1Esse texto faz parte de uma pesquisa em desenvolvimento intitulada Imaginário em Cuba a
partir da produção serigráfica: uma leitura semiótica dos cartazes de cinema produzidos em Cuba
de 1960 a 1969, da mesma autora.
2 Leila Kelly Gualandi é mestranda em Comunicação e Semiótica (PUC-SP); bolsista do
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); bacharel em Artes
Plásticas (UFES); bacharel em Comunicação Social com ênfase em Publicidade e Propaganda
(FAESA-ES). E-mail: leilakelly.go@gmail.com.
3 Nesse texto todas as citações em língua estrangeira são traduzidas livremente pela autora,
conforme segue. (...) certos elementos ambientais apreensíveis pelos sentidos, tal como as
próprias construções que servem de marco, a luminosidade, o cuidado nas orientações
perceptivas, as referências artístico-monumentais ou o mobiliário, todos os elementos, de fato,
fornecidos pelo planejador ou por sua solicitação.
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Esse ambiente criado pelo projetista serve para auxiliar e dar ordem a
cidade, mas não é o suficiente para criar um espaço social. Para tanto, é
necessário o fator urbano, este que não é possível planejar, pois é criado pelas
pessoas que ocupam a cidade, definindo uma organização fluida e espontânea
que por muitas vezes não segue o plano inicial do urbanista.
4 (...) não é um esquema de pontos, nem um quadro vazio, nem um invólucro, muito menos
forma que é imposta aos fatos. É uma mera atividade, uma ação interminável cujos protagonistas
são os usuários que reinterpretam a forma urbana das formas que acessam e nelas caminham.
2
Cuba passou por uma grande transformação após a Revolução: o país
transacionava de sistema político e socioeconômico – do capitalismo para o
socialismo – o que ocasionou o embargo econômico promovido pelos Estados
Unidos, ao mesmo tempo em que a União Soviética o apoiou e o "apadrinhou”,
em meio à Guerra Fria protagonizada por essas duas potências. A ilha
caribenha, então, se modificou e se reestruturou profundamente para a criação
de uma nova organização social e comunitária.
A influência exercida pelo país soviético sobre Cuba foi muito além
de um modelo econômico e um sistema político. A ingerência de
Moscou sobre La Habana remodelou todo o modo de vida da
sociedade cubana (GUALANDI, 2016, p. 47).
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artístico. A sociedade começa a se apropriar dos cartazes disponíveis nas ruas
de Cuba levando-os como suvenires para suas casas e escritórios, atribuindo
relevância artística às serigrafias e criando um mercado paralelo de
colecionismo, de decoração e comercial.
5Por outro lado, o espaço urbano real - não o concebido - conhece a numerosa heterogeneidade
de ações e atores. (...) Deste modo, não há escolha senão concordar em submeter à aparência
e às iniciativas imprevistas dos outros.
4
Os cartazes dispostos pelas cidades, que deveriam auxiliar na
propagação de informação à população, são recebidos pela comunidade que os
ressignificam, dando novo uso e valor aos pôsteres. Essa ação não foi decidida
ou determinada previamente, mas aconteceu a partir da interação entre a
população e os cartazes.
Tenemos ahí, sin duda, una ecología, un nicho o entorno físico al que
amoldarse, no sólo constituido por los elementos morfológicos más
permanentes - las fachadas de los edificios, los elementos del
mobiliario urbano, los monumentos, etcétera -, sino también por otros
factores mudables, como la hora, las condiciones climáticas, si el día
es festivo o laboral y, además, por la infinidad de acontecimientos que
suscitan la versatilidad inmensa de los usos - con frecuencia
inopinados - de los propios viandantes, que conforman un medio
ambiente cambiante, que funciona como una pregnancia de formas
sensibles: visiones instantáneas, sonidos que irrumpen de pronto o que
son como un murmullo de fondo, olores, colores..., que se organizan
en configuraciones que parecen condenadas a pasarse el tiempo
haciéndose y deshaciéndose6 (DELGADO, 2007, P. 89).
6 Temos portanto, sem dúvida, uma ecologia, um nicho ou ambiente físico a ser moldado, não
só constituído pelos elementos morfológicos mas permanentes – as fachadas dos edifícios, os
elementos do mobiliário urbano, os monumentos, etc. –, mas também por outros fatores de
mutáveis, como o tempo, as condições climáticas, se o dia é feriado ou dia útil e, além disso,
pela infinidade de eventos que suscitam a imensa versatilidade dos usos - muitas vezes
inapropriados – dos próprios pedestres, que compõem um ambiente variável, que funciona como
gerador de formas sensíveis: visões instantâneas, sons surgem repentinamente ou que são
como um ruído do ambiente, cheiros, cores ..., que se organizam em configurações que parecem
condenadas a passar o tempo fazendo-se e desfazendo-se.
5
A investida da população modificou o plano inicial para esses objetos, mas
o Estado se aproveitou desse novo significado para ampliar seu campo de
atuação. A partir disso, pode-se considerar que a cidade e o urbano se
autorregulam, trata-se de um ambiente social organizado, mas em constante
reorganização. Não é possível antecipar a ação do urbano, mas é possível
adequar-se a ela.
7 Poderíamos dizer que a vida social nos espaços públicos se caracteriza não tanto por ser
organizada, mas sim por estar constantemente se organizando, em uma obra de Sísifo, da qual
nem sempre é possível conhecer o resultado ou o propósito, porque nunca é concebido para
cristalizar, a menos que deixe de ser o que era até então: especificamente urbano, ou seja,
organizado a partir e ao redor da mobilidade.
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para posicionar o País como referência no cenário artístico mundial. Portando,
conclui-se que o que é apresentado pela cidade é modificado pelo urbano, que
cria uma dinâmica que se transforma continuadamente para a geração de um
ambiente social gerado por e para a comunidade.
REFERÊNCIAS