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Da ineficácia e da revogação de atos praticados

antes da falência

DA INEFICÁCIA E DA REVOGAÇÃO DE ATOS PRATICADOS ANTES


DA FALÊNCIA

Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais | vol. 53/2011 | p. 227 - 261 | Jul -
Set / 2011
DTR\2011\2843

Humberto Theodoro Júnior


Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da UFMG. Professor Titular aposentado da
Faculdade de Direito da UFMG. Membro da Academia Mineira de Letras Jurídicas, do
Instituto dos Advogados de Minas Gerais, do Instituto de Direito Comparado Luso-
Brasileiro, do Instituto Brasileiro de Direito Processual, do Instituto Ibero-Americano de
Direito Processual e da International Association of Procedural Law. Desembargador
aposentado do TJMG. Advogado.

Área do Direito: Civil; Bancário

Resumo: O presente artigo tem por escopo a análise das principais alterações
promovidas pela Lei 11.101/2005, tratando especialmente das questões processuais
relacionadas com a declaração de ineficácia e a revogação dos atos praticados pelo falido
antes da sentença de quebra, em conformidade com os arts. 129 e 130 da Lei
11.101/2005, com o objetivo de preservar a massa e os interesses de seus credores.

Palavras-chave: Lei de falências - Ineficácia e revogação de atos do falido - Vias


processuais - Ação revocatória - Recurso

Abstract: The scope of the article is the analysis of the main changes introduced by
Estatute n. 11.101/2005, dealing specially with the procedural issues related to the
annulment of fraudulent conveyances made by the debtor before the bankruptcy order,
pursuant to arts. 129 and 130 of Law 11.101/2005, in order to preserve the interests of
the bankrupt's estate.

Keywords: Bankruptcy Act - Annulment of fraudulent conveyances - Procedural issues


- Revocatory action - Appeal

Sumário:
1.Noções gerais - 2.Terminologia legal - 3.Noção de ineficácia - 4.A ineficácia e a fraude
contra credores - 5.A grande inovação jurídica ocorreu no campo procedimental -
6.Espécies de atos ineficazes no direito falimentar - 7.Vias processuais disponíveis para
discutir a fraude do art. 129 da Lei 11.101/2005: o parágrafo único - 8.Provas - 9.A
relevância do “termo legal da falência” para a ineficácia objetiva - 10.Negócios
posteriores à sentença de decretação da falência - 11.Efeitos do reconhecimento judicial
da ineficácia prevista no art. 129 da lei 11.101/2005 - 12.O casuísmo da ineficácia
objetiva - 13.Reembolso de acionista dissidente - 14.A fraude contra credores no direito
brasileiro - 15.A ação revocatória falimentar como instrumento de repressão à fraude
contra credores - 16.A relevância do elemento subjetivo na configuração da fraude -

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17.O eventus damni - 18.Atos excluídos da ineficácia em razão de plano de recuperação


judicial da empresa (art. 131 da Lei 11.101/2005) - 19.A inovação legislativa:
legitimação ativa concorrente - 20.O prazo de decadência da ação revocatória (ineficácia
subjetiva): as inovações introduzidas pela Lei de Falência e Recuperação de Empresas -
21.Prazo para a declaração da ineficácia objetiva - 22.O prazo decadencial da lei civil -
23.Legitimação passiva para a ação revocatória - 24.Competência - 25.Procedimento -
26.Natureza da decisão que reconhece a ineficácia - 27.Os efeitos da sentença
revocatória - 28.O recurso de apelação - 29.A restituição das partes ao estado anterior -
30.A situação do contratante após a declaração de ineficácia - 31.Contratantes de boa-fé
- 32.Contratante de má-fé - 33.Direito do contratante de boa-fé à reparação de perdas e
danos - 34.Securitização de créditos (art. 136, § 1.º, da lei 11.101/2005)

1. Noções gerais

As manobras fraudulentas 1 maquinadas pelo devedor em dificuldades de solvência


contra seus credores são repelidas pela lei amplamente, desde as origens romanas de
nosso sistema jurídico. A ação pauliana é o exemplo mais antigo e mais típico de
repressão ao desvio de bens praticado durante a crise da insolvência. Seu objetivo, no
Código Civil (LGL\2002\400), é recompor o acervo patrimonial do devedor, sobre o qual
os credores poderão realizar o direito de serem pagos. É bom ter sempre presente que
“o devedor responde, para cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens
presentes e futuros” (art. 591 do CPC (LGL\1973\5)). Daí que, havendo redução
ilegítima do patrimônio, por disposições praticadas pelo devedor insolvente, a pauliana
(ou revocatória) se presta a fazer com que os bens ou valores desviados revertam “em
proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores” (art. 165 do
CC/2002 (LGL\2002\400)).

Essa repressão à fraude e essa recomposição do acervo exequível tornam-se mais


necessárias na falência do empresário ou da sociedade empresária, tendo em vista a
repercussão que a ruína da empresa provoca no meio social e no mercado. Por isso, a
legislação especial disciplina a revocatória falimentar (que nada mais é do que uma
espécie da tradicional ação pauliana), atendendo às peculiaridades do juízo universal da
quebra. 2

Dois dados, desde logo, transparecem nesse regime especial: (a) há um período
suspeito, nos prelúdios da decretação da falência, no qual a lei presume certas
disposições do falido como fraudulentas, em relação à massa, sem indagar da boa ou má
intenção com que foram praticadas; e (b) estabelece, para estes atos de fraude notória,
a possibilidade de decretação de ineficácia, independentemente de ação revocatória,
permitindo sua declaração incidental, até mesmo ex officio, tal como se passa, no Código
de Processo Civil (LGL\1973\5), com as alienações em fraude de execução (art. 592, V,
do CPC (LGL\1973\5)). Fora desses casos de reação mais enérgica, a massa falida estará
munida da ação revocatória para reprimir as disposições que lhe foram prejudiciais,
tendo, porém, ônus de comprovar os requisitos normais da pauliana: o consilium fraudis
e o dano acarretado aos credores concursais.

O tratamento mais rigoroso adotado pela Lei de Falências na espécie decorre da

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experiência de que “o estado de colapso patrimonial tem sempre um período de


incubação, no qual a atividade da empresa se desenvolve de um modo mais ou menos a
normal. Nesse período, são comuns certos procedimentos do empresário, seja em busca
do seu soerguimento, seja para garantir o seu próprio futuro incerto: os truques mais
variados são usados para levantar crédito, vendas se fazem a baixo preço, expedientes
ruinosos são empregados para ostentar uma capacidade de pagar já não existente,
ativos são desviados, credores prediletos ou coniventes são beneficiados - em suma, é
encontradiço, nessa fase, todo um sortimento de atos que o devedor pode praticar em
detrimento de seus credores, seja de boa-fé ou má-fé”. 3

De tal sorte, lembra Ricardo Tepedino, a lição de Navarrini, 4 para ressaltar que, uma
vez decretada a quebra, “a tutela da revocatória surge como um instrumento de
recomposição da garantia patrimonial erodida por atos do devedor quanto já tinha
razões para suspeitar de sua queda”. 5

2. Terminologia legal

A Lei anterior tratava da repressão à fraude contra credores praticada pelo falido sob a
rubrica única de “revogação”, enquanto a Lei nova, tratando praticamente da mesma
casuística, fala em “ineficácia” e “revogação”, dando a entender que seriam duas
situações distintas: a do art. 129 da Lei 11.101/2005 (“ineficácia”) e a do art. 130 da Lei
11.101/2005 (“revogação”). 6

A distinção, porém nada tem a ver com a substância da patologia dos atos fraudulentos,
de modo que tanto os casos do art. 129 como os do art. 130 retratam atos de fraude
contra credores, todos eles ineficazes, em sentido técnico, perante a massa falida. Da
mesma forma, ocorre a revogação ( chamada de volta, para a massa, dos bens
alienados indevidamente pelo insolvente) 7 nas duas situações cogitadas pelos arts. 129
e 130. O distanciamento se dá, materialmente, quanto ao elemento subjetivo da fraude
(má-fé) e, processualmente, quanto ao procedimento necessário para o reconhecimento
judicial da fraude (ação revocatória ou simples decisão interlocutória). 8 Nas hipóteses do
art. 129, a fraude é encarada pelo legislador de maneira objetiva, não havendo
relevância a presença ou a ausência da má-fé no ato de transmissão de bens realizado
pelo devedor insolvente. Basta o enquadramento em uma das situações tipificadas na
lei. Já nas situações do art. 130, a fraude somente se configurará quando restar
comprovado “o conluio fraudulento entre o devedor e o terceiro que com ele contratar”,
do qual ainda deverá ter decorrido, comprovadamente, “o efetivo prejuízo sofrido pela
massa”.

3. Noção de ineficácia

A patologia do negócio jurídico corre quando a vontade manifestada é insuficiente para


produzir, no todo ou em parte, absoluta ou relativamente, o efeito visado pelo autor da
declaração de vontade. As consequências dessa patologia, no entanto, não são iguais
nos diversos planos por que transita o negócio jurídico.

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Sintetizemos cada um desses planos:

a) O plano da existência corresponde ao suporte fático do negócio jurídico. É bom


lembrar que os direitos subjetivos não nascem diretamente da lei, mas dos fatos que
esta preveja como idôneos a gerá-los (ex facto ius oritur). Assim, o ato antes de ser
encarado como ato jurídico deve existir como realidade material, isto é, como conjunto
de dados fáticos que corresponda ao tipo jurídico (fattispecie). Se nem ao menos esses
dados mínimos de natureza material ocorreram e a fattispecie não se configurou sequer
aparentemente, o caso é de inexistência do ato jurídico e não apenas de nulidade. 9

A inexistência, nessa ordem de ideias, é fenômeno do plano do ser. Estando incompleta


a figura material do fato típico, o fato jurídico simplesmente não existe. Logo, não se há
de discutir se é nulo ou ineficaz, nem se exige desconstituição judicial, “porque a
inexistência é o não ser que, portanto, não pode ser qualificado”. 10

b) O plano da validade é o que vem logo após o da existência e representa o necessário


a que o ato ingresse no mundo do direito, deixando de ser simples fato para adquirir a
qualidade de fato jurídico.

Superada a premissa da existência da declaração de vontade, no contexto material


cogitado pela ordem jurídica, procede-se à pesquisa em torno de sua perfeição, ou não,
isto é, se a declaração contém, ou não, algum vício invalidante (arts. 166 e 171 do
CC/2002 (LGL\2002\400)). Sabe-se que, v.g., todo negócio jurídico reclama, para sua
validade, a capacidade do agente, a licitude do objeto e a forma adequada (art. 104 do
CC/2002 (LGL\2002\400)), e que são passíveis de anulação aqueles negócios
contaminados por vício de consentimento ou incapacidade relativa do agente (art. 171
do CC/2002 (LGL\2002\400)).

Ocorre a nulidade quando falta ao negócio um dos seus requisitos essenciais, de maneira
que o evento defeituoso se apresenta como fato simples (existente), mas não como ato
jurídico. 11 Não há falta de elemento essencial, mas de requisito ligado a tal elemento. 12
Assim, não há negócio jurídico sem declaração de vontade. Mas, para ser válido o ato, é
requisito que a declaração seja feita por pessoa capaz, sem vício de consentimento.
Existência e validade são fenômenos distintos, portanto.

A sanção aplicável ao negócio praticado com ofensa aos requisitos legais de validade é a
privação de seus efeitos, por meio da nulidade ou anulabilidade.13

c) O plano da eficácia é aquele, no mundo jurídico, onde os fatos jurídicos produzem os


seus efeitos, criando as situações ou relações jurídicas, dentro daquilo que a vontade
negocial projetara. Diz-se ineficaz o negócio jurídico quando, por qualquer razão de
direito, não produz, momentânea ou permanentemente, os efeitos buscados pela
declaração de vontade.

Embora a privação de eficácia seja uma decorrência natural da invalidade (isto é, da


nulidade ou anulação do negócio jurídico), há situações em que ocorre sem qualquer
conotação com vícios ou defeitos da declaração negocial.

Há, porém, situações em que a ineficácia é empregada pelo legislador como evidente
técnica sancionatória. O ato foi validamente praticado entre as partes, mas seus efeitos
exteriores (inter alios) refletiram sobre determinadas pessoas, as quais a lei entende de
proteger mediante imunização contra tais efeitos. O negócio, então, vale entre as partes,

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mas não produz efeito perante o terceiro (ou terceiros) que a norma legal quer tutelar.
Este não é nulo, nem anulável, é negócio plenamente válido e somente não produz sua
eficácia perante terceiro ou terceiros beneficiados por inoponibilidade.14

Essa inoponibilidade, em casos como o da insolvência do devedor, permite aquilo que a


lei chama impropriamente de revogação do ato praticado em fraude dos credores, que
não é uma anulação, mas apenas um mecanismo jurídico para suspender a eficácia do
negócio, em face dos terceiros prejudicados. A expressão escorreita, in casu, não é
“revogação” (do negócio), mas “revocação” (dos bens negociados) - daí o nome
“revocatória” atribuído à ação em que se pede o reconhecimento da ineficácia dos atos
impugnados.

4. A ineficácia e a fraude contra credores

A ineficácia, em sentido lato (isto é, a não produção de efeitos jurídicos), pode decorrer
da nulidade ou da desconstituição do negócio jurídico. Em sentido estrito, porém, não é
apanágio do ato nulo ou anulável, podendo ocorrer independentemente de qualquer vício
ou defeito nos elementos essenciais do negócio jurídico ou do ato jurídico.

A fraude contra credores, nessa ordem de ideias, gera a ineficácia dos negócios do
devedor insolvente apenas porque, do ponto de vista social, não convém que os
credores, que juridicamente contavam com a garantia genérica do patrimônio do
obrigado para realização de seus créditos, se vejam em determinado momento privados
dessa mesma garantia, em razão de redução voluntária dos bens do devedor.

O devedor, por estar em débito com os credores, não perde o direito de dispor de seus
bens, mas deve fazê-lo dentro dos limites que preservem a garantia dos credores já
existentes. Ultrapassados esses limites, o ato de disposição causa prejuízo aos credores,
embora inexista sem seus elementos qualquer defeito capaz de comprometer-lhe a
validade. A censura de que se torna objeto, por isso, não lhe afeta a validade. Ocorre no
tratamento que a lei lhe reserva, ao confrontar os direitos do adquirente com os dos
credores prejudicados. Fala-se, nessa conjuntura, em vício social e não em vício de
consentimento, e tampouco em causa de nulidade da alienação, que é intrinsecamente
válida entre aqueles que a praticaram.

Mesmo isento de defeito, no plano da validade, o negócio fica passível de uma sanção,
concebida para defesa dos credores, os quais não serão alcançados pelo ato de
disposição que redundou na eliminação ou redução da garantia de solução de seus
direitos creditícios.

A legislação falimentar, desde a Lei 2.024/1908, se afastou do erro técnico cometido


pelos antigos civilistas de considerar a fraude como motivo de anulação. Procurou, desde
então, no campo da quebra, colocar a fraude e a ação revocatória no caminho indicado
pelos princípios fixados para a pauliana pelo Direito Romano, e ainda hoje dominantes
no direito comparado de raízes europeias.

Tal como já fizera a Lei 2.024/1908, a antiga Lei de Falências ( Dec.-lei 7.661/1945)
manteve-se na correta posição de não confundir anulabilidade com ineficácia (ou
inoponibilidade). Fiel à tradição romanística, ignorada pelo Código Civil (LGL\2002\400),

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a Lei Falimentar submeteu o ato defraudador dos credores do falido ao regime da


ineficácia, “que não tem no próprio ato a sua causa, mas em um fato estranho,
concernente aos seus efeitos, pelo que não toca no ato jurídico, que permanece válido”.
15
Esse continua sendo o regime da atual Lei de Falências (arts. 129 e 130 da Lei
11.101/2005).

5. A grande inovação jurídica ocorreu no campo procedimental

Ao cogitar da fraude ipso iure, aquela configurável mesmo sem má-fé dos contratantes,
o art. 52 do Dec.-lei 7.661/1945 (Lei Falimentar anterior) falava em atos que “não
produzem efeito” relativamente à massa. O atual art. 129 afirma que os mesmos atos da
enumeração da lei revogada “são ineficazes” em relação à massa falida. A mudança ficou
apenas na literalidade do texto, pois substancialmente o tratamento jurídico se manteve
inalterado. Com efeito, ser ineficaz perante a massa falida corresponde exatamente a
não produzir efeito perante ela.

No regime da lei anterior, havia submissão à ação revocatória tanto das hipóteses
elencadas no art. 52 do Dec.-lei 7.661/1945 (fraude presumida ou in re ipsa) como no
conluio fraudulento cogitado no art. 53 do Dec.-lei 7.661/1945 (fraude dependente de
prova do consilium fraudis estabelecido entre devedor e adquirente). 16 O art. 56, § 2.º,
do Dec.-lei 7.661/1945, apenas estatuía uma diferença de efeitos para a apelação
interposta contra a sentença da ação revocatória: (a) se baseada no art. 52 do Dec.-lei
7.661/1945, o recurso seria recebido apenas no efeito devolutivo (tornava-se possível a
execução provisória da sentença); (b) se lastreada no art. 53 do Dec.-lei 7.661/1945, a
apelação seria processada com os efeitos devolutivo e suspensivo (inviável se tornava a
execução provisória).

No regime da Lei 11.101/2005, a orientação é outra: não há necessidade de ação


revocatória nos casos da ineficácia prevista no art. 129. 17 O juiz está autorizado a
declará-la de ofício, desde que sua ocorrência venha a ficar evidenciada nos autos da
falência. Naturalmente, esse poder conferido ex lege ao juiz não anula a possibilidade de
o reconhecimento da fraude tornar-se objeto de ação revocatória. Nem se acham os
interessados impedidos de provocar, por petição simples, o exame incidental, pelo juiz,
da fraude objetiva. Se o juiz não se dispõe a declarar a fraude, por não havê-la como
adequadamente demonstrada no processo falimentar, ou por qualquer outro motivo, os
legitimados pelo art. 132 da Lei 11.101/2005 (administrador judicial, qualquer credor ou
Ministério Público) poderão ajuizar a competente ação revocatória, como se acha
previsto no parágrafo único do art. 129 da Lei 11.101/2005 sob comento. A ação, na
espécie, apresenta-se como mera faculdade.

6. Espécies de atos ineficazes no direito falimentar

O fato de a lei atual (assim como a anterior) tratar da ineficácia dos atos prejudiciais à
massa em dois artigos distintos (arts. 129 e 130 da Lei 11.101/2005) levou doutrina
antiga (mas não dominante) a afirmar uma substancial diferença entre os casos
agrupados em cada um dos citados dispositivos legais. Para Waldemar Ferreira, v.g., as

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hipóteses do antigo art. 52 (atual art. 129 da Lei 11.101/2005) seriam casos de
ineficácia. Já os do velho art. 53 (hoje, art. 130 da Lei 11.101/2005) corresponderiam a
atos anuláveis.18 Entretanto, a orientação que afinal predominou e subsistiu foi a que
recusou a diferença de substância entre os vários casos de fraude repelidos pela Lei de
Falências. 19

Realmente, não há nulidade ou anulabilidade no art. 129 da Lei 11.101/2005 e


tampouco no art. 130 da mesma Lei. O fenômeno jurídico é o mesmo, nas duas
situações reguladas separadamente pela Lei de Falências. Ambas cuidam de preservar a
massa dos efeitos externos do negócio jurídico praticado pelo falido em prejuízo dos
credores concursais. A sanção, em qualquer das hipóteses legais, não se passa no plano
da validade (esta é sempre mantida entre os sujeitos do negócio impugnado), mas no do
impedimento de eficácia, apenas em face dos credores prejudicados (massa falida). 20
Onde, então, encontrar a diferença dos regimes adotados nos arts. 129 e 130 da Lei
11.101/2005? A sanção é única, mas as condições de aplicação são diversas.

Daí ser cabível a seguinte distinção:

a) atos ineficazes de forma objetiva (fraude in re ipsa), configuráveis sem necessidade


de prova do intuito de prejudicar os credores (art. 129 da Lei 11.101/2005);

b) atos ineficazes de forma subjetiva, somente configuráveis quando presentes as


condições do art. 130 (expedientes reveladores de conluio para lesar os credores do
falido).

A ineficácia objetiva, na sistemática da lei atual, não depende de ação revocatória para
ser conhecida; pode ser declarada incidentalmente (até de ofício), desde que
comprovados, nos autos da falência (ou de outra ação ligada ao processo falimentar), os
elementos objetivos de sua configuração legal. Havendo ausência ou insuficiência de tais
provas no processo falimentar, a discussão será remetida para ação própria. A ação
revocatória, portanto, não se revela obrigatória, em princípio, mas pode vir a ser
utilizada, conforme as circunstâncias do caso (art. 129, parágrafo único, da Lei
11.101/2005).

A ineficácia subjetiva (art. 130 da Lei 11.101/2005) por sua vez, nunca será declarável
incidentalmente na falência; dependerá sempre da instauração da ação revocatória
disciplinada nos arts. 132 e 135 da Lei 11.101/2005, em cuja instrução haverão de ser
provados os dados objetivos e subjetivos do ato praticado em prejuízo da massa falida.

7. Vias processuais disponíveis para discutir a fraude do art. 129 da Lei


11.101/2005: o parágrafo único

Além da (a) declaração judicial, provocada pela parte ou ex officio, e retratada em


decisão interlocutória nos autos da falência, e (b) da ação revocatória processada à
parte e sob procedimento ordinário (art. 134), a Lei 11.101/2005 ainda prevê:

a) arguição da fraude in re ipsa (ineficácia objetiva) como matéria de defesa; ou

b) em ação declaratória incidental.

Vê-se, pois, que o problema da ineficácia objetiva pode ser aventado tanto como objeto

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de ação principal como em incidente de outra ação ou do próprio processo falimentar.


Se, v.g., o terceiro utiliza ação reivindicatória para reclamar a posse do bem que lhe
transmitiu o falido, a massa poderá se defender arguindo em contestação a fraude
enquadrável num dos itens do art. 129 da Lei 11.101/2005.

Se é a massa que está reivindicando o bem do falido e o possuidor se defende arguindo


sua qualidade de proprietário, é possível, após a contestação, a propositura, nos
mesmos autos, da declaratória incidental a que alude o art. 325 do CPC (LGL\1973\5). 21

Enfim, suscitada regularmente a questão da ineficácia relativa objetiva em qualquer


processo por parte legítima para argui-la, sua declaração poderá ocorrer em sentença de
qualquer modalidade de ação de conhecimento, de que participe a massa falida, seja
como autora ou ré. 22

8. Provas

O art. 129 da Lei 11.101/2005 dispensa o elemento subjetivo ( conluio entre devedor e
terceiro para “fraudar credores”, ou conhecimento, por parte do terceiro, do “estado de
crise econômico-financeira do devedor”). Não se exija, portanto, prova de tais elementos
subjetivos para o reconhecimento pelo art. 129 da Lei 11.101/2005).

O dispositivo legal, todavia, identifica, com precisão, os elementos objetivos reclamados


para a configuração do prejuízo autorizador da incidência da sanção de ineficácia dos
atos de disposição praticados. Com base em circunstâncias temporais (proximidade da
quebra) e no comprometimento evidente que o negócio praticado pelo falido
representou, naquela oportunidade, para os interesses da massa de credores, a lei,
praticamente, o presume danoso ou lesivo.

Deve-se ponderar, todavia, que se é indiferente a inexistência ou não de prova de má-fé


(conluio fraudulento), é indispensável que todos os dados fáticos descritos em cada
inciso do art. 129 da Lei 11.101/2005 estejam convincentemente revelados nos
elementos constantes dos autos principais ou de algum procedimento acessório, como
habilitação de crédito, embargos de terceiro etc.

É que se trata de atos anômalos, constantes de enumeração taxativa e submetidos à


tipicidade legal rigorosa. Há sempre a colocação do evento dentro de um lapso de
tempo, que a lei trata como “período suspeito”, no qual (confundindo, ou não, com o
“termo legal da falência”) 23 já era possível prenunciar o estado falimentar. Somente pela
rigorosa subsunção do caso concreto à fattiespecie da lei, será possível reconhecer a
incidência da sanção do art. 129 da Lei 11.101/2005, motivo pelo qual não se pode
prescindir da presença de provas convincentes a seu respeito. Inexistindo tais elementos
de convicção, inadmissível será o reconhecimento incidental da ineficácia e somente por
ação própria (revocatória) se viabilizará a respectiva declaração judicial.

Quando se trata de apurar a má-fé (conluio fraudulento) exigida como condição da


revocatória fundada no art. 130, é quase sempre difícil, ou mesmo impossível, obter-se
prova direta a seu respeito, devendo o convencimento do juiz, na maioria das vezes,
formar-se por meios indiretos (prova circunstancial ou indiciária). Essa dificuldade não
existe quando o caso é de tipificar, objetivamente, as causas de ineficácia previstas no

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art. 129 da Lei 11.101/2005. O pagamento de dívida não vencida dentro do termo legal
da falência, a dação em pagamento dentro do mesmo termo, o ato gratuito praticado
nos dois anos antes da decretação da falência, a venda do estabelecimento sem o
consentimento dos credores e o registro de direito real após a decretação, tudo isto
corresponde a eventos facilmente apuráveis mediante prova documental, pública ou
particular, de maneira que o juiz não poderá se contentar, para decretar a ineficácia
prevista no art. 129 da Lei 11.101/2005, com simples alegações ou meras suposições ou
suspeitas. Deverá apoiar-se sempre em elementos de prova consistentes disponíveis nos
autos. 24

9. A relevância do “termo legal da falência” para a ineficácia objetiva

Os atos lesivos do insolvente anteriores ao marco fixado pelo “termo legal da falência”
(art. 99, II, da Lei 11.101/2005) não se incluem, em princípio, na presunção objetiva de
fraude à massa. Se configuraram fraude contra credores, esse defeito do negócio
jurídico haverá de ser suscitado e dirimido em ação pauliana, nos moldes do Código Civil
(LGL\2002\400) (art. 161). Seu manejo caberá somente aos credores que já o eram ao
tempo dos atos impugnados (art. 158, § 2.º, do CC/2002 (LGL\2002\400)), pois foram
eles, àquele tempo, os únicos prejudicados pela criação ou agravamento da insolvência
provocada pelo ato de disposição do devedor.

Fora do termo legal (ou de outro lapso fixado pelo art. 129 da Lei 11.101/2005 para
delimitação do “período suspeito”), não se pode reconhecer de imediato lesividade à
massa falida, que ao tempo do ato ainda não se formara, nem tivera seus interesses
projetados retroativamente no tempo, por decorrência da sentença ou da lei.

Portanto, o administrador da massa e os credores posteriores ao ato impugnado e


contemporâneos à sentença da quebra não se investem de legitimidade para postular a
declaração de ineficácia de negócios antigos do devedor, cujo ataque estaria restrito
apenas aos legitimados pelo Código Civil (LGL\2002\400) para a ação pauliana.

10. Negócios posteriores à sentença de decretação da falência

O regime especial de ineficácia falimentar (art. 129 da Lei 11.101/2005) circunscreve-se


aos atos válidos do devedor praticados antes da sentença de decretação da quebra.
Estes atos, embora nocivos aos credores, continuam subsistindo entre as partes que o
realizaram. Não produzem, porém, efeitos perante a massa, em virtude da sanção de
ineficácia relativa que lhes impõe o art. 129 da Lei 11.101/2005.

Para os atos de disposição de direitos ou alienação de bens posteriores à abertura da


falência, não se aplica referida ineficácia, visto tratar-se de atos nulos, se tiverem por
objeto bens, interesses, direitos e obrigações compreendidos na falência. 25 E, sendo
nulos, não têm aptidão para produzir efeitos; logo, não hão de sujeitar-se ao regime
especial da ineficácia relativa, concebido justamente para preservar a validade entre as
partes, mesmo depois de decretada a medida prevista no art. 129 da Lei 11.101/2005. A
sanção que se aplica aos atos do falido posteriores à quebra é a da invalidade total, quer

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

para a massa, quer para as próprias partes do negócio ilicitamente praticado (a nulidade
repercute erga omnes).

11. Efeitos do reconhecimento judicial da ineficácia prevista no art. 129 da lei


11.101/2005

Reconhecida, em sentença ou em decisão interlocutória, a ineficácia objetiva prevista no


art. 129, o negócio impugnado não se anula, apenas não poderá ser oposto à massa
falida. Dessa maneira, os bens alienados serão arrecadados, se ainda não o foram. Não
voltarão jamais, de forma completa, ao estado anterior à alienação. A revogação se dá
apenas em favor do juízo concursal e nunca em prol do devedor alienante. A massa,
beneficiando-se da arrecadação, terá de agir, em face do contratante, na forma prevista
no art. 136, para evitar enriquecimento sem causa. 26

Se os efeitos da falência cessarem, sem que os bens revocados para a massa tenham
sido expropriados em arrematação, ou outra forma de alienação judicial de realização de
ativo, a liberação de tais bens dar-se-á para o terceiro adquirente. Respeitar-se-á o
negócio alienatório, cuja validade não chegou a se comprometer. 27

12. O casuísmo da ineficácia objetiva

O art. 129 arrola, em enumeração taxativa, os casos em que, com ou sem propósito de
lesar credores, o ato do falido, praticado em momento definido pela lei, será
objetivamente qualificado de ineficaz perante a massa. Alguns ocorrem dentro do “termo
legal da falência”; outros, “nos dois anos anteriores à decretação da falência”; e apenas
um, após tal decretação.

Os atos fraudulentos do falido cuja ineficácia pressupõe prática dentro do termo legal
são:

a) o pagamento de dívida não vencida, qualquer que seja o meio extintivo de crédito
utilizado (art. 129, I, da Lei 11.101/2005);

b) o pagamento de dívida vencida, efetuado por forma diversa da prevista no contrato


(art. 129, II, da Lei 11.101/2005);

c) a constituição de garantia real para dívida previamente contraída (art. 129, III, da Lei
11.101/2005);

d) a venda ou transferência de estabelecimento sem consentimento dos credores (art.


129, VI, da Lei 11.101/2005).

Os que, para serem havidos como ineficazes, devem ter sido praticados no prazo
suspeito (até dois anos antes da decretação da falência) são:

a) o ato praticado a título gratuito (art. 129, IV, da Lei 11.101/2005);

b) a renúncia a herança ou a legado (art. 129, V, da Lei 11.101/2005).

Após a decretação da falência, os atos que a lei qualifica como ineficazes consistem nos

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

registros de direitos reais e de transferência de propriedade, ou na averbação relativa a


imóveis pertinentes à massa, cujos títulos são anteriores, mas só foram levados ao
registro público após a sentença de instauração da execução coletiva do falido (art. 129,
VII, da Lei 11.101/2005). O STJ exclui da regra em apreciação os apartamentos
residenciais adquiridos da construtora, antes de sua quebra, desde que a aquisição
tenha ocorrido de boa-fé. 28

Há, ainda, fora do rol do art. 129 da Lei de Falências, um caso de ineficácia perante a
massa, que se acha previsto na Lei das Sociedades Anônimas (art. 45, § 8.º, da Lei
6.404/1976).

Deve-se ressaltar, mais uma vez, que a lei estabelece um rol fechado (numerus
clausus), de sorte que as hipóteses do art. 129 da Lei 11.101/2005, além de típicas,
correspondem a um “elenco taxativo, não comportando por isso qualquer ampliação”. 29

13. Reembolso de acionista dissidente

Fora da Lei de Falências e no bojo da Lei de Sociedades Anônimas, há previsão de mais


um caso de ineficácia de ato jurídico da companhia falida. Trata-se do reembolso em
favor do acionista dissidente, que a Lei 6.404/1976 considera ineficaz em relação aos
credores anteriores à retirada e cuja ineficácia pode ser arguida após a falência da
sociedade, se os ex-acionistas não foram substituídos e se a massa não bastar para o
pagamento dos créditos mais antigos (art. 45, § 6.º, da Lei 6.404/1976).

A Lei societária fala em ação revocatória para reconhecer dita ineficácia, harmonizando-
se com a Lei de Falências anterior, que submetia todos os casos de ineficácia ao regime
de ação revocatória. Como, no entanto, o caso é de ineficácia objetiva, no regime
falimentar atual não haverá mais obrigatoriedade de recorrer à ação revocatória,
podendo-se reconhecê-la incidentalmente, até mesmo ex officio, como hoje permite o
parágrafo único do art. 129 da Lei 11.101/2005. 30

14. A fraude contra credores no direito brasileiro

Por meio do direito português (ordenações do reino), nosso ordenamento jurídico


recebeu o instituto da ação pauliana nos moldes fundamentais com que o forjou a
compilação de Justiniano.

Hoje, pode-se afirmar que três são as principais sedes normativas de repressão à fraude
contra credores no direito positivo brasileiro:

a) o Código Civil (LGL\2002\400), que cuida da ação pauliana, propriamente dita, nos
arts. 158 a 165, ou seja, no Capítulo relativo aos “defeitos do negócio jurídico”;

b) a Lei de Recuperação de Empresas, que trata da ineficácia dos atos do devedor antes
da quebra a ser promovida por meio da ação revocatória, nos termos do art. 130, ou até
de ofício para aqueles atos arrolados no art. 129; e

c) o Código de Processo Civil (LGL\1973\5), que prevê a fraude de execução,


reconhecível incidentemente no curso da execução forçada, independentemente de ação

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

e sentença (arts. 592, V, e 593, CPC (LGL\1973\5)).

De início, cumpre afirmar que não há diferença de substância entre a fraude cogitada em
cada um destes três segmentos do direito nacional, mas apenas variações que se
manifestam sobretudo no terreno procedimental.

15. A ação revocatória falimentar como instrumento de repressão à fraude


contra credores

A ação revocatória prevista no art. 130 da Lei 11.101/2005 não cuida de fenômeno
diferente do que é objeto da ação pauliana, regulada no Código Civil (LGL\2002\400).
Em ambas, o fato fundamental é um só: o desfalque indevido dos bens que deveriam
assegurar a satisfação do direito dos credores.

Assim, o tratamento que a Lei de Recuperação de Empresas dispensa, em sua área de


incidência, não representa senão “uma especialização da ação pauliana”. 31

Com efeito, quanto à revocatória falimentar, a visão doutrinária é a de que não se pode
deixar de ver que o remédio empresarial de repressão à fraude nasceu da própria ação
pauliana civil e não passa de mera adaptação desta às particularidades da insolvência do
devedor empresário.

“Daí dizer-se que a revocatória é a própria pauliana, facilitada no seu exercício, para
maior proteção da boa-fé e o rápido êxito dos atos e dos contratos comerciais (Butera);
32
a revocatória falimentar é uma pauliana que se vale de certas presunções no que diz
respeito ao seu exercício; a declaração de falência não cria uma ação, mas consente na
aplicação de certas presunções em razão de pressupostos de uma ação que já existe
(Ferrara); 33 a revocatória outra coisa não é senão a revocatória ordinária, alargada no
seu exercício, na sua base e nos seus efeitos (Navarrini); 34 do ponto de vista do
fundamento, nenhuma diferença se pode reconhecer entre a revocatória ordinária e
aquela falimentar (Auletta e Satta); 35 as diferenças são de ordem processual, e derivam
do fato de que a revocatória falimentar se insere em um processo executivo que está em
curso, e aquela se oferece adequada para a garantia de execução do crédito (Cosattini).
36

Trata-se, na realidade, de uma evolução da fraude contra credores, direcionada no


sentido das necessidades mercantis, sem que se diluíssem por inteiro os caracteres
respectivos”. 37

Esta constatação de identidade substancial entre as duas figuras repressivas da fraude


contra credores conduz à necessidade de aproveitar a evolução técnico-jurídica de cada
um dos setores normativos do direito positivo a benefício de todo sistema, e não apenas
daquele em que a regra ou a visão atualizada se consolidou.

16. A relevância do elemento subjetivo na configuração da fraude

Dispõe o art. 130 da Lei 11.101/2005 que “são revogáveis os atos praticados com a
intenção de prejudicar credores, provando-se o conluio fraudulento entre o devedor e o

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

terceiro (…”. Ou seja, ao contrário dos atos arrolados no art. 129 da Lei 11.101/2005,
aqui exige a lei a comprovação do elemento subjetivo para que se torne possível a
declaração de ineficácia.

O elemento subjetivo, assim, ganha relevância para a configuração da fraude. O que se


observa da conjugação dos arts. 129 e 130 da Lei 11.101.2005 é ter sido instituído um
sistema de repressão à fraude contra credores em que ora o elemento subjetivo é
irrelevante, ora é essencial para a ineficácia do ato.

A ação revocatória é preciso destacar, mais uma vez, não se presta na sistemática da Lei
de Recuperação de Empresas apenas para a declaração de ineficácia de atos em que há
demonstração do elemento subjetivo. É igualmente cabível para atacar os atos do art.
129 da Lei 11.101/2005, em alguns casos mesmo sendo o elemento subjetivo
totalmente dispensável para a caracterização da fraude (v. item 5). Outrossim, a
revocatória, em se tratando de atos gratuitos que não se enquadrem na hipótese do inc.
IV do art. 129 da Lei 11.101/2005, dispensará a prova do elemento subjetivo, sendo
necessária a comprovação tão somente do eventus damni.

Destarte, quando a ação revocatória se volta contra atos de alienação onerosa e que não
se subsumam ao rol do art. 129 da Lei 11.101/2005, sua procedência reclama, além do
eventus damni (prejuízo efetivo para a massa), o elemento ético scientia fraudis por
parte do terceiro adquirente. O autor da revocatória terá a seu cargo o ônus de provar
em juízo que o adquirente praticou o ato diante de um alienante notoriamente insolvente
ou em circunstância em que havia motivo para conhecer sua situação patrimonial
deficitária.

Em suma, nossa Lei de Recuperação de Empresas, como de resto se passa no direito


comparado, divide a revocatória em duas modalidades: (a) nas hipóteses de alienação
prejudiciais à massa no período suspeito, a lei não cogita do elemento subjetivo, seja o
ato gratuito ou oneroso; para a revocação, bastará o prejuízo sofrido pela massa ativa
dos credores do empresário falido (art. 129, parágrafo único, da Lei 11.101/2005); (b)
nos demais casos de revocatória contra o ato do falido, especialmente, nos que tiverem
sido praticados a título oneroso, é indispensável a comprovação do consilium fraudis
também por parte do adquirente (art. 130 da Lei 11.101/2005).

17. O eventus damni

O êxito da revocatória depende da configuração do prejuízo sofrido pela massa falida


decorrente do ato do devedor falido. É o déficit patrimonial que afeta a garantia de
exequibilidade do passivo, gerando a efetiva impossibilidade de sua realização, que
configura o eventus damni como requisito da ação revocatória.

Desde que se apure a insuficiência do patrimônio do devedor para realizar o seu passivo,
atendido estará o pressuposto para a declaração de ineficácia do ato. É de se destacar
que, para caracterização do prejuízo, necessário é que o bem ou direito objeto de
alienação pelo falido integre a garantia dos credores, isto é, seja penhorável.

Para as hipóteses traçadas no art. 129 da Lei 11.101/2005, a própria lei já presume o
prejuízo para a massa, visto que os atos representariam um desfalque para o patrimônio

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

do empresário.

18. Atos excluídos da ineficácia em razão de plano de recuperação judicial da


empresa (art. 131 da Lei 11.101/2005)

A submissão do devedor ao regime de recuperação judicial lhe permite a prática de


alguns atos que, de ordinário, poderiam configurar a fraude objetiva prevista no art. 129
da Lei 11.101/2005, caso a recuperação se degenerasse em falência. A lei, entretanto,
os preserva de revogação desde que tenham figurado no plano de recuperação
devidamente aprovado, ainda quando ocorridos dentro do período suspeito da quebra,
posteriormente decretada.

Assim, mesmo vindo o devedor a cair em falência, o art. 131 da Lei 11.101/2005, prevê
que os atos referidos nos incs. I a III e VI do art. 129 da Lei 11.101/2005, quando
correspondam a atos previstos e realizados na forma definida no plano de recuperação
judicial, nunca serão declarados ineficazes ou revogados. São eles: o pagamento de
dívida não vencida dentro do termo legal (I), o pagamento, dentro do mesmo termo, de
dívida vencida, por forma não prevista pelo contrato (II), a constituição de garantia real,
ainda dentro do termo da falência, em benefício de dívida anteriormente contratada (III)
e a venda do estabelecimento (VI).

Restaram fora da isenção do art. 131 da Lei 11.101/2005 os atos previstos nos incs. IV
(atos gratuitos), V (renúncia a herança ou legado) e VII (registros de direitos reais
imobiliários efetuados depois da decretação da falência). Com efeito, a impossibilidade
óbvia de terem sido tais atos contemplados no plano de recuperação judicial da
empresa, faz com que a eles, realmente, não se tenha como aplicar o disposto no art.
131 da Lei 11.101/2005.

Ressalte-se, contudo, que não é qualquer ato constante dos incisos descritos no texto do
art. 129 que a lei exclui da ineficácia, mas apenas aqueles que (a) tenham sido previstos
no plano de recuperação judicial e que (b) tenham sido realizados na forma definida no
plano. Logo, o ato não incluído no plano ou praticado de modo diverso da que nele fora
previsto continuará alcançável pela declaração de ineficácia, ainda que ocorrido durante
o regime de recuperação judicial da empresa.

A explicação da norma excludente é facilmente alcançável. Se o propósito primordial da


legislação falimentar atual é salvar a empresa solvente, e se a sua recuperação está
sendo processada sob aprovação dos credores e autorização judicial, não há lugar para
se cogitar de fraude, obviamente, a não ser que o ato não encontre respaldo no plano e
na autorização do juiz. 38

19. A inovação legislativa: legitimação ativa concorrente

A legitimação ativa para o ajuizamento da ação revocatória encontrava-se prevista no


art. 55 do Dec.-lei 7.661/1945, do seguinte teor:

“Art. 55. A ação revocatória deve ser proposta pelo síndico, mas, se não o for dentro de
trinta dias seguintes à data da publicação do aviso a que se refere o art. 114 e seu

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

parágrafo, também poderá ser proposta por qualquer credor.”

Da leitura do dispositivo, depreende-se que a legitimação ativa poderia ser subdividida


em suas espécies: (a) legitimação principal e (b) legitimação subsidiária. A legitimação
ativa principal era do síndico, na qualidade de administrador da massa falida, ou seja, a
ele cabia originariamente ajuizar a ação revocatória falimentar, visto que dentre de suas
numerosas funções no procedimento concursal se inseria a de zelar pelos interesses da
massa.

A Lei 11.101/2005 inovou em matéria de legitimação ativa para o ajuizamento da ação


revocatória, rompendo com a sistemática da legislação anterior e abolindo a legitimação
principal e subsidiária entre síndico e credores, facilitando, com essa medida, o manejo
do instrumento de repressão à fraude. E, ainda, ampliou o rol dos legitimados, nele
inserindo o Ministério Público. 39

Com efeito, pela nova Lei, o Ministério Público tem legitimação ativa para ajuizar a ação
revocatória falimentar, postulando a declaração de ineficácia dos atos fraudulentos que
prejudiquem a massa. Sua atuação, portanto, não se resume apenas à atuação na
falência ou na recuperação judicial na qualidade de custos legis. Assim, a partir da
vigência da Lei 11.101/2005, não se pode mais negar ao Ministério Público a
legitimidade para a propositura de ação revocatória.

A alteração no plano da legitimidade ativa não está apenas na inclusão de mais um


legitimado - o Ministério Público -, mas na abolição da sistemática anterior de
legitimação subsidiária dos credores. A Lei 11.101/2005 outorga aos legitimados ativos -
administrador, credores e Ministério Público - legitimação concorrente. Qualquer deles
está autorizado, enquanto não ultimada a decadência, a ajuizar a ação revocatória sem
qualquer precedência/preferência entre eles. Não há mais, no atual regime, a
necessidade de se configurar a omissão do representante da massa falida para que os
demais legitimados possam ingressar, em juízo, com a ação revocatória.

Ao contemplar a legitimação concorrente, sem dúvida, a nova lei simplificou o sistema e


prestigiou o amplo acesso à Justiça, o que é salutar, considerando-se a finalidade
primordial para a qual foi historicamente engendrada a ação revocatória: a repressão da
fraude.

20. O prazo de decadência da ação revocatória (ineficácia subjetiva): as


inovações introduzidas pela Lei de Falência e Recuperação de Empresas

No que tange ao regime da decadência da ação revocatória falimentar, a Lei


11.101/2005 trouxe, também, significativas alterações se comparada ao Dec.--lei
7.661/1945.

Na sistemática anterior, previa o § 1.º do art. 56 do Dec.-lei 7.661/1945, verbis:

“Art. 56. A ação revocatória correrá perante o juiz da falência e terá curso ordinário.

§ 1.º A ação somente poderá ser proposta até um ano, a contar da publicação do aviso a
que se refere o art. 114 e seu parágrafo.”

O dispositivo supra estabelecia, para o exercício da ação revocatória, um prazo

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

decadencial de um ano contado da publicação do aviso de comunicação aos interessados


do início da realização do ativo. Para que não se deixasse ao alvedrio indefinido do
síndico, o termo inicial do prazo de um ano diante da inércia na publicação do aviso a
que aludia o art. 114 do Dec.-lei 7.661/1945, doutrina e jurisprudência assinalavam-no
como sendo aquele “a partir de quando deveria ter sido expedido ou a falência
encerrada”. 40 Isto se dava porque “não se pode permitir que o síndico seja o único
senhor plenipotenciário da ação revocatória, podendo promovê-la quando bem quiser”. 41
E continuava Nelson Nery Junior, em lições relativas ao direito pretérito:

“Não se pode conceber a condição potestativa de deixar-se ao alvedrio do síndico o


prazo, que é de ordem pública, para a propositura da ação revocatória. Não se
compatibilizam prazo de ordem pública com condição potestativa!” 42

Assim é que concluía a doutrina pátria, acerca do prazo decadencial, que:

“A fixação do prazo de um ano, a partir da publicação do aviso, só prevalece quando


respeitados todos os prazos anteriores do processo falimentar, caso em que a ação deve
ser intentada necessariamente antes de terem defluido dois anos após a declaração de
falência.” 43

Os inconvenientes da lei anterior e as discussões em torno do termo inicial do prazo de


decadência para ajuizamento da ação revocatória foram, salutarmente, eliminados na Lei
11.101/2005. No regime da nova lei, o prazo de decadência é de três anos e tem como
termo inicial de sua fluência a sentença que decreta a falência. É a partir da publicidade
da sentença que decreta a falência que terá início o prazo decadencial de três anos para
o ajuizamento da ação revocatória.

21. Prazo para a declaração da ineficácia objetiva

A Lei 11.101/2005 não contém um dispositivo específico que explicite o prazo dentro do
qual seja possível impor ao terceiro adquirente a sujeição à ineficácia cogitada no art.
129 da Lei 11.101/2005. Ao cuidar, porém, da ineficácia subjetiva (aquela em que se
registra o conluio fraudulento entre o devedor e o adquirente com o intuito de prejudicar
os credores), o art. 132 da Lei 11.101/2005 determina que a ação revocatória (art. 130
da Lei 11.101/2005) deverá ser proposta no prazo de três anos contado da decretação
da falência. Trata-se, é bom lembrar, de prazo decadencial, insuscetível, portanto, de
interrupção ou suspensão. 44

Prevendo a mesma lei que a ineficácia objetiva (art. 129 da Lei 11.101/2005) poderá ser
objeto de ação revocatória (embora não obrigatoriamente) (art. 129, parágrafo único, da
Lei 11.101/2005), não há razão para pensar que na espécie, a declaração judicial se
apresente liberada da observância do marco temporal do art. 132 da Lei 11.101/2005.
Seria incongruente admitir que a mesma ação revocatória, ora estivesse submetida a um
prazo decadencial de três anos, ora pudesse ser manejada sem subordinação a prazo
algum.

Destarte, também a declaração de ineficácia objetiva se sujeita ao prazo decadencial de


três anos cujo termo inicial é a decretação da falência.

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

22. O prazo decadencial da lei civil

É de se destacar que o prazo decadencial do art. 132 da Lei 11.101/2005 não será
aplicável para a hipótese de ineficácia subjetiva (art. 130 da Lei 11.101/2005) quando,
anteriormente, tiver se consumado o prazo da lei civil para invalidação dos atos em
fraude contra credores por via da ação pauliana.

Com efeito, a sentença que decreta a falência não reabre o prazo para que sejam
atacados atos remotos do devedor e para cuja impugnação ter-se-ia consumado a
decadência da ação pauliana, contemplada no Código Civil (LGL\2002\400). Assim, se
por ocasião da decretação da quebra tiver transcorrido o prazo decadencial de quatro
anos para o ajuizamento da ação pauliana tendo por objeto os atos do art. 130 da Lei
11.101/2005, impossível será se valer da ação revocatória para atacar o negócio
jurídico, ainda que lesivo e prejudicial aos interesses da massa.

A ação revocatória, nesta hipótese, apenas terá lugar se ainda não operada a decadência
para a ação pauliana. A regra se explica porque, enquanto não decretada a quebra, têm
os credores o direito de se valer da ação pauliana para atacar os atos fraudulentos do
devedor (ineficácia subjetiva). Se não exerceram a pretensão de declaração de ineficácia
do ato no prazo de quatro anos da lei civil, impossível será fazê-lo quando decretada a
quebra, pois do contrário seria criar uma instabilidade para as relações jurídicas o que é
de todo inconveniente. Exemplificando, se o negócio prejudicial à massa foi realizado
oito anos antes da declaração de falência, impossível será ao administrador, qualquer
credor ou ao Ministério Público postular a sua ineficácia pela via da ação revocatória. O
ato não será mais impugnável sob o fundamento da fraude contra credores (ineficácia
subjetiva), porquanto consumada a decadência máxima da Lei Civil.

Para as hipóteses de ineficácia objetiva descritas no art. 129 da Lei 11.101/2005, o


prazo decadencial para seu reconhecimento será sempre de três anos contados da
declaração de falência, não havendo que se cogitar da aplicação da lei civil. Isto se
explica porquanto os atos do art. 129 reputados ineficazes o são de forma absoluta e
pressupõem a decretação da quebra. Todos os atos praticados nos prazos ali assinalados
e que se subsumirem aos incisos do art. 129 da Lei 11.101/2005 estão eivados de
ineficácia com a decretação da quebra, podendo ser comparados aos atos em fraude à
execução. É a partir da declaração de falência que nasce a possibilidade de
reconhecimento da ineficácia objetiva.

23. Legitimação passiva para a ação revocatória

O art. 133 da Lei 11.101/2005 cuida dos legitimados passivos para a ação revocatória,
não trazendo inovações substanciais em relação ao regime anterior (art. 55, parágrafo
único, do Dec.-lei 7.661/1945). 45

Embora a literalidade do texto do artigo pareça sinalizar ser de escolha livre do autor a
indicação daqueles, entre as várias pessoas enumeradas nos incs. I e II, que figurarão
como réus na ação revocatória, o certo é que, a exemplo do que se opera com a ação
pauliana, há, in casu, um litisconsórcio necessário entre o devedor alienante e o terceiro

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

adquirente, nos termos do art. 47 do CPC (LGL\1973\5). Isto porque a sentença


alcançará a eficácia do negócio jurídico, não sendo possível, destarte, que deliberasse
apenas em face de um dos sujeitos da relação contratual.

Igualmente o subadquirente, isto é, aquele que adquiriu o bem objeto da fraude já das
mãos da pessoa que antes negociara com o devedor, deve participar do litisconsórcio
passivo da ação revocatória. Reclama-se, todavia, a ocorrência de má-fé, ou seja,
deverá o subadquirente ter conhecimento real ou presumido 46 do prejuízo que da
alienação pelo devedor primitivo (falido) resultou para os credores. Assim, para que o
subadquirente esteja legitimado a figurar no polo passivo, terá a petição inicial que fazer
alusão ao elemento subjetivo. Este deverá estar ao menos afirmado na peça de ingresso,
pois do contrário restará patenteada a ilegitimidade passiva a ensejar a extinção do
processo sem julgamento de mérito (art. 267, VI, CPC (LGL\1973\5)). A investigação
sobre a configuração, ou não, da má-fé in concreto integrará, por sua vez, o mérito da
ação revocatória. Vale dizer: a má-fé, enquanto condição da ação, bastará estar
afirmada na petição inicial; enquanto mérito, para ensejar a procedência do pedido,
deverá ser comprovada pelo autor e reconhecida pela sentença da revocatória.

Na hipótese de haver uma cadeia de sucessivas alienações, a título oneroso, em relação


a cada um dos adquirentes terá que ser comprovado o requisito da participação na
fraude, de sorte que aqueles que agiram de boa-fé serão excluídos do alcance da
sentença na ação revocatória. 47 Logo, se o último adquirente estiver na titularidade da
coisa de boa-fé, a procedência da ação revocatória somente obrigará aqueles que
reconhecidamente participaram da fraude. Não estando mais o bem defraudado em seu
poder, a sentença lhes imporá a obrigação de repor à massa ou seu valor de mercado,
nos exatos termos do art. 135.

24. Competência

O juízo competente para processar e julgar a ação revocatória é o da falência, nos


precisos termos do art. 134 da Lei 11.101/2005. O juízo da falência, por sua vez, deverá
ser aquele do local do principal estabelecimento do devedor ou da filial de empresa que
tenha sede fora do Brasil (art. 3.º da Lei 11.101.2005).

A competência, na hipótese, é de natureza absoluta, estando submetida ao regramento


jurídico desta: pode ser arguida em preliminar da contestação ou a qualquer tempo;
pode ser declarada de ofício e reconhecida em qualquer grau de jurisdição (art. 113 do
CPC (LGL\1973\5)).

Na definição da competência para a ação revocatória, nenhuma relevância tem a


natureza do crédito. Daí ter o STJ firmado a orientação no sentido da competência da
Justiça comum ainda que o crédito seja trabalhista: “ Conflito de competência. Ação
pauliana. Execução trabalhista.- É da justiça comum a competência para julgar ação e
anulação de ato praticado em fraude a credores, ainda que um destes tenha crédito
trabalhista”. 48

Em se tratando de ação revocatória, a competência será sempre do juízo da falência.

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

25. Procedimento

A ação revocatória segue o rito comum ordinário regulado pelo Código de Processo Civil
(LGL\1973\5), sendo-lhe aplicáveis todas as regras procedimentais.

Na sistemática da legislação anterior, embora houvesse a previsão no art. 56 da


submissão da ação revocatória ao procedimento ordinário, a própria Lei de Falências
estabelecia algumas regras procedimentais de exceção, tais como relativas a prazos
processuais e férias forenses. Assim sendo, à vista da polêmica que se instaurou quanto
à aplicação dessas normas de exceção também à ação revocatória, o STJ se pronunciou,
naquela oportunidade, no sentido afirmativo:

“- Em ação revocatória, os prazos não se suspendem pela superveniência das férias


forenses.

- Não obstante a imposição legal de observância do procedimento ordinário em ações


revocatórias, a verificação e contagem dos prazos, em consonância com o princípio da
especialidade, devem observar as normas definidas pela Lei de Falências.
49
Recurso especial não conhecido”.

O debate não tem mais razão de ser, porquanto a nova lei, ao contrário da anterior e
dentro do seu propósito simplificador da revocação de atos em fraude, não se preocupou
em excepcionar o procedimento ordinário que, neste contexto, se aplica sob a ótica
procedimental, sem ressalvas, à ação revocatória.

26. Natureza da decisão que reconhece a ineficácia

A sistemática da Lei de Falências permite que o reconhecimento judicial da ineficácia se


dê ora por sentença, ora por decisão interlocutória. Se o caso for de fraude subjetiva
(art. 130 da Lei 11.101/2005), somente em ação revocatória, sob rito ordinário, poderá
a ineficácia (dita “revogação” pela lei) ser declarada. O ato judicial configurará, portanto,
sentença, como expressamente reconhece o art. 135 da Lei 11.101/2005. Quando,
porém, a ineficácia é objetiva (art. 129 da Lei 11.101/2005), permite a lei que seu
reconhecimento tanto se dê em ação revocatória (sentença) como em incidente do
processo falimentar (decisão interlocutória) (art. 129, parágrafo único, da Lei
11.101/2005).

Mas a natureza do ato decisório não se define pela forma, mas pelo conteúdo, de
maneira que uma decisão pode assumir a natureza declaratória ou constitutiva, quer
revestindo a forma de sentença, quer a de decisão interlocutória.

No direito brasileiro, como no italiano, não há atos do devedor falido que possam ser
havidos como ineficazes para a massa sem pronunciamento judicial (sentença ou decisão
interlocutória, conforme os arts. 129, parágrafo único, e 135 da Lei 11.101/2005).

Pajardi, embora reconheça que sempre se trata de ineficácia relativa, e não de


anulabilidade do ato fraudulento, considera simplesmente declarativa a sentença que se
ocupa dos casos de fraude in re ipsa, porque o juiz se limita a verificar o fato e sua

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antes da falência

cronologia e nada mais faz do que declarar o efeito gerado por força da própria lei. Em
face, porém, da ineficácia que a lei condiciona a situações subjetivas e objetivas, a
sentença não se restringiria, em semelhantes circunstâncias, a declarar a proclamação
da lei, mas faria um acertamento sobre as condições de sua atuação. A ineficácia, então,
só atingiria o ato impugnado depois de acertados os seus pressupostos objetivos e
subjetivos pela sentença. Daí falar-se em “sentença tipicamente constitutiva”. 50
Também para Maggiore a sentença da revocatória “tem seguramente natureza
constitutiva”. 51

Há, outrossim, os que defendem a natureza sempre declaratória da sentença que


reconhece a ineficácia dos atos do insolvente em fraude de seus credores. 52

Pensamos que nenhuma sentença declaratória se profere sem um acertamento em torno


dos fundamentos de fato e de direito da pretensão deduzida em juízo. Não procede,
destarte, a distinção entre declaratória e constitutiva a partir do fato de o
pronunciamento judicial ter sido ou não precedido do acertamento em torno de
determinados fatos. Se, na ação revocatória do art. 129 da lei brasileira ou do art. 64 da
lei italiana, não se deve acertar sobre a existência ou não do elemento subjetivo
consilium fraudis, o certo é que o promovente da demanda terá de provar a existência
do ato, seu conteúdo e sua condição cronológica. E será à luz desses fatos comprovados
que a sentença irá declarar a ineficácia do negócio jurídico perante a massa. 53 Por que,
então, ter-se como declaratória a sentença nessa hipótese, mas não quando acerta
sobre o consilium fraudis, reclamado pelos arts. 130 da lei brasileira e 67 da lei italiana?
A diferença da área de cognição e acertamento é apenas quantitativa: menor na
primeira ação (só elementos objetivos) e maior na segunda (elementos objetivos e
subjetivos).

Não é, em nosso modo de ver, pela quantidade do material submetido à cognição e


acertamento judicial que a sentença se apresenta como declaratória ou constitutiva. É,
isto sim, pela força de alterar a situação jurídica material existente entre as partes, que
uma sentença ultrapassa os limites da declaratividade para penetrar no terreno da
constitutividade.

Se, pois, a sentença da revocatória falimentar, em todas as suas modalidades, não


atinge a essência do negócio jurídico e tão só reconhece a fraude em face da massa,
muito mais natural será qualificá-la como declaratória do que como constitutiva, em
qualquer das hipóteses legais. O efeito típico da revocatória, aliás, se passa no plano
processual, não no material. Acolhido o pedido de reconhecimento de fraude contra a
massa, o efeito do julgado será submeter à execução coletiva os bens alienados e os
valores dispostos pelo devedor como se não tivessem deixado o patrimônio do devedor.
Permanecem na titularidade jurídica do terceiro adquirente e, mesmo assim, suportam
os atos executivos pelas dívidas do alienante. Tudo se resolve, pois, no campo
processual da responsabilidade patrimonial executiva, que pelo Código de Processo Civil
(LGL\1973\5) é ordinariamente do devedor, mas que, excepcionalmente, também pode
alcançar terceiros (arts. 592 e 593 do CPC (LGL\1973\5)).

Se, em suma, não ocorre alteração substancial na relação jurídica conhecida e acertada
em juízo, a sentença a seu respeito é melhor qualificada como declaratória do que como
constitutiva. 54

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

27. Os efeitos da sentença revocatória

Embora o art. 135 cuide dos efeitos da sentença que julga a ação revocatória, o seu teor
também se estende à declaração de ineficácia, ex officio ou incidental do art. 129. Nos
seus efeitos, a sentença ou a decisão interlocutória se equiparam, porquanto em ambas
haverá declaração de ineficácia do ato.

Declarada a ineficácia, a consequência inevitável é que o particeps fraudis (adquirente)


conserva intacta a sua propriedade sobre o bem que lhe transmitiu o devedor, até que
venha a ocorrer sua expropriação com entrega do produto para a massa. Se, portanto,
houver a realização do passivo sem que seja necessária a expropriação do bem objeto
da revocatória, o adquirente obterá sua liberação de todos os riscos com que a sentença
de procedência o ameaçava.

Do fato de ter sido sucumbente na ação revocatória não decorre para o particeps fraudis
nenhum direito imediato a ser reclamado nem da massa credora nem do devedor.
Somente se realizado o resgate do débito do falido com o produto da expropriação do
bem é que sofrerá o adquirente um efetivo desfalque patrimonial, que virá desequilibrar
a equação do contrato oneroso por meio do qual houve a propriedade do bem
questionado. Tratando-se, pois, de ineficácia o terceiro não tem de pronto nenhum
ressarcimento a pleitear, nem mesmo a restituição do preço pago. Eventual direito
indenizatório somente poderá reclamar no momento posterior da concreta expropriação
do bem para realização do passivo, tornada possível em virtude da sentença revocatória.
Exceção que se opera encontra-se prevista no art. 136 (ver adiante itens 29 e ss).

28. O recurso de apelação

O ato judicial que declara a ineficácia, em sede de ação revocatória, tem natureza de
sentença e, enquanto tal, é apelável (art. 135, parágrafo único, da Lei 11.101/2005).

A lei anterior (art. 56, § 2.º, do Dec.-lei 7.661/1945) regulava especificamente os efeitos
do recurso de apelação que, para as hipóteses das fraudes do art. 52 do Dec.-lei
7.661/1945 (atual art. 129 da Lei 11.101/2005), teria efeito meramente devolutivo. Nos
casos do art. 53 do Dec.-lei 7.661/1945, o apelo seria recebido em ambos os efeitos.

A Lei 11.101/2005 nada dispôs a esse respeito, pelo que se aplicam, na integralidade, as
normas do Código de Processo Civil (LGL\1973\5), sendo o recurso de apelação contra a
sentença revocatória dotado do duplo efeito: devolutivo e suspensivo. Em se tratando,
contudo, de declaração de ineficácia incidental nas hipóteses do art. 129 da Lei
11.101/2005, o ato judicial terá natureza interlocutória e, por conseguinte, impugnável
através de agravo de instrumento, cujo efeito é apenas devolutivo.

29. A restituição das partes ao estado anterior

No regime do Dec.-lei 7.661/1945, uma vez acolhida a ação revocatória, sem distinção

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

de fundamentos invocados, a massa tinha que restituir, desde logo, o que fora prestado
pelo contratante, ou, se não o fizesse, o contratante seria admitido no concurso como
credor quirografário (art. 54, § 1.º, do Dec.-lei 7.661/1945).

Pela lei atual, as partes retornam ao estado anterior, mas apenas o contratante de boa-
fé terá direito restituição dos bens ou valores entregues ao falido (art. 136, caput, da Lei
11.101/2005).

Outra novidade é a exclusão, do campo da ineficácia, das cessões de direitos praticados


pelo falido nas operações de securitização de créditos (art. 136, § 1.º, da Lei
11.101/2005) (ver adiante o item 34).

Por isso, a restituição das partes ao estado anterior, de que fala o art. 136 da Lei
11.101/2005, tem de ser entendida no sentido que indica o fenômeno da ineficácia
relativa, que, no caso da falência, corresponde à inoponibilidade do negócio apenas à
massa. A restituição, destarte, coloca os bens ou valores alienados pelo falido na
situação anterior ao ato de disposição, tão somente para permitir que a massa os
arrecade ou se valha dos direitos concursais sobre eles, como se a alienação não tivesse
sido praticada pelo falido. Essa, e nada mais, é a restituição ao estado anterior, in
casu.55 A possibilidade de recuperação do que se pagou ao falido não decorre
diretamente da sentença declaratória de ineficácia, mas do ato de arrecadação, por uma
questão de evitar o enriquecimento sem causa pela massa. Se não há a arrecadação, por
qualquer razão prática ou jurídica, não poderá o adquirente, que não perdeu a
propriedade, requerer a restituição.

30. A situação do contratante após a declaração de ineficácia

A atual Lei de Falências dispõe diferentemente sobre a situação do contratante,


conforme tenha participado do negócio de boa ou má-fé. A situação é diferente,
portanto, daquela prevista na lei revogada, que estabelecia uma única solução para
ambos os casos (art. 54 do Dec.-lei 7.661/1945). 56

O regime da Lei 11.101/2005, na matéria, é, de acordo com o art. 136, caput, o


seguinte:

a) aos contratantes de boa-fé, assegura-se o direito à restituição dos bens e valores


entregues ao falido, o que se dará independentemente de concurso com os demais
credores da falência;

b) aos contratantes de má-fé (participes fraudis), não cabe tal direito, ficando relegados
à condição de credores concursais.

31. Contratantes de boa-fé

O tratamento diferenciado para o contratante de boa-fé mencionado no art. 136 da Lei


11.101/2005 nunca terá cabimento no caso de ação revocatória acolhida com
fundamento nas previsões do art. 130 da Lei 11.101/2005, já que se referem sempre a
“atos praticados com a intenção de prejudicar credores” (portanto, atos “de má-fé”).

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

Quando o art. 136 da Lei 11.101/2005 se reporta a reconhecimento da ineficácia (art.


129 da Lei 11.101/2005) e julgamento de procedência da ação revocatória (arts. 129 e
130 da Lei 11.101/2005), não pretende que todos os casos de um e outro dispositivo
tenham sempre possibilidade de serem praticados de boa ou má-fé. O que no início do
enunciado se faz é apenas a determinação do momento processual em que se torna
realidade a ineficácia ou revogação do ato prejudicial à massa, para em seguida
estabelecer um direito ao contratante atingido pelas consequências da ineficácia - o
direito à restituição dos bens e valores entregues ao devedor (falido) - favor legal
destinado apenas ao contratante de boa-fé.

Nem se pense que por ter a declaração de ineficácia ou a procedência da ação


revocatória encontrado apoio no art. 129 da Lei 11.101/2005 sempre estaria o
contratante em situação de exercer o direito de restituição do art. 136 da Lei
11.101/2005. Na ineficácia objetiva, o que ocorre é a indiferença quanto ao elemento
subjetivo da fraude, e não a presunção legal de boa-fé. Dessa maneira, mesmo estando
configurada uma situação arrolada no art. 129 da Lei 11.101/2005, pode o contratante
ter agido em conluio com o falido para prejudicar os credores. Não lhe socorrerá, então,
o direito à restituição dos bens e valores que tiver entregue ao devedor.

32. Contratante de má-fé

O fato de o art. 136 da Lei 11.101/2005 não prever para o contratante de má-fé o
direito à restituição dos bens e valores entregues ao falido não o priva do direito de
cobrar o respectivo ressarcimento. O contrato, in casu, não é simulado, mas verdadeiro,
de sorte que, não havendo reembolso, a massa estaria se locupletando injustamente. O
que a lei lhe nega é apenas a restituição, fora do concurso com os demais credores (nos
moldes dos arts. 85 a 93 da Lei 11.101/2005) favor conferido apenas aos contratantes
de boa-fé. Aos que agiram de má-fé, restará o direito de habilitar seu crédito na classe
que lhe corresponder. 57

33. Direito do contratante de boa-fé à reparação de perdas e danos

O contratante de má-fé, por ter sido coautor da fraude cometida pelo devedor
insolvente, nada tem a reclamar, quanto aos prejuízos que a decretação de ineficácia
afinal lhe acarretar. É, perante a falência, um credor a mais cujo direito se submete aos
azares do concurso de credores, e se limita ao que efetivamente pagou ao falido.

Ao contratante de boa-fé, além da restituição - fora dos percalços do concurso com os


demais credores - do que efetivamente pagou ao falido, a lei lhe reconhece o direito de
demandar o devedor (falido) ou seus garantes, pela indenização das perdas e danos que
a ineficácia decretada lhe provocou (art. 136, § 2.º, da Lei 11.101/2005). 58 Sua
condição é a de vítima de um ato ilícito cometido pelo alienante (o falido), único que,
realmente, cometeu a fraude contra os credores prejudicando não só estes, como
também o contratante de boa-fé. A indenização deve ser ampla e completa, de modo a
abranger todo prejuízo - dano emergente e lucros cessantes - decorrente da perda do
bem arrecadado pela massa. Só a restituição da massa não é bastante para reparar todo

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

o prejuízo. Por isso, o art. 136, § 2.º, da Lei 11.101/2005, confere ao contratante o
direito de reclamar do falido o ressarcimento daquilo que sobejar à reposição efetuada
pela massa falida.

A lei prevê que essa ação indenizatória, que é estranha ao processo falimentar, pode ser
manejada a qualquer tempo. Se se voltar contra garantes não falidos, o ajuizamento
pode acontecer antes mesmo do encerramento do processo falencial. Contra o falido,
todavia, não há como exigir-lhe a indenização senão depois de encerrado o
procedimento concursal, visto que, enquanto este estiver pendente, todo o seu
patrimônio exequível estará integrado à massa falida e submetido ao regime legal que
exclui ações ou execuções separadas contra o devedor. A ação, portanto, somente se
apresentará eficiente após o encerramento da falência e quando o falido tiver refeito seu
patrimônio. 59

34. Securitização de créditos (art. 136, § 1.º, da lei 11.101/2005)

Securitizar (anglicanismo formado a partir de securitization) corresponde ao negócio


voltado para a criação de securities, ou seja, de títulos para lançamentos no mercado de
valores (valores mobiliários, na linguagem mercadológica nacional). 60

Os créditos (ativos) de uma empresa, nesse tipo de operação, são cedidos a uma
empresa que se especializa em criar títulos ou valores mobiliários. A securitizada
antecipa a receita correspondente aos seus recebíveis, vendendo-os à securitizadora.
Tomando os créditos cedidos como lastro, a securitizadora completa a operação,
emitindo os títulos que serão, finalmente, comercializados no mercado de valores.

Ocorrendo a eventualidade da falência da empresa securitizada, prevê o § 1.º do art.


136 da Lei 11.101/2005 que a cessão de créditos entre o falido e o securitizador não
será objeto da declaração de ineficácia ou de revogação. O fim expresso do preceito é
proteger os portadores dos valores mobiliários emitidos pelo securitizador, justamente
com a garantia das referidas cessões de crédito. Estes terceiros não devem ser atingidos
nem mesmo quando tenha ocorrido alguma manobra fraudulenta entre securitizado e
securitizador. A teoria da confiança justifica a medida de tutela à boa-fé dos
investidores.

1 Sobre o tema, há abordagem mais ampla nos Comentários aos arts. 129 a 138 da Lei
11.101/2005, de minha autoria, em parceria com Juliana Cordeiro de Faria. In: Correia-
Lima, Osmar Brina et al. Comentários à nova Lei de Falência e Recuperação de
Empresas. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 899-962.

2 O instrumento de repressão à fraude praticada pelo falido, na tradição de nosso


Direito, sempre foi uma ação, manejável perante o juízo da falência, denominada ação
revocató ria. No regime da lei atual, esta ação só é obrigatória nos casos de má-fé,
arrolados no art. 130 da Lei 11.101/2005.

3 Tepedino, Ricardo. Comentários ao art. 129. In: Toledo, Paulo F. C. Salles; Abrão,
Carlos Henrique (coords.). Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência.

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

São Paulo: Saraiva, 2005. p. 342.

4 “Los actos realizados por el quebrado durante la insolvência no deben perjudicar a la


masa, no deben, pues, tener valor frente a ésta”. Navarrini, Humberto. La quiebra.
Madrid: Instituto Editorial Réus, 1943. p. 200, n. 2.274.

5 Tepedino, Ricardo. Op. cit., p. 342.

6 Doutrina antiga, anterior ao Dec.-lei 7.661/1945, dividida em dois grupos os atos que
não produziam efeito em relação à massa falida: os ineficazes e os revogáveis.
Mendonça, José Xavier Carvalho de. Tratado de direito brasileiro. 5. ed. Rio de Janeiro:
Freitas Bastos, 1954. vol. 7, p. 511-512, n. 522; Vampré, Spencer. Tratado elementar
de direito comercial. Rio de Janeiro: F. Briguiet & Cia., 1922. vol. III, § 58, n. III.

7 Embora se use tradicionalmente a palavra “revogação”, o termo “revocatória”, com


que se indica na falência o remédio processual utilizado para recuperar para a massa os
bens alienados em fraude dos credores concursais, deriva de “revocar”, verbo que,
segundo os léxicos, corresponde a “chamar para trás, mandar voltar” (Dicionário
Hauaiss, verbete “revocar”). É justamente o que ocorre com a declaração de fraude: o
juiz chama de volta para a massa aquilo que o falido alienou em prejuízo da garantia
patrimonial dos credores. É preciso evitar qualquer conotação com o verbo “revogar”,
que equivale a “anular”, ação que efetivamente não causa a sentença da revocatória.
Requião, Rubens. Curso de direito falimentar. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. vol. I, p.
191, n. 170; Theodoro Júnior, Humberto. Comentários ao novo Código Civil
(LGL\2002\400). 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. t. I, p. 316, n. 124.7; Tzirulnik,
Luiz. Direito falimentar.6. ed. São Paulo: Ed. RT, 2002. p. 125, n. 72.

8 Também na fraude contra credores, regulada pelo Código Civil (LGL\2002\400) e


reparada mediante a ação pauliana, existem duas situações, a dos negócios gratuitos
(art. 158), que independe de má-fé ou consilium fraudis, e a dos contratos onerosos
(art. 159), que só autoriza a revogação quando praticados mediante conluio entre o
insolvente e o adquirente (particeps fraudis).

9 Betti, Emilio. Teoria geral do negócio jurídico. Coimbra, 1970. vol. III, p. 17-18, n. 58.

10 Mello, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico - Plano da existência. 10. ed. São
Paulo: Saraiva, 2000. p. 83, § 21.

11 Trabucchi, Alberto. Istituzioni di diritto civile. 38. ed. Padova: Cedam, 1998. p. 185-
186, n. 82.

12 É incompleto (inexistente) o contrato que não se formou integralmente, faltando-lhe


algum elemento essencial. “Il contratto nullo, al contrario, si palesa all’esterno come una
fattispecie complete di tutti I suoi elementi, solo che qualcuno di tali elementi è inficiato
da un vizio cosi grave che lo rende irremediabilmente inidoneo a produre effetti”. Diener,
Maria Cristina. Il contratto in generale. Milano: Giuffrè, 2002. p. 752, n. 14.5.1.

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

13 A nulidade, que é cogitada no art. 166 do CC/2002 (LGL\2002\400), representa, no


dizer de Karl Larenz, o grau máximo da ineficácia: “los efectos jurídicos pretendidos del
negocio nulo no tienen lugar, en principio, ni entre los participantes ni en sus relaciones
con terceros” (Derecho civil - Parte general. Madrid: Revista de Derecho Privado, 1978.
p. 623, § 23). A anulabilidade representa um grau menor de ineficácia. O ato jurídico
existe e tem aptidão para produzir seus efeitos, mas a lei confere a uma das partes a
faculdade de requerer, dentro de certo tempo, a sua anulação, que eliminará,
retroativamente, todos os seus efeitos. Se, entretanto, a anulação não ocorre no prazo
decadencial estipulado pela lei, “o ato se considera válido não só definitivamente para o
futuro, mas como se originariamente praticado sem vício”. Trabucchi, Alberto. Op. cit.,
p. 187, n. 83.

14 “L’inefficacia viene anche distinta in assoluta e relativa, a seconda che essa operi erga
omnes o solo nei confronti dei terzi (e non anche nei confronti delle parti). A questa
seconda figura meglio si addice il termine di inopponibilità”. Diener, Maria Cristina. Op.
cit., p. 744, n. 14.2.2.

15 Valverde, Trajano de Miranda. Comentários à Lei de Falências. 4. ed. Rio de Janeiro:


Forense, 1999. vol. I, p. 375-376, n. 386.

16 “Na lei anterior qualquer que fosse a espécie de ineficácia (objetiva ou subjetiva), sua
declaração deveria ser feita sempre por sentença terminativa de ação revocatória”.
Coelho, Fábio Ulhoa. Comentários à nova Lei de Falências e de Recuperação de
Empresas. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 353, n. 296. Apenas Silva Pacheco era de
opinião que a ineficácia objetiva do art. 52 do Dec.-lei 7.661/1945, por operar ex vi
legis, podia ser declarada ex officio, ou indiferentemente, por meio de ação, ou de
defesa, ou mesmo de forma incidental ( Processo de falência e concordata. 9. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1999. p. 340, n. 536-II).

17 “Na atual [lei], muda-se a disciplina da matéria. A ação revocatória é exigida apenas
na declaração de ineficácia subjetiva”. Coelho, Fábio Ulhoa. Op. cit., p. 353, n. 296.

18 Ferreira, Waldemar. Tratado de direito comercial. São Paulo: Saraiva, 1965. vol. XIV,
p. 590-594.

19 Lacerda, J. C. Sampaio de. Manual de direito falimentar. 13. ed. Rio de Janeiro:
Freitas Bastos, 1996. p. 145-147; Requião, Rubens. Op. cit., p. 203, n. 181; Coelho,
Fábio Ulhoa. Op. cit., p. 346, n. 286.

20 O ato impugnado, com base na fraude presumida (arts. 52 da Lei velha e 129 da Lei
atual), ou na prova do conluio fraudulento (antigo art. 53 e atual art. 130) “permanece
válido”, dentro do conceito de ineficácia, adotado pela Lei de Falências, tanto numa
como noutra hipótese. “E o meio pelo qual se obtém o pronunciamento da ineficácia
[não nulidade] dos atos jurídicos referidos no art. 52, ou a que alude o art. 53, é a ação
revocatória (art. 56)” (Valverde, Trajano de Miranda. Op. cit., vol. I, p. 375-376, n.
386). O grande comentarista da Lei de Falências anterior, como se vê, não fazia
distinção eficacial entre a revocatória no caso de fraude presumida ou comprovada, e

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

recusava o caráter de ação anulatória na última hipótese. Em qualquer caso, para


aludido autor, “o ato é declarado ou decretado ineficaz tão somente em relação à massa
falida, subsistindo, portanto, como ato válido em si mesmo, entre as partes que o
criaram” (Valverde, Trajano de Miranda. Op. cit., vol. I, p. 376, n. 386).

21 Art. 325 do CPC (LGL\1973\5): “Contestando o réu o direito que constitui


fundamento do pedido, o autor poderá requerer, no prazo de 10 (dez) dias, que sobre
ele o juiz profira sentença incidente, se da declaração da existência ou da inexistência do
direito depender, no todo ou em parte, o julgamento da lide (art. 5.º)”.

22 Coelho, Fábio Ulhoa. Op. cit., p. 353, n. 296.

23 O “termo legal de falência” é útil para a configuração da ineficácia de que cuida o art.
129 da Lei 11.101/2005. Todavia, o “período suspeito” utilizável pelo dispositivo para
fazer prevalecer tal ineficácia nem sempre se confunde com o “termo legal”.

24 Fazzio Jr., Waldo. Nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas. São Paulo: Atlas,
2005. p. 309, n. 15.2.1.

25 Valverde, Trajano de Miranda. Op. cit., p. 376, n. 387.

26 “Art. 136. Reconhecida a ineficácia ou julgada procedente a ação revocatória, as


partes retornarão ao estado anterior, e o contratante de boa-fé terá direito à restituição
dos bens ou valores entregues ao devedor.§ 1.º Na hipótese de securitização de créditos
do devedor, não será declarada a ineficácia ou revogado o ato de cessão em prejuízo dos
direitos dos portadores de valores mobiliários emitidos pelo securitizador.

§ 2.º É garantido ao terceiro de boa-fé, a qualquer tempo, propor ação por perdas e
danos contra o devedor ou seus garantes.”

27 Requião, Rubens. Op. cit., p. 194, n. 170; Martin, Antônio. Comentário ao art. 129.
In: Souza Jr., Francisco Satiro de; Pitombo, Antônio Sérgio A. de Moraes (coords.).
Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência. São Paulo: Ed. RT, 2005. p.
463. n. 276.

28 “Não se submetem aos efeitos da ação revocatória movida pela massa falida
exclusivamente contra a empresa compradora de prédio arrecadado, os terceiros de
boa-fé que adquiram os apartamentos antes da declaração da quebra da vendedora
originária” (STJ, REsp 533.656/RJ, 4.ª T., j. 06.04.2010, rel. Min. Aldir Passarinho
Junior, DJe 01.02.2011). Aliás, no caso de compromisso de compra e venda de unidades
de prédio residencial em construção, a jurisprudência tem feito prevalecer a posse e o
direito do promissário comprador até mesmo sobre a hipoteca do banco que financiou a
construtora. Através de embargos de terceiro o adquirente, pode liberar o apartamento
da execução hipotecária, se já quitou o preço da aquisição, segundo o entendimento do
STJ ( REsp 462.469/PR, 3.ª T., j. 01.04.2004, rel. Min. Nancy Andrighi, DJU 26.04.2004,
p. 166). Vale dizer: “A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro,

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia


perante os adquirentes do imóvel” (Súmula 308 (MIX\2010\1557) do STJ). (STJ, REsp
593.474/RJ, 3.ª T, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 16.11.2010, DJe
01.12.2010). No mesmo sentido: STJ, REsp 625.091/RJ, 4.ª T., rel. Min. Aldir Passarinho
Júnior, j. 09.02.2010, DJe 08.03.2010.

29 Abrão, Nelson. Da ação revocató ria. 2. ed. São Paulo: Leud, 1997. p. 63.

30 Coelho, Fábio Ulhoa. Op. cit., p. 352, n. 295.

31 Cahali, Yussef Said. Fraudes contra credores. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 68 e 548.

32 Butera, Antonio. Dell’azione pauliana revocatória. Torino: Utet, 1934. p. 155, n. 39.

33 Ferrara, Francesco. Il fallimento. Milano: Giuffrè, 1959. p. 285, n. 193.

34 Navarrini, Umberto. Tratato di diritto fallimentare. Bologna: Nicola Zenichelli, 1934.


p. 289, n. 235, I.

35 Auletta, Giuseppe G. Revocatória civile e fallimentare. Milano: Giuffrè, 1939. p. 113;


Satta. Istituzioni di diritto fallimentare. 2. ed. Roma: Foro Italiano, 1946. p. 135, n. 67.

36 Cosattini. La revoca degli atti fraudolenti. 2. ed. Padova: Cedam, 1950. p. 94, n. 33.

37 Cahali, Yussef Said. Fraudes contra credores. 3. ed. São Paulo: Ed. RT, 2000. p. 548-
549.

38 Tepedino, Ricardo. Op. cit., p. 362.

39 Lei 11.101/2005: “Art. 132. A ação revocatória, de que trata o art. 130 desta Lei,
deverá ser proposta pelo administrador judicial, por qualquer credor ou pelo Ministério
Público no prazo de 3 (três) anos contado da decretação da falência”.

40 Nery Junior, Nelson. Decadência da ação revocatória falimentar - Prazo dos arts. 56 e
114 da Lei de Falências. Revista de Processo 50/175 , São Paulo: Ed. RT, abr.-jun. 1988.

41 Idem, ibidem.

42 Idem, ibidem.

43 Wald, Arnoldo. Da decadência na ação revocatória. Revista dos Tribunais 469/45 ,


São Paulo: Ed. RT, nov. 1974.

44 STJ, REsp 28.895/SP, 4.ª T., j. 18.12.1997, rel. Min. César Asfor Rocha, DJU
27.04.1998, p. 165; REsp 10.316/PR, 3.ª T., j. 11.10.1994, rel. Min. Nilson Naves, RSTJ
75/219.

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

45 Lei 11.101/2005: “Art. 133. A ação revocatória pode ser promovida: I - contra todos
os que figuraram no ato ou que por efeito dele foram pagos, garantidos ou beneficiados;

II - contra os terceiros adquirentes, se tiveram conhecimento, ao se criar o direito, da


intenção do devedor de prejudicar os credores;

III - contra os herdeiros ou legatários das pessoas indicadas nos incisos I e II do caput
deste artigo”.

“São sujeitos passivos da ação revocatória todos os integrantes da cadeia negocial,


inclusive a própria falida, os quais formam um litisconsórcio passivo necessário-unitário,
visto que a ineficácia do contrato deve ser declarada em relação a todas as partes que
nele figuraram, devendo a sentença, nos termos do art. 47, caput, do CPC
(LGL\1973\5), ser uniforme em relação a todos os envolvidos na cadeia transmissiva, os
quais, evidentemente, devem integrar o polo passivo da demanda, sob pena de nulidade
insanável” (TJRS, ApCiv 70030040877, Encantado, 6.ª Câm. Civ., j. 25.11.2010, rel.
Des. Luís Augusto Coelho Braga, DJ 10.12.2010).

46 A presunção decorrerá sempre de circunstâncias objetivas e concretas, analisadas


caso a caso, que levam a crer que o terceiro sabia ou pelo menos deveria saber do
prejuízo que adviria para os credores da alienação pelo falido.

47 Os efeitos da sentença em relação ao contratante de boa-fé serão melhor abordados,


adiante nos itens 29 e ss.

48 STJ, CComp 20.774/SP, 2.ª Seção, j. 26.11.1997, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar,
DJU 19.12.1997, p. 67443.

49 STJ, REsp 590.179/RS, 3.ª T., j. 18.08.2005, rel. Min. Nancy Andrighi, DJU
13.02.2006, p. 793.

50 Pajardi, Piero. Manuale di diritto fallimentare. 5. ed. Milano: Giuffrè, 1998. p. 331-
332, § 69.

51 Maggiore, Giuseppe Ragusa. Istituzioni di diritto fallimentare. 2. ed. Padova: Cedam,


1994. p. 202.

52 Ricci, Edoardo F. Sulla pretesa natura costitutiva della revocatoria fallimentare.


Rivista di Diritto Processuale, vol. 28, p. 479 e ss., Padova: Cedam, 1973.

53 Pajardi, Piero. Op. cit., p. 293, § 62.

54 Cf. Cahali, Yussef Said. Fraudes contra credores. 3. ed. São Paulo: Ed. RT, 2002. p.
388; e Theodoro Júnior, Humberto. Fraude contra credores. 2. ed. Belo Horizonte: Del
Rey, 2001. p. 242-244.

55 Tanto na ineficácia objetiva como na subjetiva, a declaração judicial não tem a força

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Da ineficácia e da revogação de atos praticados
antes da falência

de “uma ação de nulidade, pois não desconstitui a relação jurídica que incrimina, mas
tão somente tira a eficácia do ato em proveito da massa falida” (Requião, Rubens. Op.
cit., p. 203).

56 “A massa restituirá o que tiver sido prestado pelo contraente, salvo se do contrato ou
ato não auferiu vantagem, caso em que o contraente será admitido como credor
quirografário” (§ 1.º do art. 54 do Dec.-lei 7.661/1945).

57 Tepedino, Ricardo. Comentários ao art. 129. In: Toledo, Paulo F. C. Salles; Abrão,
Carlos Henrique (coords.). Op. cit., p. 368.

58 “Possibilidade de o adquirente buscar seus eventuais direitos decorrentes da alegada


boa-fé e efetivação da prestação perante à massa falida ou se resguardar pela via da
ação de perdas e danos em face do falido” (TJRJ, 17.ª Câm. Civ., AC 11325/2001, j.
15.08.2001, rel. Des. Maria Ines Gaspar. DVD Magister. n. 35. São Paulo: Lex Magister,
dez.-jan. 2011).

59 Requião, Rubens. Op. cit., p. 204, n. 181.

60 Na Europa, o nomen iuris da operação não se contaminou do anglicanismo a que se


submeteu o mercado brasileiro. Em vez de securitização, fala-se “titrisation”, na França;
“titulización”, na Espanha e “titularização” ou “titulação”, em Portugal, expressões que,
na língua local, nomeiam com muito mais fidelidade, a operação de criar títulos para o
mercado imobiliário.

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