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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS – CAMPUS V

Programa de Pós-Graduação em História Regional e Local

Moisés Leal Morais

Urbanização, trabalhadores e seus interlocutores no Legislativo Municipal:


Alagoinhas – Bahia, 1948-1964

Santo Antonio de Jesus - Bahia


Abril / 2011
Moisés Leal Morais

Urbanização, trabalhadores e seus interlocutores no Legislativo Municipal:


Alagoinhas – Bahia, 1948-1964

Dissertação apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em
História Regional e Local da
Universidade do Estado da Bahia -
UNEB – Campus V, Santo Antonio
de Jesus, Bahia, sob a orientação da
Professora Dra. Maria das Graças de
Andrade Leal, como requisito para
obtenção do título de Mestre.

Santo Antonio de Jesus - Bahia


Abril / 2011
Morais, Moisés Leal
Urbanização, trabalhadores e seus interlocutores no Legislativo Municipal: Alagoinhas –
Bahia, 1948- 1964 . / Moisés Leal Morais. – Santo Antonio de Jesus, 2011.
137f.

Orientadora: Profª Drª Maria das Graças de Andrade Leal.


Dissertação (Mestrado) - Universidade do Estado da Bahia , Departamento de Ciências
Humanas . Campus V. 2011.
Contém referências

1. Urbanização. 2. Trabalhadores . 3. Democracia . .4 . Urbanismo – Alagoinhas (BA). I.


Leal,Maria das Graças de Andrade. II. Universidade do Estado da Bahia, Departamento de
Ciências Humanas . Campus V.

CDD: 307.76
Urbanização, trabalhadores e seus interlocutores no Legislativo Municipal:
Alagoinhas – Bahia, 1948-1964

Moisés Leal Morais

Banca Examinadora

____________________________________________
Profª. Drª. Maria das Graças de Andrade Leal (Orientadora)
Universidade do Estado da Bahia (UNEB)

_____________________________________________
Profº. Dr. Raimundo Nonato Pereira Moreira (Presidente da Banca)
Universidade do Estado da Bahia (UNEB)

_____________________________________________
Profº. Dr. Paulo Santos Silva
Universidade do Estado da Bahia (UNEB)

_____________________________________________
Profº. Dr. Cristiano de Lima Ferraz
Universidade do Sudoeste da Bahia (UESB)
Abreviaturas

ACMA – Arquivo da Câmara Municipal de Alagoinhas


APJR – Arquivo Particular de Joanito Rocha
APMA – Arquivo da Prefeitura Municipal de Alagoinhas
APSA – Arquivo da Paróquia Santo Antonio
APWC – Arquivo Particular de Walter Campos
ARENA – Aliança Renovadora Nacional
ATRE – Arquivo do Tribunal Regional Eleitoral
BPEB – Biblioteca Pública do Estado da Bahia
BSEI – Biblioteca da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia
FIGAM – Fundação Iraci Gama
IAPI - Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
PCB – Partido Comunista do Brasil
PDC – Partido Democrata Cristão
PR – Partido Republicano
PRP – Partido da Representação Popular
PRT – Partido Republicano Trabalhista
PSD – Partido Social Democrata
PSP – Partido Social Progressista
PTB – Partido Trabalhista Brasileiro
PTN – Partido Trabalhista Nacional
SAPS – Serviço de Alimentação e Previdência Social
SESI - Serviço Social da Indústria
UDN – União Democrática Nacional
ULA – Usina de Laticínios Alagoinhas
VFFLB – Viação Férrea Federal Leste Brasileiro
Resumo

Alagoinhas, entre as décadas de 1940 e 1960, assistiu a um significativo aumento no


contingente populacional. A sua população quase que dobrou nesse período, quando também
era vivenciado um processo de desenvolvimento urbano. Durante essas décadas se
processaram no Brasil mudanças no âmbito da sua organização política. Entre 1945 e 1964, o
país viveu sob um período constitucional, marcando o intervalo entre dois regimes ditatoriais:
o Estado Novo e a Ditadura Militar. Houve o retorno das eleições diretas e da liberdade de
organização partidária, a reabertura das Casas Legislativas e a ampliação da participação
política das camadas empobrecidas da sociedade brasileira, principalmente através do voto.
Desse modo, este estudo, além de buscar compreender a dinâmica do processo de urbanização
em curso em Alagoinhas no referido período, visa discutir a emergência e a atuação de
interlocutores dos trabalhadores (ferroviários, operários em curtumes, comerciários e
servidores municipais) junto ao Estado, que tiveram lugar nesse contexto. O enfoque da
análise é o Legislativo Municipal de Alagoinhas sob uma ordem constitucional (1948-1964),
uma vez que se percebe neste momento a eleição de vereadores, alguns deles operários, que
atuaram como mediadores em determinadas demandas envolvendo os trabalhadores e o poder
público.
Palavras-chave: urbanização – trabalhadores – democracia representativa – Alagoinhas

Abstract

Alagoinhas, between the 40’s and 60’s, attended a significant increment in its populational
contingent. Its population almost doubled in that period when it was also experienced a
process of urban development. During these decades took place in Brazil changes in its
political organization. Between 1945 and 1964 the country lived under a constitutional
regime, marking the interval between two dictatorships: the New State and the Military
Dictatorship. There was the return of direct elections and freedom of party organization, the
reopening of the Legislative Houses and broadening political participation of the poor classes
of Brazilian society, especially by voting. In this way, beyond searching to understand the
dynamics of the process of urbanization in course in Alagoinhas in the related period, aims to
discuss the emergence and role of partners of employees (railroad workers, in tanneries,
commercial and municipal employees) with the State, which took place in this context.
The focus of the analysis will be done on the Municipal Legislative Alagoinhas under a
constitutional system (1948-1964), once you realize this time the election of aldermen, come
workers who acted as mediators between certain workers' demands and government.
Keywords: Urbanization - workers - representative democracy - Alagoinhas
Agradecimentos

Ao longo do percurso me encontrei com várias pessoas que, de diferentes maneiras,


colaboraram para que essa dissertação se materializasse. Aproveito aqui para registrar a minha
gratidão a todas elas.
Gostaria de agradecer aos meus familiares pelo constante e imprescindível apoio que
pude contar durante toda jornada.
À professora Maria das Graças de Andrade Leal pela competência no exercício de
orientação que em muito contribuiu para o desenvolvimento da pesquisa e da redação desta
dissertação. Aos professores Cristiano Ferraz (UESB) e Paulo Santos Silva (UNEB) pelas
preciosas observações que dirigiram no Exame de Qualificação, importantes que foram para
o aprimoramento de determinadas questões no trabalho. Às professoras Suzana Severs, Ana
Maria Oliveira e Sara Farias, além do professor Raimundo Nonato Moreira, pelas
contribuições através das disciplinas que ministraram no Mestrado. Elas foram essenciais para
aprofundar algumas reflexões e ampliar os horizontes da pesquisa.
À família Almeida, na cidade de Conceição do Almeida, pela afeição e hospitalidade de
sempre. O meu agradecimento para Seu Wando, Dona Penha, Fernanda, Fabiana e Rafael.
A Ane, Consuelo e Wilma, na Secretaria Acadêmica do Mestrado, pela imensa gentileza
e disposição em ajudar.
Aos atendentes e coordenadores dos arquivos e bibliotecas por onde caminhei nos
últimos anos, pela atenção, especialmente Ângela e Conceição no Arquivo da Prefeitura
Municipal de Alagoinhas; Domingos, Epaminondas e Nei no Arquivo da Câmara Municipal
de Alagoinhas; professora Iraci Gama e Ede Soares na Fundação Iraci Gama; ao Padre Pedro,
Andréa e Dona Zenaide no Arquivo da Paróquia Santo Antonio; e Lázaro Zacaríades no
arquivo da agência do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística sediada em Alagoinhas.
A Maria Eurivaldina (Dina) pela fundamental mediação para que se tornasse possível o
contato com o Arquivo Pessoal do Sr. Walter Campos e o exame da sua coleção do
Alagoinhas Jornal. Igualmente aos senhores Hostílio Dias e Hildebrando Dias pelas pistas
que me fizeram chegar até o Sr. Joanito Rocha, na cidade de Ipiaú, onde reside e ainda
preserva uma coleção do jornal O Nordeste, periódico que foi editado em Alagoinhas entre
1948 e 1956. Agradeço também ao amigo Albione Souza pela recepção em Ipiáu e por ter
tornado muito mais fácil do que eu podia imaginar o meu encontro com o Sr. Joanito Rocha e
a consequente coleta de uma documentação que foi de grande importância para a pesquisa.
A Carlos Nássaro, as conversas que compartilhamos, certamente contribuíram para o
amadurecimento de algumas reflexões acerca da história de Alagoinhas.
A Erahsto Felício pela cuidadosa leitura e inestimáveis críticas que teceu ao texto. À
Lécia Pena pela leitura desde os primeiros rabiscos e sugestões que apontou. A Salatiel
Morais pelo trabalho de tradução e Samuel Morais pelo auxilio no tratamento das ilustrações.
Aos colegas da graduação, e em especial com os quais ainda mantenho um fecundo
contato: Cristopher Moura, Jairo Ramos, Jorge Emanuel, Márcio Cruz, Maurício de Jesus,
Rafael Almeida, Ricardo Sizílio, Rogério França e Vagner Santos. Aos colegas que encontrei,
também, na Pós-Graduação de quem pude desfrutar da companhia e compartilhar das
discussões durante o cumprimento dos créditos: Alex Brandão, Antonio Nascimento, Ednair
Rocha, Gabriela Nogueira, Gilson de Jesus, Fátima Fernandes, Carolina Almeida, Lielva
Aguiar, Maria Regina Xavier, Marilva Cavalcanti, Mayra Caldas, Melina Bittencourt, Oscar
Santana, Priscila da Glória, Wadson Calazans e Wilma Souza. Igualmente aos mestrandos da
turma 2010.1 com quem foi oportuno cursar a disciplina História e região: Adriana Silva,
Álvaro Leal, Eliana Batista, Jairo Rios Junior, Jaqueline Gomes, Luiz Melo e Marcos
Gonçalves.
À professora Elisa Lemos, coordenadora do tirocínio docente, exemplo de
responsabilidade para com a prática docente. E também à turma do VI Semestre do curso de
Licenciatura em História da Uneb (Campus II/Alagoinhas) pelo acolhimento e rico
aprendizado que me proporcionou durante a realização do referido tirocínio.
Lista de Imagens

Imagem 1: Mapa onde são destacadas as zonas de influência comercial do estado da Bahia
que eram presididas, em 1959, por Alagoinhas, Feira de Santana e Nazaré, p.10.
Imagem 2: Ocupação da área urbana de Alagoinhas com a chegada da ferrovia em 1863,
p.38.
Imagem 3: Consolidação da ocupação urbana de Alagoinhas, a partir do entorno da estrada
de ferro, p.38.
Imagem 4: Área ocupada da cidade de Alagoinhas, após o início da exploração de petróleo,
em 1959, até a metade da década de 1970, p.38.
Imagem 5: Foto do Vereador Almiro de Carvalho Conceição, p.47.
Imagem 6: Mapa Hipsométrico da cidade de Alagoinhas, 1978, p.53.
Imagem 7: Foto do Vereador Hildebrando Dias, p.61.
Imagem 8: Foto do Vereador Eurico Costa, p.65.
Imagem 9: Foto do Vereador Romualdo Campos, p.68.
Imagem 10: Foto do Vereador José de Araujo Batista, p.80.
Imagem 11: Foto do Vereador João Nou, p.81.
Imagem 12: Foto do Vereador Hostílio Dias, p.82.
Lista de Tabelas

Tabela 1 – Tamanho populacional, p.11.


Tabela 2 –Tamanho econômico, p.13.
Tabela 3 – Grau de urbanização, p.15.
Tabela 4 – Qualidade de vida, p.16.
Tabela 5 – Centralidade, p.20.
Tabela 6 – Número e gênero dos estabelecimentos da indústria de transformação em
Alagoinhas (1959), p.25.
Tabela 7 - Número de casamentos realizados na Paróquia de Santo Antonio em Alagoinhas
(1940-1959), p.33.
Tabela 8 – Resultado da eleição presidencial de 1955 em Alagoinhas, p.87.
Tabela 9 - Resultado da eleição presidencial de 1960 em Alagoinhas, p.119.
Gráfico 1 – Migrantes casados na Paróquia Santo Antonio em Alagoinhas (1940-59), p.34.
Sumário

Introdução 1

Capítulo I – A região de Alagoinhas e a dinâmica urbana e populacional 8

1. A região de Alagoinhas 8
2. A cidade de Alagoinhas 21
3. Dinâmica populacional e urbana em Alagoinhas 31

Capítulo II – A “redemocratização” e os interlocutores dos trabalhadores no Legislativo


Municipal de Alagoinhas (1948-1954) 41

1. A primeira legislatura pós-Estado Novo (1948-1950) 42


2. Almiro de Carvalho Conceição: “um operário em partido de patrões” (1948-1950) 47
3. A ampliação da interlocução petebista (1951-1954) 58

Capítulo III – Os interlocutores dos trabalhadores no Legislativo Municipal de Alagoinhas


e a polarização política nacional (1955-1964) 77

1. A Frente Popular Democrática (1955-1958) 78


2. Interlocutores dos trabalhadores na situação (1959-1962) 106
3. Às vésperas do golpe (1963-1964) 116

Considerações Finais 129

Fontes 133

Referências Bibliográficas 137


Introdução

Pensar sobre os trabalhadores, a política e a urbanização em Alagoinhas na conjuntura


de 1948 a 1964 foi um caminho que começou a ser percorrido ainda durante pesquisas
iniciadas na graduação, momento em que se fez perceber a escassez de estudos em torno
dessas questões e a existência de uma história da cidade organizada por memorialistas em que
se narrava uma espécie de “era do ouro” vivida por Alagoinhas. Negava-se o conflito e
apresentavam-se como protagonistas da política e do desenvolvimento urbano de Alagoinhas
indivíduos ligados à elite. Essa constatação motivou as seguintes indagações: é possível um
processo de urbanização, sob a égide do capitalismo, não trazer em seu bojo contradições? E
os trabalhadores, como se conduziram nesse contexto? Esse estudo corresponde à iniciativa de
buscar respondê-las.
Entre as décadas de 1940 e 1960, se intensificava em Alagoinhas o processo de
crescimento populacional e desenvolvimento urbano. O seu contingente demográfico,
praticamente duplicou, ao passo que a ocupação na área urbana se expandia. Este processo
estabelecia uma relação de mão dupla com a dimensão política na cidade, quando, por
exemplo, trabalhadores urbanos, que também tiveram o seu número ampliado, passaram a se
destacar no cenário político local como força significativa no jogo eleitoral ou ocupando
assentos no Legislativo Municipal. Nesse contexto, e especificamente a partir de 1948, foram
eleitos vereadores, alguns deles operários, que desempenharam o papel de interlocutores entre
os trabalhadores e o Estado. Com isso, questões ligadas a esses sujeitos sociais passaram a se
fazer presentes na pauta do Legislativo em Alagoinhas, seguramente em uma proporção ainda
não verificada em outro momento da história republicana. Essas questões correspondiam, em
sua maior parte, a reivindicações voltadas para implementação de infra-estrutura urbana em
bairros operários e melhoria nas condições de trabalho de categorias como ferroviários,
servidores municipais, comerciários e operários em curtumes.
Desse modo, essa dissertação se propõe a discutir a mediação de interesses dos
trabalhadores no Legislativo Municipal de Alagoinhas entre 1948 e 1964, período em que se
percebia no Brasil uma relativa ampliação do espaço para a participação política e margem de
negociação para os trabalhadores. Cabe lembrar que o referido período se situa no intervalo de
dois regimes de exceção instaurados no Brasil: O Estado Novo, findado em 1945 e a Ditadura
Militar, implantada em 1964.
Entre 1948 e 1964 o Brasil passou por algumas transformações político-institucionais.
Vivenciou-se a transição de um regime ditatorial para a implantação de uma democracia
1
representativa a partir de 1945, havendo o retorno do pluripartidarismo e das eleições diretas.1
Nesse contexto, ocorreu a incorporação, no processo político-eleitoral, de estratos menos
privilegiados da sociedade através, principalmente do voto. Porém, essa incorporação se
realizou dentro dos limites que impõe uma democracia representativa, uma vez que era
bloqueada a interferência direta nas instâncias decisórias.2 Todavia, de acordo com Francisco
Weffort, convém considerar que, naquele momento, o voto, apesar de ser um “meio formal e
limitado, foi decisivo como forma de expressão política das massas populares”, durante essa
conjuntura que, na perspectiva do referido autor, recebe um forte traço do chamado
“populismo”.3
Francisco Weffort foi um dos principais teóricos do chamado populismo, se não o
principal deles, e compreendia que esse foi um aspecto essencial na política nacional entre
1930 e 1964. Assim, o populismo teria sido gestado no contexto sócio-político que emergiu
no Brasil com o advento da Revolução de 1930, mas ganhou intensidade durante o regime
democrático vigente entre 1945 e 1964, quando os interesses das camadas empobrecidas da
população brasileira passaram a ser levados em consideração diante do jogo eleitoral que se
instituiu.4 Em linhas gerais, Weffort concebia o populismo como o expediente mobilizado por
frações da elite, que sem desfrutar da condição de hegemonia, recorria ao apoio político das
“massas populares urbanas” com o objetivo de assegurar legitimidade para manter-se no
poder.5
É recorrente, ao longo das análises de Weffort, a utilização das categorias “povo”,
“massa” ou “classes populares”, para definir o componente social que foi fundamental para a
legitimação do populismo no Brasil. Tais categorias são reconhecidas por este autor como
“demasiadas abstratas” e “servem apenas para descrever aspectos mais superficiais do
populismo e não permitem conhecê-lo por inteiro”.6 É ambígua a compreensão do

1
SOUZA, Maria do Carmo Campelo de. Estado e partidos políticos no Brasil: 1930-1964. São Paulo: Alfa-
Omega, 1976. p.63-64.
2
Segundo Paul Hirst, em uma democracia representativa, a possibilidade de votar consiste na oportunidade de
escolher periodicamente os responsáveis pela tomada de decisões do Estado e, por isso, se apresenta como “uma
virtude limitada”, pois tal possibilidade não se configura como uma forma de controle por parte do conjunto de
eleitores que após as eleições não desfrutam de canais que assegurem a sua interferência nas decisões
governamentais. Ver: HIRST, Paul. A democracia representativa e seus limites. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editora, 2002. p.30-46.
3
Segundo esse autor, o uso do voto teria sido uma forma de expressão política individualizada dos sujeitos
recém incorporados ao processo político-eleitoral, enquanto assumiria uma faceta coletiva desse aspecto as
associações (sindicatos, movimentos de opinião, entidades estudantis). WEFFORT, Francisco Correia. O
populismo na política brasileira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980. p.18-21.
4
Idem, p.20-21.
5
Idem, p.69-70.
6
Idem, p.26.
2
comportamento deste componente social em sua relação com o Estado, ora indicando a sua
passividade e sujeição à manipulação de lideranças populistas, ora sugerindo o seu
protagonismo em algum grau no jogo político. É representativa para esta questão a sua
afirmação de que “o populismo foi, sem dúvida, manipulação de massas, mas a manipulação
nunca foi absoluta.”7
Diante do exposto, convém salientar duas questões. Primeiro, que essas premissas,
intrínsecas ao conceito de populismo, transitavam na academia e eram compartilhadas por
intelectuais como Otávio Ianni, Hélio Jaguaribe e Alberto Guerreiro Ramos. Todos estes,
assim como Weffort, formularam estudos influentes para as Ciências Sociais nas décadas de
1950 e 1960 sobre as relações, no Brasil, entre Estado e sociedade, e em especial entre Estado
e trabalhadores, considerando o populismo, nos termos que era corrente naquele momento.
Isto é, como fenômeno político em que os trabalhadores, muitos deles, ex-camponeses que
migraram para as cidades, por não desfrutarem de uma consistente consciência de classe, se
sujeitaram a líderes carismáticos que lhes manipulavam. Seriam exemplos desses líderes
Getúlio Vargas, João Goulart, Ademar de Barros, Jânio Quadros e Leonel Brizola.8 E
segundo, que a partir do final da década de 1970, surgiram iniciativas que se intensificando
nas duas décadas seguintes, sinalizavam para o abandono do uso da noção de populismo, ao
passo que apresentavam abordagens alternativas, principalmente, com relação ao espaço de
tempo em que vigorou a democracia eleitoral que intercalou o fim do Estado Novo em 1945 e
a instituição da Ditadura Militar em 1964. Problematizava-se a leitura feita sobre esse período
que se sustentava em uma interpretação vinculada à noção do populismo que remetia à idéia
de manipulação do Estado sobre os trabalhadores e a negação de que estes desfrutavam de
organização e consciência de classe.
Nesse sentido, os estudos que romperam com a adoção do populismo como conceito e
fenômeno político, revisando interpretações antecedentes, identificaram brechas em que os
trabalhadores exerciam um papel ativo nas relações políticas, as quais eram estabelecidas,
mesmo que de forma assimétrica, através do seu diálogo com a estrutura governamental.
Angela de Castro Gomes foi uma das expressões dessa ruptura existente nas ciências sociais.
Nesse sentido, essa autora argumenta que a classe trabalhadora em sua relação com o Estado

7
Idem, p.62.
8
Ver: GOMES, Angela de Castro. O populismo e as ciências sociais no Brasil: notas sobre a trajetória de um
conceito. In: FERREIRA, Jorge (org). O populismo e sua história. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001;
FERREIRA, Jorge. O nome e a coisa: o populismo na política brasileira. In: FERREIRA, Jorge (org). O
populismo e sua história. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001; REIS FILHO, Daniel Aarão. O colapso
do colapso do populismo ou a propósito de uma herança maldita. In: FERREIRA, Jorge (org). O populismo e sua
história. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
3
“só obedecia se por obediência política ficar entendido o reconhecimento de interesses e a
necessidade de retribuição”.9 E ainda, sugeriu a substituição da noção de “populismo” pela de
“pacto trabalhista”, atribuindo aos trabalhadores um papel de sujeito histórico que realiza
escolhas de acordo a um determinado horizonte de possibilidades.10
Entre 1945 e 1964, com o restabelecimento de uma democracia representativa no Brasil,
o voto se apresentava como uma das formas de expressão política possível, pois segundo
Gláucio Soares, a partir de 1945:

a totalidade das classes médias e dos setores médios, bem como um contingente
razoável da classe trabalhadora, passaram a ter uma dose razoável de poder sobre os
dirigentes políticos: ou os seus interesses eram defendidos no nível das decisões
políticas, ou seriam outros os candidatos que receberiam os seus votos nas eleições
subsequentes. Este poder com base eleitoral funcionou como elemento de barganha
nas decisões políticas.11

Alagoinhas, em meados do século XX, experimentou um aumento demográfico


significativo, em compasso com um processo de desenvolvimento urbano que se desdobrava.
Nesse contexto, fica evidenciada uma projeção dos trabalhadores na arena política como
contingente eleitoral importante e tendo representantes eleitos para o Legislativo Municipal.
Demandas destes sujeitos sociais também passaram a repercutir no ambiente político,
principalmente relacionada à melhoria de infra-estrutura urbana ou nas condições de trabalho.
É propósito desse estudo analisar esses elementos da história de Alagoinhas, sem se descuidar
da sua articulação com uma realidade mais ampla – a nacional e a global,12 assim como
propor uma visão crítica sobre uma história organizada por memorialistas locais que, de certo
modo, priorizaram os indivíduos da elite local como protagonista da cena social.13 Com isso,
tem-se como horizonte contribuir com a discussão sobre a atuação política dos trabalhadores.
Em busca desse intuito nos deparamos com os seus interlocutores, questão que reflete a forma
como estava estruturada a organização política do país nos moldes de uma democracia
representativa.

9
GOMES, Angela de Castro. A invenção do trabalhismo. Rio de Janeiro: Iuperj-Vértice, 1988. p.195.
10
GOMES, Angela de Castro. O populismo e as ciências sociais no Brasil: notas sobre a trajetória de um
conceito. In: FERREIRA, Jorge (org). O populismo e sua história. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
p.46-47.
11
SOARES, Gláucio Ary Dillon. Sociedade e política no Brasil (Desenvolvimento, classe e política durante a
Segunda República). São Paulo: Difel, 1973. p.59-60.
12
NEVES, Erivaldo Fagundes. História Regional e Local: fragmentação e recomposição da História na crise da
modernidade. Feira de Santana: Arcádia, 2002. p.104.
13
BARROS, Salomão. Vultos e Feitos do Município de Alagoinhas. Salvador: Artes Gráficas, 1979.
4
Ao longo de dois anos de pesquisa foi necessário realizar um itinerário de visitas a
arquivos situados em Alagoinhas, Inhambupe, Ipiaú e Salvador. Em Alagoinhas foram
frequentados os acervos do Arquivo da Prefeitura Municipal, do Arquivo da Câmara de
Vereadores, da Biblioteca Municipal Maria Feijó, da Fundação Iraci Gama, da agência local
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), além do arquivo pessoal do Sr.
Walter Campos para a análise da coleção do Alagoinhas Jornal. Fora de Alagoinhas, estive
em Inhambupe consultando o acervo da Biblioteca Municipal desta cidade. Em Salvador,
examinei a documentação disponível no Arquivo Público do Estado da Bahia, na Biblioteca
da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia, além da coleção de
periódicos da Biblioteca Pública do Estado da Bahia. Em Ipiaú, cidade localizada no sul do
estado da Bahia, foi possível o acesso ao arquivo pessoal do Sr. Joanito Rocha para coletar
edições do jornal O Nordeste, periódico que foi publicado em Alagoinhas entre 1948 e 1956.
A presente dissertação está composta em três capítulos, conforme se verá a seguir. No
primeiro capítulo é discutido o processo de urbanização e crescimento populacional
vivenciado em Alagoinhas durante meados do século XX. O objetivo foi compreender de que
modo estes aspectos da conjuntura local contribuíram para a emergência de trabalhadores
urbanos e de suas demandas no cenário político alagoinhense. No período enfocado, segundo
Milton Santos, Alagoinhas ocupava uma posição de centralidade com relação às demais
cidades do seu entorno, atuando como um importante entreposto comercial.14 Entretanto, tal
condição não se traduzia em distribuição social da riqueza e demandas ligadas aos
trabalhadores urbanos passaram a figurar na agenda política local. Para discutir essas questões
foi lançado mão de uma documentação de caráter quantitativo e qualitativo. Sobre o
crescimento populacional, assim como em relação ao desenvolvimento urbano assistido em
Alagoinhas, foram observados dados fornecidos por estudos do IBGE. Foram relacionados
aos dados quantitativos informações de ordem qualitativa provenientes de jornais locais e em
menor número, ao menos nesse capítulo, da documentação produzida pelo Legislativo
Municipal, como as atas das sessões ordinárias e os requerimentos. Esse capítulo está
subdividido em três partes e nele o diálogo com a Geografia foi imprescindível. Foi
necessário para a análise do desenvolvimento urbano e da dinâmica do crescimento
populacional de Alagoinhas, no período em destaque, um enfoque que ultrapassasse os limites
deste município e observasse alguns aspectos do seu entorno, onde se verificava o alcance da
sua influência urbana. Desse modo, a primeira parte deste capítulo discute A região de
14
SANTOS, Milton. Zonas de influência comercial no Estado da Bahia. In: TRICART, Jean e SANTOS, Milton.
Estudos de Geografia da Bahia. Salvador: Livraria Progresso, 1958. p. 30-31 e 43-44.
5
Alagoinhas, delimitação espacial que recebeu essa designação por Milton Santos no final da
década de 1950 para definir o espaço onde se percebia com regularidade o exercício de
centralidade urbana por Alagoinhas.15 Para tanto, se buscou perceber quais eram os elementos
que justificavam essa condição, ao examinar determinados aspectos do conjunto de
municípios que compunham a referida delimitação espacial. Na segunda parte, é analisada,
especificamente, a cidade de Alagoinhas, identificando as funções urbanas que dispunha e a
caracterizava como um importante centro regional em meados do século XX. Na última parte
deste primeiro capítulo, o já mencionado crescimento populacional é abordado, ao passo que
se investiga sobre as suas possíveis motivações. A expansão urbana vivenciada em
Alagoinhas naquele momento também é destacada.
Os dois últimos capítulos são dedicados à discussão acerca da interlocução no
Legislativo Municipal de interesses dos trabalhadores, sobretudo servidores municipais,
operários em curtumes, ferroviários e comerciários. Cabendo salientar que com exceção dos
servidores municipais, as demais categorias profissionais, tiveram representantes eleitos para
o cargo de Vereador em Alagoinhas ao longo do período em estudo.
Para atender a essa discussão, foi de suma importância a investigação da documentação
relacionada às atividades do Legislativo Municipal, como atas e requerimentos, sendo, muitas
vezes, associadas a jornais locais, principalmente O Nordeste e Alagoinhas Jornal que
costumeiramente veiculavam relatos sobre o ambiente político local e nacional.
O Nordeste foi fundado, em 1948, por Joanito Rocha. Este disputou as eleições de 1950
e 1954, em Alagoinhas, para o cargo de Vereador pelo PTB. Todavia, até o ano de 1954, este
periódico apresentou uma faceta antigetulista. Este fato, certamente, se devia à presença do
udenista João Nou como redator. Posteriormente ao ano de 1954, quando João Nou rompeu
com a UDN e filiou-se ao PSD, O Nordeste passou a adotar um posicionamento inverso, não
poupando de críticas os udenistas e apoiando as forças políticas herdeiras do getulismo. O
Alagoinhas Jornal foi criado no final do ano de 1957 por Walter Campos, jovem cirurgião
dentista e filho de Altamirano Campos, ex-prefeito de Alagoinhas durante o Estado Novo,
membro do PSD nos primeiros anos do período constitucional e presidente do PSP na
segunda metade da década de 1950. Walter Campos disputou as eleições para o cargo de
Vereador em Alagoinhas pelo PSP, em 1958 e 1962, sendo eleito nessa última ocasião.
Quanto ao segundo capítulo, é iniciada a análise sobre a dinâmica da mediação dos
interesses ligados aos trabalhadores no Legislativo Municipal de Alagoinhas. Desse modo, é

15
Idem.
6
realizada uma incursão sobre as legislaturas 1948-1950 e 1951-1954, as duas primeiras pós-
Estado Novo. Durante esse período foi percebido um aumento gradativo no número de
vereadores que atuaram como interlocutores dos trabalhadores junto à esfera governamental e
corresponde a um momento em que o embate político nacional não reverberava no contexto
local com a intensidade percebida nos anos seguintes.
No terceiro e último capítulo, explorando uma documentação semelhante, se discute as
três legislaturas que se desenvolveram de 1955 até o ano de 1964, quando se instaurou um
regime ditatorial no país que limitou as condições para a atuação política. Nota-se neste
ínterim que a polarização que se desenvolvia na política nacional, entre as forças políticas
herdeiras do getulismo e as correntes conservadoras que lhe faziam oposição, se torna mais
evidente em Alagoinhas.16 Além disso, constata-se que a interlocução de demandas de
trabalhadores no plano municipal prosseguiu e foi permeada pelo tensionamento político
local, que alternou momentos de intensificação e refluxo até ir de encontro às repercussões do
golpe civil-militar de 1964 que instalou uma ditadura no Brasil.
Nesse estudo, priorizou-se um enfoque sobre o Legislativo Municipal para responder às
indagações acima mencionadas. É importante salientar que, nesse contexto, existiam outros
espaços através dos quais os trabalhadores também se integravam às relações existentes na
arena política. Mas, a limitação do tempo para a elaboração da pesquisa – o equivalente a dois
anos - impediu que fossem aprofundadas as investigações sobre entidades associativas que
possuíam trabalhadores em seus quadros, sejam as que foram criadas durante o período
estudado (1948-1964) ou mesmo as que já estavam em funcionamento na cidade, como o
Centro Operário Beneficente de Alagoinhas, o Círculo Operário de Alagoinhas, o Sindicato
dos Trabalhadores na Indústria de Couros e Peles de Alagoinhas, a Liga Alagoinhense de
Dominó e a Liga Desportiva de Alagoinhas. Esta entidade reunia times de futebol amador e
vários dos seus dirigentes concorreram ou foram eleitos para cargos eletivos. Enfim, esta
dissertação se ocupa de uma parcela do que ainda se encontra à espera de ser pesquisado,
acerca do espaço de tempo e dos sujeitos sociais que aqui foram abordados.

16
Segundo Jorge Ferreira se confrontou no Brasil, entre 1945 e 1964 dois projetos políticos, os quais são
denominados por este autor como “nacional-estatista” e “liberal-conservador”. O primeiro estava identificado,
sobretudo ao PTB e trazendo uma plataforma política com o nacionalismo em sua linha de frente defendia a
proteção da economia nacional em contraponto aos interesses estrangeiros, a interferência do Estado em setores
estratégicos da economia e a ampliação do amparo social para estratos subalternos da população brasileira. O
segundo era representado, sobretudo pela UDN e se caracterizava por ser elitista, antigetulista, anticomunista e
solidário à abertura do país ao capital estrangeiro e a contenção da interferência estatal na economia.
FERREIRA, Jorge. Crises da República: 1954, 1955 e 1961. In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de
Almeida Neves (org). O Brasil Republicano: O tempo da experiência democrática: da democratização em 1945
ao golpe civil-militar de 1964. Vol.3. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. p.303-304.
7
Capítulo I
A região de Alagoinhas e a dinâmica urbana e populacional

1. A região de Alagoinhas

A aplicação do conceito de região se sustenta na definição de uma área no espaço


geográfico, a partir de determinados critérios, em que se notam elementos internos que
promovem certo padrão de relações capaz de singularizá-la no espaço contíguo.17 Alguns dos
critérios considerados para definir uma região podem ser de ordem econômica - produção,
circulação ou consumo - de ordem cultural – a identificação de práticas culturais ou modos de
vida - de ordem geológica – tipo de solo ou minerais predominantes em uma área – ou
climática.18
Neste estudo será abordada a região de Alagoinhas, que conforme propôs Milton
Santos, compreende o espaço geográfico onde estavam inseridos os municípios que eram
alcançados pela influência comercial de Alagoinhas, na década de 1950. Tal influência não
era exercida isoladamente por Alagoinhas nessa região. Ao contrário, por vezes, ela concorria,
em determinados pontos, com a ação de outros centros comercias, como Salvador, Feira de
Santana e Aracaju.19
Desse modo, a região de Alagoinhas tem a sua historicidade caracterizada pela
regularidade dos fluxos das relações comerciais existentes no seu interior, que colocava em
constante conexão um conjunto de mais de vinte municípios.20 Levar em consideração esta
delimitação regional se faz conveniente para se compreender a intensificação da expansão
demográfica e urbana experimentada por Alagoinhas em meados do século XX, tornando-se
fundamental lançar mão de uma investigação que ultrapasse os limites deste município e
alcance as demais cidades que compunha a mencionada região.21

17
GRAÇA FILHO, Afonso de Alencastro. História, Região e Globalização. Belo Horizonte: Autêntica Editora,
2009. p.11.
18
BARROS, José D’assunção. História, região e espacialidade. p.99. In: Revista de História Regional (10) 1: 95-
129, verão de 2005.
19
SANTOS, Milton. Zonas de influência comercial no Estado da Bahia, op. cit., p. 30-31 e 43-44.
20
TRICART, Jean; SANTOS, Milton. O Problema da divisão regional da Bahia. In: TRICART, Jean e
SANTOS, Milton. Estudos de Geografia da Bahia. Salvador: Livraria progresso, 1958. p.22.
21
Cabe salientar que uma região poderá ser definida, de acordo com outros componentes que possui, para além
das atividades econômicas, como espaço, etnia e cultura. Por esta razão, os elementos históricos que lhe
caracteriza podem não corresponder ao de outro recorte regional. Ver: NEVES, Erivaldo Fagundes. História e
região: Tópicos de História Regional e Local. In: Revista Ponta de Lança. São Cristovão: Universidade Federal
de Sergipe, Vol.1, n.2, 25-36, abr-out, 2008.
8
A condição experimentada por Alagoinhas, neste contexto, lhe caracterizava como uma
cidade média, visto que esta é uma categoria de cidade que, segundo Maria Luisa Castello
Branco, não se define tão somente a partir da “classificação por porte populacional”, embora
este aspecto seja levado em consideração, mas também pelas funções e, principalmente, o
papel de mediação que desempenha na rede urbana regional, nacional e internacional.22 Nesse
sentido, quais eram os elementos que auxiliavam Alagoinhas a se configurar enquanto cidade
média e, por conseguinte, desempenhar o papel de centralidade no espaço urbano regional?
Para responder a esta indagação, que remete aos contrastes existentes entre Alagoinhas e as
demais cidades da região que ela emprestava o nome, o conjunto dessas cidades foi submetido
a uma investigação para que fossem identificados quais eram os elementos que davam
impulso ao papel de mediação exercido por Alagoinhas, caracterizando-a como um centro de
oferta de bens e serviços. Ao passo que será observado em que medida estes elementos
estavam ausentes ou frágeis nas demais cidades desta delimitação regional, em meados do
século passado. Diante disso, foi realizado um levantamento de dados sobre tamanho
populacional, tamanho econômico, grau de urbanização, centralidade e qualidade de vida,
categorias que, conforme sugere Castello Branco, são utilizadas para identificar uma cidade
média23 e que mais adiante passaremos a examinar, pois inicialmente convém situar este
espaço regional que, segundo Milton Santos, compreendia a seguinte territorialidade:

Seguindo a estrada de ferro, Alagoinhas estende a sua influência através das


estações ferroviárias do município de Irará e Serrinha e, em caminho da Capital, até
Catu e Pojuca, não se devendo esquecer que Mata de São João e Camaçari também
lhe compram vários produtos.24

Propiciada pela rodovia Transnordestina, a influência comercial de Alagoinhas também


alcançava as cidades de Ribeira do Pombal e Tucano, sendo que neste ponto essa influência
era dividida com a da cidade de Feira de Santana.25 Em direção ao vizinho estado de Sergipe,
o “círculo de ação” de Alagoinhas avançava até a fronteira desse estado, onde cidades
sergipanas, especialmente Aracaju, exerciam intensa atividade comercial.26 O encontro dessa
concorrência comercial com cidades sergipanas era propiciado pela distância, assim como

22
CASTELLO BRANCO, Maria Luisa. Cidades Médias no Brasil. In: SPOSITO, Eliseu S.; SPOSITO, Maria
E.B.; SOBARZO, Oscar. Cidades Médias: produção do espaço urbano e regional. São Paulo: Expressão Popular,
2006. p.246.
23
Idem, p.246, 251 e 256.
24
SANTOS, Milton. Zonas de influência comercial no Estado da Bahia, op. cit., p.44.
25
Idem.
26
Idem.
9
pelo desenvolvimento industrial encontrado em solo sergipano.27 Quanto aos municípios que
estariam neste “círculo de ação”, seriam Conde, Esplanada, Rio Real e Inhambupe.28
Entretanto, é necessário incluir os demais municípios da Zona do Litoral Norte: Acajutiba,
que se emancipou de Esplanada em 1952,29 além de Entre Rios e Jandaira, não por conta de
um critério meramente físiográfico, mas por ser perceptível, por exemplo, o caso de
pecuaristas destes municípios que realizavam movimentação financeira em agências bancárias
situadas em Alagoinhas. Estariam ainda neste raio de influência de Alagoinhas, os municípios
de Itapicuru, Nova Soure e Cipó, mesmo que, por vezes, cruzasse com a influência de outros
centros, como Aracaju e Salvador.30 Cabe inserir também neste recorte regional, os
municípios criados a partir do ano de 1958: Aporá e Sátiro Dias, desmembrados de
Inhambupe; Ribeira do Amparo, desmembrado de Cipó; e Olindina, desmembrado de
Itapicuru.31

Imagem 1: Mapa onde são destacadas as zonas de influência comercial do estado da Bahia que eram presididas,
em 1959, por Alagoinhas, Feira de Santana e Nazaré, cidades que nas décadas de 1940 e 1950 se percebia a
intensificação do desempenho da função de entreposto comercial. Fonte: SANTOS, Milton A rede Urbana do
recôncavo. Salvador: Imprensa Oficial do Estado, 1959. Anexo 7.

27
Idem.
28
Idem, p.31.
29
BSEI. FUNDAÇÃO DE PESQUISAS (BA). Comportamento demográfico de divisão territorial do Estado da
Bahia de 1940-1970. Salvador, 1976, volume 3. p.23.
30
SANTOS, Milton, Zonas de influência comercial no Estado da Bahia, op. cit., p.31.
31
BSEI. FUNDAÇÃO DE PESQUISAS (BA). Comportamento demográfico e divisão territorial do Estado da
Bahia de 1940-1970. Salvador, 1976, volume 3. p.24, 29 e 30. Em 1962 Ouriçangas e Pedrão se emanciparam
de Irará; em 1963 idem para os municípios de Aramari, Cardeal da Silva e Crisópolis, os quais foram
desmembrados de Alagoinhas, Entre Rios e Itapicuru respectivamente. Ver: BSEI. FUNDAÇÃO DE
PESQUISAS (BA). Comportamento demográfico e divisão territorial do Estado da Bahia de 1940-1970.
Salvador, 1976, volumes 2 e 3.
10
Doravante, ingressemos na análise do conjunto de municípios que compunham a
região de Alagoinhas, tratando primeiramente da categoria tamanho populacional, pois dentre
os aspectos que definem uma cidade média, a dimensão demográfica é a primeira a ser
observada, não porque ele seja o elemento central para tal definição, mas em função de se
constituir como um indicador da “ocorrência de funções e relacionamentos desenvolvidos
pelas cidades médias”.32 Os dados referentes ao quantitativo populacional da região de
Alagoinhas correspondem ao período em investigação entre 1940 e 1960 (ver Tabela 1).33
Tabela 1- Tamanho populacional
1940 1950 1960
Cidades População População População População População População
total urbana total urbana total urbana
Acajutiba 7.707 1.587 9.643 2.833 9.256 ----
Alagoinhas 37.827 15.301 52.007 21.283 74.455 ----
Aporá 4.346 873 5.052 866 12.687 ----
Camaçari 11.188 1.419 13.800 2.715 21.229 ----
Catu 17.222 2.836 16.437 3.558 21.450 ----
Cipó 12.810 1.183 19.867 1.769 5.681 ----
Conde 13.841 2.732 14.431 2.953 16.962 ----
Entre Rios 18.157 927 19.356 1.079 21.492 ----
Esplanada 18.490 2.927 20.649 3.278 14.041 ----
Inhambupe 35.069 2.585 41.451 3.245 17.927 ----
Irará 47.673 1.524 46.711 1.574 45.113 ----
Itapicuru 26.008 524 32.060 752 27.822 ----
Jandaíra 5.122 655 5.306 684 5.995 ----
Mata de São João 16.672 3.523 17.651 4.766 23.013 ----
Nova Soure 7.902 984 12.244 1.286 15.099 ----
Olindina 5.471 1.000 7.751 1.828 7.693 ----
Pojuca 10.009 2.660 6.911 2.534 8.415 ----
Ribeira do Amparo 5.654 428 4.744 411 16.129 ----
Ribeira do Pombal 15.932 1.154 23.763 2.769 30.383 ----
Rio Real 11.241 2.229 12.858 2.682 13.631 ----
Sátiro Dias 7.979 598 9.989 847 11.112 ----
Serrinha 45.842 2.765 68.413 6.602 56.538 ----
Tucano 20.472 1.748 28.596 3.039 33.982 ----
Fonte: Recenseamento Geral do Brasil de 1940. Série Regional, parte XII-Bahia, Tomo 1, IBGE, 1950.
Censo Demográfico de 1950. Série Regional, volume XX, tomo 1, Estado da Bahia, IBGE, 1955.
Censo Demográfico de 1960. Série Regional, volume 1, tomo VIII. FIBGE.

32
CASTELLO BRANCO, op. cit., p.251.
33
Para identificar o aspecto populacional da região de Alagoinhas, conforme está exposto na tabela 1 foram
coletadas informações acerca da população total e da soma da população não-rural assentada no quadro urbano e
suburbano de todos os municípios em questão. Quanto aos dados referentes aos censos de 1940 e 1950, no caso
de Acajutiba, Aporá, Olindina, Ribeira do Amparo e Sátiro Dias, foi realizado o mesmo procedimento para as
sedes destes então distritos, uma vez que eles se converteram em municípios somente no final da década de
1950, como foi aludido.
11
O enfoque sobre o aspecto demográfico, em grande medida, se desenvolveu com as
pesquisas sobre cidades médias durante a década de 1970, onde se adotava como critério
balizador as faixas entre 50 e 250 mil habitantes para definir essa categoria de cidade.34 Se for
levada em conta essa parametrização, se percebe que, no interstício entre 1940 e 1960, apenas
Alagoinhas e Serrinha ultrapassaram o limite de 50 mil habitantes. Também é possível notar
que a maioria das cidades que faziam parte da composição da região de Alagoinhas não
possuía um adensamento populacional urbano significativo. Pelo contrário, é notório que a
maior parcela das suas respectivas populações estavam distribuídas na área rural. Nesse
sentido, Alagoinhas despontava com a maior taxa de urbanização em 1940, com 40,45%, e
em 1950, com 40,9%. Sobre esse aspecto, não é possível verificar com relação a 1960, em
função do censo ser omisso no fornecimento de dados relativo ao quadro urbano (ver Tabela
3). O fato de a maioria da população dos municípios da região de Alagoinhas estar fixada na
área rural pode ser compreendido, de certo modo, a partir da constatação de que, durante a
década de 1950, a agricultura e a pecuária se estabeleciam como as suas principais atividades
econômicas. Porém, apareciam como exceções Catu e Mata de São João que, nesse mesmo
período, tiveram a extração de petróleo alcançando um patamar de liderança na economia
local, sendo que a pecuária figurava para a primeira e, a agricultura, para a segunda, em uma
posição secundária.35
Essa questão também fornece indícios sobre uma fragilidade nessas cidades do interior
baiano em disporem de funções, eminentemente, urbanas como o comércio, a indústria e os
serviços, e nesse sentido Alagoinhas se apresentava como uma exceção dentro dessa
delimitação espacial, uma vez que nesse mesmo período, embora a produção agrícola fosse
relevante, possuía um setor comercial que se destacava.36 Além disso, na década de 1950, em
Alagoinhas, a atividade de curtimento de couros e peles passou a figurar como a base
econômica do município37 e como mais adiante será possível perceber, também era a cidade
da região que possuía o maior número de estabelecimentos comerciais, industriais e de
serviços, assim como de pessoal ocupado nesses setores. Na década seguinte a atividade de

34
CASTELLO BRANCO, op. cit., p.251.
35
Ver sobre as principais atividades econômicas dos municípios da região de Alagoinhas, na década de 1950,
em: Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XX. Rio de Janeiro, 1958 e Enciclopédia dos
municípios brasileiros. IBGE, volume XXI. Rio de Janeiro, 1958
36
Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XX. Rio de Janeiro, 1958. p.22-23.
37
Dados preliminares da sinopse do município de Alagoinhas. 10.02.1955. Disponível na Agência do IBGE em
Alagoinhas. p.1.
12
curtimentos de couros e peles declinou, ao passo que a extração de petróleo e a indústria no
setor ceramista ganharam importância ao lado da atividade comercial.38
Prosseguindo nesta análise, convém retomar a partir do aspecto que Castello Branco
denominou como tamanho econômico, pois, este traz um “indicativo da dinâmica econômica
do centro responsável por existência de infra-estrutura necessária ao poder de atração
locacional e ao papel de intermediação que caracterizam as cidades médias”.39

Tabela 2 - Tamanho econômico


1950 1956 1959 1960
Cidades População Pessoal Nº de Nº de Pessoal Nª de População
economicamente ocupado unidades agências ocupado unidades economicamente
ativa em 1950 total em locais de bancárias total em locais de ativa em 1960
1950 empresas em 1956 1959 empresas

Acajutiba ---- ---- ---- ---- 68 45 2.869


Alagoinhas 37.646 1.395 384 4 1.753 621 25.602
Aporá ---- ---- ---- ---- 52 36 3.521
Camaçari 10.050 247 65 ---- 470 130 6.188
Catu 11.830 278 113 ---- 154 59 6.838
Cipó 13.195 135 60 1 196 65 1.886
Conde 9.963 287 78 ---- 257 96 5.516
Entre Rios 13.458 214 108 ---- 283 109 7.332
Esplanada 14.280 190 131 1 155 82 4.545
Inhambupe 27.873 381 209 ---- 344 158 6.786
Irará 32.296 447 300 1 673 396 20.211
Itapicuru 18.605 333 143 ---- 146 116 11.606
Jandaira 3.706 123 62 ---- 65 49 2.181
Mata de São João 12.779 199 97 ---- 162 76 6.055
Nova Soure 8.060 79 44 ---- 174 119 5.044
Olindina ---- ---- ---- ---- 155 74 2.734
Pojuca 4.983 238 76 ---- 192 72 3.035
Ribeira do Amparo ---- ---- ---- ---- 435 254 5.516
Ribeira do Pombal 15.552 398 158 ---- 572 301 12.294
Rio Real 8.719 216 76 ---- 140 64 4.558
Sátiro Dias ---- ---- ---- ---- 107 49 4.816
Serrinha 44.489 674 331 3 1.315 495 18.631
Tucano 19.157 444 246 ---- 490 319 12.820

Fonte: Censo Demográfico de 1950. Série Regional, volume XX, tomo 1, Estado da Bahia, IBGE, 1955.
Censo industrial, comercial e dos serviços de 1950 (Bahia), volume XX, tomo 3. IBGE, 1956.
Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XX. Rio de Janeiro, 1958.
Censo Demográfico de 1960. Série Regional, volume I, tomo 8. FIBGE.
Censo industrial de 1960 (Bahia). Série Regional, volume III, tomo 4.
Censo comercial e dos serviços de 1960. Série Regional, volume IV, tomo 5.

38
Coleção de Monografias do IBGE, nº480 – Alagoinhas. Lucas, GB: Fundação IBGE, 1970. p.6-11.
39
CASTELLO BRANCO, op.cit., p.249.
13
Os dados concernentes à categoria tamanho econômico, demonstram um quadro em que
Alagoinhas apresenta vantagem, com relação às demais cidades da região, em desempenhar o
papel de intermediação comum às cidades médias. Por exemplo, em relação ao número total
de pessoal ocupado nos setores comercial, industrial e de serviços em 1950 e 1959,
Alagoinhas se destacava com o maior coeficiente. Apenas Serrinha se aproximava dos
números de Alagoinhas nestes aspecto, principalmente em 1959 (ver Tabela 2).
A liderança de Alagoinhas, seguida por Serrinha, também, era notada no que se refere
ao número de agências bancárias, algo, por sinal, escasso na maioria das cidades da região.
Desse modo, existiam, em Alagoinhas, quatro agências bancárias, enquanto em Serrinha três
estavam em funcionamento. Além destas cidades, apenas Cipó, Esplanada e Irará possuíam
uma agência bancária nesse mesmo período (ver Tabela 2). Desta ausência de
estabelecimentos bancários, na maioria das cidades da região de Alagoinhas, decorria a
confluência de pessoas destas localidades para cidades como Alagoinhas e Serrinha, quando
dependiam desses serviços.40
A análise do quadro correspondente ao tamanho econômico da região de Alagoinhas é
complementada com os indicadores referentes ao número de unidades locais de empresas,
representado pela soma das empresas nos setores, industrial, comercial e de serviços. Nessa
categoria, Alagoinhas também mantinha a primeira posição em 1950 e 1959, sendo
acompanhada em seguida por Serrinha, Tucano e Irará (ver Tabela 2).
O grau de urbanização, outra categoria a ser observada, compõe-se das informações
relativas à taxa de urbanização, além do número de domicílios total e urbano. A relevância em
estudar esse aspecto se justifica em função do grau de urbanização estar diretamente
associado à definição de uma cidade média, “uma vez que as atividades necessárias para
desenvolver as funções urbanas, tais como a de articulador do sistema urbano, as de centro de
atividades produtivas e de prestação de serviços constituem característica tipicamente
urbana.”41 Os dados referentes a este quesito mostram, mais um vez, a preponderância de
Alagoinhas em relação às demais cidades da região, uma vez que exibia a maior taxa de

40
Este era o caso, na década de 1950, do município de Tucano que realizava o seu movimento bancário em
Serrinha, ou mesmo de Rio Real, que para essa mesma finalidade tinha que recorrer às cidades vizinhas,
provavelmente Esplanada e Alagoinhas. Ver Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XXI. Rio
de Janeiro, 1958. p.174 e 378. Quanto à Alagoinhas, é possível identificar alguns pecuaristas do Conde,
Esplanada e Entre Rios que lhe buscavam como destino para realizar transações financeiras em agências
bancárias locais. Possivelmente havia um fluxo semelhante, oriundo de outros municípios da região de
Alagoinhas em que não possuíam bancos. Ver: O Nordeste, 28.01.1949, p.2-4 e 10.02.1949, p.6.
41
CASTELLO BRANCO, op. cit., p.250-251.
14
urbanização, em 1940 e 1950.42 Todavia, não foi possível compreender sobre esse quesito no
ano de 1960, em função do censo não expor dados ao seu respeito (ver Tabela 3).

Tabela 3 – Grau de urbanização


1940 1950 1960
Cidades Total de Domicílios Taxa de Total de Domicílios Taxa de Total de
domicílios urbanos e urbanização domicílios urbanos e urbanização domicílios
suburbanos suburbanos
Acajutiba ---- ---- 20,59% ---- ---- 29,37% 1.721
Alagoinhas 10.110 4.366 40,45% 12.163 5.688 40,92% 14.471
Aporá ---- ---- 20,08% ---- ---- 17,14% 2.567
Camaçari 2.930 726 12,68% 3.439 1.091 19,67% 4.763
Catu 5.068 1.071 16,46% 3.736 972 21,64% 4.649
Cipó 3.647 677 9,23% 4.069 612 8,90% 1.084
Conde 3.684 736 19,73% 3.322 638 20,46% 3.674
Entre Rios 5.366 605 5,10% 4.523 524 5,57% 4.876
Esplanada 5.074 1.618 15,83% 4.515 1.599 15,87% 2.867
Inhambupe 8.847 1.686 7,37% 8.530 1.275 7,82% 3.641
Irará 15.269 1.665 3,19% 10.089 983 3,36% 9.009
Itapicuru 6.035 905 2,01% 6.772 904 2,34% 5.753
Jandaira 1.860 748 12,78% 1.278 528 12,89% 1.307
Mata de 4.692 1.680 21,13% 4.424 1.824 27,01% 5.146
São João
Nova Soure 1.742 328 12,45% 2.446 298 10,50% 3.122
Olindina ---- ---- 18,27% ---- ---- 23,58% 1.473
Pojuca 2.701 870 26,57% 1.706 667 36,66% 1.898
Ribeira do ---- ---- 7,56% ---- ---- 8,66% 2.964
Amparo
Ribeira do 3.805 554 7,24% 4.577 715 11,65% 5.707
Pombal
Rio Real 2.620 718 19,82% 2.668 607 20,85% 2.505
Sátiro Dias ---- ----- 7,49% ---- ---- 8,47% 2.070
Serrinha 10.347 1.554 6,03% 13.090 1864 9,65% 9.699
Tucano 4.364 590 8,53% 5.360 671 10,62% 6.162
Fonte: Recenseamento Geral do Brasil de 1940. Série Regional, parte XII-Bahia, tomo 1, IBGE, 1950.
Censo Demográfico de 1950. Série Regional, volume XX, tomo 1, Estado da Bahia, IBGE, 1955.
Censo Demográfico de 1960. Série Regional, volume 1, tomo VIII. FIBGE.

Outro parâmetro considerado, para seguir com a análise da região de Alagoinhas, será a
qualidade de vida, pois este é um aspecto importante na definição de uma cidade média, na
medida em que, como alude Castello Branco, evidencia a “oferta de infra-estrutura,
segurança, facilidade de deslocamento entre outros, constituindo assim, fator de atração
locacional para indivíduos e também para a instalação de unidades de produção”.43

42
Para taxa de urbanização foi calculado o percentual da população urbana em relação à população total.
43
CASTELLO BRANCO, op. cit., p.250-251.

15
Tabela 4 – qualidade de vida
1950 1960
Cidades Domicílios Domicílios Domicílios Domicílios Domicílios Domicílios
ligados a ligados a ligados a ligados a ligados a ligados a
rede geral rede geral iluminação rede geral rede geral iluminação
de água de esgoto elétrica de água de esgoto elétrica
Acajutiba ---- X ---- ---- ---- 184
Alagoinhas 103 X 743 101 50 3.597
Aporá ---- X ---- ---- ---- 17
Camaçari 20 X 92 ---- ---- 635
Catu 25 X 65 ---- ---- 814
Cipó 2 X 90 48 ---- 239
Conde 11 X 60 ---- ---- 280
Entre Rios 5 X 26 23 ---- 225
Esplanada 10 X 185 11 ---- 258
Inhambupe 9 X 121 ---- ---- 252
Irará 16 X 09 11 ---- 351
Itapicuru 5 X 65 ---- ---- 143
Jandaira ---- X X ---- ---- 70
Mata de São 35 X 199 187 ---- 714
João
Nova Soure 1 X 94 61 ---- 213
Olindina ---- X ---- ---- ---- 224
Pojuca 5 X 91 ---- ---- 397
Ribeira do ---- X ---- ---- ---- 161
Amparo
Ribeira do 6 X 115 163 ---- 455
Pombal
Rio Real 10 X 133 11 ---- 246
Sátiro Dias ---- X ---- ---- ---- 76
Serrinha 35 X 259 44 16 800
Tucano 3 X 146 93 3 331
Fonte: Censo Demográfico de 1950. Série Regional, volume XX, tomo 1, Estado da Bahia, IBGE, 1955.
Censo Demográfico de 1960. Série Regional, volume 1, tomo VIII. FIBGE.

Assim, a análise dos indicadores relativos ao quesito qualidade de vida, entre 1950 e
1960, revela que os municípios que compunham a região de Alagoinhas possuíam, em sua
maioria, números inexpressivos, no que concerne à existência de serviços de abastecimento de
água, saneamento ou iluminação elétrica. Para Alagoinhas, apesar de apresentar os números
mais elevados, tudo leva a crer, que este aspecto não era decisivo para a atração de indivíduos
e empresas, bem como na conformação do seu posto de principal centro fornecedor de bens e
serviços na referida região (ver tabela 4).
Os elementos que configuram uma cidade média se completam com a questão da
centralidade, que se constitui como a mais importante característica na definição dessa
categoria de cidade, pois é nesse aspecto que, de acordo com Castello Branco:

16
se apóia o seu poder de articulação entre os diferentes níveis de centros urbanos, a
sua atuação como centro de oferta de bens e serviços para a sua área de influência, e
como nó de diferentes tipos de rede, funções que estão no cerne do conceito de
centralidade.44

O “poder de articulação” de que dispõe uma cidade é um processo que está diretamente
associado à circulação, que por sua vez propicia a integração, reforçando ou modificando uma
diferenciação geográfica. Nesse sentido, reconhecendo que a diferenciação geográfica resulta
em grande medida, da circulação, Maria Arroyo destaca que esse processo, que é dinâmico,
traz no seu bojo a especialização e a hierarquização dos lugares, como no caso “das cidades
que se constituem como entroncamentos e exercem um efeito de polarização, sobressaindo do
seu entorno”.45
Na década de 1950, Alagoinhas concentrava entroncamentos ferroviário e rodoviário,
que a ligava com a capital do estado e cidades vizinhas.46 Essa condição que também pode
estar inclusa no quesito qualidade de vida, em função de representar a possibilidade da
facilidade de deslocamento, era crucial para lhe afirmar enquanto um centro urbano que
desenvolvia um papel de articulação e fornecimento de bens e serviços para a sua área de
influência. Como já foi exposto, durante a referida década, era asseverado o papel de
centralidade de Alagoinhas a partir da sua proeminência comercial na região que levava o seu
nome. Essa afirmação foi feita através de um estudo sobre as zonas de influência comercial da
Bahia, inicialmente, publicado no ano de 1956,47 ao apurar os dados relativos às transações
comerciais estabelecidas pelas cidades, vilas e povoados baianos durante o ano de 1953.48
Para continuar analisando o que conduzia Alagoinhas a desempenhar um papel de
centralidade junto às cidades adjacentes, foram observados os elementos que remetem ao
comércio, bem como ao setor de serviços dos diferentes municípios que compunham a região
de Alagoinhas. Cabe registrar que não são abundantes as informações que cubram todo o
período em investigação, porém foram examinados os dados referentes ao giro comercial do
ano de 1956 e a disponibilidade, em meados da década de 1950, dos serviços nos setores de
educação e saúde (ver tabela 5).

44
CASTELLO BRANCO, op. cit., p.250.
45
ARROYO, Maria Mônica. Dinâmica territorial, circulação e cidades médias. In: SPOSITO, Eliseu S.;
SPOSITO, Maria E.B.; SOBARZO, Oscar. Cidades Médias: produção do espaço urbano e regional. São Paulo:
Expressão Popular, 2006. p.75.
46
Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XXI. Rio de Janeiro, 1958. p.23.
47
TRICART, Jean; SANTOS, Milton. O problema da divisão regional da Bahia, op. cit., p.23.
48
SANTOS, Milton. Zonas de influência comercial no Estado da Bahia, op. cit., p.27.
17
Acerca da centralidade resultante da ação comercial é possível constatar a existência de
transações comerciais feitas com Alagoinhas por municípios como Acajutiba, Catu, Cipó,
Conde, Entre Rios, Esplanada, Irará, Inhambupe, Itapicuru, Jandaira, Nova Soure, Pojuca,
Ribeira do Pombal, que lhe procurava para adquirir determinadas mercadorias. Cabe lembrar
que Alagoinhas não exercia essa função exclusivamente, pois, na maioria das vezes, concorria
com as ações de outros centros comerciais, como São Paulo, Salvador, Aracaju e Feira de
Santana.49 Um exemplo de como se consubstanciava essa questão é o município de Nova
Soure, que estabelecia relações comerciais, principalmente com Alagoinhas, Salvador e
cidades do vizinho estado de Sergipe, de onde comprava “tecidos, calçados, ferragens, louças,
artigos de armarinho, remédios, bebidas em geral e os chamados artigos secos e molhados do
comércio de retalho”.50 Por sua vez, Nova Soure vendia para estas cidades gêneros da sua
produção agrícola como “farinha de côco, rapadura, mandioca, borracha de mangabeira, fibra
de caroá e paina ou lã de barriguda.”51 Nesse exemplo fica evidenciada uma divisão territorial
do trabalho em uma escala interurbana.52 Todavia, Nova Soure não se constituía em um caso
isolado, pois Cipó, Irará e Serrinha, também, adquiriam no comércio de outros centros
produtos industrializados e, em contrapartida, forneciam mercadorias da sua produção
agropecuária.53 É muito provável que algo semelhante se processasse com os demais
municípios da região de Alagoinhas, uma vez que a agricultura e a pecuária respondiam como
as suas principais atividades econômicas.
Algo que evidencia a preponderância alagoinhense no setor comercial na região fica
explicitada através dos dados referentes ao giro comercial do ano de 1956, quando Alagoinhas
alcançou a cifra mais alta da região, com o valor de Cr$ 256.325. Serrinha estava em uma
segunda colocação com o valor de Cr$ 96.675, o que correspondia a menos da metade do que
foi percebido no comércio alagoinhense. Das demais cidades, apenas Irará e Itapicuru
ultrapassaram a cifra de Cr$ 50.000 (ver tabela 5).
Certamente, esse destaque no volume financeiro acumulado pela atividade comercial de
Alagoinhas recebia uma contribuição importante das atividades do seu setor atacadista. Cabe
ressaltar, que a presença do comércio atacadista se apresenta como um traço marcante nas

49
Ver o tópico Comércio e Bancos dos referidos municípios em Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE,
volume XX. Rio de Janeiro, 1958 e Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XXI. Rio de
Janeiro, 1958.
50
Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XXI. Rio de Janeiro, 1958. p. 23.
51
Idem.
52
SANTOS, Milton. A urbanização Brasileira. 5ª edição. São Paulo: Edusp, 2008. p.31.
53
Ver acerca desses municípios em Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XX. Rio de Janeiro,
1958 e Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XXI. Rio de Janeiro, 1958.
18
economias de países subdesenvolvidos, revelando o papel de intermediação no abastecimento
comercial presente em um quadro de desigualdades das rendas, pois, segundo Milton Santos,
a força dos atacadistas consiste na sua capacidade de armazenar mercadorias, enquanto os
pequenos comerciantes não desfrutam da mesma condição.54
Desse modo, se o comércio atacadista é o mais representativo na articulação de
diferentes circuitos da atividade econômica,55 Alagoinhas era uma das cidades que se
sobressaia nessa função, uma vez que em 1950, dos 18 municípios da região de Alagoinhas,
metade deles não possuíam estabelecimentos atacadistas. Então, Alagoinhas possuía 19
estabelecimentos comerciais neste setor e se destacavam ao seu lado Serrinha com 20
estabelecimentos, Catu com 18 e Tucano com 13. Ribeira do Pombal, Inhambupe, Entre Rios,
Rio Real e Itapicuru, possuíam 10 ou menos.56 Em 1960, Alagoinhas isolou-se como a cidade
com maior número de estabelecimentos atacadistas na região em destaque, com 96 unidades.
Serrinha, em segundo lugar, possuía 42 estabelecimentos. Inhambupe possuía 34 e Catu 31.
Jandaíra, Pojuca e Cipó continuavam sem possuir estabelecimentos desse setor e as demais
cidades não ultrapassavam o número dos 23 estabelecimentos que dispunha Entre Rios.57
No que se refere ao setor de serviços, na década de 1950, especificamente na área de
saúde, é possível notar um número maior de postos de atendimento e de profissionais
concentrados em Alagoinhas, mesmo que o atendimento, sobretudo no setor público, não se
desse de forma satisfatória, como será visto na segunda parte desse capítulo. Assim, havia no
referido período, 9 postos de atendimento médico em Alagoinhas e 4 em Serrinha; Esplanada
e Irará possuíam 3; Cipó e Mata de São João possuíam 2. Alagoinhas e Serrinha possuíam um
Posto de Endemias Rurais instalado pelo Governo Estadual destinado também ao atendimento
da população dos municípios do entorno. No que diz respeito ao número de médicos e
dentistas atuando nestas cidades, o quadro era o seguinte: Alagoinhas possuía 13 médicos e 8
dentistas, e, não foi encontrado dados sobre o município de Serrinha que em outros aspectos
sempre se aproximou de Alagoinhas. Quanto aos demais municípios o número desses
profissionais era irrisório (ver Tabela 5).
Quanto aos serviços na área de educação, no mesmo período, cabe destacar que o ensino
primário estava presente em todos os municípios. Todavia não acontecia o mesmo com
relação ao ensino ginasial, apenas seis de todos os municípios da região de Alagoinhas

54
SANTOS, Milton. O Espaço dividido. São Paulo: EDUSP, 2008. p.225-226.
55
Idem, p.229.
56
Censo industrial, comercial e dos serviços 1950 (Bahia), volume XX, tomo III. p.139-144.
57
Censo comercial e dos serviços de 1960 (Sergipe – Bahia), volume IV, tomo V. p.54-63.
19
ofereciam essa modalidade de ensino, e mesmo assim, isso não significa que atendesse às
necessidades da demanda local. No caso de Alagoinhas, cidade que possuía duas escolas
oferecendo o curso ginasial, isto não se dava de forma satisfatória, até mesmo porque esses
cursos não eram gratuitos. Ao lado de Alagoinhas, apenas Catu, Conde, Inhambupe, Irará,
Serrinha e Tucano, possuíam estabelecimento com o curso ginasial disponível (ver Tabela 5).

Tabela 5 - Centralidade
Cidades Giro Postos Médicos Dentistas Escolas Escolas
Comercial médicos de ensino de ensino
em 1956 primário ginasial
Acajutiba ---- 1 1 1 15 ----
Alagoinhas Cr$ 256 325 9 13 8 75 2
Aporá ---- ---- ---- ---- ---- ----
Camaçari Cr$ 27. 500 1 1 ---- 53 ----
Catu Cr$ 34. 350 1 2 2 34 1
Cipó Cr$ 16. 900 2 2 1 18 ----
Conde Cr$ 39. 450 1 1 2 30 1
Entre Rios Cr$ 17. 700 1 1 2 38 ----
Esplanada Cr$ 17. 425 3 1 3 29 ----
Inhambupe Cr$ 32. 025 1 1 1 37 1
Irará Cr$ 59. 550 3 3 1 64 1
Itapicuru Cr$ 54. 100 1 1 ---- 28 ----
Jandaira Cr$ 5. 225 1 x ---- 11 ----
Mata de São João Cr$ 19. 625 2 2 2 29 ----
Nova Soure Cr$ 9. 050 1 1 1 14 ----
Olindina ---- ---- ---- ---- ---- ----
Pojuca Cr$ 11. 150 1 1 1 1 ----
Ribeira do Amparo ---- ---- ---- ---- ---- ----
Ribeira do Pombal Cr$ 21. 275 1 1 ---- 10 ----
Rio Real Cr$ 15. 000 1 2 1 17 ----
Sátiro Dias ---- ---- ---- ---- ---- ----
Serrinha Cr$ 96. 675 4 x x 71 1
Tucano Cr$ 26. 425 1 1 ---- 69 1
Fonte: Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XX. Rio de Janeiro, 1958.
Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XXI. Rio de Janeiro, 1958.

A ausência do oferecimento de um curso ginasial motivava, evidentemente, a quem


possuía recursos, levar os seus filhos para a capital do estado a fim de continuar seus estudos,
como era o caso de Inhambupe antes de possuir essa modalidade de ensino.58 Diante disso, a
instalação no ano de 1952, em Alagoinhas, de mais um curso ginasial voltado, para o regime
de internato feminino, era saudado como uma possibilidade “não só à juventude alagoinhense,

58
MARES, Estela, A evolução histórica de Inhambupe. Salvador: Art-Contemp, 1993. p.44-45.
20
mas também a todas as moças do nordeste, já que esta região não dispõe ainda de um
internato para moças, obrigando os pais a maiores despesas”.59
Após o exame dos aspectos ligados ao tamanho populacional, ao tamanho econômico,
grau de urbanização, qualidade de vida e centralidade, na região de Alagoinhas, é possível
reconhecer a primazia de Alagoinhas, havendo, na maioria das vezes, uma posição secundária
sendo ocupada pela cidade de Serrinha. Quanto às demais cidades fica demonstrada a
fragilidade nas condições de que elas desfrutavam para o exercício de funções urbanas, como
o comércio, principalmente no setor atacadista, serviços bancários, bem como na prestação de
serviços nas áreas de saúde e educação, especialmente, no nível ginasial.
Pautadas em teorias de planejamento, que ganharam terreno após a Segunda Guerra
Mundial, foram elaboradas noções que tinham como horizonte justificar a produtividade do
capital, porém ocultando os seus reais interesses, que inevitavelmente, propiciam a
concentração da riqueza e o revesso dessa moeda, que é a manutenção da pobreza.60 Dentre
essas noções, estavam as que defendiam a constituição de uma cidade proeminente em uma
rede urbana como pólo irradiador do desenvolvimento regional.61
Reconhecer que o perfil de Alagoinhas a conduzia a uma posição de centralidade em
uma determinada região, conforme foi apresentado nesse estudo, não converge para uma
interpretação que assuma um caráter de apologia desenvolvimentista nos moldes que
propunham as teorias de planejamento. Ao contrário, o fato da cidade de Alagoinhas possuir
condições superiores para a oferta de bens e serviços, se comparada às cidades circundantes,
não repercutia em melhores condições de vida para grande parte da sua população, a exemplo
dos trabalhadores de determinadas categorias profissionais, como os operários em curtumes,
ferroviários e servidores públicos municipais, como será discutido nos capítulos posteriores.

2. A cidade de Alagoinhas

O século XX é considerado o “século da urbanização”, pois foi nesse período da


história que a maior parte da população mundial passou a se estabelecer nas cidades. As
cidades pré-existem à industrialização, mas, é inegável que elas foram impactadas
decisivamente por esse processo que, segundo Henry Lefebvre:

59
APJR. O Nordeste, 08.01.1952, p.12.
60
SANTOS, Milton. Economia Espacial. São Paulo: Edusp, 2003. p.13-35.
61
CORRÊA, Roberto Lobato. A rede urbana. São Paulo: Editora Ática, 1989. p.87-88 e 91.
21
se distinguirmos o indutor e o induzido, pode-se dizer que o processo de
industrialização é indutor e que se pode contar entre os induzidos os problemas
relativos ao crescimento e à planificação, as questões referentes à cidade e ao
desenvolvimento da realidade urbana.62

No Brasil, foi a partir da década de 1940 que a sua urbanização se intensificou, na


medida em que a maioria da população passou a residir nas cidades.63 Entretanto, não convém
tomarmos o processo de urbanização como algo uniforme. Pelo contrário, é importante atentar
para as especificidades que existem na dinâmica de cada cidade, sem que isso signifique
abordá-las como unidades autônomas e sem articulação com o todo. Por exemplo, sobre a
urbanização brasileira, Milton Santos considera que:

Desde que o Brasil teve o seu território integrado e constituiu-se como um mercado
único, e o que a primeira vista aparece como evolução divergente, é, na verdade, um
movimento convergente. Há uma lógica comum aos diversos subespaços. Essa
lógica é dada pela divisão territorial do trabalho em escala nacional, que privilegia
diferentemente cada fração do território em um determinado momento da sua
evolução.64

Assim, no processo de urbanização, as cidades não obedecem a uma marcha


homogênea. Ocorre, inclusive, de determinadas cidades concentrarem algumas funções e,
com isso, adquirirem uma posição de centralidade com relação às demais cidades do seu
entorno a ponto de estender a sua influência sobre elas.65 No caso do interior baiano, no final
da década de 1950, o comércio era um fator preponderante para a constituição de cidades com
essa característica, pois, nesse período, no estado da Bahia, a modesta industrialização da sua
capital e a ausência de um adequado sistema de transportes que a conectasse com o interior,
apresentava como mais conveniente aos comerciantes das cidades interioranas comprarem o
que necessitavam nos centros mais próximos, onde também a atividade industrial não era
predominante.66
Alagoinhas, desde fins do século XVIII, teve a sua expansão atrelada à sua localização
geográfica, pois se situava em um ponto favorável ao fluxo do tráfego comercial entre o
litoral e o sertão.67 Uma intensa modificação foi experimentada a partir da instalação da
ferrovia Bahia and San Francisco, em 1863, cujo objetivo era ligar Salvador à Juazeiro, pois

62
LEFEBVRE, Henry. O direito à cidade. São Paulo: Editora Moraes, 1991. p.3-4.
63
SANTOS, Milton. A urbanização Brasileira, op. cit., p.31.
64
Idem, p.65.
65
Idem, p.58.
66
TRICART, Jean; SANTOS, Milton, op. cit., p.22-23.
67
De acordo com Naylor Vilas-Boas nesse ponto havia um “vai e vem de boiadas, tropas, mercadorias,
andarilhos e palmeadores”. Ver: VILAS-BOAS, Neilor. Traços da vida de Ignácio Pascoal Bastos. Alagoinhas:
Tipografia Malu Editora, 1959. p.6.
22
foi determinado pelo poder público a transferência da sede da então Vila de Santo Antonio
d’Alagoinhas para as imediações da estação ferroviária, situada a cerca de três quilômetros do
núcleo populacional já existente.68
Em meados do século XX, a cidade de Alagoinhas se constituía em um centro comercial
importante para as cidades com quem mantinha contato através dos trilhos da Viação Férrea
Federal do Leste Brasileiro (VFFLB) e de algumas rodovias. Até 1961, ano em que se
emancipou politicamente o distrito alagoinhense de Aramari,69 Alagoinhas limitava-se com os
municípios de Catu, Entre Rios, Inhambupe, Irará, Mata de São João e Santo Amaro.70
Todavia, as cidades com as quais Alagoinhas mantinha contato e estendia a sua influência
comercial se dava para além das cidades limítrofes, chegando a alcançar uma área de
transição entre o litoral e o sertão, que rendia a denominação de “porta de ouro dos sertões
baianos” ou “porta aberta do polígono da seca”.71 A condição de funcionar como uma espécie
de elo entre o litoral e o sertão era favorecida pela conexão propiciada pelos ramais de
transporte existentes. Esta conexão era percebida através do entroncamento ferroviário que se
dispersava em três sentidos: Alagoinhas-Salvador, Alagoinhas-Juazeiro e o que partia de
Alagoinhas e alcançava a cidade de Propriá no estado vizinho de Sergipe;72 e também por
meio das rodovias que cruzavam Alagoinhas também em três direções, no sentido de
Salvador,73 no sentido da rodovia Transnordestina alcançando as cidades de Ribeira do
Pombal e Tucano onde dividia a sua influência com Feira de Santana e em direção à rodovia
que seguia para o estado de Sergipe.74
Esse processo em que uma cidade exerce um papel de centralidade em uma determinada
zona de influência urbana, de acordo com Milton Santos, resulta da associação de dois fatores:

a)presença de serviços e funções que garantam à aglomeração a possibilidade de


atender às necessidades de certa porção da área que a circunda; e b) existência de
uma rede de transportes destinada a permitir que a primeira influência se exercite e
através da qual a cidade entra em relações com o exterior.75

68
BARREIRA, Américo. Alagoinhas e Seu Município. Alagoinhas: Typografia do Popular, 1902. p. 27 e 38-43.
Sobre a estrada de ferro Bahia and San Francisco na segunda metade do século XIX, ver: SOUZA, Robério
Santos. Experiências de trabalhadores nos caminhos de ferro da Bahia: trabalho, solidariedade e conflitos
(1892-1909). Dissertação de mestrado, Campinas: UNICAMP, 2007.
69
BSEI. FUNDAÇÃO DE PESQUISAS (BA). Comportamento demográfico e divisão territorial do Estado da
Bahia de 1940-1970. Salvador, 1976, volume 3. p.24.
70
Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XX. Rio de Janeiro, 1958. p.21.
71
FIGAM. SOUZA, Aurélio Ângelo de. O espaço e a posição geo-astronômica do município de Alagoinhas.
Coleção Paralelo 12, volume 1. Alagoinhas: CECALCA, 1958. p.4-5.
72
Idem, p.23.
73
Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XX. Rio de Janeiro, 1958. p.23.
74
SANTOS, Milton. Zonas de influência comercial no Estado da Bahia, op. cit., p.44.
75
TRICART, Jean; SANTOS, Milton, op. cit., p.22.
23
Nesse contexto, Alagoinhas era servida por uma rede de transportes que lhe colocava
em conexão com outros centros e as cidades que estavam no seu raio de influência.
Entretanto, outros aspectos contribuíam para a constituição da sua posição de centralidade
com relação às demais cidades, a ponto de estabelecer-se como um importante centro urbano
do ponto de vista regional.76
No espaço de vinte anos, compreendido entre os anos de 1940 e 1960, percebeu-se em
Alagoinhas um aumento de cerca de 97% da sua população. Desse modo, Alagoinhas, em
1940, contava uma população de 37.827 habitantes, sendo que 15.301 destes estavam fixadas
na sede do município, o equivalente a 40,45% da população total;77 em 1950 contabilizava um
total de 52.007, com 21.283 destes na área urbana, o que significava 40,92% do contingente
populacional;78 e em 1960, quando ocorreu o aumento mais significativo, alcançou o número
de 74.455 habitantes para a sua população total. Nesse censo, não foi identificado o número
da população na área urbana, mas indica o número de 11.869 migrantes que passaram a viver
no município desde 1950.79
Durante grande parte desse período, a produção agrícola, com destaque para a produção
de fumo, laranja e leite, e o comércio respondiam como as principais atividades econômicas
do município.80 Na década de 1950, a atividade de curtimento de couros e peles despontou
como a base da economia local.81 Em 1952, havia oito curtumes funcionando e dois por
iniciar as suas atividades.82 Todavia, essa liderança dos curtumes na economia local não se
sustentou por muito tempo. Em 1955 os curtumes São Paulo e Santa Cruz, os dois maiores da
cidade, faliram, promovendo a demissão de cerca de 300 operários83 e o desamparo para
“mais de 1.300 pessoas de suas famílias”, segundo Romualdo Campos, Vereador e presidente
do sindicato da referida categoria.84 Cabe salientar que o declínio da atividade de curtimento

76
Idem, p.31.
77
Recenseamento Geral do Brasil de 1940. Série Regional, parte XII-Bahia, Tomo 1, IBGE, 1950. p.61.
78
Censo Demográfico de 1950. Série Regional, volume XX, tomo 1, Estado da Bahia, IBGE, 1955. p. 100.
79
Censo Demográfico de 1960. Série Regional, volume 1, tomo VIII. FIBGE, Departamento de Estatística da
População. p.80 e 98.
80
Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XX. Rio de Janeiro, 1958. p.22-23.
81
Dados preliminares da sinopse do município de Alagoinhas. 10.02.1955. Disponível na Agência do IBGE em
Alagoinhas. p.1.
82
ACMA. Requerimento apresentado pelos vereadores Joaquim Batista Filho e Thiago Evangelista dos Santos
em 15.09.1952. Livro de Requerimentos (1952).
83
Bahia de Todos os Fatos: Cenas da Vida Republicana–1889-1991 – Salvador: Assembléia Legislativa, 1997.
p.225.
84
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Romualdo Campos em 03.02.1956. Romualdo Campos foi
presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Curtimento de Couros e Peles de Alagoinhas durante a
década de 1950 e eleito Vereador pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), em 1950, e pelo Partido Social
Democrático (PSD) nas eleições subsequentes de 1954, 1958 e 1962. A sua atuação na Câmara de Vereadores de
Alagoinhas será alvo de discussão nos capítulos II e III.
24
de couros em Alagoinhas prosseguiu e no final da década de 1960 somente dois curtumes
estavam em operação.85
Em 1959, havia em Alagoinhas, no setor industrial, 3 estabelecimentos dedicados à
prática extrativa, especificamente, de produtos minerais, mas preponderava a indústria de
transformação com um total de 130 estabelecimentos (ver Tabela 6). E na década de 1960,
como foi observado, a extração de petróleo e a indústria cerâmica, ao lado do comércio
passaram a figurar nas posições de maior destaque na economia do município.

Tabela 6 - Número e gênero dos estabelecimentos da indústria de transformação em


Alagoinhas (1959)
Minerais não metálicos 31
Material de transporte 02
Madeira 11
Mobiliário 13
Couros, peles e produtos similares 09
Produtos de perfumaria, sabões e velas 04
Vestuário, calçados e artefatos de tecido 09
Produtos alimentares 37
Bebidas 03
Fumo 02
Editorial e gráfica 05
Diversos 04
Total 130
Fonte: Censo industrial de 1960 (Sergipe – Bahia - Minas Gerais). Volume III, Tomo IV. p.54-55.

A presença da Petrobrás em Alagoinhas, a partir de 1959, é tomada como um


importante fator de atração de fluxos migratórios e dinamização da economia local ao
distribuir salários e contribuir para a elevação o orçamento municipal através dos royalties.
Entretanto, a projeção da extração de petróleo como principal atividade econômica do
município ocorreu em um momento de retração das atividades que anteriormente ocupavam
uma posição de liderança. De certo modo, esse processo, percebido no decurso da década de
1960, refletia a diminuição do papel de centralidade de Alagoinhas no espaço regional que se
deu em consequência de motivações diversas. A melhoria da malha rodoviária que facilitava o
acesso até Salvador foi uma delas, pois passou a proporcionar o escape para esta Capital de
uma parcela da clientela que outrora buscava em Alagoinhas o seu comércio, assim como os

85
ERDENS, Antonia Déa (Dir). Contribuição ao estudo do recôncavo: 1. Alagoinhas. Laboratório de
Geomorfologia e Estudos Regionais. Salvador: Universidade Federal da Bahia, 1968. p. 4.
25
serviços que dispunha nas áreas de saúde e educação. Acrescente-se a crise na produção
agrícola na região circundante, que diminuiu o potencial de Alagoinhas como centro
redistribuidor, e o desmoronamento das atividades de beneficiamento do fumo e do couro, de
maneira que em 1968 Alagoinhas possuía apenas dois trapiches e dois curtumes em
funcionamento. A produção de laranja, também, diminuiu drasticamente. Os pomares que
havia em chácaras situadas nas imediações da cidade passaram a dar lugar a ocupação
residencial naquele contexto de expansão urbana.86
Quanto ao comércio alagoinhense, este mantinha intercâmbio com outros centros como
Salvador, Aracaju, Maceió, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo e estava estabelecido em ruas
da área central da cidade. Eram armazéns, bares, lojas de tecidos, alfaiatarias, sapatarias,
farmácias etc. que estavam distribuídas no entorno da Praça J. J. Seabra e ruas adjacentes,
como Coronel Anísio Cardoso, Soror Angélica, Pedro Pondé, Praça da Bandeira, Conselheiro
Moura, D. Pedro II, Rodrigues Lima, Coronel Tamarindo. Além disso, era possível encontrar
nestas ruas os serviços de médicos, dentistas e advogados que tinham os seus escritórios ou
consultórios ali instalados, onde algumas pessoas, também mantinham residências.87 Possuía,
também, uma feira situada nos arredores da Praça J. J. Seabra que se expandiu até a Praça da
Bandeira. Essa expansão ficou conhecida como “feira do pau” e foi deslocada em 1955, na
gestão do Prefeito Antonio Martins de Carvalho Júnior, na direção da Rua Coronel
Tamarindo, se aproximando da Escola Brasilino Viegas.88 Em meados do século XX já existia
em atividade uma agência bancária da Caixa Econômica Federal89 e, paralelo ao crescimento
populacional e do número de estabelecimentos comerciais, industriais e de serviços em
Alagoinhas, outras agências foram instaladas. Assim, foram inauguradas as agências do
Banco do Brasil em 1941, do Banco Econômico da Bahia em 1947 e do Banco da Bahia em
1951.90 E em 1948 uma filial do Banco do Comércio e da Indústria de Sergipe já
funcionava.91
As ruas localizadas na parte central da cidade de Alagoinhas, onde estavam
estabelecidas casas comerciais, escritórios, consultórios e algumas residências, se distinguiam
das ruas situadas em áreas mais afastadas, como as ruas 2 de Julho, Castro Alves, 14 de
Janeiro, Conselheiro Junqueira, dentre outras, no que se refere à infra-estrutura urbana. Em

86
Idem, p. 3-5 e 29-31.
87
É possível afirmar a esse respeito a partir da identificação dos anunciantes das páginas dos jornais Correio de
Alagoinhas (1942-1944), O Nordeste (1948-1956) e Alagoinhas Jornal (1957-1960).
88
APJR. O Nordeste, 28.05.1955, p.1.
89
BARROS, Salomão, op. cit., p.268.
90
Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XX. Rio de Janeiro, 1958. p.22-23.
91
APJR. O Nordeste, 13.08.1949, p.8.
26
1953, Almiro de Carvalho Conceição, ex-vereador e então presidente do Círculo Operário de
Alagoinhas, fazia a seguinte constatação:92

Os bairros proletários da cidade continuam sem luz, sem água, sem esgoto, sem
calçamento, e sem qualquer diversão para as suas famílias. Os melhoramentos,
sempre feitos no centro da cidade, onde residem os abastados, os felizardos da
fortuna, e o abandono reina sempre nos bairros onde reside a camada pobre.93

Cabe lembrar que o serviço de iluminação foi inaugurado em Alagoinhas em 1929 e em


1953 existiam queixas a respeito da sua ausência em bairros afastados do centro da cidade.94
O depoimento de Almiro Conceição, no ano de 1953, em tom de oposição ao governo
municipal, se situa em um momento em que ele tinha rompido com o PSD, partido governista,
e quando já pairava o debate acerca da sucessão municipal, prevista para o ano seguinte. Mas
ao analisar alguns relatórios do Executivo Municipal de Alagoinhas, emitidos na década de
1940 e 1950, se percebe que as ações voltadas para a dotação da infra-estrutura urbana, ao
longo do tempo, de fato, se concentraram no centro da cidade.95 Na verdade, esse é um
reflexo de como se desdobra um processo de urbanização sob a égide do capitalismo, em que
a canalização dos investimentos públicos na cidade não é imparcial e a distribuição dos
equipamentos, da infra-estrutura e dos serviços urbanos não é concentrada onde residem mais
pessoas. Por isso, como afirma Maria Sposito, “as contradições sociais impostas pelo
desenvolvimento capitalista estão impressas na estrutura e na paisagem urbana”.96 E, na
medida em que a dotação da infra-estrutura urbana não é implementada de igual maneira em
todo o espaço se “acentua uma “valorização” diferencial de uma área para outra” e, assim,
“apenas uma parte da população tem acesso à infra-estrutura, aos equipamentos e aos serviços
públicos urbanos.”97 Disso resulta uma territorialização da pobreza na cidade a partir do
desenvolvimento de bairros proletários, em áreas afastadas do centro onde são menos
valorizadas por serem carentes de serviços urbanos.98

92
No capítulo seguinte será abordado sobre a atuação de Almiro de Carvalho Conceição como Vereador na
legislatura de 1948-1950.
93
APJR. O Nordeste, 10.01.1953, p.6.
94
Sobre a iluminação e os impasses da modernização alagoinhense nas décadas de 1930 e 1940, ver: PAIXÃO,
Carlos Nássaro Araújo da. Traços da cidade de Alagoinhas: Memória, política e impasses da modernização
(1930-1940). Dissertação de mestrado, Santo Antonio de Jesus: UNEB, 2009.
95
APMA. Relatório apresentado à Câmara Municipal de Alagoinhas pelo Prefeito João Dourado Cerqueira Bião
referente ao período administrativo de 1º de janeiro a 31 de dezembro de 1949; Relatórios apresentados pelo
Prefeito Antonio Martins de Carvalho Júnior referente a 1941, 1956, 1957 e 1955-1959 recapitulando 1937-
1943; APJR. Relatório apresentado pelo Prefeito Pedro Dórea referente ao ano de 1951 e publicado em O
Nordeste, 08.01.1952, p. 06-07; Relatório apresentado pelo Prefeito Pedro Dórea referente ao ano de 1952 e
publicado em O Nordeste, 16.02.1953, p.4-5.
96
SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão. Capitalismo e Urbanização. São Paulo: Contexto, 1989. p. 79-80.
97
Idem.
98
RODRIGUES, Arlete Moyses. Moradia nas cidades brasileiras. São Paulo: Contexto, 1994. p.33 e 63.
27
Se o comércio e a rede de transportes existentes eram fatores que favoreciam a
Alagoinhas assumir uma condição de centralidade em relação às cidades do seu entorno, os
serviços de saúde disponíveis, no setor público e privado, se constituíam como outra variável
que confluía para esse processo. A esse respeito, um estudo do IBGE publicado em 1955
expõe que:

A cidade de Alagoinhas por ser sede natural de uma vasta região (nordeste
baiano), é procurada por grande número de doentes de inúmeras localidades para
tratamentos, partos e operações cirúrgicas em consultórios médicos particulares e
nos hospitais.99

A partir dessa informação, é possível perceber as seguintes indicações: em primeiro


lugar que havia “inúmeras localidades”, onde o serviço de saúde era frágil, a ponto de um
“grande número de doentes” buscar Alagoinhas. Por certo, estas “inúmeras localidades”
correspondiam às cidades circunvizinhas de Alagoinhas. Diante disso, cabe formular a
seguinte indagação: como estava estruturado o atendimento público dos serviços de saúde
sediados em Alagoinhas, os quais também atendiam a uma demanda formada, inclusive pela
população de outros municípios? É importante ressaltar que entre 1940 e 1960, Alagoinhas
assistiu a um processo de crescimento populacional, bem como a maioria dos demais
municípios que lhe circundava, constituindo-se como exceções nesse processo, apenas, as
atuais cidades de Cardeal da Silva, Pedrão e Ouriçangas.100
Em 1958, havia treze médicos e oito dentistas atuando em Alagoinhas, muitos deles
com consultórios particulares instalados no centro da cidade e que anunciavam seus serviços
nas páginas de jornais locais.101 O atendimento gratuito era oferecido, basicamente, por três
unidades: o Hospital Regional Dantas Bião, inaugurado em 1944,102 que possuía 82 leitos e
era mantido pelo Governo do Estado da Bahia; a Santa Casa de Misericórdia com 38 leitos,
mantida pela irmandade da Santa Casa de Misericórdia, embora, por vezes recebesse auxílios
do poder público; e a Maternidade Nossa Senhora de Fátima, a única da cidade, com 23

99
Dados preliminares da sinopse do município de Alagoinhas. 10.02.1955. Disponível na Agência do IBGE em
Alagoinhas. p.3.
100
SILVA, Barbara-Christine Netwig. Dinâmica do crescimento demográfico urbano e rural no Estado da Bahia:
1940-1980. p.71. In: Geografia. Rio Claro: Associação de Geografia Teorética, Vol. 14, nº27, 67-76, abril 1989;
BSEI. FUNDAÇÃO DE PESQUISAS (BA). Comportamento demográfico e divisão territorial do Estado da
Bahia de 1940-1970. Salvador, 1976, volume 3. p. 43-64.
101
BPEB. Correio de Alagoinhas, 09.06.1942, p.1; 04.10.1943, p.2; 31.12.1943, p.1-3; APJR. O Nordeste,
28.01.1949, p.4, 02.10.1949, p.1, 13.03.1950, p.3, 02.03.1951, p.4, 06.06.1953, p.2, 11.06.1954, p.2, 04.03.1955,
p.2; APWC. Alagoinhas Jornal, 21.10.1957, p.2 e 01.12.1958, p.2.
102
BARROS, Salomão, op. cit. p.255.
28
leitos,103 e que era mantida pela iniciativa particular de Maria Conceição Jaqueira, atendendo
a “parturientes pobres da região”.104 Em meados do século XX também era comum a
realização de partos nos domicílios através de uma parteira-prática.105
Em 1952, o jornal O Nordeste apontava um panorama sobre a assistência médica
pública em Alagoinhas, a qual enfrentava dificuldades diante da deficiência no repasse de
recursos pelo poder público:
Não se pode escurecer que a Santa Casa [de Misericórdia] não é um, estabelecimento
modelar, mas isto não acontece por culpa dos seus dirigentes. São parcos os recursos
com que conta, dentre os quais avultam grandes quantias de subvenções não
recebidas. Críticas ouvimos a cada instante contra o Hospital Regional Dantas Bião –
Vale em favor desta a mesma defesa. Com verbas limitadas e impontuais, que mais
poderíamos esperar dos seus serviços.106

Esse mesmo jornal asseverava quanto à abrangência do atendimento desses


estabelecimentos que, no caso da Santa Casa de Misericórdia, estendia “o seu raio de ação até
fora das fronteiras municipais”, e o Hospital Regional Dantas Bião que atendia “além dos
doentes que rotineiramente pedem auxílios, os acidentados nos muitos desastres verificados
no seu raio de ação”, mas também vítimas “de acidentes de veículos em Catu, Inhambupe,
Itapicuru, Soure e em Pombal.”107
Em função de serem parcos os recursos destinados aos hospitais alagoinhenses,
responsáveis pelo atendimento gratuito não só da população local, mas também de cidades
adjacentes, a cidade de Alagoinhas enfrentava dificuldades para atender a essa demanda.
Queixas a esse respeito foram demonstradas no final da década de 1950 em periódicos
locais.108
No que se refere aos serviços no setor de educação, durante a década de 1950,
Alagoinhas dispunha de 75 escolas de ensino primário, sendo 66 delas públicas. O ensino
ginasial era oferecido somente por 2 escolas, ambas particulares, que, embora recebessem
subvenções do poder público, não ofereciam preços acessíveis para a maioria da população.109
Mas, essas escolas se apresentavam como uma alternativa para alguns pais, do município ou
de cidades circunvizinhas, evitar o deslocamento dos seus filhos para a capital do estado,

103
Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XX. Rio de Janeiro, 1958. p.24.
104
BARROS, Salomão, op. cit., p.256; APWC. Alagoinhas Jornal, 17.06.1958, p.3.
105
APJR. O Nordeste, 07.08.1953, p.6, 19.08.1953, p.3, 26.02.1954, p.2; APWC. Alagoinhas Jornal,13.05.1959,
p.6.
106
APJR. O Nordeste, 30.04.1952, p.4.
107
Idem.
108
APWC. Alagoinhas Jornal, 11.01.1958, p.1.
109
APJR. O Nordeste, 08.01.1952, p.12 e 27.01.1954, p.1.
29
obviamente desde que dispusessem de recursos financeiros.110 Apenas em 1960 se anunciava
a instauração de um escola com um curso ginasial gratuito, vinculado a Campanha Nacional
do Ensino Gratuito (CNEG),111 com previsão de no ano seguinte iniciar as atividades.112 No
final da década de 1950, estava em funcionamento a Escola Profissional Ferroviária, fundada
em 1941, e também encontravam-se disponíveis na cidade cursos de corte e costura,
datilografia, alfaiataria, sapataria, dentre outros.113
Pode ser afirmado que a cidade de Alagoinhas na metade do século XX vivenciava um
processo de desenvolvimento urbano e aumento da sua capacidade de responder como
importante centro distribuidor de bens e serviços para o seu entorno. Entretanto, esse processo
não repercutia em melhores condições de trabalho para determinadas categorias profissionais,
como os curtumeiros, servidores municipais e ferroviários, ou na superação das deficiências
presentes na oferta de serviços públicos e na infra-estrutura de bairros operários. Tudo indica
que este conjunto de elementos influía para a organização de entidades de caráter associativo
ligadas aos trabalhadores como o Centro Operário Beneficente de Alagoinhas114 e o Círculo
Operário de Alagoinhas;115 para a criação de orfanatos,116 escolas e ambulatórios117 por
entidades religiosas. Ou ainda, como será discutido nos capítulos seguintes, para a eleição de
vereadores que atuaram como intermediários entre as demandas de trabalhadores junto ao
Estado e agências governamentais, pois, como afirma Parta Chatterjee, a cidadania não se
estabelece como algo universal e, diante disso, os grupos populacionais pobres buscam atrair
apoio para influenciar na implementação de políticas públicas em seu favor.118

110
APJR. O Nordeste, 08.01.1952, p.12; Ver também: APWC. Alagoinhas Jornal, 06.04,1959. p.1.
111
Segundo Haeckel Meyer, a implantação dessa escola ginasial em Alagoinhas era projetada por membros da
sociedade civil e o seu custeio seria realizado através de “contribuições mensais da população numa prova de
solidariedade humana em favor dos pais mais humildes.” Ver: Alagoinhas Jornal, 23.04.1960. p.1.
112
APWC. Alagoinhas Jornal, 20.05.1960. p.6.
113
Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XX. Rio de Janeiro, 1958. p.22-23.
114
FIGAM. Jornal Sete Dias, 17.03.1949, p.5-6.
115
APJR. O Nordeste, 02.06.1949, p.2; BARROS, op. cit., p.64.
116
APJR. O Nordeste, 06.10.1951, p.6, 31.06.1956. p.2.
117
APJR. O Nordeste, 31.03.1953, p.4; Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XX. Rio de
Janeiro, 1958. p.24.
118
Segundo Parta Chatterjee, uma vez que a cidadania não se universaliza os grupos populacionais pobres,
visando alcançar políticas públicas que lhes tragam benefícios, constroem “um largo conjunto de ligações fora
do grupo com outros grupos em situações similares, com grupos mais privilegiados e influentes, com
funcionários governamentais, talvez com partidos e líderes. Esses grupos em geral fazem uso instrumental do
fato de poder votar nas eleições.” Ver: CHATTERJEE, Partha. Colonialismo, modernidade e política. Salvador:
EDUFBA, CEAO, 2004. p. 114-115.
30
3. Dinâmica populacional e urbana em Alagoinhas

Semelhante a uma grande parte de municípios brasileiros, Alagoinhas, na transição da


primeira para a segunda metade do século XX, teve uma elevada expansão do seu contingente
populacional.119 Conforme já foi visto, nos vinte anos compreendidos entre o início da década
de 1940 e o final da década de 1960, a população total de Alagoinhas praticamente duplicou.
Em 1950 Alagoinhas passou a figurar como a 5ª cidade da Bahia em efetivo populacional.120
O censo de 1960 é omisso no que se refere à identificação dos índices relacionados à
população urbana. Mas, é conveniente supor que, neste período, este segmento da população
de Alagoinhas tenha se ampliado significativamente ou, até mesmo, superado o contingente
populacional fixado na área rural do município, em função de ter sido entre os anos de 1950 e
1960 que se constatou o aumento demográfico mais acentuado da população total, que passou
de 52.007121 para 74.455.122
Mas, quais teriam sido as motivações da expansão demográfica que se desdobrou em
Alagoinhas entre 1940 e 1960? Segundo Neide Patarra, para a compreensão de uma dinâmica
demográfica convém lançar mão da análise das seguintes variáveis: natalidade, mortalidade e
migração.123 Porém, a inexistência de dados consistentes a esse respeito sobre Alagoinhas,
não permite, por exemplo, a quantificação dos diferenciais entre os índices de natalidade e
mortalidade, ou mesmo a percepção de indicadores de possíveis fluxos migratórios
recepcionados nessa cidade. Por isso, há empecilhos para o alcance de uma melhor
compreensão da dinâmica demográfica que esteve em curso em Alagoinhas durante o período
em enfoque. Por enquanto, o que é possível perceber são indícios das prováveis motivações
da aludida expansão demográfica.

119
Sobre a expansão demográfica no Brasil, ver: PATARRA, Neide L. Dinâmica populacional e urbanização no
Brasil: o período pós-30 in: PEIRUCCI, Antonio Flávio de Oliveira (Dir). O Brasil Republicano: Volume 4:
economia e cultura (1930-1964). 3ª edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004. p.256; SANTOS, Milton. A
urbanização Brasileira. 5ª edição. São Paulo: Edusp, 2008. p.31.
120
Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XX, Rio de Janeiro, 1958. p.22.
121
Censo Demográfico de 1950. Série Regional, volume XX, tomo 1, Estado da Bahia, IBGE, 1955. p. 100.
122
Censo Demográfico de 1960. Série Regional, volume 1, tomo VIII. FIBGE, Departamento de Estatística da
População. p.80 e 98. Há informações que asseguram que em 1950 a população urbana de Alagoinhas
correspondia a 49,9% da população total, enquanto a rural era de 50,1%, praticamente se equiparando os
quantitativos populacionais desses dois setores. Em 1960, a população urbana equivalia a 59,7%, ultrapassando
desse modo a população rural, que exibia o índice de 40,3%. Essas informações são fornecidas por um estudo
desenvolvido pela Secretaria de Planejamento, Ciência e Tecnologia do Estado da Bahia. Todavia na discussão
desenvolvida neste capítulo optou-se em tomar como base apenas os dados fornecidos pelos censos do IBGE.
Ver: BSEI. FUNDAÇÂO DE PESQUISA (BA). Comportamento demográfico e divisão territorial do Estado da
Bahia de 1940-1970. Salvador, 1976, volume 3. p.44.
123
PATARRA, Neide L., op. cit., p.258.
31
A indisponibilidade, por parte do Cartório de Registro Civil de Alagoinhas, das
anotações oficiais de nascimentos, casamentos e óbitos, limita a compreensão do grau de
contribuição desses aspectos na dinâmica demográfica que se processava em Alagoinhas.
Porém, uma constatação parcial é possível quando analisados os dados provenientes de uma
documentação paroquial, necessariamente os Livros de Registros de Casamentos da Paróquia
de Santo Antonio, em Alagoinhas, que podem proporcionar uma visualização acerca do
número de casamentos realizados e indicações sobre fluxos migratórios que se destinaram
para Alagoinhas.124 Inevitavelmente, a análise dessa documentação oferecerá limites, pois
somente serão acessadas informações sobre uma determinada parcela da população, no caso
os católicos, muito embora estes se constituíssem como preponderante, do ponto de vista
religioso, em Alagoinhas, no período ora em discussão, segundo o IBGE.125
Diante disso, é possível notar, entre os anos de 1940 e 1959, uma evolução, que não foi
linear, no que diz respeito ao número de matrimônios celebrados ao longo desse período.
Partindo do princípio de que a natalidade tende a se ampliar ou diminuir proporcionalmente
ao número de casamentos realizados,126 é válido considerar que a natalidade tenha se
expandido em Alagoinhas, pois, de acordo com os dados expostos na tabela abaixo, se em
1940 foram registrados 116 casamentos, em 1947 esse número ficou muito próximo do dobro.

124
A Paróquia de Santo Antonio ficava situada na sede do município e correspondia a uma das quatro paróquias
da Freguesia de Alagoinhas. As demais paróquias estavam estabelecidas nas sedes dos distritos de Araçás, Boa
União e no Povoado de Olhos D’água. Ver: Enciclopédia dos municípios brasileiros. IBGE, volume XX. Rio de
Janeiro, 1958. p.25. Quanto a utilização aqui de uma documentação paroquial é realizada tão somente com o
objetivo de alcançar uma visão aproximada dos fluxos migratórios que se deslocaram para Alagoinhas. Não é
propósito de nesse estudo compreender a dinâmica demográfica em Alagoinhas a partir das técnicas utilizadas
pela História Demográfica. Tais técnicas, geralmente são aplicadas em análises de períodos em que inexistem
levantamentos censitários e exploram informações relacionadas aos registros de nascimentos, de casamentos e
de óbitos para operacionalizar uma minuciosa pesquisa sobre trajetórias de famílias, com a finalidade de
identificar o movimento de determinadas formações populacionais e a sua articulação com as instâncias
econômica, cultural, política, e assim por diante. Sobre História Demográfica ver: HENRY, Louis. Técnicas de
análises em Demografia Histórica. Gradiva: Lisboa, 1988; NADALIN, Sérgio Odilon. A demografia numa
perspectiva histórica. São Paulo: ABEP, 1994; FARIA, Sheila de Castro. História da Família e Demografia
Histórica. In: CARDOSO, Ciro Flamarion e VAÍNFAS, Ronaldo (Org). Domínios da História: Ensaios de teoria
e metodologia. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1997; MARCÍLIO, Maria Luiza. Crescimento histórico da
população brasileira até 1872. Cadernos do CEBRAP, São Paulo, v. 16, p. 2-26, 1973. Um farto número de
estudos em História Demográfica, sobre o Brasil e outros países da América Latina, se encontram
disponibilizados no site http://www.brnuede.com/ do Núcleo de Estudos em História Demográfica (NEHD).
125
Segundo o IBGE, em 1940, da população estimada em 37.827 habitantes, 36.925 deles eram católicos. E em
1950, dos 52.007 habitantes, 50.630 destes eram católicos. Sem desconsiderar a preponderância dos católicos no
contingente populacional alagoinhense, convém tomar criticamente a proporção atribuída a essa parcela da
população que segundo as estatísticas do IBGE correspondia a quase sua totalidade. Cabe ainda ressaltar que em
tais estatísticas não foram levadas em consideração religiões de matriz africana. Ver: Recenseamento Geral do
Brasil de 1940. Série Regional, parte XII-Bahia, tomo 1, IBGE, 1950. p.100; Censo Demográfico de 1950. Série
Regional, volume XX, tomo 1, Estado da Bahia, IBGE, 1955. p. 82.
126
NADALIN, Sergio Odilon. A demografia numa perspectiva histórica. São Paulo: ABEP, 1994. p.68.
32
A partir de 1949 foi ultrapassado o número de 200 matrimônios ao ano, sendo identificados
nos anos de 1954 e 1958 os picos de 301 e 305 casamentos realizados.

Tabela 7

Número de casamentos realizados na Paróquia de Santo Antonio em Alagoinhas (1940-


1959)
Ano 1940 1941 1942 1943 1944 1945 1946 1947 1948 1949
Nº de casamentos 116 124 143 95 126 146 167 221 194 257
Ano 1950 1951 1952 1953 1954 1955 1956 1957 1958 1959
Nº de casamentos 215 267 201 258 305 244 241 264 301 278
Fonte: Livro de Registro de casamentos da Paróquia de Santo Antonio. Vols. 01,02,03,04 e 05.

No que se refere às migrações, aspecto em que é reconhecidamente difícil de obter uma


visualização nítida,127nos censos de 1940 e 1950 estão ausentes dados a esse respeito, o que
dificulta um entendimento mais abrangente sobre a importância desse elemento na expansão
demográfica de Alagoinhas. Porém, o censo de 1960 indica que 11.869 migrantes passaram a
residir em Alagoinhas, pelo menos desde o ano de 1950.128
Diante dessa patente lacuna nos estudos sobre os fluxos migratórios que se dirigiram
para Alagoinhas, os Livros de Registros de casamentos da Paróquia de Santo Antonio
oferecem pistas, por vezes imprecisas e limitadas, seja porque, como já foi salientado,
correspondem a apenas uma parcela da população residente em Alagoinhas, no caso,
indivíduos católicos e que tiveram os seus matrimônios realizados entre 1940 e 1959 na
Paróquia de Santo Antonio sediada nesta cidade, ou mesmo por conta da divisão territorial
utilizada, que, por se basear no critério eclesiástico e não político-administrativo, permite
apenas a identificação do deslocamento de migrantes para Alagoinhas em um nível
interurbano. Sobre o fluxo de correntes migratórias no sentido campo-cidade ocorridas no
interior do município de Alagoinhas tal documentação não possibilita perceber.
Então, foram considerados apenas os nubentes nascidos fora do município de
Alagoinhas. Ao confrontar o seu local de nascimento com o da residência no período em que
foi realizado o matrimônio, identifica-se que houve movimento migratório com destino à
Alagoinhas. Cabendo ressaltar que não foi possível perceber a partir de que ano esses sujeitos
passaram a viver nesse município.

127
Idem, p.26.
128
Censo Demográfico de 1960. Série Regional, volume 1. Tomo VIII. FIBGE, Departamento de Estatística da
População. p.80 e 98.
33
O exame dos livros de registros de casamentos da Paróquia de Santo Antonio possibilita
a seguinte compreensão: Entre 1940 e 1959, 8.326 pessoas tiveram os seus casamentos
celebrados nessa paróquia. Deste total, 1.242 migraram para Alagoinhas, sendo 653 homens e
589 mulheres. Nota-se um fluxo migratório em escala interestadual, se destacando o estado
de Sergipe com 100 migrantes, seguido com números menos expressivos, Alagoas com 17 e
Pernambuco com 13. Outros estados da federação, como Minas Gerais, Ceará e São Paulo,
por exemplo, não aparecem com um quantitativo relevante.129 Os números mais
representativos de migrantes que se destinaram à Alagoinhas correspondem a municípios
limítrofes, como Inhambupe, Irará, Entre Rios, Santo Amaro e Catu. Também ocupava
condição semelhante os municípios, que estavam em conexão com Alagoinhas através das
vias ferroviária ou rodoviária, como Serrinha e Salvador, estando na sequência com números
inferiores Esplanada, Bonfim, Mata de São João, Rio Real, Cachoeira, Pojuca, Conde,
Itapicuru, e Tucano, conforme está exposto no gráfico abaixo.

Migrantes casados em Alagoinhas (1940-59)


Paróquia Santo Antônio
Irará Mata de São João
160
Inhambupe Rio Real
Número de migrantes

140
Salvador Cachoeira
120 Serrinha Pojuca
100 Entre Rios Conde
80 Santo Amaro Itapicuru
60 Catu Tucano
40 Esplanada Queimadas
20 Bomfim
0
Município de orígem

APSA. Livro de registros de casamentos da Paróquia de Santo Antonio. Vol. 01, 02,03, 04, 05.

A ausência de dados sobre mortalidade entre 1940 e 1960 em Alagoinhas prejudica a


análise da dinâmica demográfica desse período. Porém, há referência de que tal mortalidade
era acentuada no final da década de 1940, faltando, inclusive, túmulos para sepultamentos na
cidade. Este era o quadro que se apresentava em Alagoinhas em 1948, quando o município era
assolado por surtos epidêmicos de paludismo, sarampo e varíola. Segundo o Vereador Almiro
de Carvalho Conceição, nesse contexto, exigia-se a imediata ampliação do cemitério local, em
virtude “da grande mortalidade existente nos últimos anos”.130

129
APSA. Livro de registros de casamentos da Paróquia de Santo Antonio. Vols. 01, 02,03, 04, 05.
130
ACMA. Atas de 20.04.1948 e 30.07.1948 das sessões Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
34
Em 1950, a epidemia de paludismo ainda assolava a cidade.131 No ano seguinte a
discussão acerca da necessidade de ampliar o número de sepulturas no município mais uma
vez veio à tona.132 E em 1953, registrou-se também a presença da varíola em caráter
epidêmico, assim como da tuberculose em 1954.133 Sobre o paludismo, em particular,
acentuava-se a possibilidade de proliferação dos vetores desta moléstia em áreas alagadiças da
cidade que não recebiam ações de saneamento pelo poder público.
Estudos sobre a dinâmica demográfica, durante o século XX na Bahia, atribuem à
década de 1940, como marco, considerando que foi a partir desse período que a população do
estado passou a ter um crescimento mais elevado e em um ritmo mais intenso. É importante
salientar que houve dinâmicas diversas nesse processo nos municípios baianos, inclusive,
ocorrendo casos de decréscimo demográfico. Entretanto, se percebeu que, nesse quadro,
ganhou fôlego o processo de urbanização em paralelo ao de desruralização.134 Por exemplo,
enquanto Alagoinhas, como já foi exposto, atravessava, entre 1940 e 1960, um período de
elevado crescimento populacional, o mesmo não acontecia com outras localidades adjacentes
como Ouriçangas, Pedrão e Catu, que tiveram redução da sua população rural entre as
décadas de 1940 e 1960; Entre Rios na década de 1940 e Aporá na década de 1950 também
em igual situação. Entre 1940 e 1960 um processo análogo ocorreu com a população urbana
de Ouriçangas e Pedrão, que até 1963 faziam parte do município de Irará, e Cardeal da Silva
que até esse mesmo ano estava submetido politicamente a Entre Rios.135
Admitir que a dinâmica demográfica das cidades não obedecesse a uma mesma marcha,
não significa considerar que elas não possuam articulações em algum aspecto, pois a
migração é um componente que está diretamente ligado a essa problemática, uma vez que o
êxodo de parcela da população de determinado município termina sendo recepcionado por
outros.136 De acordo com Laerte Neves, os fluxos migratórios na Bahia, a partir da década de
1940, são caracterizados, basicamente, pelos seguintes movimentos: “um de origem rural e
outro de origem urbana e todos os dois com destino urbano”.137 Então, são dois movimentos,
um rural-urbano e outro urbano-urbano, ambos contribuindo para o acréscimo da população

131
ACMA. Ata de 24.11.1950 da sessão Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
132
ACMA. Atas de 10.06.1949, 20.04.1951 e 23.07.1951 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
133
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Horácio Dantas em 19.10.1953; ACMA. Requerimento
apresentado pelo Vereador Romualdo Campos em 19.04.1954. Livros de Requerimentos (1953/1954).
134
SILVA, Barbara-Christine Netwig, op. cit., p.67-75; NEVES, Laert Pedreira. O Crescimento de Salvador e
das demais cidades baianas. p.39-40. In: Estudos baianos. Salvador: UFBA, nº15, 9-98, 1985.
135
SILVA, Barbara-Christine Netwig, op. cit., p.69-71.
136
NEVES, Laert Pedreira. op. cit., p.43.
137
Idem.
35
citadina, assim como para a expansão urbana de determinadas cidades que recebem
contingentes migratórios.138
A carência de dados acerca de fluxos migratórios que se destinaram à cidade de
Alagoinhas impede uma melhor compreensão da possível relação entre esse processo e o
crescimento populacional em discussão. Na verdade, apenas o censo de 1960 traz números a
esse respeito como foi citado. Todavia, o que se pode inferir é que o desencadeamento de
fluxos migratórios provenientes de municípios situados nas imediações de Alagoinhas,
buscando essa cidade como destino era bastante provável. Como já foi visto na primeira parte
deste capítulo, enquanto Alagoinhas desempenhava um papel de centralidade na chamada
região de Alagoinhas, por se constituir em um centro com maior capacidade para a
distribuição de bens e serviços, as demais cidades que estavam inseridas nessa região
demonstravam fragilidades nesse aspecto. Além disso, parte desses municípios, especialmente
os localizados na zona nordeste do estado, ocasionalmente ficavam expostos a períodos de
estiagem. Nesse sentido, um estudo realizado na década de 1950, sobre a Bacia do Rio
Itapicuru, afirma sobre a irregularidade das chuvas nesta área, onde se situavam os municípios
de Cipó, Itapicuru, Nova Soure, Ribeira do Pombal e Tucano, os quais estavam nesse período
inseridos na zona de influência comercial de Alagoinhas. Nessa área, de que os municípios
referidos acima faziam parte, considera-se que a sangria demográfica era grande, através do
êxodo, observando que a ocorrência dessa questão não era motivada exclusivamente pelo
clima, mas também pelas “condições econômico-sociais aí vigentes: emprego estacional,
baixos rendimentos etc.”.139
Ainda sobre os fluxos migratórios ocorridos na Bahia, sobretudo a partir da década de
1940, Neves identifica a dificuldade que determinados municípios apresentavam para reter
parte da população que nessa conjuntura emigravam. Essa afirmação é feita quando são
analisados os fluxos migratórios na Bahia no sentido urbano-urbano, sendo apontada como
tendência predominante a saída de migrantes de cidades menores partindo para núcleos
urbanos maiores.140
Considerando Alagoinhas, em função da sua posição geográfica, como “porta aberta do
polígono das secas”, Aurélio Ângelo de Souza traz o seguinte testemunho sobre o trânsito de
migrantes por Alagoinhas:

138
Idem.
139
TRICART, Jean; SANTOS, Milton; SILVA, Tereza C. da; CARVALHO, Ana D. S. Reconhecimento
geográfico da Bahia do Rio Itapicuru. In: Estudos de Geografia da Bahia. Salvador: Livraria Progresso, 1958. p.
176 e 191-192.
140
NEVES, Laert Pedreira, op. cit., p.47.
36
Basta-nos espiar as levas de nordestinos que, em trânsito por esta Alagoinhas,
passam, malarrumados em “Paus-de-Arara”, no “Estrela do Norte”, no “Mochila”,
no “Rápido” e em “O Noturno”, para sabermos que, Alagoinhas é, realmente o
janelão entre o Recôncavo, os Sertões Baianos e o Nordeste.141

O testemunho acima não aponta a cidade de Alagoinhas enquanto local de destino de


“levas” de migrantes, mas indica-a enquanto ponto de passagem, condição essa que era
favorecida por nela estarem situados entroncamentos rodoviário, por onde era feito o traslado
dos “paus-de-arara”, e ferroviários, por onde circulava trens como o “Estrela do Norte”142 e o
“Mochila”, este último fazendo a conexão entre as estações de Calçada em Salvador e a de
Propriá em Sergipe.143 Porém, a possibilidade de Alagoinhas receber parte desses fluxos
migratórios não deve ser descartada, pois no verão de 1948, em artigo intitulado Combatamos
a mendicância, publicado no jornal alagoinhense O Nordeste, justificava-se a necessidade da
construção de abrigos para “pedintes”, alegando que: “Nossa terra conta, também, com a
predileção daqueles que, percorrendo localidades buscam auxílio para a sua manutenção”, e
prossegue considerando que: “A cidade tem estado infestada de pedintes, procedentes de
outros pontos do Estado, e talvez do país, em situação mesmo de comiseração”.144
Outro aspecto que se relaciona ao crescimento populacional de uma cidade é o
elastecimento da sua área ocupada. Desse modo, a expansão urbana, segundo Neves, seria
resultante da expansão demográfica.145 No caso de Alagoinhas, não foi identificado, em
compasso com o significativo crescimento populacional percebido durante o período em
discussão, alguma medida do poder público que buscasse alargar os limites do perímetro
urbano.146 Porém, há indicações através da imprensa local demonstrando a tendência para a
ocupação residencial em locais onde ainda não era efetiva essa condição. Desse modo, é
provável que esse processo de crescimento populacional tenha propiciado um gradual
adensamento demográfico de setores da cidade onde a ocupação residencial ainda era rarefeita

141
FIGAM. SOUZA, Aurélio Ângelo de. O espaço e a posição geo-astronômica do município de Alagoinhas.
Coleção Paralelo 12, volume 1. Alagoinhas: CECALCA, 1958. p.5-6.
142
ACMA. Ata de 07.12.1951 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
143
APJR. O Nordeste, 13.09.1948, p.5.
144
APJR. O Nordeste, 14.12.1948, p.1
145
NEVES, Laert Pedreira, op. cit., p.9 e 19-22.
146
Em 1932, visando ampliar o seu raio de ação, o Executivo Municipal pretendia ampliar em mais mil metros o
perímetro urbano, que nesse momento estava delimitado em 2 quilômetros. Ver: PAIXÃO, Carlos Nássaro de
Araújo, op.cit., p.86-87. Em requerimento expedido pela Câmara de Vereadores de Alagoinhas em 1952, era
alegado que a área urbana de Alagoinhas correspondia a 3 quilômetros, ou seja, a dimensão que em 1932
buscava-se instituir. Todavia não foi possível confirmar o momento em que foi oficializada essa redefinição nos
limites do perímetro urbano. Ver: ACMA. Requerimento apresentado pelos vereadores Joaquim Batista Filho e
Thiago Evangelista Santos em 15.09.1952. Livro de requerimentos (1952).
37
e ausentes de infra-estrutura urbana. A escassez de dados sobre a densidade demográfica
urbana de Alagoinhas, nesse período, impede uma melhor compreensão desse aspecto.147

Imagem 2: Ocupação da área urbana de Alagoinhas com Imagem 3: Consolidação da ocupação urbana de
a chegada da ferrovia em 1863. Alagoinhas, a partir do entorno da estrada de ferro.
Fonte: Plano Diretor Urbano da cidade de Alagoinhas, Fonte: Plano Diretor Urbano da cidade de Alagoinhas,
Volume III, 1977. Volume III, 1977.

Imagem 4: Área ocupada da cidade de Alagoinhas, após o


início da exploração de petróleo, em 1959, até a metade da
década de 1970. Considera-se a extração petrolífera como
um fator relevante na atração de fluxos populacionais para
o município no referido período.
Fonte: Plano Diretor Urbano da cidade de Alagoinhas,
Volume III, 1977.

147
Apesar de não ser tomado como referência por apresentar dados que divergem dos fornecidos pelo IBGE, um
estudo da Secretaria de Planejamento, Ciência e Tecnologia do Estado da Bahia, indica os seguintes índices com
relação à densidade demográfica para área urbana de Alagoinhas, enquanto diferença calculada entre a
população total e a população rural: em 1940 12,2 habitantes por km2; em 1950 19,1 habitantes por Km2; e em
1960 34,0 habitantes por Km2. Ver: BSEI. FUNDAÇÂO DE PESQUISA (BA). Comportamento demográfico e
divisão territorial do Estado da Bahia de 1940-1970. Salvador, 1976, volume 3. p.41 e 44.
38
Em 1948, Alcindo Camargo, colaborador do jornal alagoinhense O Nordeste, em
artigo publicado nesse periódico, identificava a carência de habitações e as limitações do
serviço de iluminação como “os dois magnos problemas” da cidade de Alagoinhas. O anúncio
da construção de 265 casas, sendo 180 destas de propriedade do Sr. Pedro Dórea, médico148
que foi eleito Prefeito municipal de Alagoinhas em 1950,149 e 85 de um tal Sr. Mascarenhas,
ainda eram consideradas insuficientes para a demanda existente naquele momento, sendo
afirmado por Alcindo Camargo que “Alagoinhas amplia-se, distende-se em todos os seus
quadrantes, principalmente do lado do 15 de Novembro”.150 E concluía: “Como as
propriedades constituem patrimônio rendoso, é de crer que capitalistas outros, inaugurem
novas vilas e parques que obviarão as aperturas residenciais em que nos debatemos”.151
O texto de Alcindo Camargo traz as seguintes indicações. Primeiro, com relação à
ampliação da área urbana de Alagoinhas, “principalmente do lado do 15 de Novembro”.
Possivelmente, o colunista refere-se às imediações da Rua 15 de Novembro, região da cidade
onde se desenvolveu uma ocupação residencial com grande presença de ferroviários e
abrigava, por exemplo, as ruas Castro Alves, 2 de Julho, Nossa Senhora das Graças, 1º de
Janeiro, 14 de Janeiro, Praça Santa Izabel, Alto do Corte e Baixa do Corte. Saliente-se que, no
final da década de 1940 e durante a década de 1950, esses logradouros foram alvos de
requerimentos encaminhados ao Executivo Municipal que solicitavam a resolução de
problemas enfrentados por seus moradores, no que diz respeito ao abastecimento de água, ao
serviço de iluminação e saneamento, como será possível perceber nos capítulos seguintes. E
segundo, com referência ao aumento da demanda por habitações na área urbana de
Alagoinhas, certamente resultante do gradual crescimento demográfico, em que a construção
de 265 residências era ínfima para atender a necessidade apresentada naquele momento.
Outra indicação de que a expansão urbana em curso em Alagoinhas implicava na
ocupação residencial de áreas ainda desprovidas de infra-estrutura urbana, está presente no
programa do pré-candidato à Prefeito municipal, em 1958, Walter Robatto Campos, quando
defendia uma campanha para a colocação de meios-fios em todas as ruas da cidade, pois “a
mesma está crescendo desordenadamente, sem obedecer a um plano urbanista”.152 E que “na

148
APJR. O Nordeste, 27.05.1953, p.2.
149
APJR. O Nordeste, 29.10.1950, p.6.
150
APJR. O Nordeste, 13.08.1948, p.3.
151
Idem.
152
APWC. Alagoinhas Jornal, 24.03.1958, p.1.
39
impossibilidade de calçá-las serão encascalhadas e niveladas com plainas niveladoras auto-
motrizes.”153
Como já foi salientado, há uma carência de informações que auxiliem a compreensão
da dinâmica do desenvolvimento da ocupação urbana de Alagoinhas, em particular, nas
décadas em que houve um relevante crescimento populacional. É válida a hipótese de que
uma das características do desenvolvimento urbano de Alagoinhas tenha sido a ocupação de
áreas em seu perímetro urbano que abrigava vazios residenciais, por vezes com feições que
remetem ao ambiente rural, com pomares, sítios e chácaras, e desprovidos de infra-estrutura
urbana, onde posteriormente sofreu um gradual acréscimo no assentamento populacional.154
Por exemplo, o bairro Jardim Pedro Braga se constituiu a partir da conversão de antigos sítios
de laranja em área residencial.155 Ou mesmo o bairro do Barreiro, que no final da década de
1970 era considerado de densidade populacional média, mais ainda com um “aspecto urbano-
rural”, pois abrigava em alguns pontos o desenvolvimento de uma agricultura de
subsistência.156
Mas, que outras implicações podem ter promovido o crescimento populacional ocorrido
em Alagoinhas nas décadas de 1940 e 1960? Pois, na medida em que esse processo estava em
curso, imprimia a necessidade da ampliação do número de habitações, de áreas urbanizadas e
da oferta de serviços públicos. Certo é que reivindicações relacionadas a essas questões
passaram a repercutir no ambiente político local, pois, como será discutido nos capítulos
posteriores, a partir do final da década de 1940, com o retorno das eleições diretas, houve a
eleição para o Legislativo Municipal de vereadores, que realizaram o exercício da
representação de interesses dos trabalhadores perante o Estado, reivindicando o atendimento
de demandas que se apresentavam nos setores de saúde, lazer, educação, infra-estrutura
urbana e que estavam relacionadas às aspirações desses sujeitos sociais.

153
Idem.
154
Em 1951 havia um anúncio intitulado “Terrenos para construção” que informava: “Vende-se uma faixa de
terra de 250 metros de frente, ótimo para loteamento para pequenas construções. Sito a Avenida Santo Antonio,
Teresópolis. Ver: APJR. O Nordeste, 22.11.1951, p.4; Em 1955 foi anunciado a venda de vários terrenos
disponíveis na Rua Luiz Viana. Ver: APJR. O Nordeste, 19.10.1955, p.5; Em 1956, foi anunciado a venda de
lotes no Parque Vitória que poderiam ser destinados a construção de “casas residenciais ou comerciais” e outros
na Rua Manoel Vitorino onde havia espaço “para a construção de 15 casas”. Ver: APJR. O Nordeste,
25.02.1956, p.6. Também em 1956 estava em atividade uma fazenda na Rua Conselheiro Junqueira que
anunciava venda de “enxertos de laranja”. Ver: APJR. O Nordeste, 17.11.1956, p.3. Em 1962 foi colocado a
venda 224 lotes, cada um possuindo cerca de 98 m2, situados na Rua Manoel Vitorino. Ver: APWC. Alagoinhas
Jornal, 30.03.1962, p.4.
155
FIGAM. ASSUNÇÃO, Dione Freitas. Análise geográfica de uma cidade média do estado da Bahia: O Caso
de Alagoinhas. Trabalho apresentado ao curso de Especialização em Conteúdos e Métodos do ensino superior,
seção I – Estudos Sociais. Pós-graduação em Educação. Universidade Federal da Bahia, 1977. p.21.
156
APMA. Plano Diretor urbano de Alagoinhas. Volume III. Organização atual e tendências de expansão
urbana: Alternativas e proposições para a ocupação do espaço urbano. Salvador, Junho de 1977. p.28-29.
40
Capítulo II
A “redemocratização” e os interlocutores dos trabalhadores no Legislativo
Municipal de Alagoinhas (1948-1954)

No capítulo anterior foi discutido o processo de crescimento populacional e urbano


vivenciado em Alagoinhas em meados do século XX, período em que esta cidade ocupava uma
posição de centralidade com relação às demais do seu entorno. Ficou indicado que nesse período a
cidade não apresentava condições satisfatórias de sobrevivência a todos os seus moradores. Como
foi visto, encontravam-se deficiências na infra-estrutura urbana, assim como no oferecimento dos
serviços públicos de saúde e educação.
Neste segundo capítulo será analisado como essas questões repercutiram na arena política
local, especialmente no Legislativo Municipal reaberto em 1948 após a derrocada da ditadura
estadonovista. Serão destacadas as duas primeiras legislaturas pós-Estado Novo, 1948-1950 e 1951-
1954, em que se percebe uma gradativa ampliação de interlocutores dos trabalhadores no
Legislativo Municipal e, por conseguinte, da mediação de demandas de determinadas categorias
profissionais – servidores municipais, operários em curtumes e ferroviários – junto ao poder
público, relacionadas a infra-estrutura urbana, condições de trabalho, acesso aos serviços de saúde e
educação.
Será visto que durante o período abordado neste capítulo, entre 1948 e 1954, havia uma série
de carências em localidades onde notadamente os ferroviários se apresentavam como maioria dos
habitantes, como o bairro 2 de Julho, a Rua Castro Alves e o distrito de Aramari, por exemplo, além
da difícil situação dos operários em curtumes e servidores municipais, no que concerne às
condições de trabalho enfrentadas. Cabe mencionar que ferroviários e operários em curtumes
tiveram representantes eleitos vereadores em Alagoinhas durante o período mencionado. Há
referências de que estas duas categorias de trabalhadores se configuravam em importante
contingente eleitoral durante a década de 1950. A elas, por exemplo, era atribuída grande parte da
votação recebida pelas candidaturas de Juscelino Kubitschek e João Goulart nas eleições
presidenciais de 1955.157
Portanto, foi a partir da reabertura do Legislativo Municipal de Alagoinhas, em 1948, que se
processaram as eleições de vereadores, dentre os quais saíram eleitos alguns operários, que, por

157
ACMA. Ata de 14.10.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

41
vezes, se apresentaram como interlocutores entre demandas de trabalhadores junto aos diferentes
níveis do Estado e órgãos governamentais. Vejamos a seguir a esse respeito.

1. A primeira legislatura pós-Estado Novo (1948-1950)

O fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, e o declínio dos regimes nazi-facistas


contribuíram para o fortalecimento da oposição no Brasil ao regime ditatorial vigente desde 1937.
Esta conjuntura anunciou a distensão do referido regime, trazendo o retorno das eleições diretas e
da atuação político-partidária, assim como a reabertura das Casas Legislativas. Todavia, esse
processo “não produziu uma substituição radical dos grupos no poder, embora exigisse uma
reformulação político-institucional”.158 Apesar da deposição do Presidente Getúlio Vargas, em
1945, a transição para a chamada “redemocratização” foi liderada pela “mesma elite política que
esteve a frente do regime deposto”.159 Porém, tratou-se de uma transição em que foi necessária uma
reorganização do aparato institucional, de maneira que se não houve mudanças profundas, também
não ocorreu uma continuidade plena.160
Mas teria o advento da “redemocratização” consistido no restabelecimento da democracia no
Brasil? Comumente há uma identificação entre democracia e democracia representativa, todavia
trata-se de noções distintas. Para Paul Hirst, a primeira seria uma forma de governo exercida
diretamente pela sociedade que se apresenta como um corpo que não estaria submetido a uma

158
SOUZA, Maria do Carmo Campelo de, op. cit., p. 63-64.
159
Idem.
160
Idem, p.134. Esse processo ocorreu em um contexto de ampliação da participação eleitoral de setores subalternos,
através do sufrágio e foi marcado pela reorganização do sistema partidário brasileiro, definindo como condição para que
os partidos fossem registrados a ligação a bases nacionais. Por isso, os partidos deveriam apresentar uma lista de 10.000
assinaturas que fossem oriundas de pelo menos cinco estados da Federação. Cabe destacar a emergência das quatro
legendas partidárias mais influentes no quadro político brasileiro desse momento: UDN, PSD, PTB e PCB. A UDN,
inspiradas em princípios liberais agregava em suas fileiras elementos que se opuseram a ordem autoritária do Estado
Novo, liderada por Getúlio Vargas. O PSD e o PTB, por sua vez tiveram a sua construção intimamente relacionada aos
vínculos que este regime estabeleceu com determinados segmentos sociais. O PSD com os quadros administrativos
remanescentes das interventorias e o PTB com lideranças sindicais, fruto do relacionamento que se desenvolveu através
do Ministério do Trabalho. O PCB, após um longo tempo de atuação na clandestinidade passava a desfrutar de
liberdade para participar do processo eleitoral, reunindo uma significativa base social que abrigava, principalmente
trabalhadores urbanos. Outras legendas de importância mais regionalizada também surgiram. São exemplos: PSP, PTN,
PDC, PRP e PR. Ver também: SOARES, Gláucio Ary Dillon. Sociedade e política no Brasil (Desenvolvimento, classe e
política durante a Segunda República). São Paulo: Difel, 1973; GOMES, Angela de Castro e D’ARAUJO, Maria
Celina. Getulismo e trabalhismo. São Paulo: Editora Ática, 1989; BENEVIDES, Maria Victoria. O PTB e o
trabalhismo. São Paulo: Editora Brasiliense, 1989; COELHO, Sandro Anselmo. O Partido Democrata cristão: teores
programáticos da terceira via brasileira (1945-1964). Revista Brasileira de História. São Paulo: ANPUH, Vol.23, nº46,
p.201-228, 2003.

42
autoridade superior. Quanto à segunda, consiste na possibilidade de escolha por parte dos eleitores
da maioria dos responsáveis pelo processo decisório governamental dentre os candidatos
apresentados pelas organizações partidárias.161 Nesse caso, “os eleitores escolhem algumas das
pessoas envolvidas na tomada de decisão governamental, mas não escolhem as decisões”.162
No Brasil, a “redemocratização” consistiu no retorno do pluripartidarismo e das eleições
diretas, conforme ficou estabelecido pela Carta Constitucional de 1946.163 Portanto, o que estava
sendo (re) institucionalizado no país era uma democracia representativa. Com isso, voltava a existir
o que Hirst considera “a virtude limitada de permitir que alguns dos principais responsáveis pela
tomada de decisão e pela iniciativa política no Estado sejam trocados periodicamente ou ameaçados
por essa troca”.164
A restauração do regime representativo no Brasil, com a derrocada da ditadura do Estado
Novo, foi acompanhada pela emergência política de setores desprivilegiados da sociedade,
sobretudo através do uso do voto. Nesse sentido, apresentava-se uma brecha para a participação
política desses setores. Porém, esta participação política se deparava com os limites inerentes a uma
democracia representativa, uma vez que lhes eram vetada a possibilidade de interferir diretamente
nas instâncias decisórias.165 Contudo, a possibilidade de votar evidenciava-se como um instrumento
de relativa pressão, para uma parcela da população empobrecida obter ao seu favor políticas
governamentais, pois correspondiam a estratos da sociedade que ingressaram no processo político e,
por isso, convinha não serem ignoradas na contabilidade eleitoral. 166
Em que pese as distinções entre Francisco Weffort e Angela de Castro Gomes acerca de
determinados aspectos sobre a análise da participação política de setores sociais menos
privilegiados no Brasil, entre 1945-1964, ambos convergem no reconhecimento do estabelecimento
de uma interlocução entre estes setores e o Estado, assim como no caráter assimétrico dessa relação
do ponto de vista do poder. 167
Ao analisar os desdobramentos do processo de “redemocratização” na Bahia, Paulo Silva
compreende que a revitalização da atuação partidária e das eleições não implicou na emergência de
um cenário político radicalmente distinto, argumentando que “o novo que se anunciava apenas
mascarava o retorno do reprimido em 1937. E o velho terminou por sobrepujar as inovações

161
HIRST, Paul, op.cit., p.31 e 34.
162
Idem, p.34.
163
SOUZA, Maria do Carmo Campelo de, op. cit., p.105-106.
164
HIRST, Paul, op. cit., p.39.
165
WEFFORT, Francisco Correia, op. cit., p.17-22.
166
SOARES, Gláucio Ary Dillon, op. cit., 59-60.
167
Ver: WEFFORT, Francisco Correia, op cit., 15-20 e GOMES, Angela de Castro, op. cit., 46-47.

43
inicialmente vislumbradas”.168 Para esse autor, o processo de “redemocratização”, em grande
medida, oportunizou a volta de traços da política oligárquica baiana que foram arrefecidos desde a
Revolução de 30: “partidos articulados em torno de nomes, organizados nos moldes oligárquicos,
isto é, sem vinculação orgânica com os setores populares e dirigidos por uma elite composta por
personalidades da intelectualidade local ou pertencentes a famílias influentes.”169
Gláucio Soares também considera que no Brasil, durante a Segunda República (1945-1964), a
política oligárquica não tenha ruído em sua plenitude, mas aponta para algumas modificações que
se apresentaram nesse período. Embora se mantivese o analfabetismo como impedimento para se
alcançar o estatuto de eleitor, houve o aumento da participação eleitoral de setores da classe média e
trabalhadora. Mas, segundo esse autor, “no nível dos representantes políticos, entretanto, não se
observou uma participação considerável das classes populares, cujos interesses eram representados
por deputados e senadores com filiação de classe bem mais elevada.”170
Desse modo, mantinha-se ainda uma estratificação no que diz respeito à representação política
no Brasil, sobretudo nos níveis federal e estadual, onde as despesas com as campanhas eram mais
onerosas, além da estratificação interna dos partidos que privilegiavam nos seus quadros aqueles
que dispunham de formação universitária.171 Todavia, no nível municipal, se percebia algum grau
de diferença nesse aspecto, sendo eleitos, principalmente para o cargo de Vereador, trabalhadores e
pequenos comerciantes. Nesse nível, se tornava propícia a eleição de quem não desfrutasse de
muitos recursos financeiros, uma vez que as campanhas políticas eram financiadas quase que
exclusivamente pelos candidatos. Então, quando essas campanhas ficavam restritas ao nível
municipal dispensavam-se grandes custos com viagens, hospedagens ou propaganda indireta, como
também, poderiam ser tocadas diretamente pelo candidato, familiares e amigos.172
Em Alagoinhas, após quase onze anos de inatividade, o Legislativo Municipal foi reaberto e
composto pelos doze vereadores eleitos no pleito realizado em 21 de dezembro de 1947.173 Essa
nova composição apresentava características diferentes das anteriores em dois aspectos. Primeiro, a
maioria dos vereadores assumia esse cargo pela primeira vez, sendo exceção apenas Francisco da

168
SILVA, Paulo Santos. A volta do jogo democrático: Bahia, 1945. Salvador: Assembléia Legislativa, 1992. p.158.
169
Idem, p.74, 85-86.
170
SOARES, Gláucio Ary Dillon, op. cit., p.136.
171
Idem. Ao analisar os treze primeiros anos (1945-1958) do regime representativo instaurado no Brasil com o fim da
ditadura do Estado Novo, Nelson Sampaio concorda que as despesas com a campanha eleitoral, sobretudo no que
concerne a propaganda, restringia, na Bahia, a participação de indivíduos com baixo poder aquisitivo nas disputas por
cargos eletivos nos níveis estadual e federal. SAMPAIO, Nelson de Souza. O diálogo democrático na Bahia. Belo
Horizonte: Editora Bernado Álvares, 1960. p. 28-30.
172
SOARES, Gláucio Ary Dillon, op. cit., p.136-144.
173
ACMA. Ata de 19.02.1948 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

44
Costa Batista. Segundo, diz respeito ao perfil sócio-econômico destes vereadores, que, de acordo
com Carlos Nássaro da Paixão, apresentava algum grau de renovação, pois:

Os proprietários de terra não deixaram de ter vaga garantida nos assentos da Câmara, entre
eles estavam os vereadores Hugo Luna Dantas, Horácio Leal Dantas e José da Silva Neto.
Eram comerciantes Francisco da Costa Batista e Altamirando Cerqueira Campos;
agrônomos Felisbertino Sá de Oliveira e Josaphat Paranhos de Azevedo. O Vereador Israel
Pontes Nonato era médico e uma novidade digna na nota da política da cidade: um operário
da ferrovia conseguiu se eleger, Almiro de Carvalho Conceição.”174

Mas, embora a maioria dos vereadores tenha sido eleita pela primeira vez, alguns casos
trazem consigo um elemento de continuidade. Trata-se da permanência dos nomes das famílias
Dantas, Leal e Azevedo, que estiveram presentes na composição do Legislativo de Alagoinhas nos
dois últimos mandatos que antecederam ao Estado Novo, ou seja, as legislaturas de 1928-1931 e
1934-1937.175 Cabendo destacar que os nomes dessas famílias foram recorrentes também em
legislaturas anteriores: Dantas e Azevedo em 1904-1907; Dantas e Leal em 1916-1919; Azevedo e
Leal em 1920-1923.176
Diante disso, os nomes de Hugo Dantas Luna, Horácio Leal Dantas e Josaphat Paranhos de
Azevedo pode ter significado a permanência da representação dos interesses das referidas famílias e
dos grupos sociais em que elas estavam inseridas. E mais, uma renovação nos quadros no interior de
uma elite para compor postos de tomada de decisões no município, com a reabertura do poder
Legislativo após cerca de uma década de inatividade. Por exemplo, Josaphat Paranhos de Azevedo,
foi adjetivado pelo jornal alagoinhense Sete Dias, na década de 1950, como “Espírito moço”, ao
mesmo tempo em que o vinculava à memória de Carlos Olimpio de Azevedo e Dantas Bião, nomes
que se destacaram no cenário político nas primeiras décadas do século XX.177

174
PAIXÃO, Carlos Nássaro Araujo da, op. cit. p.78-80.
175
A vida municipal de Alagoinhas, disponível no arquivo da Agência do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
em Alagoinhas. A julgar pelas informações apresentadas por Américo Barreira em seu livro intitulado Alagoinhas e o
seu município, as famílias Dantas, Leal e Azevedo faziam parte de uma elite local formada por proprietários rurais,
médicos, farmacêuticos, militares, alguns deles ocupando cargos políticos, desde o século XIX em Alagoinhas. Ver
Notas biográficas de Antonio Teixeira Leal, Adolpho Emygidio Leal, Arystarcho Dantas, Antonio de Souza Dantas,
Antonio de Castro Leal, Antero Olympio Pinto de Azevedo, Emygidio José Leal, Florindo Lucio Leal, Francisco de
Souza Dantas, Honorato Guimarães Leal, José Joaquim Leal, José Emygidio Leal, José Theodósio de Souza Dantas,
José da Rocha Leal, José Pedro Leal, José Olympio de Azevedo, José Olympio de Azevedo Filho, Manoel Teixeira
Leal, Miguel Olympio de Azevedo, Ormindo Olympio Pinto de Azevedo, Pedro de Souza Dantas, Pedro de Alcantara
Leal e Ramiro Olympio Pinto de Azevedo. BARREIRA, Américo, op. cit., p.103-138.
176
A vida municipal de Alagoinhas, disponível no arquivo da Agência do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
em Alagoinhas.
177
FIGAM. Jornal Sete Dias, 12.04.1954, p.1.

45
Os principais partidos brasileiros se faziam presentes através dos doze vereadores eleitos para
essa primeira legislatura pós-Estado Novo, em Alagoinhas. A UDN através de Josaphat Paranhos de
Azevedo, Gildásio d’Oliveira,178 Hugo Luna Dantas, Horácio Leal Dantas e Francisco Batista;179 o
PSD com Elias Amancio de Souza, Antonio Silva Lima,180 Altamirando Cerqueira Campos181 e
Almiro de Carvalho Conceição, o qual fora eleito pelo PTN, mas migrou para as fileiras do PSD
ainda no ano de 1948;182 e o PTB com Israel Pontes Nonato e Felisbertino Sá de Oliveira. Na
documentação examinada não fica explícito qual a filiação partidária de um décimo segundo
Vereador, José da Silva Netto.183 O Prefeito eleito na ocasião foi João Dourado de Cerqueira Bião,
representante da aliança UDN-PSD, partidos que lideravam a coligação que elegeu Otávio
Mangabeira para Governador da Bahia em 1947.184
Cabe destacar, acerca da referida legislatura, a atuação dos vereadores Almiro de Carvalho
Conceição e dos petebistas Israel Pontes Nonato e Felisbertino Sá de Oliveira, pois, partia desses
vereadores a maioria das proposições que foram apreciadas no Legislativo Municipal. Na maioria
destas proposições estava presente a tentativa de atender a determinadas demandas apresentadas na
área urbana de Alagoinhas relacionadas à infra-estrutura, principalmente de bairros afastados do
centro da cidade, ou as condições de trabalho enfrentadas por algumas categorias profissionais
como ferroviários, servidores municipais e operários de curtumes.185 Nesse sentido, é sobre esses
vereadores, que atuaram como interlocutores entre os trabalhadores e o poder público, que versará a
discussão que se seguirá nas próximas linhas.

178
ACMA. Ata de 29.04.1949 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
179
APJR. O Nordeste, 16.04.1949, p.1.
180
Idem.
181
Altamirando Cerqueira Campos teve o seu nome cogitado para representar o PSD na eleição de 1950 para Prefeito
em Alagoinhas. Ver: APJR. O Nordeste, 29.07.1950, p.10.
182
APJR. O Nordeste, 13.09.1948. p.7.
183
ACMA. Ata de 20.02.1948 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
184
ATRE. Resultado das eleições municipais de 1947 – Alagoinhas. Disponível na Secretaria de Informática.
Coordenadoria de Cadastro Eleitoral. Seção de Estatística Eleitoral. Na eleição para Governador na Bahia, em 1947,
houve uma ampla composição partidária na aliança do candidato vitorioso, o udenista Otávio Mangabeira, que reuniu
todos os partidos com representação no estado, com exceção do PTB, partido que isoladamente apresentou a
candidatura derrotada representada por Medeiros Neto. João Falcão relata que o apoio do PCB à candidatura de Otávio
Mangabeira se deu mediante a exigência de que este se comprometesse em assumir publicamente a defesa do registro
do referido partido que naquele momento já sofria ameaças de ser suspenso. Em contrapartida, Otávio Mangabeira
percebia no apoio do PCB a possibilidade da sua candidatura receber um contorno popular que faltava. Ver: FALCÃO,
João da Costa. O Partido Comunista que eu conheci. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1988. p.323. O PSD como
compensação ao apoio à candidatura udenista para o governo estadual em 1945 galgou, dois anos depois, a terceira vaga
para o Senado que cabia ao estado da Bahia, conforme foi determinado pela Constituição de 1946. SAMPAIO, Nelson
de Souza, op. cit., p.53.
185
Esta compreensão é fruto da análise dos Livros de Atas 16 e 17 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas
e dos Livros de Requerimentos Aprovados pela Câmara de Vereadores de Alagoinhas que correspondem à legislatura
1948-1950.

46
2. Almiro de Carvalho Conceição: “um operário em partido de patrões” (1948-1950)

Nascido em 7 de setembro de 1920 no município de Cachoeira, estado da Bahia, Almiro de


Carvalho Conceição, aos 26 anos de idade casou-se com Noemia Maria Cruz, celebrando o seu
matrimônio na Paróquia de Santo Antonio, sediada em Alagoinhas.186 De ascendência negra,
Almiro de Carvalho Conceição era ferroviário quando foi eleito, em dezembro de 1947, para o
cargo de Vereador em Alagoinhas, pelo Partido Trabalhista Nacional (PTN).187 Filiou-se no ano
seguinte ao PSD, partido pelo qual exerceu o mandato de Vereador de 1948 a 1950.188

Imagem 5: O Nordeste, 21.09.1948, p.3.


Foto do Vereador Almiro de Carvalho Conceição publicada na matéria do jornal O Nordeste intitulada “Prestação de
Contas do Vereador Almiro de Carvalho Conceição ao povo em geral, especialmente aos ferroviários e os
trabalhadores.”

Antes de filiar-se ao PTN e ao PSD, Almiro de Carvalho Conceição pertenceu ao PCB,


partido da esquerda brasileira sobre o qual publicamente buscou declarar, por mais de uma vez, a
sua desvinculação. Desse modo, Em junho de 1948, Almiro de Carvalho Conceição usou a tribuna
da Câmara de Vereadores de Alagoinhas para afirmar “que nenhuma ligação tinha mais com o

186
APSA. Livro de registros de casamentos nº2 da Paróquia de Santo Antonio. p.147. Deduz-se que a data de
nascimento de Almiro de Carvalho Conceição foi 07 de setembro de 1920 a partir da associação das informações da
edição do jornal O Nordeste, publicada em 25 de setembro de 1955, em que menciona o dia em que se comemorava o
seu aniversário com as informações que constam no registro do seu casamento, que indicam que este possuía 26 anos no
ano de 1946. Ver: O Nordeste, 25.09.1955, p.3 e Livro de registros de casamentos nº2 da Paróquia de Santo Antonio.
p.147.
187
Sobre a ocupação profissional de Almiro de Carvalho Conceição, ver: APJR. O Nordeste, 25.05.1955, p.7. Quanto a
legenda partidária pela qual se elegeu Vereador em Alagoinhas no ano de 1947, ver: ATRE. Resultado das eleições
municipais de 1947 – Alagoinhas. Disponível na Secretaria de Informática. Coordenadoria de Cadastro Eleitoral. Seção
de Estatística Eleitoral.
188
APJR. O Nordeste, 28.02.1950, p.4.

47
Partido Comunista do Brasil”, ao se defender de acusações publicadas em O Momento, jornal
vinculado ao PCB na Bahia, que o responsabilizava por reter certa quantia em dinheiro
“proveniente de assinaturas e vendagens avulsas do referido jornal.”189
Em 1950, mais uma vez, Almiro de Carvalho Conceição foi taxativo em afirmar que já não
possuía nenhuma ligação com o PCB, assim como da sua adesão ao PSD, partido que permanecia
vinculado naquele momento, publicando uma declaração em um jornal editado em Alagoinhas.
Além disso, nessa mesma declaração, procurou desfazer indisposições outrora construídas na sua
relação junto a Lauro de Freitas, diretor da VFFLB, buscando expressar em um tom de
arrependimento que:

Quanto à pessoa do Exmo. Sr. Dr. Lauro Freitas, posso agora reconhecer o grande erro em
que fui envolvido pelas injunções maléficas do Partido Comunista, relativamente à pessoa
do Ilustre Diretor da Leste, homem honesto e trabalhador visando sempre o
engrandecimento da Estrada e a prosperidade da Bahia. 190

Possivelmente, Almiro de Carvalho Conceição, quando ferroviário e militante comunista,


esteve em rota de colisão com Lauro de Freitas, que ocupava o posto de diretor da VFFLB.
Todavia, em 1950, Almiro de Carvalho Conceição pertencia à mesma agremiação partidária de
Lauro de Freitas, o PSD. Ademais, no ano de 1950, Lauro de Freitas teve o seu nome lançado como
candidato ao Governo do estado da Bahia por esse partido, o que exigia uma demonstração pública
de Almiro de Carvalho Conceição da sua reconciliação com aquele, em função de divergências
ocorridas em um passado recente, uma vez que se tornaram correligionários.191
As razões das divergências entre Almiro de Carvalho Conceição e Lauro de Freitas não foram
explicitadas, mas podem ter sido motivadas pela prática de retaliações aplicadas por este último aos
ferroviários que militavam no movimento comunista. Essa inferência faz sentido se levadas em
conta às indicações presentes na notícia publicada no jornal O Nordeste, em agosto de 1950, que
anunciada como um “furo sensacional” informou sobre uma possível reunião realizada entre
militantes comunistas e o candidato a Prefeito de Alagoinhas pelo PSD, Pedro Dórea, em que se
tratou do seguinte:
No último dia 7, às 20 horas, estiveram reunidos na residência do Dr. Pedro Dórea,
candidato do partido do Sr. Lauro Farani de Freitas ao Governo Municipal, em conferência
com ilustre chefe pessedista local, os Srs. Petrônio Pereira, ajudante de ajustador das

189
ACMA. Ata de 18.06.1948 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
190
APJR. O Nordeste, 28.02.1950, p.4.
191
Lauro de Freitas morreu em um acidente aéreo ocorrido no trajeto entre Lapa e Carinhanha, em setembro de 1950,
quando estava em campanha eleitoral para o cargo de Governador do estado da Bahia. Ver: APJR. O Nordeste,
17.09.1950, p.1.

48
Oficinas São Francisco; Natalício Joaquim da Silva, ajudante de caldereiro; Joaquim Cabral
de Souza, sapateiro, que acompanhados de um dirigente do Partido Comunista, vindo da
Capital, ao que se diz Aloísio Aguiar, debateram com o Sr. Pedro Dórea o apoio dos
partidários de Prestes ao candidato do PSD. Segundo apuramos em fonte digna de todo
crédito, os comunistas que, inegavelmente, dispõe de uns quatrocentos votos nesta cidade,
resolveram apoiar a candidatura de Pedro Dórea, comprometendo-se este a promover
meios, junto ao Diretor da Leste para que não seja transferido nenhum comunista
ferroviário, bem como assegurar aos militantes daquele partido, plena liberdade de
divulgação de suas campanhas.192(grifos meus).

Diante disso, seria uma prática do diretor da VFFLB, cargo ocupado por Lauro de Freitas, a
coação aos ferroviários que militavam no movimento comunista. Teria o próprio Almiro de
Carvalho Conceição sofrido tal coação? O certo é que uma onda de repressão se abatia sobre o
movimento comunista no Brasil desde a cassação do registro do PCB pelo Superior Tribunal
eleitoral em 07 de maio de 1947.193
O PSD, partido a que Almiro de Carvalho Conceição esteve filiado, foi gestado a partir da
estrutura montada pelo Estado Novo, que estabelecia ligações entre o governo central, as
interventorias estaduais e os municípios. A sua constituição visava à nova ordem que se anunciava,
tendo como horizonte a deposição do regime de exceção e o retorno de eleições diretas. Com isso, a
formação desse partido se processou sob a regência da ditadura varguista que lançou mão da
estrutura político-administrativa montada durante o Estado Novo. Conforme alude Maria do Carmo
Campello de Souza, o PSD foi um partido “criado de baixo pra cima; ou mais exatamente de dentro
para fora do Estado, através da convocação feita pelos interventores às bases municipais nos
estados.”194
A estruturação do PSD na Bahia, em 1945, segundo Paulo Silva, envolveu a articulação direta
do interventor em exercício no estado, Renato Onofre Pinto Aleixo, tendo em vista a candidatura de
Eurico Gaspar Dutra para a Presidência da República. Para isso, convocou elementos ligados à
administração pública e que, portanto, estavam subordinados à interventoria estadual, a assumirem
as suas inclinações políticas naquele momento eleitoral.195 Para esse mesmo autor, os executivos
municipais apareciam como peça chave nesse processo de articulação, pois:

Como se tratavam de autoridades nomeadas, era de se esperar que fossem convocados para
servir aos propósitos políticos dos articuladores do Partido Social Democrático. Os vínculos
entre os executivos municipais com o estadual colocavam os prefeitos na dependência

192
APJR. O Nordeste, 11.08.1950, p.1.
193
ALMEIDA JÚNIOR Antonio Mendes de. Do declínio do Estado Novo ao suicídio de Vargas. In: GOMES, Angela
de Castro [et. al.]. O Brasil Republicano, Volume 3: sociedade e política (1930-1964). 3ª edição. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 2004. p.243-244.
194
SOUZA, Maria do Carmo Campello, op. cit., p.134.
195
SILVA, Paulo Santos, op. cit., p.106.

49
direta do interventor. Na hipótese de não atenderem ao seu chamado poderiam sofrer
retaliações, como corte de verbas ou a perda do próprio poder. 196

Tratando-se da atuação de Almiro de Carvalho Conceição, no plenário do Legislativo


Municipal, em sua primeira proposição apresentada, recomendou o aumento em cem por cento dos
salários dos servidores municipais, justificando que os vencimentos dessa categoria “em nenhuma
hipótese correspondem ao atual custo de vida” e por isso, tal reajuste poderia “minorar a situação
aflita em que os mesmos se acham.”197 Essa foi uma das várias proposições apresentadas pelo
referido Vereador que se destinava a atender demandas de determinadas categorias de
trabalhadores, principalmente ferroviários, categoria a qual pertenceu.
Uma semana depois, Almiro de Carvalho Conceição, explicou que atendendo ao pedido de
diversos moradores, apresentou requerimento para ser encaminhado ao Executivo Municipal que
expunha um reclame “referente ao esgoto construído pela Leste Brasileiro em frente à Rua Castro
Alves, impotente para o escoamento das águas’’.198 Esta também foi uma das diversas ações
apresentadas por este Vereador que buscava junto ao poder público sanar necessidades apresentadas
em bairros operários da cidade.
Porém, nem sempre as ações apresentadas por Almiro de Carvalho Conceição resultavam em
êxito, pois para tanto dependiam da aprovação dos seus pares no Legislativo, e, em seguida, da
efetivação dessas deliberações pelo Executivo. Por exemplo, no recomeço do segundo período
legislativo de 1948, o citado vereador recomendou que se encaminhasse mensagem ao Prefeito para
que este levasse a cabo o cumprimento das proposições expostas em quinze requerimentos e quatro
indicações de sua autoria aprovados nesse mesmo ano.199 Outro exemplo, em junho de 1949, não
tinha sido efetivado pelo Executivo Municipal o pagamento do abono de natal aprovado em favor
dos servidores municipais.200 A justificativa utilizada para requisitar o referido abono de natal era à
dinâmica inflacionária em curso. Aliás, o aumento nos preços de gêneros considerados de primeira
necessidade como pão, leite, cereais e carne bovina foi algo recorrente nas décadas de 1940 e 1950,
o que repercutia no aumento das dificuldades de sobrevivência de trabalhadores assalariados em

196
Idem.
197
ACMA. Requerimento apresentado por Almiro de Carvalho Conceição em 02.04.1948. Livro de Requerimentos
(1948).
198
ACMA. Ata de 09.04.1948 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
199
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Almiro de Carvalho Conceição em 22.10.1948. Livro de
Requerimentos (1948).
200
ACMA. Atas de 10.12.1948 e 03.06.1949 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

50
Alagoinhas, como os servidores municipais ou mesmo os operários dos curtumes.201 Sobre estes
últimos, em particular, Almiro de Carvalho Conceição, em 1949, afirmava que devido aos baixos
salários que recebiam, em um quadro de preços elevados dos gêneros alimentícios, poderiam a
qualquer momento deflagrar uma greve.202 Se essa categoria de trabalhadores deflagrou um
movimento grevista não foi possível confirmar, mas durante a década de 1950 foi eleito para
Vereador do município, Romualdo Pessoa Campos, representante do Sindicato dos Trabalhadores
na Indústria de Curtimento de Couros e Peles de Alagoinhas.203
Ainda sobre os limites das ações de Almiro de Carvalho Conceição, quando voltadas para os
interesses de trabalhadores, houve outras proposições que sequer chegavam ao Executivo, pois
permaneceram no plenário sendo rejeitadas por seus pares. Foi o caso das propostas de conceder
auxílio financeiro ao Vencedor Esporte Clube,204 a Filarmônica Recreio Operário, sediada em
Aramari205 e ao Círculo Operário de Alagoinhas.206
O Vencedor Esporte Clube, segundo Valter Ramos, foi fundado em 2 de julho de 1941, na
Rua 2 de Julho, sendo transferido após dez anos para a Praça Santa Izabel.207 Certamente o novo
endereço foi a Rua 1º de Janeiro, nº 4, onde funcionava a sede desta entidade em 1958.208 A
Filarmônica Recreio Operário estava sediada em Aramari, então distrito de Alagoinhas, que em
1948 o próprio Vereador Almiro de Carvalho Conceição alegava que a maioria da sua população
era composta por ferroviários.209 Quanto ao Círculo Operário de Alagoinhas, Almiro de Carvalho
Conceição foi um dos seus fundadores, em 1949,210 assim como ocupou o cargo de presidente
dessa entidade211 que contava “em seu seio um elevado número de associados componentes das
diversas classes trabalhadoras.”212

201
Sobre o aumento dos preços dos gêneros de primeira necessidade em Alagoinhas, ver: ACMA. Ata de 01.07.1949 e
01.12.1950 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas; ACMA. Requerimentos apresentados pelos
vereadores Almiro de Carvalho Conceição em 13.04.1948, 06.08.1948, 13.08.1948 e 23.12.1949; ACMA.
Requerimento apresentado pelo Vereador Eurico Costa em 18.05.1951; ACMA. Requerimentos apresentados pelo
Vereador Hildebrando Dias em 07.06.1951 e 06.07.1951. Livros de Requerimentos (1948/1949/1951).
202
ACMA. Ata de 03.06.1949 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
203
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Romualdo Campos em 19.04.1954. Livro de Requerimentos
(1954).
204
ACMA. Ata de 17.06.1949 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
205
ACMA. Ata de 28.04.1950 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
206
ACMA. Ata de 01.12.1950 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
207
RAMOS, Valter. Alagoinhas Revista. Alagoinhas: [s.n.], 2006. p.10.
208
APWC. Alagoinhas Jornal, 10.03.1958, p.4.
209
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Almiro de Carvalho Conceição em 26.05.1950. Livro de
Requerimentos (1950).
210
BARROS, Salomão, op. cit., p.64.
211
APJR. O Nordeste, 25.12.1953, p.12.
212
APJR. O Nordeste, 14.10.1949, p.1.

51
Enquanto Vereador, as ações de Almiro de Carvalho Conceição não se direcionaram apenas
aos trabalhadores. Também foram apresentadas por ele petições voltadas para introduzir melhorias
na infra-estrutura urbana do centro da cidade,213 ou até mesmo que assegurasse no orçamento
municipal a concessão de subvenções para o Elegante Clube, entidade vinculada à elite
alagoinhense.214 Esta última petição foi rejeitada pela maioria dos vereadores, sendo alegado que,
por se tratar de uma entidade frequentada pela elite local, não seria necessário tal auxílio. Pretendia
Almiro de Carvalho Conceição, caso essa medida não fosse rejeitada, utilizá-la como elemento de
barganha para a aprovação por seus pares de solicitações de auxílio financeiro destinadas para
outras entidades? Ou tinha como horizonte ganhar visibilidade entre essa parcela do eleitorado
local?
Como foi dito acima, subvenções para o Vencedor Esporte Clube, a Filarmônica Recreio
Operário e o Círculo Operário de Alagoinhas não foram aprovadas.215 Mas, inegavelmente, partiram
de Almiro de Carvalho Conceição e em menor proporção dos vereadores da bancada do PTB, Israel
Pontes Nonato e Felisbertino Sá de Oliveira as discussões que colocaram na pauta do Legislativo
Municipal questões ligadas aos trabalhadores, na legislatura de 1948-1950.
Sobre os vereadores petebistas será tratado mais adiante, cabe prosseguir nesse momento a
respeito do perfil de algumas proposições apresentadas por Almiro de Carvalho Conceição que
estavam diretamente relacionadas aos ferroviários ou aos locais por eles habitados. Trata-se de
petições que representavam demandas das ruas 2 de julho e Castro Alves, ruas que eram bem
próximas e maioria de moradores ferroviários;216 das ruas 1° de Janeiro, 14 de Janeiro, Baixa do
Corte e Alto do Corte, que ao lado da Rua Castro Alves compõem o bairro da praça Santa Izabel;217
ou mesmo do distrito de Aramari, que era considerada “sede da maior oficina da Viação Férrea
213
Ver Requerimento apresentado por Almiro de Carvalho Conceição em 06.08.1948 que recomendava a reformulação
do Curral do Conselho; em 22.10.1948 sobre o escoamento dos esgotos no centro da cidade; em 05.11.1948 sobre a
arborização da Praça J.J.Seabra; e em 24.11.1950 sobre calçamento da Rua Carlos Gomes e 7 de Setembro. ACMA.
Livro de Requerimentos (1948 e 1950).
214
ACMA. Ata da sessão de 25.11.1949 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
215
No jornal O Nordeste foi listado algumas emendas propostas por Almiro de Carvalho Conceição para o orçamento
municipal de 1950, que previam auxílio econômico para entidades que possuíam um caráter distinto (operários e elite,
civis e militares, católicos e kardecistas): “Emendas a projeto de lei para o orçamento do exercício de 1950: auxílio de
Cr$4.000,00 para o Convento S. Francisco; auxílio para as filarmônicas locais ampliado de Cr$2.400,00 para
Cr$12.000,00; auxílio ao Serviço de alto-falantes A voz da liberdade e ao Serviço de alto-falantes Alagoinhas ampliado
de Cr$1.200,00 para Cr$2.400,00; auxílio para a Escola S. Sacramento; auxilio para a Escola Alan Kardec ampliado de
$600,00 para $1.200,00; auxilio às sociedades desportivas: à Sociedade Beneficente dos Operários de Aramari, à Liga
Desportiva de Alagoinhas, todos ampliados de $1.200,00 para $6.000,00; ao Lactário de Alagoinhas de $4.800,00;
auxílio para o Tiro de Guerra nº110 ampliado de $7.000,00 para $10.000,00.” Ver: APJR. O Nordeste, 24.12.1949,
p.14.
216
GAMA, Iraci. Ave Haydée. In:RAMOS, Haydée Lina de Amorim. História de minhas andanças. Alagoinhas: [s.n.],
2009. p.106.
217
RAMOS, Valter, op cit., p.10.

52
Federal Leste Brasileiro, e núcleo residencial de elevado número de operários que trabalham na
mesma viação”.218

Imagem 6: Mapa da cidade de Alagoinhas, com destaque para o trecho nas imediações da Oficina São Francisco
da VFFLB, onde se desenvolveu uma ocupação residencial que abrigava muitos ferroviários. No referido trecho
ficavam situadas a Praça Santa Izabel e as ruas Castro Alves, 2 de julho, 1º de Janeiro, 14 de Janeiro, Alto do
Corte e Baixa do Corte. Fonte: Mapa Hipsométrico da cidade de Alagoinhas, 1978. Governo do estado da Bahia
– Secretaria do Planejamento, Ciência e Tecnologia.219

Nesse sentido, em abril de 1948, foi apresentado o primeiro requerimento que buscava
contornar o problema na infra-estrutura urbana no trecho compreendido entre a Rua 2 de Julho e a

218
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Romualdo Campos em 09.11.1951. Livro de Requerimentos
(1951).
219
Trata-se do mapa da cidade de Alagoinhas que foi identificado ao longo de toda pesquisa possuindo a datação mais
próxima ao período em estudo.

53
Rua Castro Alves. Tal problema se manifestava com a chegada das chuvas, provocando transtornos
para os moradores desse ponto da cidade. Então, alegando atender aos pedidos de vários moradores,
Almiro de Carvalho Conceição apresentou o referido requerimento onde ficava expresso que:220
Na Rua 2 de Julho, em frente a Rua Castro Alves, existe um esgoto feito pela Leste
Brasileiro, por baixo da linha férrea, e sendo o mesmo impotente para suportar a passagem
das águas, quando em dias de chuva, resulta que os moradores das ruas adjacentes são os
únicos prejudicados, porque as águas invadem os seus lares. Por este motivo requeiro ao
Poder Executivo que, a fim de entrar em entendimento com o Inspetor de Tráfego da Leste
Brasileiro, nesta cidade, a fim de solucionar o caso que só será com a construção de um
pontilhão no referido local.221

Existiam outras limitações, no que diz respeito à infra-estrutura urbana, nessa porção da
cidade onde estava localizada a Rua 2 de Julho e suas adjacências. Diante desse quadro, os seus
moradores encaminharam um abaixo-assinado para Almiro de Carvalho Conceição tomando-o
como um interlocutor junto ao poder público. Esse abaixo-assinado trazia o seguinte teor:

Exmo. Sr. Vereador Almiro de Carvalho Conceição. Os abaixo assinados moradores das
ruas 1º de Janeiro, 14 de Janeiro, 2 de Julho e Praça Santa Izabel, vem solicitar de V. Exa.,
na qualidade de um dos representantes do proletariado e do povo de Alagoinhas, o
prosseguimento da iluminação pública a fim de melhorar a nossa situação de desassossego
em virtude da escuridão existente, nestas vias públicas que acarreta esconderijo de ladrões e
malfeitores, forçando aos seus moradores a fecharem as suas residências às 19 horas.
Confiantes de que seremos atendidos, subscrevemos at.222

Diante disso, Almiro de Carvalho Conceição subscreveu um requerimento destinado ao Poder


Executivo para que fosse atendida a reivindicação daqueles moradores, argumentando que:

Levando em consideração um abaixo-assinado dos moradores da Praça Santa Izabel, ruas 1º


de Janeiro, 14 de Janeiro e 2 de Julho, requeiro ao Poder Executivo que mande prosseguir a
iluminação pública para as ruas acima mencionadas a fim de que os seus moradores não
continuem privados de chegarem nas janelas de suas casas, a noite, nem tão pouco de ir ao
centro da cidade pela escuridão reinante. 223

220
ACMA. Ata de 09.04.1948 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
221
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Almiro de Carvalho Conceição em 09.04.1948. Livros de
Requerimentos (1948). O pontilhão solicitado começou a ser construído, porém em outubro de 1948 outro requerimento
foi encaminhado ao Executivo Municipal para que se tomasse providência no sentido de concluir a sua construção, pois
tal situação impedia o trânsito dos moradores pelo local. Ver: ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Almiro
de Carvalho Conceição em 22.10.1948. Livro de Requerimentos (1948).
222
ACMA. Abaixo-assinado dos moradores da Praça Santa Izabel e das ruas 1º de Janeiro, 14 de Janeiro e 2 de Julho
anexado ao Requerimento apresentado pelo Vereador Almiro de Carvalho Conceição em 07.05.1948. Livro de
Requerimentos (1948).
223
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Almiro de Carvalho Conceição em 07.05.1948. Livro de
Requerimentos (1948).

54
Entretanto, essa demanda em que o Vereador Almiro de Carvalho Conceição atuava como
interlocutor não foi atendida, o que impunha aos moradores das referidas localidades conviver por
mais tempo sem o serviço de iluminação pública. Alegando incapacidade da Usina Elétrica
Municipal, os vereadores Altamirando Cerqueira Campos, José da Silva Netto e Horácio Leal
Dantas, expediram um parecer afirmando ser impossível o atendimento do que era pleiteado no
citado abaixo-assinado.224 Se associaram a esse posicionamento os vereadores Francisco Batista e
Gildásio d’Oliveira, se constituindo uma maioria de votos, pois se opuseram ao parecer apenas
Almiro de Carvalho Conceição e Israel Pontes Nonato.225
Trechos localizados próximos à Rua 2 de julho voltaram a ser mencionados por Almiro de
Carvalho Conceição no sentido de necessitarem de atenção do Poder Executivo. Havia segundo esse
Vereador a “necessidade de roçagem dos matos crescidos no Alto do Imbirussu, Alto do Corte e
adjacências.”226 Para a Rua Castro Alves, em 1950, foram solicitadas lâmpadas para a iluminação
pública, o que foi considerado pelo Vereador udenista Horácio Leal Dantas “um método restritivo
do Vereador Almiro de Carvalho Conceição, quando toda a cidade se encontra necessitando das
providências requeridas na proposição, dele Almiro, para a Rua Castro Alves”.227 Almiro de
Carvalho Conceição respondeu a esse questionamento dizendo “que pedia essas providências para a
Rua Castro Alves, em virtude dos grandes prejuízos causados aos moradores daquele logradouro
público pelas enxurradas dos últimos tempos.”228
Tinha razão o Vereador Horácio Leal Dantas ao mencionar que o seu colega, Almiro de
Carvalho Conceição, restringia determinada solicitação para uma parte da cidade, no caso a Rua
Castro Alves. Pois como já foi dito, esta rua e suas imediações eram habitadas em sua maioria por
famílias ligadas aos operários da ferrovia, aos quais Almiro de Carvalho Conceição se apresentou
como um interlocutor junto ao poder público e agências estatais entre algumas das suas demandas
relacionadas à infra-estrutura, à oferta de serviços públicos de saúde, ou no campo do lazer.
Demonstrando possuir carência em equipamentos de infra-estrutura urbana, como calçamento
ou serviço de esgoto, no período chuvoso, a Rua Castro Alves, segundo Almiro de Carvalho
Conceição, ficava “superlotada de areia” que era trazida pelas enxurradas, acarretando prejuízos aos

224
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Almiro de Carvalho Conceição em 07.05.1948. Livro de
Requerimentos (1948).
225
ACMA. Ata de 11.06.1948 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
226
ACMA. Ata de 30.04.1948 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
227
ACMA. Ata de 22.04.1950 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
228
Idem.

55
seus moradores, pois as águas invadiam suas residências.229 Diante desse panorama, Almiro de
Carvalho Conceição, requereu por mais uma vez a atenção da Prefeitura Municipal para essa rua
onde moravam, predominantemente ferroviários.230
Para Aramari, distrito do município de Alagoinhas, que possuía uma concentração de
ferroviários como moradores, Almiro de Carvalho Conceição intercedeu junto ao poder público no
sentido de que fosse minimizada a precariedade quanto ao oferecimento dos serviços de saúde.
Nesse sentido era feita a seguinte ponderação:

A fim de minorar a situação vexatória dos moradores do distrito de Aramari, que doentes ou
acidentados se vêem na iminência de esperar a passagem de um trem para se reportarem para
esta cidade, a fim de obter assistência médica, proponho ao Poder Executivo para que junto
ao Departamento de Educação e Saúde façam instalar ali um posto médico com pessoal e
aparelhamento indispensável, a fim de solucionar, tão angustiante situação que há muito
carece solução.231

O Vereador Israel Pontes Nonato (PTB) fez um aparte, sugerindo que a proposição do seu
colega, Almiro de Carvalho Conceição, fosse extensiva aos demais distritos do município, ao
mesmo tempo em que fazia a seguinte objeção: se em Aramari, “os moradores ali, são quase na
totalidade ferroviários, que em vez de um posto por conta do Estado fosse feita uma indicação pela
mesa ao Sr. Diretor da Leste neste sentido.”232 A proposição de Almiro de Carvalho Conceição não
foi alterada, no sentido de tornar extensivo aos demais distritos do município de Alagoinhas a
instalação de um posto médico, conforme sugeriu Israel Pontes Nonato, e nos últimos meses do seu
mandato, em 1950, Almiro de Carvalho Conceição voltou a interceder em favor dos moradores de
Aramari, desta vez junto ao Diretor da VFFLB requisitando a reativação de uma sala de cinema
pertencente a essa empresa estatal:

Considerando que o distrito de Aramari apesar de possuir uma população numerosa não
possui quase nenhuma distração; Considerando que sendo a população desse distrito
composta na maioria por ferroviários; Considerando ainda que a única diversão que existe
naquele distrito é o cinema da Leste, e que há muito vem fechado; É que requeiro a Mesa
que ouvido o plenário, oficie-se o Sr. Lauro Farani Pedreira de Freitas, Diretor da Leste

229
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Almiro de Carvalho Conceição em 21.04.1948. Livro de
Requerimentos (1948).
230
Idem.
231
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Almiro de Carvalho Conceição em 14.05.1948. Livro de
Requerimentos (1948).
232
ACMA. Ata de 21.05.1948 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

56
Brasileiro, no sentido deste tomar as providências necessárias, para o funcionamento do
cinema de Aramari, no mais curto prazo possível. 233

Essa foi uma das últimas ações de Almiro de Carvalho Conceição como Vereador, pois
mesmo tentando retornar a esse cargo, acumulou derrotas eleitorais nas duas oportunidades que
pleiteou. Para as eleições de 1950 o nome de Almiro de Carvalho Conceição enfrentava ressalvas
no diretório local do PSD, pois, a sua inclusão para concorrer ao cargo de Vereador nessa disputa
eleitoral, embora tivesse o apoio de Altamirando Cerqueira Campos, Silva Lima e José Lucio dos
Santos, “era vetada intransigentemente pelo Dr. Heitor Dantas”, liderança do PSD local.234 Diante
dessa rejeição ao seu nome como candidato à Câmara de Vereadores pelo PSD, Almiro de Carvalho
Conceição afirmou: “A reação ao meu nome é natural, pois sou um operário em partido de patrões,
mas isto é uma decorrência da nossa evolução política, com a qual ainda não se conformaram
alguns reacionários.”235
Essa rejeição, certamente, não tinha se dado apenas pelo fato de Almiro de Carvalho
Conceição ser um operário. Mas, ser um operário que militou no movimento comunista durante
parte da sua trajetória política, o que poderia trazer alguma desconfiança para membros do PSD,
como Heitor Dantas. Além do mais, ser “um operário em partido de patrões” conduzia Almiro de
Carvalho Conceição a uma postura ambígua: ora mediando junto ao Executivo Municipal demandas
em favor dos operários, ora em favor dos patrões, muitas das quais foram bloqueadas, o que pode
ter repercutido negativamente junto ao seu eleitorado. Somado a essa questão, deve ter colaborado
para as suas derrotas nas eleições de 1950 e 1954 a presença de candidaturas de outros ferroviários,
trazendo uma tendência à divisão dos votos no seio dessa categoria de trabalhadores.236
Depois da derrota eleitoral em 1954, Almiro de Carvalho Conceição não participou mais de
nenhuma disputa para o Legislativo Municipal de Alagoinhas. Ao longo da década de 1950
acumulou as presidências do Círculo Operário de Alagoinhas e da Liga Alagoinhense de Dominó,
233
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Almiro de Carvalho Conceição em 26.05.1950. Livro de
Requerimentos (1950).
234
APJR. O Nordeste, 11.08.1950, p.1.
235
Idem.
236
Nas eleições municipais de 1950, Almiro de Carvalho Conceição teve 110 votos, os quais foram insuficientes para
reconduzí-lo ao cargo de Vereador. Nessa mesma eleição saíram candidatos ao cargo de Vereador os trabalhadores da
ferrovia Firmino Silva (PSD), Petrônio Pereira (PTN) e Eurico Costa (PTB), sendo este último eleito com 390 votos.
Ver: APJR. O Nordeste, 11.08.1950, p.1; APJR. O Nordeste, 27.05.1953, p.5; APJR. O Nordeste, 21.11.1950, p.4 e
ACMA. Ata da sessão de 07.04.1951 da Câmara de Vereadores de Alagoinhas. Quanto a eleição de 1954, Almiro de
Carvalho Conceição foi candidato a Vereador pelo PSP e recebeu a pífia votação de 22 votos. Nessa ocasião outros
ferroviários também concorreram ao cargo de Vereador. Foram eles: Eurico Costa, que tinha migrado do PTB para a
UDN e foi eleito Vereador pela segunda vez, além de Hostílio Dias (UDN), Amando Camões (PSD) que também foram
eleitos e José de Araujo Batista (PSD). Este não teve votação suficiente para ser eleito. Ver respectivamente: APJR. O
Nordeste, 09.08.1954, p.4 e 24.12.1954, p.7; ACMA. Ata de 15.04.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de
Alagoinhas.

57
além de ter exercido, em Salvador, a função de escriturário na Imprensa oficial do Estado da
Bahia.237 Durante essa mesma década se tornou, também, presidente da Federação Metropolitana
das Sociedades de Bairros, entidade pela qual subscreveu um ofício, congratulando-se com o
Prefeito local pela descoberta dos primeiros poços de petróleo no município de Alagoinhas no ano
de 1959.238
Além de Almiro de Carvalho Conceição, intercederam em favor de interesses dos
trabalhadores os dois vereadores eleitos pelo PTB para a legislatura de 1948-1950: Israel Pontes
Nonato e Felisbertino Sá de Oliveira. Todavia, esse exercício de mediação foi diminuto quando se
compara estes vereadores petebistas a Almiro de Carvalho Conceição. Na verdade, este aspecto se
revelou apenas na oportunidade em que foi colocada em pauta a proposta de aumento salarial dos
servidores municipais durante o ano de 1948.239
Israel Pontes Nonato e Felisbertino Sá de Oliveira pertenciam a estratos médios da sociedade
alagoinhense, sendo o primeiro médico e o segundo engenheiro agrônomo.240 A julgar por suas
atuações na Câmara de Vereadores de Alagoinhas, podemos considerar que ambos não possuíam
ainda, e talvez o próprio diretório local do PTB, uma significativa penetração entre os
trabalhadores. Mas, na legislatura seguinte esse perfil do PTB se modificou com as eleições por esta
legenda de Hildebrando Dias, Eurico Costa e Romualdo Campos, os quais levaram com recorrência
para o plenário da Câmara de Vereadores de Alagoinhas a apresentação de demandas de
trabalhadores e, desse modo, demonstrando, no nível local, uma ampliação da interlocução petebista
entre estes sujeitos sociais e o Estado, como será visto na sequência.

3. A ampliação da interlocução petebista (1951-1954)

Com a reestruturação do sistema partidário brasileiro, foi criado, em 1945, o PTB, partido
que, assim como o PSD, se constituiu sob a liderança de Getúlio Vargas quando se aproximava o
ocaso do Estado Novo. Embora a criação desses partidos tivesse como horizonte a construção de
uma base de sustentação à política trabalhista, eles adquiriram perfis distintos quanto ao programa,
237
APJR. O Nordeste, 25.09.1955, p.7.
238
APMA. Oficio nº 146 recebido pela Prefeitura Municipal de Alagoinhas em 24.11.1959. Ver: Livro de Ofícios
recebidos pela Prefeitura Municipal de Alagoinhas (1958-1961).
239
ACMA. Atas de 03.07.1948, 09.07.1948, 16.07.1948, 23.07.1948 das sessões da Câmara de Vereadores de
Alagoinhas; ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Israel Pontes Nonato em 05.11.1948. Livro de
Requerimentos (1948).
240
BARROS, Salomão, op. cit., p.310; ACMA. Ata de 20.02.1948 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

58
quadros e eleitorado, o que justifica o recorrente uso da assertiva de que quando Getúlio Vargas
criou o PSD com a mão direita terminou por criar o PTB com a esquerda. Para Maria Victoria
Benevides, enquanto o PSD, a “mão direita” de Getúlio, agregava os interventores e elementos que
estiveram envolvidos no aparato político-administrativo montado durante o Estado Novo, o PTB foi
semeado no interior do movimento queremista e vingou buscando “atingir especialmente os
operários urbanos frente a ameaça de influência do Partido Comunista sobre os sindicatos, bem
como sobre a massa trabalhadora desorganizada.”241 Além do mais, com o desenvolvimento
industrial que se processava nos grandes centros urbanos, o operariado se apresentava na cena com
um eleitorado cuja força não deveria ser desprezada.242
Desse modo, pensado para conter a inserção dos trabalhadores no movimento comunista, o
PTB adotou uma orientação a partir dos princípios do trabalhismo que se expressavam através do
sindicalismo, do nacionalismo e da construção de uma justiça social que não implicasse na ruptura
com a organização da sociedade estruturada em classes sociais e a consequente supressão do regime
capitalista.243
Das eleições realizadas em 3 de outubro de 1950 saíram os doze vereadores eleitos para a
legislatura que se desdobraria de 1951 a 1954. Em Alagoinhas, percebeu-se um equilíbrio entre os
três maiores partidos do país, o PSD, a UDN, e o PTB, tendo cada um deles quatro vereadores
eleitos. O Partido Trabalhista Nacional (PTN) também participou dessas eleições com três
candidatos, porém não foi eleito nenhum deles.244 Alianças partidárias foram construídas e
desfeitas, implicando diretamente na dinâmica das deliberações do Legislativo Municipal.
Nessa legislatura percebe-se o aumento da bancada do PTB no Legislativo Municipal, assim
como a ampliação da mediação destes vereadores entre determinadas demandas dos trabalhadores
junto ao poder público e agências governamentais. Nota-se também, embora de forma mais
modesta, o início de uma interlocução semelhante realizada por parte de alguns vereadores da
bancada udenista.
Para a legislatura de 1951-1954 a bancada do PTB sofreu uma evolução, duplicando o
número de vereadores eleitos com relação à eleição anterior. Com isso, a bancada petebista passou a
ser composta por quatro vereadores que foram empossados em 7 de abril de 1951: Eurico Costa
(eleito com 390 votos), Hildebrando Dias (eleito com 340 votos), Romualdo Campos (eleito com

241
BENEVIDES, Maria Victoria. O PTB e o trabalhismo. Editora Brasiliense: São Paulo, 1989. p.33-34.
242
Idem.
243
Idem, p.128.
244
O Total de votos contabilizados por partido na eleição para Vereador foi o seguinte: PSD 2068 votos; UDN 2052
votos; PTB 1763 votos; e PTN 348 votos. Ver O Nordeste, 21.11.1950, p.4

59
286) e Thiago Evangelista dos Santos (eleito com 210 votos).245 Este aumento de vereadores eleitos
pelo PTB deve corresponder à ampliação da penetração do partido no eleitorado local, inclusive
entre os trabalhadores, pois, aconteceu a eleição, para Vereador, em 1950, por esta legenda
partidária de um membro do sindicato ligado aos operários em curtumes de Alagoinhas, Romualdo
Campos.246 Os curtumes durante a década de 1950, se constituíram como a principal atividade
econômica de Alagoinhas, como foi visto no primeiro capítulo. Houve também a eleição pelo PTB
de dois trabalhadores da ferrovia, Eurico Costa e Thiago Evangelista dos Santos.247 E em 1951, a
Associação Profissional dos Trabalhadores na Indústria da Panificação e Confeitaria do Município
de Alagoinhas declarou que dava “integral apoio ao chefe supremo da nação e formam fileiras em
torno do Partido Trabalhista Brasileiro”.248
Com exceção de Thiago Evangelista dos Santos, que teve uma presença bastante discreta no
plenário do Legislativo Municipal, os demais vereadores petebistas – Hildebrando Dias, Eurico
Costa e Romualdo Campos - demonstraram ter uma relação próxima com os trabalhadores, uma vez
que se colocaram como interlocutores entre estes e diferentes esferas do Estado. Tal relação em
muito se assemelhava a que foi percebida através da atuação do Vereador Almiro de Carvalho
Conceição, na legislatura anterior, pois acenavam para o atendimento de dificuldades identificadas
em localidades como as ruas 2 de Julho, Castro Alves e o distrito de Aramarí, que tinham os
ferroviários como contingente habitacional preponderante, ou estavam relacionadas as condições de
trabalho enfrentadas por ferroviários, servidores municipais e os operários dos curtumes.
Para analisar a atuação desses vereadores, que muitas vezes se apresentaram como
interlocutores das demandas de trabalhadores junto ao poder público, iniciemos por Hildebrando
Dias, Vereador que teve o mandato interrompido ainda no segundo ano da legislatura de 1951-1954.
Hildebrando Dias era funcionário público, exercendo a função de coletor da Secretaria da
Fazenda do estado da Bahia.249 Durante o seu curto mandato, a sua postura no plenário,
notadamente, foi de franca oposição ao governo do Prefeito Pedro Dórea (PSD). As intervenções
deste Vereador nos debates, principalmente quando se punha a tecer críticas às ações do Executivo
Municipal ou da bancada governista, era marcada por uma linguagem em tom veemente. Por sinal,

245
A respeito da posse desses vereadores, ver: ACMA. Ata de 07.04.1951 da sessão da Câmara de Vereadores de
Alagoinhas. Quanto ao número de votos recebidos por cada um destes, ver: APJR. O Nordeste, 21.11.1950, p.4.
246
ACMA. Ata de 26.05.1952 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
247
APJR. O Nordeste, 27.05.1953, p.5.
248
ACMA. Ata de 18.05.1951 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
249
APJR. O Nordeste, 23.05.1954, p.5.

60
foi a linguagem contundente utilizada por Hildebrando Dias no plenário da Câmara de Vereadores a
razão justificada para a cassação do seu mandato em junho de 1952.250

Imagem 7: O Nordeste, 09.08.1952.


Foto de Hildebrando Dias, Vereador eleito em Alagoinhas para as legislaturas de 1950-1954 e 1955-1958.

Ao analisar a relação entre trabalhadores e o poder público, mediada pelo Legislativo


Municipal, percebe-se que por algumas vezes, em 1951, Hildebrando Dias intercedeu em favor dos
interesses dos servidores municipais, ao mesmo tempo em que mantinha uma postura de
fiscalização ao Governo do então Prefeito Pedro Dórea. Primeiramente, em maio deste ano foram
solicitadas informações detalhadas ao Poder Executivo. Foi perguntado se estava sendo cumprido o
pagamento adicional de 50% sobre os vencimentos dos servidores municipais que prestavam
serviços noturnos.251 E no mês de julho, foi solicitado que o Prefeito respondesse com urgência as
seguintes informações:
1º Se houve ou está havendo desconto em folha de pagamento, dos funcionários que
receberam fardamento; 2º Qual a importância total que os mesmo funcionários estão
sujeitos a descontar; 3º De que modo está sendo recolhido aos cofres municipais o referido
desconto; 4º A partir de quando teve inicio aquele desconto. 252

Embora não tenha sido identificada a resposta do chefe do Executivo Municipal, quanto às
informações solicitadas, de fato estava sendo descontada nos salários dos servidores municipais
uma determinada quantia correspondente ao uniforme recebido, pois no mês de outubro de 1951,

250
Sobre as discussões em torno da linguagem utilizada pelo Vereador Hildebrando Dias no plenário da Câmara de
Vereadores de Alagoinhas e que culminaram na cassação do seu mandato, ver: ACMA. Atas das sessões de 07.04.1952,
18.04.1952, 02.05.1952, 05.05.1952, 12.05.1952 e 30.05.1952 da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
251
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Hildebrando Dias em 18.05.1951. Livro de Requerimentos
(1951).
252
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Hildebrando Dias em 06.07.1951. Livro de Requerimentos
(1951).

61
Hildebrando Dias apresentou um projeto de lei, que foi aprovado, regulamentando a restituição para
esses trabalhadores de tal desconto.253
Durante o seu curto mandato, Hildebrando Dias também apresentou demandas relacionadas ao
distrito de Aramari, e as ruas 2 de Julho e Castro Alves, que como já foi visto notava-se um número
significativo de ferroviários residindo.
As solicitações que requisitavam melhoramentos para a infra-estrutura urbana desses locais
são recorrentes desde a legislatura anterior, principalmente por intermédio do Vereador Almiro de
Carvalho Conceição e prosseguiram através de outros vereadores, além do próprio Hildebrando
Dias. Desse modo, em maio de 1951, Hildebrando Dias solicitou da Prefeitura Municipal
“providências para o encascalhamento e terraplanagem na Vila de Aramari”.254 E em julho deste
mesmo ano apresentou solicitação semelhante para o 2 de Julho, demonstrando a vulnerabilidade
dessa localidade da periferia alagoinhense diante da estação chuvosa:

Considerando que é lastimável o estado em que se encontra a Rua 2 de julho;Considerando


que é a referida rua um das mais populosas desta cidade e que constitui até o maior bairro
proletário local;Considerando que o seu intenso trânsito público está sendo de difícil e
penoso acesso, dado mesmo a que, principalmente a parte esquerda da margem da estrada
de ferro, se acha transformada num tremendo charco;Considerando finalmente, que as
águas, ali estagnadas, provocando aspecto pantanoso, além de prejudicar o livre trânsito dos
moradores daquela artéria pública e de quantos por ela fazer o seu percurso, atenta
flagrantemente contra a saúde do povo;Requeiro a ilustre mesa desta casa, ouvido plenário,
que seja oficiado ao Sr. Prefeito, solicitando-lhe urgentes providências capazes de
solucionar a situação aflitiva em que se encontram os moradores da citada rua, para que não
se veja os mesmos obrigados a viver dentro da lama, vindo futuramente, ser ali considerado
como uma zona insalubre, foco de terríveis epidemias. 255

Ainda no mês de julho de 1951, Hildebrando Dias voltou a se manifestar no plenário da


Câmara de Vereadores de Alagoinhas acerca da condição da infra-estrutura urbana não só da Rua 2
de julho como de outras em suas imediações, qualificando como “lastimável” o estado em que se
encontravam. Nessa oportunidade declarou que:
no propósito de corresponder a confiança nos que lhe tinha elegido para o cargo de
vereador, tinha feito uma excursão pela Baixa do Corte, Rua 2 de Julho, Rua Castro Alves,
Rua 1º de Janeiro e outras, a fim de se inteirar da situação em que se acham aquelas artérias
públicas e verificou o estado lastimável das mesmas. Informou que efetivamente o Sr.
Prefeito, conforme requerimento que lhe fora feito pela Câmara, está fazendo serviço de
remoção de terras e tapagem de buracos, à Baixa do Corte, utilizando-se de barro tirado

253
ACMA. Ata de 15.10.1951 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
254
ACMA. Ata de 18.05.1951 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
255
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Hildebrando Dias em 13.07.1951. Livro de Requerimentos
(1951).

62
no mesmo lugar, entretanto acha que será um dinheiro perdido, porque nas épocas
invernosas as enxurradas levará todo aterro. 256(grifos meus)

A descrição feita acima pode indicar as seguintes questões: para além de um recurso de
retórica mobilizado para legitimar a relação política entre representante e representados, a
afirmação do Vereador Hildebrando Dias pode estar situando na geografia da cidade parte dos que
lhe elegeram para o cargo de Vereador. Essa descrição também indica porque eram tão vulneráveis
esses trechos da cidade no período chuvoso. Visto que o método empregado para os
“melhoramentos” das vias públicas era a utilização “de barro tirado no mesmo lugar”. Essa medida
trazia apenas uma solução temporária, pois “nas épocas invernosas as enxurradas levarão todo
aterro”. Talvez, por isso, um mês depois, este Vereador voltava a apresentar reclames a respeito das
ruas 2 de Julho, 1º de Janeiro e Castro Alves afirmando que elas estavam “completamente
abandonadas”.257
Até a cassação do seu mandato em 1952, Hildebrando Dias prosseguiu mantendo uma postura
de franca oposição ao Governo do Prefeito Pedro Dórea (PSD), desferindo a este críticas
contundentes. 258 A ruptura da aliança que havia no Legislativo entre o PTB, partido de Hildebrando
Dias, e a UDN, nesse mesmo ano de 1952, foi central para os desdobramentos que vieram gerar a
cassação do seu mandato, fazendo com que entrasse em rota de colisão, inclusive, com dois
vereadores do PTB, Romualdo Campos e Tiago Evangelista dos Santos.
Com a eleição para a composição da Mesa que iria dirigir os trabalhos legislativos em 1952
ficou evidente o alinhamento dos udenistas com o PSD, partido da situação. Foram eleitos José
Lúcio dos Santos (PSD), também conhecido como Coronel Santinho, para presidente da Câmara de
Vereadores de Alagoinhas, Armando Leal (UDN), para vice-presidente, Horácio Dantas (UDN),
como primeiro secretário e Romualdo Campos (PTB), como segundo secretário. Diante disso,
Eurico Costa (PTB) alegou que este resultado se deu em função da traição ao acordo que tinha sido
estabelecido entre a UDN e o PTB.259 Hildebrando Dias concordou com esse entendimento e
afirmou que este resultado tinha contado com o apoio dos outros dois vereadores petebistas,
Romualdo Campos e Thiago Evangelista. O debate que se desdobrou em torno deste assunto veio a
motivar a cassação do mandato de Hildebrando Dias, pois, alegou-se que este utilizou uma

256
ACMA. Ata de 30.07.1951 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
257
ACMA. Ata de 13.08.1951 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
258
Em outubro de 1951, Hildebrando Dias chegou a requerer o afastamento de Pedro Dórea da função de Prefeito
Municipal, justificando ser este responsável pelo o arrombamento da cadeia pública. Ver: ACMA Ata de 29.10.1951 da
sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas; ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Hildebrando Dias
em 29.10.1951. Livro de Requerimentos (1951).
259
ACMA. Ata de 07.04.1951 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

63
linguagem inadequada quando se dirigiu aos vereadores Romualdo Campos e Thiago Evangelista.
Sobre essa questão consta o seguinte:

O Vereador Hildebrando Dias fez recriminações com palavras insultuosas e de baixo


calão aos dois vereadores do Partido Trabalhista Brasileiro que faltaram ao compromisso
partidário e de respeito as suas assinaturas, chamando-os de indignos, vermes chegando
mesmo a dizer pessoalmente ao Vereador Thiago que o mesmo era indigno de estar naquele
meio. O referido Vereador Hildebrando Dias, continuando com a palavra disse que os dois
vereadores eleitos pela legenda do Partido Trabalhista Brasileiro eram traidores e podiam se
considerar excluídos da referida agremiação política.260

Essa fala de Hildebrando Dias, feita na sessão de 7 de abril de 1952, foi considerada
incompatível com o decoro da Câmara. Politicamente isolado, contando com o apoio apenas de
Eurico Costa (PTB), não tiveram êxito as tentativas de manter o seu mandato.261 Diante disso, em
junho de 1952, em requerimento assinado por nove vereadores, inclusive os petebistas Romualdo
Campos e Thiago Evangelista, foi aprovada a cassação do mandato de Hildebrando Dias.262 Fica
demonstrado que a insubordinação de Hildebrando Dias não foi compatível com o que era previsto
para os representantes de trabalhadores naquele momento no Brasil. Além disso, o ímpeto com que
encarava a tribuna da Câmara, fruto, talvez, da sua juventude e inexperiência no jogo parlamentar,
promoveu condições para o seu isolamento político e, posteriormente a cassação do seu mandato.
Porém, na eleição seguinte, realizada em 1954, Hildebrando Dias, retornou ao Legislativo de
Alagoinhas como o Vereador mais votado. Nesta ocasião disputou o pleito e exerceu o mandato
através do Partido Social Progressista (PSP),263 vindo a fazer parte da bancada de oposição ao
governo do Prefeito Antonio Martins de Carvalho Júnior (UDN), autodenominada por “Frente
Popular Democrática” como será visto no terceiro capítulo.264
Outro Vereador eleito pelo PTB para a legislatura 1951-1954 foi Eurico Costa. É possível
perceber em sua atuação a intermediação de determinadas demandas de trabalhadores junto a
diferentes esferas do poder. Eurico Costa foi funcionário da VFFLB, lotado no escritório das
Oficinas São Francisco, em Alagoinhas.265 É presumível que o eleitorado ferroviário contribuiu para

260
Idem.
261
Vários requerimentos apresentados por Hildebrando Dias durante o mês de maio de 1952 foram rejeitados,
demonstrando o isolamento político que vivenciava nesse período no Legislativo Municipal de Alagoinhas. Ver:
ACMA. Livro de Requerimentos (1952).
262
ACMA. Requerimento apresentado por Horácio Dantas, Manoel Virgilio de Souza Caldeira, Armando Leal, José
Lúcio dos Santos Silva, Orlando Azevedo, Romualdo Campos, Joaquim Batista Filho, Altamirano Campos e Thiago
Evangelista em 06.06.1952. Livro de Requerimentos (1952).
263
APJR. O Nordeste, 24.12.1954, p.7.
264
APJR. O Nordeste, 30.04.1955, p.6.
265
ACMA. Ata de 12.10.1953 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

64
a sua eleição, o que justifica a apresentação por esse Vereador de requerimentos cujo objetivo era a
realização de melhoramentos voltados para localidades onde residia membros desta categoria.

Imagem 8: O Nordeste, 27.05.1953, p.5.


Foto de Eurico Costa, funcionário das Oficinas São Francisco da VFFLB, que foi eleito Vereador em
Alagoinhas, consecutivamente nas eleições de 1950 e 1954.

Desse modo, em maio de 1951, Eurico Costa apresentou um requerimento que solicitava
melhorias na infra-estrutura da Rua Baixa do Corte, solicitando junto ao Poder Executivo que fosse
feita a terraplanagem e roçagem para essa rua, cujo estado era considerado “deplorável” e onde
residiam “muitos operários com suas famílias e vive abandonado, não podendo passar ali nenhum
veículo.”266 Ainda nesse ano de 1951, Eurico Costa solicitou melhoramentos junto ao Poder
Executivo municipal para o distrito de Aramari, requerendo nessa oportunidade a limpeza das ruas
dessa localidade que estavam “cheias de mato e dando um triste aspecto”.267 Pouco tempo depois,
alegando atender as reclamações da população, voltou a apresentar requerimento semelhante para
esse distrito. Afirmava Eurico Costa que “há 20 dias vinha viajando para a Vila de Aramari e
verificara que aquela vila se achava em estado de abandono”, pois as suas ruas estavam
“esburacadas e cobertas de mato”.268
No ano de 1953, Eurico Costa reivindicou melhoramentos para a Rua Castro Alves, que
consistia na Prefeitura Municipal realizar terraplanagem, encascalhamento e abertura de valetas, por
causa do “estado de pânico dos seus moradores nas ocasiões chuvosas”.269 As chuvas também
traziam grandes transtornos para a Rua 2 de Julho, que semelhante a Rua Castro Alves, possuía
carências em sua infra-estrutura urbana. Com isso, foi solicitado por esse Vereador providências

266
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Eurico Costa em 25.05.1951. Livro de Requerimentos (1951).
267
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Eurico Costa em 29.10.1951. Livro de Requerimentos (1951).
268
ACMA. Ata de 16.11.1951 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
269
ACMA. Ata de 27.04.1953 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas. Ver também: ACMA. Requerimento
apresentado pelo Vereador Eurico Costa em 24.04.1951. Livro de Requerimentos (1951).

65
para a Rua 2 de Julho, “que não dispondo de esgoto teve as suas casas inundadas com a chuva caída
ontem [26/11/1953]”.270 Diante desse quadro, se solicitou no ano seguinte, quando se aproximava o
inverno, “providências do Sr. Prefeito, no sentido de melhorar as valetas da Rua 2 de Julho, para
evitar que aquela rua fique inundada com as chuvas que se aproximam.”271
Outra demanda apresentada por Eurico Costa com relação a Rua 2 de Julho foi a solicitação
de uma escola pública para os filhos dos seus moradores, justificando que até então só existiam
escolas particulares neste trecho da cidade que era “muito populoso, com grande número de
crianças em idade escolar”.272 Cabe salientar que segundo dados do IBGE, referente ao censo de
1950, em Alagoinhas, de um total de 44.487 pessoas de 5 anos e mais, 29.842 não sabiam ler e
escrever. Então, 67,1% dos indivíduos recenseados figuravam como analfabetos.273
Embora Eurico Costa fosse funcionário da VFFLB, praticamente inexistem intervenções de
sua parte quanto às condições de trabalho dos ferroviários desta empresa. Em certa oportunidade,
inclusive, foram os próprios ferroviários, em uma iniciativa que tinha como horizonte a conquista
de um aumento salarial, que organizados em uma comissão composta por oito trabalhadores, se
dirigiram diretamente à Câmara de Vereadores.274 Esta comissão portava uma mensagem que tinha
como destinatário o Presidente da República e solicitava que a Câmara de Vereadores de
Alagoinhas “fosse intermediária” nesse processo, “fazendo acompanhar a referida mensagem de sua
moção de apoio”.275 A requisição dos ferroviários foi atendida pelo conjunto dos vereadores e uma
moção de apoio foi elaborada para acompanhar a mensagem destes trabalhadores dirigida ao
Presidente da República.
É possível perceber nas petições de Eurico Costa uma relação com redutos ferroviários como:
as ruas 2 de Julho, Castro Alves e o distrito de Aramari. Convém considerar que a eleição de um
trabalhador da ferrovia, como era Eurico Costa, para o Legislativo Municipal, possibilitava aos

270
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Eurico Costa em 27.11.1953. Livro de Requerimentos (1953).
271
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Eurico Costa em 09.04.1954. Livro de Requerimentos (1954).
272
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Eurico Costa em 27.04.1953. Livro de Requerimentos (1953).
Outras áreas afastadas do centro da cidade, também, foram alvo de requisições feitas por intermédio de Eurico Costa
nessa legislatura de 1951-1954, como a Rua 1º de Janeiro e o bairro do Mangalô. Para a Rua 1º de Janeiro, após o
recebimento de um abaixo-assinado de moradores dessa rua, Eurico Costa cobrou providências da prefeitura quanto ao
fechamento de uma via que dava acesso ao rio Aramari, onde era feito o abastecimento de água. Para o bairro do
Mangalô foi solicitada a extensão da rede elétrica. Como foi visto no primeiro capítulo, nesse período, o abastecimento
de água encanada em Alagoinhas era, praticamente inexistente e o serviço de iluminação elétrica possuía grandes
limitações. Ver: ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Eurico Costa em 16.07.1954. Livro de
Requerimentos (1954).
273
Censo Demográfico de 1950. Série Regional, volume XX, tomo 1, Estado da Bahia, IBGE, 1955. p.76.
274
Esta comissão de ferroviários era composta por Otoniel de Araujo Góes, Astrogildo José de Santana, José
Evangelista dos Santos, Nelson Guedes de Assis, Israel de Sales Paranhos, José Ciriaco da Cruz, Agenor Borges de
Castro e Hostilio Ubaldo Ribeiro Dias.
275
ACMA. Ata de 03.12.1951 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

66
membros dessa categoria ter um possível interlocutor no ambiente político-institucional. E, desse
modo, poderia ser acionado para atuar favoravelmente no sentido de requisitar ações
governamentais que pudessem atender algumas necessidades imediatas. Por sua vez, o atendimento
aos reclames desses setores sociais correspondia a um dos propósitos que motivaram a criação do
PTB. Conforme afirma Benevides, este partido tinha como fito o eleitorado urbano, e se colocava
como um canal de expressão para os trabalhadores, visando com isso evitar a inclinação destes para
o movimento comunista.276
Mais adiante, Eurico Costa rompeu com o PTB e se candidatando pela UDN fora reeleito
Vereador em 1954. Mas um terceiro Vereador petebista, Romualdo Campos, na legislatura de 1951-
1954 demonstrou em algumas de suas intervenções uma postura semelhante a de Hildebrando Dias
e Eurico Costa, no que diz respeito às localidades em que eram preponderantes o contingente
ferroviário.
Nascido no povoado de Sauípe, no município de Alagoinhas,277 Romualdo Campos,
formulou petições que requisitavam dotar de melhores condições redutos ferroviários como as ruas
2 de Julho,278 Castro Alves,279 Nossa Senhora das Graças280 e o distrito de Aramari,281 ou que
versavam sobre a precariedade nas condições de trabalho dos servidores municipais.282 Mas, o que

276
BENEVIDES, op.cit., p.33-34.
277
ACMA. Ata de 23.05.1952 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
278
Solicitação por intermédio do Legislativo Municipal ao Diretor da VFFLB para a instalação de lâmpadas em trecho
que havia os tráfegos de locomotivas e pedestres compreendido entre a Rua 2 de Julho e a Oficina São Francisco. Ver:
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Romualdo Campos em 15.10.1951. Livro de Requerimentos (1951).
279
Pedido junto ao Executivo Municipal para construção de valetas na Rua Castro Alves para facilitar o escoamento das
águas da chuva para evitar “prejuízos materiais aos seus moradores”. Ver: ACMA. Requerimento apresentado pelo
Vereador Romualdo Campos em 25.05.1951. Livro de Requerimentos (1951).
280
Foi requerida à Secretaria de Educação e Cultura do estado da Bahia a instalação de uma escola na Rua Nossa
Senhora das Graças para evitar que diariamente tivessem que “ir a outros pontos distantes em busca de colégio” as
crianças dessa localidade em que existia “aproximadamente 200 casas residenciais, em sua maioria absoluta de
ferroviários”. Ver: Requerimento apresentado pelo Vereador Romualdo Campos em 10.08.1951. Livro de
Requerimentos (1951).
281
Para Aramari, foi solicitado a “roçagem” e “aterramento” de ruas que se encontravam “tomadas de mato e
esburacadas”, assim como o fornecimento do serviço de iluminação elétrica para esse distrito que era, de acordo com
Romualdo Campos, “sede da maior oficina da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro, e núcleo residencial de elevado
número de operários que trabalham na mesma viação.” Ver: ACMA. Requerimentos apresentados pelo Vereador
Romualdo Campos em 09.11.1951. Livro de Requerimentos (1951).
282
Solicitação de informações ao Executivo Municipal se estava havendo desconto nos salários dos fiscais pelo
fardamento recebido. Ver: ACMA. Requerimentos apresentado pelo Vereador Romualdo Campos em 04.05.1951. Livro
de Requerimentos (1951); Solicitação junto ao Executivo Municipal para que fossem reajustados os salários dos
servidores municipais, que eram “os mesmos de alguns anos passados, concorrendo para passem privações com suas
famílias”, salientado que “a carestia de vida em Alagoinhas tem aumentado consideravelmente, principalmente no que
concerne aos gêneros de primeira necessidade”. Ver: ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Romualdo
Campos em 17.04.1953. Livro de Requerimentos (1953); Cobrança ao Executivo Municipal para que regularizasse a
situação dos servidores diaristas que estavam recebendo uma remuneração inferior ao salário mínimo. Ver: ACMA.
Requerimento apresentado pelo Vereador Romualdo Campos em 19.04.1954. Livro de Requerimentos (1954); ACMA.
Atas de 31.05.54 e 09.07.54 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

67
particularizou a atuação deste Vereador foi a intermediação junto à esfera governamental de
algumas demandas dos operários da indústria, especialmente os que pertenciam ao ramo de
curtumes. Este caráter, presente na sua atuação, em parte se explica por seu pertencimento ao
Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Curtimento de Couros e Peles em Alagoinhas, no qual,
inclusive, exerceu o cargo de presidente.283 É válido supor que a sua eleição para o Legislativo
Municipal tenha se dado, em grande parte, em virtude dos votos recebidos dos curtumeiros, os quais
vislumbravam alcançar canais do diálogo institucional para disporem de auxílios e políticas
públicas que pudessem, ao menos, atenuar as dificuldades por eles enfrentadas. Nesse sentido,
empossado como Vereador, caberia a Romualdo Campos corresponder ao seu eleitorado. Cabe
lembrar que os curtumes durante a década de 1950 respondiam como a principal atividade
econômica de Alagoinhas, conforme foi visto no primeiro capítulo.

Imagem 9: O Nordeste, 23.07.1955, p.3.


Foto de Romualdo Campos, presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Couros e Peles de
Alagoinhas durante a década de 1950 e Vereador eleito em Alagoinhas nas eleições de 1950, 1954, 1958 e 1962.

Através de Romualdo Campos, no plenário do Legislativo Municipal, era dada visibilidade a


problemas enfrentados por operários da indústria em Alagoinhas. Por exemplo, em 1952, este
Vereador fez a seguinte denúncia relacionada à situação destes operários:

apelando para quem de direito sobre o horário e melhoria do salário; que o salário mínimo
não está sendo observado como determina a lei; que o serviço de identificação vem sendo
burlado de maneira tal que acarreta grandes prejuízos aos referidos operários. Que o único
sindicato devidamente organizado é o de Couros e Peles, sob a sua presidência. 284

283
APJR. O Nordeste, 14.10.1949.
284
ACMA. Ata de 02.05.1952 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

68
A Constituição de 1934 já versava sobre a regulamentação da jornada trabalho em 8 horas,
assim como acerca do salário mínimo, o qual passou a ser adotado somente a partir de 1940. A
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada em 1943, consagrou tal regulamentação.285
Porém, de acordo com o que denunciava Romualdo Campos, percebe-se que havia uma distância
entre o que era previsto pela legislação trabalhista e o que realmente era vivenciado por operários
do setor industrial em Alagoinhas, demonstrando que os direitos sociais que foram introduzidos na
Constituição brasileira, durante as décadas de 1930 e 1940, não se universalizavam. A presença no
Legislativo Municipal de um representante dessa categoria de trabalhadores tornava possível atuar
como um instrumento de pressão contra as arbitrariedades cometidas pelo segmento patronal para
com os referidos operários, que, segundo Romualdo Campos, ainda carecia de organização sindical.
Ainda em relação ao conjunto dos trabalhadores na indústria de Alagoinhas, Romualdo
Campos apresentou requerimentos, através do Legislativo Municipal, destinados ao Instituto de
Aposentadoria e Pensões dos Industriários (IAPI) e ao Serviço Social da Indústria do estado da
Bahia (SESI). Para o IAPI, em 1951, requisitava-se a instalação de uma agência deste órgão em
Alagoinhas uma vez que “o número de operários da indústria e associados do Instituto de
Aposentadoria e Pensões dos Industriários nesta cidade é superior a 2.000.”286 A resposta acerca
dessa petição ocorreu somente em 1953, sendo informado que caso passasse a funcionar em
Alagoinhas uma agência do IAPI, o atendimento aos seus associados haveria de ser abreviado, “pois
as suas pretensões seriam decididas em três dias e não em trinta e mais dias como vinha sendo.”287
A instalação de um posto do SESI em Alagoinhas, segundo Romualdo Campos, teria ocorrido
através da sua intervenção, ao ser encaminhado pelo Legislativo Municipal um requerimento de sua
autoria.288 O posto do SESI, quando instalado, prestava assistência médica gratuita aos operários da
indústria e suas famílias.289

285
CARVALHO, José Murilo. A cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004.
p.110-113.
286
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Romualdo Campos em 15.10.1951. Livro de Requerimentos
(1951). Segundo dados do IBGE, em 1950, havia em Alagoinhas 708 homens e 7 mulheres vinculadas a indústria
extrativista, perfazendo um total de 715 pessoas. Com relação à indústria de transformação indica que havia 1.624
homens e 335 mulheres, totalizando o número de 1.959 pessoas atreladas a este setor produtivo. Ver: Censo
Demográfico de 1950. Série Regional, volume XX, tomo 1, Estado da Bahia, IBGE, 1955. p.88.
287
ACMA. Ata de 24.04.1953 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
288
ACMA. Ata de 22.05.1954 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas. Consta requerimento apresentado por
Romualdo Campos solicitando a extensão de determinados serviços do SESI “aos operários e suas famílias de
Alagoinhas.” Ver: ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Romualdo Campos em 06.06.1952. Livro de
Requerimentos (1952).
289
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Romualdo Campos em 27.05.1954. Livro de Requerimentos
(1954).

69
A presença em Alagoinhas de postos dos dois órgãos mencionados atenuaria as dificuldades
imediatas dos operários na indústria. A existência de uma agência do IAPI evitaria o deslocamento
de seus associados para outra cidade quando necessitassem solucionar assuntos relacionadas à
previdência, abreviando a solução de determinadas questões, e impedindo despesas com
deslocamento por estes trabalhadores, que em alguns casos sequer recebiam um salário mínimo,
conforme foi destacado. Por sua vez, o funcionamento de um posto do SESI na cidade poderia
diminuir as dificuldades relacionadas à assistência médica, uma vez que era deficiente o
atendimento público à saúde em Alagoinhas nesse período, como foi salientado no primeiro
capítulo.
No entanto, no caso do IAPI, havia uma distância entre o objetivo a ser cumprido por esse
órgão, prevista em lei, e que poderia diminuir os problemas vividos pelos operários, e o que
efetivamente se realizava. Por mais de uma vez Romualdo Campos foi porta-voz de denúncias
quanto à atuação deste Instituto previdenciário. Em maio de 1952, este vereador usou a tribuna da
Câmara denunciando que o IAPI vinha “deixando os seus associados sem o amparo a que tem
direito de acordo com a lei”.290 Reforçando a sua crítica apresentou o seguinte testemunho:

um associado do mesmo Instituto adoecido gravemente e ele [Romualdo Campos] em


companhia do Doutor Arnaldo Tavares, médico do mesmo Instituto fora visitá-lo e o
referido médico depois de meticuloso exame concluiu com um laudo que foi enviado a
direção do Instituto, que o operário associado precisava de alguns dias de descanso.
Decorrido alguns dias o operário faleceu e ontem recebeu com surpresa uma carta do
Instituto para o dito operário dizendo-o apto para o serviço e que não precisava de descanso
e dos favores daquele Instituto. Realmente o operário já falecido nada mais precisava, disse
o orador e prosseguiu focalizando o descaso que permaneceu os pobres operários
associados dos Institutos e principalmente os operários dos curtumes. Que o presidente da
república, o Doutor Getúlio Vargas tem se manifestado amigo dos operários e aos mesmos
tem dado lei que lhes concede grandes benefícios e garantias, entretanto os incumbidos de
executar a lei procuram burlar e traem a confiança que lhes é depositada.291(grifos meus)

Interpretando leis que poderiam atender a determinadas necessidades dos operários como
fruto da dádiva do Governo de Getúlio Vargas, nessa intervenção, Romualdo Campos, demonstra,
através da morte do trabalhador diante do descaso do Instituto previdenciário, o abismo existente
entre o que era previsto na legislação e a sua aplicação.292

290
ACMA. Ata de 16.05.1952 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
291
Idem.
292
O IAPI foi criado em 1934, na esteira das transformações implantada no setor previdenciário do país, após a
ascensão de Getúlio Vargas ao poder em 1930. As antigas Caixas de Aposentadoria e Pensão que eram constituídas por
empresas foram substituídas pelos Institutos de Aposentadoria e Pensão que passou a agregar categorias profissionais
amplas: marítimos, comerciários, industriários, ferroviários etc. A partir desse momento o Governo passou a ter poder
de interferência nessa nova organização do sistema previdenciário. Ver: CARVALHO, José Murilo, op. cit., p.113-114.

70
Em 19 de novembro de 1953, na sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas, Romualdo
Campos voltou a fazer queixas quanto aos serviços do IAPI, informando que o sindicato dos
operários em curtumes de Alagoinhas, do qual ele era presidente, tinha enviado uma representação
ao Ministro do Trabalho, alegando que:

é sabido a falta de assistência social, aos operários em geral deste município, alguns dos
quais portadores de moléstias insidiosas e sem nenhum recurso para o seu tratamento; que
aos poderes públicos cabe a responsabilidade, no entanto abandonam os operários de tal
maneira, que nem ao menos, procuram cumprir o seu dever dentro da lei que rege a
espécie; que existe operários doentes, encostados nos Institutos recebendo a diminuta
quantia de trezentos cruzeiros, importância deficiente para o sustento individual, quanto
mais para atender as necessidades da família e remédios.293 (grifos meus)

Nessa sua argumentação mais uma vez ficou explicitado o hiato existente entre o que
determinava a legislação trabalhista e o que de fato se efetivava, aludindo aos casos de operários
que se encontravam adoecidos e sem receber a devida assistência do Instituto a que eram
vinculados. Nessa sua fala, Romualdo Campos, certamente refere-se aos casos de tuberculose que
eram incidentes nos operários das indústrias em Alagoinhas, os quais com os parcos recursos da
remuneração que recebiam, enfrentavam sérios problemas para conduzir um tratamento clínico.
Nesta condição, em junho de 1952, um operário enfermo, por ter contraído tuberculose acionou
Romualdo Campos para que este atuasse como intermediário junto ao Ministério da Saúde, no
intuito de viabilizar o seu tratamento. Na oportunidade, salientou Romualdo Campos que havia
também outros operários “atacados do mesmo mal e sem o necessário recurso para se manter e se
tratar.”294
Diante disso, Romualdo Campos fez um pedido do medicamento destinado ao tratamento de
tuberculose, denominado Hidrazina, reiterando-o no mês seguinte, solicitando que através da
Câmara fossem encaminhados telegramas constando o mesmo pedido para o Ministro da Saúde e o
Secretário de Saúde do estado da Bahia.295 A razão do novo pedido era o atendimento de um
trabalhador que se achava “atacado de tuberculose”, talvez fosse o mesmo que motivou a
solicitação do mês anterior.296 Porém, passados alguns dias, a remessa do medicamento não tinha
sido enviada e Romualdo Campos informou que o operário que requereu a sua mediação nessa

293
ACMA. Ata de 16.11.1953 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas. Na sessão seguinte, Romualdo
Campos retificou que a quantia recebida pelos operários “encostados” nos institutos previdenciários era de 395
cruzeiros e não de 300 cruzeiros.
294
ACMA. Ata de 16.06.1952 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas; Requerimento apresentado pelo
Vereador Romualdo Campos em 16.06.1952. Livro de Requerimentos (1952).
295
ACMA. Ata de 11.07.1952 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
296
Idem.

71
demanda, vinha sendo assistido por Pedro Dórea, médico e Prefeito de Alagoinhas em exercício, o
qual tinha fornecido medicação e atendido gratuitamente ao operário enfermo.297
Desde o primeiro semestre de 1952, Romualdo Campos tinha rompido com o diretório local
do PTB, partido a que era filiado, ao passo que demonstrava uma aproximação com o PSD, partido
do Prefeito Pedro Dórea, diferente dos seus colegas de bancada Hildebrando Dias e Eurico Costa.298
Certamente, essa condição permitia que Romualdo Campos intercedesse pelo operário adoentado
solicitando serviços do médico e Prefeito Pedro Dórea, pois nesse momento mantinha no plenário
do Legislativo Municipal uma postura que não era hostil ao chefe do Executivo Local,
diferentemente dos outros dois vereadores. O Prefeito Pedro Dórea, por sua vez, dispunha de
condições para atender a tal pedido, pois além de ser médico, tinha requisitado uma remessa do
medicamento utilizado no tratamento de tuberculose e, segundo o Vereador Joaquim Batista Filho,
membro da bancada governista, distribuía “gratuitamente a pessoas pobres atacadas da terrível
moléstia.”299 Por essa razão, inclusive, o Vereador Joaquim Batista Filho propôs uma moção de
congratulações para o Prefeito Pedro Dórea, a qual foi questionada pelos petebistas Eurico Costa e
Rodolfo Dantas, este último suplente do Vereador Hildebrando Dias, ao alegarem que havia
intenções em projetar a imagem do referido Prefeito.300
Em 1954, Romualdo Campos voltou a recorrer ao Ministério da Saúde solicitando o envio do
medicamento destinado ao tratamento de tuberculose. Dessa vez, o pedido visava atender a “um
grande número de operários” e demonstra o papel de mediador exercido por Romualdo Campos
entre trabalhadores e o Estado:

Exmo. Sr. Dr. Antonio Balbino Ministro da pasta de Educação e Saúde, solicito de sua
Excia. autorizar aos seus dignos auxiliares remeter a esta Câmara a quantidade possível de
Indrazina, medicamento este de grande utilidade para a cura da tuberculose, vez que são
inúmeros os pedidos a esta Câmara por intermédio do vereador Romualdo Pessoa
Campos, em virtude do mesmo representar nesta Câmara e no Sindicato dos
Trabalhadores na Indústria de Cortimento de Couros e Peles, um grande número de
operários da indústria desta cidade, os quais diante o trabalho que exercem com salários
irrisórios e consequentemente maus alimentados, alguns chegam ao ponto diante dessa
situação a serem atacados por este terrível mal.301 (grifos meus)

297
ACMA. Ata de 21.07.1952 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
298
ACMA. Ata de 05.05.1952 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
299
ACMA. Ata de 18.07.1952 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
300
ACMA. Ata de 21.07.1952 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
301
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Romualdo Campos em 19.04.1954. Livro de Requerimentos
(1954). Em maio e julho de 1954 também foram aprovados requerimentos de Romualdo Campos para serem enviados
ao Ministério da Educação e Saúde solicitando medicamentos para o tratamento de tuberculose, os quais só foram
recebido no mês de novembro desse mesmo ano. Ver: ACMA. Atas de 07.05.1954, 12.07.1954, 22.10.1954 e
19.11.1954 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

72
Através da solicitação encaminhada ao Ministério da Saúde, além de ficar evidenciada a
função de mediação entre uma determinada demanda dos operários e o Estado, também ficam
expostas as razões que tornavam vulneráveis os trabalhadores da indústria para contraírem
tuberculose, ou seja, os salários irrisórios que recebiam e a má alimentação que ficavam expostos
em decorrência disto.
Ao mesmo tempo, essa questão reflete em dois pontos o distanciamento entre o que
sustentava a legislação e o que era vivenciado por esses trabalhadores. O primeiro ponto se
relaciona a deficiência no atendimento médico público em Alagoinhas. Diante disso, uma
alternativa escolhida pelos operários era acionar um mediador que pudesse atuar junto a
determinados organismos governamentais, como o Legislativo Municipal, o Ministério da Saúde e a
Secretaria de Saúde estadual, por exemplo.
O segundo ponto diz respeito, especificamente, à distância existente entre a legislação
trabalhista e o que era praticado nas relações estabelecidas entre patrões e trabalhadores no dia-a-
dia. Como foi visto, percebia-se, por exemplo, o não cumprimento do que era determinado por lei
quanto ao pagamento do salário mínimo aos operários de indústrias em Alagoinhas. Este era o caso
dos trabalhadores em curtumes no ano de 1952, principalmente os que estavam vinculados aos
Curtumes São Paulo e Santa Cruz, os dois maiores da cidade, que segundo Romualdo Campos
vinha “trabalhando pouco ou quase nada, a ponto de no fim de semana os operários não retirarem o
necessário para a sua manutenção e de sua família.”302 Além disso, denunciava Romualdo Campos
que “além do mais os operários estão sendo tratados desumanamente pelos dirigentes, os quais
chegam ao ponto de ostensivamente usarem armas de fogo que a todo momento experimentam-nas
para verificarem se estão perfeitas.”303 Essa denúncia suscitou a intervenção de outros vereadores.
Recuperemos parte dessa discussão:

O Vereador Horácio Dantas aparteou o senhor Romualdo Campos dizendo que,


naturalmente as armas eram usadas para [os dirigentes dos referidos curtumes] se
garantirem, talvez receiosos de uma agressão. O Vereador Romualdo Campos continuando
com a palavra referiu-se a questão trabalhista nesta cidade, o descaso dos responsáveis pela
situação dos operários, aludira a fatos que tivera a necessidade de resolver entre patrões e
operários do Curtume da firma Robatto Coelho e Cia Ltda.; que há poucos dias fora a
capital do estado para tratar com o delegado regional do trabalho a possibilidade de ser
indicado um fiscal para essa zona, tendo o referido delegado lhe observado que não havia
fiscais para a capital quanto mais para o interior em virtude da falta de verba. (...)
Continuou com a palavra o Vereador Romualdo Campos focalizando a situação dos

302
ACMA. Ata de 01.08.1952 da sessão Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
303
Idem.

73
operários sem amparos e sem garantias e disse que qualquer papel para ter andamento na
Delegacia do Trabalho tornava necessário que o operário desse gorjeta e que ele a semana
p.passada lançara mão de tal recurso dando um “olho de boi” a um serventuário a fim de
que um seu papel tivesse andamento. Em aparte o Vereador Horácio Dantas observou de
que os operários não deviam se conformar com tal situação, pois tinha recursos da lei
devendo recorrer a quem de direito. Em aparte o Vereador Joaquim Batista falou que a
questão trabalhista no Brasil estava falida. 304

De acordo com a fala de Romualdo Campos, os trabalhadores nos curtumes São Paulo e Santa
Cruz não estavam alcançando uma remuneração suficiente para a sua manutenção e de sua família.
Também é salientada a arbitrariedade dos dirigentes destas empresas, que, em gesto de ameaça,
usavam no ambiente de trabalho armas de fogo. Certamente, este quadro corresponde ao temor dos
referidos dirigentes quanto à insatisfação dos trabalhadores diante da opressão existente nas
relações de trabalho. Ao testemunhar sobre o que estava sendo enfrentado pelos curtumeiros de
Alagoinhas, Romualdo Campos mais uma vez evidencia o abismo existente entre o que era previsto
pela legislação trabalhista e o que era vivido no cotidiano pelos trabalhadores, ou seja, a fragilidade
dos organismos responsáveis para a fiscalização da aplicação da Lei diante de arbitrariedades
cometidas pelos patrões.305 Diante disso, categoricamente afirmou Joaquim Batista que “a questão
trabalhista no Brasil estava falida”, o que procede se for levada em conta essa descrição das
condições de trabalho dos curtumeiros em Alagoinhas. Porém, a fala de Joaquim Batista Filho
representa muito mais a posição de um ex-militante da Ação Integralista Brasileira306 e membro do
Partido da Representação Popular (PRP),307 que tendia a se colocar como um crítico ao que, muitas
vezes, era ovacionado como um legado positivo de Getúlio Vargas.
De sua postura enquanto Vereador, representando determinadas questões relacionadas aos
trabalhadores, rendeu interpretações controversas. Por exemplo, sobre o seu discurso em defesa do
pagamento do salário mínimo para os servidores municipais diaristas, o Vereador Joaquim Batista
julgava-o compatível para “uma república soviética ou comunista”.308 Por sua vez, o Vereador José
Olímpio de Azevedo Neto considerava Romualdo Campos ambíguo ao se colocar em defesa dos
servidores municipais e, ao mesmo tempo “estar de braços dados com o senhor Prefeito, que é o
maior perseguidor do salário mínimo”.309 Do Vereador Eurico Costa vinha o ataque a Romualdo
Campos “de querer chamar para si o privilégio de único defensor dos interesses da classe

304
ACMA. Ata de 01.08.1952 da sessão Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
305
Em 1954 foi instalado em Alagoinhas um posto da Delegacia Regional do Trabalho, alegando Romualdo Campos ter
sido fruto dos seus pedidos. Ver: ACMA. Ata de 23.04.1954 da sessão da Câmara de vereadores de Alagoinhas.
306
ACMA. Ata de 15.06.1951 da sessão Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
307
ACMA. Atas de 08.06.1951 e 22.06.1951 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
308
ACMA. Ata de 30.04.1954 da sessão Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
309
Idem.

74
proletária”.310 Dos patrões, segundo o próprio Romualdo Campos, advinha a taxação de ser ele
comunista311 e do periódico comunista O Momento a taxação de ser ele pelego.312
A atuação de Romualdo Campos dava margens para interpretações controversas, mas a sua
presença no Legislativo Municipal, assim como dos demais vereadores do PTB destacados nesse
capítulo, se apresentava como uma alternativa possível, dentro dos limites existentes em uma
democracia representativa, para trabalhadores buscarem políticas públicas em um contexto em que
ficam patentes as precariedades que havia em bairros operários, no oferecimento aos serviços de
saúde e educação e nas condições de trabalho enfrentadas por curtumeiros, ferroviários e servidores
municipais. Certamente esse aspecto contribuiu para que Romualdo Campos, assim como os outros
dois vereadores do PTB eleitos para a legislatura de 1951-1954, Hildebrando Dias e Eurico Costa,
retornassem à Câmara de Vereadores na legislatura seguinte, como será discutido no próximo
capítulo.
Ainda sobre a legislatura de 1951-1954, cabe mencionar o início de uma interlocução de
vereadores udenistas, especificamente Milton Leite, Horácio Dantas e José Olimpio de Azevedo
Neto, entre algumas demandas de trabalhadores urbanos e o poder público. Este posicionamento
corresponde a uma mudança de postura dos udenistas se comparado com a legislatura anterior. É
presumível que esta mudança tenha significado a compreensão de que esses sujeitos sociais, os
quais se multiplicavam na proporção que a cidade vivenciava um processo de expansão urbana e
demográfica, se constituía como um contingente eleitoral que não deveria ser ignorado naquele
contexto em que houve o retorno das eleições diretas.313

310
Idem.
311
ACMA. Ata de 19.04.1954 da sessão Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
312
Tentando se desvincular da imagem de comunista Romualdo Campos publicou mensagem intitulada Aos
Alagoinhenses no jornal O Nordeste admitindo ser calúnia a informação que o descrevia como “agitador, comunista e
perturbador da ordem e da tranquilidade pública.” Concluía Romualdo Campos que “(...) felizmente, a denúncia é
destas que causam até riso, (...), pois quem, até hoje, já me viu em conciliábulos comunistas ou saiba ser eu fichado no
partido político soviético?”. Ver: APJR. O Nordeste, 14.10.1949, p.2. Em outra oportunidade Romualdo Campos se
defendeu da taxação de pelego feita pelo O Momento, jornal ligado ao PCB baiano. Porém parece ter sido o seu
principal interesse demonstrar que não era bem visto entre os comunistas baianos e, desse modo, se desvincular da
insinuação de ser um destes, pois alegava Romualdo Campos que, devido a uma acusação do Delegado do Ministério
do Trabalho em Salvador, foi “vigiado como comunista” quando esteve “em Petrópolis representando os
trabalhadores”. Ver: ACMA. Ata de 20.07.1951 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
313
Milton Leite era engenheiro agrônomo e em 1951 apresentou uma proposição para a adoção da Semana Inglesa pelo
comércio de Alagoinhas, aspiração dos comerciários conforme ficou explicitado em ofício enviado ao Legislativo
Municipal pela a Associação dos Empregados no Comércio de Alagoinhas. Ver: ACMA. Atas de 07.04.1951,
11.05.1951 e 09.07.1951 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas. Milton Leite também requisitou a
instalação de chafarizes para o 2 de Julho, reduto ferroviário, como para outras localidades afastadas do centro da
cidade como Santa Terezinha e Rua do Inhambupe. Ver: ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Milton
Leite em 27.04.1951. Livro de Requerimentos (1951). Horácio Dantas era pecuarista e em 1952 apresentou proposição
recomendando o aumento salarial dos servidores municipais. ACMA. Atas de 13.10.1952, 03.11.1952 das sessões da
Câmara de Vereadores de Alagoinhas. José Olimpio de Azevedo Neto, em 1953, após ter sido procurado por alguns

75
A UDN tem a sua gênese relacionada ao agrupamento de tendências distintas que emergiram
do movimento de oposição ao regime ditatorial chefiado por Getúlio Vargas.314 Na Bahia,
confluíram para a composição da UDN os remanescentes da Concentração Autonomista e antigos
aliados de Vargas no estado, que romperam com este a partir da instauração do Estado Novo em
1937. Nestes dois blocos se destacava a liderança de Otávio Mangabeira, entre os primeiros, e a de
Juracy Magalhães, entre os últimos. Com isso, adversários de outrora se aproximaram, porém as
divergências não se diluíram e coesão foi uma palavra que se manteve rasurada no dicionário dos
udenistas baianos.315
O diretório da UDN em Alagoinhas, na retomada do regime representativo, além de
reproduzir essa divisão entre autonomistas e juracisistas316 também confirmava a tendência elitista
que possuía os quadros deste partido se observados os primeiros udenistas a ocuparem cargos
eletivos em Alagoinhas em 1947.317 Francisco Batista era comerciante, Horácio Leal Dantas e Hugo
Luna Dantas eram proprietários de terra e Josaphat Paranhos Azevedo engenheiro agrônomo.318
Enfim, diferente da legislatura anterior é perceptível na conduta da maior parte dos vereadores
udenistas uma interlocução junto ao poder público em favor do atendimento de interesses
relacionados aos trabalhadores. Trata-se de ações em proporção diminuta se comparada com as que
foram protagonizadas pelos vereadores petebistas analisadas anteriormente, mas que podem indicar
a busca dos udenistas em se vincular a uma base eleitoral na área urbana. Tal mudança de
comportamento pode refletir a compreensão de que essa parcela do eleitorado da cidade não poderia
ser desprezada naquela conjuntura em que se processava um aumento significativo do contingente
populacional urbano. A presença das candidaturas dos ferroviários Eurico Costa e Hostílio Dias,
pela UDN na eleição municipal de 1954, possivelmente refletia esta preocupação no seio deste
partido.

moradores da Rua 2 de Julho, atuou como mediador destes junto ao Executivo Municipal, pedindo “providências sobre
a atitude de um construtor granfino que está abrindo uma rua que parte da rua 14 de Janeiro para a rua 2 de Julho,
cortando casas e quintais, sem ligar a mínima importância aos prejudicados.” Ver: ACMA. Ata de 25.05.1953 da sessão
da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
314
BENEVIDES, Maria Victoria, op.cit., p.35.
315
A Concentração Autonomista foi construída por forças políticas afastadas de postos decisórios na Bahia com o
advento da Revolução de 30 e a implantação das interventorias que permitiu um grande poder de interferência da
Presidência da República nas decisões políticas em nível estadual. Ver: SILVA, Paulo Santos, op. cit., p.86-91.
316
APJR. O Nordeste, 30.04.1950, p.1.
317
Segundo Paulo Silva, os fundadores do diretório estadual da UDN caracterizavam-se como indivíduos pertencentes
“a uma elite influente, conservadora e distanciada das massas.” Ver: SILVA, Paulo Santos, op. cit., p.81 e 98.
318
PAIXÃO, Carlos Nássaro Araujo da, op. cit., p.78-80.

76
Capítulo III
Os interlocutores dos trabalhadores no Legislativo Municipal de Alagoinhas e a
polarização política nacional (1955-1964)

Desde 1948, com a reabertura do Legislativo Municipal em Alagoinhas, se percebeu um


marcha ascendente, no que diz respeito à mediação de demandas relacionadas aos trabalhadores
através desse órgão legislativo. Essa marcha ascendente teve o seu princípio na primeira legislatura
pós-Estado Novo (1948-1950), basicamente através de Almiro de Carvalho Conceição (PSD), uma
vez que os dois vereadores do PTB, Israel Pontes Nonato e Felisbertino Sá de Oliveira tiveram um
desempenho bastante discreto neste aspecto; e se ampliou na legislatura seguinte (1951-1954), em
compasso com o aumento da bancada do PTB, através dos vereadores Hildebrando Dias, Eurico
Costa e Romualdo Campos.
Neste capítulo serão discutidas as três legislaturas que se desenvolveram entre 1955 e 1964.
Vale dizer que durante essas legislaturas se tornaram mais evidentes as repercussões da polarização
política que se desenvolvia no âmbito nacional entre as forças herdeiras do getulismo e os
segmentos antigetulistas, representados, principalmente, pela UDN.
Desse modo, na primeira parte deste capítulo será abordado o período de maior intensidade
na mediação dos interesses dos trabalhadores no Legislativo Municipal, mediação protagonizada
pela Frente Popular Democrática, bancada de oposição inicialmente composta por seis vereadores.
A existência desta Frente foi efêmera, todavia se inscreveu em um momento de significativo
aumento no embate político local que, também era inflamado pela mencionada polarização que
ocorria na política do país. A segunda parte se ocupará em discutir a legislatura de 1959-1962 em
que ocorreu a presença da maior parte dos vereadores que possuíam laços com a classe trabalhadora
em uma posição governista. Na terceira parte será tratado o período entre 1963 e 1964 que abarca a
última legislatura antes do golpe civil-militar que implantou um regime ditatorial no Brasil. No seu
decurso se percebeu a ampliação na bancada governista do número de interlocutores de demandas
vinculadas aos trabalhadores e as repercussões no ambiente político local do regime autoritário
implantado em 1964 no país.

77
1. A Frente Popular Democrática (1955-1958)

Das eleições municipais, de outubro de 1954, saíram os doze vereadores eleitos para compor
o Legislativo Municipal de Alagoinhas para a legislatura 1955-1958. O PSD, assim como a UDN,
elegeu cinco vereadores e o PSP dois.319 Partidos menores como PRP e PRT participaram dessa
eleição, mas não tiveram nenhum representante eleito.320 Cabe registrar, também, que o PTB, que
vinha em ascensão nas eleições para o Legislativo Municipal, em Alagoinhas, – como foi visto no
capítulo anterior, o PTB elegeu dois vereadores em 1948 e quatro em 1950 - não elegeu nenhum
Vereador, quando havia se passado poucos dias entre a morte de Getúlio Vargas e a eleição.321
Certamente este fracasso eleitoral do PTB, em Alagoinhas, foi o preço pago pela sua frágil coesão
interna, conforme foi noticiado em 1952 e que ficou explícita nessa eleição municipal de 1954,
quando integrantes das suas fileiras se apresentaram como candidatos por outras legendas
partidárias: Felisbertino Sá de Oliveira, eleito em 1948 pelo PTB e Romualdo Campos eleito por
esse mesmo partido em 1950 se candidataram pelo PSD; Hildebrando Dias eleito pelo PTB em
1950 candidatou-se pelo PSP; Eurico Costa e Thiago Evangelista dos Santos, também eleitos pelo
PTB em 1950 saíram candidatos pela UDN.322
Nessa eleição de 1954, venceu a disputa para o Executivo Municipal, com 3.013 votos,
Antonio Martins de Carvalho Júnior, outro dissidente do PTB e que nesta oportunidade participou
do processo eleitoral representando a UDN. Concorreram também para o Executivo Municipal
Vitor Nascimento Filho, pelo PSD, recebendo 2.936 votos e Israel Pontes Nonato, candidato do
PTB, que contabilizou apenas 695 votos.323

319
Essa constatação advém do confronto entre a lista dos candidatos e os seus respectivos partidos na eleição de 1954,
publicado na edição de 24 de dezembro de 1954 do jornal O Nordeste, e os nomes dos vereadores empossados em 15 de
abril de 1955. Ver respectivamente: O Nordeste, 24.12.1954, p.7 e Ata de 15.04.1955 da Câmara de Vereadores de
Alagoinhas.
320
APJR. O Nordeste, 24.12.1954, p.7.
321
Getúlio Vargas morreu em 24 de agosto de 1954 e na sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas realizada três
dias depois, o então petebista Eurico Costa apresentou um requerimento que autorizava a colocar um quadro com o
retrato de Getúlio Vargas no recinto onde se realizava as sessões do Legislativo Municipal, assim como incluir uma
cópia da sua “carta-testamento” na ata daquela sessão. Este requerimento foi também assinado, pelos vereadores
udenistas Milton Leite, Horácio Dantas e José Olimpio de Azevedo Neto. Ver: ACMA. Ata da sessão de 27.08.1954 da
sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
322
Foi veiculado, em 1952, pelo jornal O Nordeste, que o diretório do PTB em Alagoinhas estava dividido. Havia um
conflito interno entre uma ala liderada por Israel Pontes Nonato e outra liderada por Felisbertino Sá de Oliveira. Ver: O
Nordeste, 08.01.1952, p.1. Porém, as divergências não era algo exclusivo do diretório do PTB em Alagoinhas, pois elas
predominaram em todos os escalões do partido ao longo da sua trajetória, trazendo como consequência a fragmentação
interna e as dissidências. BENEVIDES, Mara Victoria. op. cit., p.19.
323
APJR. O Nordeste, 24.12.1954, p.4.

78
Os casos dos dissidentes do PTB alagoinhense que migraram para outros partidos indicam um
traço marcante no sistema partidário brasileiro, durante a Segunda República, que está relacionado
com a indefinição programática dos partidos e a baixa solidez dos vínculos entre os filiados e as
agremiações partidárias. As dissidências, em grande medida, eram fruto deste processo que, ao
mesmo tempo, revelava a inconsistência dos partidos enquanto organismos capazes de
representarem os interesses presentes na sociedade brasileira, naquele momento.324 Estas
dissidências, também, explicitam a prática do uso dos partidos como um mero instrumento
necessário para a participação no jogo eleitoral, mas que poderia ser descartado em seguida.325
Como foi mencionado, houve exemplos das transferências de petebistas, inclusive para UDN,
partido adversário do PTB, notoriamente identificado pelo seu perfil antigetulista.326
Nesse contexto onde estava ambientado o sistema partidário brasileiro, em que se
combinavam a indefinição programática da maioria das organizações partidárias e os frágeis laços
existentes entre alguns parlamentares e os seus partidos, emergiu no interior do Legislativo
Municipal de Alagoinhas, a Frente Popular Democrática.327 Desse modo, logo na primeira sessão da
legislatura 1955-1958 se comunicou à Mesa diretora da Câmara de Vereadores de Alagoinhas a
formação desta Frente:

Senhor Presidente: Os vereadores infra-assinados comunicam a V.Excia. e a Casa que, para


os fins de atuação parlamentar, passam a constituir uma única bancada, sob a legenda
“FRENTE POPULAR DEMOCRÁTICA”, escolhendo para seu líder o Vereador João Nou,
que indicará a sua representação da bancada nas comissões permanentes na conformidade
do artigo 14 do Regimento. Alagoinhas, 15 de abril de 1955. - (Assinados) João Nou,
Romualdo Pessoa Campos, Amando Camões Filho, João Ferreira Ramos, Hostilio Ubaldo
Ribeiro Dias, Hildebrando Ribeiro Dias.328

324
DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. Partidos políticos e frentes parlamentares: projetos e conflitos na democracia
In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves (org). O Brasil Republicano: O tempo da experiência
democrática: da democratização em 1945 ao golpe civil-militar de 1964. Vol.3. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2004. p.130-151.
325
Francisco Weffort defende que durante a Segunda República (1945-1964), no Brasil, era “manifesta a incapacidade
de penetração popular dos partidos.” Por essa razão, o voto tendia a tornar preponderante uma relação entre eleitor e
candidato – uma relação entre indivíduos - e não uma relação entre eleitor e partido. Ver. WEFFORT, Francisco, op.
cit., p.19-20.
326
BENEVIDES, Mara Victoria, op. cit., p.34-35.
327
Segundo Lucilia Delgado, foi entre a segunda metade da década de 1950 e o início da década de 1960 que se deu a
formação de Frentes Parlamentares, no Brasil, reunindo em seu seio membros que buscavam constituir organizações
com identidade mais definida diante da inconsistência programática dos partidos. Nesse contexto, foi recorrente se
reunirem em uma mesma Frente representantes de organizações partidárias adversárias dando sinais de que os partidos
constituídos, a partir de 1945 no Brasil, com o retorno de uma democracia representativa, apresentavam a incapacidade
em corresponder a uma série de demandas que surgiam na sociedade brasileira que cada vez mais se urbanizava e
ampliava a sua atuação política. DELGADO, Lucilia de Almeida Neves, op. cit., p.130-151.
328
ACMA. Ata de 15.04.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

79
A FPD, durante a sua curta existência, entre os anos de 1955 a 1956, foi o exemplo mais
intenso, em Alagoinhas, da mediação entre demandas de trabalhadores junto a diferentes esferas do
Estado. Essa Frente se configurou como um bloco de oposição que foi formado por seis integrantes,
os quais eram oriundos das bancadas do PSD e do PSP, junto com um dissidente da UDN, partido
governista naquele momento no município. Mas cabe mencionar um sétimo integrante, uma vez que
eventualmente a esta se incorporava quando assumia, na condição de suplente pelo PSD, a função
de Vereador. Trata-se de José de Araújo Batista, ferroviário329 que, segundo João Nou, era um “um
moço pobre, honrado e honesto; (...) líder operário e representante do eleitorado de Aramari”.330
Aramari, como já foi visto, possuía instalada uma oficina da VFFLB e uma população composta
majoritariamente por famílias de ferroviários.

Imagem 10: Alagoinhas Jornal, 29.10.1958, p.1.


Foto de José de Araujo Batista, ferroviário que, nas eleições de 1958, foi o vereador mais votado de Alagoinhas e se
tornou o primeiro Prefeito de Aramari, quando da emancipação desse distrito alagoinhense.

Tratemos dos demais integrantes da FPD.


João Nou pertenceu por dez anos à Polícia Militar da Bahia até pedir exoneração, em 1950, do
cargo de 1º tenente.331 Começou a residir em Alagoinhas em 1947, onde exerceu o ofício de
advogado e dirigiu o jornal alagoinhense O Nordeste.332 Em 1953, transferiu-se para a cidade de

329
ACMA. Ata de 23.05.1958 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
330
ACMA. Ata de 25.04.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
331
APJR. O Nordeste, 28.06.1950, p.1.
332
APJR. O Nordeste, 24.12.1954, p.13-14.

80
Londrina, no Paraná,333 mas no ano seguinte retornou a Alagoinhas, rompendo com a UDN, partido
a que pertencia desde 1945,334 foi eleito, Vereador pelo PSD.335
João Nou pertencia às hostes udenistas desde dezembro de 1945, quando disputou as eleições
para Prefeito na cidade baiana de Glória. Em 1950, foi candidato a Deputado Estadual também pela
UDN, chegando a assumir este cargo temporariamente como suplente por essa legenda. Segundo
João Nou, foi em 1950, quando já residia em Alagoinhas, que após relutar, atendeu ao pedido dos
seus amigos Mário Cravo e Manoel Novais para assumir “a direção da política juracisista em
Alagoinhas”.336 Todavia, em 1954, João Nou anunciava a sua ruptura com a UDN em compasso
com a cisão interna que acontecia nesse partido que refletiu no afastamento entre as lideranças
Juracy Magalhães e Manoel Novais. Antes mesmo de comunicar o seu afastamento dos quadros da
UDN, João Nou já apoiava na eleição estadual de 1954 a candidatura de Pedro Calmon337 para o
Governo da Bahia,338 mas, admitia que sempre estivesse mais ligado a Manoel Novais e, por isso, o
seu “natural caminho” seria o Partido Republicano (PR), partido ao qual Manoel Novais se
vinculou.339

Imagem 11: O Nordeste, 11.09.1954, p.6.


Foto de João Nou utilizada na sua campanha eleitoral de 1954 para Vereador em Alagoinhas, em que se lê no seu
slogan: “João Nou, é o advogado dos humildes.”

Hildebrando Dias era coletor da Secretaria da Fazenda do Estado da Bahia, exercendo essa
função em 1954 no município de Entre Rios.340 Neste mesmo ano estava filiado ao PSP, partido

333
APJR. O Nordeste, 29.01.1953, p.1.
334
APJR. O Nordeste, 24.12.1954, p.13.
335
APJR. O Nordeste, 24.12.1954, p.7.
336
APJR. O Nordeste, 24.12.1954, p.13-14.
337
Pedro Calmon foi candidato da coligação do PSD, PR, PL, PDC, PSP e PSB. Ver: O Nordeste, 19.09.1954, p.5.
338
APJR. O Nordeste, 24.12.1954, p.13-14.
339
APJR. O Nordeste, 24.12.1954, p.13-14.
340
APJR. O Nordeste, 23.05.1954. p.5.

81
pelo qual foi eleito como o Vereador mais votado nas eleições municipais de Alagoinhas.341 Desse
modo, Hildebrando Dias retornava à Câmara de Vereadores, visto que em 1952 teve o seu mandato
cassado, sob acusação do uso de uma linguagem que feria o decoro parlamentar, como abordado no
capítulo anterior. O uso de uma linguagem intempestiva continuou sendo utilizada por Hildebrando
Dias e isto o assemelhava a João Nou.
Hostílio Dias, irmão de Hildebrando Dias, era ferroviário e ocupou a presidência da União
dos Servidores Públicos na sessão de Alagoinhas.342 Em 1954, disputou a eleição para Vereador
pela UDN, mas em sua atuação como Vereador, adotou uma postura de franca oposição a esse
partido.

Imagem 12: Alagoinhas Jornal, 13.09.1958, p.1.


Foto de Hostílio Dias, ferroviário que exerceu o mandato de Vereador em Alagoinhas nas legislaturas de 1955-
1958 e 1959-1962.

Romualdo Campos, como já foi visto, era presidente do Sindicato dos Trabalhadores na
Indústria de Curtimento de Couros e Peles de Alagoinhas. Em 1954, partia para o segundo mandato
como Vereador, porém desta vez foi eleito pelo PSD, uma vez que estava filiado ao PTB na
legislatura anterior.
Amando Camões também era funcionário da ferrovia e chegou a presidir a Associação
Ferroviária de Alagoinhas.343 João Ramos era um morador da Rua 2 de julho,344 parte da cidade
onde havia uma ocupação residencial majoritariamente de ferroviários. João Ramos era considerado

341
APJR. O Nordeste, 24.12.1954, p.7.
342
APJR. O Nordeste, 15.07.1956, p.6.
343
APJR. O Nordeste, 29.07.1955, p.4.
344
APJR. O Nordeste, 02.05.1956, p.5.

82
“o Vereador do 2 de julho”.345 Estes dois vereadores foram eleitos pelo PSD e tiveram uma atuação
discreta se comparados aos demais membros da FPD.
Após essa incursão acerca dos integrantes da FPD, cabe salientar que a atuação deles
enquanto interlocutores entre demandas de trabalhadores junto ao poder público não diferiu em
muito dos exemplos percebidos nas duas legislaturas anteriores abordadas no segundo capítulo. Isto
quer dizer que era preponderante a apresentação de demandas ligadas aos servidores municipais,
aos operários dos curtumes, aos ferroviários e às áreas do município que eram habitadas por estes
últimos.
Assim, na sessão realizada em 22 de Abril de 1955, quando ainda estava em curso o primeiro
mês das atividades do Legislativo Municipal eleito no ano anterior, se deu mais um exemplo de
como os trabalhadores mobilizavam interlocutores para viabilizar o alcance de ações do poder
público. Nessa sessão, João Nou afirmou que tinha sido procurado “por líderes trabalhistas,
presidentes de sindicatos e associações de classe” para que apresentasse um abaixo-assinado
“pedindo o apoio material e moral dos poderes públicos para a comemoração da grande data
universal 1º de maio.”346Ainda nessa oportunidade João Nou solicitou para que Eurico Costa
(UDN), presidente da Câmara de Vereadores de Alagoinhas, “fosse o intermediário junto ao Poder
Executivo para a obtenção dos necessários recursos.”347
Romualdo Campos, enquanto presidente do sindicato ligado aos trabalhadores em curtumes,
foi um dos que subscreveram o referido abaixo-assinado.348 Além disso, Romualdo Campos era
membro da comissão organizadora para essa celebração do 1º de Maio e desapontado informou
sobre a resposta negativa dada pelo Secretário do Prefeito de que “a Prefeitura não tinha condições
de fazer despesas.”349 João Nou, contestando o posicionamento do Executivo Municipal, lembrou
que enquanto alegava-se que os cofres do município não podiam contrair gastos, os vereadores
Milton Leite e Horácio Dantas, ambos pertencentes à UDN, partido governista no município
naquele momento, propuseram o aumento no subsídio do Prefeito.
Convém tratar brevemente a respeito dessa proposição que acenava para o aumento no
subsídio do Prefeito, a qual, em abril de 1955, foi defendida pela bancada governista. A FPD, em
sua totalidade – seis vereadores – votou contra e derrotou a proposta que previa tal reajuste, pois
votaram favoravelmente apenas os governistas Milton Leite e Eurico Costa. Os demais vereadores

345
APJR. O Nordeste, 18.03.1956, p.6.
346
ACMA. Ata de 22.04.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
347
Idem.
348
ACMA. Ata de 25.04.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
349
ACMA. Ata de 29.04.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

83
estavam ausentes na sessão em que foi feita esta deliberação.350 Este episódio é representativo da
condição de interferência que a FPD passou a demonstrar nas decisões do Legislativo Municipal de
Alagoinhas, condição esta que nenhuma bancada de oposição havia apresentando desde a sua
reabertura em 1948.
A FPD, a partir de 1955, demonstrou que contava com o equivalente à metade dos votos do
plenário, e quando essa bancada votava em unidade, como no exemplo acima mencionado, havendo
a ausência de alguns vereadores, poderia se constituir como maioria. Este foi um dos aspectos que,
aliado aos reflexos da polarização das forças políticas que se desenvolvia no plano nacional,
contribuíram para que o dissenso entre oposição e situação, no plano local, evoluísse e alcançasse
um grau de tensionamento elevado.351
Retomando a discussão sobre a comemoração do 1º de Maio no ano de 1955 em Alagoinhas,
Romualdo Campos defendeu que fosse a mesma promovida com os recursos arrecadados junto aos
associados dos sindicatos, alegando que “nenhuma atenção foi dada aos trabalhadores para
comemorar o dia 1º de maio. Assim, ia providenciar a celebração de uma missa e outras
festividades dentro das possibilidades dos trabalhadores”.352 João Nou apoiou o posicionamento de
Romualdo Campos, recomendando que se o serviço de alto-falantes da Câmara de Vereadores de
Alagoinhas estivesse funcionando “fosse o mesmo cedido a fim de que promovido uma grande
concentração de operários, todos dissessem os motivos pelos quais não tinha sido promovido os
festejos da grande data 1º de maio”.353
A comemoração do 1º de maio foi realizada, inclusive, com serviço de alto-falantes, conforme
foi descrito pelo jornal O Nordeste, periódico alagoinhense do qual João Nou era redator:
Graças à liderança dos vereadores Romualdo Campos e Hostílio Dias, aquele presidente do
Sindicato dos Empregados em Curtume, e este dirigente da classe ferroviária, o Primeiro de
Maio não passou despercebido em Alagoinhas, apesar do Prefeito Carvalho Júnior sobre o

350
ACMA. Ata de 19.04.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
351
Como já foi destacado, esta polarização estava relacionada aos dois projetos políticos que se confrontaram no Brasil,
durante o período constitucional vigente entre 1945 e 1964, os quais são nomeados por Jorge Ferreira como “nacional-
estatista” e “liberal-conservador”. O primeiro, ao qual a FPD estava identificada, era representado, principalmente pelo
PTB trazendo uma plataforma caracterizada pelo nacionalismo que se opunha ao avanço dos interesses estrangeiros na
economia nacional, ao passo que defendia a intervenção do Estado em setores estratégicos da economia e em prol da
ampliação de redes de proteção social às camadas empobrecidas da sociedade brasileira. O segundo era representado,
sobretudo pela UDN e se caracterizava por ser elitista, antigetulista, anticomunista e solidário à abertura do país ao
capital estrangeiro e a contenção da interferência estatal na economia. De acordo com o referido autor, foi em
consequência do acirramento do embate entre estes dois projetos que se instaurou no país, em alguns momentos, a
instabilidade política que era acompanhada pela ameaça da suspensão do regime constitucional. Ver: FERREIRA,
Jorge. Crises da República: 1954, 1955 e 1961. In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves (org). O
Brasil Republicano: O tempo da experiência democrática: da democratização em 1945 ao golpe civil-militar de 1964.
Vol.3. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. p.303-304.
352
ACMA. Ata de 29.04.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
353
Idem.

84
pretexto da falta de dinheiro nos cofres municipais ter se esquivado de colaborar com a
classe operária nas comemorações do dia consagrado ao Trabalho.
Um bem elaborado programa constou de alvorada com salva de vinte e um tiros, missa
gratulatória, tarde esportiva e sessão solene no Sindicato dos Empregados em Curtume, foi
executado na mais perfeita harmonia entre os trabalhadores alagoinhense, tendo a frente os
seus líderes. A sessão solene que foi presidida pelo Vereador Eurico Costa, foi muito
concorrida, havendo grande massa em frente ao sindicato a assistir e aplaudir os oradores
ouvidos através de um serviço de alto-falantes ali instalado.
Sob aplausos falaram os senhores João Nou, Hildebrando Dias, Romualdo Campos,
Hostílio Dias e o operário Clarindo Santos, todos unânimes em ressaltar a significação do
Primeiro de Maio para os trabalhadores. O Sr. João Nou em seu discurso, apelou para que
os trabalhadores se unissem de molde à de uma vez por todas deixar de ser apenas uma
unidade eleitoral em véspera de eleições.
Assim, os operários, somente eles, comemoraram o Primeiro de Maio em Alagoinhas. 354

Nesta descrição, além de se destacar o papel dos vereadores e membros da FPD, Romualdo
Campos e Hostílio Dias, como responsáveis pela efetivação das comemorações do 1º de maio em
Alagoinhas, também o Prefeito udenista, Antonio Martins de Carvalho Júnior, é contestado por ter
usado “o pretexto da falta de dinheiro nos cofres municipais” para “ter se esquivado de colaborar
com a classe operária”. Na verdade, a mencionada Frente, além de possuir uma relativa força no
Legislativo Municipal, seis dos doze votos possíveis, tinha também o acesso a um órgão da
imprensa local, uma vez que João Nou era redator do jornal alagoinhense O Nordeste, o que poderia
eventualmente ser mobilizado no sentido de dar visibilidade a questões ligadas à atuação desta
bancada de oposição, o que de fato aconteceu.
Essa mobilização de membros da FPD, pelos trabalhadores, para intermediá-los junto ao
poder público foi apenas um de vários exemplos. Cabe ressaltar, que esse papel de mediação
praticamente foi feito exclusivamente pela FPD entre 1955 e 1956 e se combinava com o embate
existente entre integrantes desta Frente e representantes udenistas.
Não faltavam razões para a animosidade entre os componentes da FPD e a UDN. João Nou,
como foi visto, tinha rompido com a UDN em 1954. João Ramos, Romualdo Campos e Amando
Camões, pertenciam ao PSD, partido que em aliança com o PTB rivalizava no plano nacional com a
UDN, questão que reverberava na política local e incidia no embate político entre a FPD e a UDN
em Alagoinhas. Quanto à Hostílio Dias e Hildebrando Dias, apesar do primeiro ter sido eleito pela
UDN e o segundo pelo PSP, ambos estavam em sintonia com o posicionamento combativo da
referida Frente ante a UDN.
Na eleição presidencial de 1955, os membros da FPD demonstraram o seu apoio à candidatura
lançada pela aliança PSD-PTB que trazia Juscelino Kubitschek (PSD) e João Goulart (PTB)
concorrendo aos cargos de Presidente e Vice-presidente respectivamente.355

354
APJR. O Nordeste, 14.05.1955, p.6.

85
João Nou, em sua coluna intitulada Aguilhoadas, escrita no jornal O Nordeste, comentou
sobre a eleição presidencial de 1955 em Alagoinhas, eleição em que Juscelino Kubitschek e João
Goulart foram os mais votados no município. 356 João Nou dizia, que tinha defendido a candidatura
destes “desassombradamente em praça pública”357 e que a eleição tinha acontecido “sem os naturais
incidentes, sem as cachaçadas e os currais eleitorais (...). Por isto tudo correu bem. A vitória foi,
como não poderia deixar de ser, dos candidatos populares, Juscelino e Jango”. 358 Hildebrando Dias,
em demonstração semelhante no plenário da Câmara de Vereadores, exaltou os ferroviários e os
curtumeiros como principal eleitorado de Juscelino Kubitschek e João Goulart em Alagoinhas,
declarando que esses trabalhadores “souberam sufragar corajosamente a dupla J.J. e que não
tiveram medo dos assoalhadores de bofe e da suposta carta de Carlos Lacerda”. 359 Em seguida,
concluiu afirmando que a UDN achava-se “desalvorada em todo país”.360 Hostílio Dias também se
congratulou com a vitória de Juscelino Kubitschek, ao passo que dirigiu críticas à Josaphat
Azevedo, udenista alagoinhense que exercia o mandato de deputado estadual naquele momento,
afirmando que este “não teve coragem de aparecer durante o pleito eleitoral e também os seus
correligionários”.361
Cerca de um mês após as eleições presidenciais de 1955, Hostílio Dias, da tribuna do
Legislativo Municipal, homenageou o General Henrique Teixeira Lott pelo movimento que visou
desarticular a ameaça de um golpe de Estado no Brasil, que geraria empecilho para a posse do
Presidente da República eleito, Juscelino Kubitschek.362 Além dessa iniciativa, a FPD apresentou

355
No dia 3 de setembro de 1955, durante a capanha eleitoral para a Presidência da República, Juscelino Kubitschek
realizou um comício na Praça Graciliano de Freitas em Alagoinhas. Neste comícxio discursaram os integrantes da FPD
João Nou, Hostílio Dias e José de Araujo Batista. Ver: APJR. O Nordeste, 12.09.1955, p.1 e 5.
356
J. Godinho Carneiro, na coluna que assinava no jornal O Nordeste, também destacou os desdobramentos da eleição
presidencial de 1955 em Alagoinhas, descrevendo o seguinte panorama: “Nesta pacífica Alagoinhas, onde a vitória dos
candidatos eleitos foi espetacular, vamos recapitular o acontecido, vez que este comentário escrito será documento
amanhã. Começando por lembrar que a justiça eleitoral não está equipada para bem desempenhar a sua finalidade,
devemos dizer que o pleito foi tranquilo entre nós e a vitória ampla dos srs. Juscelino Kubitschek e João Goulart neste
município, deve-se principalmente a Frente Popular Democrática (destacando-se os vereadores João Nou, Hildebrando
Dias, Hostílio Dias, José de Araujo Batista e Romualdo Pessoa Campos), elementos do Partido Republicano, do PSD e
getulistas (não dizemos do PTB, porque este partido não tomou posição de vanguarda entre nós), além do Vereador
Armando Leal que rompendo com a União Democrática Nacional, foi o responsável pela vitória dos candidatos
populares no distrito de Boa União. Ai está como e porque venceu a chapa J. J. neste município. Aos senhores
Altamirano Campos, Milton França e Eurico Costa, deve o Sr. Ademar de Barros a sua votação aqui. Dr. Jairo Maia e
Luiz Rabelo foram os responsáveis pela votação do General Juarez, enquanto aos srs. Joaquim Batista Filho. Dr. João
Muniz e os esforçados religiosos capuchinhos, deve o Sr. Plínio Salgado os votos conquistado em Alagoinhas. Ver: O
Nordeste, 19.10.1955, p.3.
357
APJR. O Nordeste, 19.10.1955, p.2.
358
Idem.
359
ACMA. Ata de 14.10.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
360
Idem.
361
Idem.
362
ACMA. Ata de 11.11.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

86
moções que possuíam teor semelhante destinando-as para Nereu Ramos, Presidente da República
em exercício, e ao Exército Brasileiro.363 Posteriormente, a FPD apresentou uma moção
contestando a tentativa de retorno de Café Fiho à Presidência da República, o qual por motivos de
saúde havia se afastado, julgando que tal retorno significava uma medida que buscava interromper o
processo democrático no Brasil e a posse de Juscelino Kubitschek. Na oportunidade Hostílio Dias
dirigiu críticas a Café Filho, assim como ao Prefeito de Alagoinhas, Antonio Martins de Carvalho
Júnior (UDN), acusando-os de golpistas.364

Tabela 8
Resultado da eleição presidencial de 1955 em Alagoinhas
Juscelino Juarez Ademar Plinio João Milton Danton
Kubitschek Távora de Salgado Goulart Campos Coelho
Barros
Sede 1.920 753 890 491 2.515 1.054 285
Boa União 224 70 36 46 235 111 53
Aramari 243 43 19 18 264 41 14
Riacho da Guia 201 65 48 19 221 79 16
Sauípe 16 24 1 0 3 26 0
Araçás 57 37 8 41 97 29 8
Total de Votos 2.661 992 1.002 615 3.335 1.340 376
Fonte: O Nordeste, 19.10.1955, p.1.

Mas retomemos a discussão sobre a prática da FPD, enquanto mediadora entre demandas de
trabalhadores e o Estado. Segundo Hildebrando Dias, esta Frente possuía como método de atuação
“conversar com o povo, sondando-lhe as suas necessidades e opiniões”.365 Hildebrando Dias fez
essa referência quando narrou sobre a visita que fez ao bairro de Alagoinhas Velha, comentando
sobre o estado de abandono em que se encontravam algumas ruas e da necessidade deste bairro

363
ACMA. Ata de 14.11.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
364
ACMA. Ata de 25.11.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas. Em 1955, repercutia ainda no
ambiente político do país o suicídio de Getúlio Vargas ocorrido em 24 de agosto de 1954. A vitória na eleição
presidencial da chapa PSD-PTB promoveu o desenvolvimento de uma conspiração entre setores civis e militares –,
principalmente, no interior da UDN, da Marinha e da Aeronáutica -, que previa a ruptura do regime constitucional em
busca de impedir a posse de Juscelino Kubitschek e João Goulart, vistos como representantes do getulismo, para a
presidência e vice-presidência da República. Esta conspiração foi sustada, em novembro de 1955, através de um “golpe
preventivo” liderado pelo General do Exército Henrique Teixeira Lott, que afastou o Presidente da República interino,
Carlos Luz, que como Presidente da Câmara dos Deputados substituía ao Vice-Presidente da República, Café Filho,
licenciado do cargo, em função de estar com a saúde debilitada. Carlos Luz possuía aproximação com os setores
golpistas que pretendiam interromper a ordem legal e, por consequência, a posse de Juscelino Kubitschek. Assim,
diante da vacância da Presidência da República, em uma saída negociada, se elegeu, em sessão extraordinária da
Câmara dos Deputados, o Vice-presidente do Senado, Nereu Ramos, para o cargo de chefe do Executivo federal,
mantendo-se, desse modo, a legalidade. Ver: FERREIRA, Jorge. Crises da República: 1954,1955 e 1961, op. cit., p.315-
326.
365
ACMA. Ata de 24.10.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

87
receber a extensão do serviço de fornecimento de energia elétrica, além da construção de um
cemitério.366 Em seguida Hildebrando Dias concluiu, tecendo críticas à administração do Prefeito
Antonio Martins de Carvalho Júnior (UDN), argumentando que tinha ouvido de diversos moradores
de Alagoinhas Velha “que ali assoalham malevolamente [os governistas] como que para justificar o
descaso da administração, que nada fazem porque a Frente Popular Democrática nega créditos”.367
José de Araujo Batista afirmou que em Aramari, o próprio Prefeito tinha falado algo semelhante.368
Na verdade, esta ocasião expõe, mais uma vez, que as práticas da FPD eram permeadas pelo
tensionamento que se desenvolvia na sua relação com o bloco udenista local.369
Em agosto de 1955, a FPD realizou um comício na Rua 2 de Julho. Esta oportunidade, além
de indicar a aproximação da citada Frente com este ponto da cidade, que era considerado um reduto
ferroviário, demonstrou mais uma vez o tensionamento que havia no seu relacionamento junto à
UDN, conforme foi noticiado pelo jornal O Nordeste:

Esta Frente Popular Democrática está com tudo. Realizou um comício no último domingo,
no bairro 2 de Julho, e botou as cartas na mesa. Foi uma autêntica prestação de contas e o
resultado é que o povo ficou sabendo dos abusos do Prefeito e das farsas que a UDN
municipal vem propagando ao povo também com raspagem de cabeças e apropriação
indébitas de terrenos dos tabuleiros. Hostílio [Dias] foi demoradamente aplaudido pelo
povo, principalmente ferroviários.370

A motivação da realização do referido comício, pela FPD no bairro 2 de Julho, pode ter se
dado em função de neste bairro estar concentrada uma parcela significativa da sua base eleitoral, no
caso os ferroviários, assim como, da campanha em prol da candidatura que esta Frente apoiava na
eleição presidencial que se avizinhava.371 Como foi visto, Hildebrando Dias atribuiu aos
ferroviários ao lado dos operários em curtumes a expressiva votação de Juscelino Kubitschek e João
Goulart em Alagoinhas – em Alagoinhas, inclusive, João Goulart recebeu mais votos do que
Juscelino Kubitschek (ver tabela 8). Com relação às referências feitas no referido comício sobre as

366
Idem.
367
Idem.
368
Idem.
369
Dias depois, foi recebido pela FPD e apresentado no Legislativo Municipal um abaixo-assinado, subscrito por 203
moradores de Alagoinhas Velha que além das demandas indicadas anteriormente para este bairro pelo Vereador
Hildebrando Dias, como o fornecimento de energia elétrica e a construção de um cemitério, reivindicavam também a
construção de um chafariz para o abastecimento de água potável e a construção de banheiros. Ver: ACMA. Ata de
02.12.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
370
APJR. O Nordeste, 15.08.1955, p.6.
371
Esta inferência se apóia no fato de que os integrantes da FPD Hostílio Dias, Amando Camões e José de Araújo
Batista eram ferroviários e João Ramos um morador do bairro 2 de Julho. Além disso, conforme foi discutido no
segundo capítulo, o Vereador Hildebrando Dias, durante o seu primeiro mandato apresentou uma série de proposições
direcionadas ao atendimento de demandas do bairro 2 de Julho e da Rua Castro Alves.

88
“farsas da UDN municipal”, à “raspagem das cabeças”, a “apropriação indébita de terrenos dos
tabuleiros” e mesmo aos aplausos recebidos por Hostílio Dias, cabe situar melhor estas questões,
pois elas remetem a outro exemplo em que estratos sociais subalternos acionaram a FPD para
realizar uma interlocução em seu favor junto ao Estado. Em tal exemplo, mais uma vez permeou o
tensionamento entre esta Frente e o núcleo udenista local.
Desse modo, no mesmo mês de agosto de 1955, João Nou apresentou a seguinte denúncia na
coluna Aguilhoadas que publicava no jornal O Nordeste:

Dois pretensos latifundiários, usando chapa branca do Serviço Nacional de Malária,


assaltaram dois camponeses em seu labor diário no distrito de Boa União e após
seviciarem-nos, rasparam-lhes a cabeça. Tomando conhecimento do fato, o bravo e
destemido líder ferroviário e Vereador deste município, Sr. Hostílio Dias, levou-os às
autoridades e a praça pública onde, em ato público, denunciou os espancadores ao povo.
Não parou ai, porém, o bravo líder popular. A sua luta prossegue e já agora com pleno
apoio de nós da Frente Popular Democrática e do povo esclarecido de Alagoinhas
denunciamos a barbárie às autoridades. A imprensa da capital não disse nada porque um
dos seviciadores é irmão de festejado homem de jornal, que além de jornalista brilhante e
não menos combativo deputado que muitas acicatadas têm dado no Governo. 372 (grifos
meus)

A partir desse comentário feito por João Nou é possível compreender as razões das
referências que foram feitas no comício da FPD no bairro 2 de Julho, sobre as cabeças raspadas, a
apropriação indébita de terrenos e os aplauso que foram dados ao Vereador Hostílio Dias. Tais
referências estavam relacionadas ao episódio ocorrido no distrito de Boa União, em que dois
camponeses sob tortura tiveram suas cabeças raspadas. Diante disso, Hostílio Dias e em seguida os
demais membros da FPD buscaram apresentar denúncia às autoridades e tornar pública a questão.
Inclusive, os carvoeiros, como também eram chamados os camponeses de Boa União que foram
torturados, se fizeram presentes na sessão do Legislativo Municipal do dia 22 de julho de 1955,
segundo João Nou, “a procura de um criminoso”, mas o Presidente da Câmara de Vereadores de
Alagoinhas, Eurico Costa (UDN), solicitou que estes se retirassem do recinto.373 O Vereador
udenista Horácio Dantas contestou a alegação de João Nou afirmando que “os carvoeiros, quando
em julho estiveram nessa casa, vieram sujos e rasgados, ao ponto de não ser possível permitir a

372
APJR. O Nordeste, 18.08.1955, p.2. Quanto ao Deputado e jornalista mencionado por João Nou, trata-se de Joaquim
Alves da Cruz Rios Deputado Estadual que exerceu o mandato pelo PDC na legislatura de 1955-1959 e que atuou como
repórter e redator do jornal soteropolitano A Tarde. Joaquim Alves da Cruz Rios era irmão de José da Cruz Rios, chefe
do Serviço Nacional de Malária em Alagoinhas e que, como será visto, teve o seu nome arrolado como um dos
responsáveis pelas torturas aplicadas em alguns camponeses do distrito alagoinhense de Boa União. Sobre a biografia
de Joaquim Alves da Cruz Rios, ver o site: http://www.al.ba.gov.br/v2/biografia.cfm?varCodigo=422 (site consultado
em 10 de dezembro de 2010).

373
ACMA. Ata de 18.11.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

89
continuação dos mesmos ali”.374 Na verdade, além de indicar uma visão elitista sobre uma
instituição política em um regime, dito, democrático, a fala de Horácio Dantas remete à dimensão
política que o caso ocorrido em Boa União passou a assumir, permitindo aflorar o embate entre os
integrantes da FPD e os udenistas. Diante disso, cabe retomar a denúncia de João Nou, publicada no
jornal O Nordeste, onde foi tratado sobre alguns desdobramentos acerca do inquérito instaurado
sobre o caso em que os “carvoeiros” de Boa União chegaram a ser torturados. Escreveu João Nou:

Todos esperavam que o Governo mandasse apurar o caso com imparcialidade. Mas o
Governo através da sua Secretaria de Segurança Pública, não está interessado senão em
prestar serviços ao deputado-jornalista. O professor Lafayete [Coutinho] deseja ser
sucessor do senhor Antonio Balbino e é bom não fazer rios de inimigos, mas sim muitos
amigos que lhe ajudem a conduzir sua cruz, até o Aclamação. (grifos meus)

Nota-se a denúncia de João Nou sobre a concessão do então Secretário de Segurança


Pública, Lafayete Coutinho, aos interesses do “deputado-jornalista”, em insinuação ao Deputado
Estadual pelo PDC e jornalista do jornal A Tarde Cruz Rios, de quem, segundo João Nou, o referido
Secretário, esperava o apoio para a sucessão ao governo estadual. João Nou prosseguiu ainda
descrevendo do seguinte modo sobre a interferência política que vinha sofrendo o inquérito
instaurado para investigar o caso em questão:

Por isto aqui nos apareceu um delegado especial. E sabem o que o delegado especial está
cuidando de apurar? Não é quem raspou as cabeças dos carvoeiros, mas sim, se os
vereadores Hostílio Dias e Hildebrando Dias estão conspirando para derrubar o regime do
qual ele, o delegado, é supremo guarda. Estamos acostumados a essas farsas e nos
recusamos a participar delas. Com a nossa assistência o nosso amigo Dr. Heleno Araujo
não se redimirá do pecado de haver dissolvido um comício do Sr. Antonio Balbino no
Largo do Tanque, em Salvador. Acostumado às farsas do tempo de Oliveira Brito, não nos
deixaremos envolver pelas do nosso amigo professor Lafayete Coutinho, que, bom
urologista que é escolheu a dedo o delegado especial para mandar a Alagoinhas, onde
udenistas espertos precisam ser chamado ao redil. Não nos iludimos com o resultado do
inquérito e este não nos surpreenderá se demonstrar que eu e o Vereador Hostílio Dias que
raspamos as cabeças dos carvoeiros.375

Assim, João Nou denunciava, também, sobre as pretensões do Delegado Especial indicado
para comandar o mencionado inquérito, em deslocar o foco da investigação para deixar impune os
responsáveis. Aliás, um destes seria José da Cruz Rios, chefe do Serviço Nacional de Malária em
Alagoinhas e irmão do Deputado Estadual Cruz Rios (PDC), razão que motivara a alegada
interferência desse deputado junto ao Secretário de Segurança Pública do estado, Lafayete

374
Idem.
375
APJR. O Nordeste, 18.08.1955, p.2.

90
Coutinho.376 Mas se foram “dois pretensos latifundários” que torturaram os carvoeiros de Boa
União, e José Cruz Rios seria um deles, quem seria o segundo?
Em dezembro de 1955, a FPD apresentou uma moção acusando Lafayete Coutinho, ainda
investido do cargo de Secretário de Segurança Pública da Bahia, de apoiar um golpe de Estado cujo
objetivo seria impedir a posse de Juscelino Kubitschek. O Vereador pela UDN Milton Leite
contestou tal moção. Diante disso, Hildebrando Dias se dirigiu à Milton Leite declarando que este:

deveria ser grato ao senhor Lafayete Coutinho, por muitas razões, no entanto, ele orador e
os oradores da Frente Popular Democrática, pensavam ao contrário, quanto ao senhor
Lafayete Coutinho, pois mandou para aqui o Sr. Dr. Heleno Araujo, que chegou a dizer que
Alagoinhas era uma cidade vermelha e apontar ele Vereador e os vereadores da Frente
Popular Democrática, seus companheiros, como adeptos do comunismo; que ele orador
conversara com o Dr. Heleno Araujo e na ocasião que ele dissera o que acima se referira,
perguntara se na polícia também tinha prontuário de Ademar de Barros e Getúlio Vargas.377

Trazendo à tona o inquérito sobre as agressões sofridas por alguns camponeses em Boa
União, Hildebrando Dias insinuou que o udenista Milton Leite deveria ser grato ao Secretário de
Segurança Pública da Bahia e também udenista Lafayete Coutinho pela indicação do Delegado
Heleno Araújo para comandar o referido inquérito. Pois, Segundo Hildebrando Dias, este Delegado
buscou apontar os vereadores da FPD como comunistas, ao invés de identificar os responsáveis pela
tortura dos carvoeiros de Boa União. Então, seria Milton Leite um destes responsáveis?
Em edição do jornal O Nordeste, publicada no final de julho de 1955, Milton Leite ao lado de
José da Cruz Rios eram apontados como os autores da tortura aos carvoeiros de Boa União.378 Em
tom de ironia, este periódico na mesma edição, reforçou essa informação:

É positivamente muito bárbara esta barbearia recém-inaugurada pelo Vereador [Milton]


Leite e o Sr. [José da Cruz] Rios...É ambulante e auto-transportável, pois segundo consta,
foi instalada em uma caminhonete chapa branca. Cabelo: raspado. Barba e bigode: nunca
com navalha, sempre com alicate.379

376
ACMA. Ata de 14.11.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
377
ACMA. Ata de 02.12.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas. Sobre a passagem por Alagoinhas do
Delegado Especial, Heleno Araujo, indicado para comandar tal inquérito, o jornal O Nordeste expôs que “Esteve entre
nós o Dr. Heleno Araujo enviado pela Secretaria de Segurança para apurar o já famoso caso das cabeças raspadas. Mas
acontece que o funcionário da polícia aqui chegando, derivou para o comunismo. Que maravilha foi o Dr. Heleno.
Enfim, proporcionou momentos de hilaridade, comicidade e fina infantilidade. Volte dr. Heleno!”. APJR. O Nordeste,
15.08.1955, p.6.
378
APJR. O Nordeste, 29.07.1955, p.5.
379
APJR. O Nordeste, 29.07.1955, p.6.

91
Não foi possível verificar como se deu o desfecho do inquérito dos camponeses torturados de
Boa União, mas ao que parece não foram apontados responsáveis.380 Quanto ao tensionamento
político entre a FPD e os udenistas, apesar de momentos passageiros de calmaria, ele só evoluiu.381
Sobre o avanço desse tensionamento será retomado mais adiante, por enquanto cabe tratar de um
aspecto, que praticamente foi exclusivo aos representantes da FPD entre os anos de 1955 e 1956,
isto é mediação de questões de interesse dos trabalhadores junto ao poder público.
No início da legislatura 1955-1958 discutia-se a necessidade de se conceder um abono de
emergência aos servidores municipais, indicando que esses trabalhadores continuavam enfrentando
as mesmas dificuldades de outros tempos. Segundo Romualdo Campos, por não ter acesso a algum
instituto previdenciário, faltava-lhes “assistência quando a fatalidade os atingia”.382 Ao fazer essa
afirmação Romualdo Campos citou o exemplo de um antigo funcionário público municipal que
tinha se lesionado e, por isso, se encontrava afastado do trabalho, mas como não possuía nenhum
amparo previdenciário estava sem receber remuneração. Havia também a situação dos trabalhadores
diaristas que recebiam diárias entre 12 e 18 cruzeiros, enquanto o valor para que fosse equiparado
ao salário mínimo seria de 45 cruzeiros diários, o que demonstrava uma transgressão a legislação
trabalhista.383 A respeito dos servidores municipais, a FPD atuou como uma espécie de
representação sindical da categoria, apresentando reivindicações junto ao Governo Municipal, ou
mesmo apresentando proposições que iam de encontro aos interesses desses trabalhadores.384
Os operários em curtumes foram outra categoria em que o Legislativo Municipal foi utilizado
como uma via em busca de que fossem atenuadas algumas das dificuldades enfrentadas. Esse
recurso foi acionado, principalmente por intermédio de Romualdo Campos, Vereador e presidente
do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Curtimento de Couros e Peles de Alagoinhas.
Basicamente, foram duas as questões que afligiam os curtumeiros para as quais foram dedicadas
esforços a fim de serem contornadas. A primeira era a já conhecida incidência de tuberculose no

380
Ao longo da pesquisa este inquérito não foi localizado impedindo o exame de maiores informações sobre o caso em
questão.
381
Sobre os momentos passageiros de calmaria entre oposição e situação, em Alagoinhas, cabe mencionar a fala em
novembro de 1955, de Eurico Costa (UDN), presidente da Câmara de Vereadores de Alagoinhas, o qual dizia que
“regozijava-se pelo ambiente de harmonia reinante na Câmara”, enquanto João Nou, integrante da Frente Popular
Democrática, comentava que “a atitude do Sr. Presidente vem modificando de tal maneira que tudo indica que teremos
um período de cordialidade”. Ver: ACMA. Ata de 29.11.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
382
ACMA. Ata de 25.04.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
383
ACMA. Requerimento apresentado coletivamente por Romualdo Campos, Hildebrando Dias e Hostílio Dias em
18.11.1955. Livro de Requerimentos (1955).
384
Ver Requerimento apresentado coletivamente por Hildebrando Dias, João Ramos, Romualdo Campos e João Nou
em 06.05.1955; Requerimento apresentado coletivamente por Hildebrando Dais, José de Araujo Batista, Romualdo
Campos, João Ramos e José Lucio dos Santos Silva em 04.11.1955; Requerimento apresentado coletivamente por
Romualdo Campos, Hildebrando Dias e Hostílio Dias em 18.11.1955. Livro de Requerimentos (1955).

92
seio desses trabalhadores e a segunda, as dificuldades que vários curtumeiros passaram a enfrentar,
em função das demissões que derivaram do fechamento dos dois maiores curtumes da cidade.
Desse modo, em 1955, foi requisitada ao Ministério da Saúde uma remessa de medicamentos
a ser destinada ao Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Couros e Peles de Alagoinhas para
que fossem distribuídos aos seus associados.385 Romualdo Campos fez referência a algo semelhante
que tinha sido feito na legislatura anterior “pedindo por intermédio da Mesa da Câmara, ao Sr.
Ministro da Saúde, remédios para tuberculose, seu pedido fora atendido e desse modo atendido
também fora diversas pessoas necessitadas”.386 Romualdo Campos também afirmava que a má
alimentação e a insalubridade nos locais de trabalho eram os principais fatores para a incidência de
tuberculose entre os curtumeiros.387
Mas, para uma parcela dos trabalhadores em curtumes de Alagoinhas, um elemento veio a
agravar ainda mais os problemas que já eram enfrentados. Trata-se do fechamento dos dois maiores
curtumes da cidade: o Curtume São Paulo e o Curtume Santa Cruz. Por essa razão, no início de
novembro de 1955, Romualdo Campos, na tribuna da Câmara de Vereadores de Alagoinhas,
demonstrou a sua preocupação em haver “qualquer excesso de ânimos” entre os operários dos
referidos curtumes que estavam sem receber salários.388 Dias depois, quando fazia quatro semanas
sem que tivesse ocorrido o referido pagamento salarial, um número significativo de trabalhadores
do Curtume São Paulo e do Curtume Santa Cruz se fizeram presentes na sessão do Legislativo
Municipal. Romualdo Campos então se pronunciou, informando que os operários ali presentes:

vieram interceder os seus ofícios no sentido de ser resolvida a situação e que ele na
qualidade de Presidente do Sindicato, vinha pedir o apoio da Câmara, para a Indicação
nº18, pela qual solicitava ao Governador do estado, envidar meios de socorrer as empresas
Curtume São Paulo e Santa Cruz.389

Nesse mesmo dia João Nou apresentou um requerimento sugerindo a formação de uma
comissão composta por vereadores das diferentes bancadas a fim de analisar junto com o Executivo
Municipal uma forma de auxiliar aos operários dos curtumes mencionados.390 Essa solução
temporária foi alcançada o que rendeu de Romualdo Campos a seguinte constatação sobre a difícil
situação enfrentada por “seus companheiros de curtumes”:

385
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador Romualdo Campos em 13.05.1955. Livro de Requerimentos
(1955).
386
ACMA. Ata de 16.05.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
387
Idem.
388
ACMA. Ata de 04.11.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
389
ACMA. Ata de 18.11.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
390
ACMA. Requerimento apresentado pelo Vereador João Nou em 18.11.1955. Livro de Requerimentos (1955).

93
Nunca Alagoinhas chegou ao ponto da Câmara e a Prefeitura dar auxílio para socorrer a tão
grande número de operários que se acham em dificuldades; que muitos operários, alguns
deles com dez ou onze filhos, estão passando grande necessidade ao ponto de na iminência
de pedir pra não morrer de fome; que no principio do mês dirigira-se com grande número
de operários ao deputado Josafá Azevedo [UDN] e este auxiliara a todos com uma pequena
quantia.391

De acordo com o testemunho de Romualdo Campos, era aflitiva a situação vivida pelos
curtumeiros demitidos, sendo que naquele momento estavam contando apenas com auxílios
fornecidos pela Câmara de Vereadores, Prefeitura Municipal e “uma pequena quantia” ofertada pelo
udenista Josaphat Azevedo, sobre o qual caia a alegação de ter tentado se aproximar dos operários
em curtumes com pretensões eleitoreiras, inclusive postulando a direção do sindicato dessa
categoria.392
Esse estado dos curtumeiros demitidos perdurou por todo o restante da legislatura de 1955-
1958 sem que fosse apresentada uma solução efetiva, apesar de uma série de iniciativas mediada
pelo Vereador e presidente do sindicato da categoria, Romualdo Campos, a partir do Legislativo
Municipal. Desse modo, em junho de 1957 o referido Vereador trouxe o testemunho de que:

a situação dos colaboradores dos dois maiores curtumes da cidade [que foram fechados em
outubro de 1955] é uma situação dolorosa que não pode ser explicada com a realidade; que
ele orador, [Romualdo Campos] na qualidade de presidente de um órgão de classe, tem
lançado mão de todos os recursos possíveis, levando a sua reclamação aos snrs. Presidente
da República, Vice-Presidente da República, Ministro do Trabalho e Delegados e outras
autoridades, inclusive do nosso estado, e tudo tem sido debalde, com a demonstração tácita
de falta de interesse para a solução de tão grave e palpitante assunto.393

391
ACMA. Ata de 05.12.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
392
APJR. O Nordeste, 23.07.1955, p.3. Em agosto de 1955 seriam realizadas as eleições do Sindicato dos Trabalhadores
na Indústria de Curtimentos de Couros e Peles de Alagoinhas. Comentava-se que o udenista Josaphat Azevedo pleiteava
a direção desse sindicato que tinha como presidente Romualdo Campos que naquele momento buscava a reeleição. A
chapa liderada por Romualdo Campos sagrou-se vencedora nessa eleição sindical e o jornal O Nordeste noticiou esse
resultado através de uma matéria que fazia alusão à cobiça sobre os votos do eleitorado curtumeiro. Esta matéria trazia
o título “Boa resposta dos operários – Sindicato não é pasto para barganhas políticas, o deputado errou o endereço.”
Ver: APJR. O Nordeste, 12.09.1955, p.2.
393
ACMA. Ata de 07.06.1957 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas. Em 1956 se expediu telegrama para
o Presidente da República, Vice-Presidente da República e Ministro do Trabalho comunicando-os sobre a precária
condição de cerca de 200 operários dos curtumes São Paulo e Santa Cruz. E em 1957 foi requerido que se oficiasse às
mesmas autoridades, dessa vez solicitando “providências imediatas em favor das duas maiores empresas desta cidade
que são o Curtume São Paulo e o Curtume Santa Cruz”. Nesse mesmo ano, também, se recorreu ao Serviço de
Alimentação e Previdência Social (SAPS), para que fossem fornecidos gêneros alimentícios aos curtumeiros
desempregados dos curtumes São Paulo e Santa Cruz, para que os mesmos quitassem quando fosse resolvido o
imbróglio junto aos empregadores. A resposta foi negativa a essa solicitação. Ver respectivamente os requerimentos
apresentados pelo Vereador Romualdo Campos em 03.02.1956, 26.04.1957 e 16.07.1957. ACMA. Livro de
Requerimentos (1956) e Livro de Requerimentos (1957).

94
A reivindicação dos trabalhadores desempregados para que fossem pagos os seus salários foi
encaminhada ao Judiciário.394 Porém o desfecho desse processo não foi publicado nos jornais ou
atas do Legislativo Municipal de Alagoinhas.
Quanto aos ferroviários, além de José de Araujo Batista que por algumas vezes assumiu a
vaga de Vereador como suplente pelo PSD, existia na legislatura de 1955-1958 três vereadores
pertencentes a essa categoria profissional: Eurico Costa, Hostílio Dias e Amando Camões Filho. O
primeiro pertencia ao bloco governista, enquanto os dois últimos integravam a bancada da FPD.
Com isso, uma série de demandas dos ferroviários foi apresentada por intermédio dos referidos
vereadores, se destacando as que estavam relacionadas à infra-estrutura urbana de locais onde esses
trabalhadores preponderavam como habitantes. Neste quesito, também cabe destacar a atuação do
Vereador João Ramos.395 É importante ressaltar que quando estas proposições partiam de
integrantes da FPD e eram dirigidas ao Executivo Municipal, traziam consigo um conteúdo
reivindicatório que se desdobravam em críticas a gestão do Prefeito udenista Antonio Martins de
Carvalho Júnior. Este era um dos componentes que contribuíam para o embate entre a mencionada
Frente, o Governo Municipal e a sua representação no Poder Legislativo. Intrínseco a este embate
estava a disputa por um espaço de poder na esfera municipal. É o que fica compreensível na
afirmação de João Nou, em 1955, através da sua coluna Aguilhoadas, publicada no jornal O
Nordeste. Dizia João Nou a respeito da FPD:

A nossa vigilância será posta a serviço do povo, do município e da Constituição. No


próximo pleito que se avizinha, desejamos mostrar unidos do que somos capazes e o que
seremos em 1958. Ninguém: não há suborno que quebra a fibra dos homens de
bem.396(grifos meus)

João Nou fez esta afirmação no momento em que apresentava uma espécie de prestação de
contas, externando sobre três questões: a regularização do abastecimento de farinha de trigo para as
padarias, que a partir de uma intervenção da FPD foi sanada a escassez do pão na cidade;397 a
mobilização do ferroviário e Vereador Hostílio Dias junto ao diretor da VFFLB para que as

394
ACMA. Ata de 07.06.1957 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
395
Ver Livros de Requerimentos da Câmara de Vereadores de Alagoinhas referente aos anos de 1955, 1956, 1957 e
1958.
396
APJR. O Nordeste, 11.07.1955, p.2.
397
É informado que “Alagoinhas quase ficou sem pão e os panificadores sujeitos a exploração de certo comerciante que
estava vendendo um saco de farinha de trigo por 700 cruzeiros”. Nessa oportunidade foi feita a referência acerca da
inoperância do Prefeito para regularizar o abastecimento de farinha de trigo na cidade, questão que foi contornada,
somente após a intervenção da Frente Popular Democrática, passando o saco de farinha a custar o valor de 301
cruzeiros. Ver: O Nordeste, 11.07.1955, p.2 e p.6.

95
Oficinas São Francisco paralisassem suas atividades no feriado do dia 2 de julho;398 e sobre o
anúncio de emendas para o Orçamento federal de 1956, apresentadas pelo Deputado Federal
Manoel Novais (PR), somando um montante de catorze milhões de cruzeiros que seriam destinados
à Alagoinhas. Segundo João Nou, tais emendas correspondiam às sugestões encaminhadas para
Manoel Novais, seu amigo de outrora desde as fileiras da UDN, após ouvir proposições de seus
companheiros da FPD. As emendas contemplavam um conjunto de 12 reivindicações que seriam:

1- criação de um posto agro-pecuário, com uma escola para tratoristas; 2- subvenção para o
Colégio S. S. Sacramento para o auxílio à construção do edifício do ginásio; 3- subvenção
para o orfanato São Francisco; 4- subvenção à Liga Desportiva de Alagoinhas, para a
conclusão do estádio; 5- verba para o serviço de água e esgoto; 6- verba para a rodovia
Feira-Irará-Alagoinhas; 7-subvenção ao Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de
Couros e Peles; 8- subvenção a Sociedade Lauro de Freitas 9-subvenção a Filarmônica
Recreio Operário de Aramari; 10- Verba para a construção de uma muralha de
sustentação e balaustrada nas ruas 2 de julho em Alagoinhas e Castro Alves em Aramari
11- verba para a construção do Hospital Ferroviário, em Alagoinhas; 12- verba para a
construção de refeitórios em São Francisco e em Aramari. 399(grifos meus)

Em parte dessas reivindicações fica exposto o direcionamento de verbas para o atendimento


de interesses ligados aos trabalhadores, especialmente curtumeiros e ferroviários, prevendo
concessão de subvenções que promovessem melhorias nos locais de trabalho, lazer, infra-estrutura
urbana e assistência médica.400
Após expor essas informações, João Nou também declarou o seguinte sobre a FPD:
“Transformaremos esta frente parlamentar consciente e honesta, em frente política que há de
decidir, ponderavelmente os destinos políticos de Alagoinhas”.401 O que fica compreendido é que
estava no horizonte deste bloco político, nas eleições municipais que ocorreriam no ano de 1958,
ampliar a sua ocupação em postos de tomadas de decisões. Um passo importante para esses

398
APJR. O Nordeste, 11.07.1955, p.2.
399
Idem.
400
Idem. Em 1949, João Nou, através da sua coluna Panorama Condensado, expôs o seu testemunho sobre a ausência
de um refeitório para os ferroviários de Alagoinhas. João Nou nessa época pertencia a UDN e no ano seguinte disputou
a eleição como candidato a Deputado Estadual por este partido. Disse João Nou: “Chegando em um trem ao meio dia na
Estação São Francisco, vi um quadro que impressiona. Sobre rumas de lenha, sobre vagões, nas calçadas, sob árvores,
os operários das oficinas, aqueles mesmos que fabricam as nossas locomotivas e os vagões que servem para cartaz em
visita presidencial, faziam as suas refeições. Marmiteiros mesmo. Depois do almoço na lata, certamente a água quente
da torneira. A poeira nos dias de sol invadindo a bóia. Nos dias de chuva a lama tirando o apetite. A Leste tão rica em
estações bonitas, tão ciosa dos seus carros de luxo, principalmente os de inspeção, ainda não quis construir um
restaurante para os seus operários de São Francisco e em Aramari. E isto lhe custaria muito pouco. No próximo ano vai
haver eleições e então os operários de São Francisco e Aramari, que quase todos são eleitores, deverão lembrar quando
lhes pedirem o voto que elege que ele precisam de um restaurante e mais alguma coisa”. Ver: O Nordeste, 24.12.1949,
p.3. Em fevereiro de 1952, João Nou exercendo, como suplente pela UDN, o mandato de Deputado Estadual,
apresentou uma indicação que solicitava a construção de um refeitório para os ferroviários nas Oficinas de Aramari e
São Francisco. Ver esta indicação publicada na edição do Jornal O Nordeste de 11.06.1954, p.5.
401
APJR. O Nordeste, 11.07.1955, p.2.

96
propósitos da FPD seria ocupar a Mesa diretora do Legislativo Municipal. Este passo foi dado e
promoveu o acirramento do seu embate com o bloco governista. Desse embate resultou a
fragilização da FPD com os desdobramentos que passaram a ocorrer, suscitando o afastamento do
Legislativo Municipal dos três integrantes mais atuantes desta bancada, João Nou, Hostílio Dias e
Hildebrando Dias.
Em 07 de Abril de 1956 ocorreu a reabertura dos trabalhos do Legislativo Municipal de
Alagoinhas para o segundo ano da legislatura 1955-1958. Como de praxe proceder-se-ia à eleição
para a composição da sua Mesa diretora, porém Eurico Costa (UDN), ainda investido das funções
de presidente da Câmara de Vereadores de Alagoinhas, terminou protelando a realização de tal
eleição ao anunciar a presença no recinto do Juiz da Comarca de Alagoinhas, do Prefeito Municipal
de Alagoinhas e do presidente do Rotary Clube, convidando-os para tomarem assento em local
reservado. João Nou contestou a atitude do presidente da Câmara, Eurico Costa, alegando que
deveria ser realizada primeiramente a eleição dos novos membros da Mesa diretora para o período
legislativo de 1956. Em seguida caberia à Mesa eleita “instalar o referido período e fazer aquele tão
honroso convite as ditas autoridades”.402 Eurico Costa respondeu dizendo que sendo omisso o
regimento mantinha a sua decisão “e novamente convidava as citadas autoridades”. 403 Diante desta
resposta de Eurico Costa, João Nou sugeriu que a decisão sobre a realização ou não da eleição da
Mesa fosse submetida ao plenário, porém mais uma vez Eurico Costa rejeitou a sua proposição.
João Nou respondeu que a aquela atitude lhe forçava ao lado dos seus companheiros de bancada a
retirarem-se do recinto da sessão. Aliás, o que de fato se procedeu, tendo o Vereador Armando Leal,
dissidente da UDN, acompanhado aos demais vereadores da FPD, João Nou, Hostílio Dias,
Hildebrando Dias, João Ramos, Romualdo Campos e Amando Camões Filho.404
Cabe ressaltar que Armando Leal, em 1955, segundo J. Godinho, colunista do jornal O
Nordeste, desviou-se da sua orientação partidária e na eleição presidencial deste ano apoiou as
candidatura de Juscelino Kubitschek (PSD) e João Goulart (PTB).405 Em 1956 o próprio Armando
Leal confirmou este seu posicionamento no momento em que manifestou publicamente que deixaria
a UDN.406
A sessão ia se tornando tumultuada, pois governistas e oposição não chegavam a um
consenso. Nesse momento, em que os seis vereadores da FPD e o udenista Armando Leal tinham

402
ACMA. Ata de 07.04.1956 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
403
Idem.
404
Idem.
405
APJR. O Nordeste, 19.10.1955, p.5.
406
APJR. O Nordeste, 18.03.1956, p.1-5.

97
abandonado o plenário, o presidente da Câmara, Eurico Costa, decidiu suspender as atividades por
estarem presentes apenas cinco vereadores, número insuficiente para tocar os trabalhos.407
Momentos depois retornaram ao recinto das sessões os sete vereadores mencionados.408 Segundo o
jornal O Nordeste tal retorno foi motivado pela tentativa de conciliação realizada pelo Juiz da
Comarca de Alagoinhas, presente naquela oportunidade, que se comprometeu em convencer o
presidente da Câmara, Eurico Costa, a submeter ao plenário a proposição de João Nou inicialmente
refutada.409 Então, foi reaberta a sessão e a Mesa diretora ficou formada por Eurico Costa na
presidência, Milton Leite como 1º secretário e Romualdo Campos como 2º secretário.
Mas, o que ficava visível é que a FPD naquele momento estava se constituindo como maioria
no Legislativo Municipal, pois, além de contar com os seis votos dos seus integrantes passava à
dispor da adesão do dissidente udenista, Armando Leal. A bancada governista estava fadada a
derrota na eleição para a composição da diretoria da Câmara, assim como, possivelmente nas
deliberações ulteriores em que, eventualmente, conflitassem os interesses da bancada governista e
de oposição representada pela FPD. Neste quadro, apesar da momentânea retomada da sessão, o
presidente da Câmara, Eurico Costa, afirmou “que havia encerrado a sessão e mantinha, assim, o
seu ato”410 e retirou-se logo depois em companhia dos vereadores Altamirano Campos (PSP),
Milton Leite (UDN) e Horácio Dantas (UDN), pois o Vereador José Lúcio dos Santos Silva (PSD),
já havia saído anteriormente.411 A saída em bloco da bancada governista talvez tenha sido um
subterfúgio utilizado para impedir que se procedesse à eleição para compor a Mesa diretora do
Legislativo Municipal. Mas, os seis vereadores da FPD e o Vereador Armando Leal permaneceram
no salão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas. Romualdo Campos era o 2º secretário da Mesa e
diante das circunstâncias em que o presidente, o vice-presidente e o 1º secretário tinham se retirado,
Romualdo Campos assumiu a presidência dos trabalhos desta sessão. A partir deste momento,
Hildebrando Dias interpretou que a sessão poderia continuar em curso, uma vez que o presidente
reabriu a mesma quando estavam presentes 11 vereadores “o que, logicamente, implicava não ter o
presidente efetivo encerrado a sessão”.412 Diante disso, Romualdo Campos, ao ter assumido a
presidência, compôs a Mesa com alguns dos vereadores presentes e daí por diante se realizou a
eleição, quando ali estavam todos os membros da FPD, além do Vereador Armando Leal,

407
ACMA. Ata de 07.04.1956 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
408
Idem.
409
APJR. O Nordeste, 11.04.1956, p.1.
410
ACMA. Ata de 07.04.1956 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
411
Idem.
412
Idem.

98
totalizando, portanto um quantitativo de sete vereadores. O resultado foi óbvio: Armando Leal,
eleito presidente com sete votos; João Nou, eleito vice-presidente com sete votos; Hildebrando
Dias, eleito 1º secretário com sete votos; e para 2º secretario foi reeleito Romualdo Campos também
com sete votos.413
A FPD, ao lado de um dissidente da bancada governista passou a ocupar postos que concedia
a prerrogativa de dirigir os trabalhos do Legislativo Municipal para o período que se estenderia
entre 1956 e 1957. Afirmava-se que a composição da Mesa que acabava de ser eleita correspondia à
“fórmula João Ramos”, pois teria sido João Ramos, “o Vereador do 2 de julho”, que tinha proposto
à FPD o nome do Vereador Armando Leal para candidato à presidência da Câmara e, deste modo,
desfalcar em um voto a bancada governista.414
Antes do encerramento dessa agitada sessão, o Vereador Hildebrando Dias informou da
chegada na cidade do Deputado Federal pelo PR, Manoel Novais, solicitando do presidente da
Câmara que “fosse franqueado àquele parlamentar, o salão desta Câmara afim de que S. Excia., em
debate público, pudesse discutir com o povo assuntos do interesse do município”.415 Sobre a estada
de Manoel Novais em Alagoinhas convém nos determos um pouco.
Manoel Novais, nas eleições de 1954, recebeu em Alagoinhas apenas 66 votos 416 e, em 1955,
enquanto Deputado Federal, propôs emendas no orçamento da União que somavam um total de
catorze milhões de cruzeiros que seriam canalizadas para Alagoinhas. Partes desses recursos seriam
destinados para entidades ligadas aos curtumeiros e aos ferroviários.
Manoel Novais chegou a Alagoinhas no dia 7 de abril de 1956, mesmo dia em que ocorreu a
tumultuada sessão na Câmara de Vereadores de Alagoinhas que culminou com a eleição de uma
composição articulada pela FPD para a Mesa diretora. O seu desembarque na estação ferroviária foi
narrado com entusiasmo pelo jornal O Nordeste, noticiando que o recepcionaram:

(...)amigos, correligionários, autoridades, delegações de ferroviários e de trabalhadores,


comissões do Ginásio de Alagoinhas e S.S. Sacramento, dos quais Manoel Novais é grande
amigo, destacando-se também a presença do presidente da Câmara Municipal, vereador
Armando Leal e de todos os vereadores da Frente Popular Democrática(...).417

413
Idem.
414
APJR. O Nordeste, 11.04.1956, p.1.
415
ACMA. Ata de 07.04.1956 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
416
APJR. O Nordeste, 24.12.1954, p.4.
417
APJR. O Nordeste, 02.05.1956, p.1.

99
Percebeu-se, nesta recepção, a presença de representações dos setores que tinham sido
contemplados com as emendas sugeridas no Orçamento da União em 1955 por Manoel Novais.418
Como oradores se pronunciaram João Nou, líder da FPD, José Godinho representante do PR em
Alagoinhas e “por delegação expressa dos ferroviários usou da palavra o tribuno dr. Antonio
Guimarães”.419
Na sua estada em Alagoinhas, Manoel Novais ficou hospedado na casa de João Nou, onde
atendeu a “amigos, correligionários e pessoas do povo” e se reuniu com os integrantes da FPD,
assim como recebeu “D. Maria Jaqueira e D. Cleide Andrade, representantes da Maternidade Nossa
Senhora de Fátima”.420 Em seguida, Manoel Novais realizou algumas visitas que tinha programado
a entidades locais.421 Cumprindo o seu itinerário, esteve na Associação Lauro de Freitas e no
Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Curtimento de Couros e Peles de Alagoinhas. Na
Associação Lauro de Freitas, houve um “debate entre Novais e os ferroviários que prolongou-se por
mais de uma hora”.422 Nessa oportunidade, o ferroviário e Vereador Hostilio Dias lhe entregou
“uma mensagem dos trabalhadores alagoinhenses ao presidente Juscelino Kubitschek”.423 Em
seguida Manoel Novais se dirigiu para o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Curtimento de
Couros e Peles de Alagoinhas, onde se pôs a “debater com os trabalhadores, inclusive os da
construção civil e os empregados no comércio, através dos seus representantes, Valdemar Sales e
Antonio Ornelas.”424 Durante a tarde, Manoel Novais compareceu a dois redutos ferroviários de
Alagoinhas: o distrito de Aramari e o bairro 2 de Julho.
Em sua curta permanência em Alagoinhas, Manoel Novais esteve em contato com diferentes
entidades e segmentos da sociedade alagoinhense. Dialogou com os operários dos curtumes e
representantes dos trabalhadores do comércio e da construção civil; visitou redutos ferroviários,
como o distrito de Aramari, o bairro 2 de Julho e a Associação Lauro de Freitas. Nesta última lhe
foi entregue um documento para ser encaminhado ao Presidente da República, Juscelino
Kubitschek. Não foi possível identificar o teor da mensagem a ser entregue ao Presidente da
República e da qual Manoel Novais foi requisitado para ser portador, mas fica indicada a utilização,
por parte dos trabalhadores, deste como um intermediário para acessar ao Estado.
418
Idem.
419
Idem.
420
Idem.
421
Nessa ocasião, Manoel Novais visitou a Escola João de Castro, a Associação Lauro de Freitas, o Sindicato dos
Trabalhadores na Indústria de Couros e Peles de Alagoinhas, a Santa casa de Misericórdia, o Ginásio de Alagoinhas e o
Ginásio S.S. Sacramento. Ver: APJR. O Nordeste, 02.05.1956, p.1 e 5.
422
APJR. O Nordeste, 02.05.1956, p.1 e 5.
423
APJR. O Nordeste, 02.05.1956, p.1.
424
APJR. O Nordeste, 02.05.1956, p. 5.

100
No dia 8 de abril de 1956, Manoel Novais partiu de Alagoinhas e certamente com a impressão
de que teria na próxima eleição uma votação mais expressiva nesse município, o que, por sinal,
deveria estar, também, em seus planos. Despediu-se Manoel Novais de Alagoinhas, mas o
tensionamento político que encontrara permanecia.
Retomemos então à agitada sessão de 7 de abril de 1956 em que se procedeu à eleição da
Mesa diretora da Câmara de Vereadores de Alagoinhas. Ela se encerrou com a solicitação feita pelo
Vereador Hildebrando Dias do salão da referida Câmara para uma audiência do Deputado Federal
Manoel Novais com segmentos da população local. Esta solicitação foi atendida, mas no dia
seguinte, quando iria acontecer a referida atividade, a Câmara de Vereadores de Alagoinhas
amanheceu cercada por soldados da Polícia Militar e da Guarda Municipal a pedido de Eurico
Costa, Vereador e ex-presidente desse órgão legislativo. A situação foi contornada após o Vereador
Armando Leal, eleito no dia anterior presidente da Câmara, ter protestado junto ao Delegado
local,425 mas segundo informação noticiada no jornal O Nordeste, o Vereador Eurico Costa
apresentou uma ação no Judiciário solicitando a busca e a apreensão das chaves do edifício da
Câmara de Vereadores de Alagoinhas e o envio de outra guarnição policial para o lugar. O Juiz teria
acatado a ação e requisitado a referida guarnição policial ao Coronel do Batalhão de Polícia, o qual
“conferenciou longamente com o Juiz e mais tarde oficiou negando-lhe a força requisitada.”426
A agitação do dia 8 de abril passou, mas os vereadores da bancada governista não
compareceram às quatro sessões posteriores à tumultuada eleição da Mesa da Câmara processada
em 7 de abril de 1956. Enquanto isso, o tensionamento político local se elevava, conforme ficou
evidenciado na sessão de 4 de maio de 1956 através do pronunciamento de João Nou quando se
referiu ao Prefeito Municipal pela UDN, Antonio Martins de Carvalho Júnior:

(...) os inimigos do Sr. Carvalho Júnior, estavam se prevalecendo da senilidade do mesmo,


e os quais queriam a todo transe levá-lo ao ridículo; que há poucos dias, em companhia do
dr. João Batista de Almeida Costa, Juiz de Direito da Comarca, e do dr. João Muniz de
Oliveira, Promotor Público, ele orador visitara as cadeias públicas desta cidade, e que esta

425
O Vereador Armando Leal expediu ofício com o seguinte teor ao Delegado local: “Câmara Municipal de
Alagoinhas, gabinete da presidência, 08 de abril de 1956. Sr. Capitão Delegado de Policia. Tendo, com surpresa,
tomado conhecimento do fato de haver o senhor Vereador Eurico Batista da Costa, ex-presidente da Câmara Municipal
desta cidade, pois o mandato de S. Excia, naquele alto cargo, ontem se extinguiu, em ofício dirigido a V. Sa., requerido
que fossem colocados soldados na entrada do prédio do Poder Legislativo, sob alegação, que a mim, como presidente
efetivo e legalmente eleito, não merecem ser apreciadas nesta oportunidade, em nome mesmo da dignidade do nome da
Câmara de Vereadores e do respeito que a ela se deve, na qualidade de um dos poderes públicos que integram a
estrutura jurídica do nosso regime, venho solicitar-lhe a retirada incontinente, daquele local, de qualquer soldado ou
agente de policia, subordinado a essa delegacia. Ass. Armando Leal. Presidente.” Ver: ACMA. Ata de 09.04.1956 da
sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
426
APJR. O Nordeste, 11.04.1956, p.1.

101
visita fizera a convite do Juiz, o qual fazia em consequência de uma carta que recebera de
um detento; que a visita teve por principal objetivo um exame da situação das prisões, bem
como do tratamento que estava sendo ministrado aos detentos, não só na parte da
assistência, como também, relativamente a alimentação; que retiraram-se todos seriamente
desolados com o quadro tétrico de misérias, que qualquer espírito bem formado repele (...).
Daí foi que lhe veio à idéia do artigo “Voltando a Cadeia”, publicado no jornal O Nordeste
do dia 2 de maio o que passou a ler.427

No artigo intitulado Voltando a cadeia, publicado na edição de 2 de maio de 1956 do jornal O


Nordeste, João Nou descreveu a precariedade que ele testemunhara na cadeia pública de Alagoinhas
e dirigiu severas críticas à administração do Prefeito udenista Antonio Martins Carvalho Júnior. No
referido artigo João Nou expressou que:

Se a cadeia que conheci antigamente era uma miséria (...) a que agora vi é muito pior. (...)
verdade é que os xadrezes continuam os mesmos, as tarimbas são as mesmas compradas na
administração de Pedro Dórea, as grades ainda não tem porta. Mas para agravar tudo isto, o
Prefeito Municipal, a título de economia, segundo informaram ao Juiz na própria cadeia
pública, cortou a ração dos encarcerados, que agora, praticamente, estão reduzidos a
miséria, passando inclusive fome. Ao passo que esta economia que o Sr. Prefeito Municipal
faz, a custa da miséria dos encarcerados, gasta é com passeios à Capital, corridas de
automóvel (só a Mesa da Câmara o ano passado gastou quase vinte mil cruzeiros em
corridas de automóvel na cidade), gratificações a corrutos, ou furtos aos cofres municipais
por apaniguados, sócios ou familiares do Sr. Prefeito municipal, homem a quem hoje, com
autoridade e provas, posso chamar de profundamente desumano e espertamente
desonesto.428 (grifos meus)

João Nou, portanto, fez críticas agudas à administração municipal com relação ao estado em
que se encontrava a Cadeia Pública de Alagoinhas, afirmando também que possuía provas para
chamar o Prefeito Antonio Martins de Carvalho Júnior de “profundamente desumano e
espertamente desonesto”. Segundo o próprio João Nou, em respostas às acusações expressas acima,
o referido Prefeito distribuiu pelas ruas de Alagoinhas boletins com o título Repto de Honra
convidando-o “para determinar um lugar nesta Câmara ou em praça pública, a fim de que ele,
orador, provasse o que dissera no aludido artigo, ser ele, o Prefeito profundamente desumano e
espertamente desonesto”.429 Dirigindo denúncias de corrupção à administração municipal, João Nou
passou a se referir da seguinte maneira ao Prefeito e ao boletim que este teria distribuído em
Alagoinhas:

(...) não seria possível que S. Excia, que não teve a coragem de defender a sua honra
quando moço o quisesse fazer agora quando ultrapassou os 70 anos, e está enquadrado entre
os indivíduos citados pelos cientistas, que dizem que nessa idade são eles atacados de

427
Ata de 04.05.1956 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
428
APJR. O Nordeste, 02.05.1956, p.3.
429
Ata de 04.05.1956 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

102
amnésia irreparável, insensibilidade e se entregam a libidinagem, ficando sujeitos a ser
acometidos, facilmente por um ataque cardio-renal. (...) Familiares e mal conselheiros do
Sr. Carvalho Júnior compeliram-no a lançar o ridículo e irrisório boletim, pensando que ele
orador se deixaria levar para atender convite tão idiota. No entanto, aceitava-o para um
debate público, a ser realizado no Cine Azi, com entradas pagas, e cuja renda viesse a
reverter em benefício da Santa casa de Misericórdia. (...) que ele, o prefeito, tem um filho
moço, e este estava no dever de defendê-lo não deixando cair no ridículo como vem
fazendo; que o pai dele, orador, é Desembargador no estado de Sergipe, e se por acaso
soubesse que alguém o ferira na sua honra e reputação, imediatamente se transportaria para
ali, e como quiserem fossem as suas palavras compreendidas. 430 (grifos meus)

João Nou, da tribuna da Câmara de Vereadores, fez duras críticas ao prefeito Antonio Martins
de Carvalho Júnior, inclusive afirmando que este tinha “um filho moço” que “estava no dever de
defendê-lo”. Concluindo disse que “como quiserem fosse as suas palavras compreendidas”. Na
sessão de 7 de maio de 1956, posterior ao pronunciamento de João Nou, o filho de Antonio Martins
de Carvalho Júnior, se fez presente em uma decisão que viria se revelar como trágica. Nesta sessão,
estavam presentes os vereadores da FPD João Nou, Hildebrando Dias, Romualdo Campos, Amando
Camões Filho, Hostilio Dias e José de Araújo Batista que tinha assumido como suplente do
Vereador João Ramos. Compareceram também os vereadores governistas Horácio Dantas (UDN),
Eurico Batista (UDN), Milton Leite (UDN), José Lúcio dos Santos (PSD) e Altamirano Campos
(PSP), algo que não acontecia desde a tumultuada eleição da Mesa diretora processada no mês
anterior. Faltou nessa oportunidade o presidente da Casa, Armando Leal. Diante desta ausência,
assumiu a presidência dos trabalhos o Vereador João Nou, tendo como 1º secretário o Vereador
Hildebrando Dias e 2º secretário Romualdo Campos. Conforme a ordem costumeira, a sessão foi
iniciada com a leitura da ata da sessão anterior. Os desdobramentos que houve posteriormente
também foram registrados pelo redator da ata desta sessão inconclusa, a qual segue abaixo a sua
transcrição:

(...)foi determinada a leitura da ata da sessão dia 4 do mês andante. Terminada a leitura da
ata o Sr. Presidente submeteu a discussão e a aprovação, como nenhum dos srs. Vereadores
se pronunciaram sobre a mesma, deu como aprovada; já nessa ocasião não se encontravam
mais no recinto do plenário os vereadores Horácio Leal Dantas, Eurico Batista Costa,
Milton Batista de Souza Leite, José Lúcio dos Santos e Altamirano Cerqueira Campos, os
quais retirando-se, ficaram a porta da ante-sala que dá acesso ao recinto das sessões.
Nessa altura dos trabalhos legislativos da presente sessão, surgiu do meio dos assistentes, e
que de pé já se encontrava o Bel. Darcy Carvalho, Secretário da Prefeitura, que em voz
alta e agitada, dirigindo-se ao Sr. Presidente disse que protestava contra a ata que
acabava de ser aprovada e que pedia ao vereador João Nou, para que ele repetisse o que
havia dito do seu pai. Fazendo soar a campanhia, o Sr. Presidente disse ao interpelante que
a assistência não podia se manifestar. Nesse ínterim os vereadores Eurico Costa, Horácio
Leal Dantas e Milton Batista de Souza Leite, que se encontravam na porta da ante-sala,
bateram palmas dizendo que a assistência podia se manifestar, no que foi imitado por quase

430
Idem.

103
toda a assistência. No meio dessa confusão verificou-se que o Bel. Darcy Carvalho, pulava
o gradio que separa a assistência do plenário e de arma em punho dizia para o Sr.
Presidente: “isto ainda é sobre o repto de honra”. A partir desse momento, deu-se um
tremendo tiroteio e nada mais pode ser percebido. E para constar lavrou-se a presente ata,
que depois de lida, aprovada e por todos assinada, será transcrita em livro próprio.431(grifos
meus)

Darcy Carvalho era o filho do Prefeito Municipal Antonio Martins de Carvalho Júnior, que na
ocasião ocupava o cargo de Secretário de Governo do município em Alagoinhas. Quando da sua
nomeação para este cargo, o jornal O Nordeste o descrevia como um “jovem educado e de passado
que pode ser analisado.”432 Na tensa sessão de 7 de maio de 1956, Darcy Carvalho, empunhando
um arma saltou “o gradio” que separava o público do plenário da Câmara de Vereadores e se
dirigiu a João Nou, que presidia essa sessão, dizendo “isto ainda é sobre o repto de honra” – uma
referência ao debate que até então era travado através de publicações entre João Nou e o pai de
Darcy Carvalho, o Prefeito Antonio Martins Carvalho Júnior. A partir daí se iniciou um tiroteio, no
qual Darcy Carvalho foi alvejado e não sobreviveu.433 João Nou e Hildebrando Dias foram feridos
a tiros, mas conseguiram sobreviver. Estes dois vereadores ao lado, de Hostílio Dias, foram
afastados dos seus mandatos, sendo presos e processados, pesando sobre eles a acusação da morte
de Darcy Carvalho.434 O nome de José Alves Ferreira também aparece arrolado ao lado dos citados
vereadores,435 porém em setembro de 1958 todos foram absolvidos.436
As hostilidades entre a bancada governista e a oposição organizada em torno da FPD haviam
se elevado, sobretudo após a eleição que resultou no afastamento de representantes da situação dos
cargos diretórios no Legislativo Municipal, e na ascensão aos mesmos por vereadores que
compunham a FPD ao lado do dissidente udenista Armando Leal. Nesta sessão, Armando Leal,
então presidente da Câmara, não compareceu. Quando da entrada de Darcy Carvalho de arma em
punho no plenário, com a sessão ainda em curso, os vereadores Horácio Dantas, Eurico Costa,
Milton Leite, José Lúcio dos Santos e Altamirano Campos tinham se retirado e ficaram à porta da
ante-sala que dava acesso ao salão das sessões. Previam eles os desdobramentos que aconteceriam
nessa sessão e das proporções que viriam alcançar? Ou foi apenas por acaso as ausências do
primeiro na sessão e dos demais no plenário?

431
Ata de 07.05.1956 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
432
APJR. O Nordeste, 16.04.1955, p.6.
433
TELES, Fernando Jatobá da Silva; FERREIRA, Jessé Muniz. O caso da Câmara de Alagoinhas: Defesa dos
vereadores João Rodrigues Nou, Hildebrando Dias e Hostílio Ubaldo Ribeiro Dias. Alagoinhas: [s.n], 1957.
434
Idem.
435
APWC. Alagoinhas Jornal, 21.10.1957, p.1.
436
APWC. Alagoinhas Jornal, 13.09.1958, p.1.

104
O certo é que o Legislativo Municipal, após esse episódio, retomou as suas atividades quase
um ano depois, com a assunção dos suplentes José de Araújo Batista, Hugo Dantas Luna e Osvaldo
Matos para as vagas de João Nou, Hostílio Dias e Hildebrando Dias, respectivamente, pois estes
cumpriam prisão preventiva.437 O tensionamento político local se arrefeceu após o afastamento
destes três vereadores e talvez seja representativa a fala em junho de 1957, de Osvaldo Matos,
suplente que assumiu pelo PSP a vaga de Hildebrando Dias, afirmando que se sentia satisfeito “pela
prontidão do Poder Executivo em atender aos pedidos do Poder Legislativo, verificando-se haver
compreensão e harmonia entre os dois poderes que em eras passadas não se notava, em virtude do
extravasamento que daqui partiam contra o Poder Executivo.”438 Dos remanescentes da FPD,
apenas Romualdo Campos e João Ramos mantinham uma postura de contestação frente ao governo
municipal, mesmo assim sem força política na Câmara de Vereadores. É emblemática a discussão
em torno da aprovação das contas do Prefeito referente ao ano de 1956, as quais foram aprovadas
sem dificuldade, apesar destes dois vereadores alegarem ter identificado irregularidades e votarem
pela rejeição.439
Com essa reabertura do Legislativo Municipal em 1957, não se extinguiu a apresentação de
demandas ligadas a trabalhadores, embora tenha se dado com menor intensidade. Por exemplo, João
Ramos apresentou requerimentos reclamando melhorias para a Rua 2 de Julho e Castro Alves,
igualmente a José de Araújo Batista no que se refere à Aramari. E Romualdo Campos continuou a
atuar como um representante dos interesses dos operários em curtumes de Alagoinhas. Em todo
caso, estes vereadores, ao lado de Amando Camões, jamais voltaram a reivindicar o nome da FPD
durante essa legislatura, que às vésperas do seu encerramento em 1958 teve Hostílio Dias
recuperando o seu mandato.440 Nas eleições municipais realizadas em outubro deste mesmo ano,
este vereador foi eleito pelo PTB.441 Romualdo Campos, João Ramos e José de Araújo Batista,
também, foram reeleitos, sendo este último como o vereador mais votado no município, recebendo
601 votos.442 Os udenistas Horácio Dantas, Milton Leite, Hugo Dantas Luna e José Olímpio de
Azevedo migraram para o PTN e não conseguiram retornar à Câmara de Vereadores.443 Eurico
Costa e Armando Leal, que em 1954 tinham sido eleitos pela UDN, disputaram essa eleição por

437
Ata de 07.04.1956 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
438
Ata de 13.06.1957 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
439
Ata de 13.09.1957 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
440
Ata de 22.11.1958 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
441
APWC. Alagoinhas Jornal, 29.10.1958, p.1.
442
Idem.
443
Idem.

105
outras legendas. O primeiro pelo PSB e o segundo pelo PSD, todavia ambos não conseguiram
alcançar à reeleição.444
Na legislatura de 1955-1958, essa bancada oposicionista, denominada por Frente Popular
Democrática, demonstrou em sua atuação vínculos com segmentos da classe trabalhadora, ao passo
que aspirava ampliar a sua ocupação em instâncias decisórias importantes para o município.
Durante esse mesmo período, se desenvolvia no plano nacional um embate político que influenciava
a polarização entre forças políticas reformistas, herdeiras do getulismo, e setores conservadores da
elite brasileira. Deste embate resultou o golpe civil-militar de 1964, que visava impedir a progressão
daquelas forças políticas que estavam em algum nível associadas às camadas pauperizadas da
sociedade brasileira.445 Na arena política de Alagoinhas essa polarização política reverberou, se
tornando mais evidente na legislatura de 1955-1958 através do choque entre a FPD e o grupo
governista liderado pela UDN. Nesse contexto, o tensionamento político local se elevou e culminou
nos acontecimentos que tiveram lugar na conturbada sessão da Câmara de Vereadores de 7 de maio
de 1956, como foi mencionado, trazendo como um dos desdobramentos o afastamento de três
integrantes da referida Frente, fragilizando-a e dificultando a possibilidade de ascensão deste grupo
político a outros postos de tomada de decisões.

2. Interlocutores dos trabalhadores na situação (1959-1962)

É possível afirmar que o exercício de mediação de interesses dos trabalhadores através do


Legislativo Municipal, junto aos diferentes níveis do Estado, foi, na maioria das vezes, um
expediente utilizado por vereadores que estavam atrelados as forças da oposição no município.
Desse modo, este exercício, além de representar alguma vinculação entre os que possuíam um
mandato de Vereador e as suas bases eleitorais, como no caso dos vereadores que pertenciam às
categorias dos ferroviários ou dos curtumeiros, funcionava também como um instrumento de
pressão junto ao campo governista, a partir do momento que expunha a debilidade ou indisposição
política da gestão do Executivo Municipal ao reivindicar, por exemplo, melhorias na infra-estrutura
de determinados logradouros ou nas condições de trabalho dos servidores municipais. Por sua vez,
as forças da situação, através dos seus representantes no Legislativo, ao se constituir como maioria,
buscava rejeitar várias proposições que partiram dos vereadores oposicionistas. Este quadro poderia
ser alterado, como foi visto no tópico anterior, em 1956, quando a Frente Popular Democrática,
444
Idem.
445
WEFFORT, Francisco Correia, op. cit., p.52-53.

106
bancada de oposição no Legislativo Municipal de Alagoinhas, recebeu a adesão de um dissidente da
situação e desse modo, passou a dispor de uma incontestável maioria. Todavia, as contingências que
se apresentaram a partir deste momento desfalcaram essa Frente parlamentar dos seus membros
mais atuantes, impedindo que a sua existência se prolongasse.
Quanto ao Executivo Municipal, ele também buscava retardar ou mesmo vetar o atendimento
de demandas apresentadas pela oposição, isto fica evidente quando se nota a repetição ao longo do
tempo de reivindicações semelhantes. Esse processo de bloqueio colocado pela situação poderia
trazer como consequência uma propaganda negativa dos representantes do setor oposicionista e
impedir a sua projeção política junto ao eleitorado.
Dito isto, tratemos de agora em diante da legislatura de 1959-1962, em que a presença de
interlocutores dos trabalhadores no bloco oposicionista não se extinguiu, mas se enfraqueceu. Nessa
conjuntura percebe-se na composição da bancada governista a presença de vereadores que atuaram
como mediadores de demandas ligadas aos trabalhadores, promovendo outras implicações para a
dinâmica deste processo como será exposto.
Para a legislatura de 1959-1962 foram eleitos para a Câmara de Vereadores de Alagoinhas
quatro representantes do PSD, quatro do PTN, dois da UDN, um do PTB e um do PSB.446 Pelo PSD
foram reeleitos José Lúcio dos Santos, que como já foi visto, era proprietário de terras no distrito
alagoinhense de Riacho da Guia e Romualdo Campos, Vereador que durante a década de 1950
presidiu o Sindicato dos operários em curtumes de Alagoinhas. Completaram a bancada pessedista
Osvaldo Matos, Tenente da Polícia Militar e o ferroviário José de Araujo Batista, os quais na
legislatura anterior (1955-1958) havia ocupado temporariamente o cargo de Vereador na condição
de suplentes.
Pelo PTN foi reeleito João Ramos, considerado “o Vereador do 2 de Julho”, por residir neste
bairro;447 Thiago Evangelista dos Santos, ferroviário que retornou à vereança após o intervalo de
uma legislatura; a professora Maria de Lourdes Veloso, a única mulher eleita para o Legislativo
Municipal em Alagoinhas durante a Segunda República; e Milton Ramos, funcionário público cuja
repartição em que era lotado não foi identificada.448

446
Sobre os nomes e os partidos dos doze vereadores eleitos para a legislatura de 1959-1962 em Alagoinhas, ver:
APWC. Alagoinhas Jornal, 13.05.1959, p.4.
447
APJR. O Nordeste, 18.03.1956, p.6 e 02.05.1956, p.5.
448
Sobre a condição ocupacional de Thiago Evangelista dos Santos, Maria de Lourdes Veloso e Milton Ramos, ver:
ACMA. Atas de 19.02.1960 e 22.02.1960 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas e APWC. Alagoinhas
Jornal, 28.04.1958, p.3.

107
Quanto à UDN, esta sigla partidária teve reduzida, significativamente a sua representação no
Legislativo Municipal, pois elegeu apenas dois vereadores: Antonio Mutti, que era vinculado ao
Departamento de Estradas e Rodagens da Bahia e Luiz Rabelo, proprietário de terras.449
Pelo PTB retornou para mais uma legislatura Hostílio Dias, que, como já foi mencionado, era
ferroviário, e o PSB teve o cirurgião dentista Antonio Guimarães como seu primeiro representante
eleito para Vereador em Alagoinhas.450
Para Prefeito Municipal de Alagoinhas entre 1959 e 1962, foi eleito o comerciante José Azi,
representante do PR, estreante no cenário político local que enfrentou como concorrentes nesse
pleito Israel Pontes Nonato (PTB), Antonio Valverde Bastos (PTN-PSP) e Eurico Costa, ao que
tudo indica como candidato do PSB.451 Nessa ocasião, José Azi, contou com o apoio de Manoel
Novais, Deputado Federal pelo PR e liderança desse partido, além da UDN e do PSD local.452
Para o quatriênio 1959-1962, José Azi, em tese, poderia contar no Legislativo Municipal com
o apoio de seis dos seus doze membros. E isto se confirmou, pois foi consolidada uma bancada
governista no Legislativo Municipal composta pelos quatro vereadores eleitos pelo PSD e os dois
pela UDN, partidos que haviam apoiado a candidatura de José Azi para a chefia do Executivo
Municipal.453 Essa bancada se constituiu sob a liderança de Osvaldo Matos (PSD) e ao longo do
tempo deu sustentação aos projetos do Prefeito José Azi, excetuando-se apenas o período em que os
udenistas momentaneamente romperam com o governo municipal, como será visto adiante. Quanto
às demais organizações partidárias, PTN, PSB e PTB, que possuíam representantes no Legislativo
Municipal, tendiam a atuarem como bloco de oposição. Tendiam, pois os vereadores do PTN e do
PSB, embora em determinados momentos tenham reivindicado a condição de oposição,
demonstraram uma conduta pendular, por vezes adotando uma postura de conciliação com o
governo e agindo como representantes da situação. Apenas o ferroviário Hostílio Dias (PTB)
manteve uma atitude constante e solitária de fiscalização sobre o Executivo Municipal.
Mas o que particularizou a legislatura ora em discussão foi a presença no campo da situação
no município de vereadores que possuíam ligação com segmentos da classe trabalhadora. Trata-se

449
ACMA. Atas de 26.02.1960 e 13.05.1960 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
450
ACMA. Ata de 18.05.1959 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
451
APWC. Alagoinhas Jornal, 29.09.1958, p.1-2.
452
Sobre o apoio da UDN, do PSD e de Manoel Novais (PR) à candidatura de José Azi para Prefeito de Alagoinhas,
em 1958, ver: APWC. Alagoinhas Jornal, 29.09.1958, p.1-2; Alagoinhas Jornal, 22.01.1959, p.1 e Alagoinhas Jornal,
14.03.1960, p.6. Após exercer o cargo de Prefeito, José Azi ganhou projeção política. Foi eleito Deputado Estadual pelo
PTB em 1962 e Vereador em Alagoinhas pela Aliança Renovadora Nacional (ARENA) entre 1971-1972 e 1973-1976.
Ver biografia de José Azi em: http://www.al.ba.gov.br/v2/biografia.cfm?varCodigo=447 (síte consultado em
20.10.2010).
453
ACMA. Ata de 10.04.1959 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

108
dos remanescentes da Frente Popular Democrática e pertencentes ao PSD: José de Araujo Batista e
Romualdo Campos. Some-se a estes dois, outro remanescente da Frente Popular Democrática, João
Ramos, eleito na ocasião pelo PTN e o representante do PSB, Antonio Guimarães, ambos oscilando
entre uma postura de oposição moderada ou pró-governo. Esse quadro promovia um paradoxo. Se
por um lado, determinadas demandas dos trabalhadores apresentadas por estes vereadores eram
atendidas sem os eventuais bloqueios impostos pela situação, processo típico quando correspondiam
a proposições que partiam do bloco oposicionista. Por outro lado, trazia limites para a atuação
destes vereadores, uma vez que fazer parte da bancada da situação exigia um compromisso de
defesa do governo, por exemplo, quando este era responsabilizado pelas carências existentes em
bairros operários ou pelas difíceis condições de trabalho enfrentadas pelos servidores municipais.
Estiveram presentes no Legislativo Municipal de Alagoinhas, na legislatura de 1959-1962,
três ferroviários: José de Araujo Batista (PSD), Hostílio Dias (PTB) e Thiago Evangelista dos
Santos (PTN), todavia apenas os dois primeiros atuaram representando interesses dessa categoria de
trabalhadores. Thiago Evangelista dos Santos exercia pela segunda vez o mandato de Vereador, mas
igualmente na primeira oportunidade (1950-1954) limitava-se a participar das votações, poupando-
se de realizar intervenções nos debates ou apresentar proposições.
Desse modo, foi através de José de Araújo Batista e Hostílio Dias que algumas demandas dos
ferroviários foram apresentadas na tribuna da Câmara e que se buscou pressionar determinadas
instâncias governamentais para que elas fossem atendidas. Exemplo disto foram as reivindicações
encaminhadas à Presidência da República e aos ministérios da Guerra, da Justiça e do Trabalho para
que fossem coibidas as irregularidades existentes da Caixa de Aposentadorias e Pensões a que
estavam vinculados os ferroviários.454 Uma das principais irregularidades era a imprecisão no
pagamento dos benefícios por este órgão que, ao longo de 1959, foi denunciada no Legislativo
Municipal pelos referidos vereadores. Estas denúncias desapareceram nos anos seguintes, indicando
que pode ter havido solução para o problema enfrentado pelos ferroviários aposentados.455
Entretanto, quanto aos ferroviários em atividade, permanecia o atraso no pagamento salarial o que
motivou, ao lado de outras questões, a deflagração de uma greve em fevereiro de 1960.456 A

454
ACMA. Atas de 12.01.1959 e 30.01.1959 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
455
ACMA. Atas de 22.05.1959, 25.05.1959, 13.07.1959, 17.07.1959, 31.07.1959 das sessões da Câmara de Vereadores
de Alagoinhas.
456
Segundo Hostílio Dias e José de Araujo Batista, as primeiras articulações desse movimento grevista foram
desenvolvidas durante os meses de janeiro e fevereiro de 1960. Ver: ACMA. Atas de 25.01.1960 e 05.02.1960 das
sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

109
imprensa local noticiou que essa mobilização era comandada pelo “General Fome”, uma alusão a
pressão que os baixos salários exerciam para ação dos ferroviários que reivindicavam o seguinte:

1º - Pagamento em data regular dos seus vencimentos mensais; 2º - Reclassificação de


cargos na rede até 18 de fevereiro [de 1960]; 3º - Se não for aprovada até essa data, a
concessão de um abono especial de $ 3.000,00, indistintamente; 4º - instalação de um posto
médico em Aramari; 5º - Admissão de um ginecologista e dentista; 6º - Instalação de
Serviço de Proteção à saúde dos operários; 7º - Mudança do Posto Médico que funciona em
consultório particular para as proximidades das Oficinas de São Francisco; 8º - Prestação de
melhor assistência por parte da Caixa dos ferroviários; 9º - Instalação de serviço sanitário
em Aramari; 10º - Instalação de bebedouros nas Oficinas.457

Estas reivindicações não foram atendidas e em 19 de fevereiro de 1960 a greve foi deflagrada.
É importante destacar que a Constituição de 1946, em vigor naquele momento, não assegurava o
direito de greve.458 Diante disso, se percebeu a habilidade dos ferroviários em mobilizar apoio
político em seu favor, neste contexto que, embora denominado democrático, fica evidente, a partir
da plataforma de reclamações dos ferroviários, como a cidadania no Brasil se constituía como uma
condição de desfrute restrito. Assim, um dia antes do início da referida greve, a partir de solicitação
apresentada pelo Vereador Romualdo Campos, foi realizada uma sessão extraordinária na Câmara
de Vereadores de Alagoinhas em que estiveram presentes sete dos doze vereadores. Romualdo
Campos não hesitou em demonstrar a sua solidariedade para com os trabalhadores da ferrovia,
assim como chamar a atenção da “necessidade da Câmara dar oficialmente um testemunho do seu
apoio ao movimento dos ferroviários.”459 Essa greve dos ferroviários se prolongou até o dia 28 de
fevereiro de 1960, após ter sido celebrado, na presença de autoridades, um protocolo em que a
direção da VFFLB se comprometia a cumprir as seguintes cláusulas, na medida em que os
trabalhadores, da Bahia e de Sergipe, retomassem as suas atividades:460

-Regularizar o pagamento das horas extraordinárias do serviço de todo o pessoal, como,


aliás, já vinha procedendo com a maioria do pessoal;

457
APWC. Alagoinhas Jornal, 02.02.1960, p.4.
458
Somente em 1964, durante a ditadura militar, foi aprovada a primeira lei de greve. Entretanto, anterior a essa
regulamentação várias greves foram deflagradas no Brasil. CARVALHO, José Murilo, op. cit., p.127.
459
ACMA. Ata de 18.02.1960 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
460
Na ocasião do acordo firmado para por fim à greve dos ferroviários se fizeram presentes representando esta categoria
Diógenes Alves, presidente da Associação dos Ferroviários da Bahia e Sergipe, Hermenito Dourado, consultor jurídico
da Associação dos Ferroviários da Bahia e Sergipe, Victor dos Santos, presidente da União dos Ferroviários do Brasil
(seção da Bahia), Jerônimo C. Silva, presidente da Federação dos Trabalhadores nas Indústrias da Bahia e Hostílio Dias,
ferroviário e Vereador em Alagoinhas. Ver: APMA. Protocolo pelo qual os ferroviários da Viação Férrea Federal
Leste Brasileiro – Rede Ferroviária Federal S/A – acordam com a diretoria da mesma Estrada em fazer cessar a
paralisação do tráfego e mais serviços, mediante o estabelecimento de condições e compromissos. Salvador, 28 de
fevereiro de 1960. Agradeço imensamente a Ede Soares pela apresentação deste documento.

110
-Iniciar o pagamento da folha de fevereiro logo reabram os bancos, não efetuando qualquer
desconto que decorra da paralisação do serviço;
-Conceder um abono provisório, cujo pagamento será sustado, quanto aos funcionários
cedidos, logo entre em vigor a reclassificação geral ora em curso no Congresso Nacional,
não computável para qualquer outro fim que não seja o de pagamento na base de Dois Mil
Cruzeiros ($ 2.000,00) para quantos tenham salário ou vencimento básico inferior ou igual
a Onze Mil Cruzeiros ($ 11.000,00) e Hum Mil Cruzeiros ($ 1.000,00), para todos os
demais servidores com vigência a partir de 1º de março p. vindouro;
-Que esse abono passará a ser pago dentro do prazo máximo de 45 dias, período
indispensável para o seu processamento e obtenção de recursos necessários ao atendimento
da despesa;
-Que será de logo apreciado o estudo e levantamento da diferença salarial, devendo o seu
pagamento no mínimo viger a partir de 1º de março p. vindouro;
-Que não serão adotadas medidas que importem em represálias, como consequência da
participação nesse movimento, nem solicitadas transferências ou inclusões em relações de
excedentes quanto a qualquer dos seus dirigentes.461

O referido protocolo também previa que as autoridades presentes na ocasião, o Vice-


Governador da Bahia, Orlando Moscoso, os deputados federais Waldir Pires - este também
representando o Governador do estado de Sergipe, Lourival Batista -, Clemens Sampaio, João
Batista Alves de Macedo e o Deputado Estadual Murilo Cavalcante, assumissem o compromisso de
se empenharem junto ao Governo Federal no sentido de que fossem possibilitados à empresa
ferroviária os recursos necessários para dar lastro as despesas previstas pelo acordo formalizado
com os ferroviários, bem como de se comprometerem em atuar “como fiadores da obtenção, perante
o Exmo. Sr. Ministro da Viação, a completa anistia em favor de quantos participaram do
movimento.”462
Os ferroviários voltaram ao trabalho, mas a VFFLB não cumpriu plenamente com a
contrapartida, ao atender, segundo Hostílio Dias, apenas duas cláusulas do protocolo que havia sido
firmado em 28 de fevereiro de 1960. Com isso, foi retomada a mobilização dos ferroviários e de
seus interlocutores no Legislativo Municipal de Alagoinhas, na medida em que se esboçava o início
de mais uma greve. No Legislativo Municipal, entre maio e julho de 1960, José de Araujo Batista
(PSD) e Hostílio Dias (PTB) foram porta-vozes dessa mobilização, que contava com o engajamento
de ferroviários da Bahia e de Sergipe da VFFLB.463
Desse modo, em maio de 1960, os ferroviários, através de uma comissão intitulada “Pró-
Melhores Dias” elaboraram um documento com dezessete pontos, sete pontos a mais do que trazia a
plataforma de reivindicações que antecedeu a greve realizada meses antes. Neste documento
constavam as exigências destes trabalhadores por reajuste salarial e a regularidade no seu

461
Idem.
462
Idem.
463
ACMA. Atas de 02.05.1960, 06.05.1960, 13.05.1960 e 04.07.1960 das sessões da Câmara de Vereadores de
Alagoinhas.

111
pagamento, melhorias no ambiente de trabalho, além da transferência do Sub-Inspetor das Oficinas
São Francisco em Alagoinhas.464 Em julho de 1960, uma comissão de ferroviários se encontrou em
Salvador com o Presidente da República, Juscelino Kubitschek, para reivindicar o atendimento do
que havia sido definido no protocolo acordado entre os trabalhadores e a direção da ferrovia para
por fim ao aludido movimento grevista.465 Em seguida, se reuniram em Alagoinhas, representantes
dos ferroviários da Bahia, Sergipe e Pernambuco que, conjuntamente, aprovaram um documento
que exibia uma lista de reivindicações mais extensa que as anteriores. Dessa vez, trazia cobranças
dispostas em dezenove itens, indicando que caso não fossem atendidas até o dia 10 de agosto de
1960 deflagrariam mais uma greve.466 Estas reivindicações não foram atendidas de imediato, mas os
ferroviários não iniciaram outra paralisação, a qual continuou sendo cogitada pelo menos até o mês
de novembro desse mesmo ano.467 Posteriormente esse assunto se dissipou, seja na pauta do
Legislativo Municipal, assim como na imprensa local, sem que se possa afirmar ao certo se houve o
atendimento das demandas apresentadas pelos ferroviários por parte da diretoria da VFFLB ou se
eram frágeis as condições políticas para conduzir outro movimento grevista por esses trabalhadores.
Não foram apenas os ferroviários que entraram em greve no início da década de 1960. Os
bancários de Alagoinhas aderiram à paralisação nacional da categoria em 1961 e os servidores
municipais, no ano seguinte, pela primeira vez, interromperam as suas atividades em busca de
reajuste salarial.468 José de Araújo Batista apresentou uma moção de apoio à greve dos bancários
de 1961, atitude que segundo Romualdo Campos também era a sua intenção.469 Porém, se para com
a greve dos ferroviários e dos bancários, esses vereadores governistas apresentaram uma
solidariedade irrestrita, com relação à paralisação dos servidores municipais demonstraram um
comportamento diferente.
Ferroviários, bancários e servidores municipais em Alagoinhas viviam um contexto
semelhante de constante aumento nos preços dos chamados “gêneros de primeira necessidade”,
estando expostos ao rebaixamento do poder de compra dos seus salários. 470 Quanto à situação dos

464
APMA. Os pontos que a comissão executiva dos ferroviários “Pró-Melhores Dias” defenderá junto à Rede Regional
da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro, 04.05.1960.
465
ACMA. Ata de 15.07.1960 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
466
APMA. Memorando aprovado por ferroviários da VFFLB em 24.07.1960 para ser entregue ao Diretor
Superintendente desta ferrovia. Aqui agradeço, também, à Ede Soares pela apresentação deste documento.
467
Em outubro e novembro de 1960, os vereadores José de Araujo Batista e Hostílio Dias fizeram intervenções
comunicando sobre uma possível paralisação dos trabalhadores da ferrovia VFFLB. Ver: ACMA. Atas de 11.10.1960,
04.11.1960 e 07.11.1960 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
468
ACMA. Atas de 20.10.1961 e 17.09.1962 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
469
ACMA. Ata de 20.10.1961 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
470
Sobre as referências ao recorrente aumento nos preços dos “gêneros de primeira necessidade”, ver: ACMA. Atas de
31.08.1959, 04.09.1959, 11.09.1959, 14.09.1959, 18.09.1959, 13.11.1959, 01.02.1959, 04.01.1960, 19.02.1960,

112
servidores municipais, especificamente, diversas vezes essa questão foi alegada quando se
reivindicava um reajuste para os seus vencimentos, demanda que geralmente era mediada por
vereadores que faziam oposição ao governo municipal. Tratam-se dos vereadores Hostílio Dias
(PTB), João Ramos (PTN), Antonio Guimarães (PSB), ou mesmo o udenista Luiz Rabelo,
sobretudo quando o seu partido esteve em litígio temporariamente com o Prefeito José Azi.471 No
entanto, o inverso ocorria a partir dos vereadores José de Araujo Batista (PSD) e Romualdo Campos
(PSD), que por fazerem parte da bancada da situação, quando entrava em pauta a mediação de
interesses dos servidores municipais, defendia o ponto de vista do governo, dificultando o avanço
das deliberações que poderiam promover melhorias nas condições de trabalho desta categoria.
Essa contradição na prática de José de Araujo Batista e Romualdo Campos foi comentada
pelo Alagoinhas Jornal, jornal que realizava oposição ao governo municipal. Por exemplo, em
meados de 1959 e início de 1960 era noticiado que, contrariando o que previa a Constituição, parte
dos servidores municipais recebia uma remuneração de Dois Mil e Cento e Trinta e Seis Cruzeiros,
valor inferior ao que correspondia o salário mínimo da região definido em Quatro Mil Cruzeiros.472
Por isso denominava de demagogos os representantes da bancada da situação no município que
estariam obstruindo a possibilidade de reajuste nos vencimentos dos servidores municipais. Além
disso, reproduziu a qualificação do periódico A Bahia dirigida a José de Araújo Batista (PSD),
Thiago Evangelista dos Santos (PTN) e Romualdo Campos (PSD) taxando-os de “coveiros de si
próprios” ao apontar que estes vereadores vinham adotando um posicionamento incoerente com
relação a concessão para os servidores municipais do salário mínimo de Quatro Mil Cruzeiros,
conforme estava previsto em Lei. Esta incoerência lhes era imputada, pois tinham defendido
“ardorosamente” o “aumento dos ferroviários que já percebiam $4.900,00.” E concluía que

08.08.1960, 26.08.1960, 15.05.1961, 02.06.1961, 07.06.1961, 06.10.1961, 05.12.1961 e 18.09.1962 das sessões da
Câmara de Vereadores de Alagoinhas. Ver também: APWC. Alagoinhas Jornal, 30.09.1959, p.2; 21.10.1959, p.1 e 3;
19.11.1959, p.5; 02.02.1962, p.2 e 22.02.1960, p.3.
471
Sobre as intervenções de Hostilio Dias (PTB) em favor dos servidores municipais, ver: ACMA. Atas de 24.08.1959,
16.11.1959, 23.11.1959, 04.01.1960, 25.01.1960, 01.02.1960, 25.11.1960, 25.08.1961, 20.10.1961, 28.05.1962,
17.09.1962 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas. Quanto a Antonio Guimarães (PSB), ver: ACMA.
Atas de 24.04.1959, 10.07.1959, 19.02.1960 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas; Luiz Rabelo (UDN),
ver: ACMA. Atas de 22.02.1960, 04.12.1961, 21.09.1962 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas; e João
Ramos (PTN), ver: ACMA. Ata de 05.06.1959 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas. Com relação ao
litígio entre a UDN e o grupo do prefeito José Azi, segundo o Alagoinhas Jornal, foi motivado pelo dissenso sobre qual
seria a destinação da verba proveniente do jogo do bicho na cidade. Porém, diante da eleição que se avizinhava, em
abril de 1960, para a Mesa diretora da Câmara de Vereadores, aconteceu uma reaproximação entre esses grupos. Ver:
APWC. Alagoinhas Jornal, 22.04.1960, p.1.
472
APWC. Alagoinhas Jornal, 01.06.1959, p.2; 11.01.1960, p.5; 23.04.1960, p.1 e 22.06.1960, p.3.

113
“coveiros de si próprios” era “um epíteto bem empregado porquanto se mantiverem nessa atitude
correrão o risco de no futuro não voltarem a ser representantes do povo na Câmara Municipal.”473
Mais adiante abordaremos sobre o desempenho destes vereadores nas eleições subsequentes,
mas no que diz respeito aos servidores municipais, finalmente, em maio de 1960, o Legislativo
Municipal, aprovou a concessão do salário mínimo para esses trabalhadores e em novembro deste
mesmo ano, também definiu o seu reajuste.474 No ano seguinte não se obteve a incorporação de um
aumento em seus vencimentos, pois, apesar do Vereador Hostílio Dias (PTB) ter buscado
intermediar esta demanda junto ao Executivo Municipal, lhes foi concedido apenas um abono
salarial.475 O ano de 1962 transcorria sem que os servidores municipais recebessem reajuste salarial
e diante disso, no dia 15 de setembro deste ano, pela primeira vez realizaram uma paralisação para
reivindicar uma melhor remuneração.476 Cabe ressaltar, que a esta altura estes trabalhadores já
estavam melhor organizados, pois já se contava cerca de um ano desde que tinha começado a ser
estruturada a Associação dos Funcionários Municipais de Alagoinhas.477Ademais, o momento
escolhido para realizar esse protesto contra os baixos salários trazia melhores condições para atrair
apoio político. Faltava menos de um mês para acontecer às eleições para a sucessão municipal e do
realinhamento dos partidos que se processou poderia se tirar proveito. Nessa oportunidade a UDN e
o PTN estavam apoiando a candidatura do principal opositor ao representante governista à sucessão
municipal. Diante disso, o que se viu foi que com celeridade se buscou atender à demanda
apresentada pelos servidores municipais. A paralisação que durou apenas algumas horas do sábado,
foi suficiente para que na segunda-feira seguinte o Executivo Municipal encaminhasse à Câmara de
Vereadores uma proposta de abono de emergência para os referidos servidores, a qual foi
aprovada.478 Porém, mais adiante, houve retaliações e alguns trabalhadores foram demitidos.479
As opiniões dos vereadores em torno do episódio da paralisação dos servidores municipais
variaram, entretanto correspondiam ao quadro político que tinha se estabelecido naquele momento
pré-eleitoral. O petebista Hostílio Dias criticando a gestão do Prefeito José Azi, argumentou que
este tinha:

473
APWC. Alagoinhas Jornal, 22.02.1960, p.3 e 5.
474
APWC. Alagoinhas Jornal, 20.05.1960, p.2 e ACMA. Ata de 28.11.1960 da sessão da Câmara de Vereadores de
Alagoinhas.
475
ACMA. Atas de 25.08.1961, 20.10.1961, 24.11.1961 e 04.12.1961 das sessões da Câmara de Vereadores de
Alagoinhas.
476
ACMA. Ata de 17.09.1962 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
477
ACMA. Ata de 06.10.1961 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
478
ACMA. Atas de 17.09.1962, 18.09.1962 e 24.09.1962 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
479
ACMA. Ata de 07.06.1963 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

114
desrespeitado as leis, deixando a cidade sofrer as consequências da sua atitude e o
funcionalismo municipal, já cansado de sofrer e passar fome, tivera que lançar mãos da
medida assumida no sábado 15 do corrente mês; que o sr. Prefeito José Azi, é o Presidente
do monopólio da carne verde e que fez propaganda e alardeia que demitirá funcionários
porque tiveram de protestar por não suportarem as consequências do minguado ordenado
que percebem.480

O representante da UDN, Luiz Rabelo, comentou que a paralisação dos servidores municipais
era fruto do cansaço destes trabalhadores em “arcar com o peso do alto padrão de vida e a falta de
remuneração condizente para enfrentá-lo.”481 Alegou ainda que havia por parte do Prefeito “má
vontade” em conceder aumento nos vencimentos das auxiliares de ensino.482 João Ramos (PTN),
que ao longo da legislatura demonstrou uma ambiguidade em sua atuação, ora assumindo que
exercia oposição ao governo do Prefeito José Azi, ora demonstrando cordialidade e apoio a este
mesmo governo, também saiu em defesa da iniciativa tomada pelos servidores do município,
considerando que foram “premidos pelas suas necessidades” que estes resolveram suspender as
suas atividades.483 João Ramos também comentou, ao se dirigir para Murilo Cavalcanti, advogado,
Deputado Estadual pelo PSD e candidato do bloco governista à sucessão do Executivo Municipal,
que este era “acostumado a dar o seu apoio a todas as greves dos ferroviários,” mas não se fez
presente junto aos servidores municipais naquele momento para “confortá-los e animá-los com a
sua palavra de esperança futura.”484
Diferente desta postura em apoio à paralisação de setembro de 1962 dos servidores
municipais foi a de Romualdo Campos, Vereador governista, que na ocasião minimizou as
responsabilidades do Executivo Municipal quanto aos baixos salários desses trabalhadores.
Argumentava Romualdo Campos que “esse fenômeno se registra em todo o estado e em parte é
justificado pela crise que atravessamos.”485 Alegou ainda que defendia a greve como método de
protesto, todavia exortou aos servidores municipais para que suas ações não permitissem a
intervenção de terceiros ou servissem a fins eleitorais, sem em momento algum demonstrar
solidariedade a esta categoria como fizera com os ferroviários e os bancários, em outra
oportunidade.486 Quanto a José de Araujo Batista, Vereador também da bancada governista que no
Legislativo Municipal demonstrou o seu apoiou às greves dos ferroviários e dos bancários, no início
da década de 1960, manteve-se em silêncio com relação a essa situação dos servidores municipais.

480
ACMA. Ata de 17.09.1962 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
481
Idem.
482
ACMA. Ata de 24.09.1962 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
483
Idem.
484
ACMA. Ata de 17.09.1962 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
485
ACMA. Ata de 18.09.1962 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
486
Idem.

115
Com isso, o que fica demonstrado é o constrangimento que estes dois vereadores, os quais
possuíam entre os trabalhadores o seu principal eleitorado, ficavam submetidos ao compor a
bancada governista, agindo em defesa do Executivo Municipal e sendo seu porta-voz na Câmara de
Vereadores.487 Ao mesmo tempo, o fato de estarem alinhados com forças políticas da situação no
município permitia tirar proveito dessa condição para alcançarem um despenho eleitoral satisfatório
nas eleições vindouras. Toma sentido essa argumentação quando se constata o insucesso de Hostilio
Dias, Vereador combativo da oposição, na eleição subsequente realizada em outubro de 1962, ao
passo que nota-se o inverso quanto a Romualdo Campos e José de Araujo Batista. O primeiro foi
reeleito Vereador e o segundo se tornou o primeiro Prefeito de Aramari, ex-distrito alagoinhense,
para assumirem os seus mandatos na legislatura que se iniciou em 1963, às vésperas do golpe civil-
militar que instaurou uma ordem ditatorial no Brasil.488

3. Às vésperas do golpe (1963-1964)

Em 1964, o regime constitucional estabelecido desde 1946 foi interrompido, alterando


decisivamente a dinâmica da mediação dos interesses de setores subalternos da sociedade brasileira
na esfera político-institucional. Desse modo, com a implantação do regime ditatorial, sustou-se a
possibilidade de extensão de diretos sociais para trabalhadores urbanos e rurais, representada pelas
Reformas de Base que o governo do Presidente João Goulart pretendia implementar.489 Segundo
Thomas Skidmore, as Reformas de Base acenavam para três questões basicamente: a desobstrução
de entraves no processo de desenvolvimento econômico, por exemplo, com os desdobramentos da
dinamização da produção agrícola advindos da redistribuição da propriedade da terra, ao por em
prática um plano de reforma agrária; a necessidade da divisão mais equitativa do desenvolvimento
econômico alcançado até então; e a alteração no equilíbrio político, através da extensão do direito
de voto aos analfabetos e da intensificação do programa de alfabetização no país, questões que

487
Quando tomaram posse como vereadores, para a legislatura 1959-1962, José de Araujo Batista manifestou o seu
agradecimento especial ao eleitorado de Aramari, distrito de Alagoinhas onde se destacava como principal contingente
populacional os ferroviários. Romualdo Campos, por sua vez, agradeceu a votação por ele recebida, principalmente aos
operários dos curtumes de Alagoinhas, “seus velhos e dedicados companheiros.” Ver: ACMA. Ata de 07.04.1959 da
sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
488
APWC. Alagoinhas Jornal, 21.10.1962, p.2.
489
TOLEDO, Caio Navarro de. 1964: Um golpe contra as reformas e a democracia. In: Revista Brasileira de História.
São Paulo: ANPUH, Vol.24, nº47, 13-28, 2004. p.14-15.

116
poderiam repercutir no processo eleitoral e promover condições para a realização de mudanças
profundas na sociedade brasileira.490
Com a capitulação do Governo João Goulart, Alagoinhas também foi incluída na agenda de
repressão desencadeada pelo novo governo, mesmo quando não se percebia em curso uma
radicalização política consistente nas ruas, no campo, nos quartéis ou nas instâncias político-
institucionais do município, mediante uma “estratégia de confronto”, tal como alude Jorge Ferreira,
frente às forças conservadoras que se opunham às Reformas de Base.491 Estudos pioneiros sobre as
repercussões, em Alagoinhas, do golpe civil-militar de 1964, apontam que eram incipientes
organismos de esquerda na cidade. Por exemplo, o PCB, embora estivesse na ilegalidade, atuava em
Alagoinhas, porém contando com um reduzido número de militantes em seus quadros.492 Diante
disso, quais as razões para que Alagoinhas ocupasse as preocupações do governo golpista, a ponto
de ser mobilizado o seu aparato repressivo para esta cidade?
Para tentar responder a esta pergunta, convém ser retomada, dentre outras questões, a
discussão sobre o Legislativo Municipal e a atuação no seu interior de interlocutores que
representaram interesses dos trabalhadores junto ao Estado. Sobre tais interlocutores, inclusive
pesou a coerção desencadeada imediatamente ao afastamento de João Goulart da Presidência da
República e a implantação de um regime ditatorial no país. Nesse sentido, na legislatura iniciada em
1963, a última sob o regime constitucional em vigor no Brasil desde 1946, ficou evidenciada a
manutenção de um aspecto apresentado na legislatura anterior, isto é, a presença na situação de
vereadores vinculados aos trabalhadores. A bancada da situação nessa legislatura ficou sendo
composta por sete vereadores, quatro eleitos pela Aliança Trabalhista Democrática (ATD) e três
pelo PR. Eleitos através da ATD foram o médico Renato Bittencourt, o comerciante Jefferson Vila
Nova, o funcionário público Milton Ramos, o veterano Vereador e, naquela altura, ex-presidente do

490
SKIDMORE, Thomas. Brasil: de Getúlio a Castelo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. p.289. Além da intervenção
no latifúndio brasileiro, levada a cabo por uma reforma agrária, da extensão do direito de voto aos analfabetos e da
intensificação do programa de alfabetização no país através da reforma educacional, as Reformas de Base previam,
também, a ampliação do direito à habitação, principalmente nas grandes cidades brasileiras, mediante a execução de
uma reforma urbana e a redução da carga tributária que incidia sobre os trabalhadores assalariados e pequenas empresas
nacionais com a reforma fiscal e tributária. DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. Nacionalismo como projeto de
nação: a Frente Parlamentar Nacionalista. In: FERREIRA, Jorge e REIS, Daniel Aarão. Nacionalismo e reformismo
radical 1945-1964. Vol. 2. As esquerdas no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. p.359-360.
491
Sobre a radicalização política da esquerda brasileira, no início da década de 1960, ver: FERREIRA, Jorge. A
estratégia do confronto: a Frente de Mobilização Popular. Revista Brasileira de História. São Paulo: ANPUH, Vol.24,
nº47, 181-212, 2004.
492
Ver: SANTANA, Arleide Farias de. Repressão às portas do agreste baiano: consequências do golpe militar em
Alagoinhas. Monografia de Especialização em História Política. Alagoinhas: Universidade do Estado da Bahia
(UNEB), 2002; SOARES, Ede Ricardo de Assis. O PCB de Alagoinhas e o golpe civil-militar de 31 de março de 1964.
Monografia de Conclusão de Curso – Graduação de Licenciatura em História. Alagoinhas: Universidade do Estado da
Bahia (UNEB), 2010.

117
Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Couros e Peles de Alagoinhas, Romualdo Campos,493 e
José Dias da Silva, cuja condição sócio-econômica não foi identificada. Os representantes do PR
eram o médico Jairo Azi, o ferroviário e presidente da Liga de Assistência Social ao Pobre,
Adolpho Mendes e o presidente da Associação dos Comerciários de Alagoinhas, Edson Oliveira.494
Quanto à bancada oposicionista, esta foi formada por quatro vereadores: Antonio Mutti e Manoel
Otávio, eleitos pela UDN, além dos representantes do PSP, Alvino Neto, e Walter Campos,
cirurgião dentista e proprietário do Alagoinhas Jornal.495
Duas questões cabem ser destacadas acerca do cenário que se apresentou para a legislatura
iniciada em 1963. A primeira questão seria o fato do PTB, partido do Presidente da República em
exercício, João Goulart, não ter eleito nenhum Vereador. E uma segunda questão seria a
fragilização da UDN local, que além de repetir o fraco desempenho da eleição anterior, elegendo
apenas dois vereadores, teve, também, derrotado o candidato que apoiou para o Executivo
Municipal, algo inédito ainda desde 1948. Demonstração dessa fragilização udenista, em
Alagoinhas, já havia sido indicada pelos resultados, no município, das eleições presidenciais de
1955 e de 1960, e reafirmada, em 1962, através das eleições para Prefeito Municipal e Governador
do Estado. Em 1955, como foi visto, recebeu a maioria dos votos Juscelino Kubitschek e João
Goulart, em detrimento dos candidatos udenistas à Presidência e Vice-Presidência da República,
Juarez Távora e Milton Campos, respectivamente.496 Em 1960, Jânio Quadros contabilizou menos
votos do que o General Henrique Teixeira Lott (Ver tabela 9). E em 1962, Waldir Pires, na eleição
para Governador do Estado, foi mais votado que Lomanto Júnior, candidato que foi eleito
recebendo o apoio da UDN.497 Refletindo esta tendência, em 1962, foi eleito Prefeito de Alagoinhas

493
Em 1962, era João Minervino que ocupava o cargo de presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de
Couros e Peles em Alagoinhas. Ver: APWC: Alagoinhas Jornal, 23.09.1962, p.1.
494
Ao que tudo indica a Aliança Trabalhista Democrática (ATD) foi formada a partir da coligação entre o PSD e PTN,
que ao lado do PR compuseram a representação governista no Legislativo Municipal entre 1963 e 1964. Ver: ACMA.
Ata de 15.12.1964 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
495
ACMA. Ata de 19.04.1963 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
496
João Goulart recebeu uma votação superior a de Juscelino Kubitschek e os totais individuais destes candidatos
superaram a soma de votos dos candidatos udenistas Juarez Távora e Milton Campos. Sobre os resultados da eleição
presidencial de 1955 em Alagoinhas, ver Tabela 08.
497
Lomanto Júnior foi candidato por uma coalizão que reunia partidos rivais no plano nacional, no caso o PTB e a
UDN. Fazia parte também desta coalizão o PL, o PR e o PRP. Entretanto, naquele momento, na Bahia, era o PSD,
partido de Waldir Pires, que demonstrava uma inclinação à esquerda, compondo uma aliança com o PDC, o PTN e o
PSP, além de contar com o apoio do PCB. Ver: DANTAS NETO, Paulo Fábio. Tradição, autocracia e carisma: a
política de Antônio Carlos Magalhães na modernização da Bahia (1954 – 1974). Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006.
p.162-163.

118
Murilo Cavalcanti (PSD).498 Desse modo, fica evidente a vantagem das forças políticas que se
apoiavam na herança do getulismo nos pleitos realizados em Alagoinhas.

Tabela 9 - Resultado da eleição presidencial de 1960 em Alagoinhas


Presidente Totais Vice-Presidente Totais
Henrique Lott 4.313 João Goulart 4.056
Jânio Quadros 2.826 Milton Campos 2.468
Adhemar de Barros 704 Fernando Ferrari 1.163
Brancos 326 Brancos 552
Nulos 379 Nulos 309
Fonte: Alagoinhas Jornal, 07.10.1960, p.5.

Parte do mencionado enfraquecimento eleitoral da UDN, percebido em Alagoinhas, convém


atribuir a migração de membros do seu seio para outras organizações partidárias, algo que se
processou desde a segunda metade da década de 1950.499 Fica demonstrado também uma relação
negativa da UDN com o processo de urbanização que se intensificou em Alagoinhas na metade do
século XX, momento em que passou a ser salientado o protagonismo dos trabalhadores urbanos no
processo eleitoral.500 A saída de representantes da UDN para outras siglas partidárias, a exemplo do
PTN, pode refletir a divisão interna que predominou nas hostes udenistas na Bahia, mas
possivelmente a tentativa de redimensionamento político de alguns de seus membros ante a
intensificação do processo de urbanização em Alagoinhas.
Retomando sobre essa última legislatura que antecedeu ao golpe de 1964, tomou posse como
Prefeito de Alagoinhas, em abril de 1963, o advogado e ex-Deputado Estadual pelo PSD, Murilo
Cavalcanti, o qual desfrutava de uma aproximação com os ferroviários e os operários da Petrobrás,
em função de ter prestado serviços a estas categorias profissionais.501 Segundo o Alagoinhas Jornal,
periódico que era opositor da candidatura de Murilo Cavalcanti, este para concorrer à chefia do

498
APWC. Alagoinhas Jornal, 21.10.1962, p. 1 e 4.
499
Em 1956, Armando Leal anunciou a sua ruptura com o diretório local da UDN e em 1958 disputou a eleição para
Vereador pelo PSB. Nesta mesma eleição, os ex-udenistas Horácio Dantas, Milton Leite, José Olimpio de Azevedo
Neto e Álvaro Leal candidataram-se pelo PTN, partido que em Alagoinhas era liderado pelo também ex-udenista
Josaphat Azevedo. Ver: APJR. O Nordeste, 18.03.1956, p.5; APWC. Alagoinhas Jornal, 29.10.1958, p.1 e 07.10.1960,
p.5.
500
Há referência de que foram os ferroviários e os trabalhadores em curtumes os principais responsáveis pela expressiva
votação recebida, em Alagoinhas, por Juscelino Kubitschek e João Goulart na eleição presidencial de 1955. Ver:
ACMA. Ata de 14.10.1955 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas. Em 1961, mencionava-se que os
ferroviários, curtumeiros, bancários, comerciários e professores apresentariam representantes do seu seio para a disputa
eleitoral no município que aconteceria no ano seguinte. Ver: APWC. Alagoinhas Jornal, 07.06.1961, p.1. Também em
1961 sugeria-se a importância dos votos dos trabalhadores da ferrovia, dos curtumes e da Petrobrás, para a decisão
eleitoral em Alagoinhas. Ver: APWC. Alagoinhas Jornal, 07.06.1961, p.1.
501
ACMA. Atas de 05.06.1959 e 10.05.1963 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas; SANTANA, Arleide
Farias de, op. cit., p.13.

119
Executivo Municipal contou com o apoio do grupo político liderado pelo então Prefeito José Azi e
se aliou “de corpo e alma aos comunistas, além de se comprometer com grupos econômicos locais
que desejariam gordas compensações da municipalidade se eleito ele fosse.”502
É difícil identificar com precisão a composição de forças que apoiaram a candidatura de
Murilo Cavalcanti para Prefeito na eleição de 1962. Em muito a afirmação veiculada pelo
Alagoinhas Jornal, buscava desestabilizar esta candidatura, uma vez que o referido periódico
defendia o nome de Antonio Valverde, candidato da coligação PSP-UDN-PRP-PTN e principal
oponente de Murilo Cavalcanti.503 Mas é plausível o entendimento de que a candidatura de Murilo
Cavalcanti se equilibrou em uma composição de forças políticas que estavam vinculadas a uma base
eleitoral heterogênea, do ponto de vista social, político e econômico. É possível esta compreensão
quando levamos em conta a distinção do perfil sócio-econômico das entidades que receberam
subvenções, oriundas de emendas do Orçamento estadual, propostas por Murilo Cavalcanti, quando
exercia o mandato de Deputado Estadual, em 1961.504 Ou mesmo quando é notada distinção
semelhante nos perfis dos vereadores que lhe deram sustentação quando assumiu o cargo de
Prefeito, em Alagoinhas, como já foi acima aludido.
Em 1963 tomaram posse, também, os vereadores eleitos no município. Notou-se ao longo
desse ano o predomínio do consenso entre situação e oposição, demonstrando o arrefecimento da
tensão política que teve lugar durante o momento pré-eleitoral.505 É representativo a esse respeito o
depoimento do governista Romualdo Campos e de Taciano Cordeiro, Vereador do bloco de
oposição que tinha assumido como suplente pela UDN a cadeira de Manoel Otávio, ao se
despedirem dos trabalhos legislativos do ano de 1963. O primeiro comentou sobre “a harmonia”
que havia “reinado nesta Câmara entre todas as bancadas, ao ponto de muitas vezes não se saber se

502
APWC. Alagoinhas Jornal, 16.07.1962, p.1 e Alagoinhas Jornal, 23.09.1962, p.1.
503
APWC. Alagoinhas Jornal, 15.08.1962, p.1.
504
Havia entidades ligadas aos trabalhadores, assim como a setores mais abastados da sociedade alagoinhense entre as
que foram contempladas, em 1961, com subvenções do Orçamento estadual, a partir da indicação do então Deputado
Estadual Murilo Cavalcanti. Correspondia ao primeiro caso o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Couros e
Peles de Alagoinhas e a Associação Lauro de Freitas, esta vinculada aos ferroviários. E ao segundo caso a Associação
Cultural e Recreativa de Alagoinhas (ACRA) e o Alagoinhas Tênis Clube. Ver: APWC. Alagoinhas Jornal, 06.05.1961,
p. 2.
505
Em julho de 1962, o Alagoinhas Jornal noticiou o desfecho de um litígio judicial entre Nilton Maia, liderança da
UDN local e Murilo Cavalcanti, concluindo que “felizes os homens que, de cabeça fria, compreendem que as lutas
eleitorais, numa democracia são jornadas cívicas e que por mais divergentes que sejam as suas idéias, podem discutí-las
como cavalheiros em busca de um denominador comum”. Consta, também, no trabalho de Ede Soares, o depoimento de
Erisvaldo Trindade Mota, militante comunista no início da década de 1960 em Alagoinhas, de que Nilton Maia buscou
impugnar a candidatura a Prefeito de Murilo Cavalcanti, alegando que este pertencia ao Partido Comunista. Ver
respectivamente: APWC. Alagoinhas Jornal, 16.07.1962, p.1 e SOARES, Ede Ricardo de Assis. op. cit., p.29-30.

120
existe bancada oposicionista.”506 E o segundo, replicou em tom semelhante, afirmando que “a
bancada da minoria a que pertence não descobriu o menor ponto de prepotência manifestada pela
bancada da maioria.”507
A mediação, no Legislativo Municipal, de benefícios voltados para os trabalhadores,
continuou se processando, principalmente através de vereadores que faziam parte da bancada da
situação como Romualdo Campos, Adolpho Mendes, e Edson Oliveira. Desse modo, Romualdo
Campos, durante o ano de 1963, propôs a implantação da Semana Inglesa no comércio local, uma
vez que o projeto de lei que versava sobre este assunto em 1955 não foi sancionado pelo Prefeito.508
Também apresentou denúncias quanto ao descumprimento da legislação trabalhista no comércio de
Alagoinhas, alegando que havia trabalhadores deste setor, que enfrentavam jornadas de trabalho de
12 a 14 horas.509 Segundo Romualdo Campos essas suas intervenções provocavam a insatisfação de
comerciantes para com ele, o que foi confirmado pelo Vereador Antonio Mutti.510 Ainda no ano de
1963, Romualdo Campos apresentou projeto de lei, o qual foi aprovado, concedendo um subsidio,
no valor de 150 mil cruzeiros, para o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Couros e Peles de
Alagoinhas concluir as obras da sua sede.511
Quanto ao debate que se desenvolvia no país em torno das Reformas de Base, propostas pelo
Governo João Goulart, em 1963, Romualdo Campos se posicionou favorável a estas reformas,
sugerindo, em maio do referido ano, que por meio de uma indicação, fosse levado ao conhecimento
do Presidente da República o seu apoio e dos seus pares no Legislativo Municipal. Defendendo, em
especial a reforma agrária, Romualdo Campos, ressaltava a solidariedade do conjunto de vereadores
às Reformas de Base, ao comentar que o Presidente da República e a Nação “ficariam sabendo que
o povo de Alagoinhas, através dos seus representantes, vinha de dar o integral apoio às Reformas de
Base que se constitui no momento como uma esperança para a salvação da nossa situação social e
econômica.”512 Essa indicação proposta por Romualdo Campos foi subscrita por todos os
vereadores naquele momento, porém isto não traduz plenamente o grau de solidariedade de cada um
deles às Reformas de Base. Enquanto o Vereador governista e ferroviário Adolpho Mendes (PR)
assumindo um tom semelhante ao de Romualdo Campos declarara que era “incondicionalmente a
favor” das Reformas de Base, o seu colega de bancada, Jairo Azi (PR), demonstrava algumas

506
ACMA. Ata de 07.12.1963 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
507
Idem.
508
ACMA. Ata de 15.04.1963 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
509
ACMA. Ata de 23.04.1963 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
510
ACMA. Ata de 23.07.1963 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
511
ACMA. Atas de 05.11.1963, 19.11.1963 e 26.12.1963 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
512
ACMA. Ata de 21.05.1963 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

121
objeções, sobretudo com relação à reforma agrária.513 Por sua vez, o Vereador Edson Oliveira (PR),
que representou interesses dos comerciários, categoria que presidia a sua Associação,514 demonstrou
sintonia para com o governo João Goulart recomendando para que a diretoria da Câmara, em
janeiro de 1964, telegrafasse parabenizando-o “pelo seu gesto de coragem, sancionando a Lei de
Remessas de Lucros.”515
Essa atuação, dos vereadores acima destacados, como interlocutores dos trabalhadores, ao
lado do posicionamento que adotaram no plano político nacional, em apoio ao governo João
Goulart, contribuiu para que sofressem os efeitos da repressão desencadeada no país, após a
deposição do citado Presidente. Pois, tal posicionamento, na medida em que a repressão política se
abateu sobre o país, dava margem, para que estes e outros interlocutores dos trabalhadores –
vereadores em exercício e ex-vereadores - fossem alvos das acusações de serem “agitadores”,
“subversivos”, “comunistas”. Acusações que partiam, por vezes, de desafetos construídos na arena
política local. A disposição solidária ao Governo João Goulart que existia na ambiência político-
institucional em Alagoinhas, não foi o fator mais importante, mas ao lado de outros contribuiu para
atrair o deslocamento de uma Junta Militar para esta cidade, em maio de 1964. Tal Junta Militar
levou a cabo um processo de averiguação sobre a existência de núcleos “subversivos” no município,
realizando detenções e interrogatórios de trabalhadores, estudantes e autoridades, estando entre
estes, principalmente os que demonstraram vinculações com segmentos subalternos da sociedade
local ou com as forças políticas herdeiras do getulismo, representadas na aliança PSD/PTB.
No estudo realizado por Arleide Santana acerca das repercussões do Golpe de 1964 em
Alagoinhas, consta o depoimento de Antonio Bião Martins, então Capitão do Exército, que
justificou a preocupação dos militares, naquela conjuntura, para com esta cidade, devido a fama que
ela possuía de “cidade vermelha,” em função da suposta penetração de idéias comunistas que havia,
sobretudo entre os ferroviários. Reconhecia este militar que era pequeno o número de militantes
comunistas na cidade, porém atestava que era significativa a sua capacidade de influência. 516 De
fato era diminuto o número de militantes comunistas em Alagoinhas, quando levamos em
513
Idem.
514
Trata-se do projeto de lei que autorizava a Prefeitura Municipal conceder uma faixa de terra para a construção da
sede da Associação dos Empregados no Comércio de Alagoinhas. Posteriormente foi aprovada no Legislativo
Municipal a subvenção no valor de 500 mil cruzeiros, proposta pela Comissão de Orçamento e Finanças, para a
construção da referida sede. Ver: ACMA. Atas de 12.11.1963 e 26.12.1963 das sessões da Câmara de Vereadores de
Alagoinhas.
515
ACMA. Ata de 23.01.1964 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas. A Lei de Remessas de Lucros
consistia na normatização dos lucros oriundos do capital estrangeiro no país, estipulando o cômputo destes lucros que
deveriam ser destinados a reinvestimentos no Brasil e não enviados para o exterior. Esta Lei sofreu a contestação de
investidores estrangeiros e do governo dos Estados Unidos. Ver: SKIDMORE, Thomas, op. cit., p. 329.
516
SANTANA, op. cit., p.41.

122
consideração o depoimento de Erisvaldo Trindade Mota, ex-militante comunista, cedido à pesquisa
de Ede Soares sobre a atuação do PCB alagoinhense entre 1958 e 1964. Segundo este depoimento, o
PCB local reunia cerca de 8 a 10 membros, mas que teve superestimado o seu poder de influência
naquele período.517
Fica evidenciado que era incipiente o movimento comunista em Alagoinhas às vésperas do
Golpe de 1964. Em seu estudo, Soares identificou em seu trabalho os nomes de oito militantes do
PCB em Alagoinhas entre os anos de 1958 e 1964: Eliseu Mendes (Lilio Alfaiate), Mário Alves
(Mário Borracheiro), Maura Cardoso e Esmeraldino Canízio Carvalho. Além dos funcionários da
agência local do Banco do Brasil, Humberto Archibaldo Campbell, Erisvaldo Trindade Mota
(Quarentinha), Aurélio Pereira de Souza e o Sargento da Policia Militar, Otoniel Lira Gomes.518
Sobre eles incidiu a coerção que veio na esteira do Golpe de 1964.519 No entanto, esta coerção, em
Alagoinhas, não se limitou apenas ao movimento comunista como já foi indicado brevemente.
Foram detidos os vereadores Romualdo Campos, Adolpho Mendes, Edson Oliveira, Jairo Azi e o
Prefeito Murilo Cavalcanti, além dos ex-vereadores Hostílio Dias e Hildebrando Dias, lideranças
operárias e estudantis. Estas detenções foram motivadas por acusações do desenvolvimento de
atividades “subversivas”, acusações que em grande medida partiam de adversários políticos ou
atendiam ao propósito de averiguação da posição ideológica de alguns indivíduos e das entidades a
que pertenciam.520
Romualdo Campos, durante a década de 1950, presidiu o Sindicato dos Trabalhadores na
Indústria de Couros e Peles de Alagoinhas e em 1964 exercia o quarto mandato consecutivo como
Vereador em Alagoinhas. Como foi mencionado, por intermédio da sua atuação neste cargo, tornou
público o desrespeito à legislação trabalhista em Alagoinhas, sobretudo pelos proprietários de
curtumes e os comerciantes. Por adotar essa postura, foi algumas vezes apontado como militante
comunista, fato por ele negado. Em 1960, durante a campanha para a eleição presidencial,
coordenou o comitê local da candidatura do General Henrique Teixeira Lott, candidato à
Presidência da República pela coligação PSD-PTB.521 E em 1963, manifestou o seu apoio às
Reformas de Base apresentadas pelo Governo João Goulart. Certamente, esses elementos da sua
trajetória política contribuíram para sua detenção a fim de prestar esclarecimentos com o advento do

517
SOARES, op. cit., p.67.
518
Idem, p.27-27, 32-35 e 72.
519
Idem, p.68-72.
520
SANTANA, op. cit., p.15,21 e 38.
521
ACMA. Ata de 23.05.1960 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

123
golpe civil-militar de 1964.522 Provavelmente, foi prevendo esse desdobramento, que, em 18 de
abril de 1964, declarou através da tribuna da Câmara “a sua atitude de repúdio ao credo
bolchevista”, com o objetivo de se precaver do que poderia acontecer naquele contexto em que
reconhecia que “alguns políticos estão a pensar que o momento é propício para vinganças
pessoais.”523
Adolpho Mendes era ferroviário e no Legislativo Municipal em 1963 apoiou o movimento
grevista que se esboçava entre a categoria a que pertencia, assim como as Reformas de Base.524 Mas
certamente, também pesou para a sua detenção e, posteriormente, a cassação do seu mandato de
Vereador a sua participação em algumas reuniões do PCB em Alagoinhas.525
Edson Oliveira, como foi dito anteriormente, além de ter hipotecado o seu apoio ao Presidente
João Goulart por ter sancionado a Lei de Remessas de Lucros, presidia a Associação dos
Empregados no Comércio de Alagoinhas, entidade que, a exemplo de outras que eram atreladas aos
trabalhadores e aos estudantes, em Alagoinhas, se buscou investigar sobre o perfil político-
ideológico das suas lideranças.526 Cabe ressaltar que vários trabalhadores e estudantes foram presos,
em Alagoinhas, logo após o golpe deflagrado em 31 de março de 1964, por participarem de uma
manifestação em apoio ao Presidente da República deposto.527
Jairo Azi, apesar das suas ressalvas em 1963, manifestou o seu apoio às Reformas de Base. Se
esta posição lhe rendeu a detenção para prestar interrogatório, não é possível afirmar ao certo.
Todavia, Jairo Azi, assim como a maioria dos seus pares, teve preservado o seu mandato,
colaborando para a adequação do Legislativo Municipal aos ditames que foram imposto pelo novo
regime e desfazendo possíveis suspeitas de serem solidários aos rumos que estavam sendo tomados
no país durante o governo João Goulart.528 Assim, se outrora o Legislativo Municipal de
Alagoinhas aprovou documentos que demonstravam apoio ao governo João Goulart, a partir de

522
ACMA. Ata de 14.07.1964 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
523
ACMA. Ata de 18.04.1964 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
524
ACMA. Atas de 10.05.1963 e 21.05.1963 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
525
SOARES, op. cit., p.57-58.
526
SANTANA, op. cit., p.15 e 21.
527
Idem, p.38.
528
São exemplo da sujeição do Legislativo Municipal de Alagoinhas aos ditames da ordem autoritária instituída no
país, em 1964, a cassação dos mandatos do Vereador Adolpho Mendes (PR) e dos suplentes de vereadores Otoniel Lira
Gomes (UDN) e Esmeraldino Canízio Carvalho (PR), a partir da alegação de que estes possuíam envolvimento com o
movimento comunista, assim como a composição de uma comissão, conforme definia o Ato Institucional, para realizar
uma rigorosa investigação “sobre a conduta atual e pregressa dos funcionários da Câmara e da Prefeitura e se algum
tem, por ventura, ligações com as idéias subversivas.” Esta comissão foi composta pelos vereadores Jefferson Vila
Nova, Romualdo Campos e Edson Oliveira, sendo presidida pelo primeiro deles. Outra comissão foi formada para que
fosse ajustado o Regimento Interno ao que prescrevia o Ato Institucional. Ver respectivamente: ACMA. Atas de
07.04.1964, 18.04.1964 e 28.04.1964 das sessões da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

124
abril de 1964 fazia o mesmo para os protagonistas do golpe que alijou este do Poder. Esta atitude,
em sinalizar que não havia no Legislativo Municipal de Alagoinhas a disposição de se opor ao novo
regime, pode representar a tentativa empenhada por parte dos vereadores de fugir da repressão que
tinha sido deflagrada no país naquele momento, como também um gesto de pragmatismo político ao
aderir às forças políticas que passaram a ocupar o governo.529 É representativo desta postura o
discurso do Vereador Jairo Azi quando assumiu a Presidência da Câmara em 7 de abril de 1964:

Sinto-me com redobrada responsabilidade diante da hora presente quando o país redimido,
enaltecido e forte segue a sua trilha democrática e cristã no caminho da sua glória,
amparado, guarnecido pelo heroísmo das Forças Armadas. Temos estado alarmados e até
surpresos com os volumes de subversão e conspiração que nestes dias tem se descoberto,
tem se desalojado do país que atentava com plenos próximos para a derrubada do regime
democrático e escravização do Brasil.530

Em seguida atenuava a sua manifestação de apoio às Reformas de Base, talvez uma das
motivações da sua detenção para interrogatório:

Constam nos anais desta casa as minhas afirmativas proferidas aqui quando se pleiteava a
alguns meses, moção em favor das Reformas de Base; e eu dizia que se Reformas de Base
eram necessárias, eram justas, mas que antes delas deviam fazer primeiro as reformas dos
valores políticos, as reformas das intenções, a reforma dos homens que dirigem altos postos
administrativos e políticos da pátria.531

Quanto ao Prefeito Murilo Cavalcanti, advogado que tinha atuado junto aos ferroviários e
trabalhadores da Petrobrás, foi o candidato do PSD a sucessão municipal em 1962 quando se
comentava que neste partido havia uma disposição de desviá-lo “da sua norma de partido
conservador transformando-o em partido de luta popular.”532 Na campanha da eleição presidencial
de 1960, alegando “ser um moço pobre” e que não fazia parte de “negociatas” se manifestou
publicamente em apoio a chapa que trazia o General Henrique Teixeira Lott e João Goulart, ao
passo que não poupava de criticas representantes dos diretórios local e estadual da UDN.533 A
detenção de Murilo Cavalcanti para interrogatório em 1964, provavelmente foi motivada por esse
seu flerte com as correntes herdeiras do getulismo e que o seu partido, PSD, em nível estadual se
associava. Após essa detenção Murilo Cavalcanti reassumiu o cargo de Prefeito e seguiu carreira
529
Ver sobre as moções aprovadas congratulando o Marechal Castelo Branco e o Governador de Minas Gerais
Magalhães Pinto em: ACMA. Ata de 07.04.1964 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
530
Idem.
531
Idem.
532
APWC. Alagoinhas Jornal, 07.06.1961, p.1.
533
João Goulart realizou comício em Alagoinhas durante esta campanha eleitoral e Murilo Cavalcanti ao lado de Waldir
Pires, candidato ao governo estadual, discursaram na oportunidade. Ver: APWC. Alagoinhas Jornal,19.09.1960, p.1.

125
política por partidos que reunia setores que apoiaram o regime ditatorial, como a Aliança
Renovadora Nacional (ARENA) e o Partido Democrático Social (PDS).534
Sobre os ex-vereadores Hildebrando Dias e Hostílo Dias, cabe lembrar que quando estiveram
exercendo o mandato de Vereador por diversas vezes atuaram como interlocutores dos
trabalhadores, sendo subjacente a esta postura o tensionamento com setores conservadores da
política local. Na campanha para a eleição presidencial de 1955, se empenharam em favor da
aliança PSD-PTB que trazia Juscelino Kubitschek como candidato à Presidente e João Goulart
como candidato à Vice-Presidente. É conveniente supor que estes elementos contaram para que
fossem detidos pelos militares em 1964.535
Hostilio Dias, em 1964, era presidente do diretório do PTB local e foi submetido a prisão por
quatro vezes durante esse ano. Segundo Arleide Santana, o que influenciou essas sucessivas
detenções “foram as acusações de agitador, subversivo, além das rixas entre grupos políticos locais,
pois havia pessoas que se aproveitaram do momento para vinganças particulares ou afastamento de
pessoas fortes do cenário político local.”536 Um ensaio deste processo teve lugar no ano de 1961,
diante da crise política que se apresentou no país com a renúncia de Jânio Quadros da Presidência
da República. Nesta ocasião, segundo o Vereador José de Araujo Batista, Hostílio Dias sofreu
ameaça de prisão sem que os seus pares no Legislativo Municipal fizessem nada em seu favor.
Hostílio Dias confirmou esta denúncia alegando que localmente a UDN e o Delegado Osvaldo
Matos537 adotaram atitudes hostis contra quem defendia a manutenção da legalidade e a,
consequente, posse de João Goulart, uma vez que o titular do cargo de Presidente da República
tinha renunciado.538 Hostilio Dias ainda afirmou que o referido Delegado “ostensivamente

534
Murilo Cavalcanti voltou a ser Prefeito de Alagoinhas entre 1971-1973 e 1992-1996, não sendo identificada qual foi
a legenda partidária que pertencia quando exerceu esses mandatos. Foi eleito Deputado Estadual pela Aliança
Renovadora Nacional (ARENA), consecutivamente para as legislaturas de 1975-1979 e 1979-1983. Com o retorno do
pluripartidarismo na década de 1980 foi reeleito Deputado Estadual pelo Partido Democrático Social (PDS). Ver:
http://www.al.ba.gov.br/v2/biografia.cfm?varCodigo=258 (site consultado em 16.11.2010).
535
SANTANA, op. cit., p. 23 e 40.
536
Idem, p.40.
537
Osvaldo Matos era Oficial da Polícia Militar e membro do PSD. Em 1964, exercendo o mandato de Vereador em
Alagoinhas, discursou na tribuna da Câmara comentando que o golpe que retirou João Goulart do poder, o qual ele
designou por “revolução”, foi protagonizado por “esses brasileiros abnegados [que] não mediram sacrifícios para
arrancarem o Brasil do caos em que se achava”. Ver: ACMA. Ata de 19.06.1964 da sessão da Câmara de Vereadores de
Alagoinhas.
538
A renúncia de Jânio Quadros do cargo de Presidente da República aconteceu em um momento que o Vice-Presidente
da República, João Goulart, estava em viagem no exterior. Diante disso, assumiu a Presidência da República, Ranieri
Mazzilli, Presidente da Câmara dos Deputados que vinculado a setores civis e militares conservadores defendeu a
inconveniência do retorno de João Goulart ao Brasil. Ficava sinalizado o veto à posse de João Goulart e a ameaça de um
golpe de Estado. Nesse contexto, se desenvolveu uma significativa mobilização envolvendo diversos segmentos da
sociedade brasileira (trabalhadores, estudantes, representantes políticos e militares) que saíram em defesa da ordem
constitucional e, por conseguinte, da posse de João Goulart. Este quadro de instabilidade foi contornado, somente com a

126
procurava se informar do [seu] paradeiro, para prendê-lo” e por esta razão “procurou se afastar um
pouco, no entanto estava constantemente em contato com seus companheiros, mormente
ferroviários; que a sua retirada foi apenas estratégica, pois nada receava e teria grande honra em ser
preso naquela oportunidade.”539
Às vésperas do golpe de 1964 não havia em Alagoinhas uma presença consistente de uma
esquerda radical. Não se desenvolveu, seja no interior do Legislativo Municipal ou mesmo através
da imprensa local a elevação do tom em torno da defesa das Reformas de Base naquele momento. A
defesa em prol das Reformas de Base aconteceu, mas quando isto ocorreu se deu de uma maneira
moderada. Todavia, Alagoinhas entrou na rota da repressão política deflagrada no Brasil, após a
queda de João Goulart e a instauração do regime ditatorial. Em grande medida, as razões que
promoveram estas circunstâncias derivaram do fato de Alagoinhas ter se constituído como uma
importante base eleitoral para as forças políticas que se apoiavam no espólio getulista, o que ficou
expresso na eleição presidencial de 1955 e 1960, como foi visto. Saliente-se que a partir da década
de 1940 tinha se intensificado o processo de urbanização em Alagoinhas, conforme foi observado
no primeiro capítulo, tornando-se cada vez maior o contingente de trabalhadores urbanos que se
organizaram em maior ou menor intensidade e passaram a representar uma peça importante no jogo
eleitoral.540 Além disso, no Legislativo Municipal desde a sua reabertura em 1948 obtiveram
assentos vereadores que atuaram como interlocutores dos interesses dos trabalhadores, quando
também ficava expressado pelos resultados eleitorais um gradual enfraquecimento de setores
conservadores, representados principalmente pela UDN. Este conjunto de elementos promovia
indícios para que as forças reacionárias suspeitassem sobre a “infiltração comunista” em Alagoinhas
ou que nesta cidade se apresentasse um movimento firme de resistência a deposição de João Goulart
em 1964.
O golpe de 1964 propiciou a suspensão de uma democracia ainda limitada vigente no Brasil
desde 1946, mas que promovia margens para a mediação de interesses dos trabalhadores no âmbito

aprovação de uma emenda constitucional que instituiu o parlamentarismo no Brasil, permitindo que João Goulart
assumisse a Presidência da República, todavia, com limitação dos seus poderes. Ver: FERREIRA, Jorge. Crises da
República: 1954-1955 e 1961, op. cit., p.326-336.
539
ACMA. Ata de 15.09.1961 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.
540
No final da década de 1950 identificavam-se as seguintes entidades vinculadas aos trabalhadores em Alagoinhas:
Associação Ferroviária de Alagoinhas, Associação Lauro Farani Pedreira de Freitas, Círculo Operário de Alagoinhas,
Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Couros e Peles em Alagoinhas, Associação dos Trabalhadores na Indústria
de Panificação da Cidade de Alagoinhas, a Associação dos Empregados no Comércio de Alagoinhas, o Sindicato dos
Trabalhadores na Indústria da Construção Civil de Alagoinhas, a União Baiana dos Servidores Públicos Civis (seção
Alagoinhas) e a Sociedade Unificada do Professorado Primário Estadual (sucursal de Alagoinhas). Ver: Enciclopédia
dos municípios brasileiros. IBGE, volume XX. Rio de Janeiro, 1958. p.24.

127
político-institucional. O êxito desse golpe gerou um panorama político conturbado no Brasil de
brutal perseguição ideológica, desarticulando organizações políticas vinculadas à esquerda e
obstruindo a extensão de direitos sociais, a distribuição da renda e do poder que aspiravam
trabalhadores urbanos e rurais.
Em Alagoinhas, desde a queda do Estado Novo e a emergência de uma democracia
representativa que vigorou até 1964, se viu uma progressiva ampliação do protagonismo dos
trabalhadores no processo eleitoral e na participação em instâncias decisórias no plano político
municipal, como a Câmara de Vereadores. No interior desse órgão legislativo, em particular, se
percebeu ao longo desse período a presença de vereadores que atuaram como interlocutores de
demandas dos trabalhadores, processo que o golpe de 1964 inibiu o avanço ou a sua retomada com
maior intensidade, tal como se conduzia entre os anos de 1955 e 1956, através da Frente Popular
Democrática. Vale dizer, que no ano de 1964, após o advento do referido golpe, praticamente
desapareceu da pauta do Legislativo Municipal em Alagoinhas a representação de interesses ligados
aos trabalhadores. A reação do Vereador Edson Oliveira em setembro de 1964, alegando que não
conhecia nenhum dos signatários do abaixo-assinado que lhe foi dirigido solicitando a extensão do
serviço de iluminação para a Rua São José, pode indicar o constrangimento que se estabeleceu para
a mediação de reivindicações da população no interior do Legislativo Municipal naquele momento
em que o país já viva submetido a um regime autoritário.541

541
ACMA. Ata de 29.09.1964 da sessão da Câmara de Vereadores de Alagoinhas.

128
Considerações Finais

Alagoinhas, entre 1940 e 1960, experimentou um significativo processo de crescimento


populacional. Enquanto isso, a ocupação do setor urbano se ampliava. Apesar de nesse período
Alagoinhas figurar em uma posição de centralidade com relação aos municípios situados no seu
entorno, por desfrutar de algumas funções urbanas que eram frágeis nestes, não significava que isto
repercutisse em uma distribuição social da riqueza, privando grande parte da sua população de
melhores condições de vida. Este duplo processo de expansão demográfica e urbana não foi
acompanhado por ações compatíveis do poder público, no que concerne à dotação de infra-estrutura
urbana de bairros operários ou mesmo no oferecimento de serviços públicos nas áreas de saúde e
educação.
Nesse contexto, particularmente a partir do final da década de 1940, com o retorno das
eleições diretas no Brasil após a queda da ditadura do Estado Novo, ocorreu em Alagoinhas o
ingresso no Legislativo Municipal de vereadores através dos quais os interesses de trabalhadores
passaram a frequentar a pauta da política local. Ao que tudo indica, os trabalhadores, em
Alagoinhas, representavam um contingente eleitoral expressivo nesse momento que estava em curso
um processo de desenvolvimento urbano. Saiu do seio de determinadas categorias profissionais,
especialmente ferroviários, operários dos curtumes e comerciários, parte desses vereadores que
atuaram como interlocutores de demandas operárias.
Nesse período, no Brasil, se processou um aumento da participação política de setores sociais
empobrecidos, dentro do quadro de possibilidades que se apresentava com a retomada de uma
democracia representativa. Em Alagoinhas, a mobilização de vereadores como interlocutores foi um
expediente utilizado por trabalhadores para acessar políticas governamentais que atendessem a
algumas necessidades imediatas, relacionadas a melhorias em infra-estrutura urbana, lazer, serviços
de saúde e educação e ao cumprimento da legislação trabalhista (salário mínimo, jornada de 8 horas
etc). Parte dessas necessidades foi atendida, por vezes através de soluções pontuais e temporárias, e
parte não alcançou desfecho semelhante e ficou sem ultrapassar a condição de denúncia. Essas
questões são perceptíveis no curso das legislaturas que se sucederam entre 1948 e 1964 em que se
identifica a repetição, ao longo do tempo, de reivindicações semelhantes. Com isso, ficam
evidenciados os limites existentes em uma democracia representativa. Nesse modelo de organização
política, as possibilidades de mudanças sociais encontram empecilhos concretos diante da ausência
de mecanismos que permitam a participação efetiva da população nas decisões governamentais. No
plano nacional esse aspecto ficou igualmente manifesto, quando as reformas sociais que estavam

129
abrigadas no programa das Reformas de Base e que, embora correspondessem aos interesses de
amplos setores da população brasileira, não encontrou algo correlato entre a maioria dos
parlamentares do Congresso Nacional. Porém, a democracia representativa traz, a partir do direito
ao voto, a possibilidade da ameaça da troca dos sujeitos responsáveis pela tomada de decisões
governamentais, como também a presença da figura do interlocutor em instâncias políticas, o que,
sem dúvida alguma, torna este regime preferível a uma ditadura. No Brasil, quando estes fatores se
apresentaram como ameaças para estabilidade da hegemonia da elite em postos de comando na
esfera política, a democracia representativa foi posta em xeque. Cabe lembrar a crise política de
1954, que se desdobrou no suicídio de Getulio Vargas; a ameaça de golpe que visava impedir a
posse do Presidente eleito em 1955, Juscelino Kubistchek; a crise da legalidade em 1961 com a
renúncia de Jânio Quadros da Presidência da República; e o golpe de 1964 que extinguiu, de fato, o
regime constitucional no Brasil retirando do poder o Presidente João Goulart, suspendendo o
pluripartidarismo, as eleições diretas, cerrando as portas das Casas Legislativas e disseminando a
repressão política.
Retomando a argumentação acerca da experiência em Alagoinhas com a democracia
representativa que vigorou no Brasil entre 1945 a 1964, percebeu-se nos primeiros anos de
reabertura do Legislativo Municipal o progressivo aumento de interlocutores dos interesses dos
trabalhadores no interior deste organismo, com a presença do Vereador Almiro de Carvalho
Conceição (PSD) na legislatura 1948-1950 e na legislatura seguinte de 1951-1954 através dos
vereadores da bancada do PTB, Hildebrando Dias, Eurico Costa e Romualdo Campos. A partir
desse momento questões relacionadas aos trabalhadores ganharam espaço no Legislativo em
Alagoinhas como jamais tinha sido visto em toda história republicana. Entretanto foi na legislatura
1955-1958, e especificamente no intervalo compreendido entre 1955-1956 que a interlocução de
demandas vinculadas aos trabalhadores alcançou maior intensidade. Esse processo aconteceu
através da atuação da Frente Popular Democrática, bancada de oposição que era formada por seis
dos doze vereadores eleitos. Durante este período, se tornam mais perceptíveis na política
alagoinhense o conflito que se desenvolvia entre as forças políticas herdeiras do getulismo que
defendiam um projeto político nacional-estatista e os setores conservadores representados,
principalmente, pela UDN e parcelas das Forças Armadas. A atuação desta Frente, que estava
afinada com a aliança PTB-PSD, aconteceu associada ao embate com o núcleo local da UDN,
partido da situação no município naquele momento. Este embate alcançou níveis mais elevados
quando a hegemonia da FPD no Legislativo Municipal deixou de ser apenas uma ameaça ao receber

130
a adesão de Armando Leal (UDN), Vereador dissidente da bancada governista, e passar a ocupar
todos os seus cargos diretivos, após uma conturbada eleição. A tensão se manteve elevada e trouxe
como repercussão o afastamento de três dos mais atuantes membros da referida Frente ocasionando
a desarticulação de um grupo político que almejava e poderia ocupar espaços importantes para o
município na esfera política.
Daí por diante, a interlocução de demandas dos trabalhadores não cessou no interior do
Legislativo Municipal, muito embora a intensidade e insubordinação dos vereadores-interlocutores
notada entre 1955 e 1956 não tenha se repetido. Houve uma renovação dos interlocutores, os quais
passaram a figurar em sua maioria em uma posição governista através, sobretudo do PSD e PR,
partidos que possuíam como lideranças elementos da elite local.
Na legislatura iniciada em 1963, que se inscreveu no contexto que antecedeu ao golpe de
1964, percebeu-se a sintonia de alguns vereadores com relação à defesa das Reformas de Base,
apesar disto ter acontecido de uma forma moderada. Com o advento do referido golpe, Alagoinhas,
cidade que possuía significativo contingente operário e vinha demonstrando um comportamento
eleitoral favorável aos representantes do projeto “nacional-estatista”, entrou na rota da repressão
política, a qual incidiu no Legislativo Municipal, principalmente sobre os vereadores que
demonstravam vinculações com os trabalhadores ou haviam defendido as Reformas de Base, assim
como sobre a militância comunista e organizações de classes que atuavam na cidade.
Esse estudo buscou analisar a participação dos trabalhadores no processo político em um
contexto de abertura política no país e de intensificação do processo de urbanização em Alagoinhas,
no intervalo compreendido entre os anos de 1948 e 1964. Para isso se privilegiou um enfoque sobre
o Legislativo Municipal, por identificar neste espaço decisório a recorrência do exercício de
interlocução de demandas dos trabalhadores. Porém, há muito para se avançar no que concerne ao
estudo da atuação política dos trabalhadores em Alagoinhas. O investimento presente nesta
dissertação corresponde à tentativa de compreender parte desse processo, o que significa destacar,
entre outras questões a serem tratadas com maior profundidade, as trajetórias de trabalhadores que
se elegeram vereadores como Almiro de Carvalho Conceição, Romualdo Campos, Hildebrando
Dias, Hostílio Dias, por exemplo. Assim como acerca da dinâmica das relações estabelecidas entre
entidades associativas, que possuíam trabalhadores em seus quadros, junto ao Estado e
representantes da elite política local e o jogo político e de interesses presente em tais relações. As
entidades associativas a que me refiro são o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Couros e
Peles de Alagoinhas, o Círculo Operário de Alagoinhas, o Centro Operário Beneficente de

131
Alagoinhas, a Associação dos Servidores Municipais, a Associação dos Empregados no Comércio
de Alagoinhas, ou mesmo a Liga Desportiva de Alagoinhas. Esta última agregava times de futebol
amador, alguns deles notadamente vinculados aos trabalhadores, e possuía dirigentes que tinham
uma estreita relação com a política partidária ou foram eleitos para cargos de votação popular.
Todas estas agremiações se constituíram ou já estavam em atividade nas décadas de 1940, 1950 e
1960, e, por vezes, receberam subvenções financeiras oriundas dos governos Federal, Estadual ou
Municipal. Enfim, são questões que estão a merecer investigações através de estudos ulteriores.

132
Fontes

Arquivo da Câmara Municipal de Alagoinhas

Livros de Requerimentos da Câmara de Vereadores de Alagoinhas (1948-1960)


Livros de Atas da Câmara de Vereadores de Alagoinhas (1948-1960)

Arquivo da Paróquia Santo Antonio

Livro de registro de casamentos da Paróquia de Santo Antonio. Volumes: 01,02,03,04 e 05


(1940-1959).

Arquivo da Prefeitura Municipal de Alagoinhas

Memorando aprovado por ferroviários da VFFLB em 24.07.1960 para ser entregue ao


Diretor Superintendente desta ferrovia.
Os pontos que a comissão executiva dos ferroviários “Pró-Melhores Dias” defenderá junto
Rede Regional da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro, 04.05.1960.
Protocolo pelo qual os ferroviários da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro – Rede
Ferroviária Federal S/A – acordam com a diretoria da mesma Estrada em fazer cessar a
paralisação do tráfego e mais serviços, mediante o estabelecimento de condições e
compromissos. Salvador, 28 de fevereiro de 1960.
Plano Diretor Urbano da Cidade de Alagoinhas. Volume III. Organização atual e tendências
de expansão urbana: Alternativas e proposições para a ocupação do espaço urbano.
Salvador, Junho de 1977.

Arquivo Particular de Joanito Rocha

O Nordeste, 13.08.1948
O Nordeste, 13.09.1948
O Nordeste, 21.09.1948
O Nordeste, 14.12.1948
O Nordeste, 28.01.1949
O Nordeste, 10.02.1949
O Nordeste, 02.06.1949
O Nordeste, 13.08.1949
O Nordeste, 02.10.1949
O Nordeste, 14.10.1949
O Nordeste, 25.11.1949
O Nordeste, 24.12.1949
O Nordeste, 28.02.1950
O Nordeste, 13.03.1950
O Nordeste, 26.03.1950
O Nordeste, 11.05.1950

133
O Nordeste, 04.06.1950
O Nordeste, 28.06.1950
O Nordeste, 11.08.1950
O Nordeste, 17.09.1950
O Nordeste, 29.10.1950
O Nordeste, 21.11.1950
O Nordeste, 24.12.1950
O Nordeste, 24.01.1951
O Nordeste, 02.03.1951
O Nordeste, 04.06.1951
O Nordeste, 18.07.1951
O Nordeste, 06.10.1951
O Nordeste, 22.11.1951
O Nordeste, 08.01.1952
O Nordeste, 07.03.1952
O Nordeste, 30.04.1952
O Nordeste, 12.05.1952
O Nordeste, 07.07.1952
O Nordeste, 24.12.1952
O Nordeste, 10.01.1953
O Nordeste, 29.01.1953
O Nordeste, 16.02.1953
O Nordeste, 03.03.1953
O Nordeste, 31.03.1953
O Nordeste, 27.04.1953
O Nordeste, 12.05.1953
O Nordeste, 27.05.1953
O Nordeste, 06.06.1953
O Nordeste, 07.08.1953
O Nordeste, 19.08.1953
O Nordeste, 25.12.1953
O Nordeste, 17.01.1954
O Nordeste, 27.01.1954
O Nordeste, 26.02.1954
O Nordeste, 12.04.1954
O Nordeste, 23.05.1954
O Nordeste, 11.06.1954
O Nordeste, 09.08.1954
O Nordeste, 11.09.1954
O Nordeste, 19.09.1954
O Nordeste, 30.09.1954
O Nordeste, 24.12.1954
O Nordeste, 09.01.1955
O Nordeste, 04.03.1955
O Nordeste, 30.04.1955
O Nordeste, 14.05.1955
O Nordeste, 28.05.1955
O Nordeste, 11.07.1955

134
O Nordeste, 23.07.1955
O Nordeste, 29.07.1955
O Nordeste, 15.08.1955
O Nordeste, 28.08.1955
O Nordeste, 12.09.1955
O Nordeste, 25.09.1955
O Nordeste, 01.10.1955
O Nordeste, 19.10.1955
O Nordeste, 21.11.1955
O Nordeste, 25.02.1956
O Nordeste, 18.03.1956
O Nordeste, 11.04.1956
O Nordeste, 16.04.1955
O Nordeste, 02.05.1956
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O Nordeste, 15.07.1956
O Nordeste, 17.11.1956

Arquivo Particular de Walter Campos


Alagoinhas Jornal, 21.10.1957
Alagoinhas Jornal, 11.01.1958
Alagoinhas Jornal, 10.03.1958
Alagoinhas Jornal, 24.03.1958
Alagoinhas Jornal, 28.04.1958
Alagoinhas Jornal, 29.09.1958
Alagoinhas Jornal, 29.10.1958
Alagoinhas Jornal, 01.12.1958
Alagoinhas Jornal, 22.01.1959
Alagoinhas Jornal, 16.02.1959
Alagoinhas Jornal, 06.04.1959
Alagoinhas Jornal, 13.05.1959
Alagoinhas Jornal, 01.06.1959
Alagoinhas Jornal, 11.01.1960
Alagoinhas Jornal, 02.02.1960
Alagoinhas Jornal, 14.03.1960
Alagoinhas Jornal, 03.04.1960
Alagoinhas Jornal, 22.04.1960
Alagoinhas Jornal, 20.05.1960
Alagoinhas Jornal, 22.06.1960

Biblioteca Pública do Estado da Bahia


Correio de Alagoinhas, 09.06.1942
Correio de Alagoinhas, 04.10.1943
Correio de Alagoinhas, 31.12.1943

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Biblioteca da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia

Comportamento demográfico e divisão territorial do Estado da Bahia de 1940-1970. Salvador,


1976, volume 3.

Fundação Iraci Gama

Jornal Sete Dias, 17.03.1949


Jornal Sete Dias, 12.04.1954

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Documentos disponíveis em http://biblioteca.ibge.gov.br)

Censo Demográfico de 1950


Censo Demográfico de 1950
Censo comercial e dos serviços de 1960 (Sergipe - Bahia)
Censo industrial, comercial e dos serviços de 1950 (Bahia)
Censo industrial de 1960 (Sergipe – Bahia - Minas Gerais)
Enciclopédia dos municípios brasileiros, volume XX (1958)
Enciclopédia dos municípios brasileiros, volume XXI (1958)
Recenseamento Geral do Brasil de 1940

136
Referências Bibliográficas

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