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Ainda e sempre a presunção de inocência : sobre a equivocada alegação

de não se valoração de provas em recurso especial e extraordinário.

Gustavo Henrique Badaró1


gustavobadaro@usp.br
orcid.org/0000-0002-4526-9316

Um argumento constantemente utilizado para justificar a


restrição da presunção de inocência a momentos anteriores ao trânsito em
julgado, em especial, ao término das instânc ias ordinárias nos tribunais
locais, é: a partir de tal fase, por ser somente cabível recurso especial e
extraordinário, em que não mais se valoram provas, inexistirá discussão
sobre aspecto fático da inocência do acusado que ainda estará sendo
processado.

A crítica é incompleta e equivocada.

Esse seria, no máximo, um fundamento pré-legislativo para a


restrição da presunção de inocência. Isto é, deveria ter sido considerado
pelo legislador constitui nte antes da redação do inciso LVII do caput do
artigo 5º, e não posteriormente pelo exegeta de tal dispositivo. A toda
evidencia, o legislador sabe o que é “trânsito em jugado”. Sequer é preciso
ser neófito em direito para tanto. Até mesmo o leigo sabe , em termos
práticos ao menos, o que isso significa. É razoável supor, pois, que
também sabiam os autores da Constituição, que no secular recurso
extraordinário não se valoram provas e , que seu irmão mais novo em
gestação, o recurso especial, teria a mesma limitação.

1
. Professor Associado de Direito Processual Penal da Universidade de São Paulo, nos cursos de
Graduação e Pós-Graduação. Livre-Docente (2011), Doutor (2002) e Mestre (1998) em Direito
Processual Penal pela Universidade de São Paulo. Graduado em Direito pela Universidade de São Paulo
(1993). Advogado Criminalista. Membro do Instituto Ibero-americano de Direito Processual (IIDP),
Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), Instituto Brasileiro de Ciências Criminais
(IBCCRIM), Instituto Brasileiro de Direito Processual Penal (IBRASPP) e Instituto dos Advogados de
São Paulo (IASP). É membro da Diretoria do Instituto Brasileiro de Direito Processual. Membro do
Conselho Científico do Centro de Estudos de Direito Penal e Processual Penal Latino-americano, do
Instituto de Ciências Criminais, da Georg-August de Göttingen (Alemanha). orcid.org/0000-0002-
4526-9316
Mesmo assim, a Constituição não es tabeleceu: “ninguém será
considerado culpado, até o momento em que se valoram provas no
processo”. Não. Escolheu-se, técnica e axiologicamente: “ninguém será
considera culpado , até o trânsito em julgado da sentença penal
condenatória ”.

Já bastaria isso, p ara demonstrar que o argumento é


equivocado.

Mas, apenas por amor o debate, é possível trabalhar


hipoteticamente com a restrição sugerida. A té porque, essa foi a única
linha jurídico -argumentativa formulada contra a posição por nós defendida
em artigo no analisamos a presunção de inocência e o trânsito em julgado,
publicado ontem, site Consultor Jurídico . 2

Há uma premissa que foi ig norada: a inegável distinção de


duas facetas da presunção de inocência, como regra de julgamento do
acusado e como regra de tratamento do acusado. A solução proposta, sem
justificar porque, restringe -a indevidamente ao primeiro aspecto.

Como regra de julgamento do acusado, a garantia da


presunção de inocência liga -se a aspecto probatório e, mais
especificamente, a co mo deverá decidir o juiz sempre que houver dúvida
sobre fato relevante da imputação penal. É uma disciplina do acertamento
penal, que somente admite uma sentença condenatória quando houver
prova além de qualquer dúvida razoável da culpa do acusado. Nesta
acepção, como destaca A N TÔ N IO M A GA LH ÃE S G OM ES F I LH O , presunção de
inocência confunde-se com o in dubio pro reo. 3 É de se destacar que, em
tal caso, embora a presunção de inocência esteja diretamente ligada à
prova, não se trata de uma presunção em sentido técnico processual.

Mas a presunção de inocência funciona, também, como como


regra de tratamento do acusado ao longo do processo, não permitindo que
ele seja equiparado ao culpado. 4 São manifestações claras deste último

2
. https://www.conjur.com.br/2018-abr-03/badaro-stf-nao-criar-conceito-transito-julgado
3
. MAGALHÃES GOMES FILHO, Antonio Presunção de Inocência e prisão cautelar. São Paulo:
Saraiva, 1991, p. 39.
4
. BARGI, Alfredo. Procedimento probatorio e giusto processo. Napoli: Jovene, 1990, p. 77.
sentido da presunção de inocência , como ressalta I LLU M IN A T I , a vedação
de prisões processuais automáticas ou obrigatórias e a impossibilidade de
execução provisória ou antecipada da sanção penal. 5

Quem justifica que a presunção de inocência se aplica


somente até o término do julgamento nos tribunais locais, porque a partir
desse momento, não se discutiria mais provas em recurso especial e
extraordinário, está limitando a presunção de inocência ao se u primeiro
aspecto, de regra de julgamento, e ignora ndo o seu segundo, de regra de
tratamento.

Deixe-se de lado a falta de justificativa para a tal limitação.


Ainda que se pretende trabalhar com a presunção de inocência só como
regra de julgamento , ainda assim o raciocínio é juridicamente equivocado.

Primeiro, porque não é correto, pelo menos na amplitude que


se parece querer dar, que “em recurso especial e extraordinário não se
discutem mais provas”. Tanto o Supremo Tribunal Federal quanto o
Superior Tri bunal de Justi ça fazem distinção entre o que seria
“valoração da prova”, admitida nos recursos extremos, e “reexame de
prova”, que impede a sua admissibilidade . Na doutrina processual penal,
por exemplo, essa diferenciação é acolhida por E UG ÊN IO P AC E L LI e
D O UG LA S F IS C H E R , em seus Comentários ao Código de Processo Penal . 6
Aplicando-a, o STJ já decidiu: “a valoração da prova refere -se ao valor
jurídico desta, sua admissão ou não em face da lei que a disciplina,
podendo ser ainda a contrariedade a princípio ou regra jurídica do campo
probatório, questão unicamente de direito, passível de exame nesta Corte.
O reexame da prova implica a reapreciação dos elementos probatórios para
concluir-se se eles foram ou não bem interpretados, constituindo matéria
de fato, soberanamente decidida pelas instâncias ordinárias, insuscetível
de revisão no recurso especial”. 7

5
. ILLUMINATI, Giullio La presunzione d’innocenza dell’imputato. Bologna: Zanichelli, 1979, p. 2.
6
. PACELLI, Eugênio; FISCHER, Douglas. Comentários ao Código de Processo Penal. São Paulo: Atlas,
2015, p. 1333.
7
. STJ, AgREsp 420.217/SC, rel. min. Eliana Calmon, 2.ª T., j. 04.06.2002, v.u.
Não é tudo. A análise da presunção de inocência , mesmo que
sob o exclusivo enfoque da regra de julgamento, deve considera que tal
garantia abarca a dúvida sob re fatos relevantes e, portanto, cobre toda a
atividade heurística desenvolvida no processo , que vai muito além da
mera valoração da prova . Integra a atividade de reconstrução história
dos fatos – e portanto, sobre ainda haver “dúvida” ou não de ser o acus ado
inocente, os critérios de apreciação da prova , a errada aplicação das
regras de experiência, a utilização de prova ilícita, a nulidade da prova,
o valor legal da prova , as presunções legais, ou a distribuição do ônus da
prova, pois todas estas questões não são “de fato”, mas “de direito”. 8 O
STJ, decidiu que “a chamada ‘valoração da prova’ a ensejar recurso
especial, é aquela em que há errônea aplicação de um princípio legal ou
negativa de vigência de norma pertinente ao direito probatório”. 9

Também cabe, por exemplo, co ntrolar em recurso especial se


o acórdão condenatório se baseou exclusivamente em provas
produzidas no inquérito policial , caso em que terá sido contrariado o art.
155, caput, do Código de Processo Penal. Em tal caso, o provimento do
recurso especial, inegavelmente, implicará valoração dos elementos de
prova, ainda que seja para afirmar que todos eles foram produzidos no
inquérito e, portanto, são insuficientes para a condenação. Poderá ser
analisada, também, a regras que estabeleçam hi pótese de prova legal
negativa ou “regra de corroboração ”, como por exemplo, a contrariedade
do acórdão ao art. 4º, § 16, da Lei 12.850/2013, porque o tribunal local
condenou o acusado valorando exclusivamente o conteúdo de colaboração
premiada realizada e m desfavor do acusado.

É possível , em recurso especial ou extraordinário, controlar a


valoração probatória quanto aos princípios gerais da experiência , os
conhecimentos científicos , as leis do pensamento e, até mesmo, os fatos

8
. Nesse sentido: STF, AgRg no AI 153.836/MA, 1.ª T., rel. Min. Moreira Alves, j. 24.05.1994, v.u.;
STF, RExt 89.573/PR, 1.ª T., rel. Min. Soares Muñoz, j. 14.11.1978, v.u, RTJ 91/674; STJ, REsp
46.186-3/DF, 5.ª T, rel. Min. Edson Vidigal, j. 18.09.1995, v.u., RT 725/531. Na doutrina:
GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; SCARANCE FERNANDES,
Antonio, Recursos no processo penal. 7. ed. São Paulo: Ed. RT, 2011, n. 170, p. 203. No processo
civil: MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Marinoni, Luiz Guilherme (Dir.).
Comentários ao Código de Processo Civil, Artigos 976 ao 1044. São Paulo: RT, 2016, v. XVI, p. 250.
9
. STJ, REsp 142.616, 4.ª T., rel. Min. Barros Monteiro, j. 13.02.2002.
notórios. E, para que não se diga que isso é coisa de quem defende a
impunidade em terras tupiniquins, esse é, por exemplo, um dos
fundamentos pelos quais, no modelo alemão, Roxin admite o recurso de
cassação. 10 No nosso caso, portanto, o fundamento dos recursos ser iam,
para o extraordinário, a contrariedade ao art. 93, caput, IX, da CR e para
o especial, ao art. 381, inciso III, do CPP.

Também é possível, no que diz respeito a valoração probatória,


acessar o Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de Justi ça, por
violação da regra legal de imposição do ônus da prova no processo penal.
Por exemplo, se tribunal local condenar o acusado por afirmar que, tendo
ele alegado a presunção de inocência, sendo este um fato impeditivo do
direito de punir, ao acusado in cumbir o ônus da prova de sua ocorrência
e, na dúvida, deve ser condenado. Esse hipotético acórdão claramente
contrariaria o art. 5º, caput, inc. LVII, da CR, bem como o art. 386, caput,
inciso VI, parte final , do CPP. Cabível, pois, recurso extraordinário e
especial, em tema puramente probatório. Aliás, no plano constitucional,
Pontes de Miranda dá como exemplo de hipótese de admissão de recurso
extraordinário exatamente a violação de regras sobre ônus da prova. 11

O controle da motivação também é admissível em recurso especial


e extraordinário, sob o fundamento de violação, respectivamente, do
art. 381, III, do CPP e do art. 93, caput, IX, da Constituição, em razão da
falta de completude da valoração realizada no juízo das questões de fato,
seja pelo juiz d e primeiro grau, seja pelo tribunal local. Assim, por
exemplo, a sentença ou o acórdão deixam de analisar “alternativas
razoáveis” em havendo narrativas fáticas diversas. 12

Tudo isso diz respeito a presunção de inocência, enquanto regra de


julgamento, e oc orre antes do trânsito em julgado, e terá como
consequência reafirmar a inocência ou, ao menos, concluir que há dúvida

10
. ROXIN, Claus, Derecho procesal penal. Tradução de Gabriela E. Córdoba e Daniel R. Pastor. Buenos
Aires: Del Puerto, 2000, § 53, D, II, 3, p. 472.
11
. PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários à Constituição de 1967, com a Emenda
n.1. 2. ed. São Paulo: RT, 1970, t. IV, p. 68.
12
. Nesse sentido, na doutrina alemã, ROXIN, Derecho Procesal Penal..., § 53, D, II, 3, p. 472.
sobre aspecto fático que tenha justificado uma errônea condenação do
acusado que ... ainda é presumido inocente. Há, pois, muito sobre pr ova e
muito sobre dúvida da inocência a se discutir em recurso especial e
extraordinário e, portanto, antes do trânsito em julgado da condenação
penal. Isso mostra o acerto da escolha do legislador constituinte em
reforça a presunção de inocência, assegura ndo-a até o trânsito em julgado
da condenação penal.

Imagino, contudo, que tanta reação à presunção de inoc ência,


não é por su a face como regra de julgamento nem como regra de tratamento
de acusado. É por sua essência! A primeira, e talvez a mais importante
forma de analisar este princípio, é como garantia política do cidadão. A
presunção de inocência é, como adverte B E T TIO L , antes de tudo um
princípio político! 13 O processo, e em particular o processo penal é um
microcosmos no qual se refletem a cultura da sociedade e a organização
do sistema político. 14 Não se pode imaginar um Estado de Direito que não
adote um processo penal acusatório e, como seu consectário necessário, a
presunção de inocência que é, nas palavras de P IS A N I , um “presupposto
implicito e peculiare del processo accusatorio penale” . 15

13
. BETTIOL, Giuseppe. Sulle presunzioni nel diritto e nel processo penale. In:_____. Scritti Giuridici.
Padova: Cedam, 1966. t. I, p. 385; No mesmo sentido: Illuminati, La presunzione d’innocenza ..., p. 5;
BORGHESE, Sofo Presunzioni (diritto penale e diritto processuale penale). Novissimo digesto italiano.
Torino: Utet, 1966. vol. XIII, p. 774.
14
. NAPPI, Aniello. Guida al Codici di Procedura Penale. 8. ed. Milano: Giuffrè, 2001, p. 3.
15
. PISANI, Mario. Sulla presunzione di non colpevolezza. Il Foro Penale, 1965, p. 3.

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