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Título:

AGENTES
PÚBLICO
S-
ADVOGA
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PAGAME
NTO DE
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E DA
OAB
PELO
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PÚBLICO
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A

CONSULTAS EM DESTAQUE - 629/19/FEV/2003

AGENTES PÚBLICOS – ADVOGADOS – PAGAMENTO DE ANUIDADE DA


OAB PELO PODER PÚBLICO – ENCARGO PESSOAL INERENTE AO
EXERCÍCIO PROFISSIONAL – NECESSIDADE DE LEI AUTORIZATÓRIA –
FUNDAMENTO NO INTERESSE PÚBLICO – BUSCA DE PRESERVAÇÃO
DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA.
ORIENTAÇÃO JURÍDICA1

EMENTA: Agentes públicos – Pagamento de anuidade da OAB pela Administração –


Princípios da legalidade e isonomia.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL: Arts. 15 a 23 da Lei Complementar nº 101/00; art. 37 da


Constituição Federal/88.

1. Agentes públicos. Pagamento de Anuidade da OAB. Verba de natureza particular


inerente ao exercício da advocacia. Necessidade de lei autorizatória específica com
critérios para eventual concessão. Cogitação de ofensa aos princípios da legalidade e
isonomia devido ao tratamento diferenciado em relação a outras categorias de
servidores.

2. Despesa pública. Aumento. Observância dos requisitos constantes dos arts. 15 a 23


da LRF.

1 CONSULTA

A consulta destina-se à orientação no que tange à possibilidade de sociedade de


economia mista – portanto, sujeita à fiscalização da Corte de Contas – assumir o
pagamento de anuidade da OAB dos advogados que compõem a sua assessoria jurídica,
tendo em vista que tais profissionais mantêm vínculo de exclusividade com a referida
entidade e cumprem jornada de 8 horas diárias.

2 FUNDAMENTOS LEGAIS E DOUTRINÁRIOS

É de se firmar, desde logo, a premissa de que a concessão de quaisquer benefícios aos


agentes públicos deverá se dar por meio de lei autorizatória específica, posto que, por
evidente, também as entidades da Administração Indireta estão submetidas ao princípio
da legalidade, postulado constitucionalmente consagrado no art. 37, caput, da
Constituição da República.

Hely Lopes Meirelles2, abordando o princípio da legalidade, ensina que:

"A legalidade, como princípio, de administração (CF, art. 37, caput), significa que o
administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos
da lei e às exigências do bem comum, e deles não pode se afastar ou desviar, sob pena
de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil e criminal,
conforme o caso.

A eficácia de toda atividade administrativa está condicionada ao atendimento da lei. Na


Administração Pública, não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na
administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública
só é permitido fazer o que a lei autoriza.

(...)"

Em suma, não basta que os atos praticados no exercício da função administrativa


estejam de acordo com a lei, é necessário que eles se fundamentem no ordenamento
jurídico.

Ainda a respeito da sujeição da atividade administrativa ao ordenamento e à lei,


oportuno transcrever as palavras do inesquecível mestre Ruy Cirne Lima:

"O fim – e não a vontade – domina todas as formas de administração.

Supõe, destarte, a atividade administrativa a preexistência de uma regra jurídica,


reconhecendo-lhe uma finalidade própria. Jaz, conseqüentemente, a administração
pública debaixo da legislação, que deve enunciar e determinar a regra de direito". 3

Cármen Lúcia Antunes Rocha, analisando o assunto sob a ótica do erário, leciona que “a
lei – e apenas a lei – é fonte formal a fundamentar o dispêndio legítimo de recursos
públicos, inclusive o pagamento de pessoal”, que “não se haveria sequer de cogitar de
feitura de gastos públicos, a dizer, comprometimento do patrimônio público, sem o
prévio consentimento livre do povo” e que “a legalidade formal impõe condição
translúcida para o cuidado com as despesas públicas voltadas ao conjunto de agentes
públicos.”4

Seguindo o raciocínio e tocando no cerne da consulta, o Tribunal de Contas da União já


firmou entendimento sobre o pagamento de anuidades dos advogados pela
Administração Pública ao julgar prestação de contas do Serviço Social da
Indústria/Departamento Regional do Amapá5, cujo Ministro Relator assim se manifestou
em determinado momento do seu voto:

"3.3.4.1, para justificar a irregularidade do subitem 3.3.2.1, temos a comentar o que


segue:

a) as alegações de que o pagamento pelo SESI/AP de suas anuidades profissionais


decorreu do fato de que a Entidade utilizava-se de seus serviços com exclusividade,
impossibilitando-os de advogar para outras esferas ou empresas, ou ainda, de que é
uma forma de compensar o não pagamento das horas excedentes à carga horária
legalmente estabelecida, não são bastantes para justificar tal pagamento irregular. A
anuidade devida pelo Advogado à OAB constitui um débito de natureza particular,
pessoal. Ademais, não há previsão legal ou regulamentar que autorize a Entidade a
assumir esse tipo de encargo.

b) assim, as alegações apresentadas pelos responsáveis não se mostram idôneas o


suficiente para elidirem a irregularidade apontada, tendo em vista as peças constantes
dos autos que atestam a existência da irregularidade, bem assim a falta de comprovação
de suas assertivas, restando caracterizado o ato ilegítimo. Assim, s.m.j., cabe proposta
de rejeição das alegações de defesa e de julgamento pela irregularidade das contas com
aplicação, aos responsáveis, da multa prevista no art. 57, condenando-os ao pagamento
dos respectivos débitos, cujo valor original de R$ 425,00 deverá ser atualizado
monetariamente, a partir das datas de 10.09.97 e 15.10.97, e acrescido dos juros de mora
legais".

Destarte, a anuidade da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) é encargo pessoal


inerente ao exercício profissional da advocacia, não existindo respaldo legal para o seu
pagamento por parte do Poder Público aos seus servidores que compõem a sua
assessoria jurídica.

Noutro sentido, poder-se-ia cogitar do pagamento de anuidades suplementares para que


tais agentes públicos pudessem fazer a defesa exclusiva dos interesses do Poder
Público em outras unidades seccionais que não a do seu domicílio profissional. Essa
temática (anuidades suplementares) também já foi objeto de análise por parte do
Tribunal de Contas da União ao examinar recurso de reconsideração do Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA)6, que culminou com a seguinte ementa:

"Prestação de Contas relativa ao exercício de 1996 – Contas julgadas regulares com


ressalva, promovendo-se as determinações cabíveis – Recurso de Reconsideração
contra a determinação no sentido de a entidade abster-se de arcar com o pagamento de
anuidades à Ordem dos Advogados do Brasil para inscrição suplementar em outra
Seccional da Ordem, adotando providências quanto ao ressarcimento, pelos advogados
beneficiários, dos valores indevidamente pagos – Inexistência de proveito pessoal pelos
destinatários do benefício – Despesas realizadas em prol do interesse público –
Conhecimento – Provimento – Ciência ao interessado".

E o conteúdo do voto do Ministro Relator Guilherme Palmeira foi o seguinte:

"Inicialmente cabe registrar que o Ofício nº 35/IPEA, de 02.06.2000, enviado pelo


Presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Sr. Roberto Borges Martins,
demonstra claramente a intenção do signatário de ver modificada a determinação
contida na alínea “b” do item 2 do Ofício nº 149/2000, da então 8ª Secex, atual 2ª Secex,
que deu conhecimento àquela entidade da decisão deste Tribunal proferida por ocasião
do julgamento das contas do IPEA referentes ao exercício de 1996 (Relação nº 28/2000
do Gabinete do Ministro Walton Alencar Rodrigues, in ata nº 14 - 1ª Câmara, de
02.05.2000).

Pelo motivo acima exposto, e por preencher os requisitos de admissibilidade previstos


nos arts. 32, inc. I, e 33 da Lei nº 8.443/92 e arts. 229 e 233 do Regimento Interno do TCU,
pode o expediente acima mencionado ser conhecido como Recurso de Reconsideração.

Quanto ao mérito, entendo procedentes os argumentos expostos pelo recorrente no


sentido de que a despesa realizada pelo IPEA, para pagamento da inscrição suplementar
de advogados de seu quadro na Seccional do Rio de Janeiro da Ordem dos Advogados
do Brasil, objetiva o estrito interesse da entidade, não tendo os advogados envolvidos
interesse pessoal em realizar tal inscrição suplementar, além da que já arcam com a
inscrição na seccional de seu domicílio.

Imaginemos, apenas para testar a razoabilidade de manter a decisão ora questionada,


que o IPEA necessitasse de assistência de seus advogados em todas as seccionais da
OAB no país. Seria razoável exigir dos mesmos que, às suas expensas, realizassem
inscrições suplementares em todas essas seccionais?

O exemplo supra demonstra serem pertinentes, também, os argumentos de que o


princípio da razoabilidade dá respaldo à administração do IPEA para que, no uso de seu
poder discricionário, mesmo inexistindo lei expressamente permissiva, proceda aos
pagamentos das inscrições suplementares de que se trata.

Obviamente que se poderia comparar o custo de deslocar os advogados de Brasília para


o Rio com a contratação de um escritório de advocacia naquela cidade, mas isso
implicar fazer várias considerações que refogem à abrangência deste recurso, razão por
que me restringi a examinar apenas a questão posta nesta oportunidade.

Ante o exposto, acolho as razões expostas pela unidade técnica e pelo Ministério
Público e VOTO no sentido de que o Tribunal adote a deliberação que ora submeto à
consideração deste Colegiado".

Portanto, verifica-se que todo e qualquer gasto a ser realizado com os agentes públicos,
sejam eles agentes políticos ou servidores públicos, independentemente de sua posição
hierárquica na estrutura administrativa, dependerá de lei formal que autorize a
Administração Pública agir nesse sentido, sob pena de violação aos princípios da
legalidade e da indisponibilidade do interesse público e todos os demais que deles
decorrem.

É de se destacar, ainda, o aspecto atinente ao princípio da isonomia na concessão da


vantagem cogitada. O comando teleológico visado por esse princípio não é atingido
apenas assegurando a igualdade a todos, mas sim tratando de igual forma os iguais e de
forma distinta os desiguais, na proporção dessa desigualdade. É, pois, um dos vetores
que orienta o desenvolvimento da atividade administrativa de forma que esta não crie
discriminações, preferências, diferenças, privilégios ou quaisquer outros fatores que
tenham por condão estabelecer tratamento desigual entre administrados, sem que para
isso exista comando normativo que assim autorize ou razão justificadora no sentido de
que somente estabelecendo tal discriminação se alcançaria o interesse público. 7

Na esteira dessas idéias, se a satisfação de um interesse público reclamar a concessão


de um dado benefício à determinada categoria de servidores por conta das
peculiaridades das funções exercidas, não se vislumbra, a princípio, afronta ao princípio
da isonomia. Neste aspecto, socorre-se dos ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de
Mello, para quem a “isonomia é igualdade entre os iguais, isto é, entre os que
preenchem as mesmas condições ou se encontram em situações comparáveis.” 8

Contudo, o pagamento de anuidades às entidades de fiscalização profissional, mesmo


mediante lei, apenas para determinada categoria (advogados), sem um motivo
suficientemente embasador dessa conduta, qual seja, o interesse público, e não o
concedendo para outras categorias que necessitem recolher a mesma espécie de
contribuição para o exercício profissional (médicos, engenheiros, etc.), acabaria por
violar o princípio da isonomia, por ser disposição discriminatória, não condizente com o
princípio constitucional em comento. Nesse caso, Cármen Lúcia Antunes Rocha entende
que “haverá óbvia e incontestável inconstitucionalidade, perfeitamente possível de ser
desfeita pelo controle de constitucionalidade.”9

Por fim, indica-se a necessidade de observância das normas de cunho orçamentário e


financeiro à implementação do benefício pretendido pela Consulente, notadamente as
insculpidas na Lei de Responsabilidade Fiscal quanto à geração da despesa (arts. 15 e
16) e despesas com pessoal (art. 18 e seguintes – limites).

3 CONCLUSÕES

Diante de todo o exposto, respondendo objetivamente à presente Consulta, entende-se


que somente por meio de lei autorizatória poderá ser concedido aos funcionários da
Administração Consulente o pagamento de anuidade da OAB, porquanto a referida
anuidade constitui um débito de natureza particular, pessoal e inerente ao exercício da
advocacia.

Note-se que tais pagamentos, sem que para tanto exista lei que assim determine o Poder
Público agir, caracteriza manifesta alijamento do princípio da indisponibilidade do
interesse público, em especial da legalidade e da isonomia, haja vista que se estará
criando um ônus para o erário sem que exista fundamento jurídico para justificá-lo. Além
disso, é preciso determinar os critérios de sua concessão de forma a preservar o
princípio da isonomia no que tange à eventual não atribuição de tal vantagem a outros
servidores submetidos a outras entidades fiscalizadoras de suas profissões.

Anota-se, por derradeiro, que o Administrador Público deve atentar às questões de


natureza orçamentária e respectiva previsibilidade das despesas, para a concessão das
anuidades, nos instrumentos de planejamento – orçamento. Tais medidas, nos termos
dos arts. 15 a 23 da Lei Complementar nº 101/2000 – LRF, conforme o montante, devem
ser precedidas, em síntese de: a) estimativas de impacto orçamentário e financeiro no
exercício que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes; b) declaração do ordenador
da despesa; c) demonstração da origem dos recursos; d) observância dos limites para
as despesas de pessoal.

Salvo melhor juízo, essa é a orientação da Consultoria Zênite, elaborada de acordo com
os subsídios fornecidos pelo Consulente.

1
Orientação jurídica elaborada pelo Corpo de Consultores da Consultoria Zênite à
consulta formulada por assinante do IDAF cuja identificação foi propositadamente
omitida
2
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. Malheiros Editores, 1997. p.
82.
3
LIMA, Ruy Cirne. Princípios de Direito Administrativo. RT, 1982. p. 22.
4
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos.
São Paulo: Editora Saraiva, 1999. p. 286 -287.
5
Acórdão nº 600/2002 – Primeira Câmara – DOU de 26.09.2002.
6
Acórdão nº 529/2002 – Primeira Câmara – DOU de 03.09.2002.
7
FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo. 4. ed. São Paulo: Malheiros
Editores, 2000. p. 45. Ressalta a importância deste princípio para a conformação do
próprio Estado de Direito: “O princípio da igualdade é a mola propulsora do Estado de
Direito; sem seu cumprimento, o exercício da função administrativa seria realmente sem
sentido. Não se concebe que possa estar a função administrativa debaixo da lei e sem
respeitar o princípio da igualdade. Destarte, o princípio da igualdade deve nortear, de
ponta a ponta, toda a atividade da Administração, e os provimentos emanados por esta
só serão válidos à medida que estejam atendendo ao princípio. A exata dimensão do
princípio da igualdade é de grande importância no entendimento da discricionariedade,
pois, se atento se estiver ao cumprimento do princípio, ver-se-á quando a Administração
pode desigualar, quando pode agir adotando certos discrímenes e quando não pode,
porque tais discrímenes não estarão, como tão magistralmente professa Celso Antônio
Bandeira de Mello, em correlação com a discriminação efetuada”.
8
Curso de direito administrativo. 13. ed., p. 46.
9
Princípios constitucionais dos servidores públicos, p. 330.

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Título:

Agentes
Públicos -
Período
de
afastame
nto -
Vantagen
s-
Pagamen
to de
vale-
alimentaç
ão -
Possibilid
ade

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 271/15/OUT/2002

PERGUNTA 5

Determinada Constituição estadual prevê que o servidor público quando


investido nas funções de direção máxima de entidade representativa de
classe ou conselheiro de entidade de fiscalização do exercício das
profissões liberais, não sofrerá prejuízos nos seus salários e demais
vantagens na sua instituição de origem. Dessa maneira, se o benefício
alimentação (que não tem natureza salarial, portanto não se incorporando
à remuneração do servidor para quaisquer efeitos), poderia ser
concedido ao servidor representante de classe que se encontra afastado?

RESPOSTA

Face às normas próprias aplicáveis aos servidores e tal como posto na citada
Constituição estadual, o Poder Público deverá conceder todas as vantagens a que o
servidor tem direito, ainda que afastado de suas funções que, no caso em tela, trata-se
do exercício de representação em entidade de classe. Dentre as vantagens pecuniárias,
um exemplo a ser trazido é o do adicional por tempo de serviço, extensivo a todos os
servidores que cumprirem certo lapso temporal e atenderem às disposições legais para
sua concessão, incluído o servidor afastado para a finalidade exposta.

Por outro lado, há que se salientar que tratamento diverso recebe a atribuição de
determinadas gratificações aos servidores, como a gratificação por risco de vida ou
saúde, que nesse caso, apenas aqueles que atuam na Administração exercendo função
cujo risco ou insalubridade são a ela inerentes, é que as perceberão. Isto significa que
se o servidor afastado recebia gratificação por risco de vida, por trabalhar em situação
de risco e, com o afastamento, deixou de atuar nessas condições, não poderá mais
receber a tal vantagem.

Já no que tange ao beneficio alimentação, adotando-se a mesma linha de raciocínio


utilizada em relação ao adicional por tempo de serviço, por entender-se que mesmo não
tendo natureza salarial (não incorporável à sua remuneração), e constituindo-se em
vantagem concedida a todos os servidores da Administração Pública, esse também
deverá ser concedido ao servidor afastado.

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Título:

Agentes
públicos -
Afastame
nto para
atividade
política -
Considera
ções

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 163/14/SET/2002

PERGUNTA 6

Servidor público federal contratado para o cargo de professor substituto


terá o direito ao afastamento para atividade política conforme preceitua o
art. 86 da Lei nº 8.112/90? Em caso afirmativo, poderá permanecer no
cargo e concorrer a cargo eletivo?

RESPOSTA

A resolução da questão proposta depende da interpretação dos dispositivos legais


contidos no art. 86 da Lei nº 8.112/90 e na Lei Complementar nº 64/90. Para tanto,
indispensável transcrever a redação das referidas normas:

"Lei nº 8.112/90

Da Licença para Atividade Política

Art. 86 O servidor terá direito a licença, sem remuneração, durante o período que mediar
entre a sua escolha em convenção partidária, como candidato a cargo eletivo, e a
véspera do registro de sua candidatura perante a Justiça Eleitoral.

§ 1º O servidor candidato a cargo eletivo na localidade onde desempenha suas funções e


que exerça cargo de direção, chefia, assessoramento, arrecadação ou fiscalização, dele
será afastado, a partir do dia imediato ao do registro de sua candidatura perante a
Justiça Eleitoral, até o décimo dia seguinte ao do pleito.

§ 2º A partir do registro da candidatura e até o décimo dia seguinte ao da eleição, o


servidor fará jus à licença, assegurados os vencimentos do cargo efetivo, somente pelo
período de três meses.

Lei Complementar nº 64/90

Art. 1º São inelegíveis:

I - (...)
II - (...)

l) os que, servidores públicos, estatutários ou não, dos órgãos ou entidades da


Administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Municípios e dos Territórios, inclusive das fundações mantidas pelo Poder Público, não
se afastarem até 3 (três) meses anteriores ao pleito, garantido o direito à percepção dos
seus vencimentos integrais;"

O comando normativo que se extrai da dicção dos textos legais transcritos conduz à
garantia de afastamento remunerado de servidores, estatutários ou não, candidatos ao
pleito eleitoral (federal, estadual ou municipal) pelo período de três meses, notadamente
em face da Lei das Inelegibilidades (Lei Complementar nº 64/90).

A jurisprudência tem firmado o seguinte sobre o tema:

"Recurso eleitoral – Indeferimento de registro de candidatura a cargo de vereador –


Inelegibilidade – Titular de cargo de provimento em comissão em órgão da
Administração Pública estadual – Prazo de desincompatibilização. O Colendo Tribunal
Superior Eleitoral já decidiu que: Os servidores públicos, estatutários ou não, dos
órgãos ou entidades da administração direta ou indireta da União, dos Estados, do
Distrito Federal e do mesmo Município, inclusive das fundações mantidas pelo poder
público, deverão afastar-se de seu cargo três meses antes do pleito, garantindo o direito
a percepção de vencimentos integrais". (TRE/RN – Recurso Ordinário – AC nº 524/96,
Min. Rel. Lauro Molina – 30.08.1996.)

Restaria, no entanto, verificar se a norma em comento abarcaria os servidores


contratados temporariamente. Novamente nos socorremos da jurisprudência dos
tribunais eleitorais, de modo a confirmar que "enquadram-se nas disposições do art. 1º,
inc. II, ‘l’, da Lei Complementar nº 64/90, os professores admitidos em caráter temporário
(ACTs), sendo-lhes imprescindível o afastamento do cargo, caso venham a candidatar-
se."1

Dessa forma, independentemente da previsão posta no art. 86 da Lei nº 8.112/90 sobre as


licenças para atividade política, é condição de elegibilidade o afastamento remunerado
do servidor pelo período de três meses anteriores ao pleito eleitoral. Nesse sentido, a
continuidade em atividade ou a cessação da licença por opção do servidor é causa de
inelegibilidade, não possuindo reflexos na atividade administrativa, a não ser o retorno
ao exercício das atribuições do cargo ou emprego.

Portanto, com base na disciplina legal sobre o assunto e na jurisprudência tende-se a


concluir que é assegurado o afastamento remunerado aos servidores candidatos,
estatutários ou não (inclusive aqueles contratados temporariamente), pelo prazo de três
meses. Todavia, como o referido afastamento constitui condição de elegibilidade, a
permanência no cargo implicará na impossibilidade de concorrer ao pleito eleitoral.

1
TRE/SC – AC n° 16482 – 28.08.2000.
Julgados dos Tribunais Imprimir

Tipo Recurso:

Agravo de
Instrumento
Número do
2002.01.00.002345-1
Recurso:
Tribunal: Tribunal Regional Federal - 1ª Região
Data do
21/MAI/2002
Julgamento:
Relator: Jirair Aram Meguerian
Processual civil – Ação cautelar – Pressupostos – Servidor público – Licença remunerada
Ementa do
– Afastamento para disputar cargo eletivo municipal – Desconto feito na remuneração
Recurso:
do servidor – Suspensão liminar – Presença do fumus boni iuris e periculum in mora.

JURISPRUDÊNCIA - 287/15/OUT/2002

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO

Agravo de Instrumento nº: 2002.01.00.002345-1 UF: RO


Relator: Juiz Jirair Aram Meguerian
Data: 21.05.2002
Fonte: DJ, de 20.06.2002

Assunto:

Agentes públicos – Afastamento para disputar cargo eletivo – Desconto feito na


remuneração – Impossibilidade.

Ementa:

Processual civil – Ação cautelar – Pressupostos – Servidor público – Licença


remunerada – Afastamento para disputar cargo eletivo municipal – Desconto feito na
remuneração do servidor – Suspensão liminar – Presença do fumus boni iuris e
periculum in mora.

I – Demonstrado na decisão a qua a presença dos requisitos aptos a ensejarem a


concessão da medida liminar em ação cautelar, quais sejam, o periculum in mora e o
fumus boni iuris, correta a decisão do juízo a quo que defere o pleito liminar requerido.

II – Por outro lado, em sede de Agravo de Instrumento, a abordagem deve ser restrita ao
acerto ou não da decisão liminar, levando-se em conta a presença dos requisitos
mencionados, e não do mérito da ação.

III – Agravo de Instrumento a que se nega provimento.


Acórdão

“Decide a Turma, à unanimidade, negar provimento ao Agravo de Instrumento.”

2ª Turma do TRF da 1ª Região – 21.05.2002.

Juiz JIRAIR ARAM MEGUERIAN


Relator

Relatório

O EXMO. SR. JUIZ JIRAIR ARAM MEGUERIAN (RELATOR):

Cuida-se de agravo de instrumento interposto pela União Federal, com pedido de efeito
suspensivo, contra decisão proferida pelo MM. Juízo Federal da 3ª Vara da Seção
Judiciária de Rondônia que, nos autos da Ação Cautelar nº 2002.41.00.000068-9/RO,
deferiu a medida liminar para suspender o desconto que vem sendo efetuado na
remuneração do autor/agravado, em razão da Portaria nº 2.310, de 04.09.2000 (cópia às
fls. 44/46). Os referidos descontos são decorrentes do afastamento do servidor agravado
para disputar cargo eletivo municipal.

2. A agravante, em síntese, sustentou que é impossível a concessão de medida liminar


contra a Fazenda Pública. Sustentou, ainda, que a medida liminar tem caráter satisfativo,
bem como não restaram presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora a ensejarem
a concessão de medida liminar. Finalmente, pugnou pela reforma da decisão a qua.

3. O pedido de efeito suspensivo foi indeferido, conforme fls. 50/51.

4. Contraminuta às fls. 60/61.

5. Parecer do parquet, às fls. 69/73, pelo desprovimento do presente agravo de


instrumento.

É o relatório.

Juiz JIRAIR ARAM MEGUERIAN


Relator

Voto

O EXMO. SR. JUIZ JIRAIR ARAM MEGUERIAN (RELATOR):

Ao analisar o pedido de efeito suspensivo, decidi nos seguintes termos:

Vistos,

Cuida-se de Agravo de Instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto pela


União Federal, contra decisão proferida pelo MM. Juiz Federal Substituto da 3ª Vara da
Seção Judiciária de Rondônia que, nos autos da Ação Cautelar nº 2002.41.00.000068-
9/RO, proferiu a seguinte decisão:

“SINVAL BATISTA DA SILVA ajuizou esta ação cautelar, preparatória a ação de cobrança,
onde postula, liminarmente, a concessão de medida cautelar no sentido de determinar a
ré que suspenda os descontos financeiros que vem efetivando em seus salários, por
ocasião de seu afastamento para disputar mandato eletivo municipal no pleito ocorrido
em 2000.

Alega para tanto, que a Lei Complementar nº 64/90, em seu art. 1º, inciso II, alínea ‘I’,
garante o direito à percepção dos vencimentos daqueles que se afastarem de seus
cargos. Prossegue dizendo que os descontos ora questionados vem sendo efetuados
com base no art. 86, § 2º, da Lei nº 8.112/90, pois que a ré somente reconhece o direito a
afastamento a partir do período de registro da candidatura do autor, sendo este o
motivador do desconto da verba que a administração reputa ter pago indevidamente.
Sustenta que há conflito de normas no caso devendo prevalecer a primeira, pois que lei
ordinária é hierarquicamente inferior a lei complementar e por isso não pode contrariá-la.

(...)

São pressupostos para a concessão da medida cautelar a plausibilidade do direito e o


perigo da demora na prestação jurisdicional.

O exato sentido da expressão ‘fumaça do bom direito’ há de ser compreendido como a


possibilidade de discussão da pretensão em uma ação principal. Mesmo porque o direito
a ser discutido é litigioso e por isso mesmo não precisa se mostrar evidente.

Tutela-se na via da ação cautelar a higidez da relação jurídica discutida no processo dito
principal, visando a garantia da utilidade da prestação jurisdicional.

No caso concreto, num juízo superficial e preambular, vejo que estão presentes estes
requisitos.

Os fatos alegados estão comprovados através dos documentos juntados, notadamente o


da fl. 17, pelo que passo a analisar as suas repercussões jurídicas.

Com efeito, a situação regulada pela Lei Complementar nº 64/90, artigo 1º inciso II, alínea
‘I’, c/c inciso IV, alínea ‘a’, passou a ser tratada inteiramente pelo § 2º, do art. 86, da Lei nº
8.112/90.

Por esse motivo, tenho que a regulamentação da matéria em destaque pela Lei nº
8.112/90 apresenta feição inconstitucional, o que sinaliza a possibilidade de o pleito do
autor ser discutido na ação principal indicada na petição inicial.

O perigo da demora decorre dos prejuízos irreparáveis que o autor vem experimentando
em sede de verba alimentar. No particular, vale dizer: as privações alimentares de hoje
jamais poderão ser recompostas pela simples entrega do alimento amanhã.

Por derradeiro, verifico que o art. 1º, da Lei nº 8.437/92 em nada obsta a concessão desta
liminar, eis que os seus efeitos não implicarão em desembolso de qualquer valor por
parte da ré.

Diante dessas razões, CONCEDO a medida liminarmente requerida e DETERMINO a ré


que suspenda os descontos que vem efetuando na remuneração do autor, em razão da
Portaria nº 2.310, de 04.09.2000, a partir do mês em curso.”

2. Em juízo de cognição sumária, não vislumbro a presença dos requisitos aptos a


ensejarem, por ora, a suspensão do decisum agravado, devendo o mesmo ser mantido, a
princípio, por seus próprios fundamentos.

Pelo exposto, indefiro o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao presente feito.”

2. O r. decisum a quo não merece censura, porquanto restaram presentes os


pressupostos aptos a justificarem a concessão da medida liminar pelo juízo de 1º grau.
Logo deve ser mantido por seus próprios e jurídicos fundamentos.

3. Para concessão do pleito liminar é necessária a presença concomitante do fumus


boni iuris e do periculum in mora. Quanto ao primeiro requisito, constato que o mesmo
restou demonstrado na decisão a qua. Ademais, esta Corte Federal possui julgado que,
mutatis mutandis, evidencia a relevância da fundamentação jurídica feita pelo
autor/agravado, a saber:

"CONSTITUCIONAL – ADMINISTRATIVO – HIERARQUIA DAS NORMAS – LEI


COMPLEMENTAR – LEI ORDINÁRIA – LICENÇA REMUNERADA – CARGO ELETIVO.

É cabível a percepção de licença remunerada pelo servidor público durante o período de


afastamento para disputa de cargo eletivo.

(REOMS 93.01.10356-7/PA. Rel.: Juiz Jirair Aram Meguerian. 2ª Turma. Unânime. DJU de
09.11.95.)"

4. Quanto ao periculum in mora, não resta dúvida da sua presença, porque cuida-se de
descontos que estão sendo feitos na remuneração percebida pelo agravado. Logo, não
será fácil o retorno ao status quo ante, porque são verbas de caráter alimentar.

Pelo exposto, nego provimento ao presente agravo de instrumento.

É como voto.

Juiz JIRAIR ARAM MEGUERIAN


Relator

Consulta em Destaque Imprimir

Título:

SERVIDO
R
PÚBLICO
- AGENTE
PENITEN
CIÁRIO -
POSSIBIL
IDADE
DO
EXERCÍCI
O DA
ADVOCA
CIA -
COMPETÊ
NCIA DO
ESTADO
PARA
REGULAR
A
RELAÇÃO
ESTATUT
ÁRIA -
MATÉRIA
ESTRANH

APRECIA
ÇÃO DA
OAB

CONSULTAS EM DESTAQUE - 642/07/FEV/2002

SERVIDOR PÚBLICO - AGENTE PENITENCIÁRIO - POSSIBILIDADE DO


EXERCÍCIO DA ADVOCACIA - COMPETÊNCIA DO ESTADO PARA
REGULAR A RELAÇÃO ESTATUTÁRIA - MATÉRIA ESTRANHA À
APRECIAÇÃO DA OAB.

ORIENTAÇÃO JURÍDICA.5

EMENTA: Agentes públicos - Funções - Incompatibilidades e impedimentos.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL: Arts. 27, 28 e 44 da Lei nº 8.906/94.

1. Servidor público estadual ocupante de cargo de agente penitenciário questiona sobre


a possibilidade do exercício concomitante da advocacia. Não obstante manifestação da
OAB, a competência para disciplinar a relação entre o servidor e o Poder Público é da
pessoa jurídica de direito público interno. As incompatibilidades e impedimentos dos
servidores públicos dependem de edição de lei estadual sobre a matéria.

I - CONSULTA.

O conteúdo da consulta possui o seguinte teor:

“1. Entende a Ordem dos Advogados do Brasil, através de um parecer jurídico, em


considerar o cargo de Agente Penitenciário de natureza policial. 2. Preliminarmente,
cumpre ressaltar que o agente penitenciário é, antes de tudo, um servidor público regido
pelo Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado. 3. O pessoal penitenciário é
dividido em três categorias: o pessoal administrativo, que inclui, além do diretor, outros
servidores com funções de direção e chefia (diretor-adjunto, chefes de unidade, chefes
de equipe, chefe de divisão, auxiliares de administração, etc.); o pessoal especializado
ou técnico (médicos, dentistas, psicólogos, assistentes sociais, etc.); o pessoal de
vigilância (da guarda interna); 4. Quanto aos agentes penitenciários, a opinião
praticamente unânime dos estudiosos da matéria é de que, considerados como da
guarda interna, devem ser funcionários civis e não com formação militar. 5. O fato de o
agente penitenciário receber, evidentemente, uma formação específica, não quer dizer
que ele tenha uma formação militar ou policial, como entende a Ordem dos Advogados
do Brasil, já que ele não exerce uma atividade policial de qualquer natureza. 6. Por esse
motivo, questiono se há incompatibilidade entre a atividade das funções do cargo de
agente penitenciário e o exercício da advocacia, com fundamento no art. 28, inciso V, do
Estatuto da Advocacia”.

II - FUNDAMENTOS LEGAIS E JURISPRUDENCIAIS.

Preliminarmente, é preciso restringir o questionamento proposto em consulta a partir da


relação travada entre o servidor (agente penitenciário) e a Administração Pública, e não
propriamente em relação ao exercício da advocacia perante a Ordem dos Advogados do
Brasil, impedimentos e incompatibilidades, matéria que refoge ao objeto desta
Consultoria.

Nesse sentido e como bem assevera o Consulente, é imperioso verificar a legislação


estatutária, consoante o vínculo entre os titulares de cargos e do Estado.

A premissa para tal raciocínio é de que o Estado, nos termos da repartição


constitucional de competência, detém poder expresso para regular a relação com seus
servidores, através do seu estatuto e não mediante pareceres ou recomendações da
Ordem dos Advogados do Brasil. A própria legislação federal da advocacia dispõe que
inexiste vínculo funcional ou hierárquico entre a OAB e a Administração Pública.

De outra parte, a Ordem dos Advogados do Brasil como entidade regulamentadora e


fiscalizadora da advocacia deve se pronunciar exclusivamente quanto aos seus filiados
ou pretensos filiados, e não em relação aos agentes públicos estaduais. Portanto, o
assunto em tela não é de competência daquela entidade representativa, mas relativo à
autonomia que possuem os estados para legislar sobre seus servidores.

Os principais dispositivos do Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/94) referentes à


consulta em epígrafe, em síntese, são os que seguem:

“Art. 27. A incompatibilidade determina a proibição total, e o impedimento, a proibição


parcial do exercício da advocacia.

Art. 28. A advocacia é incompatível, mesmo em causa própria, com as seguintes


atividades:

(...)

V - ocupantes de cargos ou funções vinculados direta ou indiretamente a atividade


policial de qualquer natureza;

Art. 44. A Ordem dos Advogados do Brasil (ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL),
serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tem por finalidade:

I - defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os


direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida
administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas;

II - promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos


advogados em toda a República Federativa do Brasil.

§ 1º. A ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL não mantém com órgãos da


Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico.

§ 2º. O uso da sigla ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL é privativo da Ordem dos
Advogados do Brasil”.

Por outro lado, o entendimento jurisprudencial (TRF) sobre o tema suscitado aponta,
genericamente, para as informações constantes da consulta e parecer da OAB, a não ser
nos casos de desvio de função. Se não vejamos:

“Origem: TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO.

Classe: AMS - Apelação em Mandado de Segurança.

Processo: 96.02.02686-3.

UF: RJ.

Órgão Julgador: Segunda Turma.

Data da Decisão: 04.6.1997.

Documento: TRF - 200048399.

DJ Data: 05.8.1997, p. 59.

Ementa:

Administrativo - Advogado - Inscrição nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil -


Impedimentos - Cargo de agente penitenciário - Desvio de função.

I - Se o ocupante de cargo de agente penitenciário exerce, legalmente, função


inteiramente diversa daquela inerente a seu cargo, não se pode dizer que estará
exercendo a função desse cargo. A proibição de inscrição nos quadros da Ordem dos
Advogados do Brasil, quanto ao policial, tem a ver com o exercício da função do cargo.
Se está afastado dessas funções, exercendo outra, de advogado, não incidirá na
proibição de inscrever-se na Ordem dos Advogados do Brasil, enquanto perdurar o
afastamento. O exercício do cargo é que cria a incompatibilidade. Se o impetrante exerce
efetivamente a advocacia, não desempenhando qualquer atividade direta ou indireta de
policial, estando positivado o desvio funcional por ato administrativo regular, impõe-se a
inscrição, se a nova função exercida pelo servidor não se insere entre aquelas geradoras
da incompatibilidade.

II - Recurso provido.

Origem: Tribunal - Quarta Região.

Classe: AMS - Apelação em Mandado de Segurança.


Processo: 96.04.14511-8.

UF: RS

Órgão Julgador: Terceira Turma.

Data da Decisão: 13.11.1997.

Documento: TRF - 400056428.

DJ Data: 10.12.1997, p. 108.280.

Ementa:

Administrativo. Funcionário público. Agente penitenciário.

Inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil. Incompatibilidade. Art. 28 da Lei nº


8.906/94.

1. Não merece reparos a decisão que denegou a segurança para que o impetrante,
agente penitenciário, pudesse obter a inscrição na ORDEM DOS ADVOGADOS DO
BRASIL, pois resta caracterizada a incompatibilidade de que trata o art. 28 da Lei nº
8.906/94.

2. Apelação improvida”.

Em vista do exposto, responde-se objetivamente ao questionamento proposto,


remetendo à legislação estadual da Administração consulente as normas relacionadas
com eventuais incompatibilidades ou impedimentos que possam existir entre o exercício
das funções de agente penitenciário e a advocacia. Reitera-se, portanto, que a matéria
questionada se vincula à autonomia estatal em normatizar a relação com seus agentes
públicos, não restando descabida a interferência da OAB neste caso. No entanto, a
jurisprudência colacionada acima dá conta de que, em verdade, as referidas funções são
incompatíveis por considerar a atividade do agente penitenciário como “policial de
qualquer natureza”.

Salvo melhor juízo, essa é a orientação da Consultoria Zênite, elaborada de acordo com
os subsídios fornecidos pelo Consulente.

5
Orientação jurídica a consulta formulada por assinante do IDAF cuja identificação foi
propositadamente omitida, elaborada pela Consultoria Zênite.

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Título:
Agente
político -
Denúncia
por crime
de
responsa
bilidade -
Defesa
pela
Procurad
oria
Jurídica
Municipal
-
Impossibi
lidade

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 457/17/DEZ/2002

PERGUNTA 1

A Procuradoria Geral do Município pode defender diretamente o Prefeito Municipal em


denúncia de crime de responsabilidade ou essa defesa terá de ser patrocinada por
advogado particular?

RESPOSTA

Interessa quanto ao conteúdo da indagação detalhar o aspecto no qual a Administração


Pública, sempre com fundamento na lei, distribui o exercício de atividades públicas a
organismos que lhe integram, isto é, que não gozam de personalidade própria e que se
denominam “órgãos públicos”, que, nos dizeres de Celso Antônio Bandeira de Mello,
“são unidades abstratas que sintetizam os vários círculos de atribuições do Estado.” 1

Órgãos públicos, então, correspondem a repartições despersonalizadas, integrantes da


estrutura organizacional do Poder Público, acometidas, mediante lei formal, do exercício
de determinado plexo de atribuições, nominado de “competência”.

É indispensável destacar as palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello: “(...) a


competência pode ser conceituada como o círculo compreensivo de um plexo de
deveres públicos a serem satisfeitos mediante o exercício de correlatos e demarcados
poderes instrumentais, legalmente conferidos para a satisfação de interesses públicos.” 2

Feitas essas anotações preliminares, é mister considerar que as Procuradorias


Municipais, por evidente, são órgãos públicos e, portanto, podem praticar apenas e tão-
somente as atividades que lhes são conferidas pela lei, nos estritos limites da
competência outorgada pelo ordenamento jurídico.

Adotando-se tal seqüência de idéias, as procuradorias jurídicas destinam-se a promover


a defesa dos interesses da municipalidade, mais precisamente da pessoa jurídica de
direito público interno (União, Estados, Municípios e Distrito Federal), onde estão
envolvidos aspectos relativos à atividade administrativa amplamente considerada, não
se confundindo, portanto, com interesses pessoais de agentes políticos.

A confirmar esta assertiva está o argumento de que se o Prefeito foi acusado de prática
de crime de responsabilidade, a Procuradoria Jurídica (que cuida dos interesses da
pessoa jurídica) pode figurar no pólo oposto da relação, que seja, o de defesa do
Município e do erário, tomando providências contrárias aos interesses do agente
político.

Por essa razão, sendo processada a pessoa do Prefeito Municipal, é de se sustentar que
não caberia à Procuradoria respectiva patrocinar a sua defesa, haja vista que, em
primeira análise, os interesses em jogo na demanda judicial não envolvem aqueles
pertencentes ao Município, mas do agente político. Permitir-se raciocínio contrário –
reafirmando-se o posicionamento acima posto –, incidir-se-ia em contradição
inarredável, uma vez que, não raro e frente a determinadas circunstâncias, a própria
Procuradoria Jurídica deve tomar medidas judiciais contra os agentes públicos, sejam
agentes políticos ou sejam servidores. Logo, poder-se-ia, então, eventualmente cogitar
da hipótese em que Procuradoria, hora defenderia e hora acusaria o agente público,
hipótese que se apresenta, tanto nos planos jurídico, ético, moral e lógico, descabida.

Logo, devido à natureza da função a ser exercida pela Procuradoria Jurídica de uma
pessoa jurídica de direito público interno, não lhe cabe a defesa pessoal de agente
público.

1
Curso de direito administrativo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 106.
2
Op. cit., p. 110.

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Título:

Agentes
Públicos -
Indenizaç
ões -
Diárias -
Prefeito e
Vice-
Prefeito -
Critério
de
fixação
de
valores

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 270/15/OUT/2002


PERGUNTA 4

Qual dos Poderes instituídos deve fixar o valor de diárias de Prefeito e


Vice-prefeito? O Chefe do Executivo face à autonomia do Poder Executivo
para tratar de assuntos internos ou a Câmara Municipal, para atender aos
princípios constitucionais da moralidade e impessoalidade?

RESPOSTA

De início, há que se ressaltar a necessidade de verificar a normatização própria e


específica sobre o assunto de cada um dos entes da Federação, uma vez que todos
detém competência para legislar e emitir regulamentos que autorizam, ou não, o
pagamento de diárias no âmbito municipal (ou quaisquer outras espécies de
indenizações), o valor a ser a ela atribuídos, as circunstâncias de sua concessão e em
quais hipóteses o Prefeito e Vice-Prefeito as receberão.

A título ilustrativo, no âmbito da União, o Decreto nº 3.643, de 26.02.2000 1 regulamenta o


valor das diárias dos servidores federais previstas no art. 58 e seguintes da Lei Federal
nº 8.112, de 11.12.1990 (Regime Jurídico dos Servidores Públicos da União). O
Presidente e Vice-Presidente da República, na verdade, não recebem diárias, mas
apenas os membros de suas comitivas. Aqueles recebem verbas próprias para seus
gastos com viagens.

No âmbito do Estado de São Paulo, a Lei nº 10.261, de 28.10.68 (Estatuto dos


Funcionários Públicos Civis do Estado), há, por igual, disciplina sobre a matéria,
atribuída, pela citada Lei, que o valor das diárias serão fixados por Decreto (§ 5º do art.
144 e art. 146).2

Por outro lado, em certos Municípios e Estados, não há a previsão de diárias, e sim o
regime de adiantamento para seus servidores, como outra forma de indenização. Em
qualquer dos casos, deve existir lei criando a espécie de indenização (diárias,
adiantamento, etc.), e decreto regulamentando valores e forma de concessão.

A diária é uma das espécies de indenização ao servidor que, ao afastar-se da sede em


caráter eventual ou transitório, receberá um quantum para as parcelas de despesas
extraordinárias como pousada, alimentação e locomoção urbana. Vê-se assim o caráter
indenizatório e não remuneratório de tais verbas.3

Conforme Cármen Lúcia Antunes Rocha, as diárias indenizadas “visam deixar sem dano
o patrimônio daquele que a ela tem direito, pelo que, evidentemente, jamais se poderia
deixar de indenizá-lo”.4 A própria autora aduz ainda que “as indenizações são
recomposições de valor gasto em razão do próprio serviço, pelo que são situações
precárias, com motivação específica e prevista em lei”. (Grifamos.)

Desta forma, e com base no raciocínio exposto, qualquer indenização, como por
exemplo, as diárias a serem concedidas aos agentes públicos – nesta categorias
incluídos os agentes políticos, Prefeito e Vice-Prefeito – devem ter previsão expressa em
lei formal que, no caso dos municípios, tramitará segundo as normas do processo
legislativo e receberá a devida apreciação pelas respectivas câmaras municipais.

Já no que tange ao seu valor, critérios e forma de concessão poderá ser fixado por
Decreto do Poder Executivo ao regulamentar a lei que criou a referida indenização.

1
Altera, entre outros, o Decreto nº 343, de 19.11.91, que dispõe sobre a concessão de
diárias no Serviço Público Civil da União.
2
“Art. 146 A tabela de diárias, bem como as autoridades que as concederem, deverão
constar de decreto”.
3
Para fins de contribuição à Previdência Social, via de regra, as diárias não são
consideradas como remuneração, a não ser que elas excedam a 50% da remuneração
mensal do servidor (Lei nº 9.783, de 28.01.99).
4
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos.
São Paulo: Saraiva, 1999. p. 313.

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Título:

Agente
Político -
Vereador
-
Inexistên
cia de
direito ao
13º
salário

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 259/39/OUT/2004

PERGUNTA 5 - AGENTE POLÍTICO

É devido o pagamento de 13º salário para os vereadores?

Os agentes políticos, aí enquadrados os vereadores, constituem categoria própria de


agentes públicos.(Nota 1) O vínculo que tais agentes possuem com o Estado não é de natureza
profissional, mas de natureza política.

Por possuírem vínculo essencialmente político, de caráter transitório, não são assegurados aos
agentes políticos os mesmos direitos e garantias inerentes ao regime constitucional dos
servidores públicos. É o que se extrai, por exemplo, do disposto nos §§ 3º e 4º do art. 39 da
Constituição da República:

Art. 39 A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselho de política de


administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos
Poderes.

(...)

§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII,
XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de
admissão quando a natureza do cargo o exigir.

§ 4º O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários


Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única,
vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou
outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI.

Como se nota, o § 3º do art. 39 assegura aos servidores públicos, entre outros direitos, o de
receber o 13º salário (ao fazer remissão ao art. 7º, inc. VIII). Contudo, o § 4º do art. 39, ao
tratar da remuneração dos agentes políticos, que ocorre mediante subsídio, (Nota 2) não faz
menção ao 13º salário.

Diante da interpretação sistemática dessas disposições, é possível aferir que o direito ao 13º
salário somente alcança os titulares de cargos públicos, não os agentes políticos, (Nota 3) aí
incluídos os vereadores.

Tendo em vista que cabe ao poder constituinte ditar as normas sobre a organização
dos poderes, aí englobadas as regras básicas do regime dos agentes públicos, como não é
assegurado constitucionalmente o direito ao 13º salário aos agentes políticos, não é devido o
pagamento desse benefício pelo Poder Público Municipal aos vereadores.

Por fim, cabe informar, o Tribunal de Contas do Estado do Paraná (Resolução nº 5171/96-TC;
Resolução nº 2165/96-TC) e o Tribunal de Contas do Pará (Acórdão TC nº 274/2000) já se
pronunciaram expressamente no sentido de que não é devido o 13º salário aos vereadores.

(Nota 1)
Agentes públicos são todas as pessoas que prestam serviços ao Estado, podendo ser
divididos nas seguintes categorias: agentes políticos, servidores públicos, militares e
particulares em colaboração com o Poder Público.
(Nota 2)
Aqui, é interessante mencionar que o subsídio inicialmente constituía retribuição destinada
somente aos agentes políticos passando, a partir da Emenda Constitucional nº 19/98, a ser
forma de remuneração de determinados agentes públicos. O subsídio consiste em uma parcela
definida por lei, que não admite variações. Ressalte-se, todavia, que a remuneração por
subsídio não exclui a possibilidade de incidência de outros valores assegurados pela
Constituição ou de lei, sobre o subsídio do agente político.
(Nota 3)
É interessante salientar que há quem entenda que os secretários municipais têm direito
ao 13º salário, em razão de estarem investidos em cargo em comissão. Nesse sentido, já
decidiu o TCE/PR (Resolução 12333/99-TC).

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Título:

Agentes
públicos -
Desconto
em folha
de
pagamen
to por
decisão
judicial
em ação
de
alimentos
- Retorno
do
servidor
ao
convívio
familiar -
Pedido
administr
ativo
para
cancelam
ento do
desconto
-
Necessid
ade de
novo
pronuncia
mento
jurisdicio
nal

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 926/22/MAI/2003

PERGUNTA 2

Decisão judicial em ação de alimentos determina que servidor tenha consignado em


folha o desconto relativo à pensão alimentícia, em favor de seu filho menor que se
encontra sob a guarda de sua mãe, que o representa. Ocorre que o referido servidor
requereu administrativamente o cancelamento dessa consignação, alegando o retorno à
convivência familiar com sua ex-esposa, juntando, inclusive, requerimento em que esta
pede ao magistrado o cancelamento do desconto de pensão alimentícia, em razão da
volta ao convívio familiar. Porém, até a presente data, não chegou a este setor qualquer
ordem judicial para suspender tal consignação em folha. Indaga-se, assim, se tal
requerimento administrativo deverá ser deferido?

RESPOSTA

O assunto em tela faz menção ao instituto da consignação compulsória em folha de


pagamento, decorrente de decisão judicial em ação de alimentos.

As normas aplicáveis ao caso concreto contidas na Lei nº 8.112/90 e regulamento,


consubstanciado no Decreto nº 3.297/99, dispõem:

"Lei nº 8.112/90:

Art. 45 Salvo por imposição legal, ou mandado judicial, nenhum desconto incidirá sobre
a remuneração ou provento.

Parágrafo único. Mediante autorização do servidor, poderá haver consignação em folha


de pagamento a favor de terceiros, a critério da administração e com reposição de
custos, na forma definida em regulamento.

Decreto nº 3.297/99:

Art. 1º Os órgãos do Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal (SIPEC) devem


observar, na elaboração da folha de pagamento dos servidores públicos civis da
Administração direta, autárquica e fundacional do Poder Executivo da União, as regras
estabelecidas neste Decreto, relativamente às consignações compulsória e facultativa.

Art. 2º Considera-se, para fins deste Decreto:

(...)

III - consignação compulsória: desconto incidente sobre a remuneração do servidor,


efetuado por força de lei ou mandado judicial; e

IV - consignação facultativa: o desconto incidente sobre a remuneração do servidor,


mediante sua autorização prévia e formal, e anuência da Administração.

Art. 3º São consideradas consignações compulsórias:

(...)

III - pensão alimentícia judicial;

(...)

VII - decisão judicial ou administrativa;

(...)

Art. 6º O pedido de consignação de pensão alimentícia voluntária será instruído com a


indicação do valor ou percentual de desconto sobre a remuneração, conta bancária em
que será destinado o crédito e a autorização prévia e expressa do consignatário ou seu
representante legal.

Art. 17 A consignação facultativa pode ser cancelada:

I - por interesse da Administração;

II - por interesse do consignatário, expresso ou por meio de solicitação formal


encaminhada ao órgão setorial ou seccional do SIPEC; ou

III - a pedido do servidor, mediante requerimento endereçado ao órgão setorial ou


seccional do SIPEC".

Da análise dos dispositivos legais acima transcritos, dessume-se que os valores da


pensão alimentícia podem ser consignados facultativa ou compulsoriamente em folha de
pagamento dos servidores.

Quanto às consignações compulsórias, não há previsão legal de cancelamento por via


de requerimento administrativo. Nem poderia ser diferente, porque somente uma nova
decisão judicial, na hipótese de ação de alimentos, é que possui o condão de desobrigar
o desconto em folha. Do contrário, o administrador poderia ser responsabilizado pelo
descumprimento de ordem judicial. Ilustrativamente, imagine-se a ocorrência de
despacho judicial pelo indeferimento do pedido de cancelamento do desconto em folha e
já tendo sido processado tal cancelamento pela via administrativa. Tal circunstância
traria uma série de transtornos para o a Administração Pública.

Assim, é de se concluir que a consignação compulsória de pensão alimentícia, em folha


de pagamento em razão de determinação judicial, somente pode ser cancelada ou
suspensa mediante emissão de outra decisão judicial no sentido postulado pelo
servidor, devendo ser indeferido o requerimento administrativo nesse sentido.

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Título:

Agentes
Públicos -
Ação de
ressarcim
ento por
danos
causados
ao erário
-
Imprescri
tibilidade

PERGUNTAS E RESPOSTAS – 69/13/AGO/2002

PERGUNTA 6

Instaurada sindicância para fins de apurar acidente envolvendo servidor


público federal e veículo oficial (ocorrido a mais de 2 anos e menos de 5
anos), resultou a aplicação da penalidade de advertência ao servidor, bem
como o ressarcimento ao erário pelos prejuízos causados. Depois de
proferida a decisão administrativa, verificou-se a existência de vício
insanável na sindicância. Nesse caso, pode a administração instaurar
novo procedimento disciplinar que permita apurar o ilícito praticado pelo
servidor com o conseqüente ressarcimento ao erário, se assim for
decidido?

RESPOSTA

O § 5º do art. 37 da Constituição da República é claro ao dispor que não prescreve a


ação de ressarcimento por prejuízos que os servidores públicos causarem aos cofres
públicos.

No plano doutrinário Celso Antônio Bandeira de Mello sustenta que é “imprescritível a


ação de ressarcimento por ilícitos praticados por qualquer agente que cause prejuízo ao
erário (art. 37, § 5º)”.1 No mesmo sentindo se manifestou o Tribunal de Contas de União,
no acórdão 12/1998 da 2ª Câmara.

O que prescreve, na verdade, é a atuação da Administração Pública através do poder


disciplinar para a aplicação de sanções, como as estipuladas pelo art. 142 da Lei nº
8.112/90.

A título exemplificativo, o TRF 2ª Região tende à imprescritibilidade das ações de


ressarcimento de prejuízos causados ao patrimônio público (AG, Processo 9802257940 e
AG, Processo 9802257974).

Sobre a imprescritibilidade, Manoel Gonçalves Ferreira Filho informa que essa “é sempre
condenada pela doutrina, seja qual for o seu campo; entretanto, a constituinte
demonstrou por ela um entusiasmo perverso e vingativo.”2

Ante o exposto, verifica-se que se o processo disciplinar foi considerado nulo, a decisão
pela aplicação de advertência e pelo ressarcimento também são nulas. Deve a
Administração, assim, instaurar novo processo administrativo disciplinar, com o intuito
de averiguar a culpa do servidor em questão, e se esse realmente terá que ressarcir os
cofres públicos.

De qualquer forma, em face do que regulamenta a Lei nº 8.112/90, a atuação disciplinar


visando aplicar sanções de suspensão e advertência estará prescrita. Apenas a
demissão, nos termos da referida lei, por ainda não ter passado os 5 anos legalmente
previstos, poderá ser aplicada como sanção, se for o caso, após a realização de novo
processo disciplinar.

Portanto, entende-se que, em face ao que dispõe o § 5º do art. 37 da Constituição da


República, as ações de ressarcimento ao erário não prescrevem e a Administração pode
instaurar novo procedimento disciplinar, se o inicial foi anulado, com o intuito de aferir
se será realmente o caso de ressarcimento ao erário por parte do servidor em questão.
As sanções de advertência e suspensão encontram-se prescritas, em face ao que dispõe
a Lei nº 8.112/90.

1
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 11. ed. São Paulo:
Malheiros, 1999. p. 198.
2
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição brasileira de 1988. 2.
ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 253.

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Título:

Agentes
públicos -
Titular do
cargo de
médico -
Exercício
de
função
de diretor
de
hospital
privado -
Vedação
expressa
-
Atividade
na
iniciativa
privada -
Acionista
-
Possibilid
ade - Art.
117, inc.
X, da Lei

8.112/90

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 461/28/NOV/2003

PERGUNTA 2

Em face da vedação prevista no art. 117 da Lei nº 8.112/90, pode servidor


concursado, titular de um cargo de médico, ser diretor clínico de hospital
particular, considerando que também é acionista do mesmo? Poderá,
ainda, o mesmo servidor ser acionista de uma sociedade limitada e,
também, seu Diretor Presidente?

RESPOSTA

Convém salientar que a Constituição da República não veda, genericamente, o acúmulo do


exercício de cargo ou emprego público com outras atividades privadas.

Assim, inexistindo incompatibilidade de horários entre o desempenho das atividades do


servidor no órgão em que está lotado e, uma vez que a exploração de atividade econômica
(empresarial) também não prejudique, de qualquer outra forma, o exercício de suas funções
públicas, entende-se não haver óbice que o impeça de exercer atividade privada.

Ilustrativamente, traz-se expediente da Secretaria de Recursos Humanos do Ministério de


Orçamento Planejamento e Gestão, que corrobora a afirmativa acima:

Ofício nº 448/98/COGLE/DENOR/SRH/MARE

(...)

1. A Lei nº 8.112, de 11.12.90, estabelece os direitos e deveres dos servidores públicos


civis da União. No art. 117, comina as proibições, em especial as previstas nos incisos IX,
X, XII, XVI e XVIII, todas de caráter inerente ao exercício de cargo ou função pública.
Infere-se dos referidos dispositivos legais, que o servidor enquanto servidor público, deverá
observar a proibição de “valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em
detrimento da dignidade da função pública”, de “Participar de gerência ou administração de
empresa privada, de sociedade civil, ou exercer o comércio, exceto na qualidade de
acionista, cotista ou comanditário”, “receber propina, comissão, presente ou vantagem de
qualquer espécie, em razão de suas atribuições”, “utilizar pessoal ou recursos materiais da
repartição em serviços ou atividades particulares” “exercer quaisquer atividades que sejam
incompatíveis com o exercício do cargo ou função e com o horário de trabalho”,
respectivamente os incisos IX, X, XII, XVI, e XVIII.

2. Ademais, a referida Lei proibiu a acumulação de cargos públicos, estendida a cargos,


empregos e funções em autarquias, fundações públicas, empresas públicas, sociedades
de economia mista da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Territórios e dos
Municípios, não mencionando a iniciativa privada, e condicionando a acumulação lícita à
comprovação da compatibilidade de horários (art. 118, caput e §§ 1º e 2º).

(...)

3. Depreende-se, portanto, da legislação em vigor, que não há impedimento legal


expresso quanto ao desempenho de atividade na iniciativa privada, respeitados os
ditames legais do Regime Jurídico Único, e observando-se a compatibilidade de
horários.

(...)

Desta feita, servidor público federal ocupante de cargo efetivo poderá desempenhar
atividades na iniciativa privada desde que observe as proibições e deveres do Regime
Jurídico e a compatibilidade de horários, excetuando-se os servidores ocupantes de cargo
em comissão, que deverão ter dedicação integral.

Atenciosamente,

PAULO APARECIDO DA SILVA

Coordenador-Geral de Sistematização e Aplicação da Legislação (Grifamos.)

O fundamento para adoção desse entendimento encontra-se na própria Constituição da


República que, em seus arts. 1º e 170, consagra o direito à livre iniciativa e ao trabalho como
uma das colunas basilares do nosso Estado Democrático de Direito.

Contudo, a possibilidade do servidor em voga exercer atividades empresariais deve passar


ainda pelo crivo da constatação da inexistência de impedimento no Estatuto dos Servidores
Civis da União.

Veja-se o que determina o art. 117, inc. X da Lei nº 8.112/90:

Art. 117 Ao servidor é proibido:

(...)

X - participar de gerência ou administração de empresa privada, de sociedade civil, salvo


a participação nos Conselhos de administração e fiscal de empresas ou entidades em que
União detenha, direta ou indiretamente, participação do capital social, sendo-lhe vedado
exercer o comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comandatário. (Grifamos.)

Em vista desse dispositivo legal, há expressa vedação à possibilidade de um servidor


participar de gerência ou administração de sociedade civil ou empresa privada, restando-lhe
a opção de figurar como “acionista, cotista ou comandatário”.

Nada impede, portanto, que o servidor, na situação cogitada na pergunta, seja acionista de
hospital particular e sociedade limitada, porém está impedido de exercer qualquer espécie de
ato de gerência. Tal afirmativa conduz à evidente conclusão de que são ilegais as situações
aventadas, quais sejam, que o servidor detenha as funções de diretor presidente e diretor
clínico.1

Vale lembrar que a inobservância, desse e de outros comandos legais enseja, à luz da Lei nº
8.112/90, a instauração de processo administrativo disciplinar, podendo acarretar até mesmo a
demissão do servidor (art. 132, inc. XIII).

Em conclusão, o Estatuto dos Servidores Civis da União, em seu art. 117, inc. X, proíbe, de
maneira inequívoca, que os servidores públicos participem de gerência e administração de
empresa privada e sociedade civil, cabendo-lhe apenas a condição de acionista.

* Esta seção é elaborada pelo Corpo de Consultores da Consultoria Zênite.


1
Destaca-se que ao se fazer uma busca no site do Ministério do Trabalho e Emprego,
encontrou-se na Classificação Brasileira de Ocupações a seguinte descrição sumária de diretor
clínico: Planejam, coordenam e avaliam ações de saúde; definem estratégias para unidades de
saúde; administram recursos financeiros; gerenciam recursos humanos e coordenam
interfaces com entidades sociais e profissionais. Disponível em <http//:www.mte.gov.br>.
(Grifamos.)

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Título:

Agentes
Públicos -
Cargos e
emprego
s públicos
-
Considera
ções

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 367/16/NOV/2002

PERGUNTA 6
A Administração Pública direta e, ainda, as autarquias, podem ter empregados e
servidores? Qual a diferença entre empregado e servidor?

RESPOSTA

Preliminarmente, insta consignar que integram a Administração Pública indireta as


autarquias, fundações públicas, empresas públicas, sociedades de economia mista,
sendo que as duas primeiras são regidas integralmente por normas de direito público,
pois são detentoras de personalidade jurídica de direito público; e, as demais são
dotadas de personalidade jurídica de direito privado, regendo-se por regras de direito
privado, no entanto, não exclusivamente.

O cerne do questionamento em voga refere-se à diferenciação jurídica entre “servidor


público” e “empregado público”.

Neste passo, recorre-se à construção da doutrina a respeito do tema.

Na categoria de “agentes públicos” destaca-se a dos servidores públicos que, nas lições
de Maria Sylvia Di Pietro, “em sentido amplo, são as pessoas físicas que prestam
serviços ao Estado e às entidades da Administração indireta, com vínculo empregatício e
mediante remuneração paga pelos cofres públicos.”1

Os prestadores de serviços, com vínculo empregatício são considerados nas preleções


da mesma jurista como empregados públicos2. Infere-se, portanto, que o termo “servidor
público” é utilizado para identificar o gênero, que nessa hipótese, o “empregado
público” é uma das espécies.

Nessa esteira, a diferenciação ocorre entre os servidores ocupantes de cargos e os


detentores de emprego público. Veja-se essa diferença.

Os servidores públicos detêm cargos ou empregos públicos, sendo que no primeiro


caso, aplica-se o regime estatutário, ou seja, mantém uma relação institucional com o
Estado e, no segundo, a relação é contratual, regida pela CLT.

Nesse sentido, a natureza do vínculo entre os titulares de cargos e o Estado é estatutária


(ou institucional), não sendo , portanto, de natureza contratual, e são regidos pelas leis
próprias de cada esfera. Já a natureza do vínculo entre os ocupantes de emprego e o
Estado é celetista (ou trabalhista), de natureza contratual e regidas pela Consolidação
das Leis do Trabalho (CLT) – Decreto-Lei nº 5.452, de 01.05.43. 3

Celso Antônio Bandeira de Mello assevera que:

"... embora o regime de cargo tenha que ser o normal, o dominante, na Administração
direta, autarquias e fundações de Direito Público, há casos em que o regime trabalhista
(nunca puro, mas afetado, tal como se averbou inicialmente, pela interferência de
determinados preceitos de Direito Público) é admissível para o desempenho de algumas
atividades; aquelas cujo desempenho sob o regime laboral não compromete os objetivos
que impõem a adoção do regime estatutário como o normal, o dominante". 4 (Grifamos.)

Em face do exposto, depreende-se que podem compor os quadros da Administração


Pública direta e autárquica, tanto os servidores ocupantes de cargo quanto os de
emprego público. No que tange à Administração indireta, especificamente, às
sociedades de economia mista e empresas públicas, são, por mandamento
constitucional, celetistas.

Assim, em que pese a regra geral ser a titularização de cargos, a própria Constituição
Federal prevê a possibilidade de certas atividades serem desenvolvidas por empregados
públicos, sob o regime celetista.

Ressalte-se que o acesso aos cargos e empregos públicos deve se dar mediante
concurso público, conforme se deflui do art. 37, inc. I, da Constituição da República e em
todos os casos devendo ser assegurado tratamento igualitário entre aqueles que tenham
interesse em manter vínculo com o Poder Público, seja estatutário ou celetista.

1
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 12. ed., São Paulo: Atlas, 2000,
p. 417.
2
Para Maria Sylvia Di Pietro, servidores públicos compreendem: a) servidores
estatutários, sujeitos ao regime estatutário e ocupantes de cargos públicos; b)
empregados públicos, contratados sob o regime da legislação trabalhista e ocupantes
de empregos públicos; c) servidores temporários, contratados por tempo determinado
para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público (art. 37, IX, CF).
3
Sobre o tema, Celso Antônio Bandeira de Mello dispõe o seguinte: “Nas relações
contratuais, como se sabe, direitos e obrigações recíprocos, constituídos nos termos e
na ocasião da avença, são unilateralmente imutáveis e passam a integrar de imediato o
patrimônio jurídico das partes, gerando, desde logo, direitos adquiridos em relação a
eles. Diversamente, no liame de função pública, composto sob égide estatutária, o
Estado, ressalvadas as pertinentes disposições constitucionais impeditivas, deterá o
poder de alterar legislativamente o regime jurídico dos seus servidores, inexistindo a
garantia de que continuarão sempre disciplinados pelas disposições vigentes quando de
seu ingresso. Então, benefícios e vantagens, dantes previstos, podem ser ulteriormente
suprimidos. Bem por isto, os direitos que deles derivem não se incorporam ao
patrimônio jurídico do servidor (firmando-se como direitos adquiridos), do mesmo modo
que nele se integrariam se a relação fosse contratual.” (Grifamos.) (Curso de Direito
Administrativo, p. 235-236).
4
Curso de direito administrativo, p. 209

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Título:

Efetividad
ee
estabilida
de –
Distinção.

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 570/42/JAN/2005

PERGUNTA 6 - EFETIVIDADE E ESTABILIDADE

Qual a diferença entre efetividade e estabilidade?


A efetividade é um atributo do cargo de provimento efetivo. Diz respeito à característica
de que a pessoa nele investida será, a rigor, seu titular definitivo. Sobre o assunto, interessante
transcrever as considerações feitas por José Afonso da Silva:

Cargo de provimento efetivo é aquele que, segundo a lei, deve ser preenchido em caráter definitivo,
referindo-se essa característica à titularidade do cargo, para indicar que a pessoa nele investida o será
como seu titular definitivo, em princípio, pois isso não impede remoção ou transferência. Opõe-se ao
cargo de provimento em comissão, o que, segundo a lei, será ocupado em caráter transitório,
querendo isso dizer que seu ocupante não é o seu titular definitivo, mas nele permanecerá apenas
enquanto merecer a confiança da autoridade (daí, cargo de confiança) que o indicou ou nomeou. 2

Já a estabilidade é a garantia que tem o servidor público, devidamente aprovado em


concurso público para cargo de provimento efetivo e após a realização do estágio probatório (3
anos de efetivo exercício), de não ser desligado do serviço público senão em virtude de (art.
41, § 1º e art. 169, § 4º da Constituição da República):

a) sentença judicial transitada em julgado;

b) processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa;

c) insuficiência de desempenho apurada em procedimento de avaliação periódica, na


forma de lei complementar, assegurada a ampla defesa;

d) necessidade de redução de despesas com pessoal ativo e inativo para adequação


aos limites estabelecidos na Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei nº 101/2000), mediante ato
normativo motivado com especificação da atividade funcional, o órgão ou unidade
administrativa objeto da redução de pessoal, desde que já tenham sido tomadas as seguintes
medidas previamente: redução de pelo menos 20% das despesas com cargos em comissão e
funções de confiança e exoneração de servidores não estáveis.

Pode-se concluir, então, que enquanto a efetividade é um atributo do cargo de


provimento efetivo – que diz respeito ao fato de que o nomeado, a rigor, será seu titular efetivo
–, a estabilidade é uma garantia do servidor ocupante de cargo dessa natureza, após a
realização do estágio probatório – de não perder o cargo, ressalvados os casos acima
especificados.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

2
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 1999. p.
675.

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Título:

Efetividad
ee
estabilida
de –
Distinção.
PERGUNTAS E RESPOSTAS - 570/42/JAN/2005

PERGUNTA 6 - EFETIVIDADE E ESTABILIDADE

Qual a diferença entre efetividade e estabilidade?

A efetividade é um atributo do cargo de provimento efetivo. Diz respeito à característica


de que a pessoa nele investida será, a rigor, seu titular definitivo. Sobre o assunto, interessante
transcrever as considerações feitas por José Afonso da Silva:

Cargo de provimento efetivo é aquele que, segundo a lei, deve ser preenchido em caráter definitivo,
referindo-se essa característica à titularidade do cargo, para indicar que a pessoa nele investida o será
como seu titular definitivo, em princípio, pois isso não impede remoção ou transferência. Opõe-se ao
cargo de provimento em comissão, o que, segundo a lei, será ocupado em caráter transitório,
querendo isso dizer que seu ocupante não é o seu titular definitivo, mas nele permanecerá apenas
enquanto merecer a confiança da autoridade (daí, cargo de confiança) que o indicou ou nomeou. 2

Já a estabilidade é a garantia que tem o servidor público, devidamente aprovado em


concurso público para cargo de provimento efetivo e após a realização do estágio probatório (3
anos de efetivo exercício), de não ser desligado do serviço público senão em virtude de (art.
41, § 1º e art. 169, § 4º da Constituição da República):

a) sentença judicial transitada em julgado;

b) processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa;

c) insuficiência de desempenho apurada em procedimento de avaliação periódica, na


forma de lei complementar, assegurada a ampla defesa;

d) necessidade de redução de despesas com pessoal ativo e inativo para adequação


aos limites estabelecidos na Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei nº 101/2000), mediante ato
normativo motivado com especificação da atividade funcional, o órgão ou unidade
administrativa objeto da redução de pessoal, desde que já tenham sido tomadas as seguintes
medidas previamente: redução de pelo menos 20% das despesas com cargos em comissão e
funções de confiança e exoneração de servidores não estáveis.

Pode-se concluir, então, que enquanto a efetividade é um atributo do cargo de


provimento efetivo – que diz respeito ao fato de que o nomeado, a rigor, será seu titular efetivo
–, a estabilidade é uma garantia do servidor ocupante de cargo dessa natureza, após a
realização do estágio probatório – de não perder o cargo, ressalvados os casos acima
especificados.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

2
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 1999. p.
675.

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Título:

AGENTES
PÚBLICO
S-
ALTERAÇ
ÃO DE
CARGOS
E
FUNÇÕES
POR
DECRETO
-
PROVIME
NTO
ORIGINÁ
RIO
OCASION
ADO
PELA
APLICAÇ
ÃO DO
DECRETO
-
INCONST
ITUCION
ALIDADE
-
HIPÓTES
E DE
APLICAÇ
ÃO DA
LEI DE
IMPROBI
DADE
(LEI Nº
8.429/92)

CONSULTAS EM DESTAQUE - 909/22/MAI/2003

AGENTES PÚBLICOS – ALTERAÇÃO DE CARGOS E FUNÇÕES POR


DECRETO – PROVIMENTO ORIGINÁRIO OCASIONADO PELA APLICAÇÃO
DO DECRETO – INCONSTITUCIONALIDADE – HIPÓTESE DE APLICAÇÃO
DA LEI DE IMPROBIDADE (LEI Nº 8.429/92).

ORIENTAÇÃO JURÍDICA1

EMENTA: Servidor – Alteração de função através de Decreto – Concurso Público –


Inconstitucionalidade.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL: Art. 37, inc. II, da Constituição da República.

1. Decreto que altera a função dos servidores. Alteração que deve ser feita mediante
edição de lei formal. Provimento originário em carreira diversa daquela para a qual o
servidor foi aprovado em concurso público. Nulidade. Caracterização de burla ao
concurso público. Inconstitucionalidade. Hipótese de aplicação da Lei de Improbidade.

1 CONSULTA

Em 1991, determinado Município realizou concurso público e posteriormente foi


publicado Decreto alterando os cargos dos servidores aprovados no concurso. A fim de
exemplificar a situação, um servidor com cargo de Assistente Administrativo Nível III
passou a titularizar o cargo de Advogado Nível I, entre outros. Ainda, o Decreto
denominou a mudança de cargo de “mudança de função”.

Para tanto, entende-se oportuno transcrever a redação do art. 1º, do mencionado


Decreto:

"Art. 1º Os servidores municipais abaixo discriminados, a partir deste mês, terão as


funções e níveis alterados: (...)"

Diante do exposto, este novo Município deve considerar como correto o cargo em que o
servidor passou no concurso ou o cargo alterado por Decreto? Qual cargo deve ser
considerado que para efeito de aposentadoria, já que o Tribunal de Contas exige toda a
documentação existente a respeito do servidor, inclusive o procedimento de admissão
de pessoal e o Decreto de alteração do cargo?

2 FUNDAMENTOS LEGAIS E DOUTRINÁRIOS

Quanto aos cargos públicos e funções, José dos Santos Carvalho Filho ensina:

"Cargo público é o lugar dentro da organização funcional da Administração Direta e de


suas autarquias e fundações públicas que, ocupado por servidor público, tem funções
específicas e remuneração fixadas em lei ou diploma a ela equivalente.

A função pública é a atividade em si mesma, ou seja, função é sinônimo de atribuição e


corresponde às inúmeras tarefas que constituem o objeto dos serviços prestados pelos
servidores públicos. Nesse sentido, fala-se em função de apoio, função de direção,
função técnica. (...) Todo cargo tem função, porque não se pode admitir um lugar na
Administração que não tenha a predeterminação das tarefas do servidor". (...) 2

Como se observa, cada cargo é diretamente vinculado às funções que lhe são, por lei,
inerentes.

O ingresso nos quadros públicos ocorre, a rigor, através de concurso público (art. 37,
inc. II, da Constituição da República) e, obviamente, sob pena de inconstitucionalidade,
para o preenchimento de determinados cargos, expressamente identificados no
respectivo edital de convocação. À vista dos cargos a serem preenchidos, serão
identificadas as condições necessárias ao desempenho das respectivas funções e
estabelecidos os requisitos para o ingresso.

É pressuposto lógico, então, que o servidor aprovado desempenhará as funções


relativas ao cargo para o qual concorreu e no qual foi provido. Cogitada a hipótese
contrária, ter-se-á desvio de função que, pelo ordenamento jurídico nacional, é ilegal.

Não se concebe, no plano da validade, que o servidor provido em determinado cargo e


ao qual correspondem determinadas e específicas funções, desempenhe outras, dele
desvinculadas. Vê-se, pois, no caso em tela, que houve alteração de carreira,
circunstância que escancara a ilegalidade, pois se o servidor era, p. ex., Assistente
Administrativo Nível III e foi provido no cargo de Advogado Nível I. E mais, não houve
apenas mudança de cargo, função, mas provimento originário em cargo público sem
concurso público, pois também ocasionou mudança de carreiras (no exemplo dado pela
Consulente houve a mudança de servidor de carreira de cunho administrativo para a
jurídica).

Portanto, pelas normas constitucionais vigentes, não mais se admite algumas formas de
provimento derivado, como as “transferências” e “remanejamentos”, a cargos recém-
criados, nos moldes postos nesta Consulta, pois como informa a Administração
Consulente, no Decreto consta disposição expressa alterando as funções e níveis, in
verbis: “Art. 1º Os servidores municipais abaixo discriminados, a partir deste mês, terão
as funções e níveis alterados:...”. Resta, por evidente, ressalvadas eventuais e
excepcionalíssimas hipóteses que possam ser subsumidas ao ordenamento jurídico.

Outra não poderia ser a conclusão: o Decreto em comento fere disposição


constitucional, nos termos acima expostos.

Sobre o assunto, Alexandre Morais alerta que:

"(...) o Supremo Tribunal Federal, ressalvadas as exceções constitucionais, é


intransigente em relação à imposição à efetividade do princípio constitucional do
concurso público3, como regra para todas as admissões da Administração pública,
vedando expressamente tanto a ausência desse postulado, quanto seu afastamento
fraudulento, por meio de transferência de servidores públicos para outros cargos
diversos daquele para o qual foi originariamente admitido". 4-5 (Grifamos.)

O mesmo autor ainda aduz que:

"(...) em conclusão, a investidura em cargos ou empregos públicos depende de


aprovação prévia em concurso público de provas ou provas e títulos, não havendo a
possibilidade de edição de lei que, mediante agrupamento de carreiras, operem
transformações em cargos, permitindo que os ocupantes dos cargos originários fossem
investidos nos cargos emergentes, de carreira diversa daquela para a qual ingressaram
no serviço público, sem concurso público". 6-7 (Grifamos.)

Celso Antônio Bandeira de Mello, seguindo a coerência de posicionamento, ensina que o


concurso público, entre outras coisas,

"(...) propôs-se a impedir tanto o ingresso sem concurso, ressalvadas as exceções


previstas na Constituição, quanto obstar a que o servidor habilitado por concurso para
cargo ou emprego de determinada natureza viesse depois a ser agraciado com cargo ou
emprego permanente de outra natureza, pois esta seria uma forma de fraudar a razão de
ser do concurso público".8 (Grifamos.)

Em síntese, o concurso público é o único meio de provimento originário em cargo ou


emprego inicial da carreira na Administração, não podendo o servidor ser agraciado com
lei ou decreto que afaste as funções inerentes ao cargo no qual foi investido pelo
concurso público.

Logo, havendo alteração no plexo de atribuições do cargo público originário, tal situação
se configura inconstitucional, uma vez que o ingresso nos quadros públicos ocorre
através de concurso público para o preenchimento de cargos expressamente
identificados no edital convocatório, para o exercício de funções específicas de cada
cargo que, por sua vez, foi por lei criada e somente por lei pode ser alterada.

3 CONCLUSÕES

Diante de todo o exposto, respondendo objetivamente à presente Consulta, entende-se


que, levando-se em conta que a investidura de servidores em cargo público, como regra,
depende de aprovação prévia em concurso público, a mudança no plexo de atribuições
através de decreto e não de lei formal não encontra fundamento constitucional,
impedindo o afastamento do instituto do concurso público e das peculiaridades que o
regem para dar lugar à “transferência” de servidor para outro cargo de natureza diversa
daquela para o qual foi originalmente admitido, considerada tal prática uma fraude ao
princípio constitucional do concurso público, situação que encontra plena aplicabilidade
da Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92).

Portanto, somente pode ser considerado válido o provimento no cargo para o qual o
servidor foi aprovado em concurso público, e não aquele alterado por Decreto: as
demais hipóteses são indubitavelmente nulas.

Salvo melhor juízo, essa é a orientação da Consultoria Zênite, elaborada de acordo com
os subsídios fornecidos pela Consulente.

1
Orientação jurídica elaborada pelo Corpo de Consultores da Consultoria Zênite à
consulta formulada por assinante do IDAF cuja identificação foi propositadamente
omitida.
2
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 6. ed. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2000, p. 442-443.
3
Suspensão de Segurança nº 1.081-6/ES, nº 1.082-4/ES, nº 1.085-9.
4
ADIn nº 1.329-7/AL.
5
MORAES, Alexandre. Reforma administrativa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1999, p. 42.
6
Informativo STF, 19 a 23 de agosto de 1996, nº 41, ADIn 231-RJ, ADIn 1.030-SC.
7
Mesma obra, p. 43.
8
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 11. ed. São Paulo:
Malheiros, 1999, p. 193 e 194.

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Título:
Cargo
público -
Provimen
to
derivado
- Servidor
público
integrant
e de
outra
carreira -
Impossibi
lidade

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 471/41/DEZ/2004

PERGUNTA 6 - PROVIMENTO DE CARGO PÚBLICO

É possível autorizar, como forma de provimento derivado, que determinado


servidor público seja investido em cargo integrante de carreira diversa?

A investidura em cargo ou emprego público, como regra, depende de prévia aprovação em concurso
público, por força do disposto no inc. II do art. 37 da Constituição da República, ressalvadas as nomeações para
cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.

A imposição de prévia aprovação em concurso público decorre dos princípios da


igualdade, da impessoalidade e da moralidade administrativa, por força dos quais os cargos,
empregos e funções públicas são acessíveis a todos aqueles que preencham os requisitos
previstos em lei.

Por isso, quando a Administração Pública pretende preencher cargos, empregos ou


funções públicas, deverá realizar prévio concurso público, não sendo possível, por exemplo,
provê-los com servidores que sejam titulares de cargos relativos a carreira diversa.

O fato dessas pessoas já terem sido aprovadas em concurso público não autoriza que
sejam investidas em qualquer cargo público, mediante provimento derivado. Somente poderão
ser titulares dos cargos para o qual prestaram o concurso, ressalvadas as hipóteses de cargos
em comissão. Cármen Lúcia Antunes Rocha, sobre o assunto, menciona o seguinte:

Prevalece, assim, a vedação de ingresso em dada carreira sem aprovação prévia em concurso público
prestado para o cargo inicial de carreira específica, não sendo possível a sua aceitação para qualquer
cargo ou emprego público e, posteriormente, o seu aproveitamento como condição para ingressar em
cargo ou emprego de carreira para a qual não se tenha aprovado o candidato especificamente.4
(Grifamos.)

Inclusive, cabe destacar que o STF vem se pronunciando nesse mesmo sentido. No
julgamento da ADIN nº 951/SC,(Nota 1) o Supremo declarou a inconstitucionalidade de alguns
dispositivos de normas catarinenses que estabeleciam modalidades derivadas de investidura
em cargo público sem atendimento à exigência de realização de concurso público, por se
entender caracterizada ofensa ao art. 37, inc. II da Constituição.

Conclui-se, dessa forma, que não é possível autorizar, como forma de provimento
derivado, que determinado servidor público seja investido em cargo integrante de carreira
diversa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

4
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos. São
Paulo: Saraiva, 1999. p. 204-205.

(Nota 1)
Julgada em 18.11.2004, noticiado no informativo nº 370 do STF.
Julgados dos Tribunais Imprimir

Tipo Recurso:

Mandado de
Segurança
Número do
23.577-2
Recurso:
Tribunal: Supremo Tribunal Federal
Data do
15/MAI/2003
Julgamento:
Relator: Carlos Velloso
Ementa do Constitucional – Administrativo – Servidor público estável – Estágio probatório – Lei nº
Recurso: 8.112, de 1990, art. 20, § 2º.

JURISPRUDÊNCIA - 1127/24/JUL/2003

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Mandado de Segurança nº: 23.577-2 UF: DF


Relator: Min. Carlos Velloso
Data: 15.05.2003
Fonte: DJ, de 16.04.2002, p. 128

Assunto:

Agentes Públicos – Servidor estável – Aprovação em novo concurso – Estágio


probatório – Requerimento de recondução ao cargo anterior – Possibilidade.

Ementa:

Constitucional – Administrativo – Servidor público estável – Estágio probatório – Lei nº


8.112, de 1990, art. 20, § 2º.

I - Policial Rodoviário Federal, aprovado em concurso público, estável, que presta novo
concurso e, aprovado, é nomeado Escrivão da Polícia Federal. Durante o estágio
probatório neste último cargo, requer sua recondução ao cargo anterior. Possibilidade,
na forma do disposto no art. 20, § 2º, da Lei nº 8.112/90. É que, enquanto não confirmado
no estágio do novo cargo, não estará extinta a situação anterior.

II - Precedentes do STF: MS 22.933-DF, Ministro O. Gallotti, Plenário, 26.06.98, DJ de


13.11.98.

III - Mandado de segurança deferido.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal


Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por decisão unânime, deferir o mandado de segurança, nos termos do
voto do Relator. Ausentes, justificativamente, os Senhores Ministros Celso de Mello e
Marco Aurélio, Presidente.

Brasília, 15 de maio de 2002.

ILMAR GALVÃO
Presidente

CARLOS VELLOSO
Relator

Relatório

O SR. MINISTRO CARLOS VELLOSO:

Trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado por Marco Antonio
Furtado Lisboa, contra ato do Excelentíssimo Senhor Presidente da República, que,
aprovando o Parecer GQ-196, da Advocacia Geral da União, indeferiu a pretensão do
impetrante de ser reconduzido ao cargo de Policial Rodoviário Federal.

Diz o impetrante que exercia cargo de Policial Rodoviário Federal, tendo ingressado
mediante aprovação em concurso público e alcançado a estabilidade, quando pediu
licença para tratar de interesses particulares. Durante o gozo da referida licença, logrou
aprovação em concurso para o cargo de Escrivão da Polícia Federal, onde fora
empossado e iniciou efetivo exercício. Entretanto, durante o estágio probatório do novo
cargo, verificou o impetrante sua inaptidão para o exercício da nova atividade e iniciou
uma série de consultas e requerimentos buscando sua recondução ao cargo que
anteriormente ocupara, vale dizer, o de Policial Rodoviário Federal, série essa que
culminou no ato impugnado, consistente no indeferimento de recurso junto ao Ministério
da Justiça, confirmando parecer negativo de autoria da Advocacia Geral da União.

Sustenta, mais, em síntese, o seguinte:

a) o fato de, “em muitos casos, não de forma genérica, muitos policiais foram
reconduzidos à função anterior, ao sentirem-se desconfortáveis no exercício das novas
funções” (fl. 03);

b) violação a direito líquido e certo, porquanto a decisão da Administração ofende o


previsto no art. 20, § 2º, ao dispor que, frustrado o estágio probatório do novo cargo
público, o servidor estável retornará ao antigo cargo;

c) legitimidade da pretensão do impetrante, uma vez que não “há que se invocar o
princípio da legalidade para obstar o pleito do Impetrante, pois embora ali não tenha
previsto expressamente o caso do Impetrante, e mesmo sabendo-se que a
Administração só poderá fazer o que é permitido por lei (no silêncio da lei), tem-se que ‘a
analogia admissível no campo do Direito Público é a que permite aplicar o texto da
norma administrativa à espécie não prevista, mas compreendido no seu espírito’” (fl. 05)

Pede o impetrante, ao final, o reconhecimento do direito líquido e certo à recondução


pretendida.

O então relator, Ministro Marco Aurélio, deferiu, às fls. 108/110, a liminar requerida.

Requisitaram-se informações (fls. 112). O Excelentíssimo Senhor Presidente da


República, por intermédio da Advocacia Geral da União, às fls. 119/127, sustentou, em
síntese:

a) ausência de suporte constitucional para a recondução pleiteada, dado que, por “força
do item XV do art. 37 da Carta, inserem-se na regra constitucional proibitiva da
acumulação de cargos os de Policial Rodoviário Federal e de Escrivão de Polícia
Federal. Portanto, vagou o primeiro, a pedido do interessado, na data em que ocorreu a
posse no último” (fl. 121);

b) ausência de suporte legal a fundamentar a vontade do impetrante, porquanto os arts.


20 e 29 da Lei nº 8.112/91 não atribuem ao servidor “decidir, a seu exclusivo talante a
interesse, pela desisvestidura num dos cargos e o retorno àquele de que se afastara, a
pedido, inclusive de unidades da Federação diferentes, e em detrimento da maior
utilidade pública consistente em a Administração obter a prestação de serviços que
atendam às necessidades administrativas e em razão do qual se realizou o recrutamento
do pessoal” (fl. 124);

c) impossibilidade da recondução pretendida, tendo em vista que o “reingresso de quem


se afasta de um quadro de pessoal, mesmo sob o pretexto de ser provido noutro
incalculável, de mesma ou de diferente unidade federativa, seria mais caso de
readmissão, instituto banido da ordem jurídica pelo art. 113 do Decreto-Lei nº 200, de
1967, e menos da incidência do regramento da recondução e do estágio probatório, os
quais não dizem respeito à pretensão do requerente” (fl. 124).

O ilustre Subprocurador-Geral da República, Dr. João Batista de Almeida, em parecer


aprovado pelo eminente Procurador-Geral da República, Prof. Geraldo Brindeiro (fls.
130/131), opina pelo deferimento do writ.

Autos conclusos em 28.02.2002.

É o relatório.

Voto

O SR. MINISTRO CARLOS VELLOSO (RELATOR):

O impetrante exercia cargo de Policial Rodoviário Federal, tendo ingressado no referido


cargo mediante aprovação em concurso público. Nesse cargo, alcançou a estabilidade
no serviço público. Em licença para tratar de interesses particulares, logrou aprovação
em concurso para o cargo de Escrivão de Polícia Federal, cargo para o qual foi nomeado
e empossado. Entretanto, durante o estágio probatório nesse último cargo, pretendeu
retornar ao cargo antigo, de Policial Rodoviário Federal, tendo sido indeferida a sua
pretensão. Daí o presente mandado de segurança, pugnando o impetrante pela sua
recondução ao cargo anterior. Invoca, em seu favor, o disposto no art. 20, § 2º, da Lei nº
8.112/90.

Apreciando caso igual - MS 22.933-DF, Relator o Ministro Octavio Gallotti – decidiu o


Supremo Tribunal Federal:

"EMENTA: Estágio probatório.

Funcionário estável da Imprensa Nacional admitido, por concurso público, ao cargo de


Agente de Polícia do Distrito Federal.

Natureza, inerente ao estágio, de, complemento do processo seletivo, sendo, igualmente,


sua finalidade a de aferir a adaptabilidade do servidor ao desempenho de suas novas
funções.

Conseqüente possibilidade, durante o seu curso, de desistência do estágio, com retorno


ao cargo de origem (art. 20, § 2º, da Lei nº 8.112/90).

Incoerência de ofensa ao princípio da autonomia das Unidades da Federação, por ser


mantida pela União a Polícia Civil do Distrito Federal (Constituição, art. 21, XIV).

Mandado de segurança deferido".

No seu voto, o eminente Ministro Octavio Gallotti lecionou, forte em Lúcio Bittencourt:
“Do Estágio Probatório e sua Efetiva Utilização”, separata da Revista do Serviço Público,
Departamento de Imprensa Nacional, Rio, 1949:

"(...)

Em sua tese, aponta, o saudoso mestre, como finalidade precípua do estágio, a de


“servir de complemento ao processo de seleção, fornecendo uma prova prática, objetiva,
que é o exercício das próprias funções do cargo”.

Bastaria esse caráter de prova para obstar, segundo penso, que, da desistência da
faculdade de sua realização, ou da de nele prosseguir, pudesse advir, ao candidato,
conseqüência mais nociva que a de sua reprovação.

É durante o estágio probatório – continua Lúcio Bittencourt: “especialmente, que se


deve cuidar de ajustar devidamente o homem à função que lhe è adequada”, para, então,
advertir:

A inadaptação do servidor ao trabalho – esclarece Franklin Meine – pode ser decorrente


de suas próprias condições orgânicas ou do caráter do trabalho. Se o funcionário
demonstra preferir outra atividade, é, pelo menos, de se presumir que será útil estudar a
sua transferência. Quando os servidores sabem que podem ser transferidos, se o
desejarem, reduz-se o número dos que abandonam o emprego e aumenta o dos que
trabalham com alegria, satisfeitos com as suas funções".

E acrescenta o eminente Ministro Gallotti, que tanto honrou e dignificou esta Casa:
“Estimular a permanência na função para a qual se confessa inadaptado o servidor,
estorvando a sua volta ao cargo em cuja experiência já havia sido ele aprovado será,
certamente, subverter a finalidade para que foi o estágio probatório concebido”.

Esplêndida lição, que extrai do que está disposto no art. 20 e seu § 2º da Lei nº 8.112, de
1990, toda a sua expressão teleológica.

Na linha, em termos substanciais, do entendimento do eminente Ministro Gallotti, a lição


de Ivan Barbosa Rigolin, a dizer que “apenas a confirmação no estágio probatório do
novo cargo extingue a situação anterior, pertinente ao cargo onde o servidor se
estabilizou” (RIGOLIN, Ivan Barbosa. Comentários ao Regime Único dos Servidores
Públicos Civis. 4. ed. Saraiva, 1995, p. 65). Ora, se, enquanto não confirmado no estágio
do novo cargo, não estará extinta a situação anterior, “pertinente ao cargo onde o
servidor se estabilizou”, é razoável que ao servidor, em estágio probatório no novo
cargo, seja permitido o retorno ao cargo antigo, se reconhece ele próprio a sua
inadaptação naquele cargo.
Assim posta a questão, defiro o writ, observado, se for o caso, o disposto no art. 29,
parágrafo único, da Lei nº 8.112/90.

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Título:
CARREIRAS DE
ESTADO: A
DEFESA DO
NÚCLEO
ESTRATÉGICO
Autor do
Juarez Freitas
Texto:

DOUTRINA - 117/38/SET/2004

CARREIRAS DE ESTADO: A DEFESA DO NÚCLEO ESTRATÉGICO

por JUAREZ FREITAS

Professor titular e coordenador do Mestrado e do Doutorado em Direito da Pontifícia


Universidade Católica do Rio Grande do Sul, professor da UFRGS, da Escola Superior da
Magistratura-AJURIS e da Escola da Magistratura do TRF-4. Presidente do Instituto de Direito
Administrativo do Rio Grande do Sul, professor visitante de programas de pós-graduação em
Direito no país e no exterior, advogado e parecerista.

As relações de Direito Público devem ser enfaticamente mais de Estado do que de


governo.(Nota 1) Com efeito, assegurar a obrigatória continuidade das políticas públicas, para
além dos governos episódicos, é uma das razões primordiais do Direito Administrativo
contemporâneo. Nesse contexto, mingua o espaço da antiga discricionariedade, substituída, a
pouco e pouco, pela noção de liberdade vinculada e justificável racionalmente, sem sucumbir a
particularismos contrários à idéia de universalização, de sorte que toda discricionariedade (no
plano dos mandamentos ou na eleição das conseqüências) resta vinculada aos princípios
fundamentais, donde segue a inexistência de discricionariedade pura. Cobra-se, mais e
mais, o exercício fundamentado do poder estatal. Vale dizer, a exigência alastrada de
motivação surge como antídoto contra a arbitrariedade entendida como o exercício
autofágico e coisificante do poder pela ausência de fundamentação reflexiva e conseqüente
quebra da vocação para a sistematicidade.

O Direito Administrativo afirma-se, assim, menos como o Direito do Estado executor


direto de serviços públicos ou universais, convertendo-se precipuamente em Direito do Estado
Regulador, ao mesmo tempo em que começa a deixar de ser um plexo de normas viciadas
pelo executivismo crônico (mormente no presidencialismo que se caracteriza pela excessiva
concentração unipessoal das chefias de Estado e de Governo). A continuidade pós-
governamental e o planejamento passam a exercer papel maiúsculo na efetividade do
complexo de princípios e regras que regem as relações de administração. Nesse quadro, mais
do que nunca, para bem cumprir suas funções, indispensável a máxima valorização das
carreiras de Estado, robustecidas e consolidadas em regime institucional que confira os
devidos estímulos e as garantias compatíveis.

Justamente essa última asserção é que abre ensejo à reflexão sobre as carreiras de
Estado, tema do presente estudo.(Nota 2)

REGIME INSTITUCIONAL E CARREIRAS DE ESTADO

Quando o constitucionalismo e o próprio Direito Administrativo ainda se achavam em


fase inicial de desenvolvimento, muitos, na falta de conceitos mais apropriados, cederam à
tentação de pedir auxílio às categorias do Direito Privado, (Nota 3) optando pelas discutíveis
virtudes do método extrapolativo, cuja lógica consiste em elucidar um ramo do Direito a partir
do observado em outro mais antigo. Foi Paul Laband quem ressaltou que, nesse período
embrionário, a literatura, sucumbindo ao comodismo das meras semelhanças, foi buscar nas
figuras negociais do mandato (Harprech, Eybel, Troplong, Merlin e Laurent), da locação de
serviços (Paul Kress, Wilhelm Neumann e D. Strube) – e até no contrato inominado. 1 (J. C.
Leist e J. A. Feurbach) – a inspiração para discernir a essência da relação jurídica articulada
entre o Poder Público e seus funcionários. Depois de rechaçar, uma a uma, as alternativas de
cunho privatista – por definição, precárias –, Laband, procurando harmonizar a idéia de
bilateralidade com os princípios do Direito Público, animou-se a propor que tudo não passava
de um contrato de direito público sui generis. Em seu entender,

a relação de serviço do funcionário público repousa sobre um contrato pelo qual, ..., o servidor se
devota ao Estado, assume um particular dever de serviço e de fidelidade, engaja-se em um dever de
obediência, e pelo qual o Estado, por sua vez, aceita tal promessa, assim como a singular relação de
poder que lhe é oferecida, assegurando ao funcionário, em contrapartida, proteção e, também,
sustento.(Nota 4)

Graças a esse pronunciamento, Laband acabou se tornando o precursor e um dos


maiores expoentes da chamada teoria contratualista que, influenciada pela atmosfera liberal
reinante na segunda metade do século XIX, elegeu o princípio da autonomia da vontade como
sua principal pedra de alicerce. Ocorre que as notórias inconsistências da teoria bilateral muito
cedo vieram à tona: como compatibilizar o largo espectro das intervenções unilaterais do Poder
Público, inclusive no plano dos direitos e obrigações dos servidores, com a máxima
sinalagmática da mútua pactuação dos vínculos? Ainda quando se cogitasse de um “contrato
sui generis”,(Nota 5) o certo é que, antes de se incorporar ao serviço público, o funcionário, nesse
regime bilateral, teria a possibilidade de debater as condições do trabalho, as quais, uma vez
acordadas, fariam lei entre os contraentes, não podendo ser modificadas pela vontade
exclusiva do Estado. Ora, salta aos olhos que esse resultado nunca refletiu a concreta e efetiva
realidade que, já então, norteava as relações entre o Poder Público e seu corpo de
funcionários.

O passo seguinte, nesse renhido debate, coube à criatividade de Otto Mayer. O


eminente professor da Universidade de Estrasburgo, insurgindo-se, de um lado, contra a tese
contratualista do seu colega Laband e, de outro, contra a anacrônica influência privatista da
época, alertou para a circunstância de que o vínculo entre Estado e servidor público não tinha,
propriamente, origem em um contrato de trabalho (público ou privado), mas, antes, numa
“obrigação de servir de direito público”. (Nota 6) Rejeitando, assim, as antigas concepções da
gestão de negócios, da locação de serviços e do mandato, Mayer adverte que “a função é um
círculo de atividades do Estado que devem ser geridas por uma pessoa ligada por uma
obrigação de direito público de servir ao Estado”. (Nota 7)

Mas o passo decisivo no sentido de superar, em se cogitando de servidores


tipicamente estatais, a noção de contrato foi dado por uma tríade de renomados juristas
franceses: Léon Duguit, Maurice Hauriou e Gaston Jèze. Ao dissociarem a realidade jurídica
dos servidores públicos da de outras espécies de empregados da Administração, cujas
relações de trabalho eram disciplinadas pelas regras do direito privado, em uníssono, trataram
de repudiar o processo de colonização do Direito Público pela doutrina privatista, demarcando,
ato contínuo, as características assaz peculiares do estatuto publicista reservado aos
“funcionários propriamente ditos” (“fonctionnaire proprement dit”).

Duguit, aludindo à “situação geral dos funcionários”, (Nota 8) escreveu que:

A palavra estatuto designa a situação especial constituída para os funcionários pela aplicação das
disposições legais ou regulamentares editadas para protegê-los contra todos os atos arbitrários dos
governantes ou de seus agentes diretos. Esta definição do estatuto basta para mostrar que ele
constitui, essencialmente, uma situação de direito objetivo resultante, diretamente, da aplicação do
direito objetivo formulado pelas leis e pelos regulamentos do serviço público considerado. (Nota 9)

É o que, com idêntico sentido e com linguagem assemelhada, enunciou Hauriou,


ressaltando que:

Se a concepção do contrato de serviço público deve ser afastada para os funcionários propriamente
ditos e se, inclusive, se deve evitar dizer que, no todo de sua relação, o funcionário se liga à
Administração como uma parte à outra parte, pela boa razão de que funcionário e Administração são
um dentro da instituição administrativa, não resta outra solução jurídica possível senão a de que o
funcionário seja incorporado à Administração por uma requisição consentida que lhe confere um
estatuto legal regulamentar e moral. (Nota 10)

Gaston Jèze, com seu inconfundível estilo oratório, também reproduziu esse ponto de
vista, consoante o qual:

na França, os agentes do serviço público propriamente ditos estão em uma situação jurídica legal e
regulamentar. Isso significa que o sistema do contrato não intervém em nenhum momento. Não é um
contrato que incorpora o agente ao serviço público. Não é um contrato que regula os direitos e
obrigações dos indivíduos no serviço público. Não é um contrato que fixa a duração das funções e as
condições de exoneração do serviço público. A sanção dos direitos e das obrigações dos agentes do
serviço público não é aquela dos direitos e obrigações resultantes de um contrato. (Nota 11)

Como não poderia deixar de ser, o eco das concepções francesa e alemã repercutiu
entre nós. No Brasil, foi Pontes de Miranda um dos que mais aprofundadamente meditaram
sobre a matéria. Embora o sistema constitucional brasileiro de 1946 (Nota 12) para cá tenha sofrido
abrangentes mutações na seara do regime jurídico dos servidores públicos, não se pode negar
que, no plano das linhas mestras, a reflexão ponteana sobre o trabalho público teve o raro
mérito de resistir a sobressaltos e às mudanças circunstanciais, transformando-se, em
questões nevrálgicas, em fonte atualizada, não só de orientação segura para os
administradores, mas, igualmente, de esclarecido alerta para os legisladores.

Depois de investigar as diferentes teorias que disputavam a preferência da comunidade


jurídica, detendo-se na polêmica que acirrara os ânimos entre os adeptos do regime contratual
(bilateralidade) e da corrente estatutária (unilateralidade), Pontes pondera que para discernir
qual o enfoque mais correto, convém, antes de mais nada, ter presente que, enquanto “a
relação jurídica é sempre bilateral, porque exige, pelo menos, dois pólos”, apenas “a fonte da
relação jurídica é que pode ser unilateral, ou bilateral, ou plurilateral”.2 Quer dizer: embora toda
relação jurídica seja bilateral, nem todas as relações jurídicas vêm ao mundo ungidas pela
bilateralidade. É preciso não confundir a necessária bilateralidade dos efeitos com a eventual
bilateralidade das fontes. Não se deve negligenciar a evidência de que a polaridade na relação
é um a posteriori cujo a priori, não raro, é a unilateralidade. Segundo Pontes, esse parece ser,
sem rasuras, o caso da relação entre Estado e servidor público. Trata-se, de modo nítido, de
posição jurídica da qual emergem incontáveis efeitos bilaterais. Todavia, não há como despistar
o dado concreto de que, lá no princípio, no bojo originário de suas fontes, “a vontade dos
figurantes como que desaparece: não só a vontade do funcionário público, ou do candidato à
investidura, nos cargos públicos, mas, também, a do próprio Estado...”.3 É por isso que Pontes,
armado de bons argumentos, termina afirmando que “o elemento institucional é predominante,
quase exclusivo”, motivo pelo qual “trata-se de relação jurídica (portanto, bilateral), mas
institucional, o que repele a noção de pura contratualidade”.4

Como se vê, a conclusão de Pontes, a despeito de divergências laterais, não


desmente, no geral, o entendimento, quase em tudo convergente, de Mayer, Duguit, Hauriou e
Jèze, vale dizer: à diferença do chamado empregado público, cujo contrato de trabalho é regido
pela CLT,(Nota 13) a situação jurídica do servidor público “propriamente dito” é, sim, estatutária ou
legal.

Com efeito, a disciplina hoje em vigor não tornou obsoletas, no particular, nenhuma das
observações doutrinárias mencionadas. Ninguém ignora que a modificação do art. 39 da
CF/88, promovida pela Emenda 19/98, tentou, de modo formalmente inconstitucional,
descontinuar o regime jurídico único, ampliando, em contrapartida, o âmbito de utilização da
figura do empregado público, cujas relações com o Estado são disciplinadas, basicamente,
pelas regras constantes da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Afigura-se irretorquível,
entretanto, que subsiste, incólume, o regime institucional. É o que não deixam margem para
maior dúvida as inúmeras alusões, no texto da Lei Fundamental, à categoria dos servidores
titulares de cargos públicos na Administração direta, nas autarquias, nas fundações de Direito
Público, no setor administrativo do Poder Legislativo e no próprio Poder Judiciário.

Do regime estatutário ou institucional decorre um bom número de conseqüências


dignas de registro. É auspicioso que o constituinte derivado, apesar das vastas reformas que
vem promovendo na esfera dos direitos dos servidores públicos, felizmente não abandonou o
reconhecimento de que, para a segurança da sociedade e para a eficiência do serviço público,
convém reservar aos ocupantes de certos cargos efetivos um tratamento especial, apto a
propiciar a formação de uma carreira com o irrenunciável e profissional atributo da competência
e capaz de colocar os seus membros a salvo das cooptações partidárias, (Nota 14) da
descontinuidade governativa, assim como das ásperas angústias relacionadas à subsistência
incerta na velhice.

Alexander Hamilton, faz tempo, observou: só o que detém controle sobre o próprio
sustento mantém altivo domínio sobre a vontade. (Nota 15) Pessoas cuja sobrevivência depende da
maré oscilante e fortuita da sorte ou da ascendência calculista de terceiros transformam-se,
não raro, em servos indefesos, no mercado opressivo dos interesses econômicos e políticos.
Dessa maneira, ontem como agora, perdura intacta, no fundamental, a idéia de “que o melhor
meio de assegurar um bom funcionamento dos serviços públicos é conferir aos funcionários,
legalmente, uma situação estável”.(Nota 16)

O trágico inventário das tentativas de supressão radical do regime estatutário e de suas respectivas
garantias institucionais, sobretudo a da estabilidade, atesta que elas jamais foram bem-sucedidas. Um caso
emblemático foi o de Andrew Jackson nos EUA. Apesar daquele célebre alerta de Hamilton no final do século
XVIII, chamando a atenção para que se cuidasse de resguardar a independência dos servidores (em especial a
dos magistrados), o Presidente Jackson, em 1829, subvertendo o sistema da “due participation” criado por
Thomas Jefferson, houve por bem introduzir a doutrina do “spoils system”. Tal “sistema dos despojos” conseguiu
ser pior do que a mais equivocada aplicação da fórmula da “devida participação” que, concebida por Jefferson
em bases de estrita igualdade entre os partidos, logo se converteu em reflexo proporcional ao desempenho nas
eleições. O mecanismo da “devida participação” estava longe de ser o ideal, todavia o substitutivo posto em
voga por Jackson sobrepujou-o, em muito, nas mazelas. Em contraste com o sistema da “devida participação”, a
alternativa prescrita por Jackson “degenerou em mero partidarismo”. (Nota 17) O critério adotado por Jackson, sem
apreço pela idéia de profissionalismo, foi, em resumo, o da simples e leiga rotatividade nos cargos. Como bem
percebeu Gaston Jèze, “Jackson preconizava a seguinte regra: a cada um a sua vez”. (Nota 18) Vale a pena
transcrever o juízo que o eminente jurista francês formou a respeito dessa proposta indefensável:

Trata-se da exposição de um demagogo cínico ou bem o programa de um político inexperiente? O


certo é que os resultados do sistema dos despojos foram deploráveis. Em poucos anos, os hábitos de
concussão, imoralidade, introduziram-se na administração americana. Os abusos foram tais que
levaram, em 1883, a uma reação que operou uma mudança radical no recrutamento da função pública
(sistema do concurso).(Nota 19)
Atualmente, no Brasil das reformas, convém não perder de vista esta advertência
histórica. Com efeito, as Emendas Constitucionais nºs 19, 20 e 41 promoveram sucessivas e
substanciais alterações, criando perigosos mecanismos de relativização da estabilidade e até
reformando o que já havia sido reformado: novas regras aplicáveis às aposentadorias do setor
público. Do ponto de vista publicista, as mudanças, no geral, não foram de boa filosofia. Mal
compostas, algumas das modificações merecem as incontáveis críticas recebidas, tanto
jurídicas como políticas. Nada obstante, seria unilateralismo negar que o constituinte teve
alguns acertos. Cuidou de deixar clara e intocável a regra do concurso público. Mais:
consciente de que o futuro das instituições depende, em larga medida, da salvaguarda de
algumas carreiras de Estado, sem as quais periclitam a continuidade e o funcionamento da
Administração Pública (da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios), o
Congresso Nacional deixou, aqui e acolá, sinais de cautela e prudência. É precisamente nesse
rol em que se encaixam o recente acréscimo do inc. XXII ao art. 37 e a nova redação conferida
ao inc. IV do art. 167, todos da Constituição Federal (EC nº 42/2003). Como se nota, o sentido
finalístico e sistemático de ambos os dispositivos é confluente com a perspectiva de estatuir um
tratamento diferenciado para algumas carreiras de cuja atuação eficiente, proba e estável
depende o funcionamento não só de todas as instituições públicas, mas, também, e sobretudo,
da sociedade civil. O mundo moderno assemelha-se a um complexo sistema vivo e não é
preciso grande argumentação para se perceber que determinados órgãos são mais vitais do
que outros.

A propósito, o estudo da situação jurídica da “Administração Tributária” constitui boa


ilustração da necessidade de uma perspectiva institucional e publicista. De fato, quando se
lança um olhar investigativo em direção ao passado, nota-se que determinadas idéias
constituem a culminância de valioso processo evolutivo que remonta a longes tempos. Não se
trata, aqui, do apego supersticioso a velhos hábitos. Não. É apenas o reconhecimento de que,
sob vários aspectos, não é possível compreender o presente sem consultar a provada
sabedoria dos que nos antecederam. Ora, a decisão de conferir às “Administrações Tributárias
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios” a elevada dignidade de
“atividades essenciais ao funcionamento do Estado” e, nessa medida, de permitir,
excepcionalmente, “a vinculação de receita de impostos ... para realização de atividades de
administração tributária”, só experimenta perfeita nitidez se projetada sob o pano de fundo de
uma história que, de forma quase ininterrupta, conservou-se fiel à idéia de que os “organi
essenziali e principali dell’attività tributari”5 reclamam, para a defesa e para o guarnecimento da
sociedade, disciplina normativa especial.

Não é de hoje que as atividades que gravitam em torno da gestão e da fiscalização


tributárias gozam de status jurídico preeminente. Assim a Roma da República, assim a do
Principado, aquela com o aerarium e os quaestores, esta com as novidades do fiscus e dos
praefecti aerarii (sem falar nos procuratores fisci, no praetor fiscalis e nos advocati fisci),
conheceram a preocupação, crucial para o resguardo do vigor romani, de manter um aparato
burocrático e administrativo eficiente e estável, ao mesmo tempo.

Para se ter idéia da relevância das funções desempenhadas, já no início do período da


República, pelos quaestores, basta lembrar que “o cônsul – a mais alta magistratura de então –
era obrigado a se fazer assistir pelo questor toda vez que retirasse dinheiro do tesouro,
provavelmente sob o procedimento de que o questor remetia os recursos financeiros solicitados
pelo cônsul e registrava em seus livros a soma desembolsada”. (Nota 20) Isso significa que, eleito
“pelo mérito” (Nota 21) “o questor exerce, nesse primeiro caso, uma representação
indispensável...”,(Nota 22) de cuja mediação até o cônsul depende. Como uma magistratura
patrícia, ordinária e cum potestas – isto é, com a “faculdade de exprimir, com a própria vontade,
a vontade do Estado, criando direitos e obrigações” (Nota 23) –, os questores ocupavam o ápice da
estrutura administrativa romana, ficando abaixo somente das magistraturas cum império.6

No Principado, a partir de Augusto, surge, ademais, o praefectus aerarii. Àquela altura,


entre os funcionários romanos, a categoria do praefectum (prefeito) é de todas a mais
relevante.7 O sentido etimológico da palavra praefectum, que designa o “representante de uma
autoridade superior”, já denuncia, por si só, a situação de destaque dos praefecti aerarii, que,
escolhidos diretamente pelo princeps, representam-no na gestão do aerarium, bem como na do
fiscus, podendo, o que o distingue de semelhantes magistraturas, receber “recompensas
especiais ... em caso de boa administração”. (Nota 24) A independência desses funcionários
responsáveis pela condução dos negócios públicos pode ser aquilatada pelo fato de que,
“mesmo durante a mais turbulenta luta pelo poder ... o aparato administrativo continuou a
desenvolver com notável regularidade as suas funções, (...). E se isso vale para a
administração em geral, vale, ainda mais, para a administração financeira”. (Nota 25)

A melhor parcela da herança portuguesa não destoa dessa antiga e sábia orientação
de atribuir altos galardões aos funcionários encarregados de gerir as contas públicas. Em
Portugal, na hierarquia da Administração do Rei D. Afonso V, logo abaixo do alferes-mor – o
cargo mais elevado –, encontrava-se, então, senex ou calculus,(Nota 26) servidor responsável pelo
controle das receitas e das despesas da Casa Real. Segundo o texto das Ordenações
Afonsinas, tal condição se justificava pelo fato elementar de que “todos os haveres passavam
pelas suas mãos, e isso é coisa que move muito o coração dos homens”. (Nota 27)

Seis séculos depois dessa lúcida advertência constante das Ordenações Afonsinas,
Andrew Jackson, desafiando a própria tradição americana que remontava a Alexander
Hamilton, deliberou fazer ouvidos moucos às lições da história e duvidar da vulnerabilidade
daqueles que zelavam pelo destino das receitas públicas. O desfecho, sobretudo no que
concerne à Administração Tributária, foi um constrangedor desastre. O desprestígio inoculado
pelas reformas de Jackson no âmbito do serviço público, além de responsável pelo rápido
declínio da eficiência administrativa, acabou por ensejar episódios estrepitosos. “Desses –
conta Leonard White – o mais notável foi o caso do (...) coletor de impostos nomeado por
Jackson para o Porto de New York, o qual fugiu para Espanha, em 1837, com algo em torno de
$1.250.000”,(Nota 28)uma cifra, sem dúvida, nababesca para os padrões da época.

Foram precedentes do gênero que estimularam a doutrina, em décadas mais recentes,


a recomendar, como forma de prevenir fraudes e corrupção na área das contas públicas, que o
pessoal ligado ao controle e à fiscalização de tributos fosse protegido por uma relação especial,
estável e bem remunerada. Adolf Wagner, um dos clássicos da Ciência das Finanças,
sublinhava, a propósito, que bons resultados nesse campo só seriam obtidos “organizando
logicamente o serviço e concedendo uma situação conveniente aos servidores”, (Nota 29) os quais
deveriam ser “bem pagos e bem treinados”.(Nota 30)

Em termos de “organização lógica do serviço” e de garantia de “uma situação


conveniente aos servidores”, um dos princípios universalmente adotados foi o de que as
atividades de fiscalização tributária (no exercício de indelegável poder de polícia fiscal)
deveriam ser, sempre e sempre, desempenhadas por pessoas jurídicas de direito público,
valendo-se, nessa medida, da performance profissional e segura de servidores ocupantes de
cargos efetivos, isto é, cargos que, em nosso ordenamento, gozam das garantias peculiares do
regime institucional.(Nota 31) Em grau diferenciado, o trabalho da Administração Tributária costuma
ser fustigado pela influência de dois fortes grupos de pressão: de um lado, “os partidos
políticos” que a “cercam por todos os lados” e, de outro, “fora da política”, mas por ela
secundada, a sedutora persuasão dos fiscalizados, “cujos interesses são, por vezes, atingidos
pelas deliberações administrativas”.8 Assim, numa ordem constitucional em que a
Administração Tributária tem por munus garantir a máxima eficácia da rede de tributos,
conferindo de perto a regular incidência, admitir-se que as suas funções pudessem ser
exercidas por entidades de direito privado ou por empregados não-estatutários (ainda que
concursados), seria o mesmo que viciar o sistema pela base, fazendo com que os meios
conspirassem contra os fins.

Depois de lastimar que a moralidade média ainda não estivesse elevada o suficiente
para erradicar os efeitos perversos da malícia, Albert Hensel mostrou que a Administração
Tributária, como “representante da autoridade do Estado”, (Nota 32) serve para impedir que
“nenhuma pretensão de imposto, por menor que seja, se subtraia, em qualquer caso, ao
pagamento”.(Nota 33) Com acerto, o professor da Universidade de Königsberg destaca que, no
moderno Estado de Direito, “também a administração tributária (ou sobretudo ela!) serve,
enfim, à realização do ordenamento jurídico objetivo”, (Nota 34) motivo por que, “livre de qualquer
influência” (Nota 35) deve estar, efetiva e materialmente, em condições de se sobrepor, quer ao
arbítrio da política, quer ao estigma da condescendência. A verdade é que um aparelho estatal
incapaz de se proteger das investidas dos agentes políticos transitórios ou das perversões do
mercado acaba oscilando, como um pêndulo, entre os extremos deletérios da interpretação pro
fisco ou da interpretação contra fiscum. Ocorre que uma e outra não se amoldam aos desígnios
imparciais e superiores do Estado de Direito. (Nota 36) Nem pro fisco, tampouco contra fiscum.
Antes, a atuação da “Administração Tributária do Estado” (“amministrazione tributaria dello
Stato”) há de ser, de forma isenta, pro lege. Constitucionalmente justificável no Estados dos
direitos fundamentais.

Pois bem, semelhante mescla de rigor e de eqüidade na ação apenas se oferece em


contexto jurídico muito singular. Foi o que percebeu, há muito, a melhor doutrina quando
discutiu a possibilidade do exercício do poder de polícia por pessoas jurídicas de direito
privado. Contra tal hipótese se pronunciou o entendimento majoritário da comunidade científica,
impugnando-a com argumentos, já de ordem moral e administrativa, já de caráter jurídico e
constitucional.(Nota 37) Mas isso foi também o que os legisladores enxergaram e, sem demora,
consagraram, de maneira expressa, no texto do Código Tributário Nacional, declarando, no seu
art. 7º, § 3º, que:

Art. 7º A competência tributária é indelegável, salvo atribuição das funções de arrecadar ou fiscalizar
tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária, conferida
por uma pessoa jurídica de direito público a outra (...).

(...)

§ 3º Não constitui delegação de competência o cometimento, a pessoas de direito privado, do encargo


ou da função de arrecadar tributos. Como se constata, somente pessoa jurídica de direito público pode
desempenhar atividades próprias da fiscalização tributária.

Aliomar Baleeiro, desde o início, observara, comentando o Código Tributário Nacional,


que “a delegação para ... fiscalização é restrita às pessoas de Direito Público”,9 o que importa
dizer que a delegação à pessoa jurídica de direito privado encontra-se vedada. (Nota 38) O máximo
que pode haver é a transferência à pessoa de direito privado da mera função instrumental de
arrecadar, (Nota 39) como, aliás, em visível simetria com o Direito Romano, (Nota 40) tem acontecido,
atualmente, com vários estabelecimentos bancários, cuja rede de agências, mais próxima do
contribuinte, permite eficiência, agilidade e conforto no recolhimento dos tributos em geral.

Mas o caráter diferenciado das regras disciplinadoras do exercício do poder de polícia


– e a fiscalização tributária configura somente uma das tantas espécies –, também implicou a
condição jurídica dos servidores incumbidos de representar o Estado no manejo dos
instrumentos de intervenção reguladora na esfera dos interesses particulares. Nesse sentido, o
entendimento doutrinário e jurisprudencial nunca deixou de proclamar que o desempenho
profícuo do poder de polícia administrativo reclama, em face das injunções políticas e das
sedições do mundo da economia, uma blindagem em torno do servidor, que só as garantias do
cargo de carreira estatutário pode erigir. A utilização, em tal contexto, de empregado público,
despido da armadura jurídica peculiar ao ocupante de cargo de provimento efetivo, “introduz
riscos para a impessoalidade da ação do Estado em relação aos administrados”.10

Convém chamar atenção para que até os defensores de um regime jurídico uniforme e
indistinto para servidores públicos e trabalhadores particulares não deixam de conceder a
imperiosa necessidade, em certos casos, “de se examinar, cuidadosamente, quais seriam os
postos da função pública que requerem especiais direitos e deveres e como deveriam esses
direitos e deveres ser constituídos e matizados em vista de cada tarefa e cargo”. (Nota 41) Afinal,
como pondera Martin Bullinger – um dos grandes defensores daquele mencionado regime
uniforme –, “seria inoportuno que um oficial de portaria e um alto funcionário de Ministério
fossem eventualmente submetidos a um regime jurídico substancialmente idêntico”. (Nota 42)

Ainda com o advento da Emenda Constitucional nº 19 e, posteriormente, com a entrada


em vigor da Lei nº 9.986/2000, o Poder Judiciário teve oportunidade de examinar a
constitucionalidade de alguns dispositivos que conferiam aos servidores das Agências
Reguladoras a condição de empregados públicos justamente ao atuarem como reguladores. É
que a EC nº 19, ao tentar extinguir o “regime jurídico único”, supostamente teria aberto espaço
para que o art. 1º da Lei nº 9.986, curvando-se às conveniências da hora, pudesse, sem
considerações de fundo, determinar que “as Agências Reguladoras terão suas relações de
trabalho regidas pela Consolidação das Leis do Trabalho, ..., em regime de emprego público”.

Submetido, entretanto, à apreciação do Supremo Tribunal Federal (ADIn 2.310), esse


dispositivo, tamanha a incompatibilidade com a Lei Fundamental, felizmente teve a sua
eficácia, desde logo, suspensa. O ministro relator Marco Aurélio mostrou-se sensível à
ponderação de que “prescindir, no caso, da ocupação de cargos públicos, com direitos e
garantias a eles inerentes, é adotar flexibilidade incompatível com a natureza dos serviços a
serem prestados...”.(Nota 43)

Com muita freqüência, o ponto de melhor visibilidade só se deixa alcançar pela arte da
comparação e, por conseguinte, pelo respeito à regra de que aquilo que vale ou repugna a uma
relação jurídica em particular, também vale ou repugna a qualquer outra relação eventualmente
assemelhada ou idêntica. Ora, o status dos servidores responsáveis pela Administração
Tributária – munus delicado e desafiador – guarda parcial semelhança, no âmago, com a
situação jurídica descrita pela doutrina e chancelada pelo STF, na ADIn 2.310. Com efeito, se
mesmo no caso das Agências Reguladoras, em que havia regra legislada prescrevendo o
contrário, já se afastou a possibilidade de utilização exclusiva do regime celetista, com igual ou
maior razão se deverá bani-lo, por inteiro, na seara da Administração Tributária, cujas funções
sempre exigiram, ao longo da história, regime jurídico peculiaríssimo, atualmente reafirmado,
em patamar constitucional, pelo inc. XXII acrescentado pela Emenda nº 42 ao art. 37 da Lei
Fundamental.

Em outras palavras, o caráter especial das funções de polícia administrativa,


desempenhadas pela vinculada e indelegável fiscalização de tributos, as quais se acha
entrelaçado o regime estatutário, obteve a sua máxima e palpável consagração com a regra
que confirmou, quanto à Administração Tributária, a sua natureza de “atividade essencial ao
funcionamento do Estado”. É em tal contexto e com tal espírito que se deve interpretar, quer o
inc. XXII do art. 37, quer o inc. IV do art. 167, ambos da CF.

Dando continuidade, apesar das inúmeras variações políticas e ideológicas, a uma


trajetória de resguardo dos núcleos estratégicos da Administração Pública, a EC nº 42, de
modo não-excludente, já imprimiu à atuação de determinados servidores o selo de “atividade
essencial”, coroando, com esse título, uma carreira de deveres austeros, de cujo serviço
depende não só o financiamento do Estado, mas, em igual medida, o bem-estar da sociedade
e a eficácia dos direitos fundamentais.

Cumpre notar, ainda, que o emprego da palavra “carreira” não constitui licença retórica,
divorciada de fundamentos normativos ou constitucionais. Antes, a escolha dessa categoria
deve ser creditada ao próprio constituinte que, em confluência com o atributo da
essencialidade, consignou o alerta de que o quadro de pessoal da Administração Tributária da
União, dos Estados e dos Municípios deve ser formado por “servidores de carreiras
específicas”. Aqui, a expressão “carreira” tem sentido técnico muito preciso, querendo designar
aqueles cargos de provimento efetivo – portanto estatutários – que, à diferença dos
denominados “cargos isolados”, se escalonam em classes hierarquizadas segundo o grau de
responsabilidade ou de complexidade das atribuições funcionais. (Nota 44)

Tal, porém, não é tudo. Há outra relevante perspectiva a ser investigada.


Decididamente, a alusão à carreira é mais rica do que, à primeira leitura, se pode imaginar. Ao
que tudo indica, o uso do termo tem o fito adicional de reforçar aquele almejado ambiente de
“institucionalização da independência” (“Institutionalisierung der Unabhängigkeit”)11 com o
escopo de erradicar, pelo menos em determinados domínios da Administração Pública, o
regime de emprego celetista,(Nota 45) ou seja, no caso das funções essenciais que exigem o
vínculo institucional.

Não foi por outro motivo que, na Alemanha, o Tribunal Constitucional


(Bundesverfassungsgericht), referiu-se ao

servidor público de carreira como uma instituição que, com fundamento em conhecimentos técnicos,
desempenho profissional e leal cumprimento do dever, garante uma Administração estável,
representando um fator de compensação em face das forças políticas conformadoras da vida do
Estado.(Nota 46)

Mas o intento de consolidar o lastro de proteção jurídica imprescindível ao pleno e


regular exercício da Administração foi mais longe. No caso da Administração Tributária, aqui
tomado como exemplo, por se tratar de segmento administrativo cuja performance repercute,
em última instância, no custeio de boa parte das atividades do Poder Público, o constituinte,
numa inovação complementar, culminou por prescrever, em apoio àquela atmosfera de
estabilidade, que “as administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios, ... terão recursos prioritários para a realização de suas atividades”. Para tanto,
o constituinte derivado tornou-a exeqüível – essa reserva de “recursos prioritários” –, com o
alargamento das exceções constantes do inc. IV do art. 167 da CF. Como se vê, desde a
promulgação da EC 42, viabilizou-se “a vinculação de receita de impostos ... para realização de
atividades da administração tributária”.

O que se observa, portanto, é que todas essas modificações, somadas às conquistas


sedimentadas pela doutrina e pela jurisprudência, exprimem, da parte do Congresso Nacional,
inegável solicitude no sentido de alargar a rede de proteção em torno do poder de polícia
tributária. Cuida-se de bom paradigma do justificável zelo com setores estratégicos da
Administração contra a intrépida inventividade das fraudes e sonegações. Daí a unidade
finalística dessas mudanças, cujo alvo está em fundar, com firmes declarações de estatura
constitucional, a independência dos fiscais de tributo, de um lado, incluindo-os, desde já, no rol
das chamadas carreiras de Estado, e, de outro, irrigando-os com dotações orçamentárias
capazes de arcar, pela via da vinculação de receitas fiscais, com os custos do aparato
fiscalizatório e das suas inerentes garantias.

Em síntese, é da essência do poder de polícia, em qualquer das instâncias da


Federação, estruturar-se a partir de uma carreira de servidores públicos estatutários, formada
por cargos de provimento efetivo, devidamente concursados e dotados das garantias aptas a
minimizar os efeitos deletérios da política episódica. Se é verdade que a função fiscalizatória
ajuda a consolidar, no exemplo dado, a arrecadação de tributos e, por conseguinte, a eficiência
do sistema tributário, não menos verdade que à fraqueza dos instrumentos de controle também
se pode imputar o progressivo exaurimento das reservas públicas. Privados, simultaneamente,
de servidores estatutários e de rubricas de custeio autônomas, os órgãos de controle fiscal
poderiam acabar vítimas da inanição orçamentária, dos famigerados contingenciamentos (que
ameaçam mortalmente a independência das agências reguladoras) e das conveniências
externas, cumulativamente espoliados pelos interesses partidários ou pela insopitável astúcia.

Como se vê, afortunadamente, o ordenamento brasileiro, neste ponto exemplar da


Administração Tributária, premuniu-se contra tais riscos por meio de quatro disposições com
eficácia imediata e vinculante em todas as esferas da Federação. Primeira: as competências da
Administração Tributária só podem ser exercidas por pessoas jurídicas de direito público. O
caput do art. 7º do CTN já não deixava margem para maior controvérsia: quando se trata de
fiscalização tributária, mesmo no caso de delegação, somente instituições de direito público
podem desempenhá-las. Segunda: à luz da Constituição emendada (inc. XXII, art. 37), apenas
o servidor público estatutário (estável, nos termos do art. 41 da CF) e de carreira reúne as
credenciais necessárias e suficientes para se desincumbir das tarefas da Administração
Tributária. O que a EC nº 42 teve em vista, com a ressalva de que o trabalho de fiscalização
deve ser conduzido por servidores públicos, foi criar uma situação independente e garantida,
capaz de propiciar o desenvolvimento de uma carreira de Estado (não meramente governativa),
com os atributos do profissionalismo e da estabilidade, sem os quais a decência corre o risco
de se transformar em presa das apreensões com a subsistência. Terceira: o inc. XXII
acrescentado ao art. 37 da CF não visou a, tão-somente, impor o regime estatutário de carreira.
O seu intuito também foi o de conceder às carreiras vinculadas à Administração Tributária o
status de “atividades essenciais ao funcionamento do Estado”. Isso significa que o constituinte,
antecipando-se, lucidamente, a projetos que versam sobre as carreiras de Estado, atribuiu aos
fiscais de tributos da União, dos Estados e dos Municípios, de forma cogente e auto-aplicável,
o título de “Carreira de Estado”, com todos os consectários jurídico-constitucionais. Quarta: o
inc. IV do art. 167, combinado com a parte final do citado inc. XXII do art. 37, ambos da CF,
asseguram às Administrações Tributárias da União, dos Estados e dos Municípios, pela via da
“vinculação de receita de impostos”, a destinação orçamentária de “recursos prioritários para a
realização de suas atividades”. É como se a Administração de tributos passasse a desfrutar de
fonte orçamentária específica, destinada a cobrir o custeio, inclusive salarial e previdenciário,
da estrutura afeita à fiscalização e cobrança. Como o poder de tributar nada seria sem o
eficiente poder de fiscalizar, o constituinte houve por bem garantir à federação, em todos as
instâncias, uma Administração independente não só do ponto de vista funcional, mas, também,
do ponto de vista econômico-financeiro. Autonomia real! Com efeito, se a Administração de
tributos não gozasse de independência quanto às dotações orçamentárias, aquela outra
independência, a de natureza funcional, seria, em todos os sentidos, vã, dado que o livre
manejo das verbas de custeio pode comprometer qualquer autonomia estatutária fundada em
abstratas prescrições. Buscando inspiração novamente em Alexander Hamilton, é o caso de
assinalar: o poder sobre a subsistência da Administração implica o poder sobre a eficácia da
Administração.(Nota 47)

Mais: os administradores tributários mantêm vinculação institucional, que supõe um


tratamento prudente e diferenciado (sem configuração de qualquer privilégio), preservando-se
garantias que fazem as vezes de escudos contra a falta de continuidade das políticas públicas
e a insegurança jurídica, não raro, propícia ao tormentoso arbítrio. Em outras palavras, o
administrador que entretém vínculo institucional (não-contratual) é aquele concursado que pode
aspirar, diferentemente do empregado, à estabilidade no serviço público (e não no cargo), um
dos elementos constitutivos do regime estatutário.

ESTABILIDADE DOS SERVIDORES PERTENCENTES ÀS CARREIRAS DE ESTADO

Com efeito, a estabilidade na carreira de Estado, para além das mudanças pontuais no
tocante a regras, há de ser vista como rigorosamente intangível, desempenhando valiosa
tríplice função. De fato, tal proteção de alçada constitucional colima: a) garantir a manutenção
das políticas públicas, uma vez que são os servidores estáveis que asseguram a permanência
das metas do Estado (de longo prazo), sem prejuízo das alterações conjunturais, a cargo dos
agentes políticos, transitórios por definição. A estabilidade oferece, ainda, ao servidor que
responde por atividade essencial de Estado; b) a salvaguarda contra a prepotência dos
mandantes de turno, não raro travestida de “discricionariedade”. Como acentuado, sem a
independência e a segurança oferecidas pela garantia da estabilidade, o cidadão logra ter
menores chances de uma prestação adequada dos serviços essenciais, mormente por déficit
de controle. A terceira função da estabilidade reside na c) contrapartida que o regime
institucional (não-contratual) oferece à vista da periclitante lâmina posta à disposição do Poder
Público sob a forma de poderio unilateral (ainda que mitigado) de alteração das regras do
regime.

No intuito de cumprir a tríplice função, a estabilidade no serviço público deve ser


compreendida como proteção de alçada constitucional contra a perda do cargo, conferida a
titular de cargo efetivo, nomeado em razão de concurso público, após o desenrolar do período
de estágio probatório (presentemente, a regra é de três anos de real exercício no cargo) e
mediante avaliação exitosa ao cabo do aludido estágio, não sendo suficiente o mero transcurso
do lapso temporal apontado. Indispensável a conjugação do prazo e da aprovação por
intermédio de comissão de estáveis, designada para tal fim (CF, art. 41, § 4º).

A calhar, ainda que de passagem, convém passar ao exame das situações de perda do
cargo do servidor estável oriundas da Emenda Constitucional nº 19/98. À primeira vista,
exsurgem quatro hipóteses para a referida perda do cargo. Contudo, uma delas resulta
abrangida por outra, de maneira que, a bem do rigor, são mais propriamente três as situações
em que se admite a desvinculação compulsória do agente dotado dessa garantia. Uma a uma,
cumpre fazer menção às circunstâncias de perda do cargo público. A primeira hipótese,
nitidamente de cunho punitivo, segue da sentença transitada em julgado (art. 41, § 1º, inc. I),
(Nota 48)
convindo averbar que, invalidada por sentença a demissão do servidor estável, aplica-se,
nesse caso, a regra prevista no § 2º, cumprindo reintegrar o servidor no cargo. A segunda
hipótese (não necessariamente de penalidade demissória) concerne ao processo administrativo
em que seja assegurada a ampla defesa e, por suposto, o contraditório (art. 41, § 1º, inc. II). A
terceira hipótese é a relacionada à insuficiência de desempenho, matéria pendente de
regulamentação por intermédio de lei complementar (CF, art. 41, § 1º, inc. III), que não deve
resvalar para o alargamento das sombrias veredas do arbítrio (discrição não-motivável) ou da
violação do devido processo (material e formalmente considerado).

Tais hipóteses ostentam o traço de serem decorrentes, em regra, de penalidades


demissórias, porém a segunda hipótese pode abarcar situação de mera desinvestidura, desde
que conjugada ou entrelaçada à dicção do art. 169, § 4º, CF. Na leitura sistemática, (Nota 49)
mostra-se aconselhável preferir compreender que o constituinte quis apenas punir
severamente o servidor público que, de modo culposo grave ou doloso, torne insustentável a
mantença do vínculo institucional. No entanto, o aludido liame perece se e somente se o laço
com o Poder Público restar, de modo irremissível, maculado pela conduta inaceitável do agente
público, no caso das carreiras de Estado.

Note-se que a suposta quarta hipótese autônoma do deslocado art. 169, § 4º, (Nota 50) em
realidade está absorvida na segunda possibilidade elencada, pois também aí se exige processo
administrativo escorado em todas as garantias. Mais: a “quarta” hipótese, trazida pelo art. 169,
revela um desligamento sem conteúdo punitivo (dado que inexiste caráter sancionatório em
decorrência da conduta do servidor), oriundo do enxugamento de despesas, e requer o
processo administrativo estatuído no art. 41, § 1º, inc. II, sem embargo de relevantes
acréscimos de cautelas, sendo inviável para os ocupantes de cargos essenciais ao
funcionamento do Estado.

Apresenta-se a hipótese do art. 169, § 4º, CF, como recurso derradeiro para fazer
observar os limites de despesas com pessoal, estatuídos em lei complementar (atualmente, a
Lei Complementar nº 101/2000). Assim, se medidas prévias não renderem resultado suficiente,
o servidor estável poderá, em última instância, perder o cargo, “desde que ato normativo
motivado de cada um dos Poderes especifique a atividade funcional, o órgão ou unidade
administrativa objeto da redução de pessoal”, vedada a discricionariedade pura. (Nota 51)

Todavia, uma motivação congruente, clara e aceitável será virtualmente impossível


para o enxugamento de servidores que desempenhem atividades essenciais ao funcionamento
estatal, sob pena de destruição do Estado. O constituinte não pode pedir que, em nome da
austeridade fiscal, o Estado se destrua.
Vai daí a implicação decisiva do argumento: mostra-se plausível, por meio de saudável
interpretação sistemática, acentuar a concordância prática dos preceitos em tela,
salvaguardando a proporcionalidade e impondo o menor sacrifício aos servidores, de modo a
afastar a aplicação do art. 169 da CF em relação aos ocupantes de cargos essenciais ao
funcionamento do Estado, em sintonia com a premissa de que o interesse público supõe e
requer a menor precariedade possível nas relações de administração, mormente no regime
institucional das carreiras tidas como imprescindíveis à existência do Estado dos direitos
fundamentais.

A sugerida interpretação resgata a segurança mínima das carreiras de Estado. Eis o


caminho mais equilibrado, uma vez que sem a tranqüilização do servidor essencial, impossível
edificar a consolidação do Estado essencial, nem máximo, nem mínimo. Reiterando: a
obediência aos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal, nos termos preconizados pelo art.
169 da CF, não pode conduzir o Estado ao suicídio.

Inquestionável que se encontra subjacente ao asseverado o forte apreço por aqueles


que deliberaram investir suas energias numa carreira pública árdua, a qual, bem entendida e
praticada, demanda pronunciada abnegação, mormente em face das múltiplas restrições
imanentes ao regime publicista. Note-se que, ao fim e ao cabo, a estabilidade nada mais
representa do que uma contrapartida para as sérias restrições e desvantagens trazidas pela
relação não-contratual. Além disso, pelo mesmo motivo, parece adequado afirmar que, no caso
emblemático dos fiscais tributários, à semelhança, v.g., com o que sucede com a carreira do
juiz, não faz sentido admitir ocupante de cargo de confiança para o desempenho das funções
inerentemente de Estado. Assim como não há juiz de confiança, não pode haver fiscal que não
seja de carreira. Os cargos em comissão podem ser direcionados para funções de apoio, tão-
somente. Por isso mesmo, os cargos de direção, na Administração Tributária, devem ser
reservados aos servidores de carreira.

Tudo considerado, os administradores que exercem funções típicas e finalísticas de


Estado (funções essenciais), além de terem a garantia de acesso impessoal do concurso
público, merecem a proteção adicional de robustos anteparos formais e substanciais contra
voluntarismos persecutórios ou enxugamentos fiscais lineares. Tais anteparos não devem
servir, está claro, para a acomodação dos agentes públicos, mas para que possuam uma
couraça num mundo de estonteante rotatividade no regime de trabalho. Essa segurança
mínima, em vez de estimular a indolência, deve fazer-se benfazeja para o cumprimento fiel dos
princípios constitucionais, em lugar da obediência acrítica aos chefes ou poderosos da hora.

Vez por todas, a garantia patrocinada pela estabilidade do art. 41 da CF deve ser
concebida como proteção oferecida à sociedade, donde segue não haver motivo para
antagonizar os qualificadamente estáveis. Em lugar da hostilidade, a estabilidade peculiar da
carreira de Estado apresenta-se como requisito funcional para impedir que se torne postiço o
Estado de Direito, sem prejuízo da luta contínua para que os seus agentes pautem as condutas
sob o manto sagrado do interesse público.

CONCLUSÕES

Tendo em conta o asseverado, eis as principais conclusões:

a) Há carreiras essenciais ao funcionamento do Estado (por exemplo, procuradores ou


fiscais de tributos), o que determina regime peculiar de natureza institucional, com a
estabilidade qualificada do art. 41 da CF, sem aplicação da hipótese trazida pelo art. 169, § 4º,
CF;

b) Somente pessoa jurídica de direito público pode exercer competências privativas da


Administração, uma vez que estas se inserem no âmbito indelegável da “utilização de poderes
de soberania” (“Ausübung hoheitsrechlicher Befugnisse”);(Nota 52)

c) Apenas servidor de carreira e, por conseguinte, ocupante de cargos de provimento


efetivo pode executar as funções peculiares à fiscalização, haja vista que as suas tarefas são
de cunho permanente (“ständige Aufgabe”)12 e, ao pressuporem “utilização de poderes de
soberania” (“Ausübung hoheitsrechlicher Befugnisse”), exigem, por simetria, o arrimo
estatutário de um “status especial” (“besonderen status”);(Nota 53)

d) Cumpre registrar que a alusão à carreira constante do inc. II, do art. 37 da CF


designa, antes de mais nada, aqueles cargos estatutários de provimento efetivo que, em
contraste com os cargos isolados, são escalonados em classes hierarquizadas de acordo com
o grau de responsabilidade e de complexidade das funções. Mas não é só. Tal referência
também exprime a preocupação do constituinte de criar um ambiente jurídico propício ao
desenvolvimento de uma carreira cercada das garantias de direito público capazes de colocar
determinados agentes públicos a salvo dos incidentes da política governamental transitória e
dos acidentes da vida;

e) A lei que haverá de definir as carreiras de Estado deveria, por exemplo, deixar
estampada a interpretação aqui defendida quanto às hipóteses de perda do cargo elencadas
no art. 169, com a redação dada pela EC nº 19. Deve, ainda, garantir proventos integrais,
arcados ou garantidos pelo Tesouro, por força da essencialidade. Deve, ademais, assegurar
fortemente a irredutibilidade real de vencimentos, evitando que a corrosão inflacionária mine
um dos alicerces do Estado. Deve deixar claro que os cargos de direção e de chefia,
diretamente envolvidos com “atividade-fim”, devem ser ocupados por membros de carreira,
dada a natureza das tarefas e das garantias correspondentes;

f) As carreiras de Estado precisam ter regime previdenciário diferenciado, compatível,


por exemplo, com as inelimináveis garantias da integralidade de proventos. Quando se medita
sobre o sentido finalístico da assertiva de que determinada carreira é essencial ao
funcionamento do Estado, percebe-se que a intenção protetiva seria meramente nominal caso
não se encontrasse acompanhada por provisões orçamentárias imunes à errática manipulação
dos governos e dos partidos. O que se quer é que tenhamos agentes públicos, cujo acesso
seja marcado pela imparcialidade e cuja permanência tenha garantias institucionais para que
se façam, por sua vez, garantes de uma Administração Pública com reais condições de atuar
como efetivadora dos princípios de Direito Público, isto é, agindo, para além do unilateralismo,
inclusive governamental, sempre a favor da Constituição e, portanto, da concretização dos
direitos fundamentais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1
Le Droit Public de L’Empire Allemand. Tradução de C. Gandilhon e TH. Lacuire, Paris: V. Giard & E. Brière,
1901, Tomo II, p. 114 e 115.
2
MIRANDA, Pontes de. Comentários à constituição de 1967 com a emenda nº 1 de 1969. São Paulo: RT, 1973,
tomo III. p. 432.
3
Ibid., p. 431.
4
Id.
5
GANGEMI, Lello. Elementi di Amministrazione Finanziaria Pubblica. Padova: CEDAM, 1934. p. 109 e ss.
6
MOREIRA ALVES, José Carlos. Direito romano. Rio de Janeiro: Forense, 1971, vol. I, p. 30.
7
Ibid., p. 50.
8
MIRANDA, Pontes de. Op. cit., p. 418.
9
BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 80.
10
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 242.
11
ZIPPELIUS, Reinhold. Allgemeine Staatslehre. München: C.H. Beck’sche Verlag, 1999. p. 382.
12
KONRAD, Hesse. Grundzüge des Verfassugsrechts der Bundesrepublik Deutschland. C. F. Müller Juristischer
Verlag: Heidelberg, 1978, p. 218.

(Nota 1
Vide, por obséquio, Juarez Freitas in O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 3.
ed. Malheiros Editores: São Paulo, 2004, revisando categorias à luz da premissa mencionada.
(Nota 2)
Fragmentos do presente estudo constam no Parecer que emiti, em junho de 2004, a convite honroso da
Febrafite sobre aspectos da Emenda Constitucional 42/2003.
(Nota 3
Pontes de Miranda já notara: “Como acontece quando a qualquer relação jurídica menos conhecida,
procurou-se explicar a relação jurídica entre o funcionário público e o Estado, assimilando-a a algumas das
relações mais vulgares no mundo do Direito, em subordinação do direito público ao direito privado, característica
de séculos em que o Direito Civil representou a preocupação principal da burguesia, após a derrocada das
instituições monárquico-feudais”. (Comentários à constituição de 1967 com a emenda nº 1 de 1969. São Paulo:
RT, 1973, tomo III, p. 418).
(Nota 4)
“Le rapport de service du fonctionnaire de l’Etat repose sur un contrat par lequel, ..., contracte un devoir
particulier de service et de fidélité, s’angage à un dévouement particulier, à une obéissance particulièr, et par
lequel l’Etat accepte cette promesse, ainsi que le rapport de puissence particulier qui lui est offert et assure en
retour au fonctionnaire protection et, d’ordinaire, entretien”. (Op. cit., p. 119 e 120).
(Nota 5)
Entre nós, M. I. Carvalho de Mendonça e Clóvis Beviláqua se incluem no rol dos juristas que acolheram a
concepção do “contrato sui generis”. Sobre o tema, vide Pontes de Miranda op. cit., p. 428.
(Nota 6)
“La fonction publique, au contraire, est essentiellement liée à obligation de servir du droit public”. ( Droit
Aministratif Allemand. Paris: V. Giard & E. Brière, 1906, Tomo IV, § 42, p. 8).
(Nota 7)
“La fonction est un cercle d’affaires de l’Etat, qui doivent être gérées par une personne liée par l’obligation
de droit public de servir l’Etat”. (op. cit., p. 8) Sobre o confronto entre Laband e Otto Mayer vide, por exemplo,
Fritz Fleiner in Droit Administratif Allemand. Tradução de Dh. Eisenmann, Paris: Librairie Dalegrave, 1933, que,
por sua vez, seguiu o pensamento de Otto Mayer, sustentando que a opinião de Laband “ne peut cepandant pas
être acceptée. La nomination du fonctionnaire comme la naturalisation de l’étranger sont l’oeuvre d’une
disposition unilatérale de l’autorité, mais d’une disposition que l’autorité ne peut édicter qu’avec l’assentiment de
l’intéressé” (p. 123). Na década de 50, Friedrich Giese in Allgemeines Verwaltungsrecht. Tübingen: J.C.B. Mohr
(Paul Siebeck), 1952, p. 55, também acolheu a ótica de que “die Ernennung ist kein öffentilich-rechtlicher
Vertrag, sondern ein einseitiger Staatshoheitsakt”. Atuamente, a visão que prevalece é a de que se trata de ato
administrativo, como mostra Hartmut Maurer in Allgemeines Verwaltungsrecht. München: C.H. Beck’sche Varlag,
1985, p. 146.
(Nota 8)
“...situation générale des fonctionnaires...”. (DUGUIT, Léon. Traité de Droit Constitutionnel. Paris: Ancienne
Librairie Fontemoing & Cie. Éditeurs, 1930, tomo III, p. 159).
(Nota 9)
“Le mot statut désigne la situation spéciale qui est faite aux fonctionnaires par l’application des dispositions
légales ou réglementaires édictées pour les protéger contre tous actes arbitraires de la part des gouvernants et
de leurs agents directs. Cette définition du statut suffit à montrer qu’il constitue essentiellement une situation de
droit objectif résultant directement de l’application du droit objectif formulée par les lois e règlements du service
public considéré”. (Op. cit., p. 159).
(Nota 10)
“Si la conception du contrat de service public doit être écartée pour le fonctionnaire proprement dit et si
même on doit éviter de dire que, pour l’ensemble de sa situation, le fonctionnaire soit lie à l’administration
comme une partie à une autre partie, pour la bonne raison que fonctionnaire et administration ne font qu’un dans
l’institution administrative, il reste qu’une solution juridique possible, à savoir que le fonctionnaire soit rattaché à
l’administration par une réquisition consentie lui conférant un statut légal réglementaire et moral”. (HAURIOU,
Maurice. Précis Élémentaire de Droit Administratif. Paris: Librarie du Recueil Sirey, 1938. p. 72)
(Nota 11)
“En France, les agents au service public proprement dits sont dans une situation juridique légale et
réglementaire. Cela signifie que le procédé du contrat n’intervient à aucun moment. Ce n’est pas un contrat qui
fait entrer les agents au service public. Ce n’est pas un contrat qui règle les droits et obligations des individus au
service public. Ce n’est pas un contrat qui fixe la durée des functions et les conditions de la sortie du service
public. La sanction des droit et obligations des agents au service public n’est pas celle des droits et obligations
résultant d’un contrat”. (JÈZE, Gaston. Les Principes Généraux du Droit Administratif. Paris: Marcel Giard
Libraire-Éditeur, 1930. p. 244 e 145) André de Laubadère, em 1968 (num trabalho que foi publicado nos Annales
de la Faculté de Droit et des Sciences économiques de Toulouse – faculdade em lecionara Maurice Hauriou – e,
também, no volume I, das Pages de Doctrine. Paris: LGDJ, 1980) lembrou, com lucidez, que, apesar das
abertas divergências, sobretudo quanto ao modo de pensar a ciência jurídica, “c’est également un accord des
deux grands maîtres [Duguit e Hauriou] que l’on rencontre, dans la théorie de la fonction public, sur des points
fondamentaux, considérés depuis lors comme acquis: le rejet de la notion de contrat pour définir le lien unissant
des fonctionnaire à l’intérieur de l’administration...” (Pages de Doctrine. Paris: LGDJ, 1980, vol. I, p. 27).
(Nota 12)
A escolha da Constituição de 46 como marco se explica pelo fato de que foi ao comentá-la que Pontes
parece haver amadurecido o seu posicionamento sobre o tema dos funcionários públicos. Não se olvida,
portanto, que Pontes, antes da Constituição de 46, já comentara a de 34.
(Nota 13)
O dualismo entre servidores públicos estatutários (vínculo institucional de Direito Público) e empregados
públicos (contrato de trabalho) conserva-se na Alemanha, na França e, também, no nosso sistema. Entre os
alemães, Konrad Hesse in Grundzüge des Verfassugsrechts der Bundesrepublik Deutschland. C. F. Müller
Juristischer Verlag: Heidelberg, 1978, p. 218 e Norbert Achterberg (in Allgemeines Verwaltungsrecht. Heidelberg:
Decker & C. F. Müller, 1982, p. 194) confirmam esse dualismo entre “Beamter” (servidor público estatutário) e
“Angestelte” (empregado público), que vem de longe (Constituição de Weimar). Entre os franceses, Yves
Gaudemet, ao atualizar o Tratado de André de Laubadère, esclarece que “a la différence du personnel
fonctionnaire, uniformément soumis à une situation légale ou réglementaire de droit public, le personnel non
fonctionnaire relève de régimes juridiques divers” (Traité de Droit Administratif. Paris: L.G.D.J., 1998, p. 40).
Entre nós, a doutrina é uniforme no sentido de reconhecer que “a Constituição admite, na própria Administração
direta, nas autarquias e fundações públicas, que certas atividades possam ser desenvolvidas sob regime de
emprego” (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2003.
p. 240). Isso quer significar que, “embora o regime de cargo tenha que ser o normal, o dominante, na
Administração direta, autárquica e fundações de Direito público, há casos em que o regime trabalhista (nunca
puro, mas afetado, tal como se averbou inicialmente, pela interferência de determinados preceitos de Direito
Público) é admissível para o desempenho de algumas atividades; aquelas cujo desempenho sob regime laboral
não compromete os objetivos que impõem a adoção do regime estatutário como normal, o dominante” (op. cit.,
p. 242). São do mesmo entendimento, por exemplo, Hely Lopes Meirelles in Direito administrativo brasileiro. São
Paulo: Malheiros, 2001. p. 383; Odete Medauar in Direito administrativo moderno. São Paulo: RT, 2002. p. 333;
Maria Sylvia Zanella Di Pietro in Direito administrativo. São Paulo: Atlas S.A., 2001. p. 424 e Diogo de
Figueiredo Moreira Neto in Curso de direito administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 276.
(Nota 14)
Como lembra Fritz Fleiner in op. cit., p. 66 e 67, na Alemanha, já “la Constitution d’Empeire a cherché à
parer au danger d’une introduction de la politique dans l’administration (Politisierung der Verwaltung) et de
l’exercice d’influences de parti sur les fonctionnaires en proclamant le principe – qui va de soi – que ‘les
fonctionnaires sont les serviteurs de la collectivité, non d’un parti’ (art. 130, al. 1)”.
(Nota 15)
Como sublinha Hamilton, “In the general course of human nature, a power over a man’s subsistence
amounts to a power over his will”. (The Federalist. Chicago: Encyclopaedia Britannica, 1952, vol. 43, n. 79, p.
233).
(Nota 16)
“Alors est née cette idée éminemment juste que le meilleur moyen d’assurer un bon fonctionnement des
services publics, c’est de conférer légalement aux fonctionnaire une situation stable”.( DUGUIT, Leon. op. cit.,
tomo III, p. 149 e 150).
(Nota 17)
“Contrary to jackson’s expectation, rotation degenerated into mere partisanship”. (WHITE, Leonard.
Introduction to the Study of Public Administration. New York: The Macmillan Company, 1957. p. 18)
(Nota 18)
“En termes plus nets, Jackson préconisait la règles: chacun son tour!”. (Op. cit., p. 405).
(Nota 19)
“Est-ce là l’exposé d’un démagogue cynique ou bien le programme d’un homme politique inexperimenté?
Ce qui est certain, c’est que les résultats du système des dépouilles furent déplorables. En quelques années, les
habitudes de concussion, l’immoralité, s’introduisirent dans l’administration américane. Le abus furent tels qu’ils
amenèrent en 1883 une réaction et firent opérer un changement radical dans le recrutement de la fonction public
(système du concours)”. (Op. cit. p. 405).
(Nota 20)
“...le consul était obligé de se faire assister du questeur toutes les fois qu’il retirait de l’argent du trésor,
probablement sous cette forme que le questeur remettait l’aegent au consul sur l’ordre de celui-ci et inscrivait sur
ses livres la somme déboursée”. (MOMMSEN, Théodor. Manuel des Antiquités Romaines. Tradução de Paul
Frédéric Girard, Paris: Thorin et Fils, 1894, tomo IV, p. 244).
(Nota 21)
“... the quaestorship was obtained, ..., by merit in the candidates ...”. (Tacito. The Annals. Tradução de
Alfred John Church e William Jackson Brofribb, Chigago: Great Books, vol. 15, p. 106)
(Nota 22)
“Par conséquent, le questeur qui exerçait dans le premier cas une représentation indispensable...”.
(MOMMSEN, Théodor. Op. cit., p. 244).
(Nota 23)
“...la facoltà di esprimere con la propria volontà quella dello Stato, creandogli diritti ed oblighi;...”.
(ARANGIO-RUIZ, Vincenzo. Storia del Diritto Romano. Napoli: Casa Editrice Dott. Eugenio Jovene, 1968. p. 31).
(Nota 24)
“La perspective de récompenses spéciales leur était ouverte au cas de bonne administration”.
(MOMMSEN, Theodor. Op. cit., p. 260-161).
(Nota 25)
“...anche durante le più turbinose lotte per il potere ..., l’apparato amministrativo há continuato a svolgere
con notevole regolarità le sue funzione, ... . E se questo vale per l’amministrazione in generale, vale ancor più
per l’amministrazione finanziaria”. Como ressalta Orestano, “no exercício de sua atividade o aparato fiscal opera,
de fato, como organização em larga medida independente da pessoa imperador, por meio de uma vastíssima
burocracia cujos membros são escolhidos entre os adictos da casa imperial (...), aos quais é reconhecido um
poder de iniciativa assaz extenso, confirmado por vários princípios” (“Nell’espletamento delle sua attività
l’apparato fiscale opera infatti come organizzazione in larga misura indipendente dalla persona del princeps
attraverso una vastissima burocrazia i cui membri sono scelti tra gli addetti alla cassa imperiale (...), alla quale è
riconosciuto un podere d’iniziativa abbastanza esteso, confermato da vari principi” (ORESTANO, Ricardo. Il
Problema delle Persone Giuridiche in Diritto Romano. Torino: G. Giappichelli Editore, 1968. p. 255).
(Nota 26)
De acordo com as Ordenações Afonsinas, Livro I, Título LVII, o mordomo-mor também era chamado de
senex, que em latim quereria dizer velho, pelo fato de que desempenhava ofício honrado. Já o designativo
calculus, ainda com base nas Ordenações Afonsinas, evocava a pedra com que os antigos faziam suas contas.
(Nota 27)
“..., porque todo o haver paffa per fua maaõ, que he coufa, que move muito os coraçoões dos homees”.
(Ordenações Afonsinas. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984, vol. I, Livro I, Título LVII, p. 337) Sobre a
condição de superioridade do Mordomo-mor, vide, ainda, Pontes de Miranda op. cit., p. 440 e 441.
(Nota 28)
“Of these perhaps the most remarkable was the case (...) collector of the port of New York, who fled to
Spain in 1837 with something over $1.250.000”. (Op. cit., p. 309)
(Nota 29)
“...en organisant logiquement le serviçe et en donnant une situation convenable aux employés, ...”. ( Traité
de la Science des Finances. Tradução de Jules Ronjat, Paris: V. Giard & E. Brière, 1909, p. 482).
(Nota 30)
“...bien payés et bien instruits”. (Op. cit., p. 468).
(Nota 31)
Sobre garantias institucionais, em sentido largo, há lições preciosas do mestre Paulo Bonavides in Curso
de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 492.
(Nota 32)
“...rappresentante dell’autorità dello Stato...”. (Diritto Tributario. Tradução de Dino Jarach, Milano: Dott. A.
Giuffrè – Editore, 1956. p. 165).
(Nota 33)
“...che nessuna pretesa d’imposto, anche solo possibile, si sottragga in nessun caso al soddisfacimento”.
(Op. cit., p. 163).
(Nota 34)
“Anche l’attività amministrativa tributaria (o piuttosto proprio questa!) serve infine alla realizzazione
dell’ordinamento giuridico obbiettivo”. (Op. cit., p. 165).
(Nota 35)
“...sottrata ad ongi ... influenza, ...”. (Op. cit., p. 169)
(Nota 36)
Sobre o excesso de exação da Administração Tributária, vide, por exemplo, Hugo de Brito Machado in
Estudos de Direito penal tributário. São Paulo: Atlas S. A., 2002. p. 188 e ss.
(Nota 37)
Vide Juarez Freitas: “Outra característica nodal é a de que a polícia administrativa há de ser exercício
privativo do Poder Público, ...”. (Estudos de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 1995. p. 54). É o que
também ensinava Ruy Cirne Lima, quando escreveu que “traço característico da limitação ou restrição policial é
o de ser imposta pelo poder público privativamento”. (Princípios de direito administrativo. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1982. p. 107).
(Nota 38)
A propósito, vide Hugo de Brito Machado: “A reposta afirmativa à última daquelas questões pode ser
sustentada, especialmente tendo-se em vista que a atribuição das funções em tela [atividade de fiscalização]
não pode ser feita a pessoa jurídica de Direito Privado”. (Comentários ao código tributário nacional. São Paulo:
Atlas S.A., 2003. vol. I, p. 156). Do mesmo autor, vide, ainda, Curso de direito tributário. São Paulo: Malheiros,
2004. p. 256. Com igual ponto de vista, vide, ademais, Bernardo Ribeiro de Moraes in Compêndio de direito
tributário. Rio de Janeiro: Forense, 1993. vol. I, p. 269.
(Nota 39)
A tal respeito, Hugo de Brito Machado, assim se posiciona: “Não constitui delegação de competência
tributária o cometimento a pessoas de direito privado do encargo ou da função de arrecadar tributos (CTN, art.
7º, § 3º). Simples função de caixa, que hoje é atribuída aos estabelecimentos bancários”. (Curso de direito
tributário. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 256).
(Nota 40)
Aqui reaparece o fio contínuo da história. Apesar dos inegáveis contrastes entre os contextos
institucionais, as semelhanças com o Direito Romano outra vez vêm a lume. Enquanto a função fiscalizatória
propriamente dita ficava nas mãos de um Magistrado (dos quaestor na República e dos praefecti aerarii no
Principado), a função arrecadatória era desempenhada pelos publicani, que operavam no seio de uma
societates publicanorum por eles constituída (v. Max Kaser in Das Römische Privatrecht. München: C.H.
Beck’sche Verlagsbuchhandlung, 1955, p. 263 e ss.; e Wolfgang Kunkel in Römische Rechtsgeschichte. Köln:
Böhlau Verlag, 1956, p. 26). No primeiro caso, tratava-se de típica relação de direito público, em que a
“posizione ‘pubblicistica” (v. Riccardo Orestano Op. cit., p. 256) que vincula o quaestor ao aerarium e o praefecti
aerarii ao princeps saltava aos olhos. No segundo caso, ao contrário, já se localiza também a presença do
direito privado, com a intervenção de particulares, os publicani e as societates publicanorum, em vínculo de
colaboração com o Poder Público. O nítido paralelismo entre os quaestores, os praefecti aerarii e os atuais
fiscais de tributos é tão saliente quanto a clara parecença entre os publicani, as societates publicanorum e os
modernos estabelecimentos bancários. Ontem como agora, enquanto uns fiscalizavam, outros arrecadavam. Lá
como aqui, uns agiam sob o aguilhão vigilante do direito público, enquanto os outros com a presença
coadjuvante e auxiliar do direito privado. Em certo período da história de Roma, como entre nós, o regime
especial da potestas (o poder de declarar a vontade do Estado), somente aos primeiros restava garantido.
Todavia, para que não haja mal-entendido, convém, desde logo, ressaltar a existência de contrastes. Para não
alongar a exposição, suficiente recordar que os publicanos (societates publicanorum) tinham a possibilidade, por
força de uma lex censoria, de manejar medidas executivas – agindo em nome próprio, jamais como substituto
processual do povo romano –, podendo-se valer, contra os devedores de impostos (vectigalia), da legis actio per
pignoris capionem, conforme o testemunho, entre outros, de Gaius em suas Institutionum, Livro IV, § 28 (v.
Francis de Zulueta in The Institutes of Gaius - Commentary. Oxford: At The Clarendon Press, 1967, vol. II, pp.
248 e 249; Vide, ainda, José Carlos Moreira Alves op. cit., p. 228, mais José Rogério Cruz e Tucci e Luis Carlos
de Azevedo in Lições de história do processo civil romano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996. p. 70).
(Nota 41)
“...müsste sorgfältig geprüft werden, für welche Positionen des öffentilichen Dienstes besondere
Beamtenrechte und Beamtenpflichten überhaupt erforderlich und wie diese Rechte und Pflichten je nach der
besonderen Aufgabe und Stellung verschieden zu gestalten sind”.
(Nota 42)
Idem: in ob. cit., p. 101: “So erweist es sich u.U. als nicht angebraucht, einen technischen Hausmeister
und den höheren Beamten eines Ministeriums im wesentlichen demselben Beamtenrecht zu unterwerfen”.
(BULLINGER, Martin. Öffentliches Recht und Privatrecht. Stuttgart/Berlin/Köln/Mainz: W. Kohlhammer Verlag,
1968. p. 101).
(Nota 43)
ADIn 2.310. Foi por esse motivo que a Constituição Alemã, de 23 de maio de 1949, no seu art. 33, alínea
4, preceituou que “l’exercice des droits de souveraineté doit être confié à titre permanent à des fonctionnaires
publics...”, sendo que, neste mesmo artigo, a alínea 5 determina, ainda, que “le droit de la fonction publique doit
être réglementé en tenant compte des principes traditionnels du fonctionnariat” (Constitutions et Documents
Politiques. Org. por Maurice Duverger, Paris: Presses Universitaires de France, 1981. p. 468).
(Nota 44)
Vide Hely Lopes Meirelles in Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 398, e Celso
Antônio Bandeira de Mello op. cit., p. 276.
(Nota 45)
A despeito de também os empregados públicos serem concursados e de terem algumas
garantias que decorrem de princípios de direito público que incidem em tais relações. Sobre o
tema, vide Ney Freitas in Dispensa de empregado público e o princípio da motivação. Curitiba:
Juruá, 2002.
(Nota 46)
“...Berufsbeamtentum als eine Institution ..., die gegründet auf Sachwissen, fachliche Leistung und loyale
Pflichterfüllung, eine stabile Verwaltung sichern und damit einen ausgleichenden Faktor gegenüber den das
Staatsleben gestaltenden politischen Kräften darstellen sollm”. (BverfGE, 7, 162).
(Nota 47)
Vide nota nº 15.
(Nota 48)
“Art. 41. São estáveis após 3 (três) anos de efetivo exercício os servidores nomeados para cargo de
provimento efetivo em virtude de concurso público. §1º. O servidor público estável só perderá o cargo: I – em
virtude de sentença judicial transitada em julgado; II – mediante processo administrativo em que lhe seja
assegurada ampla defesa; III – mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei
complementar, assegurada ampla defesa. § 2º. Invalidada por sentença judicial a demissão do servidor estável,
será ele reintegrado, e o eventual ocupante da vaga, se estável, reconduzido ao cargo de origem, sem direito à
indenização, aproveitado em outro cargo ou posto em disponibilidade com remuneração proporcional ao tempo
de serviço”.
(Nota 49)
Para uma visão mais aprofundada do tema, vide Juarez Freitas in A interpretação sistemática do direito. 4.
ed. São Paulo: Malheiros, 2004.
(Nota 50)
Art. 169, § 4º, CF: “Se as medidas adotadas com base no parágrafo anterior não forem suficientes para
assegurar o cumprimento da determinação da lei complementar referida neste artigo, o servidor estável poderá
perder o cargo, desde que ato normativo motivado de cada um dos Poderes especifique a atividade funcional, o
órgão ou unidade administrativa objeto da redução de pessoal”.
(Nota 51)
Toda discricionariedade está vinculada aos princípios fundamentais. A propósito, vide Juarez Freitas in o
controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.
(Nota 52)
Hesse, Konrad in ob. cit., p. 218. Vide, também, as alíneas 4 e 5 do art. 33 da Constituição Alemã, citado
na nota nº 57 supra, as quais determinam que o exercício de poderes ou de direitos de soberania dever ser
confiado exclusivamente a funcionário público regido pelos princípios tradicionais do funcionalismo.
(Nota 53)
Idem: ob. cit., p. 218. Nesta mesma linha, vide Hans J. Wolff e Otto Bachof in Verwaltungsrecht.
München: C.H. Beck’sche Verlag, 1976, vol. II, p. 486: “... einen besonderen rechtlichen Status”.

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Título:

SERVIDO
RES
PÚBLICO
S–
PRINCÍPI
O DA
MORALID
ADE –
APLICAÇ
ÃO DO
CÓDIGO
DE
CONDUT
A DA
ALTA
ADMINIS
TRAÇÃO
FEDERAL

CONSULTAS EM DESTAQUE - 440/05/DEZ/2001


SERVIDORES PÚBLICOS – PRINCÍPIO DA MORALIDADE – APLICAÇÃO
DO CÓDIGO DE CONDUTA DA ALTA ADMINISTRAÇÃO FEDERAL.

ORIENTAÇÃO JURÍDICA.1

EMENTA: Servidor – Probidade – Princípio da moralidade.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL: Código de Conduta da Alta Administração Federal.

1. À luz do princípio da moralidade, não nos parece que seja possível a Federação em
comento arcar com os custos do evento em questão, visto que ela seria, em tese, uma
das maiores interessadas nas decisões que serão tomadas pelas autoridades
administrativas.

A Consulente informa que a entidade privada promoverá encontro nacional entre as


Delegacias de Segurança Privada do Departamento de Polícia Federal, distribuídas em
todo o território nacional, para tratar da uniformidade de procedimentos entre aquelas
Delegacias. A referida entidade propõe custear as despesas de deslocamento e
alimentação para os Delegados Titulares das Delegacias de Segurança Privada
participantes do evento.

Diante do exposto, questiona:

“Tendo em vista a edição do Código de Conduta da Alta Administração Federal,


publicado no DOU 22.8.2000, dispor em seu art. 7º, parágrafo único, verbis: ‘Art. 7º. (...) É
permitida a participação em seminários, congressos e eventos semelhantes, desde que
tornada pública eventual remuneração, bem como o pagamento das despesas de viagem
pelo promotor do evento, o qual não poderá ter interesse em decisão a ser tomada pela
autoridade’. É possível, sob o ponto de vista legal, aquela Federação, que tem por
interesse promover a segurança de transportes de valores, atividade sob a fiscalização
das referidas Delegacias de Segurança Privada, custear tais despesas?”.

Preliminarmente, urge salientar alguns aspectos que, na exposição da consulta,


chamaram a atenção.

O primeiro deles é o fato de empresa privada estar promovendo encontro nacional entre
as Delegacias de Segurança Privada da Polícia Federal, distribuídas em todo o território
nacional, para tratar da uniformidade de procedimentos entre aquelas Delegacias.

À primeira vista, parece que a competência para a instauração e promoção de um evento


dessa natureza é da própria Polícia Federal, ainda mais se nessa oportunidade forem
tomadas medidas relativas às atividades do ente administrativo (uniformidade de
procedimentos).

Num segundo momento, tudo estaria a indicar que a interessada, entidade privada, em
promover o mencionado encontro nacional das Delegacias de Segurança Privada da
Polícia Federal é justamente uma das maiores interessadas nas eventuais decisões que
possam ser tomadas para a uniformização dos procedimentos entre essas Delegacias,
uma vez que ela representa justamente as empresas de segurança e transporte de
valores sujeitas à fiscalização das Delegacias sob comando dos Delegados que
participarão do evento.

À luz dessas observações, traz-se à tona o conteúdo do art. 7º do Código de Conduta da


Alta Administração Federal:

“Art. 7º. A autoridade pública não poderá receber salário ou qualquer outra remuneração
de fonte privada em desacordo com a lei, nem receber transporte, hospedagem ou
quaisquer favores de particulares de forma a permitir situação que possa gerar dúvida
sobre a sua probidade ou honorabilidade.

Parágrafo único. É permitida a participação em seminários, congressos e eventos


semelhantes, desde que tornada pública eventual remuneração, bem como o pagamento
das despesas de viagem pelo promotor do evento, o qual não poderá ter interesse em
decisão a ser tomada pela autoridade”. (Destacamos.)

Nota-se que o dispositivo do Código veda expressamente a percepção de qualquer


vantagem por agente administrativo. Não obstante, prescreve exceção a essa condição,
a qual, para se aperfeiçoar, demanda a satisfação de alguns requisitos, quais sejam, a
publicidade de eventual remuneração, e que o fato de o pagamento das despesas de
viagem ser feito pelo promotor do evento seja divulgado (publicado) e, como requisito
fundamental, que o patrocinador da despesa não tenha interesse na decisão a ser
tomada pela autoridade.

Constata-se facilmente que esse código tem como finalidade dar efetividade aos
princípios da moralidade2 e da probidade administrativas.

A moralidade administrativa transcende a legalidade imposta pelo ordenamento jurídico.


Diante disso, assinala-se que esse princípio possui caráter de aferição muito mais
subjetivo do que objetivo, tal como ocorre com o princípio da boa-fé. 3

A despeito desse apontamento, pode-se dizer que o princípio da moralidade


administrativa determina que o agente público, mais que observar a lei e o ordenamento
jurídico, deve se eximir de, no desenvolvimento da função administrativa, praticar
condutas em desacordo com a ética e a moral. Tão importante quanto o cumprimento do
princípio da legalidade é a observação do princípio da moralidade, dado que uma
conduta compatível com a lei, mas em desconformidade com a ética ou com a moral,
será inválida.

No que tange ao princípio da moralidade, traz-se a lume a lição de Lúcia Valle


Figueiredo: “o princípio da moralidade vai corresponder ao conjunto de regras de
conduta da Administração que, em determinado ordenamento jurídico, são consideradas
os ‘standards’ comportamentais que a sociedade deseja e espera”. 4

Esse princípio privilegia a idéia do bom administrador, do agente administrativo que


desenvolve sua função de acordo com os postulados da ética, da seriedade, do perfeito
atendimento à função administrativa, do interesse público e dos princípios impostos
pelo regime jurídico-administrativo.

Odete Medauar, nesse passo, cita Manoel de Oliveira Franco Sobrinho, para quem “Muito
embora não se cometam faltas legais, a ordem jurídica não justifica no excesso, no
desvio, no arbítrio, motivações outras que não encontram garantia no interesse geral,
público e necessário;... o que se quer defender é a lisura ou a exação nas práticas
administrativas;... a presunção de fim legal equivale à presunção de moralidade”. 5
Destarte, responde-se objetivamente à consulta formulada de modo a concluir-se pela
provável impossibilidade de as despesas relativas a encontro de Delegados da Polícia
Federal serem assumidas pela entidade privada interessada, uma vez que esta possui
interesse direto nas decisões a serem tomadas nesse encontro, hipótese expressamente
vedada pelo Código de Conduta da Alta Administração Federal.

Salvo melhor juízo, essa é a orientação da Consultoria Zênite, elaborada de acordo com
os subsídios fornecidos pela Consulente.

1
Orientação jurídica a consulta formulada por assinante do IDAF cuja identificação foi
propositadamente omitida, elaborada pela Consultoria Zênite.
2
Atenta-se que o princípio da moralidade é consagrado constitucionalmente: “Art. 37 - A
administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:”.
3
Marçal Justen Filho, Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, 7ª ed.,
São Paulo, Dialética, 2000, p. 71, afirma que: “A moralidade e a probidade administrativas
são princípios de conteúdo inespecífico, que não podem ser explicados de modo
exaustivo. A explicação, nesse ponto, será sempre aproximativa”.
4
Lúcia Valle Figueiredo, Curso de direito administrativo, 4ª ed., São Paulo, Malheiros
Editores, 2000, p. 53.
5
Odete Medauar, Direito administrativo moderno, 3ª ed., São Paulo, Editora Revista dos
Tribunais, 1999, p. 142.

Consulta em Destaque Imprimir

Título:

AGENTES
PÚBLICO
S-
COMPETÊ
NCIA
ADMINIS
TRATIVA
-
DELEGAÇ
ÃO -
RESPONS
ABILIDA
DES -
CONSIDE
RAÇÕES

CONSULTAS EM DESTAQUE - 537/18/JAN/2003

AGENTES PÚBLICOS – COMPETÊNCIA ADMINISTRATIVA – DELEGAÇÃO


– RESPONSABILIDADES – CONSIDERAÇÕES.
ORIENTAÇÃO JURÍDICA1

EMENTA: Competência – Delegação – Considerações.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL: Decreto nº 83.726/79; Lei nº 9.784, de 29.01.99.

1. Competência. Delegação. Necessidade de previsão legal. Plexo de atribuições


conferidas ao agente com exclusividade. Impossibilidade de delegação.

2. Delegação de competência. Transferência das atribuições inerentes ao cargo público


para outro agente público. Inadequação. Impossibilidade de esvaziamento da
competência. Lesão aos princípios da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade.

3. Responsabilidade. A regra geral o agente que praticou o ato é responsabilizado por


eventuais danos causados à Administração ou a terceiros. Posição jurisprudencial.

1 CONSULTA

Determinado Secretário de Estado pode delegar competência a servidor subalterno para


atuar como ordenador de despesas, deixando de assinar todos os documentos relativos
à rotina administrativa e financeira, p. ex., autorização de licitação e sua posterior
homologação, empenhos, contratos, convênios, ordens bancárias e outros documentos
correlatos? Pode se eximir de eventual responsabilidade futura perante os órgãos de
controle interno, órgãos de controle externo, Ministério Público e Poder Judiciário, ou
responde solidariamente pelos atos praticados, já que delegou competência, mas não a
responsabilidade como agente público?

2 FUNDAMENTOS LEGAIS E DOUTRINÁRIOS

Num primeiro passo é de se observar que a competência consiste na outorga de


desenvolver determinadas atribuições. No nosso sistema jurídico, sob o plano da
validade, a competência deve derivar de lei e por ela ser delimitada. É, também,
indeclinável, pois é conferida em prol do interesse público.

A doutrina2 se posiciona quanto à matéria mediante a seguinte construção teórica.

Hely Lopes Meirelles3, assim define o tema:

"Entende-se por competência administrativa o poder atribuído ao agente da


Administração para o desempenho específico de suas funções. A competência resulta
da lei e por ela é delimitada. Todo ato emanado de agente incompetente, ou realizado
além do limite de que dispõe a autoridade incumbida de sua prática, é inválido, por lhe
faltar um elemento básico de perfeição, qual seja, o poder jurídico para manifestar a
vontade da Administração. Daí a oportuna advertência de Caio Tácito de que “'não é
competente quem quer, mas quem pode, segundo a norma de Direito.'” 4

Assim, a regra é de que o agente administrativo competente 5 é responsável pelos atos


que pratica.

Por outro lado, a competência pode ser objeto de delegação segundo Odete Medauar: 6

"Mediante a delegação de competência um órgão ou autoridade, titular de determinados


poderes e atribuições, transfere a outro órgão ou autoridade (em geral de nível
hierárquico inferior) parcela de tais poderes e atribuições. A autoridade que transfere
tem o nome de delegante; a autoridade ou órgão que recebem as atribuições
denominam-se delegados; o ato pelo qual se efetua a transferência intitula-se ato de
delegação.

O ato de delegação, em geral especifica as matérias transferidas, os limites da atuação


da autoridade delegada, a duração e os objetivos de delegação. No silêncio quanto à
duração, entende-se que a transferência perdurará até que seja cessada".

Observa-se, então, que a delegação não significa o esvaziamento da competência de


quem dela se utiliza como instrumento de eficiência administrativa. Ou seja, não se
apresenta juridicamente aceitável que, através da delegação, o agente político – como no
caso em análise – transfira todas as atribuições que são inerentes ao seu cargo, ficando
desobrigado do seu total desempenho e das conseqüências de sua prática.

Por certo, em situações eventuais, como ausências legais para o exercício da função (p.
ex., viagens) ou outros impedimentos, poderá o agente delegado praticar todos os atos
que são inerentes ao cargo do delegante. Porém, frise-se que essa é uma hipótese que
somente encontra suporte na excepcionalidade e, por óbvio, nos limites legais da
delegação.

Ademais disso, redundaria em violação aos princípios da legalidade, da razoabilidade e


da proporcionalidade que um agente público pudesse se eximir de todas as atribuições
pertinentes ao seu cargo, pois a competência é irrenunciável.

Nesta ordem de idéias, demonstra-se necessário que seja observado se no ordenamento


jurídico aplicável ao órgão há legislação específica quanto à competência e sua
delegação, como ocorre na Administração Pública Federal, com a Lei nº 9.784, de
29.01.99, que dispõe sobre o processo administrativo:

"Art. 11 A competência é irrenunciável e se exerce pelos órgãos administrativos a que foi


atribuída como própria, salvo os casos de delegação e avocação legalmente admitidos.

Art. 12 Um órgão administrativo e seu titular poderão, se não houver impedimento legal,
delegar parte da sua competência a outros órgãos ou titulares, ainda que estes não lhe
sejam hierarquicamente subordinados, quando for conveniente, em razão de
circunstâncias de índole técnica, social, econômica, jurídica ou territorial.

(...)

Art. 13 Não podem ser objeto de delegação:

I - a edição de atos de caráter normativo;

II - a decisão de recursos administrativos;


III - as matérias de competência exclusiva do órgão ou autoridade.

(...)

§ 1º O ato de delegação especificará as matérias e poderes transferidos, os limites da


atuação do delegado, a duração e os objetivos da delegação e o recurso cabível,
podendo conter ressalva de exercício da atribuição delegada.

§ 2º O ato de delegação é revogável a qualquer tempo pela autoridade delegante.

§ 3º As decisões adotadas por delegação devem mencionar explicitamente esta


qualidade e considerar-se-ão editadas pelo delegado.

Art. 15 Será permitida, em caráter excepcional e por motivos relevantes devidamente


justificados, a avocação temporária de competência atribuída a órgão hierarquicamente
inferior.

(...)". (Grifamos.)

Da transcrição do texto legal constata-se que a delegação deve ter limites estritamente
definidos, no que tange aos poderes delegados, delimitação de atuação do delegado,
duração e objetivos. Impende ressaltar que essa é uma regra insculpida na Lei de
Processo Administrativo em âmbito federal, para situação específica que é o processo
administrativo e que, para a prática de outros atos administrativos, pode haver
normatização própria disciplinando o assunto de forma distinta e específica.

Tecidos esses comentários gerais sobre competência e delegação, cabe, em síntese,


reforçar que a transferência de poderes e atribuições de uma autoridade administrativa
para outra, através do instituto da delegação, somente pode ocorrer se estiver
adequadamente previsto em lei e não incida sobre competência conferida com
exclusividade.

Desse modo, a primeira providência a ser adotada é a análise quanto à competência e


sua exclusividade, a fim de se conferir tais e quais atos podem ser objeto de delegação.

É, ainda, fundamental acentuar que o agente que delega competência jamais deixa de
ser competente para a prática do ato e que pode, a qualquer momento, chamar a sua
emissão novamente para si. Trata-se da conseqüência lógica de que a delegação, como
já visto, não significa a eliminação da competência do agente que delegou.

Frente às considerações apresentadas no que tange à competência, à delegação, sua


disciplina e necessidade de autorização legal, depreende-se, como ponto inicial, que o
agente delegado será o responsável pelos atos praticados por delegação. No entanto,
essa assertiva não afasta eventual responsabilização do agente que detinha a
competência originariamente, se restar comprovado que houve lesão aos princípios que
regem a atuação administrativa no exercício da delegação 7, ou mesmo culpa in eligendo,
ao nomear alguém que às escâncaras não detinha conhecimento técnico ou idoneidade
moral para assumir as atribuições próprias de seu cargo.

A jurisprudência emanada do Tribunal Regional Federal, da Primeira Região sobre tal


responsabilidade, segue o seguinte sentido:

"Mandado de Segurança – Administrativo – Concurso público – Reserva de vagas para


ascensão funcional de Técnico do Tesouro Nacional ao cargo de Auditores Fiscais do
Tesouro Nacional – Autoridade coatora – Legitimidade passiva.

1 - Para que a Autoridade seja considerada legítima a responder pela prática do ato, há
que ser considerado o ponto de partida deste mesmo ato. A simples delegação de
competência para realizá-lo não transfere a responsabilidade para o funcionário que o
executou.

2 - Apelação improvida.

3 - Sentença confirmada. (AMS nº 1273385 – TRF – 1ª Região – 1ª Turma – Rel. Juiz Catão
Alves – DJ 11.03.99)".

3 CONCLUSÕES

Diante aos argumentos expostos, conclui-se que a competência decorre sempre da lei, é
inderrogável e pode ser objeto de delegação ou de avocação, desde que não se trate de
competência conferida a determinado órgão ou agente, com exclusividade, pela lei.

Assim, para a solução dos questionamentos propostos, é preciso verificar o plexo de


competências dos agentes públicos (nesse caso, Secretários de Estado) para,
posteriormente, definir os poderes e atribuições conferidos com exclusividade, daqueles
que podem, legalmente, ser objeto de delegação.

Uma vez identificadas as atividades mencionadas pela Consulente como passíveis de


delegação, resta analisar a questão sob a ótica da responsabilidade, que é, em verdade,
o cerne do questionamento.

Em princípio, pode-se afirmar que a responsabilidade pela prática de atos danosos é do


agente que efetivamente os emitiu, seja em decorrência de competência que lhe tenha
sido atribuída originariamente por lei, ou mediante delegação. Entretanto, isso não
significa que o agente que delegou poderes para atuar em seu nome não possa ser
responsabilizado. Para tanto, há que se perquirir se houve delegação em dissonância
com os princípios da legalidade, da razoabilidade, da proporcionalidade e outros
aplicáveis ao caso, caracterizando um verdadeiro esvaziamento das atribuições do
agente público.

No caso concreto apresentado, não se afigura possível, desde logo, afirmar de forma
extreme de dúvidas que existe ou não responsabilidade solidária do agente que detinha
inicialmente a competência para a prática de certos atos (delegante) em relação a
eventuais danos causados pelo agente atuando por delegação (delegado), tendo em
vista a necessidade de verificação da legislação pertinente na seara da Consulente.

Salvo melhor juízo, essa é a orientação da Consultoria Zênite, elaborada de acordo com
os subsídios fornecidos pela Consulente.

1
Orientação jurídica elaborada pelo Corpo de Consultores da Consultoria Zênite à
consulta formulada por assinante do IDAF cuja identificação foi propositadamente
omitida.
2
Sobre o assunto, aduz Lúcia Valle Figueiredo: “Em primeiro lugar devemos analisar a
competência, tal seja, o plexo de atribuições outorgadas pela lei ao agente
administrativo para a consecução do interesse público postulado pela norma. A
competência, no dizer de Caio Tácito, não é um ‘cheque em branco’. É demarcada,
limitada. A Administração deve concretizar a utilidade pública. Para isso detém
competências específicas. Destarte, vício de competência existirá sempre que houver
uso desconforme ou ausência de permissão legal para a prática de determinado ato”.
Curso de direito administrativo. 4. ed. São Paulo: Malheiros, p. 175.
3
Direito administrativo brasileiro. 20. ed., São Paulo: Malheiros, 1999, p. 134.
4
TÁCITO, Caio. O abuso de poder administrativo no Brasil, Rio. 1959, p. 27.
5
Maria Sylvia Zanella Di Pietro enumera regras pertinentes a competência, quais sejam:
“1. decorre sempre da lei, não podendo o próprio órgão estabelecer, por si, suas
atribuições; 2. é inderrogável, seja pela vontade da Administração, seja por acordo com
terceiros; isto porque a competência é conferida em benefício do interesse público; 3.
pode ser objeto de delegação ou de avocação, desde que não se trate de competência
conferida a determinado órgão ou agente, com exclusividade, pela lei”. Direito
administrativo. 12. ed., Jurídico Atlas, p. 189.
6
Direito administrativo moderno. 3. ed., Revista dos Tribunais, p. 59-61.
7
Isso deixando de lado outras hipóteses mais incisivas quanto à própria legalidade da
atuação do agente público em eventual conluio com o agente que praticou os atos que
deram ensejo à responsabilização.

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Título:

Agente
público -
Cargo,
emprego
e função
-
Contrataç
ão de
pessoa
pelo
administr
ador
público -
Ausência
de cargo
vago -
Ônus
financeiro
arcado
pelo
agente
público
contratan
te -
“Funcion
ário de
fato” -
Impossibi
lidade -
Repercus
sões na
esfera
administr
ativa e
jurisdicio
nal

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 1415/36/JUL/2004

PERGUNTA 4

Determinado administrador público pretende contratar uma


secretária pessoal pelo período de 4 horas diárias, sob o regime
celetista, uma vez que existe no quadro do órgão o cargo de
secretária administrativa, porém não há cargo vago para
admissão pelo regime estatutário, mediante concurso público. É
legal a prestação de serviços por indivíduo contratado
pessoalmente pelo administrador, sem vínculo com o Poder
Público, mediante o pagamento de salários arcados pelo agente
público e com seus próprios recursos?

RESPOSTA

A Constituição Federal permite que as pessoas jurídicas de direito público tenham, em seus
quadros funcionais, tanto servidores titulares de cargos, quanto empregados públicos, exceto
as pessoas jurídicas de direito privado, empresas públicas e sociedades de economia mista,
que terão, obrigatoriamente, empregados públicos.

Já as funções públicas são conceituadas por Celso Antônio Bandeira de Mello 1 de forma
restritiva, abrangendo unicamente os núcleos de competências, criados por lei 2, concernentes
aos encargos de direção, chefia ou assessoramento, os quais serão exercidos por titulares de
cargo efetivo.

Na situação concreta, o administrador público pretende contratar, às suas próprias expensas,


uma secretária, tendo em vista que todos os cargos de secretariado existentes já estão
ocupados.

Com base em tais informações, é de fácil dedução que a pessoa, contratada nos termos
cogitados, apesar de não estar investida em cargo público, atuará como se o estivesse
ocupando, pois prestará serviços para a Administração Pública mediante atos materiais (como
enviar fax, atender telefone, redigir documentos públicos, etc.), tendentes a desempenhar
função pública e, por conseguinte, estará sujeita aos ditames impostos para o atendimento do
interesse público. Seria ela, em verdade, um funcionário de fato.

Na lição de Cármen Lúcia Antunes Rocha:

Considera-se servidor de fato a pessoa que exerce as funções públicas inerentes a cargo ou
emprego público sem investidura legalmente válida. A pessoa que se põe na condição de
servidor de fato não teve provimento no cargo, função ou emprego público, ou aquele ato que
lhe teria conduzido a tal provimento eivou-se de vício, originária ou incidentalmente, o que o
tornou, juridicamente, inexistente, nulo ou irregular. 3

E mais à frente, conclui a autora:

Diversa, pois, é a situação jurídica do servidor de fato ou servidor aparente. Esse tem os seus
atos validados ou não, conforme a condição na qual se tenha dado a sua prática e em cotejo
com os seus efeitos sociais e jurídicos. O regime de responsabilidade que subordina essa
situação fática é tratado em normas específicas, não naquelas que definem o regime jurídico
do servidor público. Esse é o que vem para servir o administrado. Aquele vem para se servir
da administração, ainda que involuntária ou inconscientemente, mas, com certeza,
irregularmente.4 (Grifamos)

Convém mencionar, ainda, que o Superior Tribunal de Justiça já determinou o pagamento de


salário, pela Administração, a funcionário de fato, posto que há vedação constitucional ao
trabalho gratuito.

No caso exposto, embora seja o administrador quem irá arcar com o salário da secretária, esta
irá desempenhar função pública; receberá ordens daquele agente público. 5 Assim, não se
afasta de todo a possibilidade de eventual condenação da Administração pelo Poder Judiciário
no mesmo sentido acima noticiado.

Ao lado disso, por configurar a situação de funcionário de fato, há o vício de competência e


eventuais atos administrativos praticados por pessoa nessa circunstância deverão ser
convalidados. Se a incompetência for o único defeito do ato, devem ser verificadas em cada
caso concreto a necessidade e a possibilidade de convalidação, visando à proteção do terceiro
de boa-fé.

Em que pese seja louvável o desejo do administrador público, de melhorar a eficiência da


Administração com a referida contratação, arcando com o ônus financeiro de uma pessoa que
executará os serviços de um funcionário público – cujo cargo tem previsão no quadro e há
funções específicas –, a pretendida decisão não encontra respaldo no ordenamento jurídico,
razão pela qual se conclui pela impossibilidade da contratação.

1
Op. cit. p. 227. Odete Medauar entende que também exercem função pública os servidores
contratados temporariamente (além dos já citados por Bandeira de Mello), nos termos do art.
37, inc.IX, da Constituição da República, In: Direito administrativo moderno. 4. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2000. p. 313.

No mesmo sentido é a lição de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, “Portanto, perante a Constituição
atual, quando se fala em função, tem-se que ter em vista dois tipos de situações:

1. a função exercida por servidores contratados temporariamente com base no art. 37, IX (...);

2. as funções de natureza permanente, correspondente a chefia direção, assessoramento ou


outro tipo de atividade para a qual o legislador não crie o cargo respectivo; em geral, são
funções de confiança, de livre provimento e exoneração; (...)”. Direito administrativo. 11. ed.
São Paulo: Atlas, 1999. p. 421-422.

2
Segundo Caio Tácito (Temas de direito público. Rio de Janeiro: Renovar, 1997. p. 1487):

“Na função pública – e este é um ponto geralmente obscurecido – nenhum dos dois sujeitos da
relação jurídica determina as respectivas condições: nem à administração, nem ao funcionário
cabe ditar o regime da função pública; ele resulta da lei e por ela é alterado’.”

3
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos. São
Paulo: Saraiva, 1999. p. 140.
4
Ibid., p. 141.

5
“RESP – FUNCIONÁRIO DE FATO – TRABALHO – PAGAMENTO – O trabalho, por sua
natureza, é remunerável e vedado o trabalho gratuito. Se o estado se beneficiou de serviço
de terceiro, cumpre efetuar o pagamento. Não se invoca, no caso, a condição de funcionário
público, mas remuneração pela vantagem recebida” (Grifamos). (Resp nº 48412/SC – DJ
08.08.1994 – 6ª Turma – Rel. Min. Luiz Vicente Cernecchiaro

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Título:

Agentes
públicos
– Curso
de
aperfeiço
amento –
Custeio
pelo
servidor
público –
Autorizaç
ão pelo
ordenado
r da
despesa

Ausência
de prévio
empenho
e de
celebraçã
o de
contrato

Reembols
o–
Possibilid
ade –
Verificaçã
o de
requisitos
para
assunção
do ônus
pela
Administr
ação –
Hipótese
de
responsa
bilização

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 575/29/DEZ/2003


PERGUNTA 1

Foi autorizada a participação de servidor, pelo ordenador de despesa, em curso de


aperfeiçoamento oferecido por determinada instituição de ensino, porém não houve
empenho da despesa nem foi firmado contrato. O curso já foi ministrado, o servidor
custeou-o às suas expensas, e está requerendo reembolso do valor pago àquela
instituição de ensino. Ele tem direito ao reembolso?

RESPOSTA

A Administração Pública está submetida ao ordenamento jurídico e, portanto, à legalidade 1 e à


moralidade administrativa, de sorte que a sua finalidade precípua é a satisfação do interesse
público.

Para o custeio regular de um curso de especialização pela Administração deve ser


demonstrada a existência do interesse público, ou seja, reste devida e cabalmente
justificado que a atividade se destinará a atender às necessidades administrativas e, em
última análise, ao fim público. Em outras palavras, é indispensável a exposição das razões de
fato e de direito que servirão à providência pretendida, através da motivação, bem como a
imperiosa necessidade do curso estar diretamente relacionado às áreas de interesse do serviço
público e ser imprescindível ao aprimoramento do referido servidor.

Também é fundamental, para o custeio do curso de aprimoramento, que exista um programa


que preveja os critérios e forma de como se dará a capacitação dos servidores, respeitando a
isonomia entre as diversas categorias funcionais.

Outro requisito é que haja disponibilidade de verba orçamentária (legislação orçamentária),


observados os preceitos da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000) à
geração da despesa pública, seja como criação, expansão e aperfeiçoamento de ação
governamental (arts. 15 a 17), ou como despesas de pessoal (arts. 19 a 23).

É preciso, ainda, verificar as normas aplicáveis à Administração sobre o pagamento de cursos


de aperfeiçoamento com ônus para o Poder Público. Caso tenha ocorrido autorização expressa
e observadas todas as premissas mencionadas, apenas ausente a formalização dos
procedimentos para a realização da despesa, não parece haver impedimento ao reembolso
pretendido, na forma de reconhecimento de dívida devidamente instruído em processo
administrativo específico. Do contrário, a autorização seria manifestamente ilegal e um eventual
pagamento a posteriori sujeitaria tanto o ordenador de despesa como o servidor, conforme a
participação de cada qual, à responsabilização.

* Esta seção é elaborada pelo Corpo de Consultores da Consultoria Zênite.

1
MEIRELLES, Hely Lopes. (Direito administrativo brasileiro. 20. ed. Malheiros Editores. p. 82 e
83) sintetiza bem tal entendimento, aduzindo: "Na Administração não há liberdade nem vontade
pessoal. Enquanto na Administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na
Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza".

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Título:
Agentes
públicos -
Curso de
aperfeiço
amento -
Desistênc
ia ou
reprovaç
ão -
Comprom
etimento
de
ressarcim
ento ao
erário -
Considera
ções

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 841/21/ABR/2003

PERGUNTA 3

Órgão da administração direta contratou uma instituição de ensino, após licitação, para
executar curso de especialização na área fazendária. O servidor-aluno que se
inscrevesse no curso assinava documento no qual se comprometia, em caso de
desistência e/ou reprovação por motivo de falta injustificada, a ressarcir o Estado das
despesas. No entanto, certo servidor deixou de realizar as atividades individuais e não
entregou a monografia no final do curso. Devem ser cobrados, pelo Poder Público, os
valores gastos com esse servidor?

RESPOSTA

Em primeiro plano, deve-se ressaltar que o servidor, ao ingressar no curso de


especialização na área fazendária, firmou um termo de compromisso, no qual se
obrigava a ressarcir o Estado, em casos de desistência e/ou reprovação. 1

À vista do acima consignado, nota-se que o servidor-aluno ao não realizar as atividades


individuais, bem como ao não entregar a monografia de final de curso, não cumpriu seu
compromisso com o Poder Público, e por essa razão fica obrigado a ressarcir o erário.
Em outras palavras, é inegável que poderá a Administração Pública cobrar os gastos
efetuados no referido curso de capacitação profissional.

No entanto, urge frisar que deve ser compulsado o Estatuto dos Servidores que regem a
vínculo funcional de tais servidores com a finalidade de verificar se há previsão legal
sobre o assunto – ressarcimento ao erário, de forma geral – e, ainda, qual o
procedimento a ser adotado pelo Poder Público para proceder à mencionada cobrança.

Por oportuno, trazemos à colação a jurisprudência a seguir transcrita: “Ressarcimento


de despesas feitas pelo Tesouro Nacional com ex-servidor em missão de estudos no
exterior. Comprovado o abandono, confirma-se a sentença que julgou procedente o
ressarcimento pelo réu”. (REO nº 51.764-SP, DJ de 16.08.79, p. 6.034.)

Oportuno sublinhar que o agente administrativo está sujeito à observância das


disposições estatutárias que prevêem deveres funcionais, dentre eles o de lealdade e o
de manter conduta compatível com a moralidade administrativa.

Acerca do dever de lealdade, leciona o saudoso mestre Hely Lopes Meirelles 2 que:

"O dever de lealdade, também denominado de dever de fidelidade, exige de todo


servidor a maior dedicação ao serviço e o integral respeito às leis e às instituições
constitucionais, identificando-o com os superiores interesses do Estado. Tal dever
impede que o servidor atue contra os fins e os objetivos legítimos da Administração,
pois que, se assim agisse, incorreria em infidelidade funcional, ensejadora da mais grave
penalidade, que é a demissão, vale dizer, o desligamento compulsório do serviço
público".

Além desses deveres, o agente administrativo está sujeito ao dever de prestar contas,
que decorre da essência do exercício da atividade de gestão de bens, direitos e serviços
alheios, consoante estabelecido no art. 70 da Constituição Federal/88.

Por fim, adverte-se que a violação ou mera inobservância dos deveres pelo servidor dão
margem à responsabilidade administrativa, conduzindo à circunstância de instauração
de processo disciplinar pela Administração Pública, respeitados, por evidente, os
princípios da ampla defesa e do contraditório e cogitação de aplicação de penalidade ao
agente público que violou deveres funcionais ou não cumpriu obrigações assumidas. 3

1
À título ilustrativo, no âmbito federal, o assunto é tratado pelo Decreto Federal nº
2.794/98, e subsidiariamente pelo Decreto nº 91.800/85. De acordo com as regras neste
último insculpidas, sendo o curso de aperfeiçoamento custeado pelo Poder Público, o
servidor que não concluí-lo deverá ressarcir as despesas havidas com o curso.
2
In: Direito administrativo brasileiro. 20. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1995.
3
O assunto, na esfera federal, está regulado no art. 127 da Lei nº 8.112/90.

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Tipo de Ato Decisório:

Acórdão

Número do Ato 359/2002


Decisório:
Órgão Julgador: TCU - 2ª Câmara
Data do Julgamento: 08/08/2002
Relator: Valmir Campelo
Ementa do Ato Decisório: Recurso de Reconsideração interposto pelo interessado contra o Acórdão nº
349/2001 - TCU - 2ª Câmara, que julgou suas contas irregulares quando do
exame da TCE instaurada pelo CNPq em decorrência do descumprimento das
obrigações assumidas em relatório à bolsa de estudos para realização de curso
de doutorado no exterior - Conhecimento do recurso para, no mérito, negar-lhe
provimento, mantendo, em todos os seus termos, o Acórdão recorrido -
Ciênciancia do inteiro teor da deliberação ao interessado.

TRIBUNAIS DE CONTAS - 977/32/MAR/2004

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO

Acórdão nº: 359/2002 – 2ª Câmara


Relator: Ministro Valmir Campelo
Data: 08.08.2002
Fonte: DOU nº 159, de 19.08.2002

Assunto:
Agentes públicos – Afastamento para realização de curso de doutorado no exterior –
Concessão de bolsa de estudos – Descumprimento das obrigações assumidas – Dever
de ressarcimento das despesas ao erário.

Ementa:
Recurso de Reconsideração interposto pelo interessado contra o Acórdão nº 349/2001 –
TCU - 2ª Câmara, que julgou suas contas irregulares quando do exame da TCE
instaurada pelo CNPq em decorrência do descumprimento das obrigações assumidas
em relatório à bolsa de estudos para realização de curso de doutorado no exterior –
Conhecimento do recurso para, no mérito, negar-lhe provimento, mantendo, em todos os
seus termos, o Acórdão recorrido – Ciência do inteiro teor da deliberação ao
interessado.

Relatório e Voto

Recurso de Reconsideração interposto pelo interessado, Sr. José Alexandre Ferreira Filho,
contra o Acórdão nº 349/2001 - TCU - 2ª Câmara, que julgou irregulares suas contas nos autos
da TCE instaurada pelo CNPq em decorrência do descumprimento das obrigações assumidas
em relação à bolsa de estudos concedida para a realização de curso de doutorado na
Université Catholique de Louvain, na cidade de Louvain-La-Neuve, Bélgica.

2. Na presente postulação, o recorrente reapresenta a argumentação já analisada e rejeitada


quando da apreciação das alegações de defesa iniciais. Resta infrutífera a intenção do
recorrente, visto que continua notório o fato de que o dispêndio dos recursos para capacitar um
servidor público não atingiu o objetivo, sendo agora, necessariamente, responsabilizado pelo
insucesso do projeto, visto ter deixado de participar dos estudos e, mesmo assim, recebido os
valores relativos à bolsa de estudos sem nada comunicar ao órgão concedente.

3. Nesse passo, considero oportuno trazer à colação a seqüência de informações de mérito


oferecidas pela zelosa SERUR às fls. 13/18, consubstanciadas nos termos a seguir:

Trata-se de Recurso de Reconsideração interposto pelo Sr. José Alexandre Ferreira Filho,
beneficiário de bolsa de estudo no exterior concedida pelo Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, objetivando a reforma do Acórdão nº
349/2001, prolatado pela E. 2ª Câmara na Sessão Ordinária realizada em 07/06/2001, lavrado
nos seguintes termos:

VISTOS, relatados e discutidos estes autos que tratam de Tomada de Contas Especial
instaurada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, em
nome do Sr. José Alexandre Ferreira Filho, em decorrência do descumprimento de obrigações
assumidas em contrapartida ao recebimento de bolsa de estudos para a realização de curso
de doutorado na Université Catholique de Louvain, na cidade de Louvain-La-Neuve, Bélgica.

Considerando o descumprimento dos itens 2, 9, 10 e 13 do Termo de Compromisso


assinado pelo responsável quando do recebimento da bolsa de estudos;

Considerando que o responsável sequer concluiu curso de mestrado, deixando de


concluir o curso de doutorado que era o objeto da bolsa de estudos;

Considerando que o responsável agiu de má-fé ao retornar ao Brasil para ocupar emprego
junto ao Governo de Pernambuco, sem comunicar o fato ao CNPq, fazendo-o crer que
permanecia na Bélgica desenvolvendo seus estudos;

Considerando que o responsável, ao assumir novo emprego, infringiu o § 2º do art. 95 da


Lei nº 8.112/90 e o § 3º do art. 47 do Decreto nº 94.664/87, que prevêem, em tais situações,
a necessidade de ressarcimento integral das quantias despendidas com o treinamento do
servidor,

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão da 2ª Câmara,


com fulcro nos arts. 1º, inciso I, 16, inciso III, alínea ‘b’, 19 e 23, inciso III, todos da Lei nº
8.443/92, em: a) julgar irregulares as presentes contas e em débito o Sr. José Alexandre
Ferreira Filho, fixando-lhe o prazo de 15 (quinze) dias, a partir da notificação, para que
comprove, perante este Tribunal (art. 165, III, alínea ‘a’, do Regimento Interno), o recolhimento
dos valores abaixo referidos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico - CNPq, acrescidos da atualização monetária e dos juros de mora devidos,
contados a partir das respectivas datas, até o dia do efetivo pagamento, nos termos da
legislação em vigor: (...)

b) aplicar ao responsável a multa referida no art. 57 da Lei nº 8.443/92, arbitrando-lhe o


valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), correspondente a aproximadamente 15% do valor
atualizado do débito, fixando o prazo de 15 (quinze) dias, a partir da notificação, para que
comprove, perante o Tribunal (art. 165, III, alínea “a” do Regimento Interno), seu recolhimento
aos cofres do Tesouro Nacional, atualizado monetariamente a partir do dia seguinte ao término
do prazo ora fixado, até a data do efetivo pagamento;

c) autorizar, desde logo, com fulcro no art. 28, inciso II, da Lei nº 8.443/92, a cobrança judicial
das dívidas, caso não atendidas as notificações;

d) determinar ao CNPq:

d.1) que inclua o nome do responsável, Sr. José Alexandre Ferreira Filho, no CADIN, caso essa
providência ainda não tenha sido adotada;

d.2) que se utilize de maior rigor quando da análise e concessão de bolsas no exterior, de
modo a evitar-se situações como a constatada nestes autos;

e) determinar à Universidade Federal de Roraima que proceda ao levantamento dos


valores pagos ao Sr. José Alexandre Ferreira Filho durante o período de acumulação
ilícita (setembro de 1996 a agosto de 1997) e efetue sua cobrança, instaurando, se
necessário, processo de tomada de contas especial. (os destaques não são do original).

2. Inconformado com a referida condenação, o responsável interpôs o recurso ora em exame,


onde, repisando diversos argumentos já apresentados ao Tribunal quando da apresentação
das alegações de defesa (fls. 223/234 do v. p.), alega em síntese:

a) o relatório do condutor do acórdão vergastado limitou-se a dizer que as alegações eram


insuficientes, sem trazer razão substancial (fl. 1, v. 1);

b) o fato inquinado foi enquadrado, no voto que fundamentou o acórdão recorrido, nas
situações previstas no § 2º do artigo 95 da Lei nº 8.112/90 e no § 3º do artigo 47 do Decreto nº
94.664/97, o que seria indevido porque a tomada de contas especial foi instaurada para apurar
eventual descumprimento do Termo de Compromisso firmado para obtenção da bolsa de
estudos e não a situação funcional do recorrente (fl. 2, v. 1);

c) o recorrente dedicou-se integral e exclusivamente ao curso enquanto esteve na Bélgica no


período de ago/94-ago/96 e, mesmo retornando ao Brasil para não perder o cargo público
efetivo referente ao concurso prestado desde 1992, continuou envidando esforços para concluir
o curso, sendo equivocada a presunção de que “apenas assistiu às aulas sem ter realizado
exames” (fls. 3 e 6, v. 1);

d) o mestrado teria ficado pendente apenas pela dissertação da tese, que efetivamente chegou
a ser elaborada e seu projeto levado ao orientador para defesa em janeiro de 1998, consoante
registrado em documentos elaborados pelo CNPq ali referenciados (fls. 3/6, v.1);

e) o CNPq sabia a todo tempo que o recorrente necessitava cursar o mestrado como pré-
requisito para o doutorado, o que refutaria a constatação referenciada no acórdão condenatório
no sentido de que o interessado deixou de concluir o curso de doutorado, que era objeto da
bolsa de estudos (fl. 5, v. 1);

f) não há como considerar má-fé do responsável, posto que restou demonstrado o animus de
concluir o curso, evidenciado pelo vínculo mantido com a Universidade estrangeira e pelas
atividades desenvolvidas para elaboração da respectiva dissertação (fl. 6, v. 1);

g) a cobrança dos valores liberados pelo CNPq anteriormente a agosto de 1996 seria indevida
e inexeqüível pelas seguintes razões: o bolsista efetivamente morou com sua família e estudou,
com dedicação exclusiva, na Bélgica de setembro de 1994 a julho de 1996; a hipossuficiência
de recursos por parte do responsável foi reconhecida e determinante para a concessão do
benefício; os valores liberados têm natureza alimentar, posto que destinados à manutenção do
interessado e de sua família, além do pagamento do curso, devendo ser considerada a sua
consuntibilidade; e o descumprimento formal e apenas parcial da avença não tem o condão de
invalidar todo o contrato (fls. 6/8, v. 1);

h) o procedimento adotado pelo CNPq ao instaurar a TCE, ratificado pelo TCU, desafia o plano
da lógica e se converte ao dogmatismo, apegando-se o acórdão condenatório ao formalismo
exacerbado, sem considerar as particularidades do caso sub examine e sem levar em conta,
ainda, que o CNPq não condena bolsistas a devolução de qualquer quantia em razão de
insucesso na realização dos estudos (fls. 6/7, v.1); e

i) a concessão da bolsa em comento se deu a título de meio de realização do curso e não de


resultado, sendo tais meios devidamente utilizados, como reconheceu a própria auditoria do
CNPq (fl. 8).

2.1. Arrematando a peça recursal, o interessado requer seja reconsiderado o r. decisum e


julgadas regulares com ressalvas as presentes contas, ou, pelo menos, retificado o valor do
débito, reconhecendo como quantum debeatur a quantia liberada a partir de agosto de 1996,
quando o responsável retornou ao Brasil (fl. 8, v. 1).
3. O exame dos autos permite ratificar a análise prévia de admissibilidade constante à fl. 10 do
volume 1, razão pela qual o presente feito pode ser conhecido como recurso de
reconsideração, com fundamento nos artigos 32, inciso I e 33 da Lei nº 8.443/92.

4. As alegações apresentadas na peça recursal podem ser agrupadas em três questões, a


saber: os fundamentos da condenação - no caso, o não atingimento da finalidade da avença e
o descumprimento das obrigações assumidas -, a boa-fé do responsável e o valor do débito a
ele imputado.

4.1. A propósito dos fundamentos da condenação, cabe assinalar, inicialmente, que não há
dúvida que o objetivo da bolsa era a obtenção, pelo beneficiário, no período de 01/09/1994 a
31/08/1997 (1) do título de doutor em Economia fornecido por universidade estrangeira,
abrangendo, como pré-requisito, sua aprovação no curso de mestrado oferecido pela mesma
instituição.

(1) O período de vigência da concessão foi inicialmente fixado em 01/09/1994 a 31/08/1996 e


sucessivamente prorrogado até 31/08/1997 (fls. 13, 35, 37/39, e 41/44, v.p.).

4.1.1. Deixando de lado qualquer questionamento sobre a conveniência e oportunidade de o


CNPq conceder bolsas de estudo para cursos de doutorado a pessoas não habilitadas - fato
que, cumpre assinalar, ensejou a determinação constante da alínea ‘d.2’ do acórdão
combatido, dirigida ao CNPq -, releva observar que aquela entidade, ao examinar o último
pedido de prorrogação formulado pelo interessado, ressaltou que já naquela oportunidade
(10/09/1997) revelava-se praticamente impossível a obtenção do título de doutor até agosto de
1998 (prazo máximo de vigência da bolsa), visto que o interessado ainda não havia completado
o período probatório para o ingresso no doutorado, o que se daria somente após a aprovação
de sua tese de mestrado, cuja defesa estava prevista para janeiro de 1998 (fl. 45 do v.p.).

4.1.2. Curioso notar que embora questione a assertiva constante do acórdão vergastado no
sentido de que sequer o mestrado chegou a ser concluído, o responsável, tanto nas alegações
de defesa como no recurso ora em exame, apresentados, respectivamente, em 22/05/2000 e
26/07/2001, apenas anuncia que a defesa da tese estava marcada para janeiro de 1998,
reportando-se, a título de comprovação do feito, a trechos de pareceres do CNPq, sem
apresentar qualquer documento que demonstre o resultado alcançado relativamente ao
mestrado.

4.1.3. Sobejamente evidenciado, desse modo, o cabal descumprimento da finalidade


perseguida quando da concessão do auxílio financeiro em questão. Nesse sentido, é imperioso
notar que o entendimento defendido pelo recorrente, no tocante a constituir tal benefício
apenas o meio para a obtenção do título almejado, decorre de uma visão personalíssima da
utilização dos recursos públicos. Sob o ponto de vista do interesse da Administração, ou seja,
da boa e regular aplicação dos recursos orçamentários, o que se observa é que os valores
despendidos para capacitar um servidor público não lograram êxito. Exatamente por essa
razão o legislador estabeleceu que em tais circunstâncias devem os mesmos retornar, em sua
totalidade, aos cofres da União.

4.1.4. De igual modo, visando assegurar a sobredita boa e regular aplicação de tais recursos,
foram estabelecidos compromissos e obrigações, assumidos pelos beneficiários de auxílios
financeiros dessa natureza. No caso do recorrente, destacam-se, entre as obrigações
consignadas no Termo de Compromisso por ele assinado (fls. 11/12 do v.p.): item 01: cumprir
as disposições da Lei nº 8.112/90 e do Decreto nº 91.800/85, que tratam, respectivamente, do
regime jurídico dos servidores públicos civis da União e de viagens ao exterior; item 02:
dedicar-se integral e exclusivamente ao curso objeto da bolsa de estudos; item 9: somente
empreender viagens mediante autorização daquela entidade; item 10: informar o órgão
concedente sobre qualquer alteração em sua situação financeira ou na de seus familiares
durante a vigência da bolsa; e item 13: retornar ao Brasil em até 90 dias contados do
encerramento da bolsa ou da atividade.

4.1.4.1. Diferentemente do acordado, o responsável, sem sequer dar ciência ao CNPq,


retornou ao Brasil em agosto de 1996, deixando de dedicar-se integral e exclusivamente ao
curso, fato que, certamente contribuiu para o insucesso aqui tratado. Ademais, fê-lo para
assumir outro cargo efetivo, com infringência aos dispositivos constitucionais e legais que
vedam a acumulação de cargos.

4.1.4.2. Tais fatos, longe de caracterizarem falha formal, demonstram que a concessão em tela
não logrou êxito, com conseqüências não apenas financeiras, mas, também, na consecução
dos objetivos traçados pelo Governo Federal relativamente à capacitação dos integrantes de
seus quadros. Por conseguinte, não há como atribuir ao acórdão vergastado dogmatismo ou
formalismo exacerbado, tal como intenta o recorrente. Note-se, supletivamente, que não há no
referido decisum (e nem mesmo nos respectivos Relatório e Voto) qualquer presunção de que
o recorrente teria apenas assistido às aulas sem realizar os exames, tal como foi asseverado
na peça recursal.

4.1.5. No que concerne ao objeto da presente TCE, equivoca-se o recorrente ao considerar que
em razão de terem sido mencionados no acórdão condenatório os dispositivos ínsitos no § 2º
do artigo 95 da Lei nº 8.112/90 e no § 3º do artigo 47 do Decreto nº 94.664/87, estaria o
Tribunal examinando sua situação funcional, em lugar do descumprimento das condições
estabelecidas para obtenção da bolsa de estudos, fato que ensejou a instauração do presente
processo.

4.1.5.1. A esse respeito releva esclarecer que a situação funcional do responsável,


notadamente a acumulação ilícita de cargos, ensejou, sim, determinação do Tribunal à
Universidade Federal de Roraima no sentido de promover o levantamento e a cobrança dos
valores indevidamente pagos, instaurando, se necessário, outra tomada de contas especial (v.
alínea ‘e’ do acórdão transcrito no item 1 desta instrução).

4.1.5.2. Ademais, as normas legais e infralegais em comento, a seguir transcritas, versam


sobre a obrigatoriedade de serem as despesas ressarcidas, caso infringidas as condições ali
estabelecidas.

Art. 95. O servidor não poderá ausentar-se do País para estudo ou missão oficial, sem
autorização do Presidente da República, Presidente dos Órgãos do Poder Legislativo e
Presidente do Supremo Tribunal Federal.

...................................................................................................

§ 2º Ao servidor beneficiado pelo disposto neste artigo não será concedida exoneração ou
licença para tratar de interesse particular antes de decorrido período igual ao do afastamento,
ressalvada a hipótese de ressarcimento da despesa havida com seu afastamento. (grifamos) e

Art. 47. Além dos casos previstos na legislação vigente, o ocupante de cargo ou emprego das
carreiras de Magistério e Técnico-administrativo poderá afastar-se de suas funções,
assegurados todos os direitos e vantagens a que fizer jus em razão da atividade docente:

I - para aperfeiçoar-se em instituição nacional ou estrangeira;

...................................................................................................

3º A concessão do afastamento a que se refere o item I importará no compromisso de, ao seu


retorno, o servidor permanecer, obrigatoriamente, na IFE, por tempo igual ao do afastamento,
incluídas as prorrogações, sob pena de indenização de todas as despesas. (grifamos)

4.2. No que se refere à alegada boa-fé do responsável, os elementos contidos nos autos
revelam atitudes do responsável que levaram o CNPq a crer que o mesmo encontrava-se na
Bélgica, quando, de fato, estava em território nacional - v. p. ex., a carta dirigida àquela
entidade em 27/11/1996, onde é indicada a cidade de Louvain-La-Neuve como originária da
correspondência (fl. 40, v.p.), em confronto com as informações do responsável no sentido de
que retornou ao Brasil em agosto de 1996 e somente voltou à Bélgica em 1997 (fls. 224 e 229,
v. p.).

4.2.1. Ademais, deve ser observado que o pedido de exoneração, dirigido à Universidade
Federal de Roraima, somente foi efetuado em 30/07/1997, após o interessado tomar
conhecimento do inquérito administrativo instaurado em decorrência da denúncia de
acumulação ilícita de cargos, formulada pelo extinto Ministério da Administração e Reforma do
Estado - MARE a partir do cruzamento de informações funcionais de servidores (fls. 182/184, v.
p.).

4.2.1.1. Desse modo, o recorrente permaneceu recebendo, até agosto de 1997, proventos
daquela IFE, de onde estava afastado com ônus limitado (v. fl. 162, v. p.), cumulativamente com
os proventos do Governo do Estado de Pernambuco, percebidos a partir de 19/08/1996, e com
auxílio financeiro concedido pelo CNPq. Tivesse o responsável solicitado tempestivamente sua
exoneração, afastando a acumulação ilícita, e comunicado sua nova situação funcional ao
CNPq, certamente seria chamado a devolver os recursos despendidos, na forma da legislação
pertinente.

4.2.2. Já a alegação do interessado quanto ao ânimo demonstrado para concluir o curso


revela-se irrelevante, in casu, notadamente se considerarmos seu interesse pessoal em obter o
título em comento, dados os benefícios profissionais dele decorrentes.

4.3. No tocante ao valor do débito, temos por despiciendas maiores considerações sobre o
montante a ser ressarcido pelo responsável, tendo em vista que as normas legais e infralegais
transcritas no subitem 4.1.5.2 desta Instrução e a própria condição estabelecida no Termo de
Compromisso assinado pelo responsável ao receber a bolsa de estudos são absolutamente
claros quanto à obrigatoriedade de ser devolvida a totalidade dos recursos despendidos pela
União.

4.3.1. Cumpre assinalar, apenas, que a assertiva apresentada pelo recorrente no sentido de
que o CNPq não requer a devolução dos recursos por parte dos bolsistas que tenham tido
insucesso na consecução dos estudos (fl. 7, v.1) não guarda relevo relativamente à situação
aqui tratada, que se refere, conforme fartamente demonstrado, ao não cumprimento das
obrigações assumidas em contrapartida ao recebimento de bolsa de estudos.

4.3.2. Configura-se inepta, também, a alegação de impossibilidade de serem os recursos


devolvidos em virtude de sua natureza alimentar e da consuntibilidade dos mesmos, posto que
desprovida de razoabilidade e de qualquer respaldo lógico e jurídico. Esposar tal entendimento
significaria tornar letra morta os dispositivos legais aqui mencionados, atinentes à
obrigatoriedade de devolução de tais valores nos casos ali previstos, bem assim as próprias
normas de concessão de tais benefícios, acolhidas pelo recorrente ao celebrar a avença.

4.3.2.1. Importa enfatizar, por fim, que o sustento do responsável e de seus dependentes
durante a realização dos estudos na Bélgica foi garantido pela União, mediante autorização de
afastamento do País com ônus limitado, proporcionando, por conseguinte, a manutenção do
pagamento dos vencimentos relativos ao cargo efetivo que ocupava na Universidade Federal
de Roraima. Desse modo, a discussão da natureza alimentar e consumptível dos valores em
epígrafe traduz-se inócua, além de desviar o foco da matéria sub examine.

5. Releva destacar, finalmente, que se encontram acostados às fls. 267/269 do volume principal
documentos estranhos aos presentes autos. Examinando tais peças, observamos que tratam-
se de elementos relativos ao TC-275.237/1995-8, referente à tomada de contas especial da
Prefeitura Municipal de Maracanaú (CE). Por esta razão, sugerimos sejam tais peças
desentranhadas dos presentes autos e encaminhadas à SECEX/PE para que adote as
providências cabíveis.

6. Por todo o exposto, submetemos os autos à consideração superior, propondo:

a) seja conhecido o Recurso de Reconsideração apresentado pelo Sr. José Alexandre Ferreira
Filho, ante o preenchimento dos requisitos de admissibilidade insculpidos nos artigos 32, inciso
I, e 33 da Lei nº 8.443/92, para, no mérito, negar-lhe provimento, mantendo-se, nos exatos
termos, o Acórdão nº 349/2001, prolatado pela E. 2ª Câmara na Sessão Ordinária realizada em
07/06/2001;

b) seja o recorrente comunicado da decisão que vier a ser adotada pelo Tribunal; e

c) sejam desentranhados dos presentes autos os documentos acostados às fls. 267/269 do


volume principal, e encaminhados à SECEX/PE para que proceda a sua juntada ao TC-
275.237/1995-8, que trata do assunto ali referenciado.

4. O ilustre Representante do Ministério Público, manifestando-se à fl. 19, põe-se de acordo


com a Unidade Técnica.

Assim, acolhendo os pareceres da Unidade Técnica e do Ministério Público, VOTO no sentido


de que o Tribunal adote o Acórdão que ora submeto à deliberação desta Câmara.

T.C.U., Sala das Sessões, em 08 de agosto de 2002.

VALMIR CAMPELO
Ministro-Relator

Acórdão

1. Processo: TC-008.316/1999-6 (com 1 volume)

2. Classe de Assunto I: Recurso de Reconsideração

3. Interessado: José Alexandre Ferreira Filho

4. Entidade: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq

5. Relator: Ministro Valmir Campelo

6. Representante do Ministério Público: Dr. Lucas Rocha Furtado

7. Unidade Técnica: SERUR

8. Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Reconsideração movido pelo Sr.
José Alexandre Ferreira Filho contra o Acórdão nº 349/2001 - TCU - 2ª Câmara, que julgou
irregulares as contas do interessado, quando da apreciação da TCE instaurada pelo CNPq em
decorrência do descumprimento das obrigações assumidas em relação à bolsa de estudos
concedida;

Considerando que os argumentos agora apresentados neste recurso de reconsideração são os


mesmos das alegações iniciais, já rejeitadas;

Considerando que o recorrente não deu prosseguimento aos estudos para os quais recebera a
bolsa de estudos e, mesmo assim, continuou recebendo os correspondentes recursos públicos;
e

Considerando o inteiro teor dos pareceres da Unidade Técnica e do douto representante do


Ministério Público, uniformes em seu mérito;

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão da 2ª Câmara,


ante as razões expostas pelo Relator, com fundamento nos arts. 32, inciso I, e 33 da Lei nº
8.443/92, em:

8.1. conhecer do presente Recurso de Reconsideração para, no mérito, negar-lhe provimento,


mantendo-se inalterados os termos do Acórdão nº 349/2001 - TCU - 2ª Câmara, de 07.06.2001;

8.2. que sejam desentranhados dos presentes autos os documentos acostados às fl. 267/269
do volume principal e encaminhados à SECEX/PE para que proceda a sua juntada ao TC-
275.237/1995-8, que trata do assunto ali referenciado;

8.3. levar ao conhecimento do recorrente o inteiro teor da presente deliberação.

9. Ata nº 29/2002 - 2ª Câmara

10. Data da Sessão: 08/08/2002 - Ordinária

11. Especificação do quorum:

11.1. Ministros presentes: Adylson Motta (na Presidência), Valmir Campelo (Relator), Ubiratan
Aguiar e Benjamin Zymler.

ADYLSON MOTTA
na Presidência

VALMIR CAMPELO
Ministro-Relator

Fui presente: MARINUS EDUARDO DE VRIES MARSICO


Rep. do Ministério Público

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Título:
AGENTES
PÚBLICO
S-
CURSOS
DE
ESPECIAL
IZAÇÃO -
PREVISÃ
O
ORÇAME
NTÁRIA -
CONFIGU
RAÇÃO
DE
INTERES
SE
PÚBLICO
-
GARANTI
AS DE
RETORN
O DO
INVESTI
MENTO
PARA A
ADMINIS
TRAÇÃO
PÚBLICA

CONSULTAS EM DESTAQUE - 744/08/MAR/2002

AGENTES PÚBLICOS – CURSOS DE ESPECIALIZAÇÃO – PREVISÃO


ORÇAMENTÁRIA – CONFIGURAÇÃO DE INTERESSE PÚBLICO –
GARANTIAS DE RETORNO DO INVESTIMENTO PARA A ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA.

ORIENTAÇÃO JURÍDICA.1

EMENTA: Agentes públicos – Cursos de especialização.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL: Constituição da República.

1. Custeio de cursos de especialização aos servidores. Verbas orçamentárias. Interesse


público. Possibilidade. Desnecessidade de lei específica.

2. A escolha dos servidores deverá se dar por meio de critérios objetivos.


Impossibilidade de escolha arbitrária por parte de determinada autoridade.

3. Necessidade de previsão sobre a obrigatoriedade de devolução dos recursos


investidos em caso de desligamento do serviço público.
I - CONSULTA.

A Consulta é a seguinte:

“Almejando propiciar o aprimoramento profissional de seus servidores, o Município, ao


promover o custeio integral ou parcial de cursos de espe-cialização, destinados aos
procuradores e consultores integrantes de seu quadro funcional, quer saber se há
necessidade de autorização legislativa específica para implementação do referido
projeto ou é suficiente a previsão e existência de recursos orçamentários para tal
finalidade? Como deve a Administração proceder em relação à escolha dos servidores a
serem beneficiados caso o número de interessados exceda às vagas existentes: é
imprescindível a instauração de modalidade seletiva, com critérios previamente
definidos ou pode haver livre escolha do titular da Pasta de Assuntos Jurídicos? É
permitida a instituição da obrigatoriedade da devolução do total despendido para o
custeio do curso, devidamente atualizado, para os servidores que se desligarem do
serviço público, no período de três anos ulteriores à conclusão do curso, uma vez que o
objetivo colimado, embora resulte em inevitável proveito pessoal, traduz-se no
aprimoramento técnico vocacionado ao atendimento das necessidades do Município?”.

II - FUNDAMENTAÇÃO.

Em razão do princípio da legalidade, a Administração só está autorizada a fazer o que o


ordenamento jurídico permite. Hely Lopes Meirelles 2 sintetiza bem tal entendimento,
aduzindo:

“Na Administração não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na Administração


particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é
permitido fazer o que a lei autoriza”.

Por evidente, não é apenas o princípio da legalidade que está a submeter a


Administração e que deve, por ela, ser respeitado. A atuação administrativa, além de
legal, deve ser moral e atender à finalidade precípua da Administração Pública, que é a
satisfação do interesse público.

Desse modo, para que o projeto cogitado se efetive de maneira adequada, é


indispensável que a Administração justifique a presença do interesse público, ou seja,
demonstre, de forma motivada, que a concessão do benefício dos cursos de
especialização resultarão no atendimento de suas necessidades.

Neste passo, é oportuna a menção ao regime jurídico-administrativo que, consoante o


entendimento de Celso Antônio Bandeira de Mello3, constitui-se a partir do binômio
“prerrogativas da Administração – direitos dos administrados”, sendo elementos desse
binômio o conteúdo dos princípios da supremacia do interesse público e da
indisponibilidade do interesse público pela Administração.

Portanto, fica impedida a Administração de formalizar vínculos que não atendam aos
interesses da coletividade, visto que aí seria flagrante a violação aos princípios
conformadores do regime jurídico-administrativo.

A idéia relaciona-se com o princípio constitucional da motivação dos atos


administrativos, sobre o qual Celso Antônio Bandeira de Mello4 ensina:

“Dito princípio implica para a Administração o dever de justificar seus atos, apontando-
lhes os fundamentos de direito e de fato, assim como a correlação lógica entre os
eventos e situações que deu por existentes e a providência tomada, nos casos em que
este último aclaramento seja necessário para aferir-se a consonância da conduta
administrativa”.

Também nessa hipótese é vetor da atuação administrativa os seus peculiares fins.


Indicada aqui a precisa lição de Hely Lopes Meirelles: 5

“Em última análise, os fins da Administração consubstanciam-se na defesa do interesse


público, assim entendidas aquelas aspirações ou vantagens licitamente almejadas por
toda a comunidade administrada ou por uma parte expressiva de seus membros. O ato
ou contrato administrativo realizado sem interesse público configura desvio de
finalidade”.

É, pois, premissa inarredável para que a Administração arque com os custos dos
mencionados cursos de especialização de seus servidores, a demonstração da
existência de interesse público, e que tais cursos sejam imprescindíveis para o
aprimoramento dos servidores, isso implica que, obviamente, sejam relativos às áreas
de interesse da Administração.

Outro requisito essencial, já apontado pelo Consulente, é que existam a previsão e a


disponibilidade de verba orçamentária.

Caso haja mais interessados que vagas disponíveis, deverá a Administração, atendendo
ao princípio da isonomia, definir regras e critérios objetivos para a escolha dos
servidores, restando inadequada e passível de impugnação a escolha, pura e simples,
por parte de determinada autoridade. A seleção deve ser cuidadosa, motivada e atender
à isonomia.

É de se alertar que se apresenta injustificada a eventual circunstância de assunção, pela


Administração, de custos do curso de especialização para servidores em cargos em
comissão ou empregados temporários, em detrimento dos servidores do quadro
permanente. Tal afirmativa assenta-se na necessidade de retorno do investimento para a
Administração dos que serão beneficiados com os cursos, pois os comissionados
mantêm vínculo precário e os temporários possuem contrato por prazo determinado.

Ainda que oferecendo os cursos apenas para o pessoal do quadro permanente, entende-
se necessário que seja fixada, previamente, a obrigatoriedade de devolução dos
recursos investidos caso o servidor se desligue do serviço público em determinado
período relativamente curto de tempo.

III - CONCLUSÕES.

Diante de todo o exposto, respondendo objetivamente à presente consulta, entende-se


que a Administração Pública pode, e deve, propiciar o aprimoramento profissional de
seus servidores públicos, com as devidas justificativas e, existindo verbas
orçamentárias próprias, entende-se adequada a promoção do custeio integral ou parcial
de cursos de especialização, sem a necessidade de que, para isso, seja necessária lei
específica autorizativa.

Ao lado disso, a indicação dos servidores beneficiados deverá se dar mediante critérios
objetivos, sendo desaconselhável a escolha arbitrária por parte de determinada
autoridade administrativa.

É de todo conveniente, já que serão utilizados recursos do erário e para o melhor


atendimento do interesse público, a fixação prévia sobre a obrigatoriedade de devolução
dos recursos investidos, caso o servidor contemplado se desligue do serviço público em
determinado espaço de tempo.

Salvo melhor juízo, essa é a orientação da Consultoria Zênite, elaborada de acordo com
os subsídios fornecidos pelo Consulente.

1
Orientação jurídica a consulta formulada por assinante do IDAF cuja identificação foi
propositadamente omitida, elaborada pelo Corpo de Consultores da Consultoria Zênite.
2
Direito administrativo brasileiro, Malheiros Editores, 20ª ed., p. 82-83.
3
Curso de direito administrativo, Malheiros Editores, 12 ª ed., p. 28.
4
Curso de direito administrativo, 11ª ed., São Paulo, Malheiros, 1998, p. 69.
5
Direito administrativo brasileiro, 20ª ed., Malheiros, 1995, p. 81-82.

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Título:

Agentes
públicos -
Denúncia
em
processo
crime -
Exoneraç
ão -
Impossibi
lidade

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 72/13/AGO/2002

PERGUNTA 8

É possível exonerar servidor público que respondeu a processo


administrativo cuja penalidade foi de suspensão por 60 dias e agora foi
denunciado em processo crime?

RESPOSTA

Atente-se inicialmente que a mera denúncia em processo crime não faz presumir que há
culpa. Esta somente será constatada após o trânsito em julgado de sentença penal
condenatória (cf. CF, art. 5º, inc. LVII).

Além disso, há que se observar que o ilícito penal nem sempre configura também um
ilícito administrativo. Destarte, a comunicação entre tais esferas punitivas deverá ser
analisada em cada caso concreto.

Assim sendo, o servidor público somente poderá ser exonerado diante de uma das
hipóteses expressamente previstas nos estatutos que regem o respectivo vínculo
jurídico. Não se enquadrando a hipótese descrita em qualquer daquelas expressamente
arroladas em lei, não há como exonerar o servidor em questão.

Em consonância do mandamento constitucional acima transcrito, o Código Penal em


seu art. 92, assim disciplina:

"Art. 92 São também efeitos da condenação:

I - a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo:

a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano,
nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a
Administração Pública;

b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos
nos demais casos.

...

Parágrafo único. Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser
motivadamente declarados na sentença". (Grifamos.)

Conseqüentemente, ante ao que dispõe o Código Penal, o servidor poderá ser


exonerado nos casos em que a condenação penal venha a surtir tal efeito, caso
contrário, não obstante a natureza da pena aplicada, essa não terá o condão da
exoneração.

Ademais, a exoneração dependerá sempre do devido processo administrativo, onde seja


assegurado ao servidor o direito ao contraditório e à ampla defesa.

Portanto, somente se poderá exonerar o servidor público após o trânsito em julgado de


sentença penal condenatória, à qual tenha sido atribuído esse efeito.

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Título:

Agentes
públicos -
Descoloc
amente
da sede -
Concessã
o de
Diária -
Requisito
de
temporali
dade -
Hipóteses
legais e
infralegai
s-
Considera
ções

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 460/17/DEZ/2002

PERGUNTA 4

Servidor público federal, lotado e em exercício em determinada localidade, foi deslocado


para exercer suas atividades em outra unidade, onde permaneceu por um longo tempo
(800 dias aproximadamente). Ao solicitar o pagamento de diárias é informado que não
tinha direito à percepção por ter sido deslocado para a representação desse órgão na
localidade e por inexistir, neste caso, o caráter de temporalidade. Assim sendo, está
correta a atuação da Administração Pública?

RESPOSTA

A rigor, a legislação específica traz a previsão do pagamento de diárias a título de


indenização por despesas extraordinárias decorrentes do deslocamento de servidores
de seu local de trabalho (p. ex.: pousada, alimentação e locomoção urbana). É esse,
aliás, o conteúdo do art. 58 da Lei nº 8.112/90, determinando que sejam observados,
ainda, os termos do regulamento, in verbis:

"Art. 58 O servidor que, a serviço, afastar-se da sede em caráter eventual ou transitório


para outro ponto do território nacional ou para o exterior, fará jus a passagens e diárias
destinadas a indenizar as parcelas de despesas extraordinária com pousada,
alimentação e locomoção urbana, conforme dispuser em regulamento.

§ 1º A diária será concedida por dia de afastamento, sendo devida pela metade quando o
deslocamento não exigir pernoite fora da sede, ou quando a União custear, por meio
diverso, as despesas extraordinárias cobertas por diárias.

§ 2º Nos casos em que o deslocamento da sede constituir exigência permanente do


cargo o servidor não fará jus a diárias.

§ 3º Também não fará jus a diárias o servidor que se deslocar dentro da mesma região
metropolitana, aglomeração urbana ou microrregião, constituídas por municípios
limítrofes e regularmente instituídas, ou em áreas de controle integrado mantidas com
países limítrofes, cuja jurisdição e competência dos órgãos, entidades e servidores
brasileiros considera-se estendida, salvo se houver pernoite fora da sede, hipóteses em
que as diárias pagas serão sempre as fixadas para os afastamentos dentro do território
nacional". (Grifamos.)

Portanto, a Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, no art. 58, regulamentada pelo


Decreto nº 343, de 1991 e pelo Decreto nº 3.643, de 26.10.2000, determina que o
pagamento de diárias tem por finalidade indenizar o servidor de despesas
extraordinárias com pousada, alimentação e locomoção urbana, quando efetivamente
houver o afastamento da sede em caráter eventual ou transitório.

Importa realçar que a concessão de diárias necessita de motivação detalhada para o


deslocamento do servidor, assim como a existência de nexo entre as atribuições
regulamentares e as atividades realizadas quando da viagem.

Nesse sentido, a diária é uma espécie de indenização ao servidor que, ao afastar-se da


sede em caráter eventual ou transitório, receberá um quantum para as despesas
extraordinárias como pousada, alimentação e locomoção urbana. Vê-se, pois, o caráter
indenizatório e não remuneratório das diárias.

As diárias indenizadas, segundo Cármen Lúcia Antunes Rocha, “visa deixar sem dano o
patrimônio daquele que a ela tem direito, pelo que, evidentemente, jamais se poderia
deixar de indenizá-lo.”1 A própria autora aduz ainda que “as indenizações são
recomposições de valor gasto em razão do próprio serviço, pelo que são situações
precárias, com motivação específica e prevista em lei”. (Grifamos.)

A consideração que se pode genericamente tecer é no sentido de que o “fato gerador”,


por assim dizer, do dever de pagar as diárias é a existência de despesas com
movimentação do servidor, a serviço da Administração, para localidade diversa daquela
em que realiza suas atividades em caráter exclusivamente transitório ou eventual em que
não ocorra pela necessidade de permanência do cargo na nova sede.

Senão, vejamos o que diz a jurisprudência:

"Administrativo – Servidor – Deslocamento do local de trabalho – Caráter permanente –


Diárias indevidas – Indenização – Lei nº 8.216.

1. Se os afastamentos do servidor do local de trabalho constituem exigência permanente


das atividades que exerce, não ensejam a concessão de diárias (art. 58, PAR-2, da Lei nº
8.112)". (AC n° 9604459759 – TRF 4ª Região – 3ª Turma – Rel. Juíza Vivian Josete
Pantaleão Caminho.)

Portanto, no caso concreto, verifica-se que o servidor deslocado para atuar em nova
sede, no prazo noticiado, aproximadamente 800 dias, não faz jus à concessão de diárias,
porquanto afastado o seu caráter temporal e constituir exigência de permanente devido
às atribuições do cargo.

1
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos.
São Paulo: Saraiva, 1999, p. 313.

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Título:

Agentes
públicos -
Desvio de
função -
Descump
rimento
de ordem
emitida
por
superior
hierárqui
co -
Considera
ções

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 162/14/SET/2002

PERGUNTA 5

Um servidor em desvio de função pode ser punido, após o devido


processo administrativo, se não cumprir serviço extraordinário para o
qual foi designado?

RESPOSTA

Ocorre o desvio de função quando um servidor exerce atribuições diversas daquelas


relativas ao cargo, emprego ou função que titulariza, o que, a princípio, é uma ruptura
das regras constitucionais (desempenho de funções sem a prévia aprovação em
concurso público – art. 37, inc. II). 1

A Administração deve verificar, num primeiro momento, se o Estatuto dos seus


Servidores não contém expressa vedação do desvio de função.

Note-se que em determinados estatutos existe a previsão de exceção com relação à


caracterização de desvio de função. Exemplo disso é o art. 117 da Lei nº 8.112/90
(Estatuto dos Servidores Federais), em seu inc. XVII, ao disciplinar que ao servidor é
proibido cometer a outro servidor atribuições estranhas ao cargo que ocupa, exceto em
situações de emergência e transitórias.

Há decisões do TRF 5ª Região, no sentido de considerar lícito que um servidor ocupe


outras funções (desvio de função) em situação emergencial e transitória, nos termos da
Lei nº 8.112/90 (AC 88452 e AC 83996).

Esse dispositivo da Lei nº 8.112/90 é aplicável apenas para os servidores federais, e não
aos servidores de Administrações de outras esferas da Federação. De qualquer forma,
deverá ser consultado se no Estatuto próprio dos servidores não existe disposição
sobre o tema, no sentido de ser confirmado se realmente ocorreu um desvio de função
ilícito. É, pois, essencial que o Poder Público, nesse caso, confirme se o desvio de
função ocorrido foi lícito ou não.

Entre os deveres dos servidores está o dever de obediência (acatamento) às ordem


legais de seus superiores e sua fiel execução. 2 Odete Medauar informa que nos
enunciados relativos aos deveres dos servidores, dentre os mais genéricos e comuns,
está o dever de desempenhar as atribuições do cargo ou função e o já citado dever de
obediência.3

Entende-se que, a princípio, a Administração estaria desprovida de fundamentos legais


para aplicar penalidades ao servidor, mesmo após o devido processo administrativo com
contraditório e ampla defesa, se aquele se recusar a cumprir serviço extraordinário no
qual reste caracterizado o desvio de função ilícito. Seria, a rigor, uma determinação ilegal
de sua autoridade o mandamento da execução de serviços que não estivessem no rol
dos relativos à função ou ao cargo desse servidor.

Contudo, se por algum motivo, a Administração constatar que o desvio de função


ocorrido, na situação em tela, foi lícito, não poderia o servidor que recebeu ordem de
determinada autoridade, no sentido de prestar serviços extraordinários, recusar-se a
exercê-los, sob pena de, por meio de processo administrativo, serem aplicadas as
sanções cabíveis disciplinadas no Estatuto dos Servidores.

Da mesma forma, caso o desvio de função em tela seja considerado lícito, nos termos
aqui tratados, o servidor poderá ser penalizado nos termos das normas pertinentes, por
descumprimento de ordem exarada por autoridade e/ou por não cumprir as obrigações
legalmente constituídas, respeitados os princípios constitucionais relativos ao processo
administrativo a que venha a ser submetido.

1
Sobre o tema, indicamos a leitura da pergunta e resposta publicada no IDAF nº 11,
jun./2002. p. 1.018.
2
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 25. ed. São Paulo: Malheiros,
2000. p. 427.
3
MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 4. ed. São Paulo: RT, 2000. p. 346 a
348. Sobre os deveres dos servidores municipais, também recomenda-se que a
Administração verifique o que estipula o seu Estatuto, uma vez que, novamente nos
utilizando como exemplo da Lei nº 8.112/90, o seu art. 116, inc. IV, dispõe que entre os
deveres dos servidores está o cumprimento às ordens superiores, exceto quando
manifestamente ilegais.

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Título:

Agentes
públicos -
Desvio de
função -
Ferias -
Aplicação
da CLT
condicion
ada à
previsão
expressa
no
Estatuto

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 1018/11/JUN/2002

PERGUNTA 5

Um servidor municipal completou período aquisitivo de férias (12 meses)


em cargo diferente daquele no qual ingressou no serviço público (desvio
de função), inclusive com vencimentos superiores. Considerando que ele
voltou ao seu cargo de origem para se aposentar e não gozou as férias, o
terço constitucional deve ser pago com base nos vencimentos do cargo
ocupado em que se implementou o período aquisitivo ou no cargo em
que se aposentou? A CLT poderá ser usada supletivamente, ante a
omissão do estatuto municipal? Se possível, como a legislação
trabalhista cuida da matéria?

RESPOSTA

Dá-se o desvio de função quando um servidor passa a exercer atribuições diversas


daquelas relativas ao cargo, emprego ou função que titulariza.

Cármen Lúcia Antunes Rocha assim comenta o assunto:

"Dá-se o denominado ‘desvio de função’ quando um servidor é nomeado e investido em


um cargo público e passa a desempenhar funções inerentes a outrem, mediante ato que
o designa para tanto, sem qualquer comportamento formal.

(...)

Os casos para os quais se admite que um servidor nomeado para determinado cargo
preste as funções inerentes a outro são, exclusivamente, aqueles previstos em lei
expressa, tal como se dá em hipótese de substituição precária por licença médica de um
servidor e impossibilidade de ficar sem o contínuo desempenho das atividades por ele
desempenhadas. Afasta-se, precária e temporariamente, o servidor das funções do cargo
por ele ocupado para o atendimento daquelas correspondentes ao outro que não está
sendo ocupado porque se deu a sua vacância ou porque algum fato imprevisto
determinou o afastamento momentâneo de seu ocupante". 1

Em vista do exposto, o desvio de função caracteriza ruptura das regras constitucionais,


considerando que admite que determinado sujeito passe a desempenhar funções sem a
prévia aprovação em concurso público (art. 37, inc. II), já que o certame no qual foi
aprovado resultou em sua nomeação para o exercício de cargo completamente distinto
do ocupado.

Todavia, mesmo se tratando de atuação administrativa eivada de vício, não poderia o


servidor desviado de suas funções originárias deixar de receber os vencimentos
relativos àqueles da função exercida de fato.
Entendimento adotado em sentido contrário ocasionaria a aceitação de enriquecimento
ilícito por parte do Poder Público, o qual se consubstanciaria no fato de o servidor
exercer certa função, cumprir com as responsabilidades a ele inerentes e receber como
contraprestação as vantagens decorrentes do cargo de origem, se inferiores os
vencimentos.

Nesse sentido, direciona-se o seguinte julgado do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

"Desvio de função - Vencimentos - Diferenças. Reiterada jurisprudência desta Corte no


sentido de que o servidor que desempenha função diversa daquela inerente ao cargo
para o qual foi investido, embora não faça jus a reenquadramento, tem direito a perceber
as diferenças remuneratórias relativas ao período, sob pena de se gerar locupletamento
indevido pela Administração. Recurso a que se nega provimento". (STJ – RESP 202922 –
Processo: 1999.00.08728-3 – Quinta Turma – Data da Decisão: 26.10.1999 – Rel. Min. Felix
Fischer).

Feitas essas considerações, em síntese, é possível concluir que o desvio de função é


ilegal, mas, a despeito disso, não retira do servidor o direito ao recebimento dos
vencimentos decorrentes do cargo exercido.

A mesma ordem de idéias se aplica às férias, pois, verificado o cumprimento do período


necessário para que faça jus ao seu gozo, deverá o terço constitucional corresponder
proporcionalmente ao valor dos vencimentos percebidos em desvio de função.

Superado esse primeiro aspecto, parte-se para a questão atinente à aplicação da


Consolidação das Lei do Trabalho ao presente caso, considerando a omissão do
respectivo estatuto funcional.

Nesse contexto, é relevante destacar que os servidores públicos estatutários não se


assujeitam às normas da CLT, pois são regidos pelas disposições de natureza diversa e
submetem-se ao regime jurídico administrativo.

Todavia, haveria a possiblidade de aplicação da CLT somente se o próprio Estatuto


trouxesse comando expresso determinando a sua aplicação subsidiária.

1
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos.
São Paulo: Saraiva, 1999, p. 233-234.

Acórdãos e Decisões Imprimir

Tipo de Ato Decisório:

Acórdão

Número do Ato 254


Decisório:
Órgão Julgador: TCU - 2ª Câmara
Data do Julgamento: 06/06/2002
Relator: Ubiratan Aguiar
Recurso de Reconsideração – Desvio de recursos oriundos do recebimento de
contas de luz, por ex-empregado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos
Ementa do Ato Decisório:
– Ausência de novos documentos capazes de descaracterizar a responsabilidade
que lhe foi imputada – Conhecimento – Negativa de provimento.

TRIBUNAIS DE CONTAS - 387/16/NOV/2002

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO

Acórdão nº: 254/2002 – 2ª Câmara


Relator: Min. Ubiratan Aguiar
Data: 06.06.2002
Fonte: DOU nº 114, de 17.06.2002

Assunto:

Agentes públicos – Dever de prestar contas – Omissão – Desvio de recursos.

Ementa:

Recurso de Reconsideração – Desvio de recursos oriundos do recebimento de contas de


luz, por ex-empregado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – Ausência de
novos documentos capazes de descaracterizar a responsabilidade que lhe foi imputada
– Conhecimento – Negativa de provimento.

Relatório

Adoto como Relatório a instrução produzida no âmbito da SERUR, acolhida pelos


dirigentes da Unidade Técnica e pelo Representante do Ministério Público:

Trata-se de Recurso de Reconsideração interposto pelo Sr. Fernando Floro da Silva, ex-
empregado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT, CPF nº 511.947.834-49,
representado por advogado regularmente constituído, contra o Acórdão nº 485/2001TCU-
2ª Câmara, prolatado em processo de Tomada de Contas Especial, instaurada pela ECT
contra o Recorrente em decorrência de desfalques praticados, no período de
novembro/96 a novembro/97, ocasião em que exercia a função de Chefe na agência
Central de Novo Nilo/PI (Vol. 1, fls.1-5).

2.Por meio do referido Acórdão (Vol. Principal, fls. 319 e 320), o Tribunal decidiu, com
fundamento nos arts. 1º, inciso I, 16, inciso III, alínea d, 19 e 23, inciso III, alínea b, todos
da Lei nº 8.443/92, verbis:

“8.1 - julgar irregulares as presentes contas e em débito o Sr. Fernando Floro da Silva, fixando-lhe
o prazo de 15 (quinze) dias, a contar do recebimento da notificação, para que comprove, perante o
Tribunal (art. 165, inciso III, alínea a, do Regimento Interno/TCU), o recolhimento, aos cofres da
Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, das importâncias abaixo discriminadas, atualizadas
monetariamente e acrescidas de juros de mora, calculadas a contar das datas indicadas, até o
efetivo recolhimento, nos termos da legislação vigente, abatendo-se, na ocasião, nos termos da
Súmula 128 da Jurisprudência predominante do TCU, a quantia de R$ 290,23, (duzentos e noventa
reais e vinte três centavos), satisfeita em 12.11.97:
DATA VALOR DATA VALOR DATA VALOR DATA VALOR (R$)
(R$) (R$) (R$)
12/11/96
13,54 15/09/97 63,55 13/10/97 167,05 31/10/97 95,20
06/08/97
69,09 19/09/97 19,68 14/10/97 31,11 03/11/97 380,95
27/08/97
15,80 22/09/97 241,00 15/10/97 33,54 04/11/97 121,23
28/08/97
16,87 29/09/97 13,32 17/10/97 26,60 05/11/97 78,87
03/09/97
40,08 30/09/97 11,48 20/10/97 73,94 06/11/97 189,65
05/09/97
66,90 01/10/97 66,58 21/10/97 16,47 07/11/97 171,02
08/09/97
17,64 03/10/97 660,53 22/10/97 192,12 10/11/97 111,04
09/09/97
68,30 06/10/97 115,09 24/10/97 108,08 11/11/97 121,55
10/09/97
128,81 07/10/97 107,82 27/10/97 174,39 12/11/97 106,25
11/09/97
17,66 08/10/97 134,58 28/10/97 36,64 13/11/97 178,47
12/09/97
34,16 10/10/97 15,20 29/10/97 45,51 14/11/97 229,87

8.2 - autorizar, desde logo, nos termos do art. 28, inciso II, da Lei nº 8.443/92, a cobrança
judicial dos débitos, caso não atendida a notificação;

8.3 - remeter cópia da documentação pertinente ao Ministério Público da União para


ajuizamento das ações civis e penais cabíveis, nos termos do art. 16, § 3º, da Lei nº
8.443/92; e

8.4 - determinar à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos a inclusão do nome do


responsável no CADIN, se ainda não o fez, de acordo com a Decisão 94/2000 TCU -
Plenário”.

II - EXAME DE ADMISSIBILIDADE

3.O exame preliminar de admissibilidade, realizado por esta Unidade Técnica, evidencia
que os pressupostos de admissibilidade recursal foram observados pelo Recorrente,
podendo o Tribunal de Contas da União conhecer do presente Recurso de
Reconsideração, nos termos dos arts. 32, inciso I, e 33, da Lei nº 8.443/92 (Vol. 1, fl. 7).

III - EXAME DE MÉRITO


4. Com vistas a obter do TCU a reforma do decisum impugnado, o Recorrente apresenta
fundamentalmente três argumentos: falta de provas suficientes para condenação;
ausência de dolo na conduta praticada e aplicação para o caso vertente do princípio da
proporcionalidade.

Argumento do Recorrente

5. Alega o Recorrente que não há nos autos provas suficientes para responsabilizá-lo
pela irregularidade indicada na Tomada de Contas Especial, devendo, em razão disso,
ser aplicado o princípio in dubio pro reo, pois, segundo o Apelante, com lastro em
ensinamento do professor Julio Fabbrini Mirabete (In: Processo Penal. 8. ed., São Paulo:
Atlas. p. 42), “O réu não tem o dever de provar sua inocência; cabe ao acusador
comprovar a sua culpa’, acrescentando, ainda com fundamento em ensinamento do
aludido autor, que ‘para condenar o acusado, o juiz deve ter convicção de que é ele
responsável pelo delito, bastando, para absolvição, a dúvida a respeito da sua culpa”
(Vol. 1, fl. 3).

Análise do Analista de Controle Externo - ACE

6. Do argumento apresentado pelo Recorrente, destacam-se os seguintes pontos: a


alegação de falta de provas nos autos para responsabilizá-lo; a invocação da inversão
do ônus da prova e a aplicabilidade ao caso em discussão do princípio in dubio pro reo.

7. Diferentemente do alegado, elementos extraíveis da documentação acostada aos


autos indicam para uma direção: a responsabilidade do Recorrente pelos prejuízos
causados à ECT em razão da falta de prestação de contas da arrecadação proveniente de
pagamentos de faturas de luz realizados por usuários da Companhia Energética do Piauí
- CEPISA na agência dos Correios de Novo Nilo/PI, na qual o ex-empregado exercia a
função de Chefe.

8. Informações substanciais encontradas neste processo imprimem o acerto de


imputação de responsabilidade ao Apelante quanto à matéria tratada na TCE: declaração
firmada pelo próprio Recorrente à Comissão de Sindicância da ECT reconhecendo que
as rubricas existentes nas cópias das faturas originais das contas de luz da CEPISA,
anexadas ao Processo nº 072, são suas (Termo de Declarações - Vol. Principal, fl. 216);
cópias dessas faturas confirmam a declaração mencionada (Vol. Principal, fls. 32-213 e
245); constatação pela referida comissão de que as contas citadas não foram registradas
pelo Recorrente na contabilidade da Unidade nem os seus canhotos encontrados no
local em que deveriam estar (Relatório Final de Sindicância: Processo nº 072/98,
subitens 3.1.2 e 4.1, letra “b”, Vol. Principal, fls. 227-230).

9. No que se refere à alegação de que o ônus da prova na espécie em julgamento não é


do Recorrente, mas do “acusador”, asseveramos que esse juízo não deve prosperar,
visto a própria Lei Maior brasileira estabelecer no parágrafo único do art. 70 que o dever
de prestar contas recai sobre toda a pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que
utiliza, arrecada, guarda, gerencia ou administra dinheiros, bens e valores públicos ou
pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza
pecuniária.

10. In casu, o Recorrente deixou de prestar contas - a que estava obrigado por força da
função que exercia - da arrecadação proveniente de pagamentos de faturas de luz
realizados por usuários da CEPISA na agência dos Correios de Novo Nilo/PI, causando,
com essa atitude, prejuízo à ECT. Esse prejuízo decorreu do fato de a ETC ter sido
obrigada a ressarcir a referida concessionária pelos prejuízos causados por um de seus
agentes, no caso, o Recorrente. É de todo evidente o dever de prestar contas do
Recorrente no caso vertente, cabendo a ele, portanto, o ônus de provar que prestou
contas dos recursos arrecadados, pois deixar de prestar contas quando esteja obrigado
a fazê-lo constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da
administração pública, conforme dispõe o art. 11, inciso VI, da Lei nº 8.429, de 2 de junho
de 1992, à qual o Recorrente, como ex-empregado de entidade da administração indireta,
se sujeita (art. 2º c/c o art. 1º da cit. lei).

11. Dessa forma, restando comprovado nos autos que o Recorrente arrecadou valores
provenientes das contas de luz juntadas neste processo, referentes a pagamentos
realizados por usuários da empresa concessionária CEPISA, não há dificuldade em
afirmar que a responsabilidade pela prestação de contas desses valores recai sobre o
Apelante, ex-Chefe da agência dos Correios de Novo Nilo/PI, cabendo a ele e não à ECT
ou ao TCU provar a boa e regular aplicação dos recursos arrecadados.

12. Em relação à aplicação do princípio “in dubio pro reo”, na forma enfocada pelo
Recorrente, temos em mente que tal não se aplica visto que a alegada dúvida sustentada
pelo Apelante não está materializada no decisum recorrido, bem como no Relatório e
Voto que o acompanham.

Argumento do Recorrente

13. Alega também o Recorrente que, mesmo que houvesse provas do dano sofrido pela
ECT, não deveria ser responsabilizado em vista de não tê-lo causado com dolo, uma vez
que encontra ausente na conduta praticada a “maliciosa indução da outra parte em erro”
(Vol. 1, fl. 3).

Análise do ACE

14. Aplica-se à matéria tratada nesta TCE o disposto no § 6º do art. 37 da Constituição


Federal, que adotou, seguindo a linha traçada nas Constituições anteriores, a Teoria da
Responsabilidade Civil Objetiva da Administração, sob a modalidade do risco
administrativo, conforme escólio de Hely Lopes Meirelles (In: Direito Administrativo
Brasileiro. 22. ed., São Paulo: Malheiros Editores. 1997. p. 565).

15. Dispõe o § 6º do art. 37 da CF/88: “As pessoas jurídicas de direito público e as de


direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus
agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra
o responsável nos casos de dolo ou culpa.”

16. A ECT, em razão do prejuízo causado pelo Recorrente à empresa CEPISA, foi
obrigada, por força do dispositivo Constitucional em referência, a indenizar a citada
empresa concessionária pelo mesmo valor constante do Acórdão impugnado, nos
termos de cobrança firmada por meio dos documentos de fls. 10-17 e 243 do Vol.
Principal (Valor indenizado: R$ 4.337,00 - Vol. Principal, fl. 4).

17. Em face do disposto na parte final do transcrito § 6º do art. 37 da CF/88, tomamos


como improcedente a alegação do Recorrente - e por isso mesmo não deve ser acolhida
- de que não pode ser responsabilizado pelo dano sofrido pela ECT em relação aos fatos
narrados nesta TCE, uma vez que o dano teria sido causado sem a conduta dolosa do
agente.

18. Diversamente do que afirma o Apelante, o aludido dispositivo Constitucional


assegura à ECT o direito de regresso contra o responsável mesmo nos casos em que o
dano suportado pela Entidade tenha sido praticado por culpa do agente. Nesse sentido
também é o que dispõe o art. 5º da Lei nº 8.429/92: “Ocorrendo lesão ao patrimônio
público por ação ou omissão, dolosa ou culposa, do agente ou de terceiro, dar-se-á o
integral ressarcimento do dano”.

19. Lembramos, porém, que não nos parece ser esse o caso discutido neste processo,
vez que presentes nos autos evidências marcantes de que o ato praticado pelo
Recorrente foi intencional. Sobre essa assertiva, vejamos o que diz um dos
considerandos insertos no item 8 do decisum recorrido: “Considerando a ausência, nos
autos, de qualquer elemento que possa ser tomado como indício da existência de boa-fé,
ante a natureza dos fatos, caracterizando o desvio intencional de valores” (Vol. Principal,
fl. 319).

Argumento do Recorrente

20. O Recorrente prossegue em suas alegações afirmando que deve ser aplicado ao
caso examinado o princípio da proporcionalidade, haja vista que já teria recebido pelo
mesmo fato “a mais grave das penas que se pode aplicar a alguém numa época de crise
econômica, na qual se vive no Brasil, que foi a sua demissão”, sendo um afronta,
segundo seu entendimento, ao mencionado princípio a rejeição de suas contas neste
processo de TCE. Para sustentar essa premissa, o Recorrente apresenta ensinamentos
doutrinários sobre a aplicabilidade do aludido princípio (Vol. 1, fls. 3 e 4).

Análise do ACE

21. O princípio da proporcionalidade tem larga aceitação na doutrina e na jurisprudência


pátria, não sendo desprezado nos processos apreciados no âmbito do Tribunal de
Contas da União (v.g.: Acórdãos/TCU nºs 400/1996-1ª Câmara; 76/1999-1ª Câmara;
55/1998-Plenário; 99/2000-Plenário).

22. Ocorre que, à questão suscitada pelo Recorrente, esse princípio não se amolda, visto
que a responsabilidade do agente, in casu, pode se desdobrar nas instâncias penal, civil
e administrativa. Com isso, pelo mesmo ilícito discutido nesta TCE, o Apelante pode ser
responsabilizado penal, civil e administrativamente, sem que ocorra, em razão dessa
tríplice responsabilização, a alegada afronta ao princípio da proporcionalidade.
Destaque-se que, no caso concreto, houve a adequação entre meios e fins e a utilidade
da Tomada de Contas Especial para a proteção patrimonial da ECT, haja vista que de
outra forma o responsável não se dispôs a atender às notificações da referida empresa,
por ocasião do procedimento de sindicância, para que efetuasse o ressarcimento do
dano causado à Entidade em face do desvio da arrecadação das contas de luz da
empresa concessionária CEPISA (Vol. Principal, fls. 232 e 248).

23. Impende, de igual modo, deixar assente que não fere o princípio da
proporcionalidade - diferentemente, portanto, do que alega o Apelante - o fato de o TCU
ter julgado estas contas irregulares, com imputação de débito ao Responsável, se ele já
havia recebido a pena de demissão no âmbito da ECT pelo mesmo fato tratado nesta
TCE, visto que estamos tratando de processos administrativos distintos, cada qual com
suas peculiaridades legitimamente amparadas no ordenamento jurídico pátrio,
consoante observar-se-á a seguir.

24. HELY LOPES MEIRELLES, discorrendo sobre o processo administrativo e suas


modalidades, na obra Direito Administrativo Brasileiro (22ª ed. Atual. por AZEVEDO,
Eurico de Andrade; ALEIXO, Délcio Balestero; BURLE FILHO, José Emmanuel. São
Paulo: Malheiros Editores. 1997. p. 598-600), divide os processos administrativos em
quatro modalidades, nesta ordem: processo de expediente, processo de outorga,
processo de controle e processo punitivo. Interessa-nos, neste momento, estes dois
últimos: o processo administrativo de controle e o processo administrativo punitivo.

25. Em relação ao processo administrativo de controle, o mencionado autor assere que:

... é todo aquele em que a Administração realiza verificações e declara situação, direito
ou conduta do administrado ou de servidor, com caráter vinculante para as partes. Tais
processos, normalmente, têm rito próprio e, quando neles se deparam irregularidades
puníveis, exigem oportunidade de defesa ao interessado, antes de seu encerramento,
sob pena de invalidade do resultado da apuração. O processo de controle - também
chamado de determinação ou de declaração - não se confunde com o processo punitivo,
porque, enquanto neste se apura a falta e se aplica a penalidade cabível, naquele apenas
se verifica a situação ou a conduta do agente e se proclama o resultado para efeitos
futuros. São exemplos de processos administrativos de controle os de prestação de
contas perante órgãos públicos, os de verificação de atividades sujeitas a fiscalização, o
de lançamento tributário e o de consulta fiscal.

26. Assevera, ainda, o referido autor que:

Nesses processos a decisão final é vinculante para a Administração e para o


interessado, embora nem sempre seja auto-executável, pois dependerá da instauração
de outro processo administrativo, de caráter punitivo ou disciplinar, ou, mesmo, de ação
civil ou criminal, ou, ainda, do pronunciamento executório de outro Poder, como no caso
do julgamento de contas pelo Legislativo, após a manifestação prévia do Tribunal de
Contas competente, no respectivo processo administrativo de controle.

27. Esse processo administrativo de controle de que fala HELY LOPES MEIRELLES está
materializado nesta Tomada de Contas Especial e o Órgão competente para julgar tais
contas é o Tribunal de Contas da União, por força de disposição Constitucional (art.71, II)
e legal (art. 1º, I, da Lei nº 8.443/92). Observe-se que esse processo administrativo de
controle não se confunde com o processo administrativo punitivo, pois, não obstante
atuarem sobre um mesmo fato, os fins a que se destinam não são os mesmos, senão
vejamos.

28. Ao tratar do processo administrativo punitivo, HELY LOPES MEIRELLES assegura


que “é todo aquele promovido pela Administração para a imposição de penalidade por
infração de lei, regulamento ou contrato. Esses processos devem ser necessariamente
contraditórios, com oportunidade de defesa e estrita observância do devido processo
legal (due process of law), sob pena de nulidade da sanção imposta. A sua instauração
há que basear-se em auto de infração, representação ou peça equivalente, iniciando-se
com a exposição minuciosa dos atos ou fatos ilegais ou administrativamente ilícitos
atribuídos ao indiciado e indicação da norma ou convenção infringida.” Acrescenta o
aludido autor que “Nesta modalidade incluem-se todos os procedimentos que visem à
imposição de alguma sanção ao administrado, ao servidor ou a quem eventualmente
esteja vinculado à Administração por uma relação especial de hierarquia, como são os
militares, os estudantes e os demais freqüentadores de estabelecimentos públicos
sujeitos circunstancialmente à sua disciplina.”

29. Deixe-se evidenciado - para que não pairem dúvidas - que, em relação ao aludido
processo administrativo punitivo, pouca ou nenhuma liberdade possuía o dirigente da
ECT para deixar de apurar a responsabilidade do ex-empregado e, via de conseqüência,
aplicar-lhe a penalidade disciplinar prevista nas normas regulamentares da Entidade,
uma vez que a irregularidade praticada foi de tal gravidade que não é dada ao
administrador a autonomia de escolha: a apuração da responsabilidade e a imputação da
penalidade disciplinar se mostraram cogentes no caso em tela. Em caso de omissão, o
administrador da ECT estaria sujeito à pena prevista no art. 319 do Código Penal
brasileiro, visto que tal atitude caracterizaria crime de prevaricação, que consiste,
segundo dispõe o referido dispositivo legal, em “Retardar ou deixar de praticar,
indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para
satisfazer interesse ou sentimento pessoal”. Retardar ou deixar de praticar,
indevidamente, ato de ofício constitui também, nos termos do art. 11, inciso II, da Lei nº
8.429/92, ato de improbidade administrativa, sujeitando o infrator às penas previstas na
referida lei.

30. Assim, como se observa das considerações realizadas, a decisão proferida pelo
Tribunal no Acórdão recorrido não afronta o princípio da proporcionalidade, sendo de
todo correta a cumulação da pena aplicada no processo punitivo instaurado no âmbito
da ECT com o julgamento realizado pelo TCU neste processo de TCE, não prevalecendo,
dessa forma, o argumento do Apelante.

Pedido do Recorrente

31. Por fim, o Recorrente requer o arquivamento deste processo sob a alegação de
insuficiência de provas para sua responsabilização em relação à irregularidade discutida
nos autos (Vol. 1, fl. 4).

Análise do ACE

32. Restando comprovado nos autos que o Recorrente tinha sob sua responsabilidade
valores provenientes de pagamentos de faturas de luz realizados por usuários de
serviços da Companhia Energética do Piauí - CEPISA, no período de novembro/96 a
novembro/97, e que esses valores não foram repassados à aludida concessionária,
conforme apuração realizada no âmbito da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos -
ECT, ratificada neste processo, causando prejuízo à ECT, vez que obrigada a ressarcir à
CEPISA o prejuízo causado por um de seus agentes, no caso, o Recorrente, entendemos
que o pedido formulado no item anterior não deve ser atendido.

33. Ademais, ressalte-se, ainda, que o Recorrente - não obstante as diversas


oportunidades que teve no âmbito da ECT e do TCU - deixou de juntar aos autos prova
conclusiva da exclusão de sua responsabilidade quanto aos fatos narrados nesta TCE,
atendo-se tão-só a proferir alegações genéricas que, por si sós, não têm o condão de
infirmar as apurações realizadas pela ECT e o decisum ora impugnado. Não se pode
olvidar, de igual modo, que o ônus da prova, no presente caso, recai sobre o Recorrente,
consoante amplamente dissecado nos itens 9, 10 e 11 retro.

IV - CONCLUSÃO

34. Do exame realizado, verificamos que os argumentos apresentados pelo Recorrente


em seu recurso não conseguiram elidir as irregularidades que motivaram o Tribunal de
Contas da União à prolação do decisum recorrido, motivo por que sugerimos seja
conhecido o Recurso de Reconsideração, ante o preenchimento dos requisitos de
admissibilidade, para, no mérito, negar-lhe provimento, nos termos da proposta de
encaminhamento adiante.

V - PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO

35. Ante o exposto, propomos:


35.1. conhecer, com base nos arts. 32, inciso I, e 33 da Lei nº 8.443/92, do Recurso de
Reconsideração interposto pelo Sr. Fernando Floro da Silva, ex-empregado da Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT, CPF nº 511.947.834-49, para, no mérito, negar-
lhe provimento, mantendo-se, em seus exatos termos, o Acórdão n° 485/2001TCU-2ª
Câmara 35.2. dar conhecimento ao Recorrente do inteiro teor da deliberação que vier a
ser adotada pelo Tribunal.

É o Relatório.

Voto

Os documentos constantes dos autos depõem contra o recorrente, uma vez que existem
provas de que mais de 220 contas de luz foram recebidas pelo responsável, conforme se
verifica pela aposição de sua assinatura nos referidos documentos, sem que tenham
sido contabilizadas na Agência de Correios de Novo Nilo - PI, onde exercia o cargo de
Atendente Comercial e se encontrava no desempenho da função de chefia. Além da falta
de contabilização, os arquivos da Unidade não apresentaram um único documento
relativo aos pagamentos reclamados. Em conseqüência, os valores relativos às contas
em questão não foram lançados no Documento de Arrecadação de Terceiros. Em outras
palavras, os valores relativos aos recebimentos não foram localizados, sendo
posteriormente reclamados pela CEPISA.

2. A questão foi tratada de forma adequada pela Unidade Técnica, que analisou cada uma
das alegações recursais apresentadas.

3. Contrariamente ao que alega o recorrente, não resta qualquer dúvida quanto à


definição de responsabilidade pelas irregularidades. Ao contrário, é notório que ele, na
qualidade de agente recebedor, deveria adotar as cautelas necessárias e prestar contas
da totalidade dos recursos recebidos. É ele, portanto, o responsável natural pelo
prejuízo causado à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos.

4. Também de forma diversa do que afirma o Sr. Fernando Floro da Silva, não vislumbro
simples culpa em sua conduta, mas sim a existência de má-fé. Veja-se que não se trata
do desaparecimento de uma ou de uma dúzia de contas - e dos respectivos valores -,
mas de mais de duzentas e vinte contas, pagas pelos clientes em diferentes datas. Não
há como se conceber da inexistência de qualquer registro dos pagamentos recebidos
por aquele responsável senão pela intenção, pelo deliberado propósito de fazer com que
tais registros não existissem. É de se ver, mesmo, que em tais circunstâncias poderia o
responsável ter sido condenado por este Tribunal, também, ao pagamento de multa, que
poderia equivaler a 100% do valor do débito que lhe foi imputado, providência que não
adoto nesta oportunidade exclusivamente porque configuraria o reformatio in pejus.

Ante o exposto, manifesto-me de acordo com os pareceres e VOTO no sentido de que o


Tribunal adote a deliberação que ora submeto ao Colegiado.

Sala das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, em 06 de junho de 2002.

UBIRATAN AGUIAR
Ministro-Relator
Acórdão

1. Processo nº: TC-011.935/1999-5, c/1 volume.

2. Classe de Assunto: Recurso de Reconsideração.

3. Responsável: Fernando Floro da Silva (ex-empregado).

4. Entidade: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT.

5. Relator: Ministro Ubiratan Aguiar.

6. Representante do Ministério Público: Dr. Jatir Batista da Cunha.

7. Unidade Técnica: SECEX-PI e SERUR - Secretaria de Recursos.

8. Acórdão:

VISTOS, relatados e discutidos estes autos que tratam de recurso de reconsideração


interposto pelo Sr. Fernando Floro da Silva contra o Acórdão nº 485/2001 - 2ª Câmara,
que julgou irregulares suas contas e o condenou ao pagamento dos débitos nele
especificados.

Considerando que os argumentos apresentados pelo recorrente não lograram êxito em


descaracterizar as irregularidades que lhe foram imputadas;

Considerando que os documentos constantes dos autos demonstram, ao contrário, a


existência de contas de luz recebidas pelo responsável e não contabilizadas;

Considerando que não existem dúvidas quanto à responsabilidade do recorrente no que


tange ao prejuízo causado à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, uma vez que
na condição de agente recebedor tinha ele a obrigação de adotar as cautelas
necessárias à preservação dos recursos e deles prestar contas à administração,

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão da 2ª


Câmara, com fulcro no art. 33 da Lei nº 8.443/92, em:

a) conhecer do recurso de reconsideração interposto pelo Sr. Fernando Floro da Silva


para, no mérito, negar-lhe provimento, mantendo os exatos termos do Acórdão nº
485/2001 - 2ª Câmara;

b) dar conhecimento, ao recorrente, do teor da presente deliberação.

9. Ata nº 20/2002 - Segunda Câmara.

10. Data da Sessão: 06/06/2002 – Ordinária.

11. Especificação do quorum:

1. Ministros presentes: Adylson Motta (Na Presidência), Ubiratan Aguiar (Relator),


Benjamin Zymler e o Ministro-Substituto Marcos Bemquerer Costa.
11.2. Auditor presente: Lincoln Magalhães da Rocha.

ADYLSON MOTTA
Na Presidência

UBIRATAN AGUIAR
Relator

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Título:

Servidor -
Dever
funcional
do
agente -
Conceito
de
“conduta
escandal
osa” -
Considera
ções

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 84/25/AGO/2003

PERGUNTA 4

Qual o conceito de “conduta escandalosa” previsto no art. 132, inc. V, da Lei nº 8.112/90?

RESPOSTA

No caso em tela, cumpre observar o conteúdo do art. 132, inc. V, da Lei nº 8.112/90, in
verbis:

"Art. 132 A demissão será aplicada nos seguintes casos:

(...)

V - incontinência pública e conduta escandalosa dentro da repartição". (Grifamos.)

Nesse contexto, traz-se o conceito dos termos “conduta” e “escândalo” contidos no


Dicionário Aurélio:1

Conduta - Procedimento moral (bom ou mau); comportamento.


Escândalo - 1 . Aquilo que é causa, ou resulta de erro ou pecado.

2. Aquilo que perturba a sensibilidade pelo desprezo às convenções ou a moral vigente.

3. Indignação provocada por um mau exemplo, ou ação vergonhosa, leviana, indecente.

4 .Desordem, tumulto, cena, alvoroço, escarcéu.

5. Grave acontecimento que abala a opinião pública.

6. Fato imoral, revoltante. (Grifamos.)

Surge da conceituação vernacular acima citada que “conduta escandalosa” é toda


aquela considerada reprovável pelo homem médio, ou seja, praticada em desacordo com
o comportamento geral da sociedade, em dado tempo e espaço.

De acordo com Paulo de Matos Ferreira Diniz2 são elementos caracterizadores desta
conduta:

a) o servidor não se contém nos seus ímpetos de índole antes instintiva do que racional;

b) a ocorrência há que se dar em público, daí assumir o aspecto escandaloso e


ameaçador que constitui perigo a todos os presentes;

c) o episódio há de correr na repartição pública. Não necessariamente relacionada ao


cargo ou função, porque é a qualidade de servidor público que não se coaduna com a
conduta incontinente nem publicamente escandalosa.

Nota-se, então, que a “conduta escandalosa” está relacionada com a natureza do ato 3
(sexual, físico ou verbal) praticado pelo agente administrativo, desde que sua ocorrência
seja em local público, em especial, na repartição pública, pois desse modo as demais
pessoas presentes no recinto se sentiriam constrangidas ou até mesmo ameaçadas.

Percebe-se que a literatura jurídica não conseguiu adotar uma conceituação precisa para
a expressão em análise, ou seja, seu conceito – ou esta expressão – contém
indeterminação e há forte cunho subjetivo. Sem embargo, há uma certa objetividade que
pode ser vislumbrada quando o ato praticado extrapola a normalidade e a descrição.
Exemplo como gritos ou pronúncia de palavras de baixo calão em uma passeata é
considerada uma conduta normal para a sociedade, todavia, as mesmas condutas em
uma igreja seriam tomadas como “condutas escandalosas”.

Portanto, convém salientar, neste passo, que é preciso verificar as circunstâncias do


caso concreto para se aquilatar se determinado agir pode ser tomado por “escandaloso”
ou não.

Por fim, chama-se atenção do conceito de “conduta escandalosa” apresentado por Ivan
Barbosa Rigolin, extraída da Apelação Cível nº 96.04.29699-0 do Tribunal Regional
Federal 4ª Região:

"O tipo infracional seguinte no art. 132 é a incontinência pública e a conduta


escandalosa dentro da repartição. É fácil compreender o que tal significa: o servidor que
habitualmente provoca escândalos, graves perturbações a ordem no serviço, tumultos
injustificados, bem como aquele que se porta de modo imoral, atentatório ao senso
médio de pudor, desmedido, desbragado, caso o faça dentro da repartição onde esteja
lotado, incide infração, de grave natureza, prevista no inc. V deste artigo". (Grifamos.)

Guardando coerência com os aspectos expostos e para fins de aplicação na


Administração Pública, o conceito de “conduta escandalosa” dependerá, ab inito, do
caso concreto. Contudo, pode-se afirmar de plano que todo ato que gere indignação,
vergonha, desordem, tumulto, alvoroço, escarcéu, revolta à moral pública poderá ser
considerado como “conduta escandalosa”, desde que praticada e presenciada no
interior de dada repartição pública.

1
Edição eletrônica. Editora Nova Fronteira. Versão 3.0.
2
Lei nº 8.112/90 – Regime Jurídico. 5. ed. atual. com. manual. rev. Brasília: Brasília
Jurídica, 2000. p. 356.
3
Oportuno comentar que o direito do trabalho prevê a incontinência de conduta, como
fator de extinção da relação contratual, por se configurar uma falta grave. Sem embargo,
nessa área do direito, a maioria da doutrina entende que a incontinência estaria restrita
ao campo da sexualidade. Acolhendo esse entendimento Valentin Carrion explana: “A
incontinência estaria restrita ao campo do abuso ou desvio da sexualidade, quando
afetar o nível de moralidade média da sociedade, revestindo ofensa ao pudor, violência à
liberdade sexual, pornografia ou obscenidade, impostanto em desrespeito e
desconsideração à sociedade, à empresa e aos companheiros de trabalho.” In:
Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p.
360. No mesmo sentido: MARTINS, Sergio Pinto. Comentários à CLT. 5 ed. São Paulo:
Atlas, 2002. p. 485.

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Título:

Agentes
Públicos -
Confrater
nizações
- Venda e
consumo
de
bebidas
alcoólicas
-
Vedação
legal
quanto à
venda
nas
dependê
ncias da
Administr
ação
Pública -
Dever
funcional
de
conduta
adequada
-
Considera
ções

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 324/27/OUT/2003

PERGUNTA 4

Como deve a Administração Pública proceder quando há realização de


eventos (churrascos, festas e confraternizações) em que há possibilidade
de consumo de bebida alcoólica? E nos casos em que tais atividades de
lazer se desenrolem em prédio público ou fora dele, mas sempre em
horário no qual os servidores não estão no desempenho de suas funções
administrativas?

RESPOSTA

Os arts. 116 e 117 da Lei nº 8.112/90 enunciam vários dispositivos que estabelecem os deveres
e as proibições que incidem na relação estatutária dos servidores públicos da União. No
entanto, nenhum deles contempla a hipótese de consumo de bebidas alcoólicas pelos
servidores durante o horário de trabalho. Porém, destaca-se entre os deveres dos servidores
públicos a manutenção de “conduta compatível com a moralidade administrativa”.

Restaria analisar a possibilidade de ingestão de bebidas alcoólicas dentro ou fora da repartição


pública, mas não em horário no qual os servidores estariam no exercício de suas atividades
administrativas.

Num primeiro passo, cabe menção à Lei nº 9.294/96, que dispõe sobre as restrições ao uso e à
propaganda de produtos fumígeros, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos
agrícolas e determina que:

Art. 1º O uso e a propaganda de produtos fumígeros, derivados ou não do tabaco, de bebidas


alcoólicas, de medicamentos e terapias e de defensivos agrícolas estão sujeitos às restrições e
condições estabelecidas por esta Lei, nos termos do § 4º do art. 220 da Constituição Federal.

Parágrafo único. Consideram-se bebidas alcoólicas, para efeitos desta Lei, as bebidas potáveis
com teor alcoólico superior a treze graus Gay Lussac.

Art. 2º É proibido o uso de cigarros, cigarrilhas, charutos, cachimbos ou de qualquer outro


produto fumígero, derivado ou não do tabaco, em recinto coletivo, privado ou público, salvo em
área destinada exclusivamente a esse fim, devidamente isolada e com arejamento
conveniente.

§ 1º Incluem-se nas disposições deste artigo as repartições públicas, os hospitais e postos de


saúde, as salas de aula, as bibliotecas, os recintos de trabalho coletivo e as salas de teatro e
cinema.

(...)

Art. 3º-A Quanto aos produtos referidos no art. 2º desta Lei, são proibidos: (Artigo incluído pela
Lei nº 10.167, de 27.12.2000.)

(...)

VIII - a comercialização em estabelecimento de ensino, em estabelecimento de saúde e em


órgãos ou entidades da Administração Pública; (Redação dada pela Lei nº 10.702, de
14.07.2003.)

Percebe-se, então, que o legislador infraconstitucional, com base em dados técnicos,


estabeleceu restrições ao uso, comercialização e divulgação de produtos fumígeros, bebidas
alcoólicas e outros que causem males à saúde, dentre os quais vedação expressa de
comercialização de tais produtos em órgãos ou entidades da Administração Pública (art.
3º-A, inc. VIII).

Embora não haja previsão específica quanto ao consumo de bebidas alcoólicas, é plausível
recomendar a sua não ingestão (mesmo fora do horário de trabalho) no âmbito das instalações
da Administração, à medida que a comercialização é categoricamente proibida.

Portanto, apesar de não inexistir proibição legal expressa, é de todo desaconselhável o


consumo de bebidas de teor alcoólico nas dependências da Administração Pública por motivos
de bom senso e conduta. No plano sistemático legislativo, é evidente que, se inequívoca a
impossibilidade de venda – cenário mais amplo –, o consumo – ação concreta e particularizada
– encontra-se abrangido.

Por outro lado, fora dos limites físicos dos órgãos e unidades da Administração não parece
haver qualquer empecilho objetivo, não se cogitando da realização, pelo erário, de quaisquer
despesas nesse sentido, pois tais gastos são estranhos à função administrativa e se ocorrerem
devem ser suportados pelos próprios agentes públicos ou associação de servidores.

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Tipo Recurso:

Recurso Ordinário
em Mandado de
Segurança
Número do
12.288
Recurso:
Tribunal: Superior Tribunal de Justiça
Data do
13/MAR/2002
Julgamento:
Relator: Gilson Dipp
Ementa do Constitucional – Servidor público – Direito de greve – Ausência de legislação
infraconstitucional regulamentadora – Eficácia limitada – Poder-dever da Administração
em instaurar procedimento ou processo administrativo para averiguação de atos lesivos
ao interesse público – Processo administra-tivo – Desrespeito aos princípios do devido
Recurso:
processo legal, contraditório e ampla defesa – Impossibilidade da antecipação da
reprimenda, sem o respectivo desfecho do compêndio administrativo – Suspensão
preventiva e relotação – Falta de motivação específica.

JURISPRUDÊNCIA - 1114/12/JUL/2002

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RECURSO ORDINÁRIO EM MS Nº: 12.288 UF: RJ


RELATOR: Ministro Gilson Dipp
DATA: 13.03.2002
FONTE: DJ, de 08.04.2002

ASSUNTO:

Agentes públicos – Direito de greve – Considerações.

EMENTA:

Constitucional – Servidor público – Direito de greve – Ausência de legislação


infraconstitucional regulamentadora – Eficácia limitada – Poder-dever da Administração
em instaurar procedimento ou processo administrativo para averiguação de atos lesivos
ao interesse público – Processo administra-tivo – Desrespeito aos princípios do devido
processo legal, contraditório e ampla defesa – Impossibilidade da antecipação da
reprimenda, sem o respectivo desfecho do compêndio administrativo – Suspensão
preventiva e relotação – Falta de motivação específica.

I - O direito de greve, nos termos do art. 37, inc. VII da Constituição Federal, é
assegurado aos servidores públicos. Todavia, o seu pleno exercício necessita da edição
de lei regulamentadora. Com isso, “O preceito constitucional que reconheceu o direito
de greve ao servidor público civil constitui norma de eficácia meramente limitada,
desprovida, em conseqüência, de auto-aplicabilidade, razão pela qual, para atuar
plenamente, depende da edição da lei complementar exigida pelo próprio texto da
Constituição. A mera outorga constitucional do direito de greve ao servidor público civil
não basta – ante a ausência de auto-aplicabilidade da norma constante do art. 37, inc.
Vll, da Constituição – para justificar o seu imediato exercício. (Mandado de Injunção 20-
DF, Relator Min. Celso de Mello, DJ de 22.11.96).

II - Nos termos do art. 306 do Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado do Rio
de Janeiro, “A autoridade que tiver ciência de qualquer irregularidade no serviço público
é obrigada a promover-lhe a apuração imediata, por meios sumários ou mediante
processo administrativo disciplinar”. Neste contexto, escorreito o ato do Exm°. Des.
Corregedor do Tribunal de Justiça Estadual, ao instaurar processo administrativo para
apurar incidentes lesivos ao normal funcionamento do fórum. A edição da Portaria nº
17/98 inspirou-se no princípio da legalidade, sendo defeso ao Administrador furtar-se
deste poder-dever.

III - O mandado de segurança é ação constitucionalizada instituída para proteger direito


líquido e certo, sempre que alguém sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la,
por ilegalidade ou abuso de poder. No caso em espeque, não há direito líquido a ser
defendido, já que a pretensão do livre e pleno exercício de greve é certo, mas de eficácia
limitada, pois carece de regulamentação infraconstitucional.

IV - Quanto às sanções “preventivas” aplicadas aos grevistas, suspensão e relotação, da


leitura da motivação tecida na Portaria nº 17/98, não se verificam as circunstâncias
especiais que levaram a Administração a mitigar os princípios basilares do processo
(devido processo legal, contraditório e ampla defesa). Ao contrário, a fundamentação é
clara ao traduzir mera antecipação dos resultados do compêndio administrativo. Desta
forma, despicienda a imposição de qualquer pena intitulada “preventiva”, quando, em
verdade, o que se pretende é a produção antecipada das reprimendas, sem o desfecho
do respectivo processo. Aliás, quanto a este pormenor, tanto a suspensão quanto a
relotação, só fariam sentido caso a permanência dos servidores inviabilizasse a
consecução do processo, mais precisamente, na fase instrutória, momento especial
onde o escopo maior é a minuciosa apuração dos fatos ensejadores da instauração do
PAD.

V - Recurso conhecido e parcialmente provido, tão-somente, para afastar a suspensão


preventiva e relotação dos servidores sindicalizados, já que as mesmas não foram
motivadas de maneira pormenorizada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam
os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça A Turma, por
unanimidade, deu parcial provimento ao recurso, tão somente, para afastar a suspensão
preventiva e relotação dos servidores sindicalizados, já que as mesmas não foram
motivadas de maneira pormenorizada. Os Srs. Ministros Jorge Scartezzini, Edson
Vidigal, José Arnaldo da Fonseca e Felix Fischer votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 13 de março de 2002. (Data Julgamento)

FELIX FISCHER
Presidente

GILSON DIPP
Relator

RELATÓRIO

EXMO. SR. MINISTRO GILSON DIPP (Relator):

Trata-se de recurso ordinário interposto pelo Sindicato dos Servidores do Poder


Judiciário do Estado do Rio de Janeiro – SIND-JUSTIÇA, com base na alínea “b”, inc. II,
do art. 105 da Constituição Federal, contra v. acórdão do Tribunal de Justiça daquele
Estado, denegatório de mandado de segurança.

Na inicial do writ, o impetrante pleiteia a anulação da Portaria nº 17/98, da Corregedoria


Geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que instaurou Processo Administrativo
Disciplinar e determinou a suspensão preventiva, com redução de vencimentos na
proporção de 1/3 (um terço) durante o afastamento, bem como o cancelamento das
lotações originárias e conseqüente disponibilidade ao Núcleo Especial da Corregedoria,
de todos os servidores públicos que aderiram ao movimento grevista deflagrado no dia
31 de julho de 1998.

Todavia, antes do julgamento do mandamus, a autoridade coatora noticiou a revogação


da suspensão preventiva e cancelamento da lotação com relação a trinta e dois
servidores (fls. 36/37).

Conclusos os autos para julgamento, o Colegiado decidiu a lide, oportunidade em que a


ementa restou assim vazada:

Mandado de segurança coletivo. Servidores punidos pela Portaria nº 17/98 da Egrégia


Corregedoria-Geral da Justiça. Inexistência de ilegalidade do ato impugnado, fruto que
foi do legítimo exercício do poder-dever disciplinar inerente ao Órgão Administrador,
para enfrentar greve abusiva. Denegação. (fl. 163).

Incontinenti, foram opostos embargos de declaração apontando omissão no v. acórdão


embargado, restando o mesmo rejeitado pelo Tribunal local, às fls. 177/178.

Daí, a interposição do presente recurso ordinário onde o Sindicato repisa toda a tese
lançada na exordial, qual seja, o direito líquido e certo à anulação da Portaria nº 17/98,
haja vista que as sanções aplicadas não foram precedidas do respectivo processo legal,
contraditório e ampla defesa, sem falar no descumprimento constitucional quanto ao
direito de greve.

Ao final, o Sindicato aduz que o ato atacado constitui represália de caráter pessoal a
subjetivo, mesmo porque o movimento paredista somente foi deflagrado a partir das
15:00 horas do dia 31 de julho, em um único dia de paralisação, em respeito à
continuidade do serviço público, deliberando-se, inclusive, pela paralisação parcial de
alguns setores.

Contra-razões, às fls. 195/199, propugnando pela manutenção do v. acórdão recorrido.

Parecer do Ministério Público Federal, às fls. 210/212, opinando pelo provimento parcial
do recurso.

É o relatório.

VOTO

EXMO. SR. MINISTRO GILSON DIPP (Relator):

Primeiramente, registre-se que o presente recurso foi interposto em tempo hábil e


precedido do respectivo preparo, cuja guias encontram-se acostadas às fls. 192/193.
Ultrapassado o conhecimento, passo ao exame do mérito propriamente dito.

Consoante acima relatado, o presente recurso ordinário cinge-se à aferição do direito


líquido e certo do recorrente à anulação da Portaria nº 17/98, da Corregedoria-Geral de
Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que instaurou processo administrativo disciplinar,
contra alguns servidores sindicalizados, ocasião em que os mesmos foram suspensos,
preventivamente, bem como relatados na Corregedoria.

O ato hostilizado estampou a seguinte fundamentação:

A decisão de adesão ao movimento paredista por reduzido número de servidores,


inquestionavelmente, caracteriza infração disciplinar de natureza grave, a indicar o
enquadramento das sanções legais segundo dimensão dos danos causados a Pública
Administração comprometendo a regularidade da sua missão na prestação jurisdicional,
a par da ostensiva rebeldia aos princípios basilares da legalidade jurídico-constitucional.

Neste roteiro, em linguagem de meridiana compreensão, alçam-se as normas


consubstanciadas nos artigos 38 do Decreto-Lei nº 220 de 18.07.75 e art. 305 do Decreto
nº 2.479 de 08.03.79, cuja a transcrição se impõe por oportuno aviso:

Constitui infração disciplinar toda a ação ou omissão do funcionário capaz de


comprometer a dignidade e o decoro da função pública, ferir a disciplina e a hierarquia,
prejudicar a eficiência do serviço ou causar dano a Administração Pública.

Destaque-se, no elenco dos deveres do funcionário a lealdade e respeito às instituições


constitucionais a administrativas a que servir. (art. 39, inc. VI do Decreto-Lei nº 220/75).

Neste contexto, o ato de manifesta insubordinação perpetrado pelo servidor,


ausentando-se do local de trabalho durante a jornada normal de expediente,
particularmente agravado pela expressa e ostensiva desobediência e confronto à
orientação previamente traçada pela Administração, impõe a imediata INSTAURAÇÃO DE
PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR, para apuração e definição quanto a
extensão do ilícito administrativo praticado e suas óbvias conseqüências, posto que, em
princípio altéia como infração, em tese, do disposto nos arts. 38, 39 e 40 incs. XI e XII do
Decreto-Lei n° 220 de 18.07.75, bem como arts. 285, 286 incs. XI e Xll e 305 do Decreto nº
2.479 de 08.03.79, imputáveis a todos os funcionários que se ausentaram das
respectivas serventias antecipadamente do horário de expediente do dia 31 de julho do
corrente, cuja relação, a seguir explicitada, restou transmitida à Corregedoria-Geral da
Justiça pelos Exmos. Senhores Juízes de Direito ou por Servidores Encarregados da
respectiva fiscalização assim cumprido estes expressa determinação do Corregedor-
Geral.

A gravidade da infração, por outra vertente está a recomendar a imperativa adoção da


cautela ditada pelo art. 308 do Decreto nº 2.479 de 08.03.79, o que então se adota,
decretando A SUSPENSÃO PREVENTIVA de quantos servidores grevistas, tanto mais
porque a permanência dos mesmos, ante a manifesta rebeldia de suas condutas,
contrasta com o princípio de obediência à ordem jurídica e compromete a normalidade
das atividades judiciais além de arranhar os princípios da autoridade e hierarquia,
predicados inabdicáveis à disciplina do Serviço Público.

Por óbvia conseqüência da medida preventiva, os servidores relacionados suportarão a


inafastável incidência da regra restritiva remuneratória prevista no art. 145, inc. I do
referido Decreto, in verbis:
Art. 145 O funcionário deixará de receber:

I - 1/3 (um terço) do vencimento e vantagens, durante o afastamento por motivo de


suspensão preventiva ou recolhimento à prisão por ordem judicial não decorrente de
condenação definitiva, ressalvado o direito à diferença se absolvido afinal, ou se o
afastamento excede o prazo de condenação definitiva.

Encaminhe-se a relação dos servidores indiciados ao SETOR DE PAGAMENTO para as


providências correlatadas, assim como, concomitantemente, ao SETOR DE LOTAÇÃO E
MOVIMENTAÇÃO, a fim que se proceda ao cancelamento das suas lotações atuais a
correspectivas disponibilidades ao NÚCLEO ESPECIAL.

Outrossim, ao presente ATO será adicionado outros servidores que, igualmente, tenham
incidido em idêntica falta funcional, em listagem que venha a ser recepcionada
supervenientemente. (fl. 33).

Ao atacar a Portaria, o Sindicato Impetrante esclarece, na exordial do writ, algumas


impropriedades ocorridas. Da peça, colhe-se o seguinte excerto:

Fundamenta a base legal do ato coator nos Decretos-Lei n° 220, de 18 de julho de 1975,
Estatuto dos Servidores Públicos Estaduais e Decreto nº 2.479, de 08 de março de 1979,
Regulamento do Estatuto.

Esses Decretos, apesar de terem força de lei, são fruto de um Poder ditatorial, que não
passaram pelo crivo democrático do Poder Legislativo Estadual, como também, a
maioria de seus dispositivos encontram-se revogados ou derrogados por não terem sido
recepcionados pela Constituição da República de 1988 e Carta Estadual de 1989.

O Governo Federal, entendo sabiamente que após a promulgação da nova ordem


constitucional não poderia mais continuar aplicando aos seus servidores o velho
estatuto, com muitos artigos revogados ou derrogados por essa nova Constituição,
tratou logo de mandar Projeto ao Congresso que se transformou na Lei Federal nº 8.112,
de 11 de dezembro de 1990, inteiramente adaptada ao comando constitucional, mas o
Estado do Rio de Janeiro não tomou esse cuidado e continua aplicando o velho e
arcaico Decreto-Lei nº 220, de 1975, aos seus servidores até hoje.

Dentre outros princípios fundamentais, a garantia Constitucional do devido processo


legal, insculpida no art. 5º, inc. LV, da Carta Magna, sequer, faz parte do contexto desses
Decretos utilizados como escopo legal para punir sumária e violentamente os servidores
públicos.

O ato coator que ora se ataca é tão violento, que em um dos seus parágrafos,
mencionando o artigo 145 do Decreto, ameaçando de 'prisão administrativa os
servidores por ordem judicial não decorrente de decisão definitiva' quando esse
dispositivo encontra-se revogado pela nova ordem constitucional.

A redução de 1/3 dos vencimentos dos servidores durante o período da suspensão


preventiva, também é outra aberração de não deixar inveja aos áureos tempos da
ditadura, já que o art. 37, da CRFB, em seu inciso XV, veda expressamente a redução de
vencimentos de servidores públicos, mas a autoridade coatora a aplicou com base no
Decreto estadual dos anos ditatoriais de 1975. Ainda, se descontasse o período não
trabalhado que foi de horas, até poder-se-ia, num esforço sobremaneira aceitar, mas
descontar 1/3 dos vencimentos por prazo indeterminado da suspensão, e realmente
inaceitável, inacreditável e intolerável.

O Decreto-Lei em seu art. 38 mencionado pela autoridade coatora, institui pena


disciplinar ao servidor infrator, mas não individualiza a pena, ferindo novamente o texto
constitucional, mas a autoridade coatora faz sua valoração pessoal de infração grave a
merecer a reprimenda incontinenti e preventiva com redução de vencimentos, em total
afronta ainda ao consagrado princípio constitucional da ampla defesa.

A remoção ex-offício, para localidade bem distante das atuais lotações, quase sempre
para o interior do Estado, a título de punição sumária é outra violência causada ao
servidor, sem precedentes, já que além de descontrolar toda a vida do servidor que
normalmente reside próximo ao órgão de trabalho, acarreta-lhe gastos inesperados, que
também de uma forma indireta acarretam redução de vencimentos, além de não estar
disciplinada nem neste Decreto que ora se comenta. (fls. 05/07).

Ao opor-se à pretensão formulada em juízo, a autoridade coatora prestou informações


salientando o seguinte:

Verbera o impetrante o que chama de ‘ato coator’ (cf. fls. 09), praticado como represália
de caráter pessoal e subjetivo, totalmente incompatível com as funções de
Administrador inerente (sic) a (sic) Autoridade Coatora (loc. cit.)

E ISSO PORQUE OS SUBSTITUÍDOS, que frise-se, sequer se sabe quais são, nada teriam
feito, além de fomentar e participar de greve em serviço público, manipulados por
interesses políticos que bradavam, pelas ruas, a plenos pulmões (e aparelhos de som,
adite-se...), prometendo-lhes ilegal incorporação estipendial da ordem de 70,5% (setenta
inteiros e cinco décimos percentuais), sob ‘pena’ de deflagrarem greve.

NÃO SATISFEITOS, PORÉM, QUER PORQUE QUER que os breves períodos de ilegal
paralisação, com públicos e notórios arrastões (procedimento de vândalos) nos
corredores do Foro, sejam considerados justificados, a teor do art. 156 do Código de
Normas....

(...)

INSISTE, TODAVIA, O AUTOR NA TESE da legalidade da greve, transcrevendo, em seu


favor, aresto do C. Superior Tribunal de Justiça (fls. 12).

ORA... É NOTÓRIO QUE, EM MATÉRIA CONSTITUCIONAL é o Supremo Tribunal Federal,


e não o Superior Tribunal de Justiça o órgão investido de competência, ex vi do
preceituado no art. 102 da Constituição da República.

E A MAIS ALTA CORTE DE JUSTIÇA DO PAÍS NÃO pensa como gostaria o autor, o que
consta, com todas as letras, do julgamento do Mandado de Injunção n° 20/94, no qual foi
relator o eminente Ministro Celso de Mello, e cuja ementa é a seguir transcrita, para que
dúvidas não pairem:

MANDADO DE INJUNÇÃO COLETIVO – DIREITO DE GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO


CIVIL – EVOLUÇÃO DESSE DIREITO NO CONSTITUCIONALISMO BRASILEIRO –
MODELOS NORMATIVOS NO DIREITO COMPARADO – PRERROGATIVA JURÍDICA
ASSEGURADA PELA CONSTITUIÇÃO (ART. 37, INC. VII) – IMPOSSIBILIDADE DE SEU
EXERCÍCIO ANTES DA EDIÇÃO DE LEI COMPLEMENTAR – OMISSÃO LEGISLATIVA –
HIPÓTESE DE SUA CONFIGURAÇÃO – RECONHECIMENTO DO ESTADO DE MORA DO
CONGRESSO NACIONAL – IMPETRAÇÃO POR ENTIDADE DE CLASSE –
ADMISSIBILIDADE – WRIT CONCEDIDO.

DIREITO DE GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO: O preceito constitucional que reconheceu o


direito de greve ao servidor público civil constitui norma de eficácia meramente limitada,
desprovida, em conseqüência, de auto-aplicabilidade, razão pela qual, para atuar
plenamente, depende da edição da lei complementar exigida pelo próprio texto da
Constituição.

A mera outorga constitucional do direito de greve ao servidor público civil não basta –
ante a ausência de auto-aplicabilidade da norma constante do art. 37, inc. VII, da
Constituição – para justificar o seu imediato exercício.

O exercício do direito público subjetivo de greve outorgado aos servidores civis só se


revelará possível depois da edição da lei complementar reclamada pela Carta Política. A
lei complementar referida – que vai definir os termos e os limites do exercício do direito
de greve no serviço público – constitui requisito de aplicabilidade e de operatividade da
norma inscrita no art. 37, VII, do texto constitucional. Essa situação de lacuna técnica,
precisamente por inviabilizar o exercício do direito de greve, justifica a utilização e o
deferimento do mandado de injunção.

A inércia estatal configura-se, objetivamente, quando o excessivo e irrazoável


retardamento na efetivação da prestação legislativa – não obstante a ausência, na
Constituição, de prazo pré-fixado para a edição da necessária norma regulamentadora –
vem a comprometer e a nulificar a situação subjetiva de vantagem criada pelo texto
constitucional em favor dos seus beneficiários.

MANDADO DE INJUNÇÃO COLETIVO: A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal


firmou-se no sentido de admitir a utilização, pelos organismos sindicais e pelas
entidades de classe, do mandado de injunção coletivo, com a finalidade de viabilizar, em
favor dos membros ou associados dessas instituições, o exercício de direitos
assegurados pela Constituição. Precedentes a doutrina. (MI 20-DF, Relator Min. Celso de
Mello, DJ de 22.11.96).

Ao cotejar os argumentos tecidos pelas partes, o Tribunal Estadual resolveu referendar o


ato, por entender abusivo o movimento paredista, acrescentando, ainda, que o ato do
Exm°. Sr. Corregedor-Geral era fruto do “legítimo exercício do poder-dever disciplinar
inerente ao Órgão Administrativo” (fl. 163).

Com isso, verifica-se que a Administração pode e deve valer-se do seu poder disciplinar,
ante a total ausência de regulamentação específica relativa ao exercício do direito de
greve, no âmbito do serviço público. A instauração do processo administrativo
disciplinar está em perfeita sintonia com o princípio da legalidade, haja vista a
disposição precisa contida no art. 306 do Regulamento:

Art. 306 A autoridade que tiver ciência de qualquer irregularidade no serviço público é
obrigada a promover-lhe a apuração imediata, por meios sumários ou mediante
processo administrativo disciplinar.

Neste ponto, cumpre relembrar o ensinamento do saudoso Hely Lopes Meirelles que,
sobre o tema, assim lecionou:

Poder disciplinar á a faculdade de punir internamente as infrações funcionais dos


servidores e demais pessoas sujeitas à disciplina dos órgãos e serviços da
Administração. É uma supremacia especial que o Estado exerce sobre todos aqueles
que se vinculam à Administração por relações de qualquer natureza, subordinando-se às
normas de funcionamento do serviço ou do estabelecimento que passam a integrar
definitiva ou transitoriamente.

O poder disciplinar é correlato com o poder hierárquico, mas com ele não se confunde.
No use do poder hierárquico a Administração Pública distribui a escalona as suas
funções executivas; no uso do poder disciplinar ela controla o desempenho dessas
funções e a conduta interna de seus servidores, responsabilizando-os pelas faltas
cometidas. Daí a exata afirmativa de Marcello Caetano de que “o poder disciplinar tem
sua origem e razão de ser no interesse e na necessidade de aperfeiçoamento
progressivo do serviço público”. Realmente, a Administração como titular do poder
disciplinar, só o exerce a benefício do serviço, e, perseguindo esse objetivo, e o único
juiz da conveniência a oportunidade da punição do servidor, dentro das normas
específicas da repartição. (Direito administrativo brasileiro. 23. ed. São Paulo: Malheiros
Editores, 1998. p. 108-109).

Destas inferências anteriormente transcritas, impõe-se bipartir a fundamentação alusiva


ao caso concreto.

Primeiramente, escorreito o raciocínio tecido pelo Tribunal a quo ao rechaçar a


possibilidade do pleno exercício de greve, enquanto não for editada a lei
regulamentadora deste direito constitucional. Aliás, a jurisprudência do Pretório Excelso
é cristalina ao dispor:

O preceito constitucional que reconheceu o direito de greve ao servidor público civil


constitui norma de eficácia meramente limitada, desprovida, em conseqüência, de auto-
aplicabilidade, razão pela qual, para atuar plenamente, depende da edição da lei
complementar exigida pelo próprio texto da Constituição. (MI - 20-DF, Relator Min. Celso
de Mello, DJ de 22.11.96).

No âmbito deste Tribunal, a jurisprudência segue a mesma orientação pretoriana.


Ilustrativamente:

CONSTITUCIONAL. DIREITO DE GREVE. SERVIDOR PÚBLICO. REGULAMENTAÇÃO. LEI


COMPLEMENTAR. DESCONTOS DOS DIAS NÃO TRABALHADOS.

- A JURISPRUDÊNCIA PRETORIANA VEM SE FIRMANDO NO SENTIDO DE NÃO SER


AUTO-APLICÁVEL O DIREITO INSCRITO NO ART. 37, INC. VII, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL, DEPENDENDO, PARA SEU AMPLO EXERCÍCIO, REGULAMENTAÇÃO
DISCIPLINADA EM LEI COMPLEMENTAR.

- LEGITIMIDADE DO ATO QUE PROMOVE O DESCONTO DOS DIAS NÃO TRABALHADOS.

- RECURSO ORDINÁRIO IMPROVIDO. (RMS 4.538-SC, DJ de 27.11.1995).

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR. GREVE.

- O MANDADO DE SEGURANÇA NÃO COMPORTA DILAÇÃO PROBATÓRIA. A AÇÃO


MANDAMENTAL PRESSUPÕE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA, DEVENDO O DIREITO
EXSURGIR LÍMPIDO E INQUESTIONÁVEL.

- O DIREITO DE GREVE, NOS TERMOS DO ART. 37, INC. VII, DA CONSTITUIÇÃO


FEDERAL, E ASSEGURADO AOS SERVIDORES PÚBLICO, PORÉM, NÃO SÃO
ILEGÍTIMOS OS DESCONTOS EFETUADOS EM RAZÕES DOS DIAS NÃO
TRABALHADOS.

- PRECEDENTES.

- RECURSO DESPROVIDO. (RMS 4.512-SC, DJ de 06.10.1997).

Com base no exposto, não há direito liquido e certo a ser defendido quanto a estes
pormenores, já que a via do mandado de segurança a inadequada para aferir direito
certo mas carecedor de regulamentação infraconstitucional, por conseqüência, ilíquido.

Superados estes aspectos, assiste razão ao Sindicato quanto às inconstitucionalidades


das penalidades previamente aplicadas, quais sejam, suspensão e relotação. Para
asseverar tal tese, impõe-se transcrever a fundamentação esposada na Portaria nº 17/98:

A gravidade da infração, por outra vertente está a recomendar a imperativa adoção da


cautela ditada pelo art. 308 do Decreto nº 2.479 de 08.03.79, o que então se adota,
decretando A SUSPENSÃO PREVENTIVA de quantos servidores grevistas, tanto mais
porque a permanência dos mesmos, ante a manifesta rebeldia de suas condutas,
contrasta com o princípio de obediência e ordem jurídica e compromete a normalidade
das atividades judiciais além de arranhar os princípios da autoridade e hierarquia,
predicados inabdicáveis a disciplina do Serviço Público.

Por óbvia conseqüência da medida preventiva, os servidores relacionados suportarão a


inafastável incidência da regra restritiva remuneratória prevista no art. 145, inc. I do
referido Decreto, in verbis:

Art. 145 O funcionário deixará de receber:

I - 1/3 (um terço) do vencimento e vantagens, durante o afastamento por motivo de


suspensão preventiva ou recolhimento à prisão por ordem judicial não decorrente de
condenação definitiva, ressalvado o direito à diferença se absolvido afinal, ou se o
afastamento excede o prazo de condenação definitiva.

Encaminhe-se a relação dos servidores indiciados ao SETOR DE PAGAMENTO para as


providências correlatadas, assim como, concomitantemente, ao SETOR DE LOTAÇÃO E
MOVIMENTAÇÃO, a fim que se proceda ao cancelamento das suas lotações atuais e
correspectivas disponibilidades ao NÚCLEO ESPECIAL.

Outrossim, ao presente ATO será adicionado outros servidores que, igualmente, tenham
incidido em idêntica falta funcional, em listagem que venha a ser recepcionada
supervenientemente. (fl. 33).

Da leitura do texto, depreende-se que ambas reprimendas não respeitaram alguns


princípios da Carta Magna de 1988 (devido processo legal, contraditório e ampla defesa).
As sanções preventivas só podem ser aplicadas restritivamente, ou seja, somente nas
hipóteses em que se fizer indispensável, razão pela qual, prescinde de fundamentação
específica, explicitando quais os motivos que levaram a Administração a mitigar os
princípios basilares do processo.

No caso em espeque, tanto a suspensão quanto a relotação, só fariam sentido caso a


permanência dos servidores inviabilizasse a consecução do processo. Aliás, somente na
fase instrutória é que se aceita a exceção, já que neste momento o objetivo maior é a
ampla apuração dos fatos ensejadores da instauração do PAD.
Desta forma, despicienda a imposição de qualquer sanção intitulada “preventiva”,
quando, em verdade, o que se pretende é a produção antecipada da reprimenda, sem o
desfecho do respectivo processo.

Por derradeiro, necessário se faz distinguir duas hipóteses: a primeira, atinente ao pleno
exercício do direito de greve, cuja eficácia está, constitucionalmente, limitada à edição
da lei regulamemadora. A segunda, o poder-dever da Administração em apurar os atos
funcionais lesivos ao interesse a desenvolvimento do serviço público, oportunidade em
que as sanções ou quaisquer outros atos punitivos prescindem, obrigatoriamente, da
respectiva apuração em processo administrativo disciplinar, regulado pelos
indissociáveis princípios constitucionais anteriormente descritos.

Ante o exposto, conheço do recurso e lhe dou parcial provimento, tão-somente, para
afastar a suspensão preventiva e relotação dos servidores sindicalizados, já que as
mesmas não foram motivadas de maneira pormenorizada.

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Título:

A GREVE DO
SERVIDOR
PÚBLICO CIVIL
E OS
DIREITOS
HUMANOS
Autor do
Carlos Henrique Bezerra Leite
Texto:

DOUTRINA / PARECER / COMENTÁRIOS - 588/07/FEV/2002

A GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO CIVIL E OS DIREITOS HUMANOS.

*
por CARLOS HENRIQUE BEZERRA LEITE

Sumário: 1. Introdução. 2. Escorço histórico da greve no Brasil. 3. A greve no


ordenamento jurídico de alguns países. 4. A greve na teoria dos direitos humanos. 5.
Posição da ONU. 6. Posição da União Européia. 7. Posição da OIT. 8. A Constituição
brasileira de 1988. 9. A Mora Legislatoris em regulamentar o exercício do Direito. 10. A
Emenda Constitucional nº 19 e a recepção da Lei nº 7.783/89. 11. Natureza política da
greve do servidor público civil. 12. Jurisprudência. 13. A questão da remuneração
durante a greve no serviço público. 14. Conclusão.
1 INTRODUÇÃO.

A greve pode ser concebida como uma das mais importantes e complexas
manifestações coletivas produzidas pela sociedade contemporânea.

O vocábulo greve foi utilizado pela primeira vez no final do século XVIII, precisamente
numa praça em Paris, chamada de Place de Grève, onde se reuniam tanto
desempregados quanto trabalhadores que, insatisfeitos geralmente com os baixos
salários e com as jornadas excessivas, paralisavam suas atividades laborativas e
reivindicavam melhores condições de trabalho. Na referida praça, acumulavam-se
gravetos trazidos pelas enchentes do rio Sena. Daí o termo grève, originário de graveto.

A história da greve surge a partir do regime de trabalho assalariado, fruto da Revolução


Industrial. Pode-se, assim, atribuir aos movimentos sindicais dos ingleses o marco
inicial da história da greve.1

Com o evolver das relações entre o Estado e seus funcionários, a greve passou a ser
permitida legalmente em alguns países, como Canadá, Espanha, Finlândia, França,
México e Portugal, cujos ordenamentos jurídicos exigem, no geral, alguns
procedimentos prévios, como consultas, negociações coletivas etc. para que o
movimento possa ser deflagrado.

A Constituição cidadã de 1988 reconhece expressamente a greve como direito


fundamental, tanto para os trabalhadores em geral (art. 9º) quanto para os servidores
públicos civis (art. 37, VI e VII), tendo estes sido também contemplados com o direito à
livre sindicalização. Ao militar, no entanto, continuam proibidas a sindicalização e a
greve.

Disciplinando a greve para os trabalhadores do setor privado, abrangendo os


“servidores empregados” das sociedades de economia mista e empresas públicas, a Lei
nº 7.783/89 (LG):

a) conceitua a greve como “suspensão coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, de


prestação pessoal de serviço a empregador” (art. 2º);

b) arrola os serviços considerados essenciais;

c) fixa os requisitos para o exercício do direito;

d) obriga os sindicatos, os trabalhadores e os empregadores a garantir, durante a greve,


a prestação de serviços indispensáveis ao atendimento das atividades inadiáveis da
comunidade, que são aquelas que, não atendidas, coloquem em risco iminente a
sobrevivência, a saúde ou a segurança da população; caso isso não seja observado, o
Poder Público assegurará a prestação dos serviços indispensáveis;

e) estabelece as sanções para os casos de abuso do direito etc.

Quanto ao servidor público civil da Administração direta, autárquica e fundacional, o art.


16 da LG dispõe expressamente que:

“Para os fins previstos no art. 37, VII, da Constituição, lei complementar definirá os
termos e os limites em que o direito de greve poderá ser exercido”.

O STF, em diversas oportunidades, considerou que o inciso VII do art. 37 da CF, em sua
redação original, encerraria norma de eficácia limitada, sendo certo que a exigência da
lei complementar para o exercício do direito de greve pelos servidores públicos civis
impediria a aplicação analógica da Lei nº 7783/89, mormente em virtude da expressa
determinação impeditiva nela contida (art. 16).

Além disso, forte na literalidade do art. 37, VII, da Constituição e do art. 16 da LG, o STF,
no julgamento do MI 20-DF, realizado em 1º de maio de 1994, considerou a existência de
lacuna técnica decorrente da mora do Congresso Nacional em regulamentar o direito de
greve do servidor público civil. Lamentavelmente, porém, a Corte Suprema, ao invés de
criar uma norma específica para o caso concreto, o que seria da própria essência do
mandado de injunção, limitou-se simplesmente a comunicar a decisão ao Congresso
para que este tomasse as providências necessárias à edição de lei complementar
indispensável ao exercício do direito de greve pelos servidores públicos civis. Até hoje,
o Congresso Nacional não deu a mínima importância à decisão injuntiva do STF.

Não obstante, a 4 de junho de 1998, o mesmo Congresso promulgou a Emenda


Constitucional nº 19, que deu nova redação ao art. 37, inciso VII, da CF, não mais
exigindo a edição de uma lei complementar para regular o exercício do direito de greve
pelo servidor público civil, mas, tão-somente, de uma “lei específica”.

No presente estudo, portanto, procuraremos enfrentar as seguintes indagações: o que


se entende por lei específica? Existe esta espécie normativa no processo legislativo
previsto na Constituição? O art. 16 da LG foi recepcionado pelo novo texto
constitucional? A decisão do STF proferida no MI 20-DF continua válida?

O objeto específico da pesquisa repousa, portanto, na seguinte problematização: até que


seja editada a “lei específica” constante do novel inciso VII do art. 37 da CF, pode o juiz
aplicar, analogicamente, os princípios e as normas da Lei nº 7.783/89?

2 ESCORÇO HISTÓRICO DA GREVE NO BRASIL.

O Código Penal (1890) proibia a greve e, até o advento do Decreto nº 1.162, de 12 de


dezembro de 1890, essa orientação foi mantida. A Lei n° 38, de 04 de abril de 1932, que
dispunha sobre segurança nacional, conceituou a greve como delito.

As Constituições brasileiras de 1891 e de 1934 foram omissas a respeito da greve. De tal


arte, esta caracterizou-se, praticamente, como um fato, de natureza social, tolerado pelo
Estado.

A Constituição de 1937 prescrevia a greve e o lockout como recursos anti-sociais,


nocivos ao trabalho e ao capital e incompatíveis com os superiores interesses da
produção nacional (art. 139, 2ª parte).

O Decreto-Lei n° 431, de 18 de maio de 1938, que também versava sobre segurança


nacional, tipificou a greve como crime, no que diz respeito a incitamento dos
funcionários públicos à paralisação coletiva dos serviços; induzimento de empregados à
cessação ou suspensão do trabalho e à paralisação coletiva por parte dos funcionários
públicos.

O Decreto-Lei n° 1.237, de 02 de maio de 1939, que instituiu a Justiça do Trabalho, previa


punições em caso de greve, desde a suspensão e a despedida por justa causa até a pena
de detenção. O Código Penal, de 07 de dezembro 1940, (arts. 200 e 201), considerava
crime a paralisação do trabalho, na hipótese de perturbação da ordem pública ou se o
movimento fosse contrário aos interesses públicos.

Em 1943, ao ser promulgada a CLT, lembra Sérgio Pinto Martins:

“estabelecia-se pena de suspensão ou dispensa do emprego, perda do cargo do


representante profissional que estivesse em gozo de mandato sindical, suspensão pelo
prazo de dois a cinco anos do direito de ser eleito como representante sindical, nos
casos de suspensão coletiva do trabalho sem prévia autorização do tribunal trabalhista
(art. 723). O art. 724 da CLT ainda estabelecia multa para o sindicato que ordenasse a
suspensão do serviço, além de cancelamento do registro da associação ou perda do
cargo, se o ato fosse exclusivo dos administradores do sindicato”. 2

O Decreto-Lei n° 9.070, de 15 de março de 1946, passou a tolerar a greve nas atividades


acessórias, não obstante a proibição prevista na Constituição de 1937. Nas atividades
fundamentais, contudo, permanecia a vedação.

Com a Carta de 1946, a greve passa a ser reconhecida como direito dos trabalhadores,
embora condicionando o seu exercício à edição de lei posterior (art. 158). É importante
assinalar, com Sérgio Pinto Martins, que

“o STF entendeu que não havia sido revogado o Decreto-Lei n° 9.070/46, pois não era
incompatível com a Lei Fundamental de 1946, que determinava que a greve deveria ser
regulada por lei ordinária, inclusive quanto a suas restrições”. 3

Somente em 1º de junho de 1964, entrou em vigor a Lei de Greve (Lei n° 4.330), que
prescrevia a ilegalidade da greve:

a) se não fossem observados os prazos e condições estabelecidos na referida lei;

b) que tivesse por objeto reivindicações julgadas improcedentes pela Justiça do


Trabalho, em decisão definitiva, há menos de um ano;

c) por motivos políticos, partidários, religiosos, morais, de solidariedade ou quaisquer


outros que não tivessem relação com a própria categoria diretamente interessada;

d) cujo fim residisse na revisão de norma coletiva, salvo se as condições pactuadas


tivessem sido substancialmente modificadas (rebus sic stantibus).

Adite-se que o art. 20, parágrafo único, da Lei n° 4.330/64, dispunha que a greve lícita
suspendia o contrato de trabalho, sendo certo que o pagamento dos dias de paralisação
ficava a cargo do empregador ou da Justiça do Trabalho, desde que deferidas, total ou
parcialmente, as reivindicações formuladas pela categoria profissional respectiva.

Cumpre sublinhar a correta observação de Francisco Osani de Lavor:

“A Lei 4.330/64 regulamentou, por muito tempo, o exercício do direito de greve, impondo
tantas limitações e criando tantas dificuldades, a ponto de ter sido denominada por
muitos juslaboristas como a Lei do delito da greve e não a Lei do direito da greve”. 4

A Constituição de 1967, em seu artigo 158, XXI, combinado com o art. 157, § 7º,
assegurou a greve aos trabalhadores do setor privado, proibindo-a, contudo, em relação
aos serviços públicos e às atividades essenciais.
A Emenda Constitucional nº 01, de 17 de outubro de 1969, manteve a mesma orientação
(artigos 165, XX, e 162).

3 A GREVE NO ORDENAMENTO JURÍDICO DE ALGUNS PAÍSES.

a) Alemanha

A Constituição alemã é omissa a respeito da greve, mas assegura o direito de


associação. O Estado mantém-se neutro, porém os próprios sindicatos fixam regras
específicas a respeito, no que tange às atividades essenciais. À Justiça Federal do
Trabalho compete definir as condições de licitude da greve, que somente pode ser
deflagrada após esgotados todos os procedimentos imprescindíveis à autocomposição
do conflito. A greve é exercida com moderação e de forma responsável, sendo raros os
movimentos de paralisação, mesmo porque o sistema trabalhista alemão caracteriza-se
mais pela colaboração do que pelo conflito.

b) Argentina

A Constituição argentina garante apenas o direito de greve aos sindicatos, sendo a


matéria regulada pelo Decreto n° 2.184/90, que limita o exercício do direito de greve nas
chamadas atividades essenciais. Há necessidade de comunicação do início da
paralisação à autoridade do Ministério do Trabalho, com antecedência de cinco dias. As
partes devem estipular em convenção coletiva a respeito da prestação de serviços
mínimos à comunidade.

c) Chile

No Chile, a greve é permitida (art. 19 da Constituição). Todavia, há proibição nos


serviços públicos e nas atividades essenciais.

d) Espanha

Na Espanha, a Constituição (art. 28) define a greve como direito fundamental dos
trabalhadores, nos seguintes termos:

“Se reconece el derecho a la huelga de los trabajadores para la defensa de sus intereses.
La ley que regule el ejercicio de este derecho estabelecerá las garantías precisas para
asegurar el mantenimiento de los servicios essenciales de la comunidad”.

O direito de greve no ordenamento espanhol é assegurado aos funcionários públicos,


mas há proibição em relação aos membros das Forças Armadas e dos corpos de
segurança, por força da Lei n° 2, de 13 de março de 1986. É importante assinalar que a
redação da norma constitucional espanhola é, na essência, idêntica à insculpida no art.
9º da Constituição brasileira de 1988.

e) Estados Unidos

Nos Estados Unidos, a Constituição não trata de greve, nem de nenhum direito dos
trabalhadores. Os funcionários públicos são proibidos de fazer greve, pois caso
contrário serão dispensados. O Wagner Act e a Lei nº Taft-Hartley (1947) traçam os
contornos gerais da greve, e a última define as responsabilidades dos sindicatos,
inclusive em greve em atividades essenciais. A greve é exercitada pelo sindicato que
congregar o maior número de trabalhadores da empresa ou de sua atividade. Foram
criadas as injunctions, que são ordens proibitivas de greves, por meio de
pronunciamentos judiciais.

f) França

O preâmbulo da Constituição francesa de 1946 faz menção ao direito de greve, cujo


exercício é regulado nos termos das leis e seus regulamentos. Cabe à jurisprudência
fixar os seus contornos. É assegurado o direito de greve ao servidor público civil, ao
pessoal das empresas públicas e das empresas encarregadas do serviço público. Exige-
se aviso prévio de cinco dias. O governo pode requisitar trabalhadores para prestar
serviços durante a greve, inclusive designando-os nominalmente. É proibida a greve nas
Forças Armadas, na magistratura e na polícia.

g) Itália

Na Itália, a Constituição de 1948 estabelece o direito de greve, nos termos da legislação


ordinária, permitindo-a, com moderação, no serviço público.

A Lei n° 146, de 14 de junho de 1990, trata da greve nos serviços públicos essenciais,
cujo rol é considerado por alguns contrário a deliberações do Comitê de Liberdade
Sindical da OIT. O aviso prévio é de, no mínimo, 10 dias.

h) México

O art. 123 da Constituição de Querétaro, de 1917, assegura tanto o direito de greve como
o lockout, embora o exercício deste último dependa de autorização prévia do Estado.

É assegurado o exercício do direito de greve no serviço público, desde que haja aviso
prévio de 10 dias à Junta de Conciliação e Arbitragem.

i) Portugal

O art. 58 da Constituição portuguesa reconhece o direito de greve, competindo aos


trabalhadores definir os interesses que serão defendidos e seu âmbito.

Não é permitido o lockout.

A Lei nº 65, de 26 de agosto de 1977, não define a greve, nem a restringe, com o que não
se vislumbra ilegalidade nas chamadas greves políticas ou de solidariedade. É
assegurado o direito de greve aos exercentes de funções públicas (art. 12), com ressalva
quanto aos integrantes “de forças militares e militarizadas” (art. 13).

Nas atividades essenciais, o art. 8º da Lei nº 65 determina o funcionamento dos serviços


mínimos, sendo possível, caso não haja voluntariedade dos grevistas para assegurar o
atendimento mínimo à população, a requisição civil de trabalhadores, mediante portaria
editada pelo Conselho de Ministros, na qual é indicada a duração do movimento, a
autoridade responsável pela sua execução e o regime de trabalho.

j) Uruguai

No ordenamento jurídico uruguaio, a greve é entendida como direito sindical, e a Lei nº


13.720 delega ao Ministério do Trabalho a competência para disciplinar os serviços
essenciais que deverão ser assegurados durante a greve.

4 A GREVE NA TEORIA DOS DIREITOS HUMANOS.

Situar a greve na dimensão dos direitos humanos requer uma investigação de fôlego, o
que não é a nossa pretensão neste singelo ensaio.

Mas é possível afirmar que a greve, a partir do momento em que passa a ter sede nas
Constituições dos países ocidentais, tal como ocorre nos ordenamentos brasileiro,
espanhol e português, passa a ser considerada um direito fundamental dos
trabalhadores.

Trata-se, pois, de um direito fundamental da pessoa humana que se insere na moldura


das chamadas dimensões dos direitos humanos.

Nesse sentido é o magistério de Julio Cesar do Prado Leite, para quem

“A greve é um direito fundamental que se arrima na Declaração dos Direitos do Homem


(...) Com efeito, o ato internacional em causa, de modo explícito, cuida de assegurar
condições justas e favoráveis de trabalho. Para obtê-las ou confirmá-las todo
trabalhador tem direito a organizar sindicatos e neles ingressar para a proteção de seus
interesses. Não há greve sem sindicato. O sindicato tornar-se-ia uma mera associação
corporativa assistencial se não dispuser do direito de fazer greve”. 5

Vale dizer, a greve constitui, a um só tempo, direito de primeira, de segunda e de terceira


dimensão, na medida em que se enquadra simultaneamente como:

a) direito de liberdade ou de primeira dimensão, pois implica um non facere por parte do
Estado, ou seja, um status negativus estatal que reconhece as liberdades públicas e o
direito subjetivo de reunião entre pessoas para fins pacíficos;

b) direito de igualdade, ou de segunda dimensão, porque é pelo exercício do direito de


greve que os trabalhadores pressionam os respectivos tomadores de seus serviços,
visando à melhoria de suas condições sociais e corrigindo, dessa forma, a desigualdade
econômica produzida pela concentração de riquezas inerente ao regime capitalista,
mormente numa economia globalizada. Tanto é assim que a Constituição brasileira de
1988 (art. 9º) considera a greve um direito social fundamental dos trabalhadores;

c) direito de fraternidade ou de terceira dimensão, na medida em que a greve representa


inequivocamente uma manifestação de solidariedade entre pessoas, o que reflete, em
última análise, a ideologia da paz, do progresso, do desenvolvimento sustentado, da
comunicação e da própria preservação da família humana. Além disso, a greve, por ser
um direito coletivo social dos trabalhadores, pode ser tipificada como uma espécie de
direito ou interesse metaindividual ou, na linguagem do Código de Defesa do
Consumidor (art. 81, parágrafo único, II), um direito ou interesse coletivo.

Ora, se a greve tem por escopo básico a melhoria das condições sociais do homem
trabalhador, implica a inferência de que ela constitui um direito fundamental do
trabalhador enquanto pessoa humana.

Nesse sentido, parece-nos adequado afirmar que a greve constitui um instrumento


democrático a serviço da cidadania, na medida em que seu objetivo maior consiste na
reação pacífica e ordenada dos trabalhadores contra os atos que impliquem direta ou
indiretamente desrespeito à dignidade da pessoa humana.

E como se trata de direito humano fundamental, não pode haver distinção entre o
trabalhador do setor privado e o do setor público, salvo quando o próprio ordenamento
jurídico dispuser em contrário, tal como ocorre, no nosso sistema, com o servidor
público militar (CF, art. 142, § 3º, IV).

5 POSIÇÃO DA ONU.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) contempla de forma implícita o


direito de greve, ao estabelecer, no seu art. XX, nº 1, que “Toda pessoa tem direito à
liberdade de reunião e associação pacíficas”, e no art. XXIII, nº 4, ao garantir que “toda
pessoa tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção de seus
interesses”.

Já foi dito em linhas pretéritas que, ao proclamar o direito de reunião e associação, bem
como o direito de organizar e associar-se a sindicatos, a DUDH acaba por reconhecer o
direito de greve que, a rigor, constitui uma forma de proteção dos interesses da pessoa
que trabalha.

Embora a DUDH não contenha referência expressa ao direito de greve, cumpre sublinhar
que a Resolução nº 2.200 (A), de 16 de dezembro de 1966, adotada na XXI Assembléia
Geral da ONU, que instituiu o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais (PIDESC), enaltece, no art. 8º, nº 1, “d”, in verbis:

“Art. 8º. ....

1. Os Estados Partes do presente Pacto se comprometem a garantir:

(...)

d) o direito de greve exercido em conformidade com as leis de cada país”.

6 POSIÇÃO DA UNIÃO EUROPÉIA.

A Carta Social Européia, de 1961, dispõe textualmente no art. 6º, nº 4, in verbis:

“Art. 6º. A fim de assegurar o exercício eficaz do direito de negociação coletiva, as Partes
Contratantes

.....................................................................................................

reconhecem:

4. O direito dos trabalhadores e dos empregadores, em caso de conflito de interesses, a


recorrer a ações coletivas, inclusive o direito de greve, sob ressalva das obrigações que
possam resultar das convenções coletivas em vigor”.

Esse documento internacional é de extrema importância, não apenas pelo aspecto


político, filosófico e sociológico que historicamente representam os padrões ideais de
vida oriundos das democracias ocidentais do continente europeu, mas igualmente pela
perspectiva jurídico-dogmática, uma vez que consolida a idéia de que, efetivamente, a
greve constitui um legítimo instrumento para assegurar o eficaz direito de negociação
coletiva.

7 POSIÇÃO DA OIT.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) não possui convenção específica sobre


greve, mas a doutrina é praticamente unânime em afirmar que as Convenções 87 e 98,
que dispõem sobre liberdade sindical e negociação coletiva 6 , contemplam,
implicitamente, a greve como um direito fundamental dos trabalhadores, tanto do setor
público quanto do setor privado, sendo certo que apenas os funcionários das forças
armadas podem ter, segundo aquele organismo internacional, algumas restrições ou até
mesmo vedações ao exercício do direito de greve.

É importante assinalar que a Convenção 151 da OIT7 , também conhecida como


“Convenção sobre as Relações de Trabalho na Administração Pública”, no seus
consideranda, reconhece, entre outros aspectos, a expansão dos serviços prestados
pela administração pública em muitos países e a necessidade de que existam sadias
relações de trabalho entre as autoridades públicas e as organizações de empregados
públicos.8 Para tanto, prescreve expressamente no seu art. 7º, in verbis:

“Deverão ser adotadas, sendo necessário, medidas adequadas às condições nacionais


para estimular e fomentar o pleno desenvolvimento e utilização de procedimentos de
negociação entre as autoridades públicas competentes e as organizações de
empregados públicos sobre as condições de emprego 9 , ou de quaisquer outros métodos
que permitam aos representantes de empregados públicos participar na determinação
de tais condições”.

No que tange à greve do servidor público, o Comitê de Liberdade Sindical vem editando
verbetes no sentido do recomendar que os países membros reconheçam a greve como
um direito dos servidores públicos, somente admitindo restrições em casos muito
particulares.

Nesse sentido, o Comitê editou o verbete nº 394, que dispõe:

“O direito de greve só pode ser objeto de restrições, inclusive proibição, na função


pública, sendo funcionários públicos aqueles que atuam como órgãos de poder público,
ou nos serviços essenciais no sentido estrito do termo, isto é, aqueles serviços cuja
interrupção possa pôr em perigo a vida, a segurança ou a saúde da pessoa, no todo ou
em parte da população”.

Segundo a OIT, pois, “só são pertinentes as limitações aplicadas aos funcionários
públicos que atuem na qualidade de órgãos do poder público. Não se incluem, porém,
nesta categoria os trabalhadores públicos dos setores de educação ou dos
transportes”.10

O verbete nº 386 cuida da possibilidade de conciliação e arbitragem em serviços


essenciais e funções públicas.

Esses verbetes, é imperioso ressaltar, vinculam o Brasil, uma vez que a nosso país se
reportam os informes correspondentes da OIT. 11

Vê-se, assim, que a orientação da OIT é no sentido de permitir amplamente a greve dos
servidores públicos civis, salvo para aqueles que atuam como órgãos de poder público,
isto é, os que exercem parcela da soberania do Estado, como os juízes, membros do
Ministério Público, diplomatas, ministros, secretários, diretores das estatais etc.

8 A CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988.

A Constituição de 1988 insere o direito de greve no elenco dos direitos sociais


fundamentais dos trabalhadores do setor privado, nos seguintes termos:

“Art. 9º. É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a
oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.

§ 1º. A lei definirá os serviços e atividades essenciais e disporá sobre o atendimento das
necessidades inadiáveis da comunidade.

§ 2º. Os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei”.

Não há mais lugar, portanto, para a proibição de greve nos serviços essenciais, mas há
necessidade de se atender às necessidades inadiáveis da comunidade.

Aos servidores públicos civis, quer investidos em cargos, quer investidos em empregos,
também foi reconhecido, no art. 37, inciso VII, da CF/88, o direito de greve. Todavia, o
legislador constituinte estabeleceu que o exercício desse direito dependeria da edição
posterior de lei complementar, que, diga-se de passagem, jamais fora editada. Pelo
contrário, ao invés de regulamentar o direito de greve mediante lei complementar, o
legislador ordinário preferiu alterar a redação original da Carta através da Emenda
Constitucional nº 19/98, estabelecendo, assim, no que concerne ao servidor público civil,
que “o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei
específica”.

9 A MORA LEGISLATORIS EM REGULAMENTAR O EXERCÍCIO DO DIREITO.

No âmbito da Administração Pública direta, autárquica e fundacional, não há negar que a


mora legislatoris em regulamentar o inciso VII do art. 37 da Constituição tem suscitado
tormentosas discussões doutrinárias e jurisprudenciais.

Duas correntes se destacam.

A primeira sustenta a eficácia contida12 do preceito em exame, pelo que é possível o


exercício do direito antes mesmo da edição de lei complementar 13 , sendo aplicável, por
analogia, a Lei nº 7.783/89.14

A segunda, entendendo ser o referido dispositivo not self-executing, advoga no sentido


de que o servidor somente poderá exercer o direito de greve após editada norma
infraconstitucional (antes, lei complementar; agora, “lei específica”), exigida, também,
pela Emenda Constitucional nº 19/98. Dito de outro modo, a segunda corrente sustenta
que a norma constitucional é de eficácia limitada.

O STF, quando vigia a redação original do inciso VII do art. 37 da CF, adotou a segunda
corrente, como se infere do seguinte julgado:
“Insuficiência de relevo de fundamentação jurídica em exame cautelar, da argüição de
inconstitucionalidade de decreto estadual que não está a regular (como propõem os
requerentes) o exercício do direito de greve pelos servidores públicos; mas a disciplinar
uma conduta julgada inconstitucional pelo Supremo Tribunal, até que venha a ser
editada a lei complementar prevista no art. 37, VII, da Carta de 1988 (M.I. nº 20, sessão de
19.5.94).” (STF-TP- ADIN n. 1306-BA, Rel. Min. Octavio Galloti, requerentes: Partido dos
Trabalhadores - PT e outros; requerido: Governador do Estado da Bahia, j. 30.6.95, DJU
27.10.95, p. 01.806 - os grifos não constam do original).

10 A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 19 E A RECEPÇÃO DA LEI Nº 7.783/89.

Cremos que, em virtude da novel Emenda Constitucional nº 19/98, que não mais
menciona ‘lei complementar”, mas, tão-somente, “lei especifica”, a orientação até então
reinante no Pretório Excelso está a exigir urgente modificação.

Ora, diante do atual texto constitucional, parece-nos que, enquanto não for editada a
referida lei específica para regular o exercício do direito de greve do servidor público,
mostra-se perfeitamente aplicável, por analogia, a atual Lei (específica) de Greve (Lei nº.
7.783/89).

Com efeito, o art. 16 da Lei nº 7.783/89, que exigia lei complementar para regular o
exercício do direito de greve do servidor público, não mais vigora no nosso
ordenamento jurídico, porquanto incompatível com o texto atual da Carta Magna. Em
outros termos, o art. 16 da LG não foi recepcionado pelo art. 37, VII, da Constituição.

Ademais, se não há, no sistema referente ao processo legislativo, distinção entre as leis
ordinárias e as específicas (a expressão “lei específica”, a rigor, não encontra previsão
no art. 59 da Constituição), também não há falar em hierarquia entre tais modalidades
normativas.

Dessa forma, diante da lacuna existente, e considerando o fenômeno da recepção da


atual Lei de Greve pela nova Emenda Constitucional nº 19, cabe ao intérprete, pelo
menos até que sobrevenha (se é que isso verdadeiramente venha a acontecer) a nova
“lei especifica”, dar a máxima efetividade à norma constitucional, mediante a integração
do sistema.

Colhe-se, por oportuno, o judicioso entendimento de lvani Contini Bramante, para quem:

“Visitando o ordenamento, verifica-se que já existe no mundo jurídico uma lei ordinária
federal que regula, especificamente, o direito de greve, as atividades essenciais e o
atendimento às necessidades inadiáveis da comunidade: a lei 7.783, de 28 de junho de
1989.

Inicialmente, cumpre verificar que o art. 16, da Lei nº 7.783/89, está revogado (...) E, aqui,
ocorreu a chamada eficácia revogativa ou eficácia negativa, que também é
desobstrutiva, pois a norma constitucional traçou novo esquema dependente para a sua
atuação, exigente de uma lei ordinária normativa, diferente do sistema anterior, o qual
remetia à lei complementar.

Destarte, a Lei nº 7.783/89 foi recepcionada, sendo, doravante, aplicável aos servidores
públicos, porque em perfeita compatibilidade vertical-formal-material com o Texto
Constitucional. Operou-se o chamado fenômeno da eficácia construtiva da norma
constitucional, visto que a Lei nº 7.783/89, que trata do direito de greve, recebeu da Carta
Política um novo jato de luz revivificador que a revaloriza para a ordem jurídica nascente,
ou seja, aquilo que a técnica jurídico-constitucional denomina de recepção da lei
anterior.

É, portanto, dispensável o apelo ou futura interferência do legislador para aperfeiçoar a


aplicabilidade da norma constitucional (...) Poder-se-ia objetar: a Lei nº 7.783/89 não é,
obviamente, lei ordinária reguladora, especificamente, da greve dos servidores públicos
civis, mas de empregados regidos por contrato de trabalho. Todavia, a objeção não
resiste. Os limites do direito de greve, e até mesmo sua proibição, em certos casos, para
algumas categorias específicas de empregados ou de funcionários públicos, justifica-se
não em razão do status do trabalhador, mas em decorrência da natureza dos serviços
prestados, que são públicos, essenciais, inadiáveis, imantados pelo princípio da
predominância do interesse geral. É cediço que os serviços essenciais à comunidade
tanto podem ser prestados pelos trabalhadores do setor privado quanto do setor
público, cuja abstenção não pode causar aos outros interesses tutelados
constitucionalmente, como aqueles possuidores de caráter de segurança, saúde, vida,
integridade física e liberdades dos indivíduos. Não se justifica, assim, o tratamento
diferenciado ou separado. Onde há a mesma razão, igual deve ser a regulamentação e
solução”.15

A bem ver, porém, o STF, já na vigência da EC nº 19/98, decidiu que o direito de greve do
servidor público civil ainda continua dependendo de regulamentação, como se
depreende do seguinte aresto:

“Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade. Portaria nº 1.788, de 25.8.98, da


Secretaria da Receita Federal. Texto destinado à regulamentação do estágio probatório,
que se acha disciplinado pelo art. 20 da Lei nº 8.112/90, com a alteração do art. 6º da EC
nº 19/98 e, por isso, insuscetível de ser impugnado pela via eleita. Inviabilidade,
declarada pelo STF (MI nº 20, Min. Celso de Mello), do exercício do direito de greve, por
parte dos funcionários públicos, enquanto não regulamentada, por lei, a norma do inc.
VII do art. 37 da Constituição. Não-conhecimento da ação” (STF ADI-1880/DF, Ac. TP, Rel.
Min. Ilmar Galvão, DJ 27.11.98, p. 7, julg. 09.9.1998).

Lamentavelmente, o referido acórdão não enfrenta a questão da recepção ou não da Lei


federal nº 7.783/89, que, como já frisado, é a única norma prevista no ordenamento
vigente que pode ser aplicada analogicamente ao servidor público civil.

11 A NATUREZA POLÍTICA DA GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO CIVIL.

É sabido que o Supremo Tribunal Federal, em controle concentrado, decidiu que o


servidor público civil não pode entabular negociação coletiva, celebrar convenção ou
acordo coletivo ou ajuizar dissídio coletivo na Justiça do Trabalho (STF-ADin nº 492-1-
DF, Rei. Min. Carlos Veloso, DJU 12.3.93).16

Ocorre que a greve, como obtempera Arion Sayão Romita17 , é

“elemento essencial da negociação coletiva. Se se pretende implantar o método de


negociação coletiva para solucionar conflitos de trabalho, será indispensável assegurar
liberdade sindical: sem autonomia, os sindicatos de trabalhadores estão desarmados.
Trata-se, no caso, do postulado fundamental para a convivência democrática. E a greve é
a arma de luta dos trabalhadores na negociação coletiva! Sem direito de greve não pode
haver negociação coletiva digna deste nome” (grifos nossos).
Afigura-se-nos rigorosamente equivocado o entendimento do STF ao confundir
negociação coletiva com convenção ou acordo coletivo.

Com efeito, negociação coletiva é um procedimento preparatório destinado à posterior


celebração dos referidos contratos-leis ou, no caso brasileiro, ajuizamento de dissídio
coletivo perante a Justiça do Trabalho (CF, art. 114, § 2º).

É certo que o reconhecimento das convenções e acordos coletivos previsto no art. 7º,
XXVI, da CF ao servidor público da Administração direta, autárquica ou fundacional
encontra obstáculos nos princípios da legalidade e do orçamento público, pois compete
ao chefe do Executivo a iniciativa do processo legislativo que implique aumento de
despesas dos servidores públicos.

Mas isso não significa, de forma alguma, que os servidores, por intermédio de seu
sindicato, não possam entabular negociação coletiva diretamente com o representante
do respectivo ente da Administração Pública.

Mesmo porque, como bem observa Arion Sayão Romita,

“A negociação coletiva enseja o debate de uma grande variedade de assuntos, que não
se restringem aos reajustamentos salariais: qualidade de vida no trabalho, saúde e
segurança, mudanças tecnológicas, flexibilização do trabalho, não-discriminação,
participação nas decisões”.18

Tanto é assim, que a Constituição reconhece expressamente aos servidores públicos o


direito à livre associação sindical (CF, art. 37, VI), sendo certo o art. 8º, VI, da mesma
Carta, que determina a obrigatoriedade da participação dos sindicatos nas negociações
coletivas de trabalho.

Ora, negociar coletivamente não significa que as partes sejam obrigadas a celebrar
convenção ou acordo coletivo. No setor privado, como já dito, da negociação coletiva
pode resultar um “contrato-lei” ou, em caso de malogro, a possibilidade de ajuizamento
de dissídio coletivo, cabendo ao Judiciário Trabalhista estabelecer normas e condições,
dentro dos limites fixados no vértice do ordenamento jurídico.

No âmbito da Administração Pública direta, autárquica ou fundacional, é juridicamente


possível que a negociação coletiva seja operacionalizada – pouco importa o nomen juris
– como um protocolo de intenções, uma mesa redonda, do qual participem, de um lado,
o representante do ente público e, de outro lado, o sindicato representativo dos
servidores, tudo em perfeita sintonia com os princípios fundamentais que regem o
Estado Democrático de Direito.

Desse protocolo de intenções, poderá surgir um projeto de lei, encampando,


materialmente, as cláusulas que contemplam o acordo de vontades entre as partes,
pressupondo, sempre, que o representante do ente público paute sempre a sua conduta
pela observância do princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse de
classe ou particular.

Obviamente que o projeto de lei será encaminhado ao Poder Legislativo, onde se abrirão
amplos debates inerentes ao processo legislativo, e, se aprovado na Casa Legislativa,
retornará para a sanção do chefe do Executivo.

Assim, embora materialmente tenha havido a negociação coletiva, do ponto de vista


formal ter-se-á não um acordo coletivo, mas sim uma lei regulando as relações de
trabalho entre os servidores e o Estado.

Nas palavras de Pinho Pedreira, para que a negociação coletiva

“passe a produzir os efeitos normativos dependerá da incorporação a um ato do


Executivo ou do Legislativo ou da aprovação de um desses Poderes de modo a
harmonizar a negociação coletiva dos servidores públicos com a competência
constitucional dos Poderes Executivo e Legislativo”.19

Desse modo, restariam observados os princípios da legalidade e, sobretudo, da


democracia participativa nas relações entre a Administração e o seu pessoal.

Afinal, como disse o Min. Marco Aurélio no voto dissidente do citado acórdão do STF,

“impossível é deixar de admitir que a negociação coletiva pode visar ao afastamento do


impasse, do conflito seguido de greve, mediante a iniciativa, exclusiva do Executivo, de
encaminhar projeto objetivando a transformação em lei do que acordado na mesa de
negociações”.

Sem direito à negociação coletiva e sem poder exercer (segundo o atual entendimento
do STF) o direito de greve, o certo é que, no mundo dos fatos, a realidade é outra.

A todo instante, como é notório, a imprensa noticia inúmeras greves eclodidas nos
diversos setores da Administração Pública direta e indireta, inclusive em atividades
essenciais, corno as da saúde e segurança públicas.

E, sem o canal de negociação coletiva, não há negar que a greve do servidor público
brasileiro tende a ser necessariamente política, pois ela é a última e única alternativa
para pressionar o Executivo a desencadear o processo legislativo destinado a atender às
reivindicações dos trabalhadores do setor público.

12 JURISPRUDÊNCIA.

Já foi dito que a jurisprudência do STF é no sentido de que o direito de greve do servidor
público está ainda a depender de lei, antes complementar, agora específica, nos termos
do art. 37, VII, da Constituição da República.

Cumpre frisar que a Suprema Corte não fez distinção entre servidor público estatutário e
servidor público celetista.

Neste passo, é importante trazer à colação a disparidade do entendimento adotado pelo


TST e pelo STJ.

No âmbito do TST, a jurisprudência da Seção de Dissídios Coletivos(SDC), mesmo na


vigência da EC nº 19/98, continua acenando que o direito de greve para o servidor
celetista está ainda a depender de lei específica e, enquanto esta não for editada, o
movimento paredista é ilegal. É o que deflui do seguinte aresto:

“Servidor público regido pela Consolidação das Leis do Trabalho. Greve. Competência
da Justiça do Trabalho para apreciar a legalidade da greve. É a justiça do trabalho
competente para decidir quanto à legalidade de greve de servidor público regido pela
legislação trabalhista. O servidor público, mesmo regido pela legislação trabalhista, não
pode exercitar o direito de greve, pois ainda não existe a lei específica prevista no art.
37, VII, da Constituição Federal” (TST RODC 614621/1999, Ac. SDC, DJ 24.5.2001, p. 81.
Recorrente: Ministério Público do Trabalho da 2ª Região; Recorridos: Sindicato dos
Médicos de São Paulo e Município de Carapicuíba; Rel. Min. Carlos Alberto Reis de
Paula).

Colhe-se, ainda, do referido julgado do c. TST, que o recurso do Ministério Público do


Trabalho foi provido, por maioria, para declarar a ilegalidade da greve dos servidores
públicos (investidos nos cargos de médicos), com as conseqüências previstas em lei,
nos termos da fundamentação do voto do Exmo. Ministro Relator, que reformulou o
entendimento manifestado anteriormente. Ficaram vencidos os Exmos. Ministros
Ronaldo Lopes Leal, que extinguia o processo sem julgamento do mérito, por
impossibilidade jurídica, e Rider Nogueira de Brito, que votava pela não-abusividade do
movimento grevista.

Já no âmbito do STJ, o entendimento majoritário, mesmo antes da Emenda


Constitucional nº 19/98, aponta que o direito de greve do servidor público estatutário
pode ser exercitado amplamente enquanto não for regulamentado o inciso VII do art. 37
da Constituição.

A única restrição apontada pelo STJ diz respeito ao pagamento dos dias de paralisação,
como se infere dos seguintes arestos:

“Constitucional. Administrativo. Professores estaduais. Greve. Paralisação. Desconto de


vencimentos. O direito de greve assegurado na Carta Magna aos servidores públicos,
embora pendente de regulamentação (art. 37, VII), pode ser exercido, o que não importa
na paralisação dos serviços sem o conseqüente desconto da remuneração relativa aos
dias de falta ao trabalho, à míngua de norma infraconstitucional definidora do assunto.
Recurso desprovido” (STJ ROMS 2873/SC, Ac. 6ª T. (1993/0009945-0), DJ 19.8.1996, p.
28.499; Relator Min. Vicente Leal, julg. 24.6.1996).

“Direito de Greve. Servidor Público. Possibilidade do exercício, independentemente da


regulamentação prevista no art. 37, VII, da Constituição Federal. No caso dos autos, não
se pode discutir a questão do desconto nos vencimentos, porque não há certeza de que
as faltas procedam tão-somente da greve. Fatos complexos que escapam ao exercício
do mandamus. Embargos declaratórios com finalidade de prequestionamento.
Descabida a multa. Recurso parcialmente provido” (STJ ROMS 2673/SC, Ac. 6ª T.
(1993/0007484-9), DJ 22.11.1993, p. 24.975, Rel. Min. José Cândido de Carvalho Filho,
julg. 19.10.1993).

A discrepância entre os Tribunais Superiores está a revelar que o servidor público


estatutário encontra-se em posição de vantagem em relação ao servidor público
celetista, o que não deixa de ser um paradoxo, uma vez que o regime contratual
(celetista) mostra-se mais propício a admitir a aplicação analógica da atual Lei de Greve
do que o regime estatutário unilateral.

13 A QUESTÃO DA REMUNERAÇÃO DURANTE A GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO.

Um dos temas que tem causado grandes celeumas é, seguramente, o que diz respeito ao
pagamento da remuneração dos servidores durante a greve.

São inúmeros os equívocos que, segundo nos parece, vêm sendo perpetrados, tanto
pelos servidores quanto pelas autoridades governamentais.

No que concerne aos servidores, o equívoco, para não dizer contradição, consiste no
fato de que, quando deflagram a paralisação, invocam a aplicação da atual Lei de Greve
(Lei nº 7.783/89) que, como é sabido, é destinada, em linha de princípio, aos
trabalhadores que estão submetidos ao regime contratual da CLT.

Ocorre que o art. 7º da Lei nº 7.783/89 dispõe textualmente que a greve implica
suspensão das relações jurídicas individuais de trabalho, nos seguintes termos:

“Observadas as condições previstas nesta Lei, a participação em greve suspende o


contrato de trabalho, devendo as relações obrigacionais, durante o período, ser regidas
pelo acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho” (grifos
nossos).

Mas o que significa suspensão do contrato de trabalho?

Para responder, pedimos vênia para transcrever pequeno trecho de obra de nossa
autoria:

“Alguns autores preferem utilizar as expressões suspensão parcial ou suspensão total


do contrato no sentido de interrupção ou suspensão do contrato, respectivamente.

A lei brasileira (CLT, Título IV, Capítulo IV), utiliza, literalmente, as expressões suspensão
e interrupção, embora não defina nem uma nem outra.

Em rigor científico, contudo, não há suspensão ou interrupção do contrato, mas sim dos
seus efeitos, isto é, das obrigações atribuídas a cada uma das partes figurantes da
relação de emprego. É por esta razão que melhor seria falar em suspensão ou
interrupção do trabalho, e não do contrato, uma vez que este, em ambos os casos,
continua vigendo e até produzindo efeitos.

Dá-se a suspensão (ou suspensão total) quando inexistir obrigatoriedade da prestação


de serviço e pagamento de salário, sendo certo que o tempo de serviço, em regra, não é
computado para os efeitos legais.

Na suspensão, portanto, empregado e empregador ficam dispensados, transitoriamente,


do cumprimento das obrigações ínsitas ao contrato de trabalho”. 20

Em relação à greve, pode-se, assim, dizer que, em princípio, ela implica suspensão da
relação jurídica de trabalho, isto é: a) não é obrigatório o pagamento de salários; b) não
é obrigatória a prestação do trabalho; c) o tempo de serviço não é computado.

E é exatamente em razão do não-pagamento da remuneração durante o movimento de


paralisação coletiva que as greves têm geralmente curta duração. E isso acontece em
todos os países nos quais a greve é considerada um direito dos trabalhadores. Na
França, por exemplo, a greve dos servidores não dura mais de dois dias, mas os seus
efeitos são sentidos em todos os setores econômicos, políticos e sociais, na medida em
que a adesão ao movimento importa ações diretas que sensibilizam a sociedade como
um todo.

É preciso que os trabalhadores públicos brasileiros se conscientizem acerca da própria


natureza instrumental da greve e assumam os riscos que a deflagração do movimento
lhes impõe. A greve no serviço público exige, necessariamente, a conscientização e a
participação não apenas dos servidores, mas, também, dos destinatários dos serviços
por eles prestados. Assim, por exemplo, no âmbito das universidades públicas, a greve
deve contar com o apoio e participação direta do corpo docente e discente, dos demais
servidores, dos pais dos alunos, dos especialistas, políticos, juristas etc. Para tanto, é
factível organizar passeatas, seminários, mesas-redondas e outros eventos e
manifestações que tenham por fim divulgar, debater e esclarecer todos os objetivos do
movimento.

Por outro lado, o equívoco das autoridades governamentais está em estabelecer sérias
restrições e até sanções aos servidores que participam de greve, o que é incompatível
com a fundamentalidade dessa espécie de direito humano, como já vimos anteriormente.

No plano federal, por exemplo, o Presidente da República editou o Decreto nº 1.480, de


03 de maio de 1995 (DOU 04.5.1995), que, em linhas gerais, disciplina que as faltas
decorrentes de participação de servidor público federal nos movimentos de paralisação
de serviços públicos não poderão, em nenhuma hipótese, ser objeto de abono,
compensação ou cômputo, para fins de contagem de tempo de serviço ou de qualquer
vantagem que o tenha por base.

Além disso, o referido decreto, de duvidosa constitucionalidade 21 , determina até mesmo


a exoneração ou dispensa dos servidores ocupantes de cargos em comissão ou de
funções gratificadas constantes da relação encaminhada pela chefia imediata do
servidor ao órgão de pessoal respectivo a relação dos servidores cujas faltas se
enquadrem na hipótese nele prevista, discriminando, dentre os relacionados, os
ocupantes de cargos em comissão e os que percebam função gratificada.

Ora, a Constituição não fez qualquer distinção entre os servidores públicos civis efetivos
e os servidores ocupantes de cargos em comissão, sendo certo que as funções de
confiança devem ser, por força da Emenda Constitucional nº 19/98, ocupadas
exclusivamente por servidores ocupantes de cargos efetivos.

Vale dizer, a atitude da Administração, como a de qualquer outro empregador, deve ser
tão-somente a de, durante a greve, não efetuar o pagamento da remuneração dos
servidores, sem qualquer distinção, que tenham aderido ao movimento. Dito de outro
modo, não há obrigatoriedade do pagamento da remuneração porque não há trabalho.
Nada mais.22

Isso não significa, em absoluto, que os excessos eventualmente praticados pelos


grevistas não sejam objeto de sanção civil, administrativa, trabalhista e penal, tal como
previsto no art. 15 da Lei nº 7.783/89.

14 CONCLUSÃO.

Como síntese do exposto, apresentamos as conclusões mais importantes.

A greve constitui um instrumento a serviço da cidadania, na medida em que seu objetivo


maior consiste na reação pacífica e ordenada contra os atos que impliquem direta ou
indiretamente desrespeito à dignidade da pessoa humana do cidadão trabalhador.

O ordenamento jurídico brasileiro considera a greve um direito fundamental dos


trabalhadores, nos termos do art. 9º da Constituição Federal.

Por se tratar de direito humano fundamental, não pode haver distinção entre o
trabalhador do setor privado e o do setor público, salvo quando o próprio ordenamento
excepciona, tal como ocorre, no nosso sistema, com o servidor público militar (CF, art.
142, § 3º, IV).

Nesse sentido é a posição da OIT, que somente admite restrições ao exercício do direito
de greve nos serviços essenciais cuja interrupção possa pôr em perigo a vida, a
segurança ou a saúde, no todo ou em parte, da população.

Lei nº 7.783/89, por ser uma lei específica sobre a greve, pode ser aplicada, por analogia,
ao servidor público civil, mormente no que tange aos serviços públicos considerados
essenciais e inadiáveis, tais como os que coloquem em risco a vida, a segurança e a
saúde da população, no todo ou em parte.

Afinal, a operacionalização do Direito conduz à ilação de que é menos prejudicial à


sociedade que o Estado-juiz reconheça a existência de um conflito e regularmente, à luz
do sistema jurídico vigente, os seus efeitos, a deixar que os próprios servidores
interessados exerçam de fato, sponte sua, e com riscos para a comunidade, em especial
a camada da população mais carente dos serviços públicos, um direito fundamental que
lhes é constitucionalmente assegurado.

A greve importa suspensão coletiva do trabalho. Logo, em linha de princípio, não há,
durante o movimento paredista, a obrigação da prestação do serviço pelo servidor nem a
obrigação da contraprestação do pagamento da remuneração pela Administração.

Para finalizar, invocamos as palavras de Georgenor de Sousa Franco Filho, para quem

“... o Estado deve regular o exercício do direito de greve, não no sentido de restringi-lo,
mas de garantir o bem-estar comum, e, por outro ângulo, retirar as causas geradoras de
que movimentos dessa natureza são conseqüência, garantindo, como pregou Aristóteles
na antiga Grécia, a existência de igualdade real entre os seres humanos, que todos
tenham direito de ascender a melhores condições de vida e de trabalho, que, ao cabo,
venha, no futuro, até mesmo a ser dispensado esse recurso extremo”. 23

*
O autor é Professor Efetivo de Direito Individual e Coletivo do Trabalho (UFES);
Procurador Regional do Ministério Público do Trabalho; Mestre e Doutorando em Direito
(PUC-SP); Membro Titular da Academia Nacional de Direito do Trabalho e Coordenador
da Pós-Gradução em Direito Constitucional(UFES)
1
Mozart Victor Russomano, Princípios gerais de direito sindical, 2ª ed., Rio de Janeiro,
Forense, 1997, p. 243.
2
Direito do trabalho, 6ª ed., São Paulo, Atlas, 1998, p. 695.
3
Ibidem, mesma página.
4
A greve no contexto democrático, in Revista Síntese Trabalhista, nº 82, abril/96, Porto
Alegre, p. 12.
5
O papel da greve na negociação coletiva, in RIBEIRO, Lélia Guimarães Carvalho;
PAMPLONA FILHO, Rodolfo (coords.), Direito do trabalho: estudos em homenagem ao
prof. Luiz de Pinho Pedreira da Silva, São Paulo, LTr, 1998, p. 427.
6
A Convenção 87 ainda não foi ratificada pelo Brasil, mas a Convenção 98 foi aprovada
pelo Decreto Legislativo nº 49, de 27.8.52, promulgada pelo Decreto nº 33.196, de 29.6.53,
com vigência nacional a partir de 18.11.1953.
7
A Convenção 151 lamentavelmente ainda não foi ratificada pelo Brasil.
8
A expressão “empregados públicos” tem significação ampla, isto é, abrange todas as
pessoas que mantêm vínculo de trabalho com a administração pública, tal como se
infere do art. 1º da Convenção nº 151 da OIT.
9
A expressão “condições de emprego” também comporta interpretação extensiva,
alcançando, assim, todas as condições inerentes às relações de trabalho no âmbito da
Administração Pública, quer no sentido de relação de natureza empregatícia, quer no
sentido de relação de natureza estatutária.
10
A liberdade sindical / trad. Edilson Alkmim Cunha. Brasília, DF: Organização
Internacional do Trabalho; São Paulo: LTr, 1994, p. 77.
11
Georgenor de Sousa Franco Filho, Liberdade sindical e direito de greve no direito
comparado: lineamentos, São Paulo, LTr, 1992, p. 94.
12
Segundo José Afonso da Silva, normas de eficácia contida “são aquelas em que o
legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos a determinada
matéria, mas deixou margem à atuação restritiva por parte da competência discricionária
do Poder Público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais
nelas enunciados” (Aplicabilidade das normas constitucionais, 3ª ed., São Paulo,
Malheiros, 1998, p. 116). Celso Antônio Bandeira de Mello, mesmo antes da EC 19/98, já
sustentava a eficácia contida do art. 37, VII, da CF: “... Este é exercitável desde logo,
antes mesmo de editada a sobredita norma complementar, que lhe estabelecerá os
limites. Trata-se de norma de eficácia contida, segundo a terminologia adotada por José
Afonso da Silva (Aplicabilidade das Normas Constitucionais, Editora Revista dos
Tribunais, 2ª edição, 1982, páginas 73 e 92 e seguintes). Admita-se, apenas, que a greve
não poderá deixar sem atendimento as “necessidades inadiáveis” da comunidade, a
serem identificadas regendo um critério de “razoabilidade”, pois a obrigação de supri-la
está constitucionalmente prevista, até mesmo para os trabalhadores em geral, conforme
§ 1º do artigo 9º” (Regime Constitucional dos Servidores da Administração Direta e
Indireta, Revista dos Tribunais, 1990, p. 77-8).
13
Com o advento da Emenda Constitucional nº 19/98, que deu nova redação ao inciso VII
do art. 37 da Constituição, não mais se exige lei complementar, mas, tão-somente, “lei
específica”.
14
Cf. Arnaldo Süssekind, Direito Constitucional do Trabalho, Rio de Janeiro, Renovar,
1999, p. 434-435. Nesse sentido, decidiu a 6ª Turma do STJ no ROMS 4531/SC
(1994/0018896-0), Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, j. 22.8.95.
15
Direito constitucional de greve dos servidores públicos - Eficácia limitada ou plena?
Emenda Constitucional nº 19, in ‘Trabalho em Revista’, jan./99, Curitiba, Editora
Decisório Trabalhista, p. 530.
16
Esse entendimento, como apontado no item 7 supra, contraria a recomendação
constante do verbete 386 do Comitê de Liberdade Sindical da OIT.
17
Direitos sociais na Constituição e outros estudos, São Paulo, LTr, p. 250.
18
Regime jurídico dos servidores públicos civis - aspectos trabalhistas e
previdenciários, São Paulo, LTr, 1993, p. 45-47.
19
A negociação coletiva no setor público, in Direito sindical brasileiro: estudos em
homenagem ao prof. Arion Sayão Romita, São Paulo, LTr, 1998, p. 262.
Doutrina Jurídica Brasileira [CD-ROM] org. Sérgio Augustin. Caxias do Sul: Plenum,
2001. ISBN 85-88512-01.
22
Recentemente, o presidente em exercício do Supremo Tribunal Federal, ministro Ilmar
Galvão, deferiu (04/10) Suspensão de Segurança (SS 2061) a favor da Advocacia-Geral da
União, relativa ao pagamento do salário de setembro dos professores das universidades
federais em greve há mais de 30 dias. A AGU ajuizou dia 03 último a Suspensão de
Segurança contra liminar concedida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao Sindicato
Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES). Ainda no mesmo
dia, o ministro encaminhou os autos à Procuradoria-Geral da República. De acordo com
o ministro, a falta dos professores das universidades ao trabalho “não pode ser
abonada, com o pagamento dos respectivos vencimentos, sem que isso implique em
grave - e provavelmente irreversível - lesão à ordem administrava das universidades”.
23
Liberdade sindical e direito de greve no direito comparado: lineamentos, São Paulo,
LTr, 1992, p. 75.
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Título:

Servidor
público -
Renúncia
das
diárias -
Pagamen
to
indevido
pela
Administr
ação -
Restituiçã
o

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 256/39/OUT/2004

PERGUNTA 1 - SERVIDOR PÚBLICO

Determinado servidor, ao ser designado para prestar serviço em outra cidade,


renunciou expressamente ao direito às diárias, justificando que possui família nessa
cidade e que não teria gastos extras em razão disso. Ocorre que, por engano, acabou
sendo efetuado pagamento a tal título. Nesse caso, deverá ser devolvido o valor das
diárias?

O pagamento de diárias tem cabimento quando o servidor tiver que se afastar da sua
sede a serviço, destinando-se a ressarci-lo das despesas extraordinárias tidas com o
deslocamento.

Portanto, o fato que autoriza o pagamento de diárias é a existência de despesas com


movimentação do servidor, a serviço do Poder Público, para localidade diversa daquela em que
está lotado e realiza suas atividades. Terá, então, caráter indenizatório.

Segundo Cármen Lúcia Antunes Rocha, “as indenizações são recomposição de valor
gasto em razão do próprio serviço, pelo que são situações precárias, com motivação específica
e prevista em lei”.1

Considerando seu caráter indenizatório, pode-se dizer que, se não houver prejuízo a
ser ressarcido em virtude do deslocamento, as diárias não serão devidas. Essa é justamente a
situação do caso em questão, em que o servidor foi designado para serviço em cidade na qual
possui família, não tendo gastos com hospedagem e alimentação sendo que, em razão disso,
renunciou expressamente ao seu direito às diárias.

Já que o pagamento das diárias não deveria ter sido efetuado, uma vez que o servidor
expressamente renunciou ao direito de recebê-las, em razão da inexistência de gastos a serem
ressarcidos, deverá ser devolvido o valor equivocadamente entregue a tal título. Do contrário,
estar-se-ia admitindo o enriquecimento sem causa do servidor, o que é vedado pelo nosso
ordenamento jurídico. A restituição de tal valor é determinada pelo art. 884 do Código Civil, que
prescreve o seguinte:

Art. 884 Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o
indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.
Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a
restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi
exigido.

O servidor que recebeu, por engano, valor de diárias a que não fazia jus terá o dever de
devolver o respectivo montante aos cofres públicos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos. São
Paulo: Saraiva, 1999. p. 313.

Consulta em Destaque Imprimir

Título:

AGENTES
PÚBLICO
S-
AUSÊNCI
A DE
ESTABILI
DADE DE
SERVIDO
R-
APROVAÇ
ÃO EM
OUTRO
CONCUR
SO
PÚBLICO
-
VACÂNCI
A DO
CARGO

CONSULTAS EM DESTAQUE - 991/23/JUN/2003

AGENTES PÚBLICOS – AUSÊNCIA DE ESTABILIDADE DE SERVIDOR –


APROVAÇÃO EM OUTRO CONCURSO PÚBLICO – VACÂNCIA DO CARGO.

ORIENTAÇÃO JURÍDICA1

EMENTA: Servidor público – Ausência de estabilidade – Aprovação em outro concurso


público – Vacância do cargo.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL: Art. 29 e art. 33, inc. VIII, da Lei nº 8.112/90.

1. Regra geral, a vacância do cargo em virtude da posse em outro cargo inacumulável


está diretamente relacionada à possibilidade de recondução do servidor, portanto,
pressupõe a estabilidade, devendo aos não estáveis, seu vínculo com a Administração
ser rompido pela exoneração.

1 CONSULTA

Os classificados em novo concurso público para o mesmo ente da Federação, com o


qual já mantêm vínculo funcional, deverão pedir sua exoneração e demissão,
respectivamente, no ato da convocação ou simplesmente nomeia-se o candidato para o
cargo ou contrata para o emprego e o tempo de serviço continua a ser computado, ainda
que estejam em estágio probatório?

2 FUNDAMENTOS LEGAIS E DOUTRINÁRIOS

Antes de adentrar no cerne da consulta, convém tecer breves considerações sobre a


estabilidade no serviço público.

A estabilidade não deve ser confundida com a efetividade, esta é uma característica
inerente ao provimento de certos cargos públicos que configura pressuposto necessário
àquela, sendo que, nas lições de Cármen Lúcia Antunes Rocha2, consiste em uma
“qualidade jurídica do vínculo administrativo estabelecido entre a pessoa estatal e o
servidor nomeado para o cargo de provimento efetivo”.

Aludida qualidade implica asseverar que o liame que une o servidor à Administração
Pública somente poderá ser rompido nas hipóteses e formas previstas no ordenamento
jurídico, não ficando ao líbito do administrador público.

Saliente-se que não basta mera existência do vínculo acima apontado, ao revés, faz-se
mister o preenchimento de certas condições previstas na Carta Magna e na legislação
infraconstitucional (no caso em tela, o Estatuto dos Servidores Públicos da União) para
que se configure a estabilidade.

Importa, ao menos, relacionar as condições imprescindíveis à aquisição da estabilidade,


ainda, que se faça, nesta ocasião, despicienda análise mais aprofundada de cada uma
delas.

Assim, tem-se como condições para cogitar o tema estabilidade: a) nomeação para
cargos de provimento efetivo; b) tal nomeação deve ser razão de concurso público de
provas ou provas e títulos; c) cumprimento de período de 3 anos de estágio probatório;
d) avaliação especial de desempenho.

Os cargos de provimento efetivo são aqueles que somente podem ser ocupados por
servidores públicos aprovados em concurso aberto ao público de provas ou provas e
títulos, cumpridos os requisitos legais que constituem a grande maioria dos cargos no
serviço público. E, ao contrário dos cargos em comissão, sua ocupação não tem caráter
temporário, sendo que a perda do cargo somente se dá através de regular processo
administrativo, no qual se assegure o contraditório e a ampla defesa ou por sentença
judicial transitada em julgado (lembre-se que a hipótese de perda de cargo por servidor
estável em razão de desempenho insatisfatório, constatado mediante avaliação periódica
de desempenho, ainda não está regulamentada).

Feitas essas considerações, passa-se à análise do caso concreto, pelo qual, nos termos
da consulta, não está presente a figura da estabilidade, uma vez que informa que o
servidor se encontra em estágio probatório e, portanto, não reuniu todas as condições
mencionadas para fazer jus à “garantia constitucional de permanência no serviço
público”, na expressão de Hely Lopes Meirelles.3

O caso em lume aponta para a forma de vacância de cargos ou empregos públicos.


Sobre o referido instituto, dispõe o art. 33 da Lei nº 8.112/90:

"Art. 33 A vacância de cargo público decorrerá de:

I - exoneração;

(...)

VIII - posse em outro cargo inacumulável;"

Ocorre que, diante dessa previsão, exsurge uma discussão doutrinária acerca da
necessidade ou não da exoneração, pois, como deflui do dispositivo acima, a vacância
decorrerá de alguma das situações elencadas nos seus incisos, ou seja, com base nas
hipóteses transcritas, dependendo do entendimento adotado, podem ser consideradas
situações completamente distintas, aplicáveis a casos diversos ou, então, se
confundem, muito embora ambas gerem os mesmos efeitos: a vacância de determinado
cargo público.

Nas lições de Cármen Lúcia Antunes Rocha4, a investidura em novo cargo público, além
de depender da aprovação em concurso público, pressupõe a exoneração do primeiro,
sendo a posse em outro cargo inacumulável uma das formas de vacância.

Em sentido diametralmente oposto, destaca-se a orientação de Paulo de Matos Ferreira


Diniz5, que postula a desnecessidade de exoneração, fazendo-se oportuna citação literal
de suas lições fundadas no estatuto funcional da Administração Federal, a Lei nº
8.112/90:

"O entendimento era o de que, no caso de nomeação de funcionário para outro cargo
dos quadros da administração, era imprescindível a expedição de decreto de
exoneração, verificando-se a vacância na data da respectiva posse em outro cargo. No
caso em que a nomeação ocorresse para outro Poder, quer da União, Estados ou
Municípios, cabia ao próprio servidor solicitar a sua exoneração.

(...)

O servidor público federal estável que obtiver aprovação em concurso para outro cargo,
deverá declarar esta sua condição e solicitar que seja declarado vago o cargo que ocupa
para tomar posse em outro cargo inacumulável. O órgão ou entidade expedirá portaria
declarando vago o cargo, mediante a seguinte expressão: por tomar posse em outro
cargo inacumulável, este servidor tomará posse no outro cargo, submetendo-se ao
estágio probatório. Caso o servidor não for aprovado neste estágio será exonerado,
também por portaria. O servidor solicitará sua recondução ao órgão ou entidade de
origem que a formalizará por portaria.

Estes procedimentos poderão ser simplificados. O servidor estável ao ser classificado


num concurso público para outro cargo, deverá declarar sua situação de ocupar cargo
inacumulável. Ao ser publicada a portaria de nomeação no novo cargo, o órgão de
pessoal de origem do servidor tomará conhecimento. À vista desta publicação, expedirá
ato de declaração de vacância com fundamento no inciso VIII do art. 33. Com esta
declaração publicada no Diário Oficial da União o servidor tomará posse no novo cargo.
Ao final do estágio probatório, o seu resultado será publicado. Caso o servidor não
obtenha aprovação, será exonerado. À vista da portaria de exoneração o servidor será
automaticamente reconduzido ao seu cargo, conforme dispõe o art. 29 desta Lei".

Extraímos do texto acima transcrito que, para este doutrinador, a vacância em virtude da
posse em outro cargo inacumulável está diretamente ligada à possibilidade de
recondução ao cargo anteriormente ocupado, o que ocorre através do art. 29 da Lei nº
8.112/90, portanto, somente é cabível no caso de servidor estável.

Retornando às preleções de Cármen Lúcia Antunes Rocha, ainda no que concerne ao


rompimento do vínculo entre o servidor e a Administração em virtude de sua posse em
outro cargo, destaca-se:

"Muitas leis (das diferentes unidades federadas) consideram hipótese de “vacância do


cargo” a “posse em outro cargo inacumulável” (por exemplo, art. 33, VIII, da Lei nº
8.112/90). É que a posse em outro cargo inacumulável configura típico caso de
exoneração do servidor do anterior, havendo seu desligamento da entidade pública, pelo
menos no que concerne ao vínculo com ela firmado em virtude do cargo de que agora se
afasta".6

Portanto, resta claro que a posse em outro cargo inacumulável faz cessar o vínculo que
o servidor mantinha com poder público, impondo-lhe no novo cargo o cumprimento de
novo estágio probatório para aquisição da estabilidade, cogitando-se, inclusive, não
lograr o êxito da sua aprovação.7

Impende ressaltar que essa situação gera um problema de cunho administrativo, em face
da recondução, que foi apontado por Cármen Lúcia Antunes Rocha, nas lições abaixo,
que refletem sua preocupação, ao asseverar:

"A regra em referência traduz situação administrativa grave: deixa solucionada,


aparentemente, uma questão jurídica, trazendo outras que conduzem a implicações
sérias. Assim, é que, por exemplo, tem-se caso em que o servidor exonera-se do cargo
que vinha ocupando para tornar-se titular de outro. O primeiro torna-se vago. E essa
vacância determina a realização de novo concurso para seu provimento. Com a
habilitação para o cargo comprova-se ao longo de três anos (para a magistratura três), o
servidor que tenha sido aprovado e esteja exercendo as funções daquele está em sua
condição regular. Se, entretanto, o primeiro servidor for declarado inabilitado e
reconduzido ao cargo, como ficará a situação do concursado público aprovado e que foi
nomeado e investiu-se no cargo que agora voltaria a ser exercido pelo reconduzido?"

Resta evidente pelo até então exposto que a discussão envolve uma análise minuciosa
das normas que regem a vida funcional dos servidores da Consulente, a exemplo do que
ocorre com o art. 29 do Estatuto do Servidor Público Federal, in verbis:

"Art. 29 Recondução é o retorno do servidor estável, ao cargo anteriormente ocupado e


decorrerá de:

I - inabilitação em estágio probatório relativo a outro cargo;

II - reintegração do anterior ocupante.

Parágrafo único. Encontrando-se provido o cargo de origem, o servidor será aproveitado


em outro, observando o disposto no artigo 30".

Com efeito, a recondução do servidor ao cargo de origem somente será possível se este
já houver cumprido os requisitos para assegurar a estabilização de seu vínculo com a
Administração (em relação ao cargo anteriormente ocupado, é óbvio).

Ilustrativamente, um terceiro entendimento é evidenciado pela Orientação Consultiva nº


036/98 – DENOR/SRH/MARE, constante do site do servidor do extinto MARE, segundo a
qual são cabíveis as duas formas de rompimento do vínculo, de modo que pode o
servidor ser exonerado, a pedido, ou, então, ser declarada a vacância do cargo que
ocupava.

De acordo com esse entendimento, não há outra distinção quanto às duas formas de
vacância senão em relação ao direito de gozar férias que, nos termos da Portaria nº 02,
de 14 outubro de 1998, somente será cabível para o caso de vacância em razão da posse
em outro cargo inacumulável, estando afastada, em face da ausência de previsão, em
caso de exoneração.

Note-se que nessa linha de orientação não há qualquer vinculação entre as formas de
vacância e a possibilidade de recondução plasmada no art. 29, inc. I, da precitada
legislação federal, sendo suficiente para sua configuração que o liame anterior tenha
sido estabilizado.

Importa, também, lembrar que somente será possível a recondução, conforme a previsão
legal, em caso de inabilitação em estágio probatório, se o novo cargo em que foi
nomeado o servidor pertencer à mesma esfera administrativa.

Outra importante observação a ser feita é a de que o servidor não dispõe do cargo que
ocupa, não lhe sendo, portanto, assegurado o direito de “requerer” a vacância do seu
cargo, pois essa é mera conseqüência fática e jurídica da incidência da hipótese
normativa. E, por conseguinte, não se trata de um direito subjetivo disponível do
servidor. Ao revés, a vacância existe no interesse da Administração, a quem incumbe
dispor sobre os cargos públicos da forma que melhor prestigiar o interesse público e,
está prevista em lei, como já ficou sobejamente demonstrado.

Destarte, a orientação que propugna a exoneração em quaisquer circunstâncias, para


que haja a vacância, independentemente de ser ou não estável o servidor, implica na
obrigatoriedade de formalização do ato sob esse rótulo (exoneração), para que possa
tomar posse no cargo para o qual foi nomeado, ou seja, afasta a possibilidade de
rompimento do vínculo pela mera posse.

Já para corrente doutrinária que defende a desnecessidade de exoneração, a simples


posse em outro cargo inacumulável seria suficiente para gerar a vacância, que seria
meramente declarada por portaria.

Ocorre que, nesse caso, a questão se biparte, não se verificando, também, quanto a esse
aspecto, uma unanimidade de pensamento, pois conforme o entendimento que relaciona
esta forma de vacância com a recondução somente poderá enquadrar-se, aos agentes
públicos municipais, fulcrado no inc. VIII, do art. 33, o servidor que tiver adquirido a
estabilidade em relação ao seu vínculo jurídico-funcional.

Reverso é o entendimento para os que propalam o entendimento de que não há qualquer


relacionamento entre a recondução e a posse do servidor em outro cargo inacumulável,
de modo que para esta corrente, poderia a vacância se dar pela exoneração ou
declaração de vacância do cargo após a posse do servidor no cargo novo, ainda que em
face da ausência de estabilidade.
3 CONCLUSÕES

Pelo exposto e respondendo objetivamente às indagações da Consulente, assevera-se


que a temática da vacância, posse em outro cargo ou emprego acumulável e
necessidade ou não de edição de ato exoneratório, passa necessariamente pela análise
e interpretação sistemática da legislação que rege a vida funcional dos servidores no
âmbito da Administração Consulente. Porém, uma coisa é certa, não se há de falar, no
caso concreto, em mera alteração de cargo, pois se parte da premissa que existe a
singularidade do plexo de atribuições ao novo cargo sendo este inacumulável com o
anterior. Do contrário, não faria o menor sentido o servidor prestar concurso para o
idêntico cargo e carreira na mesma esfera da Federação.

Na esteira desse raciocínio, firma-se entendimento de que a forma de vacância do cargo


em virtude da posse em outro cargo inacumulável está diretamente relacionada à
possibilidade de recondução do servidor e, portanto, pressupõe a estabilidade, não se
aplicando o inc. VIII do art. 33 da Lei Federal nº 8.112/90, ao servidor em estágio
probatório que foi aprovado em outro concurso público, devendo, seu vínculo com a
Administração, ser rompido pela exoneração.

Salvo melhor juízo, essa é a orientação da Consultoria Zênite, elaborada de acordo com
os subsídios fornecidos pela Consulente.

1
Orientação jurídica elaborada pelo Corpo de Consultores da Consultoria Zênite à
consulta formulada por assinante do IDAF cuja identificação foi propositadamente
omitida.
2
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos.
São Paulo: Saraiva, 1999, p. 247.
3
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 25 ed. São Paulo: Malheiros,
2000, p. 404.
4
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos.
São Paulo: Saraiva, 1999, p. 251.
5
DINIZ, Paulo de Matos. Lei nº 8.112/90 Regime jurídico único. 5 ed. Brasília: Brasília
Jurídica, 2000, p. 122.
6
Op. cit., p. 278.
7
Sobre essa assertiva, Cármen Lúcia Antunes Rocha assevera: “Essa regra vem a definir
a necessidade de estágio probatório para a estabilização do vínculo relativo a outro
cargo que não aquele ocupado. Ora, se é necessário estágio probatório e este é
cumprido exatamente para conferir a qualidade ao vínculo é que a lei considera que a
estabilidade tem substrato administrativo específico e não abstrato relativo ao serviço
público”, p. 251.

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Título:

Agentes
públicos

Estrangei
ro –
Acesso a
cargo,
emprego
ou
função
pública –
Considera
ções.

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 777/44/MAR/2005

PERGUNTA 7 - AGENTES PÚBLICOS

É possível que estrangeiro tenha acesso a cargos, empregos e funções públicas?

Na redação original do inc. I do art. 37 da Constituição, apenas era assegurado o


direito de acesso aos cargos, empregos e funções públicas aos brasileiros que preenchessem
os requisitos estabelecidos em lei, o que abrangia os natos e naturalizados. Originariamente, a
Constituição não autorizava o acesso de estrangeiros ao serviço público.

Essa regra foi atenuada com o advento da Emenda Constitucional nº 11/96 que, ao
introduzir dois parágrafos no art. 207 da Constituição da República, veio a permitir às
universidades e instituições de pesquisa científica e tecnológica a admissão de professores,
técnicos e cientistas estrangeiros, na forma da lei. No âmbito federal, esse dispositivo foi
disciplinado pela Lei nº 9.515/97.

A Emenda Constitucional nº 19/98, ao dar nova redação ao inc. I do art. 37 da


Constituição da República, finalmente, veio a garantir o direito de acesso também aos
estrangeiros na forma da lei.

Como se trata de norma que depende de regulamentação, para que seja possível que
estrangeiros tomem posse em cargo, emprego ou função pública, é indispensável a existência
de lei que regulamente a questão, a ser editada em cada qual das esferas federativas (União,
Estados, Distrito Federal e Municípios). Nesse sentido, já se pronunciou o STJ:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – NORMA QUE ASSEGURA O ACESSO DE


ESTRANGEIRO A CARGO PÚBLICO – ART. 37, INCISO I DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL –
EFICÁCIA LIMITADA – APLICABILIDADE MEDIATA – REGULAMENTAÇÃO IMPOSITIVA –
RECURSO DESPROVIDO.

I - O art. 37, inciso I da Magna Carta é norma de eficácia limitada e de aplicabilidade mediata ou
indireta. Logo, necessita que o legislador edite lei complementar ou ordinária, de modo a
assegurar a integração de sua eficácia, sem a qual o direito não pode ser exercido.

II - A regulamentação da circunstância pelo legislador ordinário em hipóteses como a presente não é


facultativa, mas impositiva. Isto significa dizer que o legislador encontra-se obrigado a emitir a lei e,
enquanto assim não o fizer, o direito reclamado não pode ser exercido.

III - No caso dos autos, a Lei nº 6.815/80, que define a situação jurídica do estrangeiro no Brasil, não
contém em seu bojo dispositivo referente ao procedimento pelo qual deve atravessar o estrangeiro, de
modo a permitir o exercício do seu direito de ocupar um cargo público no Brasil.

IV - Recurso desprovido. (Grifamos.) (STJ, ROMS nº 16923, Processo: 200301593882, 5ª Turma, Data
da decisão: 01.06.2004, DJ de 01.07.2004, Relator Min. Gilson Dipp).

Então, o acesso de estrangeiros a cargos, empregos e funções públicas somente será


possível se houver lei, editada no respectivo âmbito federativo, disciplinando o assunto. No
âmbito federal, por exemplo, a contratação de professores, técnicos e cientistas estrangeiros
por universidades e instituições científicas e tecnológicas é autorizada pela Lei nº 9.515/97.

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Título:

Agentes
públicos -
Exoneraç
ão a
pedido -
Ato
administr
ativo não
publicado
-
Reversão
-
Impossibi
lidade

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 1012/11/JUN/2002

PERGUNTA 1

Servidor público requer sua exoneração, porém antes da publicação do


ato solicita a revogação do pedido. Há algum óbice legal para que a
Administração Pública proceda à revogação, uma vez que o ato ainda não
foi publicado? Além desses aspectos, como devem ser consideradas as
faltas do servidor no período entre o pedido de exoneração até o eventual
retorno ao cargo?

RESPOSTA

É inquestionável que, assim como os demais atos administrativos que tenham, como
requisito de forma e de eficácia, a sua publicação na imprensa oficial, os efeitos do ato
de exoneração do servidor público somente são deflagrados após o atendimento do
princípio da publicidade. Então, a rigor, é possível cogitar-se da reversão do pedido de
exoneração antes desse momento.

Entretanto, o caso em tela traz peculiaridade que impede a aplicação dessa regra, pois o
servidor afastou-se de suas funções, sem aguardar a publicação do ato, agindo, assim,
de modo incompatível com a vigência do vínculo, considerando-se já alheio ao serviço
público. Diante disso (ao nosso ver), parece inevitável concluir que o rompimento
ocorreu de forma irreversível.

Vale lembrar que a exoneração a pedido do servidor depende unicamente de sua


manifestação de vontade. Dessa maneira, uma vez solicitada cabe à Administração
apenas concedê-la.

No plano fático, não pode ser afastada a possibilidade de que, arrependendo-se, o


servidor externe manifestação diversa daquela voltada para o desligamento do cargo,
requerendo sua permanência, e que a Administração revogue o ato já exarado, mas
ainda não publicado.

Contudo, é preciso que seu comportamento espelhe essa intenção, o que significa, entre
outros, praticar, ininterrupta, regular e satisfatoriamente, os atos necessários ao
desempenho de suas funções até o momento da devida publicação do ato de
exoneração.

Observe-se, aliás, que, se assim não for, a exoneração a pedido poderá motivar,
conforme o caso, a exoneração por ato da Administração ou até a pena de demissão,
cogitando-se da possibilidade de que desapareça o interesse em manter o servidor nos
quadros públicos, em conseqüência de sua própria conduta.

Pelo exposto, como o servidor se ausentou do cargo antes da publicação do ato de


exoneração, a manifestação de vontade foi concretizada através de sua conduta,
consolidando o rompimento do vínculo que mantinha com a Administração, o que
dependia, como acima mencionado, única e exclusivamente de seu querer.

Então, não se vislumbram meios de, nessa situação, reverter-se o pedido de exoneração.
A manutenção do servidor nos quadros da Administração implicará burla ao concurso
público, configurando afronta ao comando do art. 37, inc. II da Constituição da
República.

É necessário alertar, contudo, que, dada a complexidade, a matéria poderá comportar


entendimento diverso por parte da doutrina ou dos Tribunais.

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Título:

Exoneraç
ão a
pedido –
Imposiçã
o de
pagamen
to de
licença-
prêmio
não
gozada
pelo
servidor

Impossibi
lidade

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 661/43/FEV/2005


PERGUNTA 7 - EXONERAÇÃO

É possível que servidor público formule pedido de exoneração condicionando


seu desligamento ao pagamento de licença-prêmio não gozada?

A exoneração é o ato administrativo cuja finalidade é extinguir a relação funcional entre


o servidor e o Poder Público.

Cármen Lúcia Antunes Rocha, ao tratar do assunto, aduz que a “exoneração é o


desligamento do servidor dos quadros de entidade pública por vontade do próprio interessado
ou por vontade da Administração. Quanto à exoneração decorrente de ato unilateral do servidor
público, não se há de tecer maiores considerações por se dar como manifestação da liberdade
de escolha do trabalho ou emprego do interessado”.5

Logo, pode-se dizer que a exoneração a pedido do servidor depende unicamente de


sua manifestação de vontade. Por isso, não é possível que ele crie condições para que a
Administração venha a acatá-lo.

Uma vez solicitada a exoneração, cabe à Administração apenas concedê-la, sem estar
compelida a aceitar condições criadas pelo próprio servidor, já que foi ele mesmo que escolheu
se desligar do serviço público. Não poderá o servidor, então, formular pedido de exoneração
condicionando seu desligamento funcional ao pagamento de eventual licença-prêmio não
gozada. Sobre o assunto, o STJ já se pronunciou no seguinte sentido:

ADMINISTRATIVO – RECURSO ESPECIAL – MANDADO DE SEGURANÇA – SERVIDOR PÚBLICO –


PEDIDO DE EXONERAÇÃO CONDICIONADA AO PAGAMENTO DE LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA –
IMPOSSIBILIDADE.

1 - O pedido condicional de exoneração do cargo, formulado por servidor público, acentuado pela locução
conjuntiva, desde que, somente pode ser interpretado em relação ao pagamento daquilo que o impetrante
tem direito. Sendo reivindicadas verbas patrimoniais não amparadas por normas legais – pagamento de
licença-prêmio não gozada em pecúnia – exsurge o interesse máximo, qual seja, a exoneração para evitar
incompatibilidade com o cargo até então exercido.

2 - Um pedido de exoneração não pode ser condicional, porquanto a Administração Pública não está
sujeita a imposições feitas pelo servidor público. Os atos se revestem de princípios próprios, dentre os
quais não se encontra a possibilidade de condicionar a demissão, por parte daquele que a requer. Ao revés,
na espécie, a Administração agiu exatamente dentro do respeito à moralidade, à razoabilidade e à boa-fé, ao
editar o ato dentro dos parâmetros legais. Ausente, desta forma, qualquer direito líquido e certo a ser
amparado pela via mandamental.

3 - Recurso desprovido, mantendo-se a denegação da ordem. (Grifamos.) (Origem: STJ, Recurso Ordinário
em Mandado de Segurança nº 11561, Rel. Felix Fischer, Data da decisão: 28.04.2004, DJ de 25.10.2004, p.
365).

Pode-se concluir, então, que não é possível que servidor público formule pedido de
exoneração condicionando seu desligamento ao pagamento de licença-prêmio não gozada.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

5
ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos. São
Paulo: Saraiva, 1999. p. 444.

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Título:

Exoneraç
ão a
pedido -
Pedido de
readmisã
o
alegando
pertubaç
ão
psíquica
à época
do
pedido -
Impossibi
lidade de
readmiss
ão

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 379/40/NOV/2004

PERGUNTA 5 - EXONERAÇÃO

Determinado servidor pediu sua exoneração em abril deste ano. Dois meses depois
requereu sua readmissão, alegando que, à época que em que pediu a exoneração, estava
sofrendo de perturbação psíquica. Esse servidor poderá ser readmitido?

A exoneração é o ato administrativo que tem por finalidade extinguir a relação jurídico-
funcional entre o servidor e o Poder Público.

Pelo ato de exoneração ocorre o desligamento do servidor dos quadros do órgão ou


entidade pública a que estava vinculado, podendo ser levado a efeito em virtude de ato
voluntário do próprio interessado ou de ato da Administração.

Exoneração decorrente de ato unilateral do servidor é manifestação de sua liberdade


de escolha. Por isso, uma vez exonerado a pedido, a rigor, o servidor não poderá ser
readmitido no cargo que ocupava. A Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do
Planejamento, em resposta à consulta formulada, externou o seguinte posicionamento:

Ementa: Não cabe retorno de servidor exonerado a pedido em estágio probatório.

Ofício nº 71/2000/COGLE/SRH/MP

Brasília, 17 de abril de 2000

Senhora Diretora,

1. Em atenção ao Oficio nº 0l8/00-DRH de 27 de março de 2000, de interesse da servidora Palmira


Leão de Souza, informo, nos termos da Lei nº 8.112/90, em que pese os argumentos citados pela
interessada que culminaram com sua exoneração, a pedido, ainda em estágio probatório, que,
somente se inabilitada no referido estágio é que se procederia a exoneração de oficio e, se estável, no
cargo anteriormente ocupado, a ele seria reconduzida.

2. No caso, a exoneração se deu a pedido, não havendo amparo legal para retorno da interessada por
ser um ato considerado perfeito e acabado. 2

Assim, uma vez exonerado a pedido, por estar rompido o vínculo com o Poder Público,
o retorno ao serviço público dependerá de prévia aprovação em concurso de provas ou de
provas e títulos, nos termos do inc. II do art. 37 da Constituição da República.

A alegação de perturbação psíquica à época do pedido de exoneração, por si só, não


tem o condão de afastar a presunção de validade do ato de vontade proferido. A nulidade do
ato de exoneração poderia ser decretada caso houvesse decisão judicial declarando a
incapacidade do servidor para a prática dos atos da vida civil à época do pedido (Nota 1) ou que
reconhecesse a nulidade do ato de vontade do servidor em razão da existência de um dos
vícios de consentimento (erro, dolo, coação, lesão ou estado de perigo). (Nota 2)

Então, a rigor, servidor exonerado a pedido não poderá ser readmitido no cargo
anteriormente ocupado fundado na simples alegação de que na época do pedido estava
sofrendo de perturbação psíquica.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

2 Disponível em: <http:// www.servidor.gov.br>

(Nota
1)
O inc. III do art. 3º do Código Civil dispõe que são absolutamente incapazes de exercer
pessoalmente os atos da vida civil “os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir
sua vontade”.

O art. 185 do Código Civil estabelece que aos atos jurídicos lícitos, que não sejam
(Nota 2)

negócios jurídicos, aplicam-se, no que couber, as disposições legais concernentes aos


negócios jurídicos. O disposto no inc. II do art. 171 do Código Civil é compatível com a
realidade dos atos jurídicos unilaterais. Por isso, com base no inc. II do art. 171 do Código Civil,
é anulável o ato jurídico resultante de erro, dolo, coação, lesão ou estado de perigo.

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Título:

Servidor
público -
Exoneraç
ão a
pedido -
Rompime
nto de
vínculo
funcional
com a
Administr
ação -
Readmiss
ão -
Inafastab
ilidade de
concurso
público
PERGUNTAS E RESPOSTAS - 752/08/MAR/2002

PERGUNTA 1

É juridicamente adequado um servidor exonerado a pedido pleitear a


readmissão no cargo anteriormente ocupado?

RESPOSTA

Inicialmente, há que se ressaltar que a exoneração é o ato administrativo cuja finalidade


é extinguir a relação jurídico-funcional entre o servidor e o Poder Público.

Sobre a matéria, aduz Cármen Lúcia Antunes Rocha:1

“Exoneração é o desligamento do servidor dos quadros de entidade pública por vontade


do próprio interessado ou por vontade da Administração. Quanto à exoneração
decorrente de ato unilateral do servidor público, não se há de tecer maiores
considerações por se dar como manifestação da liberdade de escolha do trabalho ou
emprego do interessado”.

A partir dessa premissa – rompimento do vínculo funcional –, o servidor somente poderá


ingressar nos quadros de pessoal da Administração Pública através de concurso público
(art. 37, II, da Constituição da República), pois se está diante de provimento originário.

Celso Antônio Bandeira de Mello entende que o concurso público, entre outras coisas,
“propôs-se a impedir tanto o ingresso sem concurso, ressalvadas as exceções previstas
na Constituição, quanto obstar a que o servidor habilitado por concurso para cargo ou
emprego de determinada natureza viesse depois a ser agraciado com cargo ou emprego
permanente de outra natureza, pois esta seria uma forma de fraudar a razão de ser do
concurso público”.2

Em síntese, a aprovação em consurso público é o único meio de ser titular de cargo ou


emprego inicial da carreira na Administração Pública.

Da análise dos argumentos doutrinários anteriormente transcritos, é de se concluir que


o ato de exoneração, ainda que a pedido do servidor, configura o fim do vínculo com o
Poder Público e determina vacância no cargo público. Nesse sentido, o retorno do
servidor aos quadros da Administração, ressalvadas as hipóteses excepcionadas pela
Constituição, dar-se-á, inafastavelmente, mediante aprovação em concurso público.

Diante dos fundamentos esposados, assevera-se que a readmissão de servidor


exonerado a pedido não encontra amparo constitucional, na medida em que a
exoneração rompe o vínculo institucional entre o agente público e a Administração e o
novo ingresso no serviço público deve ser precedido de aprovação em concurso
público.

1
Cármen Lúcia Antunes Rocha, Princípios constitucionais dos servidores públicos, São
Paulo, Saraiva, 1999, p. 444.
2
Celso Antônio Bandeira de Mello, Curso de direito administrativo, 11ª ed., São Paulo,
Malheiros, 1999, p. 193 e 194. Ainda, sobre o assunto, afirma Hely Lopes Meirelles que “A
obrigatoriedade de concurso público, ressalvados os cargos em comissão e empregos
com essa natureza, refere-se à investidura em cargo ou emprego público, isto é, ao
ingresso em cargo ou emprego isolado ou em cargo ou emprego público inicial da
carreira na Administração direta e indireta”. In Direito administrativo brasileiro, 24ª ed.,
São Paulo, Malheiros, 1999, p. 387.

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Título:

Agentes
públicos -
Faltas -
Atestados
médicos -
Forma de
apresent
ação e
aceitação

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 466/05/DEZ/2001

PERGUNTA 2

Frente à constatação de faltas dos agentes penitenciários (em regime de


plantão) e do número de atestados que podem ser admitidos pela
Administração Pública, é possível proceder a desconto em folha de
pagamento dos dias faltados, sem motivo justificado, ressalvadas as
faltas por motivo de doença, devidamente comprovada, até trinta e seis
dias por ano e não mais de três dias por mês, que encontra amparo na
legislação em vigor? Como proceder em relação aos servidores em
regime de plantão de vinte e quatro por setenta e duas horas, uma vez
que inexiste outro dispositivo acerca do assunto? É cabível considerar
um único atestado médico para o servidor em regime de plantão, o que
equivaleria a três dias?

Tal indagação justifica-se pelo fato de que constantes apresentações de


atestados médicos (um para cada plantão) têm culminado com desfalque
nas equipes de trabalho de plantonistas nas unidades prisionais.

RESPOSTA

Inicialmente, é mister trazer a lume as disposições estatutárias sobre o tema:

“Art. 124. O funcionário perderá:


(...)

IV – o vencimento do dia, se não comparecer ao serviço, salvo motivo legal ou doença


comprovada, de acordo com o disposto neste Estatuto; (...)”.

Nesse aspecto, partindo do pressuposto de que realmente inexiste qualquer outra norma
regulamentar para a justificação de faltas para servidores em regime de plantão, declina-
se entendimento pela impossibilidade de rigorosa aceitação de um único atestado. Não
se vislumbra, portanto, que a Administração possa interpretar a legislação estatutária
atribuindo-lhe limites não prescritos objetivamente. Assim, se efetivamente as faltas por
motivo de doença não podem ultrapassar 03 dias por mês (conforme consta do art. 68,
XV, do Estatuto) haverá de existir norma específica para os servidores de plantão. Em
não havendo, segue-se a regra geral, ou seja, três dias por mês, podendo ocorrer, a
princípio, a apresentação de até três atestados (um para cada dia), conforme o caso, ou
apenas um atestado que sirva para justificar o número de dias limite para o afastamento.

A questão a ser enfrentada versa principalmente sobre a apresentação e aceitação de


atestados médicos, pois está ocorrendo o comprometimento da prestação do serviço
público decorrente do desfalque nas equipes de plantonistas nas unidades prisionais.
Nesse sentido, há que se buscar fundamentos na doutrina e na jurisprudência
administrativa.

Na seara da União, há previsão do denominado atestado de comparecimento e os


servidores que dele se utilizam, por exemplo, estão sujeitos à compensação de horário
no interesse do serviço. De qualquer forma, a Secretaria de Recursos Humanos do
Ministério do Planejamento adverte sobre validade e eficácia de tais atestados em
parecer exarado para o Ministério da Agricultura e do Abastecimento (orientação
consultiva em anexo).

O próprio Conselho Federal de Medicina1, através de “processo consulta” orienta que a


aceitação de atestados médicos é uma questão de legislação específica e “bom senso”.

Sendo certo que os servidores plantonistas vêm apresentando reiteradamente atestados


médicos para justificar a ausência ao trabalho de forma constante, é imperioso que tais
fatos sejam adequadamente apurados.

Alguns institutos jurídicos de Direito Administrativo podem servir de instrumento à


eventual responsabilização de agentes administrativos faltosos sem a real e motivada
comprovação. A sindicância é instrumento investigativo pelo qual são apuradas a
existência de infrações disciplinares e ou sua conseqüente autoria, por determinação da
autoridade que tiver ciência da irregularidade. Já o processo administrativo disciplinar
visa apurar a responsabilidade de servidor por infração praticada no exercício de suas
atribuições, ou que tenha relação com as atribuições do cargo em que se encontre
investido. Sua finalidade é o controle da conduta dos servidores públicos, o que parece
perfeitamente enquadrar-se ao caso em comento.

Assim, face aos argumentos anteriormente expendidos e considerando que os atestados


médicos podem ser contestados, desde que sejam emitidos com falta de lisura e perícia
técnica em favorecimento ou falsidade na sua elaboração, afigura-se razoável, no caso
concreto, a instauração de sindicância e processo disciplinar para apurar a veracidade e
as condições reais de saúde daqueles que se utilizam do referido expediente para
abonar as faltas ao serviço. Ademais, o procedimento administrativo poderá configurar a
necessidade de concessão de licenças mais condizentes com a enfermidade do servidor
ou, até mesmo, a sua aposentação por invalidez. A melhor jurisprudência sobre a
matéria recomenda, em processos dessa natureza, que o servidor seja submetido a
perícia médica para aferir o seu verdadeiro estado de saúde:

“1. Superior Tribunal de Justiça - MS 6952/DF; Mandado de Segurança (2000/0039736-9)

DJ Data: 02.10.2000 PG: 00137

JBCC Vol.: 00185 PG: 00220

(...)

5 - Segurança concedida para anular o ato demissionário, a fim de que a Comissão


Disciplinar submeta o Impetrante a novo exame médico pericial, atendendo-se à
necessidade da presença de psiquiatras gabaritados, justamente para avaliar os
diversos atestados médicos colacionados no procedimento administrativo, de modo a
concluir sobre o verdadeiro estado de saúde do mesmo”.

Assim, com fundamento nos aspectos expostos, conclui-se que: (i) a Administração
deverá providenciar regulamentação própria para os servidores em regime de plantão,
bem como sobre a apresentação e aceitação de atestados médicos, sem a qual não
poderá admitir apenas um atestado mensal, a não ser que sirva para justificar o número
de dias limite de afastamento ao trabalho, pois a norma geral prevê objetivamente a
possibilidade de ausência em até três dias por mês nesses casos; (ii) a utilização
constante e reiterada de atestados médicos para servidores plantonistas deve ser objeto
de profunda investigação acompanhada de exame médico pericial e, em se constatando
qualquer irregularidade, se impõe a instauração de competente processo disciplinar,
sem prejuízo de comunicabilidade das peças processuais ao Conselho Regional de
Medicina para as devidas providências legais e administrativas, se for o caso.

1
www.cfm.org.br

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Título:

Agentes
públicos -
Faltas -
Possibilid
ade de
compens
ação -
Requisito
s para
concessã
o-
Considera
ções

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 559/18/JAN/2003


PERGUNTA 5

Tendo em vista o inc. II do art. 44 da Lei nº 8.112/90, com redação dada pela Lei nº 9.527,
de 10.12.97, pode o servidor que precisa se ausentar do serviço determinado número de
dias, por razões de interesse particular, com a condição de compensar esses dias até o
mês subseqüente, mediante assinatura de algum “termo de compromisso”? Esse “termo
de compromisso” teria o condão de cobrar a compensação dos dias faltosos, que no
mês em que ocorreram foram abonadas em função de acordo de compensação a
posteriori?

RESPOSTA

As faltas justificadas e, portanto, abonadas estão previstas na Lei nº 8.112/90, em seu


art. 97. Estatui o referido dispositivo: "

"Art. 97 Sem qualquer prejuízo, poderá o servidor ausentar-se do serviço:

I - por 1 (um) dia, para doação de sangue;

II - por 2 (dois) dias, para se alistar como eleitor;

III - por 8 (oito) dias consecutivos em razão de :

a) casamento;

b) falecimento do cônjuge, companheiro, pais, madrasta ou padrasto, filhos, enteados,


menor sob guarda ou tutela e irmãos".

E, a par disso, impende verificar o que preconiza o art. 44 do mesmo diploma legal:

"Art. 44 O servidor perderá:

I - a remuneração do dia em que faltar ao serviço, sem motivo justificado; (Redação dada
pela Lei nº 9.527, de 10.12.97.)

II - a parcela de remuneração diária, proporcional aos atrasos, ausências justificadas,


ressalvadas as concessões de que trata o art. 97, e saídas antecipadas, salvo na
hipótese de compensação de horário, até o mês subseqüente ao da ocorrência, a ser
estabelecida pela chefia imediata. (Redação dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97.)

Parágrafo único. As faltas justificadas decorrentes de caso fortuito ou de força maior


poderão ser compensadas a critério da chefia imediata, sendo assim consideradas como
efetivo exercício. (Parágrafo incluído pela Lei nº 9.527, de 10.12.97.)" (Grifamos.)

Deflui da análise conjugada dos preceptivos legais acima transcritos que, como regra
geral, as faltas que não se enquadrem como ausências justificadas (hipóteses do art. 97)
implicarão em desconto na remuneração relativa aos dias em que o servidor não
comparecer ao serviço. E, em caráter excepcional, poderá a chefia imediata admitir a
compensação de faltas justificadas quando decorrentes de caso fortuito e força maior. 1

Por essa razão, não é admissível a hipótese de mero abono de ausências que não se
enquadrem nas situações descritas na Lei nº 8.112/90, isto é, a chefia imediata somente
poderá abonar a falta do servidor por motivos de interesse particular se essa puder ser
considerada decorrente de caso fortuito ou força maior.

No entanto, no presente caso, parece óbvio que se houve o “termo de compromisso”


para compensar os dias em que o servidor faltou, e tendo ele efetuado a compensação,
conclui-se que não há mais que se cogitar de descontos da remuneração relativos
àqueles dias.

Por outro lado, cabe destacar que não basta a assinatura do “termo de compromisso“ de
compensação no mês subseqüente ao das faltas, pois muito embora não haja previsão
legal quanto ao momento em que deva ocorrer a mencionada compensação, essa deve
ocorrer de fato.

Desse modo, não parece ser de fácil ou possível constatação se o fato de o acordo de
compensação se dar a posteriori, ou seja, depois das faltas estaria afastada a
possibilidade de seu ajuste. Além disso, os dias em que o servidor faltou, somente serão
considerados abonados depois de concretizada a compensação.

Urge frisar que a compensação, nesse caso, não é um direito subjetivo do servidor, pois
é concedida a critério da chefia imediata apenas quando decorrente de caso fortuito ou
força maior. O único caso previsto no Estatuto de compensação obrigatória é o de
servidores estudantes, que “estejam cursando o ensino regular, nas escolas oficiais,
desde que não seja possível conciliar o horário escolar e o da repartição.” 2

Outrossim, é de se mencionar que a Lei nº 8.112/90 é omissa quanto à formalização da


referida compensação, porém, não há como afastar, para fins de validade dos atos que
envolvem tal agir, que se dê através de ato formal da autoridade competente, após a
verificação da excepcionalidade da situação, com manifestação expressa do servidor
assumindo o mencionado compromisso de reposição.

Portanto, assevera-se que, em caso de falta ao serviço, sem que a situação se enquadre
em alguma das hipóteses legais de ausências, e se restar caracterizado o caso fortuito
ou a força maior, é facultado ao chefe imediato do servidor concordar com a
compensação de modo a evitar a perda da remuneração relativa aos dias respectivos
desde que demonstrada a situação excepcional.

1
O caso fortuito decorre de forças da natureza, tais como terremotos, inundações,
incêndio não provocado e, a força maior decorre de ações humanas, tais como guerras,
revoluções, greves e determinações de autoridades.
2
Parte do Parecer da SAF nº 161/91 – DOU, de 31.07.91, conforme nota de rodapé de
Paulo de Matos Ferreira Diniz, em comentário à Lei nº 8.112 (Lei nº 8.112, Regime
Jurídico Único, atualizada, comentada, manualizada, revisada e com acesso
informatizado).

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Título:
Servidor
Público -
Ausência
ao
trabalho -
Prisão -
Sentença
absolutóri
a-
Considera
ções

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 79/25/AGO/2003

PERGUNTA 1

Determinado servidor foi preso e, em virtude disso, não compareceu ao trabalho,


deixando assim de desempenhar as funções atinentes ao seu cargo. Contudo, foi
absolvido no processo criminal com fundamento no art. 386, inc. VI, do CPP. Desse
modo, poderá a administração abonar as faltas referentes ao período em que esteve
preso, tendo por fundamento a absolvição por falta de provas? Qual é o tratamento dado
ao assunto pela Lei nº 8.112/90?

RESPOSTA

O caso em tela incide, além do Código de Processo Penal, o Estatuto dos Servidores
Públicos da União e da interpretação sistemática desses diplomas legislativos extrair-se-
á as conseqüências jurídicas específicas.

Seguindo esta ordem de raciocínio, o art. 386, inc. IV, do Código de Processo Penal
determina que o juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde
que reconheça não existir prova suficiente para a condenação.

Já o Estatuto dos Servidores que, no seu art. 44, incs. I, II e parágrafo único, no que
concerne a faltas, dispõe:

"Art. 44 O servidor perderá:

I - a remuneração do dia em que faltar ao serviço, sem motivo justificado; (Redação dada
pela Lei nº 9.527, de 10.12.97.)

II - a parcela de remuneração diária, proporcional aos atrasos, ausências justificadas,


ressalvadas as concessões de que trata o art. 97, e saídas antecipadas, salvo na
hipótese de compensação de horário, até o mês subseqüente ao da ocorrência, a ser
estabelecida pela chefia imediata. (Redação dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97.)

Parágrafo único. As faltas justificadas decorrentes de caso fortuito ou de força maior


poderão ser compensadas a critério da chefia imediata, sendo assim consideradas como
efetivo exercício". (Parágrafo incluído pela Lei nº 9.527, de 10.12.97.) (Grifamos.)
Depreende-se dos dispositivos transcritos que faltas do servidor, ao trabalho, sem
motivo justificado ensejam a perda da remuneração do dia. Porém, se absolvido tem
direito a percebê-la em sua integralidade.

Entretanto, não há que se confundir aspectos remuneratórios tendo em vista a prisão do


servidor com o abono de faltas, pois nesta última hipótese podem ser consideradas
circunstâncias que conduzem à verificação de caso fortuito e força maior.

Sobre o tema, pronunciou-se a Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do


Planejamento1 através do seguinte expediente:

"Ofício Nº 153 DIORC/COGLE/DENOR/SRH

Brasília, 23 de outubro de 1997.

Senhor Coordenador-Geral,

Referimo-nos ao FAX, datado de 20 de outubro do corrente ano, solicitando orientações


sobre o que poderá ser alegado pelo servidor para justificar as faltas ao trabalho,
quando ocorrem nas situações previstas no parágrafo único do art. 44 da Lei nº 8.112/90,
que teve nova redação dada pela Medida Provisória Nº 1.573-12, de 26.10.97.

O Parágrafo Único, do artigo supracitado, dispõe que “as faltas justificadas decorrentes
de caso fortuito ou de força maior poderão ser compensadas a critério da chefia
imediata, sendo assim consideradas como efetivo exercício”.

De acordo com o vocabulário jurídico ambos os casos ocorrem por motivos alheios à
vontade do homem. No primeiro, a falta é justificada por um acontecimento imprevisível,
acidental, que não se pode prever ou impedir. Força maior é o fato que se prevê ou é
previsível, mas inevitável, visto que é mais forte que a vontade ou ação do homem".

O entendimento jurisprudencial inclina-se no sentido abaixo transcrito:

"Administrativo – Mandado de segurança visando assegurar matricula de universitário


após vencido o prazo para tal fim estipulado – Razão de força maior a justificar o não
comparecimento do impetrante – Estava o impetrante atendendo ao obrigatório
alistamento militar, comparecendo ao processo de seleção do exército, no mesmo
período fixado para matricula na universidade – Preso a tal compromisso, imposto
constitucionalmente como obrigatório (art. 143 da constituição vigente), e comprovado
nos autos, justifica-se o apelo ao motivo de força maior – A responsabilidade pela
ausência no dia da matricula não pode ser imputada ao universitário – Liminar e
sentença de 1 grau que determinavam a matricula na universidade, merecem
confirmação tornando definitiva a segurança – Decisão unânime que nega provimento à
apelação e a remessa oficial". (TRF 2ª Região - Processo 8902126811 - 3ª turma - Rel.
Juiz Celso Passos - DJU de 11.04.91.)

Os conceitos de caso fortuito e força maior estão presentes também na Teoria Geral do
Direito, e o tratamento dado pelo Código Civil de 1916, em seu art. 393 2, era o de que “o
devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se
expressamente não se houver por eles responsabilizado”. E, no seu no parágrafo único,
dispunha que “o caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos
efeitos não era possível evitar ou impedir”.

Deflui do texto legislativo transcrito que há equiparação das situações quanto ao núcleo
que lhes é comum, ou seja, que corresponde a eventos invencíveis, que refogem às
forças humanas, impedindo e impossibilitando o cumprimento da obrigação. 3

Da interpretação sistemática da Lei nº 8.112/90, o servidor absolvido em processo


criminal não pode suportar qualquer prejuízo funcional enquanto esteve preso na
situação ora sob exame, uma vez que não pode ser imputada ao servidor a ausência ao
trabalho, caracterizando circunstância invencível por absoluta impossibilidade de
comparecimento ao serviço público. Assim, as hipóteses de caso fortuito ou força maior
devem ser compreendidas além da noção tradicional de forças da natureza, mas também
devem considerar outros eventos, como pela jurisprudência colacionada acima
(obrigação constitucional) ou, no caso ora tratado, ato de autoridade no exercício da
função judiciária.

Destarte, à luz da Lei nº 8112/90, do entendimento da jurisprudência exposta, poderá o


administrador público, se assim entender, proceder à compensação das faltas ao serviço
público justificadas pelas circunstâncias de caso fortuito ou força maior. Nesse
contexto, em princípio, não há que se falar em consignação de faltas ao trabalho de
agente público por motivo de prisão e absolvido posteriormente no processo criminal,
porquanto a sentença absolutória é suficiente para justificar as suas ausências ao
trabalho, diante da total impossibilidade de comparecimento do servidor por motivos
alheios à sua vontade, decorrente de fato previsível ou imprevisível, mas, sem dúvidas,
inevitável.

1
Fonte: <http://www.servidor.gov.br>.
2
No Código Beviláqua (1916), a matéria era regulada pelo art. 1.058. Ressalte-se, tão-só,
que o novo Código Civil não promoveu grandes alterações a respeito dessa matéria. Em
verdade, o que houve, sim, foi uma mera readequação vernacular.
3
VENOSA, Silvio de Salvo. Curso de direito civil: teoria geral das obrigações e teoria
geral dos contratos. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 254. Alerta para a desnecessidade
de se distinguir o caso fortuito da força maior, alegando, para tanto, que seus efeitos são
análogos

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Título:

Agentes
públicos -
Gestante
-
Afastame
nto -
Insalubri
dade -
Exercício
de
função
pública
em outro
setor -
Possibilid
ade

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 1115/24/JUL/2003

PERGUNTA 1

Qual a correta interpretação a ser dada ao parágrafo único do art. 69 da Lei nº 8.112/90,
quando a servidora gestante é ocupante de cargo público especializado – dentista?
Poderá a Administração fazer com que ela exerça suas atividades em outro setor sem
incorrer em desvio de função. Seria o caso dessa servidora ser afastada do serviço
público enquanto durar a gestação e enquanto estiver amamentando?

RESPOSTA

Inicialmente, vale lembrar que o cargo público é o lugar da organização do serviço


público com denominação própria que define as funções ou atribuições e que fixa a
remuneração a ser percebida pelo agente público.

Já a função pública é a atividade em si mesma, ou seja, é a atribuição que a


Administração confere a cada cargo público. Desse modo, ressalta-se que todo cargo
público tem função e que deve ser preenchido por servidor efetivo, caso contrário,
poderia ser confundido com o cargo em comissão.

Como se observa, cada cargo é diretamente vinculado às funções que lhe são, por lei,
inerentes.

Nessa esteira, urge frisar que o ingresso nos quadros públicos ocorre, a rigor, através de
concurso público (art. 37, inc. II, da Constituição da República) para o preenchimento de
determinados cargos, expressamente identificados no respectivo edital de convocação.
À vista dos cargos a serem preenchidos, serão identificadas as condições necessárias
ao desempenho das respectivas funções e estabelecidas as condições para o ingresso.

É pressuposto lógico, então, que o servidor aprovado desempenhará as funções


relativas ao cargo para o qual concorreu e no qual será provido. Cogitada a hipótese
contrária, ter-se-á desvio de função que, pelo ordenamento jurídico nacional, é ilegal.

Não se concebe, no plano da validade, que o servidor provido em determinado cargo e


investido das correspondentes funções desempenhe outras, dele desvinculadas.

Feitas essas considerações preliminares, passa-se à análise do caso concreto, nesse


plano traz-se a lume o § único do art. 69 da Lei nº 8.112/90:

"Art. 69 (...)

Parágrafo único. A servidora gestante ou lactante será afastada, enquanto durar a


gestação e a lactação, das operações e locais previstos neste artigo, exercendo suas
atividades em local salubre e em serviço não penoso e não perigoso".

O parágrafo único é claro no que tange ao afastamento da gestante da sua função


quando trabalhe em local insalubre.
Nesse espectro, convém invocar a exceção legislativa com relação à caracterização de
desvio de função. O art. 117 da Lei nº 8.112/90 (Estatuto dos Servidores Federais), em
seu inc. XVII, disciplina que ao servidor é proibido cometer a outro servidor atribuições
estranhas ao cargo que ocupa, exceto em situações de emergência e transitórias, in
verbis:

"Art. 117 É proibido o servidor:

(...)

XVII - cometer a outro servidor atribuições estranhas ao cargo que ocupa, exceto em
situações de emergência e transitórias;" (Grifamos.)

Por outras palavras, os arts. 69 e 117, inc. XVII, da Lei nº 8.112/90, têm conteúdo de
aplicabilidade complementar no caso em tela e não são, por conseqüência, excludentes
entre si.

Há decisões do TRF 5ª Região, no sentido de considerar lícito que um servidor ocupe


outras funções (desvio de função) em situação emergencial e transitória, nos termos da
Lei nº 8.112/90 (AC nº 88.452 e AC nº 83.996).

À vista do exposto, muito embora exerça a servidora em questão função especializada –


dentista –, nada obsta que ela exerça durante o período de gestação e amamentação
função diversa daquela para qual ingressou nos quadros da Administração Pública, por
força do art. 117, inc. XVII, da Lei nº 8.112/90.

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Título:

Agentes
públicos -
Gestante
-
Aprovaçã
o em
concurso
público -
Licença-
maternid
ade -
Nomeaçã
o

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 746/20/MAR/2003

PERGUNTA 4

Determinada servidora pública que exerce cargo de provimento efetivo – atualmente está
afastada por estar em gozo de “licença-maternidade” – foi recentemente aprovada em
concurso público para provimento em outro cargo efetivo. Assim sendo, indaga-se: é
possível que a referida servidora seja chamada para assumir o cargo para o qual obteve
aprovação? E nesse caso, há possibilidade de ela tomar posse (ato solene) e continuar
em licença-maternidade, entretanto, em efetivo exercício do cargo após o término desse
período?

RESPOSTA

Cármen Lúcia Antunes Rocha assevera que, “em geral, a legislação prevê um período de
trinta dias, contados do ato da nomeação, para que ocorra a posse, salvo motivo de
força maior ou de causa justificada apresentado pelo nomeado e aceita pela
Administração Pública.”1

Nesse sentido, cita-se, exemplificativamente, previsão legal no âmbito da União:

"Art. 13 A posse dar-se-á pela assinatura do respectivo termo, no qual deverão constar
as atribuições, os deveres, as responsabilidades e os direitos inerentes ao cargo
ocupado, que não poderão ser alterados unilateralmente, por qualquer das partes,
ressalvados os atos de ofício previstos em lei.

§ 1º A posse ocorrerá no prazo de trinta dias contados da publicação do ato de


provimento.

§ 2º Em se tratando de servidor, que esteja na data de publicação do ato de provimento,


em licença prevista nos incisos I, III e V do art. 81, ou afastado nas hipóteses dos incisos
I, IV, VI, VIII, alíneas “a”, “b”, “d”, “e” e “f”, IX e X do art. 102, o prazo será contado do
término do impedimento”. (Grifamos.)

Art. 102 Além das ausências ao serviço previstas no art. 97, são considerados como de
efetivo exercício os afastamentos em virtude de:

(...)

VIII - licença:

a) à gestante, à adotante e à paternidade; (Grifamos.)"

Sob esse prisma, contendo o Estatuto dos Servidores Públicos Civis do Município
previsão semelhante, cumpre à Administração efetivá-la, permitindo que o prazo para a
posse da servidora que hoje goza de licença-maternidade somente tenha sua contagem
iniciada a partir do término de seu afastamento.

No entanto, inexistindo prescrição dessa espécie na lei municipal, caberá à


Administração agir consoante os princípios constitucionais e ao próprio regime jurídico-
administrativo que conformam sua atuação, em especial os princípios da legalidade e da
razoabilidade.

Em vista disso, e se tratando a licença-maternidade de um direito constitucionalmente


assegurado2, não parece adequando dar guarida ao fato de a Administração convocar a
servidora para tomar posse de cargo público enquanto ela ainda encontra-se em período
de licença-maternidade, devendo ser adotada solução semelhante à prevista no Estatuto
dos Servidores Públicos Civis da União.
Em frente à ausência de norma específica, recomenda-se que seja adotada solução
semelhante à prevista pela Lei nº 8.112/90, de tal sorte que o prazo para a posse da
servidora que hoje goza de licença-maternidade, somente tenha sua contagem iniciada a
partir do término de seu afastamento. 3

1
ROCHA, Cármén Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos.
São Paulo: Saraiva, 1999, p. 226.
2
Determina o inc. XVIII do art. 7º da Constituição da República:
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social:
(...)
XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento
e vinte dias;”.
3
Registre não estar a Consultoria Zênite orientando pela aplicação expressa, literal e
direta da Lei nº 8.112/90 – Estatuto dos Servidores Civis Federais –, uma vez que essa lei
não incide sobre a relação dos servidores com a Consulente – que deve possuir Estatuto
próprio, sob pena de ilegalidade, devendo apenas servir como parâmetro para a solução
do caso em tela.

Consulta em Destaque Imprimir

Título:

AGENTES
PÚBLICO
S-
GESTANT
E-
CARGO
EM
COMISSÃ
O-
EXONERA
ÇÃO -
NECESSI
DADE DE
MOTIVAÇ
ÃO DO
ATO

CONSULTAS EM DESTAQUE - 151/14/SET/2002

AGENTES PÚBLICOS – GESTANTE – CARGO EM COMISSÃO –


EXONERAÇÃO – NECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO DO ATO.
ORIENTAÇÃO JURÍDICA1

EMENTA: Servidores – Cargo em comissão – Gestante – Exoneração.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL: Art. 5º, inc. XVIII; art. 39, § 3º; e art. 10, inc. II, "b", do ADCT;
da Constituição da República.

1. A servidora ocupante de cargo em comissão, que seja gestante, não pode ser
exonerada apenas por estar grávida.

2. Caso ocorra exoneração desmotivada, ou motivada apenas na gravidez, essa


particular deverá ser indenizada, com o equivalente à remuneração relativa a até 5 meses
após o parto.

1 CONSULTA

"Pode gestante ocupante de cargo em comissão ser exonerada?"

2 FUNDAMENTAÇÃO

O ocupante de cargo em comissão é de confiança da autoridade que o nomeou. Esses


cargos são de livre nomeação e de livre exoneração, como regra. Entretanto, a
Administração, para expedir o ato de exoneração, deve motivá-lo, em face ao princípio
da motivação dos atos administrativos.

São vários os requisitos2 dos atos administrativos, como por exemplo a competência, a
forma, o motivo, a causa, etc. O atendimento desses requisitos serão importantes para a
verificação da perfeição e validade do ato.

Celso Antônio Bandeira de Mello entende que "a exigência de motivação dos atos
administrativos (...) há de ser tida como uma regra geral, pois os agentes administrativos
não são ‘donos’ da coisa pública, mas sim gestores de interesses de toda a coletividade,
esta sim, senhora de tais interesses." 3 (Grifamos.)

O autor ainda assevera que "se de ato discricionário se tratar, salvo alguma hipótese
excepcional, há de se entender que o ato não motivado está irremissivelmente maculado
de vício e deve ser fulminado por inválido." 4

Sobre a questão específica da exoneração dos comissionados, Cármen Lúcia Antunes


Rocha aduz:

"A qualificação do vínculo – estável ou precário – entre o servidor e a pessoa pública


condiciona a forma de seu desfazimento.

Não sendo ele juridicamente estável, tem-se que a extinção definida administrativamente
haverá de ser aperfeiçoada por ato unilateral, do qual conste, necessariamente,
motivação objetiva e pública quando se cuidar de ocupante de cargo provido por
comissionamento.

A motivação de qualquer ato administrativo é imprescindível, sem o que não há como


fazer o controle de sua validade jurídica. Daí por que se faz necessária a motivação,
mesmo nas hipóteses em que o exercício da competência contenha, pelo menos quanto
a algum dos elementos, parcela de discricionaridade, como se dá no ato administrativo
de exoneração".5 (Grifamos.)

Da doutrina citada, verifica-se que sendo o ato de exoneração um ato unilateral e


discricionário, esse ato, de qualquer forma, mesmo que seja para o caso de exoneração
de agente em cargo em comissão, deverá ser devidamente motivado, para que seja
considerado perfeito e válido.

No caso da servidora ocupante de cargo em comissão, a Administração, para que


exonere esse agente, deve motivar sua decisão, e não pode a causa ser a gravidez. De
qualquer forma, não há existência de direito da servidora em continuar no cargo em
comissão, por ser esse de confiança, mas, neste caso, essa deverá ser indenizada.

Note-se que a licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com duração de
120 dias, é um direito assegurado no inc. XVIII do art. 5º da Constituição da República a
todos os trabalhadores, inclusive para os servidores públicos, em face ao que dispõe o §
3º do art. 39 da CF:

§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII,
VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer
requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir. (Grifamos.)

O art. 10 do ADCT ainda dispõe, em seu inc. II, alínea "a", que até que seja promulgada
lei complementar, fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada
gestante, desde a confirmação da gravidez até 5 meses após o parto.

Sobre o tema da presente Consulta, o Superior Tribunal de Justiça já se posicionou (MS


nº 7393/DF),6 no sentido de que é "ilegal a demissão de servidora pública gestante,
desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto (ADCT, art. 37, inc. II,
‘b’)".

No corpo do voto do Relator, este alerta que, "em se tratando de cargo em comissão,
prevalece o comando da CF/88, art. 37, inc. II, quanto à liberdade de nomeação e
exoneração detida pela Administração. Não obstante (...) à falta de previsão legal
expressa quanto ao caso em exame, há que ser aplicado, aqui, o ADCT, art. 10, inc. II,
‘b’". (...) "Assim é que, ainda que ocupante de cargo em comissão, estava a impetrante
protegida por norma de caráter constitucional, aqui efetivamente ofendida".

O mesmo é o posicionamento em outra decisão do STJ (ROMS 3313/SC): 7

"I - A impetrante foi nomeada para exercer cargo em comissão. Alega que foi exonerada
simplesmente por estar gravida. O impetrado, em suas informações, ao fazer a defesa do
ato impugnado, não alegou nenhuma razão para a exoneração. Restou, assim, claro que
o motivo foi a gravidez.

II - Ainda que não haja norma expressa para proteger a recorrente, pode-se-lhe aplicar,
por força do art. 5. da Constituição, dispositivos constitucionais relativos ao trabalhador
em geral (art. 7., inc. XVIII, combinado com o art. 10, inc. II, "b", do ADCT).

III - Recurso ordinário conhecido e parcialmente provido para que a recorrente, que não
tem direito a permanecer no cargo, seja paga uma indenização equivalente a
remuneração que ela teria em 5 (cinco) meses a contar da gravidez". (Grifamos.)
Nesse segundo posicionamento do STJ, apenas não concordamos que a indenização
tenha que ser relativa aos 5 meses a contar da gravidez, uma vez que o art. 10, inc. II,
alínea "b", do ADCT, dispõe sobre a vedação da dispensa arbitrária ou sem justa causa
da gestante, "desde a confirmação da gravidez até 5 meses após o parto".

Informamos que o TRF 1ª Região (AC 340002517848 , AC 010008639579 , AC 0139753110 )


também já se posicionou pela aplicação do art. 10, inc. II, alínea "b", do ADCT, em
situação semelhante ao caso concreto da presente Consulta.

3 CONCLUSÕES

Diante de todo o exposto, respondendo objetivamente à presente Consulta, entendemos


que a servidora ocupante de cargo em comissão, que seja gestante, não pode ser
exonerada apenas por estar grávida.

Caso ocorra exoneração desmotivada, ou motivada apenas na gravidez, essa particular


(gestante) deverá ser indenizada, com o equivalente à remuneração relativa a até 5
meses após o parto.

Salvo melhor juízo, essa é a orientação da Consultoria Zênite, elaborada de acordo com
os subsídios fornecidos pela Consulente.

Orientação jurídica elaborada pelo Corpo de Consultores da Consultoria Zênite à


consulta formulada por assinante do IDAF cuja identificação foi propositadamente
omitida
2
Também chamados pela doutrina de elementos ou mesmo pressupostos.
3
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 13. ed. São Paulo:
Malheiros, 2001. p. 359.
4
Autor e obra citados, p. 360.
5
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos.
São Paulo: Saraiva, 1999. p. 445.
6
Mandado de Segurança nº 2001/0014371-7, Rel. Min. Edson Vidigal, 3ª Seção, de
12.12.01, DJ de 25.02.02, p. 197.
7
ROMS nº 1993/0020554-4, de 28.11.94, DJ de 20.03.95, p. 6.144, Rel. Min. Adhemar
Maciel, 6ª Turma.
8
“Constitucional – Servidora pública comissionada – Gestante – Precedentes.
I - Servidora pública, ainda que ocupante só de cargo em comissão (em Princípio
demissível ad nutum), não pode ser dispensada sem justa causa durante a gravidez,
posto que amparada pelo art. 71, I, da Constituição e art. 10, II, b, do ADCT. Precedentes.
II - Não merece qualquer reparo o decisum, quanto aos juros de mora, posto que em
consonância com a jurisprudência desta Corte.
II - Negado provimento aos apelos e à remessa, tida como interposta.”
9
“Constitucional e Administrativo - Cargo em comissão de secretário parlamentar -
Servidora gestante dispensada sem motivação – Direito à licença-maternidade e às
parcelas relativas ao 13º salário e às férias – art. 7º, VIII, XVII e XVIII, c/c art. 39, § 3º, da
CF/88 - art. 12, I, g, da Lei nº 8.212/91 c/c arts. 71 e 72 das Lei nº 8.213/91 e 95 do Decreto
nº 357/91.
I - Servidora gestante, ocupante de cargo em comissão de Secretário Parlamentar, regida
pela Lei nº 8.112/90 e dispensada sem motivação, tem direito à licença-maternidade e às
parcelas relativas ao 13º salário e às férias, por força das disposições do art. 7º, VIII, XVII
e XVIII, da CF/88, aplicáveis aos servidores públicos, por força do art. 39, § 3º, da mesma
Carta.
II - Ocupando a autora cargo em comissão, sem vínculo efetivo com a União, está
obrigatoriamente vinculada ao Regime Geral de Previdência Social, previsto na Lei nº
8.213/91, não se lhe aplicando o art. 207 da Lei nº 8.112/90, mas o art. 71 da Lei nº
8.213/91 c/c art. 95 do Decreto nº 357/91, fazendo jus ao salário-maternidade, cujo ônus
deve ser suportado pela União, ante a extinção da relação de trabalho, por dispensa
imotivada (art. 95 do Decreto nº 357/91).
III - Indevida a condenação ao pagamento de aviso prévio e de diferenças relativas ao
FGTS, por não se tratar, in casu, de empregado regido pela CLT.
IV - Apelação improvida.
V - Remessa oficial parcialmente provida.”
10
“Constitucional – Servidora pública e comissionada – Gestante.
I - Servidora pública ainda que ocupante só de cargo em comissão (em princípio
demissível ad nutum) não pode ser dispensada sem justa causa durante a gravidez,
posto que amparada pelo art. 7º, I, da Constituição e art. 10, II, “b”, do ADCT.
II - Negado provimento ao apelo e à remessa.”

Consulta em Destaque Imprimir

Título:

AGENTES
PÚBLICO
S-
GESTANT
E-
TITULAR
DE
CARGO
EM
COMISSÃ
O-
POSSIBIL
IDADE
DE
DEMISSÃ
O AD
NUTUM -
LICENÇA-
MATERNI
DADE -
PAGAME
NTO DO
BENEFÍCI
O
PREVIDE
NCIÁRIO

CONSULTAS EM DESTAQUE - 725/20/MAR/2003


AGENTES PÚBLICOS – GESTANTE – TITULAR DE CARGO EM COMISSÃO
– POSSIBILIDADE DE DEMISSÃO AD NUTUM – LICENÇA-MATERNIDADE
– PAGAMENTO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.

ORIENTAÇÃO JURÍDICA1

EMENTA: Agentes públicos – Cargo em comissão – Licença-maternidade – Exoneração e


Estabilidade provisória – Considerações – Contrato temporário.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL: Arts. 7º; 39, § 3º e 41 da Constituição da República; art. 10 do


Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; arts. 15, 71 e 73 da Lei nº 8.213, de 24
de julho de 1991.

1. Cargo comissionado. Precariedade. Licença-maternidade. Exoneração. Possibilidade.


Estabilidade provisória. Inexistência.

2. Cargo Comissionado. Exoneração. Licença-maternidade. Pagamento de benefício


previdenciário.

1 CONSULTA

A Consulta compõe-se dos seguintes aspectos:

“Servidora ocupante exclusivamente de cargo em comissão, afastada para licença


gestante, de acordo com o regime geral da previdência social (§ 13 do art. 40 da CF/88.),
a partir de 01.12.2002. Pergunta-se: pode esta servidora ser exonerada, juntamente com
todos os demais servidores comissionados do Estado em 31.12.2002? Em caso positivo,
como se dará a compensação prevista no art. 72 da Lei nº 8.213/91? A quem caberá o
ônus pela extinção da relação de trabalho – ao Estado ou ao INSS?”

2 FUNDAMENTOS LEGAIS E DOUTRINÁRIOS

De plano, parte-se da premissa de que a servidora em questão rege-se pelo regime


estatutário, pois ela é titular de um cargo em comissão. Desta feita, é preciso verificar
quais são os direitos constitucionais equivalentes aos dos empregados, extensivos aos
servidores públicos, por força do art. 39, § 3º, da CF/88:

"Art. 39 (...)

§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII,
VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer
requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.”

Nesse sentido, as normas protetivas dos trabalhadores que são extensivas aos
servidores públicos são:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social:

(...)

IV - salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas


necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação,
saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes
periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para
qualquer fim;

VII - garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração
variável;

VIII - décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da


aposentadoria;

IX - remuneração do trabalho noturno superior à do diurno;

XII - salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos


termos da lei;

XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro
semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante
acordo ou convenção coletiva de trabalho;

XV - repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos;

XVI - remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta por


cento à do normal;

XVII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o
salário normal;

XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento
e vinte dias;

XIX - licença-paternidade, nos termos fixados em lei;

XX - proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos


termos da lei;

XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e
segurança;

XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de


admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil".

De outra parte, o direito de proteção contra despedida arbitrária da empregada gestante


está consagrado no art. 7º, inc. I e no art. 10, inc. II, “b”, do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias:

"Art. 7º (...)
I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos
termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros
direitos;

Art. 10 Até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o art. 7º, I, da
Constituição:

II - fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa:

b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o


parto".

Da análise sistemática das disposições constitucionais transcritas, é possível constatar


que, em princípio, aos servidores públicos não se aplica o prescrito no art. 7º, inc. I, pois
quando o Constituinte pretendeu estender direitos sociais a determinada classe de
trabalhadores o fez de forma expressa e inequívoca. Em síntese, o instituto da
estabilidade provisória aplica-se apenas a empregados contra despedida arbitrária e sem
justa causa e não a servidores estatutários que já gozam de estabilidade após o período
de estágio probatório.2

Com relação ao cargo em comissão, recorda-se que é de livre provimento, podendo dele
dispor o administrador, posto que é de caráter provisório e sua exoneração é ad nutum,
por óbvio, nunca adquirindo estabilidade

A criação, na estrutura administrativa, de cargos de confiança pode ser – e no mais das


vezes o é – permanente, porém a precariedade relaciona-se à sua forma de provimento,
pois quem os exerce não adquire direito à continuidade na titularidade do cargo
comissionado ou da função comissionada. Portanto, no caso concreto – servidora
comissionada em licença gestante –, não parece haver à livre nomeação ou exoneração
dos cargos de confiança.

No mesmo sentido, e exemplificativamente, é o entendimento da Secretaria de Recursos


Humanos do Ministério do Planejamento no âmbito da Administração Federal:

"Ofício nº 375/99-COGLE/SRH

Brasília, 27 de outubro de 1999.

Senhora Coordenadora-Geral,

1. Faço referência a mensagem dessa procedência, de 14 de outubro de 1999, pela qual


Vossa Senhoria solicita manifestação deste Órgão, sobre a possibilidade de exoneração
de função comissionada, quando a servidora está usufruindo de licença gestante.

2. A Decisão nº 606/99/TCU-Plenário, publicada no Diário Oficial de 13 de setembro de


1999, baseia-se em Orientação Consultiva deste órgão, COGLE/DENOR/SRH/MARE, de
16 de novembro de 1998, a qual, com fundamento no art. 3º da Emenda Constitucional nº
19, de 05 de junho de 1998, entende que não é ilegal a exoneração de servidor ocupante
de cargo em comissão em licença para tratamento de saúde. Assim, aquela Egrégia
Corte de Contas manifestou-se pela legalidade da exoneração e a respectiva suspensão
dos valores a partir do momento da dispensa.

3. Na Emenda Constitucional nº 19, promulgada em 05 de junho de 1998, o inc. II, do art.


37 da Constituição Federal de 1988 passou a vigorar com a seguinte redação:

Art. 37 (Omissis)

(...)

(...)

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em


concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a
complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as
nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

4. Portanto, é flagrante a instabilidade do cargo comissionado, independente do nível


hierárquico. Assim, o mesmo critério aplicado ao servidor afastado em virtude de licença
para tratamento de saúde, pode ser aplicado à servidora gestante, em razão do contido
no Despacho exarado por este órgão, no sentido de que não há óbice legal para que os
respectivos exercentes, demissíveis ad nutum, sejam exonerados durante o período em
que se encontrarem sob o amparo dos licenciamentos previstos na Lei nº 8.112, de 11 de
dezembro de 1990.

5. Pelo exposto, a Decisão nº 606/99/TCU-Plenário, acima citada, corrobora o


entendimento deste órgão, que em razão da instabilidade do exercício da referida função
de confiança, não há óbice legal para a exoneração de servidor, mesmo que se encontre
afastado em licença para tratamento de saúde.

6. Finalmente, por via de conclusão, em razão da instabilidade da função de confiança, o


mesmo entendimento, de que o cargo é de livre nomeação e exoneração e que não há
estabilidade na função de confiança, aplica-se à servidora que está usufruindo de
licença gestante".

A jurisprudência também se posiciona pela hipótese de inaplicabilidade das disposições


constitucionais referentes à estabilidade provisória de servidora ocupante apenas de
cargo em comissão. Todavia, recepciona a possibilidade de indenização, conforme o
caso. Senão, vejamos:

"Administrativo e Constitucional – Secretário Parlamentar do Senado Federal –


Reintegração como servidor público estável do Senado Federal – Impossibilidade – Art.
19, § 2º, do ADCT da CF/88 – Art. 243, § 2º, da Lei nº 8.112/90 – Indenização pelo art. 10,
inc. II, “b”, do ADCT da CF/88 – Impossibilidade.

I - Segundo a melhor doutrina, cargo ou emprego em comissão é aquele que só admite


provimento em caráter provisório, sendo a função desempenhada precariamente, pois
quem o exerce não adquire o direito à continuidade na função, sendo exonerável ad
nutum.

II - Sendo a autora contratada, em 01.02.87, sob o regime da CLT, para a função de


Secretário Parlamentar, para exercer função de confiança no gabinete do senador que a
indicou, ficando sujeita a dispensa por solicitação do parlamentar ou ao final do
mandato, caso não reeleito o senador, caracteriza-se como ocupante de função de
confiança, restando excluída da estabilidade extraordinária prevista no art. 19 do ADCT
da CF/88, seja porque, não exercia a aludida função de confiança há, pelo menos, 5
(cinco) anos continuados, em 05.10.88, seja porque aquele dispositivo constitucional, em
seu § 2º, excluiu, do alcance da estabilidade ali prevista, “os ocupantes de cargos,
funções e empregos de confiança ou em comissão”, e também “aqueles que a lei declare
de livre exoneração, cujo tempo de serviço não será computado para os fins do caput
deste artigo, exceto se se tratar de servidor”. Precedente do STJ.

III - Tendo sido a função de confiança da autora, no regime da CLT, transformada em


cargo em comissão, por força do art. 243, § 2º, da Lei nº 8.112/90, subsistiu, no novo
regime, a índole de provisoriedade e precariedade do cargo de confiança, demissível ad
nutum, não se aplicando à autora, por força do princípio de legalidade, inscrito no art. 5º,
inc. II, da CF/88, o disposto no art. 10, inc. II, “b”, do ADCT da CF/88, que apenas se
aplica à empregada gestante e à dispensa arbitrária ou sem justa causa – hipóteses que
não se encontram provadas nos autos.

IV - Apelação improvida. (TRF – 1ª Região – AC n° 01000167684 – 2ª Turma – Rel. Juíza


Assusete Magalhães – DJ 30.08.2001).

Constitucional e Administrativo – Mandado de Segurança – Cargo em comissão –


Gestante – Exoneração – Falta de Motivação do Ato Administrativo no sentido de que a
exoneração se deu por outra razão que não a da gravidez – Inexistência de direito a
permanecer no cargo, que é de Confiança – Direito, contudo, a uma indenização
equivalente a cinco meses de remuneração, a contar da gravidez – Invocação de normas
protetivas da própria Constituição para o trabalhador in genere (Arts. 5º, §§ 2º e 7º, inc.
XVIII, e 10, inc. II, alínea “b”, do ADCT). Recurso Ordinário Conhecido e Provido.

I - A impetrante foi nomeada para exercer cargo em comissão. Alega que foi exonerada
simplesmente por estar grávida. O impetrado, em suas informações, ao fazer a defesa do
ato impugnado, não alegou nenhuma razão para a exoneração. Restou, assim, claro que
o motivo foi a gravidez.

II - Ainda que não haja norma expressa para proteger a recorrente, pode-se-lhe aplicar,
por força do art. 5º da constituição, dispositivos constitucionais relativos ao trabalhador
em geral (art. 7º, inc. XVIII, combinado com o art. 10, inc. II, “b”, do ADCT).

III - Recurso ordinário conhecido e parcialmente provido para que a recorrente, que não
tem direito a permanecer no cargo, seja paga uma indenização equivalente à
remuneração que ela teria em 5 (cinco) meses a contar da gravidez. Indexação,
cabimento, indenização, gestante, dispensa, cargo em comissão, cumprimento,
estabilidade provisória, obediência, disposições constitucionais transitórias.
Inexistência, direitos, permanência, cargo. Voto vencido, legalidade, dispensa. (STJ –
ROMS nº 3313 – 6ª Turma – Rel. Min. Juiz Adhemar Maciel.)"

Vencida a questão que enseja a possibilidade de exoneração de servidora ocupante de


cargo em comissão afastada para licença gestante, cumpre esclarecer que não existe
mais a compensação pela atual redação do art. 72 3, da Lei nº 8.213/91, in verbis:

"Art. 72 O salário-maternidade para a segurada empregada ou trabalhadora avulsa


consistirá numa renda mensal igual a sua remuneração integral. (Redação dada pela Lei
nº 9.876, de 26.11.99.)"

No que diz respeito ao ônus pela extinção da relação de trabalho, a redação do art. 71 da
Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, com as alterações da Lei nº 9.876, de 26 de
novembro de 19994, confere o benefício de salário-maternidade à segurada da
Previdência Social, durante cento e vinte dias.

Muito embora a Lei nada comente a respeito de o benefício ser concedido somente
enquanto durar a relação de emprego, o Regulamento da Previdência Social, aprovado
pelo Decreto nº 3.048/99, em seu art. 97, assim o determina. 5

Entretanto, a Previdência Social estendeu a licença-maternidade também ao contribuinte


individual e à segurada facultativa quando da publicação da Lei nº 9.876/99, desde que
observada a carência de dez contribuições mensais.6

Com a publicação do art. 240 da Instrução Normativa MPAS nº 71, de 17 de dezembro de


2002, o próprio INSS admitiu que esta carência pode ser vertida de recolhimentos
previdenciários feitos em categorias diferenciadas, caso não se tenha perdido a
qualidade de segurado.7

Face ao exposto, entendemos que a Previdência Social continua com a obrigatoriedade


de efetuar o pagamento do benefício de salário-maternidade à segurada, ainda que a
servidora ocupante de cargo exclusivamente em comissão venha a ser exonerada.

3 CONCLUSÕES

Diante de todo o exposto e respondendo objetivamente às indagações da Consulente,


assevera-se, em síntese:

a) É possível a exoneração de servidora investida exclusivamente em cargo


comissionado mesmo afastada para licença gestante, não sendo aplicável o art. 5º, inc.
II, da CF/88, e o disposto no art. 10, inc. II, “b”, do ADCT da CF/88, porquanto ocupante
de cargo de livre nomeação e exoneração em que não se vislumbra estabilidade
provisória;

b) Nos termos da atual redação do art. 72 da Lei nº 8.213/91 não há compensação, uma
vez que a licença maternidade é custeada diretamente pelo INSS e não mais pelo
empregador; e

c) Considerando ser o benefício do salário-maternidade devido a toda segurada, quer na


qualidade de empregada, quer na qualidade de contribuinte individual ou facultativa, e
considerando ainda ter a própria Previdência Social admitido que a carência do benefício
em questão pode ser vertida de recolhimentos previdenciários feitos em categorias
diferenciadas, desde que a beneficiária não tenha perdido a qualidade de segurada,
entende-se ser da Previdência Social o ônus pelo pagamento do benefício de salário-
maternidade, ainda que se dê a exoneração.

Salvo melhor juízo, essa é a orientação da Consultoria Zênite, elaborada de acordo com
os subsídios fornecidos pela Consulente.

1
Orientação jurídica elaborada pelo Corpo de Consultores da Consultoria Zênite à
consulta formulada por assinante do IDAF cuja identificação foi propositadamente
omitida.
2
Contudo, é preciso verificar se não consta norma de proteção à servidora
comissionada gestante contra despedida arbitrária ou sem justa causa no âmbito da
Administração Consulente.
3
Redação anterior: “Art. 72 O salário-maternidade para a segurada empregada ou
trabalhadora avulsa consistirá numa renda mensal igual à sua remuneração integral e
será pago pela empresa, efetivando-se a compensação quando do recolhimento das
contribuições, sobre a folha de salários. Parágrafo único. A empresa deverá conservar
durante 10 (dez) anos os comprovantes dos pagamentos e os atestados
correspondentes para exame pela fiscalização da Previdência Social”.
4
Art. 71 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, com as alterações da Lei nº 9.876, de 26
de novembro de 1999: “O salário–maternidade é devido à segurada da Previdência
Social, durante cento e vinte dias, com início no período entre vinte e oito dias antes do
parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na
legislação no que concerne à proteção à maternidade, sendo pago diretamente pela
Previdência Social.”
5
Art. 97 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048, de 06 de
maio de 1999: “O salário-maternidade da empregada será devido pela previdência social
enquanto existir a relação de emprego”.
6
Redação do inc. III do art. 25 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, na redação da Lei
nº 9.876, de 26 de novembro de 1999: “Art. 25 A concessão das prestações pecuniárias
do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência,
ressalvado o disposto no art. 26: III - salário-maternidade para as seguradas de que
tratam os incs. V e VII do art. 11 e o art. 13: dez contribuições mensais, respeitado o
disposto no parágrafo único do art. 39 desta Lei”.
7
Art. 240 da Instrução Normativa MPAS nº 71, de 17 de dezembro de 2002: “A carência do
salário-maternidade para a segurada contribuinte individual e facultativa é de dez
contribuições mensais, ainda que os recolhimentos a serem considerados tenham sido
vertidos em categorias diferenciadas e desde que não tenha havido perda da qualidade
de segurado”.

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Título:

PAGAME
NTO DE
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AÇÃO,
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AGENTES
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CONSULTAS EM DESTAQUE - 540/06/JAN/2002

PAGAMENTO DE GRATIFICAÇÃO, POR MUNICÍPIO, A AGENTES


PÚBLICOS ESTADUAIS E FEDERAIS – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA
REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS – INCONSTITUCIONALIDADE –
CONSIDERAÇÕES.

ORIENTAÇÃO JURÍDICA.1

EMENTA: Município – Gratificação a agentes públicos de outra esfera da Federação –


Inconstitucionalidade – Convênio – Possibilidade.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL: Arts. 21, 22, 24, 144 e 241 da CF/88.

1. O município não poderá custear despesas com pessoal de outra esfera da Federação
– agente público policial civil e militar, mesmo que a título de gratificação, sob pena de
incorrer em vício de constitucionalidade;

2. No entanto, é possível a realização de convênios com o Estado onde o município


poderá arcar com parte das despesas operacionais de segurança pública.

O Consulente pergunta, em síntese, se o pagamento de pró-labore ou gratificação a


policiais pelo município, através de lei, enquadra-se na despesa de pessoal civil (Lei
Complementar 101). Isso não daria acumulação remunerada a eles? Em tempo,
encaminha o projeto de lei que pretende estabelecer o aludido benefício a policiais civis
e militares, acompanhado de uma minuta de convênio.

Inicialmente, é preciso enfrentar o tema proposto em seus diversos aspectos


constitucionais, administrativos e no que se refere à eventual incidência em matéria de
responsabilidade fiscal, se for o caso.

1 Aspectos Constitucionais – Repartição em matéria legislativa.

A Constituição de 1988 adota certa configuração para a repartição em matéria de


competência legislativa entre os entes federativos. Assim, à União Federal e aos
municípios o constituinte reservou competências expressas, deixando a cargo dos
Estados-membros as chamadas competências residuais ou remanescentes.

Vejamos os dispositivos constitucionais referentes à segurança pública – polícia civil e


militar:

“Art. 21. Compete à União:

(...)
XIV - organizar e manter a polícia civil, a polícia militar e o corpo de bombeiros militar do
Distrito Federal, bem como prestar assistência financeira ao Distrito Federal para a
execução de serviços públicos, por meio de fundo próprio;”.

“Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

(...)

XXI - normas gerais de organização, efetivos, material bélico, garantias, convocação e


mobilização das polícias militares e corpos de bombeiros militares;

XXII - competência da polícia federal e das polícias rodoviária e ferroviária federais;”

“Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente
sobre:

(...)

XVI - organização, garantias, direitos e deveres das polícias civis”.

“Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é


exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do
patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I - polícia federal;

II - polícia rodoviária federal;

III - polícia ferroviária federal;

IV - polícias civis;

V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.

§ 1º. A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido
pela União e estruturado em carreira, destina-se a:

I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens,


serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas,
assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou
internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;

II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o


descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas
respectivas áreas de competência;

III - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras;

IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.

§ 2º. A polícia rodoviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e
estruturado em carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das
rodovias federais.

§ 3º. A polícia ferroviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e
estruturado em carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das
ferrovias federais.

§ 4º. às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem,


ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de
infrações penais, exceto as militares.

§ 5º. às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública;


aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a
execução de atividades de defesa civil.

§ 6º. As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do


Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos
Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

§ 7º. A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela


segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades.

§ 8º. Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de


seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.

§ 9º. A remuneração dos servidores policiais integrantes dos órgãos relacionados neste
artigo será fixada na forma do § 4º do art. 39”.

Da análise do regramento constitucional, dessume-se que a competência para legislar


em matéria de segurança pública (polícia civil e militar) é privativa da União em certos
casos e, concorrentemente, com estados e Distrito Federal noutros, à exceção, por
óbvio, da manutenção das guardas municipais, cuja competência é exclusiva dos
municípios.

José Afonso da Silva2 observa com propriedade o assunto:

“Os constituintes recusaram várias propostas no sentido de instituir alguma forma de


polícia municipal. Com isso, os Municípios não ficaram com nenhuma específica
responsabilidade pela segurança pública. Ficaram com a responsabilidade por ela na
medida em que sendo entidade estatal não podem eximir-se de ajudar os Estados no
cumprimento dessa função. Contudo, não se lhes autorizou a instituição de órgão
policial de segurança e menos ainda de polícia judiciária”.

No mesmo sentido e trazendo à colação importante jurisprudência sobre o tema, aduz


Alexandre de Moraes:3

“O art. 144, § 6º, da Constituição Federal localiza as polícias militares e os corpos de


bombeiros militares como forças auxiliares e reserva do Exército, subordinando-os,
juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e
dos Territórios”.4

Por fim, a Constituição Federal concedeu aos municípios a faculdade, por meio do
exercício de suas competências legislativas, de constituição de guardas municipais
destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei,
sem, contudo, reconhecer-lhes a possibilidade de exercício de polícia ostensiva ou
judiciária.

Assim sendo, o município, por ter competência exclusiva e suplementar discriminada,


caracterizada pelo princípio da predominância do interesse local, não pode atuar além da
seara delimitada pela Constituição, sob pena de invadir a competência da União e dos
estados, colocando em risco o pacto federativo.

Cumpre ressaltar que existem vários Projetos de Emenda Constitucional (PEC) na


Câmara dos Deputados, cujo teor é a criação de Guardas Municipais ou mesmo a
assunção, pelos municípios, de suas polícias civis e militares. Entre esses projetos, que
visam alterar o artigo 144 da CF, encontram-se os PECs 240/2000, 284/2000 e 317/2000
respectivamente dos Deputados Rubens Furlan (PPS), Rubem Medina (PFL) e Francisco
Garcia (PFL). No entanto, como já exaustivamente ressaltado, a ordem jurídica vigente
impõe à União e, concorrentemente, aos estados a responsabilidade exclusiva pela
manutenção das polícias civis e militares, não podendo tal matéria ser objeto de tratativa
municipal, embora se reconheça a existência de uma profunda crise institucional
generalizada em segurança pública.

2 Agentes Públicos – Sistema remuneratório – Acumulação, vantagens e gratificações.

O Consulente faz referência, em seus questionamentos, à eventual possibilidade de


pagamento de benefício de natureza remuneratória a policiais civis e militares lotados no
município, externando sua preocupação em relação à incidência de acumulação de
cargos. A questão não é tão simples como pode aparentar, pois o projeto de lei
municipal institui o referido benefício através de gratificações.

Lembre-se, ainda, que o inciso XVI do art. 37 da CF/88 impõe como regra geral a vedação
da acumulação remunerada de cargos e apresenta as exceções sujeitas à
compatibilidade de horários, quais sejam:

a) dois cargos de professor;

b) um cargo de professor com outro técnico ou científico;

c) dois cargos privativos de médico.

Portanto, ainda que fosse constitucionalmente possível (o que não é o caso) para a
situação concreta diante da repartição em matéria legislativa, parece inquestionável a
conclusão de que um policial civil não pode estar vinculado com o Estado, seguindo o
seu regime jurídico e, ao mesmo tempo, com a esfera municipal, submetido a outro
regime jurídico e atado funcionalmente a dois entes federativos, com regimes diversos.

De outra parte, as gratificações são as vantagens pecuniárias concedidas em face de


condições extraordinárias do serviço ou do servidor: (i) de serviço - são as vantagens
que têm como intuito compensar os riscos ou ônus decorrentes da execução de
serviços comuns, prestados de forma excepcional, tais como: trabalho noturno,
extraordinário, insalubre, perigoso, fora da sede, etc. Somente são pagos enquanto o
servidor estiver prestando o serviço nas aludidas condições. Portanto, não se
incorporam automaticamente; (ii) pessoais - são devidas em razão da situação individual
do servidor, como, por exemplo, pela existência de família, faz jus ao salário família,
enquanto tiver filhos menores ou maiores incapazes sob sua dependência. Por óbvio,
não se incorporam ao vencimento do servidor, perdurando enquanto subsistir a situação
que lhe deu ensejo.
Ora, na esteira do mesmo entendimento relativo à acumulação, ressalvadas novamente
as questões de ordem constitucional, em hipótese alguma se vislumbra a possibilidade
de instituir o benefício da gratificação a servidores de outra esfera da Federação para o
exercício de suas atribuições precípuas, no caso, a policiais civis e militares, para o
desempenho de funções insculpidas e disciplinadas pela legislação estatutária estadual.

No mesmo sentido, é a decisão do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo quanto ao


pagamento de benefícios a servidores de outras esferas de Governo:

“Tribunal de Constas de São Paulo

Número do Processo: 2372/026/95

Processo Referência: 2372/999/95 - 2372/124/95 - 37021/999/96

Decisão: TC 2372/026/95

Ata da 33ª Sessão Ordinária da Primeira Câmara, realizada em 17.9.96

“A egrégia câmara decidiu emitir parecer favorável à aprovação das contas da prefeitura
e mesa da câmara, exceção feita aos atos pendentes de apreciação por este tribunal. A
margem do parecer, determinou seja oficiado ao senhor prefeito, transmitindo-se
recomendações no sentido de que regularize as falhas existentes nos itens
almoxarifado, bens patrimoniais, documentação da despesa (publicação de atos oficiais;
hospedagem do senhor prefeito e secretário de obras; pagamento de taxa anual da OAB;
fracionamento de despesa; falta de prévio empenho; despesas ocorridas em exercício
anterior e despesas com moradia de autoridades), licitações e contratos e pessoal
(pagamento de pró-labore), e recomendando-se, especificamente, o cumprimento das
instruções nº 01/90 e a suspensão do auxílio-moradia concedido a servidores de outras
esferas de poder. (Grifo nosso.)

(...)”.

É mister lembrar que os servidores aos quais fossem deferidos tais benefícios, única e
exclusivamente por estarem lotados no município consulente, estariam em posição de
desigualdade, em face daqueles que estão, como eles, inseridos na mesma carreira, em
relação à referida vantagem. Tal desigualdade não encontraria fundamento de fato e de
direito que a embasasse, motivo pelo qual deve ser reputada ilegal por ostensiva afronta
aos princípios constitucionais da isonomia (art. 5º, ver inciso) e o da impessoalidade,
disposto no art. 37, caput, da CF/88.

Superados os ditames constitucionais (se fosse possível), restaria verificar o regime


remuneratório dos agentes policiais civis e militares. Isso porque o § 9º do art. 144 da
CF/88 dispõe que a remuneração dos servidores policiais integrantes dos órgãos
relacionados ocorrerá na forma de subsídio (§ 4º do art. 39) e essa é fixada em parcela
única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de
representação ou outra espécie remuneratória. Portanto, ainda que fosse instituída a
gratificação ou pró-labore5 pretendido pelo Consulente, os destinatários da norma não
poderiam na prática, em regra, desfrutá-los.

3 Convênios – uma possibilidade.

É preciso reconhecer o esforço do município consulente no sentido de tentar contribuir


para a melhoria das condições de segurança pública aos seus administrados. Diante de
todos os obstáculos apontados no presente estudo, resta-nos verificar se realmente
existe alguma possibilidade de a municipalidade estabelecer algum tipo de mecanismo
que possa vir a auxiliar a polícia civil e a militar na sua circunscrição.

Veja-se a esse respeito o que dispõe o artigo 241 da Constituição Federal:

“A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de lei os


consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados,
autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou
parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços
transferidos”.

Nesse caso, através de convênios, poderá ser feita a repartição dos encargos para que
dois entes, por exemplo, usufruam dos serviços de segurança pública que, como
sabemos, são indivisíveis e meritórios, do ponto de vista econômico. Dessa forma
parece justo que o estado e o município criem estes chamados “convênios de
cooperação”.

4 Conclusão.

Diante das considerações acima expendidas, em síntese, conclui-se que:

1. O município não poderá custear despesas com pessoal de outra esfera da Federação -
agente público policial civil e militar -, mesmo que a título de gratificação, sob pena de
incorrer em vício de constitucionalidade, estando sujeito a questionamento por parte
dos órgãos de controle interno e externo e do Poder Judiciário, inclusive no tocante à
medida excepcional de supressão temporária da autonomia através da intervenção.

2. Essa premissa é anterior e tem preferência aos limites de gastos com pessoal,
definidos a partir do artigo 19 das LRF. Ou seja: não poderá ocorrer esse tipo de
despesa, portanto, não há classificação definida para ela.

3. Uma alternativa para esse caso, previsto no artigo 241 da CF, é a realização de
convênios com o Estado. Tais convênios somente poderão ocorrer a partir de
autorização legislativa nos textos das leis orçamentárias.

Salvo melhor juízo, essa é a orientação da Consultoria Zênite, elaborada de acordo com
os subsídios fornecidos pelo Consulente.

1
Orientação jurídica a consulta formulada por assinante do IDAF cuja identificação foi
propositadamente omitida, elaborada pela Consultoria Zênite.
2
Curso de direito constitucional positivo, Ed. Malheiros, 16ª ed., São Paulo, 1999, p. 755-
756.
3
Direito constitucional, Ed. Atlas, 8ª ed., São Paulo, 2000, p.624.
4
STF – “Distrito Federal: polícia civil e militar: organização e manutenção da União:
significado. Ao prescrever a Constituição (art. 21, XIV) que compete à União organizar e
manter a polícia do Distrito Federal – apesar do contra-senso de entregá-la depois ao
comando do Governador (art. 144, § 6º) – parece não poder a lei distrital dispor sobre o
essencial do verbo manter, que é prescrever quanto custará pagar os quadros de
servidores policiais: desse modo a liminar do Tribunal de Justiça local, que impõe a
equiparação de vencimentos entre policiais – servidores mantidos pela União – e
servidores do Distrito Federal parece que, ou impõe a este despesa que cabe à União ou,
se a imputa a esta, emana de autoridade incompetente e, em qualquer hipótese, acarreta
risco de grave lesão à ordem administrativa” (RTJ 165/500).
5
O pró-labore é designação típica de remuneração da iniciativa privada, não sendo
nomenclatura adequada para aproveitamento dos agentes públicos.

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Título:

Agentes
públicos -
Gratificaç
ão (pró-
labore) -
Caráter
indenizat
ório

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 64/13/AGO/2002

PERGUNTA 2

O “pró-labore” tem natureza jurídica salarial ou indenizatória? Caso a


resposta seja salarial, caberia então horas extras?

RESPOSTA

As gratificações de serviços (pró-labore) caracterizam-se por sua natureza indenizatória,


haja vista o fato de que estas somente são concedidas em razão do servidor vir a
executar serviços em condições anormais (acréscimo de serviços ou riscos na sua
execução).

Diogenes Gasparini esclarece que:

"A gratificação de serviço é outorgada ao servidor a título de recompensa pelos ônus


decorrentes do desempenho de serviços comuns em condições incomuns de segurança
ou salubridade, ou concedida para compensar despesas extraordinárias realizadas no
desempenho de serviços normais prestados em condições anormais. Assim são as
gratificações concedidas em razão de serviços realizados com risco de vida e saúde,
como são os trabalhos médicos e os correlatos prestados aos aidéticos; as outorgadas
em função de serviços extraordinários, como são os prestados fora da jornada de
trabalho; as atribuídas pelo exercício do trabalho em certas zonas, como é o do
professor em zona rural; as concedidas em razão de trabalhos realizados em comissões
e bancas, como são os prestados nas comissões de licitação e nas bancas
examinadoras; as atribuídas em razão da prestação de serviços fora da sede, como são
os trabalhos de auditorias".

Percebe-se, pois, que a percepção da gratificação perdura enquanto o servidor estiver


executando o serviço que a ensejou, haja vista se constituir esta em uma retribuição
pecuniária propter laborem.

Assim, conclui-se que não há que se falar em horas extras, na medida em que a
gratificação por serviço extraordinário consiste na recompensa ao servidor que executa
serviços fora de sua jornada regular.

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Título:

Agente
público -
Servidor
estatutári
o-
Tempo
de
serviço
prestado
às Forças
Armadas
-
Gratificaç
ões
específica
s-
Rompime
nto do
vínculo -
Pretensã
o de
manter
as
gratificaç
ões antes
incorpora
das -
Impossibi
lidade

PERGUNTAS E RESPOSTAS - 1062/33/ABR/2004

PERGUNTA 2

Determinado servidor protocolou requerimento com o objetivo de incluir,


na remuneração que percebe atualmente, gratificação de função
incorporada à época em que era servidor militar (Ministério da
Aeronáutica), exercendo a atividade de controlador de tráfego aéreo.
Trata-se do cômputo de parcela da “Gratificação de Compensação
Orgânica”, prevista no art. 18, inc. VI, da Lei nº 8.237, de 30.09.1991. 1
Pode-se atender ao pleito, uma vez que a vantagem foi incorporada à
remuneração do servidor quando ocupava outro cargo e sob regime
jurídico diverso do seu vínculo neste momento, que é o da Lei nº
8.112/90? Saliente-se que o servidor deixou as Forças Armadas em 1992
e, de imediato, ingressou, mediante concurso público, no Poder
Judiciário.

RESPOSTA

Aplicam-se à questão os seguintes diplomas legais:

Lei nº 8.112/90:

Art. 100 É contado para todos os efeitos o tempo de serviço público federal, inclusive o
prestado às Forças Armadas.

Lei nº 8.237/91 anterior à sua revogação pela Medida Provisória nº 2.215-10, de 31.08.2001:

Art. 13 O direito à remuneração em atividade cessa, quando o militar for desligado do serviço
ativo das Forças Armadas por:

I - anulação de incorporação, desincorporação, licenciamento ou demissão;...

Da análise da legislação transcrita, conclui-se que o ato de desligamento do serviço militar


equivale a um rompimento de vínculo com as Forças Armadas. Sob esse prisma é que deve
ser analisado o caso concreto. Ao deixar a Aeronáutica (salvo situação específica prevista na
legislação militar) e ingressar no serviço público civil, o ex-militar se sujeita ao regime jurídico
estatuído pela Lei nº 8.112/90, sob novo sistema remuneratório e que prevê apenas a
contagem de tempo de serviço prestado às Forças Armadas para todos os fins. Porém, não há
qualquer previsão legal ou motivação que sustente a incorporação de gratificação
concedida sob a égide de regime diverso (militar), sobretudo em se tratando de um
benefício concedido face às peculiaridades assumidas no exercício de determinadas e
específicas atribuições (compensação de desgastes orgânicos – controle de tráfego aéreo).

O rompimento do vínculo, a princípio, não poderia acarretar a continuidade de percepção da


gratificação decorrente de outro regime jurídico administrativo (neste caso, o militar), a não ser
que houvesse dispositivo legal determinando as verbas que poderiam, eventualmente, ser
incorporadas à futura remuneração, ou, em sentido diverso, que a legislação que rege a atual
relação funcional admitisse a incorporação.

Não fossem os argumentos traçados suficientes para o indeferimento do pedido de


incorporação de função sob análise, ainda se poderia verificar se o alegado direito (se existisse
apenas por hipótese) poderia ser pleiteado diante o instituto da prescrição, contido no art. 110
da Lei nº 8.112/90:

Art. 110. O direito de requerer prescreve:

I - em 5 (cinco) anos, quanto aos atos de demissão e de cassação de aposentadoria ou


disponibilidade, ou que afetem interesse patrimonial e créditos resultantes das relações
de trabalho; (Grifamos.)
Em vista da situação concreta, aparentemente o servidor requerente não tem direito à
pretensão formulada, isso porque já teriam operado os requisitos da prescrição, na medida em
que a extinção do vínculo militar e ingresso no serviço público civil ocorreu há mais de dez
anos.2

O tempo de serviço prestado às Forças Armadas é computado para todos os fins (como
aposentadoria). Todavia, o direito à continuidade de recebimento de valores decorrentes de
gratificações concedidas com base em regime diferente daquele que incide sobre o vínculo
jurídico-funcional e remuneratório do servidor público, no momento presente, somente seria
possível se houvesse permissivo legal que o autorizasse.

Sublinha-se, por fim, que se vencidos os aspectos de cunho material apontados, não poderia
deixar de ser aventada a prescrição da pretensão, porque decorreram mais de 10 anos entre o
rompimento da relação jurídico-funcional com o serviço militar e início no Poder Judiciário.

1
A finalidade da referida gratificação é “compensar os desgastes orgânicos conseqüentes das
variações de altitude, das acelerações, das variações barométricas, dos danos
psicossomáticos e da exposição a radiações resultantes do desempenho continuado das
atividades especiais seguintes: (...) VI – controle de tráfego aéreo”.

2
Nessa esteira, traz-se, ainda, à luz, o princípio da segurança jurídica, o qual não se encontra
expresso no ordenamento jurídico pátrio, mas representa essência do próprio Direito. É o
princípio da segurança jurídica que define as situações, conferindo estabilidade às relações
interpessoais reguladas pelo ordenamento jurídico. Como bem se sabe, para um fato “A” a
norma estabelece uma conduta “B”. Assim, não se admitiria discutir indefinidamente
circunstâncias relativas ao convívio social, passando essas a se solidificarem a partir de
determinado tempo. Os institutos da prescrição e da decadência refletem expressão justamente
a aplicação desse vetor relacionado com a estabilidade das situações. Celso Antônio Bandeira
de Mello aborda o tema em questão: “Ora bem, é sabido e ressabido que a ordem jurídica
corresponde a um quadro normativo proposto precisamente para que as pessoas possam se
orientar, sabendo, pois, de antemão, o que devem ou o que podem fazer, tendo em vista as
ulteriores conseqüências imputáveis a seus atos. O Direito propõe-se a ensejar uma certa
estabilidade, um mínimo de certeza na regência da vida social. Daí o chamado princípio da
‘segurança jurídica’, o qual, bem por isto, se não é o mais importante dentro dos princípios
gerais de Direito, é, indisputavelmente, um dos mais importantes entre eles. Os institutos da
prescrição, da decadência, da preclusão (na esfera processual), do usucapião, da
irretroatividade da lei, do direito adquirido, são expressões concretas que bem revelam esta
profunda aspiração à estabilidade, à segurança, conatural do Direito”. (BANDEIRA DE MELLO,
Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 13. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2001. p.
93.)

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