relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;
IV - determinar a separação de corpos.
Art. 24. Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou
daqueles de propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar,
liminarmente, as seguintes medidas, entre outras:
I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida;
II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra,
venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial;
III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor;
IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e
danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a
ofendida.
Parágrafo único. Deverá o juiz oficiar ao cartório competente para os fins
previstos nos incisos II e III deste artigo.
Este rol é numerus apertus.
22.1. Encaminhamento da vítima e seus dependentes a programa
oficial ou comunitário de proteção ou atendimento
Os programas oficiais ou comunitários a que as mulheres e seus dependentes
poderão ser enviados estão no art. 35, incisos I e II da LMP:
Art. 35. A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios poderão criar e
promover, no limite das respectivas competências:
I - centros de atendimento integral e multidisciplinar para mulheres e respectivos
dependentes em situação de violência doméstica e familiar;
II - casas-abrigos para mulheres e respectivos dependentes menores em situação
de violência doméstica e familiar; [...]
22.2. Recondução da ofendida ao respectivo domicílio após o
afastamento do agressor
Remetemos o leitor para os tópicos 21.2 e 21.3 do presente resumão.
22.3. Afastamento da ofendida do lar e separação de corpos
Constatada a prática de violência doméstica ou familiar contra a mulher, o juiz
poderá aplicar o imediato afastamento do agressor do lar, domicílio ou local de
convivência com a vítima. Esta medida pode ser utilizada não apenas em favor
da mulher casada, mas também em virtude de união estável. Aliás, é possível a
decretação da medida se constatada quaisquer dos três tipos de violência
amparadas pela LMP (familiar, doméstica ou relação íntima de afeto).
Assim como na hipótese de ação de alimentos provisionais ou provisórios, a
separação de corpos é cautelar, pressupondo a ocorrência da violência contra
a mulher. Não havendo violência, ou seja, havendo outro motivo para a
separação de corpos (separação consensual), falece a competência do Juizado
da Mulher, atraindo a competência da Vara de Família. De qualquer forma, a
ação principal de divórcio, dissolução de união estável, ou qualquer outra, deve
ser proposta no prazo e no foro competente (Vara de Família).
22.4. Restituição de bens
I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida;
Sendo bens pessoais ou instrumentos de trabalho, poderá o juiz determinar
sua restituição imediata. Contudo, sendo bens de origem comum, como
aqueles adquiridos na constância do casamento, é recomendável que o juiz
adote o procedimento de arrolamento, nomeando a mulher como depositária
dos bens, até que a propriedade dos bens seja dirimida no processo principal.
22.5. Proibição temporária para compra, venda e locação de
propriedade em comum
II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e
locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial;
Esta proibição deve ser comunicada ao respectivo cartório.
22.6. Revogação das procurações conferidas pela ofendida ao
agressor
III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor;
Visa evitar que o agressor utilize as procurações para vingança, desviando o
patrimônio adquirido pelo casal. Ainda que o dispositivo fale em suspensão,
trata-se, na verdade, de revogação do mandato, impedindo que o agressor
continue a representar os interesses da vítima. Revogado o mandato, o
agressor passa a atuar como gestor de negócios, ficando sua validade
condicionada à ratificação do dono do negócio, respondendo o gestor por
eventual prejuízo.
22.7. Caução provisória mediante depósito judicial
IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e
danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a
ofendida.
A violência também causa dano material à mulher, pois além de ser uma
infração penal é também um ilícito civil. Assim, como forma de garantir o
pagamento da indenização cível ulterior, a LMP autoriza a exigência de caução
por parte do agressor, como medida cautelar.
23. Cumulação da competência cível e criminal por varas
criminais
Art. 33. Enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar
contra a Mulher, as varas criminais acumularão as competências cível e
criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática de violência
doméstica e familiar contra a mulher, observadas as previsões do Título IV desta
Lei, subsidiada pela legislação processual pertinente.
Parágrafo único. Será garantido o direito de preferência, nas varas criminais,
para o processo e o julgamento das causas referidas no caput.
Enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar
contra a Mulher, as varas criminais acumularão as competências cível e
criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática de violência
doméstica e familiar contra a mulher, assegurado o direito de preferência.
Apesar de ser taxado de inconstitucional por parcela da doutrina, prevaleceu o
entendimento de que o dispositivo não invade a competência dos Estados para
tratar de organização judiciária, pois apenas sugere, faculta, possibilita a
criação dos referidos Juizados da Mulher, não impõe a sua criação.
Em virtude de inegáveis dificuldades financeiras e administrativas suportadas
pelo Poder Judiciário dos Estados, alguns deles baixaram resoluções
ampliando a competência dos Juizados Especiais Criminais para também
abranger o processo de causas relativas à violência doméstica e familiar contra
a mulher. Isso não significa dizer que o procedimento da Lei 9.099/95 seria
aplicável às infrações praticadas com violência contra a mulher. Na verdade, o
juizado especial passou a cumular a competência para julgamento das
infrações de menor potencial ofensivo, no qual se aplica o rito da 9.099/95, e a
competência para julgamento das infrações contra a mulher, no qual se aplica o
rito da lei 11.340/06. Os recursos às decisões proferidas neste último rito serão
julgados pelo Tribunal de Justiça, enquanto os demais pelas Turmas Recursais.
24. Inaplicabilidade da Lei dos Juizados Especiais Criminais
às infrações penais praticadas com violência doméstica e
familiar contra a mulher
Apesar de balbúrdia doutrinária, prevaleceu a tese de que o art. 41 da LMP é
constitucional, ao afirmar que as disposições da Lei 9.099/95 não se aplicam às
infrações penais (crimes e contravenções) praticados com violência doméstica
e familiar contra a mulher. Sendo assim, pode-se extrair algumas conclusões:
a) Não se admite a composição civil dos danos, nem tampouco a transação
penal, às contravenções e crimes praticados no contexto de violência
doméstica e familiar contra a mulher;
b) Não se admite a suspensão condicional do processo nos crimes e
contravenções praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher;
c) Não é admissível a simples lavratura de termo circunstanciado de
ocorrência nas infrações penais (crimes e contravenções) praticadas com
violência doméstica e familiar contra a mulher. Logo, verificada a situação de
flagrância de infração penal praticada nesse contexto, incumbe à autoridade
policial efetuar a lavratura de APF e instauração de inquérito policial. Na
hipótese de ser cominada pena inferior a 4 (quatro) anos, a própria autoridade
policial poderá conceder liberdade provisória com fiança (art. 322, CPP); sendo
a pena máxima superior a 4 (quatro anos), somente o juiz poderá conceder
liberdade provisória, com ou sem fiança, sem prejuízo da aplicação cumulativa
das medidas protetivas de urgência e cautelares (art. 321);
d) Os crimes de lesões corporais leves e lesões corporais culposas
praticados no contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher são de
ação penal pública incondicionada, pois não se aplica o art. 88 da LMP
neste contexto. Já os crimes de ameaça e estupro são normalmente
perseguidos por ação penal pública condicionada à representação.
25. Admissibilidade da prisão preventiva para garantir a
execução das medidas protetivas de urgência
De nada adianta a imposição de uma medida protetiva de urgência se a ela
não se empresta força coercitiva. A LMP, portanto, acrescentou ao art. 313 do
CPP nova hipótese de admissibilidade de prisão preventiva, ainda que a pena
do crime seja inferior a 4 (quatro) anos:
Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da
prisão preventiva:
III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança,
adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução
das medidas protetivas de urgência.
O art. 313, caput, contudo, deixa claro que só caberá a decretação da
preventiva se presente pelo menos um dos pressupostos do art. 312.
26. Agravante na hipótese de violência contra a mulher
A LMP acrescentou ao art. 61 do CP uma nova hipótese de agravante,
acrescida na parte final da alínea “f”:
f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de
coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da
lei específica;

27. Aumento da lesão corporal qualificada pela violência


doméstica
O §9º do art. 129 do CP rezava que a pena seria de 6 (seis) meses a 1 (um)
ano na hipótese de a lesão corporal leve ser praticada contra ascendente,
descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha
convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de
coabitação ou de hospitalidade.
Em se tratando de lesão corporal grave, gravíssima ou seguida de morte, o
§10º do mesmo artigo faz com que seja aplicada uma causa de aumento de
pena de 1/3 se o crime for praticado nas hipóteses do parágrafo anterior.
A LMP veio e, ao invés de criar hipótese específica para proteger a mulher,
simplesmente aumentou a pena do §9º (que também abrange a mulher) para a
pena de 3 (três) meses a 3 (três) anos. Ficou assim a redação do dispositivo:
Violência Doméstica
o
§ 9 Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão,
cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda,
prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de
hospitalidade:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos.
Percebe-se que o dispositivo aplica-se indistintamente aos gêneros masculino
e feminino, não importando o sujeito passivo do delito.
Com a nova redação do dispositivo, passando a pena máxima a ser de 3 (três)
anos, o crime deixa de ser de menor potencial ofensivo. Outrossim, não é
possível a substituição da pena por restritivas de direitos, afinal, o delito
necessariamente é praticado com violência, razão pela qual se afasta a
aplicação do art. 44 do CP.
28. Majorante da hipótese de crime praticado contra pessoa
portadora de deficiência
A LMP ainda acrescentou um § 11 ao art. 129 do CP, aduzindo que, “na
hipótese do §9º deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime
for cometido contra pessoa portadora de deficiência”.
29. Limitação de fim de semana e comparecimento do
agressor a programas de recuperação e reeducação
A limitação de fim de semana é uma pena restritiva de direitos que será
especificada pelo juiz da execução penal. Nos casos de violência doméstica e
familiar contra a mulher, a LEP permite que o juiz da execução determine o
comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e
reeducação, nos termos do § único do art. 152 da LEP, que foi acrescentado
pela LMP:
Art. 152, Parágrafo único. Nos casos de violência doméstica contra a mulher, o juiz
poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de
recuperação e reeducação.
O descumprimento da pena restritiva de direitos de limitação ao fim de semana
acarreta na conversão da “pena alternativa” em privativa de liberdade.

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