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Paginas: 34 DOMINANTES E DOMINADOS Pragmatismo de Maquiavel Dentro daquels reflexéo sobre o campo, faltou esticar um pouquinho a ideia da ética, né? Entio, € claro, que se voce imaginar que num primeiro momento voc tem um fulano chamado Plato, né? E que no final das contas o que é que Plato vai nos ensinar? Que, é, o certo 0 errado da vida e da convivéncia dependem de idgias que transcendem a vida e, portanto, sto ideias absolutes, quer dizer, nio sio relativas a nada, e, portant, o que ¢ justiga ¢ justiga cinco séculos antes de Cristo, como hoje, como em Assunclo no Paraguai, em Vladivostok, para burgueses ¢ proletarios, bichas e tarados, nao importa, nao é relativo a nada, né? Perspectiva, entio, de um mundo ideal, no €? & de um mundo sensivel onde os problemas apsrecem. Se voc€ imaginar que ele vai pari um discipulo, que é mais um aluno do que um discipulo, que vai propor que os problemas étices do cotidiano, eles devem ser regidos por uma harmonia césmica, né? Colocar-se em harmonia com um universo, vocé percebe que dagui pra cé, &,2 referéncia baivou de degrau né? Por qué? Porque isso aqui, o mundo das ideias, se caracteriza por qué? Pelo fato de no depender, no é? Dos encontros materiais, né? O mundo das ideas transcende a matéria. Ora, esse cosmos grego, espécie de mundo harménico que nos convida a que nos harmonizemos com ele, esse cosmos grego ja € o mundo da materia. Entéo a referéncia € uma referéncia transcendente em relagéo ao homem, mas imanente em relacgo ao mundo. Aqui € transcendente em relacZo a0 homem e em relaco ao mundo. Entdo, descemos um degrau. Aristoteles, digamos, nos prope uma referénci, ¢ ética mais proxima de nds Vento venta, maré mareia, o sapo sapeia, eu dou aula € vocé assisti a minha aula, e tudo em ordem, né? Jd ti mais proximo de nés do que uma certa definicdo de justica ser buscada, né? A ser buscada, Ai vocé temo pensamento cristo. De certa maneira, o Deus cristBo, né? Ele vai nos oferecer arreferéncia pros problemas éticos do cotidiano, porque Deus tem uma missdo pra nds; Deus nos deu talentos. Deus, entdo, tem, digamos, uma relacdo conosco € conversando com Ele podennos clescobrir o que Fle quer pra nds e podemos, de certa forma, mobilizar os nossos talentos em busca do que Ele espera de nds. Entéo vocé percebeu, esse Deus ai, a gente tinha descido um degrau, a gente volta a subir um degrau, mas ai Deus mandou Seu filho, ai, de certa maneira, esse Deus mais Cristo, é, Cristo “tangibiliza” um pouco, né? Essa referéncia ética de que tanto precisamos. Ora, quando chega na modernidade a reflexda sobre o certo ¢ sobre o errado vai depender mais de nds do que dependeu em outros momentos. E aqui poderiamos fazer um inventério de propostas. Comecemos por Maquiavel. E é claro, o que é que Maquiavel vai nos ensinar? A acdo é boa quando voc# alcanga o que quer. Em outras palavras, a acgo € boa em fungao do seu efeito, né? Eu, Clovis, o que eu quero? A gldria. Isso tranquilamente. A gléria é 0 meu fim. Fim de finalidade. — Ah, osenhor nao pensa nos seus alunos? Nunca A no ser como instrumento para a minha giéria, entendeu? Porque é vocé que me aplaude € no ha gloria sem o aplauso do outro. Sdisso. — Nao, mas o senhor ndo gosta de mim, assim? Enquanto me aplaudir, eu gosto. — Nao é possivel, vocé no ta falando a verdade. Foda-se. Aqui ¢ Maquiavel. Entdo a.acéo vale pelo seu efeito. Ora, o que € que define o efeito em relacdo acdo? Ta fora, he he. Td fora. O efeito ta fora. O efeito nfo é aco. Entéo, quer dizer, uma coisa é a minha aula outra coisa &a tua alegria, Entdo, vocé percebeu que, de certa maneire, nds continuamos com uma referencia que transcende a vida, porque depende dos efeitos eventuais, né? Entdo, eis ai o pragmatismo de Maquiavel: s6 pode viver bem quem consegue 9 que quer. Ta perfeito? 56 pode viver bem quem consegue o que quer. Portanto aquele que quer uma coisa nio consegue nfo pode dizer que viveu bem, né? Eu quero a gldria, a minha aula é boa se me der 4 gloria. Age bem aquele que consegue o que quer. Claro, um profissional da politica quer 0 poder, sendo nao é profissional da politica. Entéo, 0 profissional da politica governa bem quando aumenta o poder que tem. E vocé dira: “E eu?”. Voce conta como o meio. Se a tua alegria for condicao pra ele aumentar o poder, entdo ele tentard te alegrar, seno nao, porque o jogo da politica € o jogo do poder. = Ah, mas eo bem comum? © bem comum nao tem nenhuma relevancia a ndo ser como meio para aumentar 0 poder, porque o que o profissional da politica quer é o poder. E gozado como alguns de vocés me alham estranho. Nao devem fazer assinatura de jornal. Assine um jornal, né? Isso vai te ajudar a dar razo a Maquiavel, Ou vocé ndo percebeu ainda que a Unica coisa que o profissional ds politica quer é o poder? Entdo, é claro, quando ele alcanca o poder, ele agiu bem, quando ele nfo alcanca o poder, ele agiu mal, Isso pode parecer estranho, mas é assim. Pragmatismo de Maquiavel: bom quando ganha, é ruim quando perde. Ficou claro? Dificil de engolir. Proposta de Maquiavel: é bom quando ganha. TO insistindo nisso, porque eis ai slguma coisa que ajuda a entender o que nds estamos querendo discutir. Fifi. Esse ¢ o pragmatismo. Utilitarismo, pragmatismo e intencionalismo Naturalmente, isso aqui, na hora que voce diz: “Eu agi bem quando conquistei o que eu queria’, a pergunta &: O outro, resposta: Meio para a vitoria. Isso produz um desconforta enorme, né? Como é que o outro pode ser meio, apenas meio, prs eu conseguir 0 que eu quero? Entdo, naturalmente, surge aqui o pensamento utilitarista. Quer dizer, bom, mais ou menos contemporaneg: Mill, né? Bentham... E 0 que eles vio dizer? A ago € boa, mas no porque eu me dei bem. Nao. A aco é boa porque ela teve como efeito a felicidade do maior numero. De nova, @ felicidade do maior numero esta na acdo? Nio, 18 fore. O criterio continua transcendente, né? Olha sd, mundo das ideias: cosmos, Deus, vitdria de quem age e alegria do maior numero, sdo referéncias externas a0 agente © que serviram ao longo da historia de parametro pra saber se voce foi eticamente legal ou no. Qual é a graca disso aqui? A poesia, né? Felicidade do maior numero, velho, é um negécia, uma coisa de inglés mesmo, né? Que invade a india com temo branco, 0 cara, guarda-chuva branco, né?E como é que a conduta € boa? Quando patrocinar a alegris do maior numero que 6a inglaterizago do mundo, né, assim como a globalizagdo @ a americanizacgo do mundo, teve uma época que a Inglaterra tinha a mesma pretensdo. Entdo, claro estd, que a felicidade do maior numero definitivamente nunca ninguém descobriv co que se tratava, né? Mas continuamos com um problema, né? A ago vale pelo seu efeito, né? E ai, € claro, vai aparecer um fulano chamado Kant e que vai dizer 0 Ghvio, isso aqui chama utilitarismo. ~ Ah, professor, Maquiavel eu enxergo bem na luta politica, agora isso aqui eu nao vejo muito. Ve sim. Voc® nunca ouvir falar em responsabilidade social das empresas? Entdo, o lucro ta aqui, né? Voc€ pega um CEO, pra Maquiavel, agiu bem? Ra! Lucro, bateu a meta... Agora, eo resto? Ah, cistribuiu salsicha em favela, croquete, é, deu, sei |g, catavento pre crianga, operou fimose em indio... PG, operou fimose em indio, o qué? A minha aluna é, alids, uma aluna extraordinaria, saiu da faculdade, foi minha aluna, foi minha orientand, sério, saiu da faculdade € foi trabalhar numa empresa preacupada com a ereco masculina, consagrada com isso. E ai 0 primeira projeto de responsabilidade social foi fazer operacgo de fimose em indio no Xingu. Ai eu perguntel: “Mas eles querem?" Ela disse: “O indio no sabe o que quer. O proprio Direito diz: o indio é relativamente incapaz, sei ld o qué. O indio néo sabe o que quer". Eupeguei e falei: “Voce vai pessoalmente fazer esse trabalho?”, ela disse: "Vou. Eu falei: “Bom, nesse caso eu jd estou adquirindo 0 meu cocar, ndo é? Porque vocé nao tem noco do naipe da responsavel pela responsabilidade social. Operar fimose em indio no Xingu é muito bacana porque o indio nfo sabe muito bem oque ele quer, ne? Agora, o.que é que Kant vai dizer? A acdo é boa quando? E 0 que Kant vai dizer é muito legal: “Voce no pode dizer que uma a¢do € boa pelo que acontece depois”. Essa é a idea. Vocé ndo pode dizer que uma ago € bog pelo que acontece depois, por qué? Usi, Isso € imediato. —Ela tem que ser boa pra ser feita. (aluno responde) Claro, companheiro. Como @ seu nome? — Fabio. Fabio. Inscreva-se ja no vestibular do curso de Filosofia. Como é que vocé pode julgar a aco pelo efeito se o efeito vem depais? Como é que vocé vai agir? Voc& percebeu? E, no tem come antecipar o efeito, raz3o pela qual a ago tem que depender de uma variavel que néo € o seu efeito. E depois, néo é bem por isso que ele disse isso a0, u guis $0 encher a tua bola pra vocé ficar feliz. Mas, na verdade, quando voce age e a tua agg € julgada pelo efeito, 2 o que acantece normalmente com os efeitos? Eles dependem de muito mais causas do que 3 tua agdo. E vocé acaba paganda o pato sozinho. Nio sei se voce entendeu? £ o que a Direito chama de ‘com causas’, é bem legal, he! Eu leio 36 de trés ou quatro coisas da faculdade de Direito, eu gosto de lembrar porque sengo esquecendo tudo é possivel que eu, perdendo totalmente a meméria eu perca a vida vivida, né? Entdo, eu lembro que mora é 2 delongs ou atraso no cumprimento da obrigagdo e tem com causas e funciona assim 6, né? Eu vou te dar um exemplo: Eu te dei uma aula sobre felicidade, é a mais triste das aulas. Ai o aluno jé veio pra aula deprimido, certo? Ai ele ouviu o que eu falei sobre awida e sobre a felicidade e tal e coisa. Ele saiu dali e decidiu abreviar a existéncia dele. Vocé percebeu, companheiro? Ue, teria abreviado se eu nao tivesse dado 3 aula? Talvez néo. Por outro lado, nao foi s aula a Unica responsavel por ele ter abreviado = existencia. Ora, se a agdo wale pelo seu efeito eu tenho que pager o pato sozinho, alids, todo mundo tem que pagar o pato sozinho dele ter abreviado a existéncia. Acho que vocé entendeu; no parece justo. Afinal de contas, a minha aula foi uma gota, né? Num oceano de angustia, num oceano de privacgdo emocional, num oceano de abandono, num oceano de tristeza. A minha aula foi uma gota que permitiu 3 esse rapaz tomar essa sabia decisdo. Mas eu no posso pagar o pato sozinho. Acho que ficou claro, no da pra julgar 3 aco pelo seu efeito. O pragmatismo é uma falacia. ‘Sem falar que os efeitos nfo param, hum. Efeito gera efeite, que gera efeito, que gera efeito, que gera efeito, que gera efeito, ¢, portant, eu ndo tenho como eferir 3 s¢8o pelos efeitos porque eu teria que arbitrariamente definir até quando... Entende o que eu 16 dizendo, no? A minha aco. Av acdo gers efeito, né? Vamos imaginar: a aula gera alegria do aluno. O aluno chega em casa © conta pra mae, né? Entdo tem o efeito dois: slegria da mie. Efeito tres: a mae vai assistir 3 aula; mie vai 2 aula. Até aqui tudo bem, né? Show de bola, a aula é do caralho. $6 que quando 3 mie vai 2 aula ela € contaminada pelo tedio absoluto, percebeu? Eu pergunto 3 vocé: 2 aula vai ser julgada pela alegria do aluno, pela alegria da m3e ouvinde oaluno, pelo fato da mae ter ido assistir a aula, ou pelo tédio que a mesma aula determinou? Acho que vocé entendeu, acho que vocé percebeu, os efeitos ndo slo confidveis. Portanto, a boa ago nao pode depender do efeito, tem que depender da boa vontade, da boa intencdo e isso é outra ‘coisa. Isso é intencionalismo nao € pragmatismo. O que importa é o que eu quero que aconteca e n3o © que acontece efetivamente. O que importa ¢ que eu td pensando em termos de ‘transformagao do mundo. O que importa € 0 que eu gostaria que acontecesse @ ndo 0 que acontece. Esse é o intencionalismo kantiano: o que importa é 2 boa vontade. Eu acho que vocé percebeu que eis ai uma referéncia que de todas essas & a mais imanente ao agente. A acdo depende de uma boa vontade. Se vocé quer que aconteca, faca. E se nao acontecer? Nao é problema seu. 0 efeito nao é referéncia. Eu no sei se vocé entendeu, mas na moral kantiana nao haveris homicidio culposo, porque se eu no queria, 16 dirigindo meu carro, de repente alguém entra na frente € eu mato, eu produzi ‘co efeito, mas eu nao queria mater. Como a moral é intencionalista s6 conta o que eu queria que acontecesse. E por que Kant acha que tem raza? Porque o que voc quer que aconteca é a Linica coisa que vocé pode controlar completamente, né? 0 efeito wocé nao contrala, mas o que vocé quer vocé controla. E é isso que deve pautar a tua acao. Beleza, até aqui? Infraestrutura, superestrutura, marxismo e classes sociais Muito bem, mas é claro que a historia do pensamento no acabou ai. O século XIX chega. Eo século XIM vai nos contaro qué? A referéncia para o certo € para o errado vai depender, né? Vocé tem agui um problema, ta aqui o seu cotidiano, ¢ qual é a referéncia para o certo € para o errado? E oséculo XIX é 0 século que aparece a Sociologia. E 0 que é que a Sociologia vai nos propor no lugar de tudo aquilo? O certo € o errado é uma decisiio social. E um fato social. A ética é um fato social, né? Quando Durkheim fala sobre ética, ele fala sobre ética como fato social. E a sociedade que decide sobre o que € certo e sobre o que € errado. Muda a sociedade, muda o que é certo e o que é errado. A sociedade é a referéncia a partir da qual eu posso identificar se eu estou agindo bem ou agindo mal. A sociedade é instancia legitima de definicSo do que é certo e do que errado. Ficou claro? Entio, é claro, que se numa sociedade eles extirpam a clitoris pra mulher nao ter prazer, isso é uma regra social culturalmente explicavel. Ta certo? Ta bom? Ora, a partir dai, como é que eu melhora a explicac3o? Como € que eu melhoro a explicacdo do certo e do errado a partir de uma perspectiva sociolégics? Em outras palavras, o que eu tenho que investigar na sociedade pra compreender melhor os processos de decantacdo dos valores, né? Como € que eu faco a genealogia dos valores examinando a sociedade? Como que eu faco? E a resposta que dardo os socidlogos ¢ uma resposta comum: Pra vocé melhorar a tua competéncia na investigacdo da onde veio o certo € 0 errado, vocé tem que cortar a sociedade de maneira a focar melhor aonde aquele valor surgiu; é cortando a sociedade. Por qué? Porque se vocé quiser saber como deve ser dada uma aula de filosofia, vocé no precisa perguntar pra uma pessoa que vende amendoim na rodovidria de Curitiba. Por qué? Porque ela nao participa dessa definigéo. Se vocé quer saber come é que um juiz deve dar uma sentenca, voré no tem por que perguntdla no Hospital Albert Einsten, pra quem faz transplante de figado. Se vocé quer saber como é que um pintor deveria pintar pra ser vanguardista, vocé ndo tem que perguntar pra mim que nao entendo picas de pintura. Se vocé quer saber qual ¢ o valor, sei la, de uma obra cinematogréfica, n3o adianta nada perguntar para o Rogério Ceni, né? E, se vocé quer saber, portanto... Entio, perceba que eu preciso encontrar na sociedade onde est o problema. Eu preciso, de certs maneira, como numa cebols, eu preciso encontrar, onde mais provavelmente esta a génese dos valores que eu estou investigando, como numa cebola. Procure me entender, né? Entdo, nesse sentido eu vou mais longe. Vamos imaginar que olha... Alguém faz uma tese, né? Uma tese sobre a Rede Globo. Entdo é aqui. Ai esta aqui o mundo, né? E esta aquia tese. Qual o valor da tese, a tese é boa? Bom, é a sociedade que decide o valor da tese, né? Bom, € esta aqui o mundo. Aonde exatamente eu vou procurar? N3o é todo mundo que gosta disso. N3o é todo mundo que se interessa por isso. Nao € todo mundo que participa disso. Nao é todo mundo que coisa isso. Ent&o, perceba que eu tenho que identificar o lugar onde mais provavelmente os critérios de uma boa tese sdo discutidos e definidos. Eu tenho que procurar. Entdo esse é o trabalho do investigador. E tentar encontrar no meio de um universo social gigantesco, o lugar onde mais provavelmente esta a génese do valor académico de uma obra. Paginas: 34 E pra responder tudo isso, vocé vai encontrar a resposta do materialismo historico. Eo que que vai nos propor Marx? Se eu quero saber o valor de qualquer coisa, o valor de qualquer coisa, eu preciso partir da premissa que as coisas aparentes do mundo que merecem o nosso valor, essas coisas sdo superestrutura. Elas nao se explicam por elas mesmas. Entdo, o valor de um artigo jornalistico, o valor de uma sentenca, o valor de uma obra de arte, o valor de uma tese académica, o valor de qualquer coisa, ndo se explica por ela mesma. Por ‘qué? Porque eu preciso de uma referéncis desde Plato até agui. Equal é a referncia do valor das coisas? E a infrsestrutura econdmics. Em outras palavras, é 3 economis da sociedsde, o lugar privilegiado pre achar os valores das coisas do mundo. Ea economia, é 8 produgdo de bens. Entdo, se vocé quer saber se o Padre Marcelo faz bem ou faz mal, o que ele faz, saiba que a Tesposta estd na producdo de bens materiais. Se vocé quer saber se 0 STJ julga bem as lides que chegam até ele, saiba que a resposta esta na producdo de bens materiais. Se vocé quer saber se 0 professor Clovis da uma boa aula, saiba que a resposta esté na produgao de bens materiais. Aj vocé olha e diz: “Nao entendi porra nenhuma. O que tem a ver a produggo de bens materiais a ver como valor de tudo isso?” E a resposta que Marx dé é simples: na hora de produzir bens materisis voc8 tem dois Tupos, a burguesia ¢ o proletariado. A burguesia & dona dos meios de produgie, o proletariado vende o trabalho pra poder participar do processo econémico, ¢, portant, a relagio de conflito entre burguesia e proletariado é 0 que explica o valor de todas as coisas. A luta de classe é o motor da historia. A luta de classe é 3 base pra entender o valor de todas as coisas. Entdo, se vocé quer saber, claro, ele me olhou com cara de: “Nao entendi a relacao”. Ué, meu Deus, como que nfo entendeu relac3o entre burguesia e proleteriado, né? E a burguesia e 0 proletariado. £ a lute de classes. © espaco que ajuda a definir o certo e o errado. fa burguesia eo proletariado. Papings: 35 Entlo existe o qué? Existe um jeito burgués de atrituir valor ao mundo, & esse jeito burgués de atribuir valor a0 mundo vai de certa forma ser, é, espargido, né? Vai ser universalizado. 0 jeito burgués de atribuir valor a0 mundo vai ser, de certa forma, estendido pras zonas nao burguesas da sociedade através dos meios de difusdo e de imposigo dos valores burgueses, ¢ a partir dai eles se ‘tornarSo universais como se fossem uma verdade absolute indiscutivel Acho que vocé entendeu o que eu estou dizendo: o que a classe dominante diz que é bonito acaba sendo bonito gracas 30 Faustéo, né?.O que a classe dominante acaba dizendo que é um corpo belo passa a ser um corpo belo gracas as Paniquetes, né? Mas a burguesia tem os espaqos de consagrago do que é bom e do que é ruim. A burguesia ‘tem, portanto, o controle das instancias sociais de divulgacéo e definicio do que é certo, do que é errado, do que é bom, do que é ruim, do que é bonito, do que é feio e assim por diante. Portanto, se vocé quiser entender o que ¢ bonito e o que é feio na sociedade, vocé tem que entender de que maneira a burguesia oprime o proletariado. Marx até chegarmos a Bourdieu. E 0 que € que Bourdieu vai dizer: “Nao sei se € s0 isso. Ndo seise €50 isso”, Que gis né? Que esforco. Isso ¢ do tempo que eu dava aula. Que esforgo. O que é que Bourdicu vai dizer? Na hora que wocé tem um certo, um problema existencial qualquer, esta aqui o seu cotidiano, vocé precisa de uma referéncia, A referencia & a sociedade porque ele ¢ um socidlogo. Mas dizer que é a sociedade € dizer uma coisa muito grande; é quase nao dizer nada. Ent3o Bourdieu vai tentar encontrar o orbital, vai tentar encontrar o lugar mais provavel de explicagio dos valores das coisas. Eo que é que Bourdieu vai dizer em relagdo.a Marx? Que dividir a sociedade em burguesia e proletariado é muito util pra entender muita coisa e completamente ‘indtil pra entender muitas outras coisas. Nao sei se vocé me entendeu. A divisio da sociedade em classes sociais ajuda a entender muitos valores que nés respeitamos, mas ngo ajuda em nada a entender tantos... Nao ajuda em nade = entender tantos outros valores que a gente respeita tambem. Ts perieito isso? Em outras palavras, Marx est para o pensamento socisl contemporgneo como a roda esta para Lamborghini. Ta perfeito? A diviso da sociedade em classes é legal... Desculpa ai. A divisio da sociedade em classes € muito legal, mas ela ndo explica tudo. E eu posso, diz Bourdieu, encontrar um jeito de explicar melhor os valores que estdo na sociedade pela sociedade, mas melhor do que dividir a sociedade apenas em burguesia e proleteriade, por qué? Porque muito do que acontece na sociedade nao se deixg explicar pela lute de classe. Aluta de classe € muito bacang pre explicar muita coise, ¢ muito inutil pra explicar muitas outres coisas. Valores dominantes Entéo perceba, o conceita de campo aparece ai. Nossa, cara, nunca vocé vai encontrar alguém que fizesse isso pra vocé. Eu no sei se vocé percebeu, mas eu comecei do mundo das ideias de Plato. Eu passei pro cosmos aristotélico. Eu passei pro Deus cristo. Eu passei pra vitdris pragmatica. Eu passei pra responsabilidade social e o bem comum. Eu passei pela vontade, pelo ‘voluntarismo kantiano. Eu passei pela luta de classe e eu cheguei no campo. Eis ai uma referencia pra entender os valores dominantes em circulagdo num determinado espago. Em outras palavras, se o problema for a tese, o campo é o académico. $¢ o problema for o filme, 0 campo @ 0 do cinema. Se o problema for uma jogada do centroavante, o campo € 0 futebolistico. Se o problema for uma sentenca do juiz, o campo é 0 juridico. Se o problema for uma decisio de um empresdrio, o campo é o econdmico. E se 0 problema for uma estratégia de marketing eleitoral, o campo é 6 politico. Eu espero que vocé tenha entendido que Marx estd para Bourdieu como a roda esta para Lamborghini. Em outras palavras, gragas ao conceito de campo eu consigo identificar o orbital mais provavel, alias, orbital mais provavel é um pleongsmo, porque o conceito de orbital nasce pela probabilidade de um elétron se encontrar. O campo é 0 orbital dos fendmenos sociais. Quer dizer, aonde mais provavelmente eu consigo explicar as coisas. Se eu tenho valores sociais eu s6 conseguirei explicar a génese desses valores sociais a partir da campo especifico em que esses valores valem. Por qué? Porque fora da campo 0 valor académico no tem valor, certo? N3o sei se ta me acompanhando. Quer dizer, eu tenho o titulo de livre docente, é um valor, academicamente é um caminhio de valor, fora do campo académico é um xis, no tem valor nenhum. Entéo, por que o campo é 0 espaco legitime de investigacdo da génese dos valores sociais? Porque é sé no campo que os valores valem, fora deles, os valores, eles sdo difusos. Difusos ¢ confusos. E é por isso que o campo € 0 instrumento socioldgico legitimo pra estudar o qué? O surgimento do certo e do errado. Bourdieu x Habermas Eu queria passar um paralelo antes de fechar esse ponto com Habermas. Habermas é muito legal. Eu sinto que Habermas é um irmao pra mit 1. Hum. Porque quando Bourdieu morreu, ele que assinou 0 artigo na mesma pagina. Eu fiquei muito Habermas € um pensador de envergadure mundial ¢ eu sou completamente desconhecido. Mas Habermas diz coisas que vale muito a pena wocé considerar agui, porque sao pensadores contemporaneos Habermas € Bourdieu. £0 que é que os distingui? Habermas tem conceito €.0 conceito de Habermas é 0 conceito, o principal conceito de Habermas é 0 conceit de espaco pilblico. Ora, espaco pUblico ou alguns traduzem por esfera puiblica. Ora, o que é 0 espaco plblico? Presta aten¢Zo aqui, porque se nZo aprender isso comigo eu vejo poucas chances pra voce, E, 0 espaco piblico é um espaco abstrato como o campo. © espaco publico éa possibilidade € a mecessidade que os agentes sociais tém de interagir, de se apresentar e de defender seus pontos de vista, o que quer dizer defender os seus valores em alianga com outros ¢ em contradicio com terceiros. Segundo Habermas, o esoaco pliblico democritica ¢ 3 condicdo de emancipacdo da sociedade, isto ¢, €.3 condigdo para que o homem consiga trazer pra si as rédeas da sociedade no sentido de uma definigéo de pra onde queremosir. O espaco publico, portanto, é um espaco em que todos, através da exposi¢do de si mesmo, através da aparicéo publica, através, digamos, da apresentaco de si, nds conhecemos as diferencas que temas em relagao aos outros, € de certa maneira isso nos ajuda a nos conhecer melhor. O espaco publica, portanto, é um espaco aonde decantaré o melhor argumento, decantaré o melhor valor, decantard o melhor ponto de vista, decantaré, digamos, a melhor ideia para aquele mundo e pra aquele espaco, né? Pra, a, digamos, o melhor caminho a ser trilhado por aquele coletivo. Q espaco publica € um espaco de enfrentamento com vistas a um pacto, com vistas a um consenso, né? Em fungdo de uma, de uma deliberacSo coletiva sobre pra onde queremos ir. Espaco pablco, Entio, ai voc8 olha pra mime diz “Qual diferenca entre o espaco piblco habermasiano #0 campo de Bourdieu? A diferenga € enorme. E por qué? Procure me entender. Bourdieu é um cientists social, Bourdieu, portanto, estuda 2 sociedade como ela & Bourdieu, portanto, nfo tem 2 menor preocupacao de dizer pra onde queremos ir, pra onde temos que ir. Bourdieu nunca foifildsofo. Entdo quando, quando Bourdieu propde o conceito de campo, ele prope uma nogéo pra estudar a sociedade como ela . Ors, o campo é um espaco de luta, de enfrentamento € esse espaco de enfrentamento é um espaco de dominagdo. E, portanto, quando Habermas fals que todos vdo apresentar os seus argumentos € dal todos vio, véo decidir qual £0 melhor argumento, ¢ todos vo assinar embaixo o melhor argumento, € todos vo estar de acordo com o melhor argumento, ¢ vdo todos estar felizes com o melhor argumento, ora, Bourdieu so pode olhar e dizer: “Mas aonde cargas d'deua vocé viu isso acontecer?”, Sabee quando existe consenso? € quando vocé tem um na frente, o outro atrés e um tubo de gel, né? Esse é o consenso. E o caracu, né? £0 consenso caracu: eu domino e voc® é dominado. Eu ganho ¢ vocé perde. Eu mando e vocé obedece. Eu ganho e vocé perde. Eu tenho ponto de vista que prepondera € 0 seu no prepondera. E isso ai, quer chamar de consenso chama, mas o campo éum espaco de domina¢do, de poder, um manda € o outro obedece, entendeu? Ora, vamos todos dar as mos e encontrar o melhor caminha, nossa, velho, sé falta um violino pra acompanhar, ta certo? né? Entdo Habermas, é curiosamente um pensador humanista que quer um... Ele é muito bem intencionado, certamente ele é muito melhor pessoa do que Bourdieu pra conversar. Ele deve ser um vows fantéstico pros netos dele: “Vamos todos sentar, todo mundo fala, todo mundo expée 0 seu ponto de vista € ai todos vamos entrer num acordo de qual €a melhor maneira de conviver’. Porra, velho, legal. E agora que tal a do portugués, né? E, por qué? Porque no mundo da vida, no mundo da sociedade, o que acontece € que os valores decorrem de um processo de dominacda ¢ de imposi¢io do interesse de uns sobre o interesse de outro. Ta perfeito? Entdo veja $0, Habermas € Bourdieu, né? Podiamos botar, aqui, luta de classe, campo € espaco pubblico, né? Como referéncia pra ética. Etica do espaco puiblico, ética da discussio, ética da comunicacio, ética do discurso, so palavras equivalentes pra teoria moral habermasiana. Ent, 0 que Habermas vai nos propor? O espaco piblico é o espaco legitimo de deliberaco coletiva sobre os valores legitimos, os melhores argumentos e pontos de vista com vistas a uma humanidade melhor. 0 que dird Bourdieu? O campo € um espaco em que uns mandam, outros obedecem, uns fodem e outros so fodidos, uns preponderam e outros sucumbem e assim por diante. E vocé diré: “Qual dos dois, serd, explica melhor as coisas como elas stio? E qual dos dois, serd, é mais util pra que a humanidade seja melhor? Porque, percebe, cada um na verdade quer uma coisa. Habermas, no final das contas, o que ele quer é que as pessoas possam participar mais do debate o que ele considera fundamental pra democracia. Que as pessoas tenham condigées de participar e decidir coletivamente. Porque mesmo quando teu argumento nfo prepondera, vocé tem que aceitar que o argumento contrério é superior ao seu e ai vocé se convence. O espaco pliblico é um espago de convencimento, fundamentalmente, enquanto que o campo é um espaco truculento de dominacSo Até aqui @ primeira metade, na segunda metade a gente continua. Som intervalo. Dez minutos, porque Bourdieu no aceita um segundo de atraso. Estratégias do campo Quando vocé pertence a um campo € vacé jogs o jogo, muita coisa que vocé faz é visando os troféus do campo. € quando eu digo visando eu quero dizer: voc articula meios e fins. A isso chamamos estratégia. Ages que passam pela sua cabega, © que tém como consequéncia imaginada uma aproximagio dos troféus. £ quem diz uma aproximagio das troféus diz ganho de capital especifico do campo. Vocé se lembra de uma semana atrés: todo o campo tem um capital especifico, espécie de recurso que sé vale naquele campo pra obtencSo daquele troféu. Falamos de campo académico, campo politico. O capital académico € 0 capital politico so mesmo incomparaveis. Dai tanta irritagdo quando um profissional da politica pretende invadir a academia, mesmo quando ela é a Academia Brasileira de Letras. Se ele escreve bem ou se ele escreve mal, vai se Id saber 0 que isso quer dizer. Mas o fate é que os capitais eles so de uma dramitica especificidade, porque eles s6 valem mesmo no orbital que Ihe corresponde. A estratégia é isso, a articulac3o de meios, a disponibilizaco de capitais para a aproximaclo progressiva do troféu. Se vocé preferir, a estratégia é « acumulacdo de capital para » acumulacdo de capital. A estratégia é vocé mobilizar energia para conseguir mais recursos. A estratégia é 2 organizaciio dos préprios recursos com vistas a dispor de mais recursos. Vontade de poténcia, diré Nietzsche. Alegria que busca alegria, teso que busca o tesdo, paténcia que busca a poténcia, poténcia que quer mais poténcia, e quando tudo isso € consciente orquestrado pela conscigncia recebe o nome de estratézia. ~ Mas poderis também ter o nome de manipulacSo, de corrupc#o, né? (aluna fals) E, nfo, aqui, sim, é claro, mas eu me refiro s6 a vocé verificar quais séo as tuas condicdes Vamos imaginar que eu queira ter mais prestigio académico € eu vejo onde eu estou, eu vejo quais so os meus pontos fortes e eu desenvolve um plano de acées pra alcancar o que eu quero alcangar; estratégia. EntSo, os campos 80 espagos em que os agentes sociais articulam meios € recursos pare obter troféus especificos © séo conscientes disso. Entdo todo o campo social é um espaco de estratégias. Mas algumas nfo so aceitaveis © exatamente isso, a especificidade do campo também se dé na interdico. Eo campo espaco legitimo de definiclo da estratégia inaceitavel. Aqui nfo, No nosso jogo vocé isso no pode fazer. As vezes uma estratégia equivalente em outro campo passa facil, mas no campo em questéo é entendido come indigno, canalha ou até mesmo ilegal. Ento perceba que € 0 campo social o espaco em que vocé encontra a definic3o das estratégias legitimas, que dizer, autorizadas, entendidas como nobres ¢ aceitaveis ¢ as estratégias inaceitéveis, né? E, claro, toda vez que alguém adota uma estratégia entendida pelo campo coma inaceitavel, pagaré as consequéncias que o proprio campo prevé para esse tipo de heresia. E, portanto, entenda que comportamentos equivalentes sero ofensas muito mais graves dependendo do campo que vocé tiver. Se vocé tiver no campo empresarial, voc olhar o cara do lado e vocé fizer igualzinho, se bobear vocé ¢ até aplaudido, se der certo esta tudo bem. Se voce tiver no campo académico vocé copiar o que o outro fez, isso dé um “chabu” considerével. © comportamento € muito parecido, mas dependendo do campo que vocé adota, as consequéncias sociais de indole ética so muito especificas. Ainda é mais grave no campo artistico. Se voc pegar uma tela de alguém e copiar € quiser se apropriar da obra de arte do outro, isso € ainda mais inaceitével do que no campo da producSo cientifica. Percebeu, copiar pode ser louvével, aceitvel, condengvel, inaceitavel e completamente reprovavel, dependendo do lugar aonde voce tiver. Presta atenco no que eu t6 falando. —Eu td prestando. (aluna responde) Entéo vamos imaginar que um ponta esquerda qualquer resolva imitar as pedaladas do Robinho e a coiss dé certo e ele faz um gol. Ele seré ovacionado pelo estédio inteiro. A pedalada do Robinho € uma obra de arte, mas no campo futebolistico @ imitagdo n3o tem nenhuma consequéncia ética de transgressSo. Mas se for uma tela de, de pintura ou uma obra de musica erudita, nlo hd nenhum problema. Se for musica popular jé é mais tolerdvel, tudo depende de quem imita, porque quando é 0 Red Stewart que copia o Jorge Bem, he, seria pior se fosse 0 contrario. Eu espero ento que vocé entenda, no sei se eu me fiz entender, mas aquele ‘teteteretete teteteterete, tetetete’, no é? E o exemplo de plagio classico espetacular assim, sem nenhuma sombra de diivids, mas é claro, como o artista mais legitimo copia o artista menos legitimo, ele de certa forma chancela com a sua legitimidade @ copia. Aho que vocé entendeu, o certo € 0 errado depende demais das condigdes especificas do campo. Estratégia € quando vocé age sabendo o que quer. Estratézia, estratégia € 0 maquiavelismo aplicado aos campos. Estratégia € vocé articular meios pra alcangar os fins. Ea parte pragmatica do campo Mas aonde que Bourdieu supera Maquiavel? Porque Bourdieu esta pra Maquiavel como Alan Borguini esta pra outra roda. £ que Bourdieu diré que a aco social nfo tem na estratégia a sua dimenso mais importante. Habitus Ouca-me, sé vocé quer entender o comportamento de alguém na sociedade saiba: a parte constiente e estratégica da sua acdo ndo € o mais importante, o mais significativo, o mais relevante € 0 mais digno de ser estudado. £ por qué? Porque o nosso comportamento, o nosso comportamenta em sociedade ele é, eu diria, a influéncia dos campos sociais sobre o nosso comportamento & muito mais significativa naquilo que nfo percebemos, nfo articulamos, nlo passa pela nossa consciéncia ¢ no se traduz em estratégia. Nossal A influéncia da sociedade sobre o nosso comportamento tem a sua parte mais sofisticada, requintada e fina naquilo que néo nos damos conta. , portanto, querer reduzir a importancia do pertencimento ao campo as estratégias que usamos pra alcancar o que queremos alcancar é ignarar o filé mignon na nossa vida social. E ignorar o filé mignon da influéncia decisiva ds sociedad sobre o nosso comportamento que se dé para além da nossa consciéncia, para além da nossa estratégia, para além da nossa, do nosso dar conta de. — Posso falar uma coisa? {aluno pergunta) — Pois néo. —£, entio Bourdieu ta falando que, vou falar a maior bobagem também. - Nao é, é isso ai, né? — Que entéo a responsabilidade da estratégia nao é de quem fez a estratégia, mas sim da sociedade ou do.campo que levou ele a fazer, a tomar aquela aclo. -E.. - 0 politico, ele faz uma estratégia, a gente tem uma nocdo errada dessa estratégia dele, mas ele nao é culpado disso, porque ele esta no meio politico, o meio politico é assim que é porque ‘todo politico faz assim, e aonde ele testa é assim que se faz, entéo ele meramente é um... — Danga conforme a musica. (outro aluno fala) ~ Ele é o resultado daquele meio que ele estd, entio ele nfo é, aquela estratégia nfo & sd, nao dele, culpa sé dele ou. -Sédele, masé -E. —£ de responsabilidade do campo. -£88 E Bourdieu no se interessa muito por responsabilidades. Ele nfo é um fildsofo moral nem um jurista. Mas essa é uma inferéncia muito boa que vocé fez. Se vocé conversasse com ele, muita provavelmente era isso mesmo que ele ia te dizer. Vocé néo falou bobagem nenhuma. Afinal de contas, a aco social do individuo ela se dé em funcao de variaveis materiais, he, que sao, digamos, cientificamente explicaveis ¢ que fazem com que quanto mais fina for a tua grade de andlise e de identificacéo das causas, mais vocé vai reduzindo 0, digamos, o campo de manobra e de liberdade pra agir diferentemente, e portanto, mais acanhada vai ficando a responsabilidade de quem age. Té perfeito isso? Eu disse que vocé falou com outras palavras. Mas é claro, claro que néo era ai que eu queria chegar. O que eu queria chegar éno sentido de dizer que se a estratégia é socialmente explicavel, o que mais importa da vida em sociedade nao é estratégico endo é estratégico porque no é consciente E, portanto, o que Bourdieu teria a dizer a Maguiavel? Bourdieu teria a dizer a Maquiavel 0 seguinte: “Muito simpatico, voc resume a sua ética a uma questio estratégica: conseguiu o que queria, agiu bem, no conseguiu o que queria, agiu mal. Nas vocé limita a vida social & consciéncia da vida social, eo filé mignon da vida social se da sem consciéncia da génese social da vida’. Eu té fazendo toda essa prelecdo pra cheger no conceito de habitus, que 0 outro grande conceito de Bourdieu Habitus. E 0 que é o habitus? Pois o habitus ¢, o habitus é um conjunto de disposigdes para Paginas: 34 agir socislmente explicdveis, socialmente construidas que no passam pels consciéncia de quem E age. £ quando vocé respeita as regras sociais sem precisar pensar em respeitar as regras soci quando vocé age de acordo sem precisar pensar pra agir de acordo. E quando vocé age de forma conveniente sem precisar ser estratégico pra ser conveniente. E quando vocé age de forma a nao destoar sem precisar pensar pra no destoar, dando até a impressiio que vocé tem mesmo sangue azul, quando na werdade vocé so teve uma socializacéo azul. E socializagio azul quer dizer convivéncia azul. ‘Quer dizer, pertencimento ao universo sociais azuis, nobres, legitimos, de gente rica. E voce que conviveu nesse espaco, de tanto vé € de tanto imitar quem faz o que faz, acaba fazendo sem perceber, dando a impresso que é mesmo uma questéo de estirpe. Iluso naturalista pra lembrar do nosso primeiro encontro: “Nossa! Logo se vé que é filho de um Almeida Prado”. Logo se vé mesmo, porque de tanto conviver com os Almeida Prado acabou virando um. No lugar de sangue azul, convivencia azul. “Habitus” que te faz agir sem precisar pensar. Claro que eu té enfatizando aqui um “habitus” de classe. E 0 mais irritante. £ ndis, velho! E quando vocé vé os Gavides chegando no Pacaembu, e vocé vé como eles interagem, vocé percebe que nenhum deles precisa pensar estrategicamente pra ser um verdadeiro Gavidio da Fiel. E ndis, manol Isso € saber pratico incorporado. E néis, velho! N3o tem liberdade deliberativa. N3o tem consciéncia moral. Nao tem escolha. Tem o qué? Tem uma atualizacko de saberes praticos incorporadas ao longo de uma trajetéria. € isso. & “habitus” de Gavido, que na ignorancia dos Gavides se converte em sangue de Gavigo, porque s gente sempre gosta de “biologizar” aquilo que @ gente ndo sabe da onde vem. Eo que a gente nao sabe da onde vem, costuma vim da sociedade que a gente frequenta, dos espagos abstratos em que a gente mais convive Grande explicacdo. Professor ficaria contente de mim, por traduzir de maneira infinitamente mais simples as pataquadas que ele dizia como: esquemas de classificacfo do mundo social incorporadas ao longo de uma trajetéria dentro de um espago abstrato, que permite uma acao regida por uma orquestra sem maestro, @ uma inconscigncia sem no sei qué, com oito ou dez linhas sem nenhum ponto final Aqui é possivel fazer mais simples: esquemas de classificacdo do mundo, disposico pra agir que faz com que vocé aja sem precisar penser. Eu sou um professor com “habitus” de professor. Eu sou professor cem por cento do tempo. Eu sou professor com professorado incorporado; eu nfo preciso de ser estratégico. Eu no preciso ser estratégico porque eu tenho a docéncia na vela e & veia aqui ngo € a veia dos cromossomos, he, de uma heranga de pais que nunca entraram nos bancos escolares. A veia aqui é a veia curtida no campo académico. E um espago eonde muito provavelmente

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