voso central e hipertensão intracraniana); doenças olar com consolidação extensa, sem apresentar tosse.
neuromusculares, pela menor capacidade de mo- Os impulsos da tosse são transmitidos pelo
bilizar o ar na fase inspiratória, e comprometimento nervo vago até um centro da tosse no cérebro que
da musculatura respiratória expiratória; cirurgias fica difusamente localizado na medula. Até hoje
abdominais e torácicas; anomalias da laringe com não se conhece o local exato do centro da tosse.(6)
ineficácia de abertura da glote (paralisia de cor- O centro da tosse pode estar presente ao longo de
das vocais); e ineficácia de abertura da glote por sua extensão, já que ainda faltam evidências sig-
procedimentos médicos (traqueostomia, tubo na- nificativas capazes de definir sua localização pre-
sotraqueal). cisa no encéfalo (Figura 1).(3)
O mecanismo de produção de tosse pode ser Os receptores da tosse pertencem ao grupo dos
alterado, acarretando redução da velocidade de receptores rapidamente adaptáveis, que representam
fluxo e de pressões necessárias para que se torne fibras mielinizadas, delgadas e contribuem para a
um real mecanismo de defesa das vias aéreas. condução do estímulo, mas ainda permanece não
Outro importante fator determinante da eficácia esclarecido seu potencial de indução de bronco-
da tosse é a velocidade do fluxo aéreo produzido constricção.(5-6)
na fase expiratória. A remoção do muco depende Os receptores rapidamente adaptáveis têm a ca-
também da obtenção de elevada velocidade do gás, racterística de sofrerem rápida adaptação perante a
que pode atingir aproximadamente 2.500 cm/s, o insuflação pulmonar mantida por cerca de 1 a 2 se-
que favorece a suspensão de partículas do muco gundos, e são ativados por substâncias como trom-
no lúmen da via aérea. Propriedades reológicas boxane, leucotrieno C4, histamina, taquicininas, me-
do muco podem também interferir na capacidade tacolina e também pelo esforço inspiratório e expira-
de mobilizá-lo pela tosse.(3) tório com a glote fechada. Agem sinergicamente com
outros subtipos de nervos aferentes para gerar tosse.
Anatomia e neurofisiologia do reflexo da tosse Receptores de adaptação lenta ao estiramento
O reflexo da tosse envolve cinco grupos de com- também participam do mecanismo da tosse de for-
ponentes: receptores de tosse, nervos aferentes, cen- ma ainda não definida.(7)
tro da tosse, nervos eferentes e músculos efetores. Outro grupo de nervos aferentes envolvidos no
O mecanismo da tosse requer um complexo mecanismo da tosse é o composto pelas fibras C,
arco reflexo iniciado pelo estímulo irritativo em as quais não são mielinizadas, possuem a capaci-
receptores distribuídos pelas vias aéreas e em lo- dade de produzir neuropeptídeos, têm relativa in-
calização extratorácica. O início deste reflexo dá-se sensibilidade à distensão pulmonar e se ativam pelo
pelo estímulo irritativo que sensibiliza os recepto- efeito da bradicinina e da capsaicina. Terminações
res difusamente localizados na árvore respiratória, das fibras C brônquicas ou pulmonares mediam
e posteriormente ele é enviado à medula. broncoconstricção. No entanto, o real papel das
Os receptores da tosse podem ser encontrados fibras C na fisiopatologia da tosse tem sido alvo
em grande número nas vias aéreas altas, da laringe de discussões na literatura, já que o transporte dos
até a carina, e nos brônquios, e podem ser esti- estímulos da tosse ocorre preferencialmente através
mulados por mecanismos químicos (gases), me- de fibras mielinizadas.(8) Há indícios de que as fi-
cânicos (secreções, corpos estranhos), térmicos (ar bras C brônquicas possam inibir o reflexo da tosse.
frio, mudanças bruscas de temperatura) e infla- Os receptores rapidamente adaptáveis interagem
matórios (asma, fibrose cística). Também podem com estas fibras, que geram inflamação neurogê-
apresentar receptores para tosse a cavidade nasal nica em resposta ao seu próprio estímulo (ácido
e os seios maxilares (nervo trigêmio aferente), a cítrico, tabagismo, bradicinina) e, por sua vez,
faringe (nervo glossofaríngeo aferente), o canal passam a liberar taquicininas, as quais ativam os
auditivo externo e a membrana timpânica, a pleura, receptores rapidamente adaptáveis. Este ciclo in-
o estômago (nervo vago aferente), o pericárdio e duz tosse na dependência do grau de ação nestes
diafragma (nervo frênico aferente), e o esôfago.(4) receptores, já que mediante estímulo leve poderá
Os receptores de tosse não estão presentes nos potencializá-la por mecanismo local e, sendo o
alvéolos e no parênquima pulmonar. Portanto, um mesmo mais intenso, pode inibi-la por ação reflexa
indivíduo poderá apresentar uma pneumonia alve- central.(9)
A traqueobronquite aguda pode causar obs- nato, macrolídeos, cefalosporina de segunda ge-
trução do fluxo aéreo e hiperresponsividade brôn- ração e até quinolonas respiratórias (moxifloxaci-
quica transitórias, com duração inferior a seis se- na e levofloxacina).(23) A solução salina isotônica
manas, em até 40% dos pacientes. ou hipertônica e os vasoconstrictores sistêmicos
Quanto ao tratamento, não existe medicação podem ser usados por poucos dias. Os corticoste-
eficiente para a tosse da bronquite aguda. Os an- róides orais devem ser reservados para casos mais
titussígenos têm pequeno efeito e os mucolíticos graves, com grande edema das mucosas e por curto
não são indicados.(16) Broncodilatadores podem ser período de tempo, inferior a sete dias.
úteis se houver indícios clínicos ou funcionais de
obstrução do fluxo aéreo. Estão indicados os ma- Gripe
crolídeos em situações especiais como epidemias O diagnóstico da gripe não é difícil quando o
por atípicos e/ou quadro clínico sugestivo de co- paciente apresenta síndrome aguda caracterizada
queluche, contato com infectados, tosse emeti- por manifestações constitucionais como febre alta,
zante e guincho, com duração de sintomas inferior calafrios, prostração, fadiga, mialgia, cefaléia, sin-
a duas semanas. tomas de vias aéreas superiores e inferiores, com
destaque para tosse e coriza, e sintomas oculares
Sinusite aguda como lacrimejamento, fotofobia e hiperemia das
A rinossinusite aguda viral é pelo menos vinte conjuntivas. Em algumas situações pode ser difícil
vezes mais freqüente do que a bacteriana e ambas diferenciar a gripe da sinusite bacteriana aguda e
são causas comuns de tosse aguda.(19) O acometi- pneumonia, principalmente quando há rinorréia e/
mento dos seios da face é comum nos resfriados, ou expectoração purulenta. Em caso de dúvida,
gripes e exacerbações das rinites. A rinossinusite deve-se realizar hemograma, dosagem de proteí-
bacteriana complica de 1% a 5% das infecções na-C e exames de imagens para esclarecimento do
virais de vias aéreas superiores. diagnóstico.
A suspeita de rinossinusite bacteriana deve As causas mais importantes da gripe são os ví-
ocorrer quando os sintomas de uma virose das vias rus influenza A e B, especialmente em surtos epi-
aéreas superiores pioram após o quinto dia ou dêmicos.
persistem por mais de dez dias.(19-20) O tratamento é fundamentalmente sintomático,
A presença de dois ou mais sinais maiores ou com hidratação oral e uso de antitérmicos e anal-
de um sinal maior e dois menores são altamente gésicos. Anti-histamínicos de primeira geração
sugestivos de sinusite aguda.(21-22) São sinais maio- associados a descongestionantes podem ser úteis
res: cefaléia, dor ou pressão facial, obstrução ou nos casos de tosse com drenagem pós-nasal. An-
congestão nasal, secreção nasal ou pós-nasal pu- titussígenos e anti-inflamatórios têm pouco valor
rulenta, hiposmia ou anosmia, e secreção nasal ou terapêutico.
pós-nasal purulenta ao exame. São sinais menores:
febre, halitose, odontalgia, otalgia ou pressão nos Exacerbação de doença pré-existente
ouvidos e tosse. Na avaliação do paciente com tosse aguda é
O valor da radiografia de seios da face é con- fundamental identificar, através da história clínica,
troverso. Ela não é acurada para várias regiões da exame físico e quando necessário de propedêutica,
face, tem pouca utilidade para diferenciar infecção casos de tosse devidos a crise de asma, exacerbação
bacteriana de viral ou alterações alérgicas, e baixa da DPOC, bronquiectasias infectadas e descontrole
relação entre custo e benefício, mesmo nos casos de rinossinusopatia.
em que existe dúvida diagnóstica após história e As exacerbações da DPOC devidas a traqueo-
exame físico.(19,23) bronquites bacterianas caracterizam-se pela piora
Não há necessidade de tratamento da sinusite da dispnéia, mudança do aspecto do escarro para
viral que apresenta sintomas leves e resolução es- purulento e aumento do volume da expectoração.
pontânea. Para as sinusites bacterianas preconiza-se Na DPOC leve ou moderada, em pacientes com
amoxacilina por sete a dez dias. Dependendo da poucas exacerbações por ano, os agentes etiológi-
resistência local, evolução e uso prévio de antibió- cos mais freqüentes são: Haemophilus influenzae,
ticos, podem ser usados amoxacilina com clavula- Streptococcus pneumoniae e Moraxella catarrhalis.
Nos pacientes graves, com co-morbidades ou muitas monia, edema pulmonar cardiogênico, crise grave
exacerbações, predominam as infecções por Gram- de asma ou DPOC, e embolia pulmonar, geralmente
negativos entéricos, pseudomonas e S. pneumoniae não são difíceis de serem diagnosticadas quando
resistente a penicilina.(24) causam tosse, uma vez que raramente se manifes-
O tratamento da exacerbação infecciosa da tam isoladamente por este sintoma. O sucesso do
DPOC inclui o uso de broncodilatadores, corticos- manejo depende da instituição de propedêutica
teróides, oxigênio e antibióticos. O uso racional adequada e terapia específica para cada doença.
de antibióticos na traqueobronquite da DPOC ba-
seia-se na sua gravidade, presença de co-morbi- Tosse subaguda
dades e número de exacerbações por ano:(24) qua- No Ι Consenso Brasileiro sobre Tosse realizado
dro leve a moderado, sem outras co-morbidades e em 1997, tosse com duração superior a oito se-
poucas exacerbações por ano - β-lactâmico asso- manas era classificada como crônica.(13) Aplican-
ciado a inibidor de β-lactamase, cefuroxima ou do-se o algoritmo de manejo proposto o sucesso
macrolídeo; quadro leve a moderado, com co-morbi- terapêutico chegava a mais de 90% (Quadro 2).
dades ou muitas exacerbações por ano - antibióticos No Consenso Norte-Americano de Tosse publi-
anteriores mais moxifloxacino, levofloxacina, ou cado em 2006 foi proposta nova classificação na
telitromicina; quadros graves, com ou sem co-mor- qual a tosse com duração superior a três e inferior
bidades e com muitas exacerbações por ano - mo- a oito semanas foi definida como tosse subagu-
xifloxacino, levofloxacina, gatifloxacina ou cipro- da.(12) Os autores deste documento destacam a
floxacino (suspeita de pseudomonas). ausência de publicações sobre a etiologia da tosse
subaguda e reafirmam que as orientações de ma-
Exposição a fatores irritantes ou alérgicos nejo são baseadas na opinião de seus integrantes.
Na avaliação de pacientes com tosse aguda é Segundo a diretriz norte-americana, uma das
fundamental pesquisar a exposição a fatores alér- causas mais comuns de tosse subaguda é a tosse
gicos, ambientais ou ocupacionais que tenham pós-infecciosa, ou seja, aquela que acomete paci-
relação temporal com o início ou piora da tosse. entes que tiveram infecção respiratória recente e
O afastamento da exposição, quando não houver não foram identificadas outras causas. Uma vez
doença respiratória pré-existente, como asma ou afastada a etiologia pós-infecciosa, o manejo será
rinite, pode tornar desnecessário o uso de medi- o mesmo da tosse crônica.
camentos para controle dos sintomas.
Tosse pós-infecciosa
Uso de medicamentos capazes de causar tosse O diagnóstico é realizado por exclusão, e de-
É essencial identificar o uso de medicamentos vem ser considerados três aspectos fundamentais:(3)
capazes de causar tosse como os inibidores da tosse com duração superior a três e inferior a oito
enzima conversora da angiotensina (captopril, ena- semanas; avaliação clínica detalhada sem identifi-
lapril, etc) e os beta-bloqueadores. Os primeiros, cação de uma causa; história de infecção das vias
por causarem tosse irritativa, sem expectoração em aéreas nas últimas três semanas.
10% a 20% dos seus usuários, que geralmente é A fisiopatogenia é multifatorial, com extensa
diagnosticada antes de três semanas de uso. E os inflamação e lesão epitelial das vias aéreas, com
β-bloqueadores, inclusive na forma de colírios, por ou sem hiperresponsividade transitória. Outros fa-
piorarem a obstrução das vias aéreas de pacientes tores que podem contribuir são a drenagem pós-
com asma ou DPOC, e causarem tosse com ou sem nasal, acúmulo de secreções nas vias aéreas infe-
dispnéia e chiado. riores e agravamento de refluxo gastresofágico
Em geral, a tosse causada por medicamentos devido a alterações no gradiente pressórico tóraco-
melhora em poucos dias após a suspensão dos abdominal durante a tosse.
mesmos. Quando necessário, deve-se utilizar bron- A etiologia relaciona-se, em geral, a infec-
codilatadores e/ou corticosteróides. ções virais, ocasionalmente após infecções por
B. pertussis, M. pnuemoniae e C. pneumoniae .
Doenças potencialmente graves A tosse em geral é auto-limitada e resolve-se
As doenças potencialmente graves, como pneu- em poucas semanas. Não há tratamento específico.
Deve-se considerar o uso de brometo de ipratró- resultado da bronquite crônica, ou pode ser seca
pio e corticosteróides por via inalatória.(20) Em ca- como resultado dos efeitos irritantes da fumaça
sos mais intensos, com grande repercussão na qua- do cigarro.
lidade de vida, deve-se testar o efeito de predni- Exames de função pulmonar podem revelar si-
sona ou prednisolona a 30 a 40 mg por dia, por nais de obstrução ao fluxo aéreo. A produção de
cinco a sete dias.(25) O uso de antibióticos deve ser volumes significativos (mais de uma xícara por dia)
reservado para casos em que haja alta probabili- de expectoração pode sugerir algumas patologias.
dade de infecção bacteriana, como nos surtos de A mais comum delas é a bronquiectasia, em que
traqueobronquite por micoplasma. Diante de um freqüentemente as secreções são purulentas e rela-
caso de coqueluche, só se justifica o uso de ma- cionadas com a mudança postural. O exame físico
crolídeo se a tosse tiver duração inferior a catorze pode revelar baqueteamento digital, halitose e es-
dias (tosse aguda). tertores localizados ou difusos, além de sinais de
obstrução ao fluxo aéreo. O diagnóstico destas
HISTÓRIA CLÍNICA E EXAME FÍSICO DO causas de tosse produtiva é normalmente direto, e
PACIENTE COM TOSSE CRÔNICA estratégias para intervenção e tratamento estão
bem definidas. (31)
Uma história clínica cuidadosa permite um diag- A tosse seca ou pouco produtiva é um dos
nóstico clínico na maioria das vezes, sem a neces- maiores desafios diagnósticos. Uma história de
sidade de investigação adicional ou de tentativas terapia com inibidores de enzima de conversão da
terapêuticas, sendo esta anamnese e o exame físi- angiotensina ocorre apenas em até 15% de paci-
co a primeira etapa na investigação da tosse crô- entes usuários de enzima de conversão da angio-
nica. Estes dois instrumentos têm sido úteis no tensina que desenvolvem tosse seca logo após o
diagnóstico da tosse em até 70% dos casos.(26-27) início da terapia.(32) A tosse normalmente diminui
No Brasil, dois estudos relatam valores semelhan- com a cessação do tratamento, mas a resolução
tes, um em um centro terciário(28) e outro em um completa pode demorar vários meses e pode per-
hospital geral.(29) sistir em uma pequena minoria de pacientes por
A história de tabagismo e a quantidade e ca- longo tempo.
racterísticas da expectoração devem ser muito bem A infecção respiratória de vias aéreas superiores
detalhadas. A tosse crônica em fumantes de cigarro é acompanhada freqüentemente por tosse que
é dose-relacionada(30) e pode ser acompanhada de normalmente diminui rapidamente com o passar
expectoração mucóide ou mucopurulenta, como do tempo. (33-34) Porém, em indivíduos previamente
hígidos, esta tosse seca pode persistir por longo rir muito pode precipitar o refluxo e a tosse. A
tempo após a infecção.(35) doença do refluxo gastresofágico é mais comum
Vários estudos mostraram que em indivíduos em pacientes com sobrepeso ou obesos embora
não fumantes, com radiografia de tórax normal e não se restrinja a eles.
que não estejam utilizando enzima de conversão Os sintomas sugestivos de asma, rinossinusite
da angiotensina, a tosse normalmente é ocasionada ou doença do refluxo gastresofágico estão pre-
por três condições, asma, rinossinusite ou a doença sentes em cerca da metade dos pacientes que pro-
do refluxo gastresofágico, e duas causas podem curam uma clínica especializada.(37) Embora a tos-
estar presentes no mesmo indivíduo.(36-37) Sintomas se possa ser o único sintoma presente nestas con-
sugestivos destas doenças podem estar ausentes, dições,(39-40) não devemos deixar de realizar uma
mas importantes informações na história freqüente- história detalhada e exame físico completos.
mente não são reconhecidas. Alterações no exame
físico são raras nestes pacientes com tosse crônica. IMPACTO NA QUALIDADE DE VIDA
Dispnéia, opressão no peito, chiado e cansaço
fácil, além da tosse, sugerem fortemente o diag- A qualidade de vida, no que se refere estrita-
nóstico de asma, mas estes sintomas podem estar mente à saúde orgânica, e principalmente quanto
completamente ausentes e esta condição denomi- às manifestações respiratórias, suscita que se con-
na-se, então, tosse variante de asma. Variabilidade siderem vários ditames essenciais para o bem es-
do pico de fluxo nas medidas diárias e exacerbação tar do indivíduo. Adicionalmente se sabe que a
noturna são sinais muito sugestivos desta condição. tosse é a queixa respiratória que conduz mais fre-
A tosse pode ser estimulada pelo exercício e/ qüentemente o indivíduo a atendimento médico.
ou contato com ar frio, mas isto também acontece Quatro estudos longitudinais(41-44) documenta-
com pacientes não asmáticos. O chiado pode ser ram que a tosse constitui uma das causas mais
encontrado no exame físico, mas freqüentemente importantes de subversão da qualidade de vida
é ausente nos pacientes com tosse variante de humana. Além desses quatros trabalhos, neste cor-
asma. No Brasil, um estudo não encontrou relação rente ano, publicou-se excelente revisão sobre
entre as respostas positivas a um questionário de complicações da tosse.(45)
tosse e o tratamento em pacientes com tosse varian- Em ordem cronológica, o primeiro estudo ci-
te de asma.(38) tado foi o Sickness Impact Profile, publicado em
A presença de rinossinusite pode ser sugerida 2002,(4¹) o qual enfatizou queixas não específicas
por uma história de obstrução ou congestão na- para certas doenças ou disfunções e, em contra-
sais, rinorréia, espirros, secreção purulenta, dor partida, utilizou um critério no qual se quantificava
facial e drenagem retronasal (sensação de secre- o desempenho das atividades usuais de cada dia.
ções que gotejam por trás da garganta). O exame As disfunções relacionadas com doenças, em paci-
da faringe pode revelar eritema, um “atapetamento" entes com tosse crônica, é mais provavelmente psi-
da mucosa da faringe posterior e a presença de cológica em sua patogenia.(42) Enquanto o Sickness
secreção mucóide ou purulenta. Infelizmente, Impact Profile não tiver sido testado psicotecni-
muitos sinais e sintomas faríngeos também acon- camente para qualificar os efeitos da tosse, esse
tecem na doença do refluxo gastresofágico. documento, que utilizou a intervenção “com tra-
A doença do refluxo gastresofágico pode ser tamento", antes e depois, deixa a conclusão de
suspeitada quando da presença de sintomas como que a tosse crônica estava associada a uma deterio-
dispepsia e azia, mas recentemente são reconhe- ração significativa na qualidade de vida do pacien-
cidos também sintomas como voz rouca e afonia. te, e que a disfunção relacionada à doença era mais
O refluxo normalmente é causado por relaxamento provavelmente devida a fatores psicológicos.(43)
passageiro do esfíncter inferior do esôfago.(35) As- O segundo estudo utilizou um questionário
sim, a tosse pode acontecer durante ou após as valorizando a qualidade de vida e foram identifi-
refeições ou mesmo quando o indivíduo mantém cadas as 28 razões mais comuns que conduziam
a posição supina, dobrando-se ou inclinando-se. o paciente a procurar o atendimento médico por
A tosse normalmente diminui durante o sono e ao causa da tosse.(42) Configurou-se uma ferramenta
se adotar uma postura vertical. O ato de falar ou confiável e válida na avaliação do impacto da tosse
Quadro 3 - Algoritmo em pacientes com diagnóstico de DPOC tor.(74) A hiperresponsividade brônquica também
Tosse pode ocorrer em pacientes com quadro de infec-
Aguda Subaguda Crônica ção respiratória, rinite alérgica e em tabagistas
tosse assintomáticos.
Suspeitar de DPOC expectoração O exame consiste na inalação de concentra-
dispnéia ções crescentes do fármaco broncoconstritor, sendo
Espirometria considerado positivo quando a queda do VEF1 atin-
Exames para afastar outras doenças
ge 20% do valor inicial. A variável principal é a
dose cumulativa da substância que levou a este
Quadro 4 - Algoritmo em pacientes com diagnóstico de DPOC decréscimo funcional (PD20). Uma alternativa é o
teste de provocação brônquica por esforço, para
Tosse
o diagnóstico de asma induzida por exercício, sen-
Aguda Subaguda Crônica
Exacerbação exacerbação doença associada neoplasia pulmão do considerada positiva, neste caso, a queda igual
laringe ou acima de 10% do VEF 1 em relação ao valor
Bronquite sinusopatia esôfago inicial.(74-75)
aguda bronquiectasia Outra variável que pode ser aferida no teste de
Gripe/resfriado pós-infecciosa HRB provocação é a queda do FIF50%, preconizada
Bronquiolite resp. para o estudo de hiperresponsividade de vias aé-
Refluxo, SGPN, reas extratorácicas. Quando ela for maior que 25%,
Inib. ECA o teste é considerado positivo. O teste positivo é
persistência de tabagismo
relacionado com a presença de doenças crônicas
das vias aéreas superiores (laringite, faringite, rinite
da asma e da doença pulmonar obstrutiva crônica. e/ou sinusite).(76) Ainda é questionado se essas pa-
Outras doenças que causam tosse, como a sarcoido- tologias causam ou são conseqüências deste tipo
se, podem apresentar limitação ao fluxo aéreo.(73) de hiperresponsividade. (77)
A espirometria normal não exclui asma, sendo A realização do teste de provocação é preconi-
indicada a broncoprovocação na seqüência diagnós- zada na suspeita de asma como etiologia da tosse,
tica. Um achado relativamente freqüente em espiro- principalmente naqueles pacientes com história
metria normal é a presença de resposta significativa clínica compatível, quando outros exames, em
ao broncodilatador (em normais, a variação do VEF1 particular a espirometria, não estabeleceram ou
é considerada significativa quando igual ou acima eliminaram o diagnóstico. (74-75, 78)
de 10% do valor previsto), a qual sugere aumento O valor preditivo positivo do teste é elevado,
do tônus broncomotor. Nesta situação, em pacientes mas a confirmação diagnóstica só ocorre após a
com correlação clínica positiva, pode ser inferido o melhora clínica com o tratamento da asma, visto
diagnóstico de asma. Entretanto, na vigência de es- que outras causas de tosse (tabagismo, rinossinu-
pirometria basal normal, ao invés da prova bronco- site, refluxo gastresofágico, bronquiectasias) tam-
dilatadora, deve ser preferido o teste de provocação bém podem apresentar positividade no exame.(46, 74)
brônquica para a confirmação diagnóstica.(69) O teste também apresenta alto valor preditivo
negativo, ou seja, a ausência de queda significati-
Testes de provocação brônquica va do VEF 1 praticamente exclui a hipótese de
Estes testes medem a resposta das vias aéreas asma.(46,74-75,78) Em um paciente com teste negati-
quando expostas a agentes farmacológicos inala- vo, e com melhora da tosse em posterior trata-
tórios que causam broncoespasmo, como metaco- mento com corticóide inalado, o diagnóstico mais
lina, carbacol e histamina. Uma resposta bronco- provável é bronquite eosinofílica não asmática.(74, 79)
constritora limitada é esperada em qualquer pessoa
hígida, mas em um paciente asmático esta resposta Pico de fluxo expiratório seriado
é exagerada, sendo indicativa de hiperresponsivi- O registro seriado do pico de fluxo expiratório
dade das vias aéreas. Por definição, a hiperres- permite a detecção de variações temporais deste
ponsividade brônquica é a resposta broncocons- parâmetro. A variabilidade do pico de fluxo expira-
tritora exagerada a um estímulo broncoconstri- tório intradiária maior que 15% é característica de
asma, ainda que não seja critério obrigatório para o DISFUNÇÃO DE CORDAS VOCAIS
seu diagnóstico.(69) O grau de variação intradiária pode
também ser utilizado na estratificação de gravidade A disfunção de cordas vocais (DCV), também
da doença. A sensibilidade para o diagnóstico de chamada de discinesia de laringe, é uma condição
asma é maior com os testes de provocação brônqui- respiratória caracterizada pela adução das cordas
ca, mas em casos duvidosos, a adição de medidas vocais durante a inspiração e/ou no início da ex-
seriadas do pico de fluxo expiratório pode adicionar piração, resultando em limitação do fluxo aéreo
sensibilidade ao diagnóstico.(74) O teste tem ainda valor no nível da laringe,(81-82) sem base anatômica e não
em medicina ocupacional, visto que permite estabe- orgânica, ou seja, é uma alteração funcional, cujos
lecer variações funcionais, correlacionadas com sin- sinais e sintomas clínicos podem ser confundidos
tomas respiratórios, decorrentes da exposição a agen- com outras patologias respiratórias, principalmente
tes inalatórios no ambiente de trabalho.(80) asma brônquica.(81, 83)
Pela falta do substrato anatômico e por ser uma
Outros testes condição pouco descrita na literatura, tendo sido
Em casos de suspeita de doença intersticial citada apenas em relatos de casos e pequenas sé-
pulmonar como causa da tosse, a determinação ries, seu diagnóstico muitas vezes não é feito ou é
dos volumes pulmonares e a prova de difusão do tardio, pela falta de lembrança ou mesmo de co-
monóxido de carbono devem ser realizadas. nhecimento dos médicos que atendem a esses
Um algoritmo adaptado(74) dos testes de fun- pacientes. São usadas medicações para asma de
ção respiratória na investigação da tosse crônica é difícil controle, como corticóide oral em altas doses
mostrado na Figura 2. e mesmo imunossupressores, de maneira desneces-
sária, o que leva a retardo do tratamento correto,
com efeitos colaterais e elevado custo financeiro
Tosse crônica
do tratamento.(81, 84-85) Com apropriadas identifica-
L ção e intervenção, muitos pacientes podem ter sig-
Ausência de drip
nificativa melhora na qualidade de vida.(83)
Sem sintomas de DRGE Tosse crônica ocorre em cerca de 80% dos
Não fumante pacientes com DCV,(86) associada a outros sinto-
Sem uso de inibidor de ECA
mas de DCV, em particular sintomas respiratórios,
L havendo uma correlação importante com doença
Radiologia de tórax e do refluxo gastresofágico (DRGE).(86-87)
seios da face normais Há uma variedade grande de sinonímias(84,88) que
demonstram as dúvidas e dificuldades no diag-
L nóstico desta patologia e como a estamos vendo
Alterada
Espirometria na atualidade: disfunção de cordas vocais, asma
J Tratamento da causa
Normal L psicogênica, asma factícia, asma laríngea, movi-
mento paradoxal das pregas vocais, estridor de
Positivo
TPB
J Tratamento da causa Munchasen, estridor psicogênico, estridor histérico,
Negativo L estridor do adolescente funcional, estridor laríngeo,
TCAR
obstrução funcional da laringe, adução paradoxal
Escarro (eos) de cordas vocais, obstrução psicogênica das vias
PFE aéreas superiores e crupe histérico,(84) além de estri-
pHmetria dor inspiratório funcional e estridor não orgânico.(89)
Broncoscopia A laringe tem como funções fisiológicas prin-
cipais a manutenção pérvia das vias aéreas, a pro-
Figura 2 - Algoritmo para investigação funcional da tosse teção das vias aéreas e a fonação. O reflexo da
crônica
tosse e o reflexo de fechamento da glote não são
DRGE: doença do refluxo gastresofágico; ECA: enzima
conversora de angiotensina; TPB: teste de provocação importantes somente para proteção da via aérea
brônquica; TCAR: tomografia computadorizada de alta durante a deglutição, mas também em resposta a
resolução; PFE: pico de fluxo expiratório. estímulos inalatórios potencialmente nocivos. Os
receptores sensitivos distribuídos na laringe, tra- A confirmação diagnóstica nem sempre é fácil.
quéia e brônquios, quando estimulados, podem O reconhecimento de DCV em pacientes com quei-
desencadear constrição da laringe. Os pacientes xas respiratórias é difícil e deve-se ter um apropria-
portadores de DCV têm o reflexo de proteção da do nível de suspeita clínica. Pacientes com sinto-
laringe aumentado a estímulos extrínsecos e in- mas semelhantes aos da asma que não respondem
trínsecos.(87) ao tratamento adequado devem ser avaliados para
A verdadeira prevalência de DCV é desconheci- a possibilidade de DCV, fazendo-se o diagnóstico
da e sua patogênese ainda não é bem definida. precoce e evitando-se iatrogenias das drogas an-
Como a etiopatogenia da DCV ainda não está to- tiasmáticas.(83)
talmente clara, algumas teorias tentam explicar a A DCV pode ocorrer isolada ou associada à asma
doença, como a teoria neurogênica, a da DRGE e brônquica persistente grave, o que dificulta mais
da reação de conversão.(84) ainda seu diagnóstico. Em torno de 40% a 50 %
Segundo a teoria neurogênica, o limiar de es- dos pacientes que têm DCV e que foram internados
tímulo para produzir espasmo da glote por ativa- por dificuldade respiratória têm asma associada, o
ção da inervação efetora do vago estaria baixo, que quer dizer que a presença de asma não exclui
facilitando as crises de discinesia após infecções o diagnóstico de DCV e vice-versa. (81)
do trato respiratório, onde um vírus neurogênico A tosse crônica está presente em cerca de 80%
afetaria o nervo vago, como também por desor- dos portadores de DCV, sendo que 33% a 40%
dens neurológicas que alterem o balanço autonô- deles são portadores de DRGE. (86) Podem apresen-
mico da laringe.(87) tar-se clinicamente apenas com tosse e DRGE, e a
Outra teoria é a da DRGE, cuja associação com DCV deve ser considerada como causa de tosse
tosse crônica é bastante conhecida. Modelos ani- crônica na ausência de patologia rinolaringológica
mais de DRGE foram sugestivos de que pH abaixo ou pulmonar.(87)
de 2,5 induz a laringoespasmo através de um me- Estridor aparece em menos de 20 % dos ca-
canismo mediado pelo vago e de sensibilização sos.(81) Quando este sintoma surge durante exercí-
de quimiorreceptores da mucosa da laringe.(90) A cios físicos, principalmente em atletas de elite, a
irritação crônica da laringe pode ser o gatilho para DCV pode mimetizar asma induzida por exercício,
a crise de DCV e a DRGE deve ser prontamente o que leva a diagnóstico errado e tratamento equi-
manejada nestes pacientes. vocado para asma induzida por exercício, quando
Uma terceira teoria é a de reação de conversão, na verdade o que está presente é a DCV, ou mesmo
daí a associação de discinesia com patologias psi- coexistem as duas patologias.
quiátricas, incluindo depressão, trauma psíquico Os sintomas de DCV podem ser desencadeados
por abuso sexual, emoções intensas e estresse físico por problemas emocionais como estresse ou medo
(pode ser desencadeada em atletas em competições (relato de abuso sexual tem sido descrito nestes
estressantes), sendo um diagnóstico diferencial com pacientes), esforço físico, inalação de irritantes
asma induzida por exercício. como cigarro, perfumes, amônia, cloro, agentes
O mais aceito na literatura atual é a associação de limpeza e outras substâncias químicas com
de mais de uma teoria.(91) odores fortes, drenagem pós-nasal devida a rinos-
Os sinais e sintomas de DCV são inespecíficos sinusopatia (alérgica ou infecciosa), DRGE, e po-
e podem ser vistos em outras doenças respiratórias dem ocorrer sem nenhum fator desencadeante
agudas ou crônicas. Para o diagnóstico, é reque- identificado.(83) Pacientes podem descrever exacer-
rido alto grau de suspeita clínica, sendo os sinais bação dos seus sintomas com identificação do
e sintomas mais comuns: tosse, chiado, estridor, gatilho em 20% a 45% dos casos. (86)
dispnéia, rouquidão e sufocamento. Alguns paci- Ocasionalmente a DCV se desenvolve em paci-
entes referem dificuldade de deglutir ou dor na entes com doenças neurológicas, como a esclerose
garganta e no tórax, e sintomatologia de DRGE.(83, 86) lateral amiotrófica, encefalite, má formação de
Na anamnese chama à atenção a ausência de his- Arnold-Chiari, estenose do aqueduto cerebral e
tória pessoal e familiar de atopia. Há predominância desordem dos movimentos.
no sexo feminino e na faixa etária de vinte a 45 Os principais exames utilizados no diagnóstico
anos. Entretanto, pode ocorrer em qualquer idade.(81) de DCV são a laringoscopia e a espirometria utili-
zando a alça fluxo volume. Entretanto, ambos os lógica (drogas anti-DRGE, antialérgicos, antidepres-
métodos têm baixa sensibilidade, embora com alta sivos, ansiolíticos e sedativos), técnicas de rela-
especificidade.(82) xamento, e clara explicação da síndrome com ces-
A nasofibrolaringoscopia com tubo flexível é o sação de medicamentos desnecessários e suporte
principal exame no diagnóstico da DCV,(81-82, 88) evi- emocional psiquiátrico.
denciando-se obstrução de 50% ou mais da via Deve-se evitar o contato com irritantes quími-
aérea no nível da glote.(86) Deve-se, durante o exa- cos e substâncias alergizantes que possam desen-
me, realizar manobras para afastar patologias neu- cadear crises. Em raros casos é utilizada pressão
rológicas como causa da obstrução da laringe.(84) positiva contínua na via aérea (CPAP), tendo sido
A nasofibrolaringoscopia é também utilizada para referido também o uso de heliox (80% de hélio e
excluir os diagnósticos diferenciais de obstrução 20% de oxigênio).(87) A combinação de métodos
das vias aéreas superiores. terapêuticos é a conduta mais indicada e signifi-
O momento do ciclo respiratório em que ocor- cativa melhora é observada em 88% dos casos
re o fechamento paradoxal das pregas vocais na quando a equipe multidisciplinar está envolvida.(86)
DCV mais aceito pela literatura é a fase inspiratória
e/ou início da fase expiratória.(83) A laringofibros- TOSSE CRÔNICA:
copia é normal em 50% dos pacientes quando rea- BRONQUITE EOSINOFÍLICA SEM ASMA
lizada fora das crises.(81)
A curva fluxo volume realizada durante a espi- O termo bronquite geralmente se refere a infla-
rometria pode revelar obstrução das vias aéreas mação dos brônquios. Bronquite eosinofílica é um
extratorácicas com achatamento da alça inspira- achado cardinal, porém não universal ou exclusivo
tória, em cerca de 23% dos casos.(81) Pode sugerir da asma. Por exemplo, a bronquite eosinofílica pode
mas não estabelecer o diagnóstico de obstrução estar ausente nas exacerbações da asma,(92) durante
de vias aéreas superiores. infecções bacterianas(92-93) ou virais,(94) e na asma
Se estes testes não são diagnósticos em paci- estável de diferentes gravidades.(92, 95) Por outro lado,
entes com suspeita de DCV, então é possível pro- a bronquite eosinofílica pode estar presente na au-
vocar episódio de DCV com exercício, metacolina sência de asma, em fumantes ou ex-fumantes, com
ou frio,(88) com resultados divergentes na literatu- ou sem doença pulmonar obstrutiva crônica,(96) e
ra sobre a positividade dos testes. Deve-se, conco- em portadores de tosse crônica sem asma.(97)
mitantemente, realizar laringoscopia e espirometria.(83) A bronquite eosinofílica sem asma como causa
Se os resultados de exames realizados fora da de tosse crônica foi descrita há apenas cerca de vinte
crise não estabelecerem o diagnóstico de DCV, la- anos.(98) A partir de então, diversas publicações têm
ringoscopia e/ou espirometria durante as crises demonstrado que a bronquite eosinofílica sem asma
sintomáticas devem ser realizadas.(83) Entretanto, é uma causa comum de tosse crônica, ocorrendo em
cresce na literatura a consideração de que a sinto- que cerca de 10% dos pacientes referidos à clínicas
matologia de obstrução variável extratorácica é terciárias para investigar este sintoma.(99-100)
altamente sugestiva de DCV e, quando detectada, A bronquite eosinofílica sem asma é definida
em apropriado contexto clínico, é suficiente para pela presença de tosse crônica em pacientes sem
o diagnóstico e início do tratamento de DCV.(83) sintomas ou evidência objetiva funcional de asma
Uma equipe multidisciplinar deve ser envolvida (broncoconstricção com resposta broncodilatadora
no diagnóstico e na terapia dos pacientes porta- e/ou hiperresponsividade das vias aéreas), associa-
dores de DCV, já que podem apresentar co-fatores da à presença de eosinofilia no escarro (eosinófi-
envolvendo a doença, em que são valorizados os los = 3,0%).(99-100) Em síntese, a bronquite eosinofí-
sintomas.(87) No diagnóstico, conforme o quadro lica distingue-se da asma por não possuir as ca-
clínico, podem participar o pneumologista, otor- racterísticas fisiológicas da asma: broncoconstric-
rinolaringologista, endoscopista respiratório, fono- ção e hiperresponsividade das vias aéreas.
terapeuta, e psiquiatra.
Modalidades terapêuticas são individualizadas Quadro clínico e diagnóstico
caso a caso, conforme a sintomatologia e incluem A bronquite eosinofílica sem asma mais comu-
suporte respiratório, fonoterapia, terapia farmaco- mente se manisfesta como tosse seca ou produti-
va que se enquadra na definição de tosse crônica, tação da garganta, rouquidão e evidentemente tosse
sem evidência clínica ou radiológica de ser causa- improdutiva seca ou com pouca eliminação de
da por outras doenças pulmonares. Nestes paci- muco, com exame do tórax sem ruídos adventícios.
entes, a espirometria é normal ou mostra limitação Os sintomas com duração de menos de três sema-
leve, sem resposta broncodilatadora e a responsi- nas são considerados tosse aguda e quando ultra-
vidade das vias aéreas ao teste de broncoprovo- passam três até oito semanas tosse subaguda. O
cação com metacolina ou histamina é normal. O diagnóstico é basicamente clínico. Em mais de
diagnóstico é confirmado pela presença de eosi- 97% dos casos, o radiograma de tórax é normal. A
nofilia no escarro espontâneo ou induzido. Como tosse é conseqüente à presença do gotejamento
a tosse crônica comumente tem múltiplas causas, pós-nasal, limpeza da faringe ou de ambos. A tosse
a bronquite eosinofílica deve sempre fazer parte nessa situação é autolimitada e resolve-se na maio-
do diagnóstico diferencial, mesmo em pacientes ria das vezes. Quando houver prostração e incô-
com outras causas de tosse diagnosticada (exceto modo, o tratamento consiste no uso do maleato
asma) e, especialmente, naqueles com resposta de dexclorfeniramina a 2 mg até quatro vezes ao
parcial ao tratamento. Adicionalmente, uma histó- dia, associado a pseudoefedrina. O brometo de
ria ocupacional detalhada é importante também ipratrópio tópico nasal pode ser usado, associado
para levantar a possibilidade de bronquite eosino- ou isolado, para alívio da rinorréia, na dose de
fílica ocupacional. dois jatos em cada narina três a quatro vezes ao
dia. Na presença da dor e irritação intensa da fa-
Tratamento e evolução ringe, deve ser prescrito naproxeno a 500 mg, três
A bronquite eosinofílica sem asma responde vezes ao dia, durante cinco dias. Os anti-histamí-
bem ao tratamento com corticosteróides inalados, nicos de última geração, não sedantes, associados
com a eosinofilia desaparecendo do escarro em ou não a pseudoefedrina, como por exemplo a
duas semanas.(101) Apesar de a história natural da loratadina, não parecem ter consistentes benefícios
bronquite eosinofílica ser controversa,(102-103) acre- em controlar a tosse e outros sintomas do resfriado
dita-se que na maior parte dos casos ela é uma comum, já que esses sintomas não são histamina
condição autolimitada(102) e que apenas uma mino- dependentes. Os corticosteróides também não tra-
ria evolui para asma. Por outro lado, pacientes com zem vantagens quando prescritos para aliviar os
tosse crônica e sem asma, que apresentem escarro sintomas do resfriado comum.
sem eosinofilia (eosinófilos < 3%), não respondem A infecção por vírus é reconhecida como a prin-
ao tratamento com corticosteróides inalatórios ad- cipal causa de exacerbação de asma tanto em adul-
ministrados durante quatro semanas.(104) Pacientes tos quanto em crianças. As células das vias aéreas
com bronquite eosinofílica ocupacional em geral são o principal sítio da infecção viral e replicação,
apresentam regressão do quadro quando afastados com liberação de uma série de mediadores pró-
da exposição. inflamatórios. O vírus parece induzir uma disfun-
ção dos receptores muscarínicos M2 da via paras-
TOSSE PÓS-INFECCIOSA simpática, resultando na liberação de acetilcolina
e maior responsividade brônquica. O vírus atua
Pacientes com tosse raramente procuram as- diretamente no receptor M2, ou indiretamente pela
sistência médica, à exceção das crianças e dos ido- liberação de interferon-gama pelas células epiteliais
sos, cujos parentes são responsáveis em conduzi- e pelos macrófagos. Os corticosteróides aliviam este
los a consultar o médico. processo, o que sugere influência taquicinérgica.
A tosse que ocorre após infecção do trato res- A sinusite bacteriana aguda é a segunda grande
piratório superior e inferior é considerada tosse causa da tosse aguda pós-infecciosa, muitas ve-
pós-infecciosa. zes indistinguível da rinossinusite aguda viral. Aos
O resfriado comum é a causa mais freqüente. pacientes com rinossinusite aguda viral, que não
Caracteriza-se pela presença de sinais e sintomas respondem ao tratamento descrito acima, devem
referentes à via aérea superior, como rinorréia, obs- ser prescritos antibióticos quando apresentarem
trução nasal, ato de fungar e espirrar, corrimento pelo menos dois dos seguintes sinais e sintomas:
pós-nasal, com ou sem febre, lacrimejamento, irri- dor na face (maxilar), secreção nasal purulenta,
anormalidade no teste da transiluminação dos seios sona inalatória tem sido útil. O brometo de ipra-
paranasais, descoloração da secreção nasal. Não trópio inalado parece atenuar a tosse pós-infeccio-
há necessidade de estudo radiológico dos seios sa. Derivados da codeína e o dextromertofano
da face para se iniciar o uso do antibiótico, cuja podem produzir alívio da tosse. Caso a tosse não
cobertura se faz necessária para H. influenzae e S. desapareça num prazo de uma semana, deve-se
pneumoniae, isto é, amoxacilina associada ao áci- realizar estudo radiográfico dos seios da face e, se
do clavulânico, a 500 mg de oito em oito horas, houver espessamento da mucosa > 5mm, nível
por quatorze dias, ou fluoroquinolona de terceira hidroaéreo ou opacificação, notadamente dos sei-
geração (levofloxacina, gatifloxacina, moxifloxa- os maxilares e/ou frontal, deverá ser prescrito des-
cina) em dose diária, por quatorze dias. Deve-se congestionante nasal (tópico) ou sistêmico e anti-
associar a dexclorfeniramina, com ou sem pseu- bióticos por pelos menos três semanas, com co-
doefedrina, e descongestionante nasal tópico ao bertura para H. influenzae e S. pneumoniae. Na-
antibiótico. queles doentes com tosse e presença de roncos,
A tosse aguda pós-infecciosa é uma manifes- sibilos e estertores inspiratórios à ausculta do tó-
tação freqüente da pneumonia adquirida na co- rax, com radiograma de tórax normal, prescrevem-
munidade. Na maioria dos casos, outros sinais e se broncodilatadores e corticosteróides inalatórios.
sintomas estão presentes, porém, nos idosos, ne- Na presença de secreção purulenta (notadamente
cessitamos de alto índice de suspeição clínica já nas traqueobronquites) está indicado o uso de
que muitas vezes febre, dor torácica e calafrios antibióticos visando ao S. pneumoniae. Nos pacien-
estão ausentes. A presença de tosse, alteração do tes portadores de bronquite crônica, deve-se co-
comportamento e anormalidade no exame físico brir também o H. influenzae e M. catharralis.
do tórax deve sempre levar à suspeita de pneumonia Muitos adultos queixam-se de tosse prolonga-
adquirida na comunidade e início de antibiotico- da após infecção de vias aéreas superiores, nota-
terapia, após um radiograma do tórax sugestivo. damente secundária a infecção viral, com radio-
A causa mais freqüente de tosse subaguda pós- grama de tórax normal (freqüência de 11% a 25%).
infecciosa é a infecção aguda do trato respiratório Durante epidemias de micoplasmose e coqueluxe,
superior sem evidências de pneumonia (radiograma a freqüência aumenta para 25% a 50% em séries
de tórax normal). Na verdade, é a tosse do resfriado selecionadas. Na população geral há uma média
comum ou da gripe que se prolonga por mais de de freqüência de 2,2% de infecções respiratórias
três semanas. A tosse é o resultado de gotejamento virais por indivíduo ao ano. Crianças acima de cinco
pós-nasal ou limpeza da garganta, secundária à anos de idade têm de 3,8 a cinco infecções por
rinite. Na traqueobronquite com ou sem hiperres- ano por criança. As crianças em creches têm maior
ponsividade transitória, a tosse é secundária ao incidência. Os vírus respiratórios (influenza, parain-
aumento e retenção de secreção secundária à in- fluenza, sincicial respiratório, adenovirus), o mico-
flamação em que os receptores da tosse são esti- plasma, a B. pertussis, a Chlamydia pneumonie e a
mulados. A tosse pode durar semanas ou até me- M. catharralis têm sido implicados nesses peque-
ses pela persistência da inflamação. Uma extensa nos pacientes.
ruptura da integridade epitelial e extensa inflamação Caso infecção pela B. pertussis tenha sido rela-
das vias aéreas superiores e inferiores ocorre nes- tada na comunidade, ou haja história recente de
ses casos. A broncoscopia e a biópsia brônquica contato com doentes com diagnóstico firmado de
revelam, na infecção pelo vírus da influenza A, coqueluche, ou na presença de sintomas caracte-
extensa descamação epitelial no nível da mem- rísticos de coqueluche, isto é, episódios de tosse
brana basal, com aumento do percentual de linfó- ou “quintas" com “guinchos" seguidos de expecto-
citos e neutrófilos no lavado broncoalveolar. O ração mucóide, várias vezes ao dia, espasmódica,
material de biópsia mostra uma bronquite linfocí- principalmente à noite, associados a sudorese
tica. O tratamento é o mesmo descrito acima para abundante, exaustão, congestão das conjuntivas,
tosse aguda pós-infecciosa acrescida de breve turgência dos vasos do pescoço, sufocação e perda
curso de prednisona ou predinisolona a 30 a 40 da consciência (crianças maiores), devemos con-
mg/dia pela manhã, por três semanas. Nos casos siderar o diagnóstico de coqueluche. A criança
de traqueobroquite por M. pneumoniae a flutica- entra em apnéia e sobrevém uma inspiração for-
çada, ruidosa e estridente, conseqüente à glote Ensaios em adultos e crianças usando vacina
semicerrada, após uma expiração fixa. Vômitos após antipertussis acelular, mais do que a vacina total,
as crises de tosse (whooping cough) são muito co- sugerem futuro promissor na prevenção da doença,
muns em qualquer idade e é um importante indício tanto em adultos como em crianças. Um grande
da doença em adolescentes e adultos. Não costu- ensaio multicêntrico, aleatorizado, controlado,
ma haver febre. A infecção por B. pertussis é reco- duplo cego, com vacina antipertussis acelular,
nhecida por causar tosse persistente em crianças, numa população com idades entre quinze e 65
adolescentes e adultos, e é conhecida como “tos- anos, foi realizado pelo Instituto Nacional de Aler-
se dos cem dias". Trata-se de uma infecção alta- gia e Doenças Infecciosas dos EUA e publicado
mente contagiosa. Vem apresentando aumento de em 2005. A vacina foi altamente efetiva, com taxa
incidência desde os anos 1980 em todas as faixas de proteção de 92%, e muito segura. Devido ao
etárias, pelo declínio imunológico da vacinação. sucesso da imunização foi recomendada a vacina-
O aumento da incidência tem ocorrido na faixa ção isolada (não associada à antidiftérica e à anti-
etária de dez a dezenove anos. Em um estudo pros- tetânica) para adolescentes entre onze e dezoito
pectivo no Canadá, em 19,9% dos adolescentes e anos de idade e idosos acima de 65 anos.
adultos com tosse pós-infecciosa a etiologia era O diagnóstico de tosse crônica pós-infecciosa
B. pertussis. na maioria das vezes é de exclusão, principalmente
Além das manifestações clínicas, o padrão ouro quando secundária a infecção por vírus, com du-
para o diagnóstico da coqueluche é o isolamento ração de mais de oito semanas.
da B. pertussis por meio de cultura do material Como descrito acima para a tosse subaguda, em
obtido de esfregaço da nasofaringe. O exame tem crianças, os vírus respiratórios (notadamente o sin-
rendimento maior (60% a 70% de crescimento) cicial respiratório e o parainfluenza), o Mycoplasma
dentro das primeiras quatro semanas da doença. pneumoniae , a Chlamydia pneumoniae e a B.
O exame sorológico pelo método ELISA para de- pertussis têm sido implicados na etiologia da tosse
monstrar aumento de IgG antitoxina pertussis é o crônica. A tosse crônica pode resultar de infec-
critério sorológico mais aceito para confirmar o ções repetidas. A tosse por B. pertussis ou por in-
diagnóstico. Um exame pareado é necessário para fecção por vírus pertussis-like pode resultar em
se afastar simples imunização de infecção, colhen- tosse persistente prolongada.
do-se as amostras de soro na fase aguda e na con- Outras infecções na infância, de ocorrência afe-
valescença. Aumento de quatro vezes da IgG é bril, em cuja ausculta do tórax estão presentes es-
também consistente com a presença recente de tertores inspiratórios, são causadas por Ureaplasma
infecção por B. pertussis. A especificidade é de urealyticum, Cytomegalovirus, P. carinii e M.
63%. A técnica da reação em cadeia da polimerase catharralis. Sarampo pode ser outra causa da tosse
é uma promessa, com especificidade de 100%. nessa idade, associada ou não ao quadro clássico
O antibiótico de escolha é a eritromicina, de da doença.
preferência o estolato de eritromicina em doses Nas infecções por Mycoplasma pneumoniae o
de 40 mg/Kg/dia para crianças e 2 g/dia para adul- diagnóstico faz-se pela presença de títulos altos
tos, ambas divididas em quatro tomadas, ou os de crioaglutinina, do tipo IgM e IgG, no sangue.
derivados atuais da eritromicina, ou seja, claritromi- Não existe um teste padrão para o diagnóstico
cina a 1 g/dia, durante dez dias, ou azitromicina a de Chlamydia pneumoniae, porém a pesquisa de
500 mg/dia, durante cinco dias. Antitussígenos, anticorpos do tipo IgG e IGM pela técnica da mi-
hidratação oral e expectoração por fisioterapia res- croimunofluorescência é aceita para o diagnóstico,
piratória estão indicados. assim como a cultura e a reação em cadeia da
O doente deve ficar isolado em casa e perma- polimerase.
necer ausente do trabalho e da escola por cinco Outras causas de tosse crônica pós-infecciosa
dias após o início do uso do antibiótico. Parecem são as bronquiectasias, sinusite crônica bacteriana,
destituídos de benefícios os antitussígenos, os beta discinesia ciliar primária, fibrose cística, panbron-
agonistas e imunoglobulinas antipertussis. Profi- quiolite difusa e, em nosso meio, a tuberculose
laxia deve ser iniciada nas duas primeiras semanas pulmonar e a paracoccidioidomicose. A história
para os comunicantes. clínica e o exame físico estreitam muito o diag-
A endoscopia nasal representa, sem dúvida, im- nossinusite aguda, e a diferenciação entre um qua-
portante ferramenta diagnóstica. Pode ser realizada dro gripal e uma infecção bacteriana nem sempre
utilizando-se endoscópios rígidos de Hopkins e/ou é fácil. Os sintomas mais comuns, como obstrução
endoscópios flexíveis de fibra ótica. Deve-se prestar nasal, rinorréia, hiposmia, pressão facial, goteja-
atenção com relação à presença de anormalidades mento pós-nasal, tosse e febre, são inespecíficos.
no interior do meato médio e na nasofaringe. Alguns sintomas como febre, halitose e hipos-
O objetivo do tratamento clínico da rinite é mia, considerados sintomas menores nos adultos,
restaurar a função nasal, a fim de manter a inte- podem ser a única manifestação de rinossinusite
gridade funcional de toda via aérea. O programa em crianças, sendo comum nestes pacientes a as-
terapêutico deve ser individualizado, com base na sociação de tosse (principalmente diurna), obstru-
intensidade e duração dos sintomas, e envolver o ção nasal e rinorréia purulenta, ao passo que a
tratamento das complicações infecciosas e mecâni- cefaléia é um sintoma incomum até os cinco ou
cas associadas. São tópicos importantes: higiene do seis anos de idade.
ambiente físico, higiene nasal, farmacoterapia e Na rinossinusite crônica é freqüente a ocor-
imunoterapia específica. rência de tosse crônica (por mais de três semanas)
São drogas utilizadas no tratamento da rinite e expectoração purulenta ou mucopurulenta, sem
alérgica: anti-histamínicos, vasoconstritores orais evidências de foco supurativo em vias aéreas infe-
e tópicos, brometo de ipratrópio, cromoglicato dis- riores (bronquite crônica, tuberculose, etc).
sódico, nedocromil sódico, e corticosteróides orais Os sinais e sintomas clínicos nas rinossinusites
e tópicos. Estas drogas podem ser utilizadas tanto aguda, subaguda e crônica são semelhantes, dife-
de forma isolada quanto em associação, princi- renciando-as o seu tempo e a forma de evolução
palmente quando o controle do ambiente físico e (Quadros 7 e 8).
a higiene nasal com solução salina não são suficien- A inspeção tradicional do nariz com luz frontal e
tes para diminuir a intensidade dos sintomas na- espéculo nasal garante informações muito restritas.
sais (Quadro 6). Os endoscópios rígidos e flexíveis de fibra óptica
A rinossinusite é definida como uma condição proporcionam uma avaliação sistemática e direta de
resultante de um processo inflamatório da mucosa áreas de inflamação ou drenagem patológica no na-
que reveste a cavidade nasal e os seios paranasais. A riz, nasofaringe, recesso esfenoetmoidal e meato
expressão rinossinusite é a mais apropriada para de- médio visualizadas. A indicação de endoscopia deve
finir esta doença, já que rinite e sinusite se apresen- ser considerada quando o paciente apresentar sinto-
tam usualmente como uma continuidade anatômica mas graves e persistentes, apesar do tratamento clí-
e fisiopatológica. A rinite existe isoladamente, mas a nico apropriado.
sinusite sem rinite é rara. Em geral, o valor diagnóstico dos radiogramas
A rinossinusite pode ser classificada com base na simples é controvertido, pois anormalidades dos seios
duração dos sintomas e na freqüência dos episódios. etmoidais, esfenoidais, recesso frontal e do complexo
A rinossinusite aguda é uma das causas mais ostiomeatal podem passar desapercebidas devido à
comuns de atendimento médico, sendo manejada dificuldade de visualização desses sítios anatômicos.
por clínicos, pediatras, pneumologistas e otorri- A tomografia computadorizada é o estudo pre-
nolaringologistas. Cerca de 0,5% a 5% das infec- ferencial para a avaliação dos seios paranasais,
ções das vias aéreas superiores evoluem para ri- porque revela melhor a relação entre os tecidos
Quadro 6 - Drogas utilizadas no tratamento da rinite alérgica Quadro 7 - Sinais e sintomas de rinossinusite
Prurido/ Secreção Bloqueio Olfato Congestão e obstrução nasal
espirro alterado Secreção purulenta nasal e em rinofaringe
Cromoglicato de sódio + + + - Tosse diurna e/ou noturna
Anti-histamínicos orais +++ ++ + - Dor e pressão facial
Brometo de ipratrópio - +++ - - Cefaléia
Descongestionantes tópicos - - +++ - Irritação na garganta
Corticosteróides tópicos +++ +++ ++ + Halitose
Corticosteróides orais +++ +++ +++ ++ Febre
Quadro 8 - Classificação da rinossinusite em adultos nusite são controlar a infecção, restaurar a venti-
e crianças lação normal das cavidades e a patência dos óstios
Aguda Duração dos sintomas até 4 semanas sinusais, melhorar a depuração mucociliar, e pro-
Subaguda Duração dos sintomas de 4 a 12 semanas mover a drenagem de secreções, evitando dessa
Crônica Duração dos sintomas por mais de 12 forma o dano tecidual.
semanas A microbiologia da rinossinusite aguda baseia-
Recorrente Mais de 4 episódios por ano, com se em cultura da secreção dos seios maxilares ou
duração de 7 a 10 dias e resolução em aspirados do meato médio, sendo similar na
completa nos intervalos
criança e no adulto. As bactérias isoladas com
Complicada Complicação local ou sistêmica em
qualquer fase mais freqüência são: Streptococcus pneumoniae ,
Haemophilus influenzae, Streptococcus viridans,
Moraxella catarrhalis e Staphylococcus aureus,
moles e as estruturas ósseas. sendo que aproximadamente 70% das rinossinusi-
Este método pode ser empregado para se ava- tes agudas são causadas pelos dois primeiros. En-
liar a extensão das complicações regionais ou in- tre os vírus, podem ser encontrados o Rhinovirus,
tracranianas da rinossinusite, na diferenciação en- Influenzae A e Parainfluenzae . Na rinossinusite
tre processos inflamatórios e neoplásicos. Prefe- crônica, o estudo bacteriológico mostra predomi-
rencialmente deve ser comparada com a tomogra- nância da flora mista e de anaeróbicos, devida à
fia computadorizada, porque não evidencia os li- menor concentração de oxigênio nos seios parana-
mites ósseos do complexo ostiomeatal. sais. Os germes mais comuns são: Staphylococcus
A etiopatogenia da rinossinusite é de natureza aureus, Haemophilus influenzae, Streptococcus
multifatorial e o reconhecimento dos fatores de ris- pneumoniae, Streptococcus alfa-hemolitico,
co é fundamental para o diagnóstico precoce e tra- Bacteroides, Veilonella e Corynebacterium. Os fun-
tamento adequado. Os principais fatores de risco gos são isolados de entre 3% e 10% das rinossinu-
encontram-se resumidos no Quadro 9. sites crônicas, sendo os mais comuns Aspergilus,
Os objetivos do tratamento clínico da rinossi- Candida albicans e Alternaria.
O principal agente etiológico das infecções de
vias aéreas é o S. pneumoniae. Logo, é de vital im-
Quadro 9 - Fatores de risco para rinossinusite
portância que se esteja a par da atividade dos dife-
• Infecção prévia nas vias aéreas superiores rentes antimicrobianos contra este microrganismo.
• Infecção por Streptococus do grupo A Estudos recentemente realizados sobre este patóge-
concomitante no demonstram uma resistência intermediária à pe-
• Rinite alérgica ou não alérgica nicilina em cerca de 20% das cepas e uma resistên-
• Poluentes cia elevada em aproximadamente 1% delas. Além
• Irritantes locais (abuso de vasoconstritores tópicos disso, estudos apontam um elevado nível de resis-
e cocaína) tência bacteriana à associação com cotrimoxasol e
• Infecções ou extrações dentárias aos macrolídeos.(122-126) No que se refere a outros
• Alterações hormonais germes, aproximadamente 10% das cepas de H.
• Fatores iatrogênicos (ventilação mecânica, tubos influenzae e mais de 90% das de M. Catarrhalis fo-
nasogástricos, tamponamento nasal, ram produtoras de β-lactamase .
procedimentos odontológicos) Tanto em adultos quanto em crianças os anti-
• Variações anatômicas (hipertrofia de adenóides e bióticos de primeira linha incluem amoxicilina ou
tonsilas, desvio de septo, pólipos nasais, fenda cotrimoxasol por sete a dez dias. Estes, entretanto,
palatina) não são eficazes contra a -lactamase produzida
• Natação pelo H. influenzae, S. aureus, M. catarrhalis e al-
• Imunodeficiência gumas bactérias aeróbicas. Se eles forem ineficazes,
• Distúrbios secretórios (fibrose cística) amoxicilina com clavulanato ou uma cefalosporina
• Síndrome do cílio imóvel de segunda geração, como o cefaclor ou a cefu-
• Broncectasias roxima, podem ser usadas durante sete a catorze
• Hipertrofia de tonsilas faríngeas dias. Também podem ser administrados macrolí-
deos como claritromicina e, em pacientes adultos, médico-social pela elevada e crescente incidência
as fluoroquinolonas, como levofloxacina, gatiflo- e por determinar sintomas de intensidade variável,
xacina e moxifloxacina. que se manifestam por tempo prolongado, podendo
Na escolha terapêutica deve ser considerada prejudicar consideravelmente a qualidade de vida
a ocorrência de episódios anteriores, tempo de do paciente. Tem prevalência estimada de 20% na
evolução do quadro clínico, gravidade da doença, população adulta dos EUA (128) e taxas similares na
história de doenças de base e as particularidades Europa.
locais de resistência bacteriana. No Brasil, em um estudo populacional empre-
Nas rinossinusites crônicas agudizadas ou nas endido em 22 metrópoles, em que se entrevistou
odontogênicas a antibioticoterapia costuma ser uma amostra populacional de 13.959 indivíduos,(129)
coadjuvante, de modo que devem ser utilizados observou-se que 4,6% dos entrevistados apresen-
regimes terapêuticos que possuam atividade con- tavam pirose uma vez por semana e que 7,3%
tra o S. aureus e os estafilococos coagulase-ne- apresentavam esta queixa duas ou mais vezes por
gativos, que são os germes aeróbios mais preva- semana. Em função destes dados, estima-se que a
lentes, associados a drogas anaerobicidas como prevalência da DRGE, em nosso meio, seja ao re-
a clindamicina ou o metronidazol. A duração do dor de 12%.
tratamento nunca deve ser inferior a 21 dias, e
depende de outras medidas terapêuticas, inclu- Prevalência do refluxo gastroesofágico como cau-
indo o tratamento cirúrgico. sa de tosse
Publicações(27, 130-134) que caracterizam tosse crô-
DOENÇA DO REFLUXO GASTRESOFÁGICO nica como decorrente do refluxo gastresofágico
(RGE), nos casos nos quais o tratamento específico
A doença do refluxo gastresofágico (DRGE), do refluxo elimina ou melhora a queixa de tosse,
considerada uma das afecções digestivas de maior consideram que o RGE representa uma das causas
prevalência nos países ocidentais,(127) tem sido bas- mais comuns de tosse crônica em adultos em todo
tante estudada. Merece destaque o grande número o mundo. A prevalência dessa condição nesses es-
de publicações existentes na literatura médica so- tudos varia de 5% a 41%. Alguns autores, em três
bre o tema. Contudo, há controvérsias em relação a publicações sobre o tema,(26-27, 43) apontaram em
vários aspectos relevantes da afecção. 1981 (26) que a prevalência de tosse crônica decor-
O Ι Consenso Brasileiro sobre a Doença do Re- rente de RGE era de 10% e que o refluxo repre-
fluxo Gastresofágico(127) definiu a doença como sentava a quarta causa mais freqüente de tosse
“afecção crônica decorrente do fluxo retrógrado crônica. Em 1990,(27) a prevalência observada foi
de parte do conteúdo gastroduodenal para o esô- de 21% e os autores passaram a considerar o re-
fago e/ou órgãos adjacentes, acarretando variável fluxo como a terceira causa mais comum de tosse
espectro de sintomas (esofágicos ou extra-esofá- crônica e, em 1998, (43) observaram prevalência de
gicos), associados ou não a lesões teciduais". Con- 36%, tendo sido considerado o refluxo como a
vém destacar três aspectos importantes na definição segunda causa mais comum de tosse crônica.
apresentada: admite-se a participação de compo- Entretanto, os critérios adotados para caracte-
nentes do refluxo duodenogástrico na fisiopato- rização da tosse como decorrente de refluxo são
genia da afecção e em função disso, propõe-se o bastante questionáveis, pois o fato de a tosse não
termo refluxo de conteúdo gastroduodenal (“não melhorar com o tratamento clínico do refluxo não
ácido") e não apenas de conteúdo gástrico (ácido); significa que a mesma não seja decorrente de re-
admite-se a existência de sintomas esofágicos e fluxo, uma vez que pode ser desencadeada por
extra-esofágicos (atípicos); destaca-se que os sin- refluxo “não ácido", que não é adequadamente
tomas podem ou não ser acompanhados por le- controlado pelo tratamento clínico.
sões teciduais esofágicas diagnosticadas pelo exame Deve-se considerar também que as duas con-
endoscópico (pode haver ou não esofagite). dições clínicas (tosse e RGE) são bastante comuns
na população em geral e que essas queixas po-
Prevalência da DRGE dem estar associadas sem necessariamente haver
A DRGE é uma afecção de grande importância relação de causa e efeito entre elas. (135-137)
rem predominantemente no período pós-prandial ses casos cogita-se mais precocemente a opção
(quando a acidez gástrica pode estar tamponada do tratamento cirúrgico do refluxo). Está indicada
pelos alimentos ingeridos) e durante o tratamento também para o diagnóstico de distúrbios motores
com drogas anti-secretoras, podem agora ser ade- específicos do esôfago, que podem alterar a orien-
quadamente analisadas. A possibilidade de estudo tação terapêutica (presença de acalasia, aperistalse
da relação existente entre as manifestações sinto- e hipocontratilidades muito acentuadas). Fornece
máticas do paciente e a presença de refluxo “não bom parâmetro da atividade motora no pré-opera-
ácido" pode ser de grande valor, sobretudo na tório de cirurgia anti-refluxo. Na presença de com-
avaliação dos sintomas em pacientes na vigência plicação disfágica, no pós-operatório de fundopli-
de drogas anti-secretoras. catura, a avaliação manométrica do esôfago tem
A associação de pH e impedância também tem mais chance de poder auxiliar no esclarecimento
se mostrado útil para auxiliar na indicação cirúr- da causa da disfagia nos pacientes submetidos a
gica de alguns casos. Alguns autores,(150) avaliando manometria pré-operatória (a manometria prévia
treze pacientes com sintomas persistentes apesar fornece bom parâmetro referencial, aumentando a
do uso de IBP em dose dupla, observaram que chance de esclarecimento diagnóstico da causa da
sete apresentavam sintomas relacionados com re- disfagia). A manometria esofágica é útil na identifi-
fluxo: um deles com refluxo ácido e seis com re- cação da localização dos esfíncteres do esôfago,
fluxo “não ácido". Isto significa que a maioria (6/7) para posicionamento adequado dos sensores de pH-
dos pacientes apresentava sintomas persistentes metria (para este fim, não é necessário estudo ma-
devidos a refluxo “não ácido", ou seja, não detec- nométrico completo do esôfago; realiza-se estudo
tados pela pHmetria convencional. Dez pacientes sumário, apenas para identificação dos esfíncteres).
foram submetidos a fundoplicatura e reavaliados, Entretanto, a manometria esofágica não avalia
notando-se desaparecimento de sintomas e de re- a real capacidade de transporte do bolus ingerido.
fluxo. Isto indica que, diferentemente do trata- Há alterações manométricas (pressóricas) que com-
mento com anti-secretores, o tratamento cirúrgico prometem bastante a função esofágica de trans-
pode eliminar também o refluxo “não ácido". porte do bolus ingerido (ex. acalasia, acometimento
A seguir, são apresentados outros métodos diag- importante do esôfago por colagenoses e espasmo
nósticos que, apesar de não se prestarem para o difuso do esôfago). Por outro lado, há alterações
diagnóstico da DRGE em si, têm utilidade na prá- evidenciadas pelo exame manométrico que não
tica clínica. comprometem substancialmente o transporte do
bolus (nutcraker esophagus, hipocontratilidades
Estudo radiológico contrastado do esôfago: O pouco acentuadas do corpo esofágico, etc).(152)
estudo radiológico contrastado do esôfago propi-
cia boa avaliação morfológica do órgão (forma do Estratégia de abordagem do paciente com tosse
esôfago e características do trânsito da substância crônica e suspeita de RGE
de contraste), e pode evidenciar complicações da Apesar de os últimos consensos, europeu(53) e
DRGE (estenoses e ulcerações) e condições favore- norte-americano,(146) recomendarem o tratamento
cedoras do refluxo (hérnia hiatal e ângulo esôfago- empírico do RGE em todos os casos mostrados no
gástrico anormal). Não identifica, porém, esofagite Quadro 10, há contestação atual em relação à efi-
(apenas eventuais complicações da mesma) e não ciência dessa conduta. Alguns autores,(153) em uma
caracteriza adequadamente o RGE. revisão sistemática de literatura sobre o tema, con-
cluem que “o uso de IBP no tratamento da tosse
Manometria esofágica: A manometria esofágica crônica associada à DRGE tem efeitos benéficos
avalia o tônus pressórico dos esfíncteres do esôfa- em alguns adultos. Contudo, inferiores aos suge-
go e a atividade motora do corpo esofágico.(151) ridos nos últimos consensos sobre tosse e que “os
Ela fornece bom parâmetro preditivo de evolução resultados de tal tratamento são inconsistentes e
da doença (casos com hipotonia muito acentuada de benefício variável". Outros(154) referem que ape-
do esfíncter inferior do esôfago freqüentemente nas 35% dos pacientes com tosse crônica e refluxo
necessitam de tratamento medicamentoso continua- patológico à pHmetria esofágica respondem bem
do, para controle adequado dos sintomas, e nes- ao uso de IBP.
Por outro lado, o tratamento empírico do re- que o melhor método diagnóstico do refluxo é a
fluxo é justificado por um estudo retrospectivo,(154) impedâncio-pHmetria esofágica, que consegue
no qual foi considerado que o RGE era causa de caracterizar a presença de refluxos ácido e “não
tosse em 44 dentre 56 pacientes com tosse estu- ácido".
dados (79%), pelo fato de haver melhora da queixa A revisão sistemática da literatura sobre tosse
com o uso de IBP. Na estratégia de abordagem decorrente de refluxo publicada em janeiro de
que emprega o tratamento empírico do refluxo, 2006(146) reconhece a importância da impedâncio-
recomenda-se a realização de investigação diag- pHmetria, mas a coloca como perspectiva futura e
nóstica específica (pHmetria esofágica prolongada) sugere o estudo radiológico contrastado do esôfa-
nos casos que não apresentam melhora significa- go nos casos nos quais a pHmetria convencional
tiva com o tratamento. A pHmetria indicada nesta não consegue caracterizar refluxo patológico. Po-
situação tem por objetivo avaliar se as medidas rém, a nosso ver, esta proposta, apesar de prática
em uso estão sendo suficientes para controlar o e pouco dispendiosa, deve ser considerada com
RGE. Porém, há de se destacar que o exame conse- bastante crítica, pois o estudo radiológico do esô-
gue avaliar apenas a ocorrência de refluxo ácido fago promove apenas avaliação momentânea do
gastresofágico, não conseguindo caracterizar a refluxo, tendo sensibilidade diagnóstica bastante
presença de refluxo “não ácido". Convém salientar reduzida, e a impedâncio-pHmetria esofágica não
que, para a realização do tratamento empírico, é apenas uma perspectiva futura, mas sim um mé-
recomendam-se medidas comportamentais e die- todo disponível em vários centros de referência de
téticas e o uso de IBP, em dose dupla, por dois a estudo do RGE, inclusive em nosso meio.
três meses. Tanto o consenso europeu quanto a recente re-
Em nenhuma das publicações sobre tosse crôni- visão de 2006 reforçam que não se deve descartar a
ca e refluxo consultadas para a elaboração deste DRGE como causa de tosse crônica nos casos que
capítulo se esclarece que a pHmetria executada não respondem bem ao tratamento empírico do re-
para controle do tratamento empírico é realizada fluxo. O insucesso do tratamento tem duas princi-
de modo diferente da utilizada para o diagnóstico pais causas: a tosse pode ser decorrente de refluxo
do RGE, que não esteja na vigência de tratamento. “não ácido" gastresofágico, que não é adequada-
Quando queremos avaliar a real ocorrência de re- mente bloqueado pelo tratamento clínico; e a tosse
fluxo ácido gastresofágico, realizamos a monitori- pode ser decorrente de refluxo ácido que não está
zação pHmétrica estimulando o paciente a manter adequadamente controlado pelas medidas clínicas
suas atividades cotidianas, ingerir alimentos com adotadas (resistência ao anti-secretor utilizado).
os quais costuma ter queixas de refluxo e suspender Um aspecto importante a ser considerado é que
qualquer medicação anti-secretora por, pelo me- os IBP controlam adequadamente os sintomas ácido
nos, uma semana antes da realização do exame. dependentes da DRGE, porém, não têm efeito
Para realização da pHmetria com objetivo de con- adequado no controle de sintomas que são decorren-
trole de tratamento, recomenda-se que o exame seja tes da presença física do refluxo (independentes da
feito na vigência das medidas terapêuticas e que seja acidez do mesmo). Alguns autores,(156) avaliando por
utilizado, além dos sensores esofágicos (para avalia- meio de impedâncio-pHmetria esofágica a eficiên-
ção de refluxo ácido gastresofágico e de refluxo áci- cia do omeprazol no controle do RGE, observaram
do supraesofágico), um sensor de pH posicionado que o uso do fármaco não reduzia significativa-
no interior da câmara gástrica, para avaliar se a aci- mente o número de episódios de refluxo mas sim
dez gástrica está devidamente bloqueada. alterava sua acidez (continuava havendo o mesmo
Convém comentar que o Consenso Europeu faz número de refluxos, contudo eles tornavam-se
uma afirmação inadequada ao recomendar a pH- “não ácidos"). Portanto, espera-se melhora clínica
metria esofágica como o melhor teste diagnóstico com o uso da droga apenas dos sintomas ácido
do RGE. Atualmente, considera-se que o método dependentes, o que explica a manutenção da quei-
seja, realmente, o melhor para caracterização do xa dos sintomas “não ácido" dependentes.
refluxo ácido gastresofágico. Contudo, são reco- Alguns autores,(147) estudando pacientes que per-
nhecidas as suas limitações na caracterização do maneciam sintomáticos apesar do uso de IBP, por
refluxo “não ácido". Em função disso, pode-se dizer meio de impedâncio-pHmetria, observaram que 28%
deles apresentavam sintomas relacionados com re- da utilização das medidas comportamentais. Ain-
fluxo ácido (detectável por pHmetria convencional). da assim, a experiência clínica tem sugerido forte-
Contudo, 40% deles apresentavam sintomas relacio- mente a sua utilização (recomendação nível C).
nados com refluxo “não ácido" (detectável pela Quanto às medidas farmacológicas, os IBP ali-
impedâncio-pHmetria). Os autores descrevem que viam os sintomas do refluxo e cicatrizam a esofa-
nos 32% restantes, os sintomas não foram relacio- gite mais rapidamente que os antagonistas H2 (AH2),
nados com refluxo (ácido e “não ácido"). conforme mostrado em duas revisões sistemáti-
Com a melhor caracterização do RGE, pode-se cas.(158-159) São apresentadas no Quadro 12 as do-
orientar, de modo mais adequado, as alternativas ses plenas diárias dessas drogas.
terapêuticas. O tratamento clínico é bem indicado Contudo, apesar da eficiência dos IBP, como já
nos casos nos quais a tosse seja decorrente de destacado, existem casos que não têm boa respos-
refluxo ácido. Contudo, para os casos de tosse ta à droga. Há tendência em se tratar os pacientes
decorrentes de refluxo “não ácido" ou de aspira- com diagnóstico de esofagite com IBP, em dose
ção grosseira para as vias respiratórias do material plena, por seis a doze semanas. Alguns autores(160-161)
refluído, a opção de correção cirúrgica do refluxo propõem administração de dose dobrada para as
deve ser fortemente considerada.(157) esofagites de maior gravidade (graus ΙΙΙ e ΙV de
Savary-Miller ou C e D de Los Angeles).
Tratamento Um estudo baseado em revisão sistemática da
O tratamento visa ao alívio dos sintomas, à ci- literatura com meta-análise,(162) avaliando a eficiên-
catrização das lesões e à prevenção de recidivas e cia de IBP e AH2 em adultos com sintomas típicos da
complicações. Do ponto de vista prático, objetiva- DRGE sem esofagite ao estudo endoscópico, con-
se reduzir o potencial agressivo do conteúdo gás- cluiu que: “os agentes anti-secretores são eficientes
trico, minimizando a agressão representada pelo no controle da queixa clínica desses pacientes e os
ácido clorídrico do suco gástrico.(139) IBP apresentam resultados melhores que os AH2".
Pode-se classificar a abordagem terapêutica em Alguns novos IBP (lansoprazol, rabeprazol e
medidas comportamentais e farmacológicas, que de- pantoprazol) têm eficiência semelhante ao omepra-
verão ser implementadas simultaneamente. As me- zol no controle da pirose, na taxa de cicatrização
didas comportamentais acham-se apresentadas no de esofagite e no controle da recidiva. Um estudo
Quadro 11. baseado em revisão sistemática da literatura,(163)
Em nosso conhecimento, não existem estudos avaliando a eficiência desses novos IBP em com-
suportados por evidências de acordo com os cri- paração com omeprazol, ranitidina e placebo, na
térios de Medicina baseada em evidências em favor cicatrização e melhora dos sintomas decorrentes
de DRGE, concluiu que: “alguns novos IBP têm
Quadro 11 - Medidas comportamentais no tratamento eficácia similar ao omeprazol em termos de con-
da doença do refluxo gastresofágico trole da pirose, taxas de cicatrização e de recidiva
• Elevação da cabeceira da cama (15 cm) dos sintomas. Os IBP foram melhores que a raniti-
• Moderar a ingestão dos seguintes alimentos, na dina e o placebo na cicatrização da esofagite".
dependência da correlação com os sintomas: A história natural da DRGE ainda não é bem
gordurosos, cítricos, café, bebidas alcoólicas, compreendida. De fato, embora os sintomas sejam
bebidas gasosas, menta, hortelã, produtos de crônicos, e muitas vezes recorrentes, usualmente
tomate, chocolate
• Cuidados especiais para medicamentos
potencialmente "de risco": anticolinérgicos, Quadro 12 - Inibidores da bomba protônica e doses
teofilina, antidepressivos tricíclicos, bloqueadores plenas diárias
de canais de cálcio, agonistas beta adrenégicos, IBP Dose plena diária
alendronato Omeprazol 40 mg
• Evitar deitar-se nas duas horas seguintes às Lansoprazol 30 mg
refeições Pantoprazol 40 mg
• Evitar refeições copiosas Rabeprazol 20 mg
• Redução drástica ou cessação do fumo Esomeprazol 40 mg
• Reduzir o peso corporal (emagrecimento) IBP: inibidor da bomba protônica.
a esofagite não progride com o passar do tempo. pação do RGE no desencadeamento dos sintomas.
Assim, apenas pequena proporção (menos de 15% O que se observa na prática é que a grande maioria
dos pacientes sem esofagite ou com esofagite leve) dos pacientes tem boa resposta às medidas clínicas
progride para graus mais avançados da doença.(164) usualmente empregadas. Entretanto, parte signifi-
Vale salientar que cerca de 80% dos pacientes com cativa dos enfermos (cerca de 50%) tem necessi-
DRGE apresentam recidiva dos sintomas nos seis dade de manutenção de tratamento clínico pro-
primeiros meses de interrupção do tratamento longado (comportamental e/ou medicamentoso)
medicamentoso.(165-166) Nos casos nos quais é reque- para se manterem assintomáticos.(168)
rido o tratamento de manutenção, este deve ser Atualmente, o ponto crucial da indicação do
feito com IBP, empregando-se a dose mínima efi- tratamento cirúrgico é a tolerância do paciente ao
caz para controle dos sintomas. tratamento clínico prolongado. Alguns pacientes
Outro estudo baseado em revisão sistemática preferem manter restrições comportamentais e, fre-
da literatura,(167) avaliando a eficiência de IBP, AH2, qüentemente, o uso de medicamentos, a serem
procinéticos, sucralfato e placebo em adultos com operados. Outros preferem o contrário. Cabe ao
DRGE (com e sem esofagite) concluiu que os IBP médico apresentar ao paciente, com imparcialida-
são mais eficientes que as demais drogas, contudo, de, as opções terapêuticas (clínica prolongada e
apresentam ocorrência de efeitos colaterais maior cirúrgica) ponderando vantagens e desvantagens
que o placebo e maior ocorrência de cefaléia que e compartilhar com o mesmo a decisão da moda-
a observada com os AH2. Os AH 2 previnem recor- lidade de tratamento a ser utilizada.
rência de sintomas melhor que o placebo, o que Um estudo baseado em revisão sistemática de
justifica seu uso em pacientes com intolerância literatura,(169) comparando a eficácia dos tratamen-
aos IBP. Tanto os procinéticos quanto o sucralfato tos clínico e cirúrgico da DRGE crônica, concluiu
mostraram benefícios em relação ao placebo. que: “o tratamento cirúrgico é mais eficaz que o
O grande problema do tratamento clínico da tratamento clínico em relação à melhora dos sin-
DRGE não é controlar os sintomas, mas sim manter tomas e cicatrização da esofagite. Contudo, os IBP
os pacientes assintomáticos em longo prazo. Frente podem proporcionar melhora dos sintomas com-
ao paciente que necessita de tratamento farmaco- parável ao tratamento cirúrgico, se forem utiliza-
lógico continuado para manter-se bem, devemos das doses ajustadas da medicação". Ou seja, au-
cogitar e apresentar a alternativa do tratamento menta-se a dose até conseguir bloqueio adequado
cirúrgico. Na decisão da indicação do tratamento da secreção ácida do estômago, avaliada por pH-
cirúrgico pesam vários fatores, como idade e con- metria esofágica prolongada. Vale destacar que,
dições clínicas do paciente, tipo de droga neces- apesar de esta consideração ser válida para o con-
sária para mantê-lo assintomático e análise das li- trole das queixas clínicas ácido dependentes do
mitações impostas em relação à qualidade de vida refluxo, pode não o ser para o controle das queixas
do paciente submetido ao tratamento clínico por “não ácido" dependentes.
longo prazo.
Um aspecto importante a ser reforçado é que, Indicações do tratamento cirúrgico
como já destacado, os IBP controlam adequadamente O tratamento cirúrgico está indicado na intole-
apenas os sintomas ácido dependentes da DRGE. rância ao controle clínico prolongado. Considerar
que os pacientes nos quais se observam melhores
Tratamento cirúrgico resultados funcionais do tratamento cirúrgico são
Por muito tempo, preconizou-se que o trata- os que tiveram boa resposta ao tratamento clínico,
mento cirúrgico da DRGE estaria indicado nos ca- mas que se tornaram dependentes do mesmo para
sos de “intratabilidade clínica" e nas formas com- manterem-se assintomáticos.
plicadas da doença. Com o significativo aumento Está indicado também nas formas complicadas
da eficiência das drogas usadas no tratamento clí- da doença (esôfago de Barrett, ulceração, estenose).
nico da afecção, pode-se dizer que, atualmente, é Apesar de a indicação do tratamento cirúrgico nas
mais rara a observação de “intratabilidade clínica", formas complicadas da DRGE ser menos polêmica
devendo os pacientes nesta situação ser meticu- do que nas formas não complicadas, não se deve
losamente estudados para conferir a real partici- indicar a terapêutica cirúrgica simplesmente pela
mesmo hemoptise. A tosse não tem horário prefe- dos estudos são: tosse variante de asma (definida
rencial e o tempo do sintoma depende do tempo como tosse persistente, não produtiva, sem sibi-
de adoecimento. Os sintomas sistêmicos, além de lância ou com um mínimo de sibilância ou disp-
febre (classicamente vespertina), surgem com a néia), refluxo gastresofágico e sinusite. Ainda não
evolução da doença.(191-192) se sabe se os lactentes e as crianças apresentam
Nos doentes com expectoração espontânea de- essas enfermidades, na mesma proporção dos adul-
vemos solicitar a baciloscopia direta (pesquisa de tos, como etiologia de tosse crônica. Atualmente
bacilo álcool-ácido resistente) em três amostras de alguns trabalhos têm mostrado evidências de que
escarro, em jejum, em dias seguidos. Havendo dis- as crianças com tosse crônica devem ser melhor
ponibilidade de cultura para micobactérias, esta deve investigadas e que a tosse variante de asma pode
ser também solicitada. A baciloscopia positiva em não ser a mesma enfermidade que observamos nos
duas ou mais amostras ou a cultura positiva atestam indivíduos adultos, principalmente quando são
como caso de tuberculose pulmonar positiva. O ren- analisadas as características epidemiológicas e de
dimento da baciloscopia é de 50% a 80% dos casos. lavado broncoalveolar.(193-194) Assim, crianças com tos-
A pesquisa bacteriológica é método prioritário quer se crônica bem como os lactentes chiadores devem
para o diagnóstico quer para o controle de trata- ter vários fenótipos que necessitam ser avaliados e
mento, além de permitir identificar a fonte de trans- entendidos dentro do diagnóstico diferencial. Além
missão da infecção, o bacilífero.(190) de numerosos fenótipos, a tosse crônica pode ser
O escarro induzido e a broncofibroscopia estão decorrente de associação de duas ou mais doenças
reservados para os casos de baciloscopia negativa. e por isto a história clínica e o exame físico são
Dá-se prioridade, inicialmente, ao escarro induzido fundamentais para o esclarecimento diagnóstico e
quando houver disponibilidade do exame. Nestes das associações diagnósticas, como acontece na
casos, além da baciloscopia direta deve ser solici- asma e refluxo gastresofágico, asma e sinusite,
tada a cultura para micobactérias.(187-189) asma e helmintíases, asma e infecções virais, tu-
Técnicas de biologia molecular, como a reação berculose e pneumonia bacteriana, etc.
em cadeia da polimerase, têm elevada sensibilidade Atualmente, acumulam-se evidências de que a
e especificidade em amostras com baciloscopia tosse crônica em crianças que não está associada a
positivas, porém seu rendimento diagnóstico é in- sibilância pode ter como etiologia fatores poluen-
ferior nas amostras com baciloscopia negativa. tes intra e extradomiciliares (tabagismo dos pais,
Recomenda-se que a técnica da reação em cadeia partículas derivadas da combustão do diesel, fre-
da polimerase não deva ser utilizada na rotina diag- qüência a creches, exposição a inseticidas, material
nóstica da tuberculose pulmonar com escarro ne- particulado no ar, animais no domicílio, etc). Outro
gativo na baciloscopia.(187) aspecto importante a ser considerado em escola-
A prova tuberculínica faz parte da abordagem res, e principalmente em adolescentes, é a tosse
diagnóstica e está indicada como método de tria- seca crônica de origem psicogênica. Ao contrário
gem ou para o diagnóstico de tuberculose.(187-188) das outras, ela melhora muito com o sono. Apesar
O estudo radiológico convencional é método de se conhecer as causas mais freqüentes de tosse
auxiliar e sempre indicado para os sintomáticos, crônica ela não deve ser tratada de forma presuntiva
contactantes e infectados pelo vírus da imunode- ou com um diagnóstico provável.
ficiência humana.(187) A tosse crônica com radiografia de tórax normal
A tomografia computadorizada do tórax justi- constitui um desafio para o médico. Deve-se dar im-
fica-se apenas em situações nas quais o radiograma portância às características da tosse, ritmo diário, época
de tórax suscita dúvidas em relação à localização e condições de início, e sinais e sintomas associados
e aspecto da lesão parenquimatosa.(187, 190) (Quadro 13). Os Quadros 14 e 15 apresentam resulta-
dos de estudos sobre a etiologia da tosse crônica.
TOSSE CRÔNICA EM CRIANÇAS
Tratamento da tosse
As três entidades mais freqüentemente associa- Se a história, exame físico e a radiografia de tó-
das à tosse crônica, recidivante ou persistente, em rax fornecem subsídios efetivos e suficientes para o
adolescentes, adultos e idosos, segundo a maioria diagnóstico etiológico, deve-se realizar o tratamento
Quadro 15 - Etiologia da tosse crônica em lactentes, crianças e adolescentes. Modificado de Holinger, LD, 1991 e de
Cloutier, MM, 1994
Asma Tosse variante de asma
Infecciosa Rinossinusite, adenoidite, coqueluche, tuberculose, infecção por adenovírus, vírus sincicial
respiratório, citomegalovírus, vírus da imunodeficiência humana, bronquite crônica,
infecções por parasitas intestinais (síndrome de Löefler), Clamydia tracomatis
Congênita Anéis vasculares, anomalias do trato digestivo: duplicações, agenesias, cistos, cistos
(estreitamento broncogênicos, estenose subglótica, traqueomalácea, estenose de brônquio e de traquéia
das vias aéreas)
Congênita Refluxo gastresofágico, não coordenação da deglutição, fístula traqueoesofágica,
(aspirativas) cleft laríngeo, paralisia de corda vocal, acalasia
Congênita Anormalidades da árvore traqueobrônquica, fibrose cística, discinesia ciliar primária,
(outras) cardiopatias congênitas, displasia bronco pulmonar
Psicogênica Tosse psicogênica (melhora com o sono)
Ambiental Fumaça de cigarro, poluição intra e extradomiciliar, baixa umidade do ar, inseticidas, frio
Traumática Corpo estranho em: traquéia, brônquio, canal auditivo externo, nariz, laringe
Otológica Cerume ou pêlo no canal auditivo externo, infecção, neoplasia
Neoplásica Tumores de mediastino causando compressão brônquica, papilomatose recidivante, adenoma brônquico
Outras Insuficiência cardíaca congestiva, cardiopatias
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