COLEGIADO DO CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA PROFESSORA: MARIA HELENA DATA 14/04/2018 GABRIEL BASONI FREDERICO IBERNON ALVES COSTA DOS SANTOS JÚNIOR
CORRELAÇÃO CRÍTICA ENTRE FATORES ECONÔMICOS,
POLÍTICOS, IDEOLÓGICOS, SOCIAIS E CULTURAIS DA DITADURA E A ATUALIDADE
UMA BREVE INTRODUÇÃO
Muito se discute acerca das reais circunstâncias inerentes ao período
ditatorial brasileiro, como se decorreu o que para alguns historiadores fora o tempo mais sombrio de nossa história, onde a democracia viu-se cerceada nos atos arbitrários de um governo despótico e cruel. Não muito distante, ressurge em nosso ambiente nacional um discurso conservador, em nova roupagem, alegando, em suma, as benesses que o período ditatorial teria trazido em prol dos brasileiros, o que seria uma oposição às diversas obras literárias que versam sobre o tema. Contudo, será esse um sermão fadado na desinformação de nacionais no ócio à busca dos reais fatos? Ou teria um “que” de verdade? É essa uma das perspectivas que trouxemos nesse trabalho a fim de explanar e correlacionar o período que vai de 1964 a 1985 com as circunstâncias de nossa atualidade. Assim, sob a ótica comparativa, traçaremos, conforme dados reais, equiparações e/ou apartamentos dos fatores deduzidos em epígrafe.
A ECONOMIA DE ONTEM
Sabido por todos, o período entre 1968 e 1973, intitulado “Milagre
Econômico”, foi o interim em que o Brasil alcançou recordes no crescimento de seu Produto Interno Bruto (PIB), chegando a margem de 10% ao ano. A indústria brasileira vivenciou um desenvolvimento exponencial sob a tutela dos militares. Diversas multinacionais encontraram solo fértil para dilatar seus empreendimentos. Em 63 a economia brasileira cresceu miseravelmente em 0,6%, aliada a taxa inflacional anual de 86%. Dessa forma, um dos argumentos do Golpe Militar foi a da robusta instabilidade econômica perpassada pelas décadas de 50 e 60, e assim apoiaram-se em políticas econômicas inconsequentes para alcançar as metas e conseguir o apoio de uma parte da população. O que os mensageiros da excelsa ditadura militar pouco fala é como se decorreu os supracitados índices e quais foram as suas consequências nos anos supervenientes. Primeiramente, insta frisar que os métodos empregados para fomentar o desenvolvimento tupiniquim foram o arrocho salarial e a grande utilização de capital estrangeiro. A forte reprimenda estatal aos sindicatos e a outros dispositivos trabalhistas impuseram falta de condições de negociação entre empregador e empregado. Este, hipossuficiente, viu-se impossibilitado de requerer melhores condições laborais e teve o seu salário desatualizado anualmente conforme a inflação. Desse modo, os empregadores capitalizaram grandes lucros dos empreendimentos mormente em função dos operários. Não menos importante, o desenvolvimento regrado pelo dinheiro estrangeiro trouxe dependência internacional à economia brasileira, tornando-a fragilizada aos fortuitos externos. Os inúmeros empréstimos realizados pelos militares acarretaram uma dívida equivalente a 54% do PIB agregados a “fatura” do governo de redemocratização. Após saírem do poder, deixaram como “herança” uma inflação de 223% em 1985, o que quatro anos depois se tornou em 1782%. E para onde foi o desenvolvimento, fruto de toda essa dívida, que possui seus resquícios até o dia de hoje? O que aconteceu foi que o “bolo econômico” criado foi fator gerador de uma grande discrepância social onde apenas os empresários e aristocracia política foram beneficiados, enquanto os pobres continuaram na sua mesma condição de marginalização. A ECONOMIA DE HOJE
É evidente a queixa dos cidadãos decorrente da crise vivenciada pelo
Brasil há quase uma década, e é nesse cenário que surge os exaltadores do período militar. O discurso de que “no militarismo os rumos econômicos teriam sido diferentes”, como já vimos, é falaciosa, e isso é ignorado ou mesmo não sabido por essa população mais radical. A atual crise econômica brasileira tem sua origem oriunda de circunstâncias muito mais complexas, que extrapolam o contexto econômico e adentram no cenário da também crise política nacional. Indo além, segundo a revista The Economist, podemos citar os fatores externos, que se mostraram preponderantes nas circunstâncias agravantes da crise. Nesse sentido, o infeliz atual quadro econômico do Brasil teve sua origem no ano de 2014, pela robusta recessão econômica através da queda no PIB consecutivamente, trazendo inúmeras consequências negativas como o desemprego e aumento na inflação. Não nos aprofundemos em conteúdos técnicos de teor unicamente economista, mas analisaremos a economia sob o prisma do Direito, com o enfoque nas consequências sociais. Correlacionando ao período ditatorial, o movimento de impeachment teve dentre seus principais elementos fomentadores a forte crise experimentado pelo governo Dilma, de outro lado o golpe militar teve como um de seus fatores a também crise econômica vivida naquele período. Ao que tudo indica o argumento de instabilidade econômica por vezes deixa de ser qualificada como patologia a ser sanada e torna-se argumento de manobra popular para tomada do poder. Cabe ressaltar que o quadro econômico jamais poderá ser argumento para atos antidemocráticos. A economia sempre teve seus altos e baixos, a sua gestão é de responsabilidade de nossos representantes postos por dispositivos constitucionalmente garantidos. Nossos compatriotas devem se inteirar acerca das informações que são postas à mesa, investigar com cautela aquilo que é alegado por terceiros. Dessa forma evitará o mau uso de suas atribuições como cidadão brasileiro. CONTEXTO SOCIAL NA DITADURA
Dando continuidade aos estudos sobre a Ditadura Militar no Brasil,
analisemos agora os aspectos sociais que permeavam aquele período.
Economicamente falando, sabe-se que este regime, ocorrido em nosso
país entre 1964 e 1985, foi marcado pelo chamado “milagre econômico”. Em breves palavras, um grande crescimento na economia do país, que promoveu avanços estruturais e a criação de milhares de empregos. Mas o que isso tem a ver com a sociedade da época?
A resposta é que os efeitos deste “milagre” influenciaram fortemente no
meio social. Como consequência deste crescimento, a estratificação social no Brasil ficou ainda mais consolidada. Ou seja, a renda ficou altamente concentrada nas classes alta e média, enquanto que a população mais pobre sofreu com a falta de amparo. Houve, portanto, crescimento, mas sem qualidade de vida; houve aumento dos postos de trabalho, mas faltou condições estruturais para permanência destes postos; tinha muito dinheiro nos cofres dos bancos, especialmente nas poupanças das classes média e alta, mas milhões de brasileiros morriam de subnutrição. Tudo sob a ótica de que era necessário “fazer o bolo crescer para depois reparti-lo”.
Diante deste contexto, não é difícil inferir que o avanço na economia,
apesar dos seus pontos positivos, também afetou profundamente o meio social. Tais características como grande quantidade de crianças mortas por desnutrição, milhares de municípios brasileiros sem água encanada, falta de saneamento básico em grande parte do país e tantas outras situações sociais evidenciaram a falta de planejamento para o desenvolvimento humano do povo brasileiro.
A Ditatura ocorrida no Brasil teve também como aspecto marcante uma
forte repressão a todas as formas de oposição ao governo. O AI-5 (Ato Institucional nº 5) foi o ponto mais alto da represália ditatorial e teve, como uma de suas características, a censura aos meios de comunicação. O cidadão brasileiro não tinha acesso às informações de forma plena e livre, pois estas chegavam até si de forma restrita e controlada. Além do mais, era severa a vigilância contra os movimentos estudantis, e reinava nas grandes cidades um clima de insegurança devido aos conflitos entre forças opostas: de um lado, movimentos de guerrilha que atuavam tanto nas zonas urbanas quanto no meio rural, e de outro, grupos de extrema direita, como por exemplo o CCC (Comando de Caça aos Comunistas), que executava sequestros e assassinatos aos opositores do regime. A sociedade, portanto, não tinha o direito de se expressar livremente, uma vez que toda forma de manifestação contrária aos detentores do poder político era violentamente repreendida, correndo o cidadão risco de ser torturado ou até mesmo assassinado, em nome da falácia do “combate ao Comunismo”.
CONTEXTO SOCIAL ATUAL
A chave para a alteração de todo esse momento conturbado na história
brasileira foi a promulgação da Constituição Federal de 1988. Esta trouxe consigo um caráter social e amplas garantias individuais e coletivas, expressas em seu art. 5º, além de estabelecer um Estado Democrático de Direito e ter, entre seus fundamentos, a dignidade da pessoa humana, conforme o art. 1º, inciso III. Assim sendo, assegurou ao indivíduo a sua liberdade de expressão, bem como o respeito à sua integridade física e psicológica. Cabe ressaltar também a liberdade de imprensa, agora sem a interferência do Estado e garantida pela Carta Magna em seu art. 220, § 1º. Entretanto, muitas das garantias trazidas pela CF/88 ainda ficam só no papel. A desigualdade social e econômica persiste, reflexo das políticas econômicas adotadas no período ditatorial. Segundo pesquisas recentes do IBGE, no ano de 2017 apenas 10% da população concentrava 43,3% da renda do país, o que evidencia que a ideia de “repartir o bolo” nunca ocorreu de fato.
Observa-se também que, embora expressa na Constituição a liberdade
de expressão e o respeito à dignidade humana, estas não são plenamente cumpridas. Ainda prevalece em meio à sociedade brasileira uma intolerância às minorias, como por exemplo os grupos indígenas e os movimentos LGBT, que cada vez mais lutam para alcançar seu espaço. Outro ponto importante é o preconceito racial, que embora implícito, insiste em subsistir: no tocante à violência e às desigualdades sociais, os negros são, infelizmente, os mais afetados, vide o recente caso da vereadora Marielle Franco, ativista negra que lutava pelas causas sociais dos negros, assassinada há um mês.
CONTEXTO CULTURAL DA DITADURA
As expressões culturais se dão, principalmente, por meio da música, do
cinema, do teatro, da dança, entre outros. Entretanto, iremos nos deter a analisar apenas a música em especial, que foi o ponto forte das manifestações durante este período histórico do Brasil. Como já analisado anteriormente, a Ditadura Militar teve como ponto principal a repressão a todo e qualquer tipo de manifestação que lhe fosse contrária. Assim sendo, as expressões artísticas, a saber, a música, o teatro, o cinema, eram mormente voltadas para a crítica à severidade do governo ditatorial. Mesmo o “pente fino” exercido nesse período pelos militares, como forma de censurar os repúdios à Ditadura, não impediu o surgimento e propagação de grandes movimentos culturais, especialmente no âmbito musical.
O Tropicalismo foi o mais marcante de todos eles. Influenciado pela
cultura pop brasileira e internacional e de correntes de vanguarda como, por exemplo, o Concretismo, este movimento musical teve como características não somente protestar contra a reprimenda militar, mas também reunir todas as tendências, informações, manifestações do pensamento e então expressar a realidade do artista brasileiro. Trouxe uma inovação ao possibilitar um sincretismo entre diversos estilos musicais, como o rock, a Bossa Nova, baião, samba, bolero, entre outros. As letras das músicas que compunham a Tropicália possuíam um caráter poético, elaborando críticas sociais e abordando temas do cotidiano de uma forma inovadora e criativa. Teve como principais nomes Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Zé, Gal Costa, Rita Lee e demais artistas da música brasileira. Apesar de maior relevância musical, o Tropicalismo também influenciou outras áreas, entre elas o cinema. O movimento Cinema Novo, tendo como um dos principais nomes Glauber Rocha, foi um dos que recebeu essa influência.
Outros nomes também se destacaram nesse período, através das
músicas de protesto. Chico Buarque é um destes, que através da música “Cálice”, faz alusão à oração de Jesus Cristo dirigida a Deus no Jardim do Getsêmani: “Pai, afasta de mim este cálice” e explora a sonoridade e o duplo sentido das palavras “cálice” e “cale-se” para criticar o regime instaurado. E como não lembrar da belíssima música “Pra Não Dizer que Não Falei das Flores”, de Geraldo Vandré? Esta música era um verdadeiro apelo ao povo para se unir e juntos, combaterem e protestarem contra o regime ditatorial.
CONTEXTO CULTURAL ATUAL
Os movimentos culturais e artísticos ocorridos no período da Ditadura
Militar consolidaram no cenário nacional grandes nomes como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico Buarque, Rita Lee e tantos outros, que continuam fazendo sucesso até hoje. Entretanto, suas músicas não possuem mais um caráter tão crítico como naquele tempo, direcionando o foco para reflexões sobre a vida e o cotidiano.
Hoje observa-se no Brasil, quanto ao meio musical, uma forte ascensão
do chamado Sertanejo Universitário, que traz em suas canções uma mistura de romance, paixão, curtição e farra, perfil da juventude de classe média brasileira. Outro estilo musical sempre em destaque é o funk, que ganhou força especialmente por ser uma forma de manifestação da realidade das favelas e periferias. Suas músicas contêm, além de um forte cunho sexual, um desejo de ostentação que demonstram a vontade de serem aceitos e incluídos na sociedade capitalista, tão marcada pela desigualdade entre as classes sociais e onde se vê cada vez mais a ascensão econômica dos mais abastados, em detrimento do mais pobres e necessitados.
Na seara musical, o papel de criticidade do atual contexto social em que
vivemos fica a cargo do rap, também presente nas periferias. Ao contrário do funk, que apenas demonstra a realidade, o rap é um meio utilizado pelos seus cantores para dar voz dos moradores dessas regiões, muitas vezes apontando a indiferença do governo quanto a essa parte da população. Nomes como Gabriel o Pensador, MV Bill, Emicida, Projota e Marcelo D2 integram os mais populares deste gênero musical.
FATORES POLÍTICOS E IDEOLÓGICOS QUE INFLUENCIARAM O GOLPE
DE ESTADO DE 1964 E O DE 2016
Com o surgimento de correntes positivistas, especialmente o positivismo
formalista, o conceito de Estado de Direito sofreu grandes deformações, uma vez que a ideia de Direito se limitava à lei. Isso provocou sérias consequências, pois formou-se o pensamento de que todo Estado conduzido por leis, independentemente de seu conteúdo axiológico, era considerado Estado de Direito, ainda que seja ditatorial. Isso esteve bastante presente no regime militar no Brasil a partir da década de 1960. Os usurpadores do poder utilizaram do produto da atividade legislativa para institucionalizarem e legalizarem o golpe e outras tantas atrocidades, sob o discurso de estarem agindo em nome da lei, buscando promover a ordem e o progresso da nação brasileira.
A partir de uma análise crítica dos contextos históricos do golpe de 1964
e 2016, verifica-se que houve fatores políticos e ideológicos determinantes para que cada um deles se desencadeasse.
Após a renúncia de Jânio Quadros ao cargo da Presidência da
República em Agosto de 1961, assumiu o governo o Vice-Presidente João Goulart. Nesse período, o mundo atravessava o momento da Guerra Fria, marcado pela Polarização entre os Estados Unidos e a União Soviética comunista. O então Presidente da República João Goulart vinha sendo acusado pelos setores militares, civis e da imprensa de ser um governo populista e de estar tentando implantar o comunismo no Brasil, principalmente depois que anunciou as Reformas de Base, visando promover, assim, a justiça social. Esse episódio ocorreu em 13 de Março de 1964, poucos dias antes do Golpe, e foi considerado o estopim rumo à tomada do poder. Era o conhecido “perigo comunista” que veio ser o argumento utilizado para justificar o episódio que se aproximava. Diante disso, os EUA temendo o Brasil se tornar comunista, procurou auxiliar o governo militar. O pensamento vigente na época era de que o Brasil estava perdido em corrupção, inflação, portanto era preciso tomar medidas urgentes para restabelecer uma suposta ordem democrática. No entanto, sabemos que o Golpe de Estado não surgiu de uma hora pra outra, mas, sim, de visões conflitantes entre a Esquerda e a Direita nos aspectos econômicos e políticos que já existiam muito antes da alegação da ameaça comunista que Jango representava.
Outro ponto de extrema relevância foi a mobilização da classe média,
que participou ativamente da Marcha da Família com Deus pela Liberdade, movimento que reuniu milhares de pessoas que formavam a parcela cristã conservadora da sociedade, tendo a imprensa brasileira enorme papel nas manifestações que se sucederam. A finalidade desse movimento foi dar respaldo popular aos militares juntamente com o apoio dos políticos envolvidos, numa tentativa dissimulada de dar ao golpe que estava prestes a acontecer o caráter de legítimo, principalmente por ter o apoio da sociedade organizada.
O anticomunismo, as articulações militares e conspirações de 1964
foram bem sucedidas, e, no mesmo ano, aproveitando-se de uma viagem interna do Presidente, o Congresso Nacional, de forma dissimulada, declarou vaga a presidência da República, formalizando, assim, um golpe de Estado.
Naquele período, o movimento foi denominado pelos militares de
revolução (revolução civil-militar), e não um Golpe de Estado. Isso pode ser explicado por que eles não se separaram da sociedade, pelo contrário, contavam com o apoio de classes dominantes, até de classes médias e uma relativa passividade de setores operários, somando-se a isso, ainda, o fato de João Goulart ter sido deposto pelo Congresso Nacional, numa tentativa de legitimar juridicamente o golpe.
A partir de então há o início das restrições de direitos e o cerceamento
das liberdades civis e democráticas, principalmente através das promulgações dos Atos Institucionais, em que foram institucionalizadas medidas como a extinção dos partidos políticos, a suspensão de direitos políticos por 10 anos, a cassação de parlamentares, a tortura, a suspensão do habeas corpus em determinados crimes, intervenções nos municípios, etc., mas todas com o objetivo de combater a subversão e as ideologias contrárias ao regime.
Destacamos o trecho inicial do primeiro Ato Institucional publicado ainda
em 1964: “É indispensável fixar o conceito do movimento civil e militar que acaba de abrir ao Brasil uma nova perspectiva sobre o seu futuro. O que houve e continuará a haver neste momento, não só no espírito e no comportamento das classes armadas, como na opinião pública nacional, é uma autêntica revolução… A revolução se distingue de outros movimentos armados pelo fato de que nela se traduz não o interesse e a vontade de um grupo, mas o interesse e a vontade da Nação… A revolução vitoriosa se investe no exercício do Poder Constituinte. Este se manifesta pela eleição popular ou pela revolução. Esta é a forma mais expressiva e mais radical do Poder Constituinte. Assim, a revolução vitoriosa, como Poder Constituinte, se legitima por si mesma".
Segundo Karl Marx A história se repete, a primeira vez como tragédia e
a segunda como farsa. Entendemos o acontecimento histórico de 1964 como a tragédia, e o mais recente na história do Brasil como a farsa.
Em se tratando desse movimento mais recente na história do Brasil — o
Impeachment da Presidente da República ocorrido em 2016 — fatores políticos e ideológicos ajudam a traçar um paralelo com o ocorrido em 1964. Nota-se que a presidente Dilma Rousseff, assim como João Goulart, possui uma agenda de Esquerda, e a insatisfação popular com o governo é representada de forma semelhante, sob influência da mídia e com o pretexto da luta contra a corrupção e de se restabelecer a “ordem e progresso” e a moralidade pública. A partir dessa dissimulação, surgem no contexto nacional figuras com a pretensão de representarem o “governo de salvação nacional”, que no período da ditadura eram representadas pelos militares.
O anticomunismo daquele período assume novos contornos em 2016. A
ameaça comunista na década de 1960, utilizada pelos setores militares e da imprensa, é equiparada ao antipetismo atualmente. Ademais, as manifestações populares favoráveis ao Impeachment revelaram com clareza a associação feita ao comunismo como um movimento maléfico a toda a sociedade, além de mostrar a insatisfação das classes sociais mais elevadas com políticas sociais implementadas pelo governo petista ao logo dos 13 anos em que esteve governando. “O anticomunismo brasileiro em 1964 logrou sucesso pela atuação da opinião pública. Podemos dizer o mesmo do antipetismo em 2016”.
Como tentativa de justificar o golpe, os envolvidos afirmam que é um
discurso falacioso, uma vez que todo o rito democrático foi seguido. Porém, o novo grupo que toma o poder aplica contrarreformas de forma autoritária em vários setores da sociedade, indo de encontro às propostas do governo democraticamente eleito, e que dificilmente seriam aprovadas nas eleições diretas. Reformas como a Trabalhista, a da previdência, o teto dos gastos públicos, entre outras, restringem e até excluem direitos sociais conquistados ao longo da história, beneficiando as elites em detrimento dos trabalhadores. Segundo o professor e político Ciro Gomes “O impeachment é o último recurso aplicado pela Constituição contra um mandato democraticamente eleito. Não foi apresentado nenhum crime de responsabilidade dolosamente cometido pela presidenta, uma vez que as chamadas pedaladas fiscais não passam de manobras fiscais que, por mais que sejam uma anomalia, não estão previstas na Constituição como passíveis de crime de responsabilidade. O que se formou, então, para a garantia da aprovação do impeachment e, portanto, do golpe, foi um consenso entre Eduardo Cunha com o vice-presidente Michel Temer e com todo o status quo do PMDB, do PSDB e de outros partidos que viram no golpe a chance de se livrarem de acusações e assaltarem o poder a fim de desenvolver seus interesses próprios, mesmo que estes tenham sido derrotados nas urnas”.
Por fim, mas não menos importante, destaca-se o movimento da Escola
Sem Partido, projeto que ganhou maior destaque a partir de 2015, como um projeto de lei na Câmara dos Deputados. À época do governo Costa e Silva, foi editado um decreto, conhecido como AI-5 da educação, em que definia “infrações disciplinares praticadas por professores, alunos, funcionários ou empregados de estabelecimentos de ensino público ou particulares”, pela prática de condutas consideradas subversivas e contrárias ao regime. O projeto que tramita na Câmara guarda semelhanças com esse decreto, uma vez que também é uma forma de controlar o que se ensina nas escolas e de tolher a liberdade de pensamento do professor, visto, na perspectiva dessa proposta, como subversivo, repetindo o discurso da ditadura militar. Há que se lembrar de que a Constituição Federal de 1988 consagrou em seus princípios fundamentais o pluralismo político e de ideias, sendo, portanto, inconcebível o cerceamento dessa liberdade fundamental.
CONCLUSÃO
Aufere-se, portanto, a partir do breve exposto acima, que é
completamente infundado enaltecer aspectos favoráveis do período ditatorial brasileiro, cuja egoísmo cruel e tirânico trouxe benesses à aristocracia daquele período em detrimento ao seio popular. Deve-se olhar pra frente e buscar uma política que, acima de tudo, busque representar fielmente os anseios comuns da sociedade democraticamente, tornando-a mais igualitária, suprida de suas necessidades básicas, e com a ideologia de um progresso justo. Referências
DANIEL, Paulo. Economia. A Economia na ditadura. Carta Capital, mar.
2012. Disponível em <https://www.cartacapital.com.br/economia/a-economia- na-ditadura>. Acesso em: 14 abr. 2018.
SANZ, Beatriz; MEDONÇA, Heloísa. Ditadura Militar Brasileira. O lado
obscuro do “milagre econômico” da ditadura: o boom da desigualdade. El País, Nov. 2017. Disponível em <https://brasil.elpais.com/brasil/2017/09/29/economia/ 1506721812_344807.html>. Acesso em: 14 abr. 2018.
ALECRIM, Edinei Messias. O SERVIÇO SOCIAL NO CONTEXTO DA
DITADURA MILITAR NO BRASIL. Disponível em: http://www.ebah.com.br/content/ABAAAfnB0AD/servico-social-no-contexto- ditadura-militar-no-brasil>. Acesso em: 14 abr. 2018.
10% da população concentrava 43,3% da renda do país em 2017, diz IBGE.