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A CIDADE E O URBANO: teoria da mestiçagem aplicada a

Cuba pós-revolução de 1959 e seus cartazes de propaganda1

Leila Kelly Gualandi2


PUC-SP

A cidade e o urbano são duas instituições criadoras de espaço social que


trabalham juntas, porém de maneiras independentes para gerar uma sociedade.
O antropólogo Manuel Delgado, em seu livro Sociedades Movedizas (2007),
discorre sobre a diferença entre os dois conceitos. Segundo o autor, a cidade é
uma grande área, onde um significante número de construções é erguido
formando um "complexo conjunto de infraestruturas" com a finalidade de atender
um grande número de pessoas. Já o urbano é o resultado das práticas e
vivências produzidas pelas pessoas que atravessam a cidade.

A cidade é planejada para a sociedade. Ruas, quadras, edifícios,


monumentos, praças, vias, tudo é construído a partir de um projeto. Projeto esse
que visa criar um lugar de convívio organizado, onde as pessoas possam ter
uma vida social e individual a partir de um plano. Os usos da cidade são pré-
determinados por direcionadores a partir da criação de

(…) ciertos elementos ambientales aprehensibles por los sentidos,


tales como las propias construcciones que le sirven de marco, la
luminosidad, el cuidado en las orientaciones perceptivas, las
referencias artístico-monumentales o el mobiliario, elementos todos
ellos, en efecto, provistos por el planificador o a instancias suyas3
(DELGADO, 2007, p. 13).

1Esse texto faz parte de uma pesquisa em desenvolvimento intitulada Imaginário em Cuba a
partir da produção serigráfica: uma leitura semiótica dos cartazes de cinema produzidos em Cuba
de 1960 a 1969, da mesma autora.
2 Leila Kelly Gualandi é mestranda em Comunicação e Semiótica (PUC-SP); bolsista do
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); bacharel em Artes
Plásticas (UFES); bacharel em Comunicação Social com ênfase em Publicidade e Propaganda
(FAESA-ES). E-mail: leilakelly.go@gmail.com.
3 Nesse texto todas as citações em língua estrangeira são traduzidas livremente pela autora,
conforme segue. (...) certos elementos ambientais apreensíveis pelos sentidos, tal como as
próprias construções que servem de marco, a luminosidade, o cuidado nas orientações
perceptivas, as referências artístico-monumentais ou o mobiliário, todos os elementos, de fato,
fornecidos pelo planejador ou por sua solicitação.
1
Esse ambiente criado pelo projetista serve para auxiliar e dar ordem a
cidade, mas não é o suficiente para criar um espaço social. Para tanto, é
necessário o fator urbano, este que não é possível planejar, pois é criado pelas
pessoas que ocupam a cidade, definindo uma organização fluida e espontânea
que por muitas vezes não segue o plano inicial do urbanista.

Delgado explica que o urbano

(…) no es un esquema de puntos, ni un marco vacío, ni un envoltorio,


ni tampoco una forma que se le impone a los hechos. Es una mera
actividad, una acción interminable cuyos protagonistas son esos
usuarios que reinterpretan la forma urbana a partir de las formas en
que acceden a ella y la caminan4 (DELGADO, 2017, p.12).

Desta maneira, "o espaço urbano não é o resultado de uma determinada


morfologia predisposta pelo projeto urbanístico, mas sim de uma dialética
renovada e auto administrada por visões e exposições" (DELGADO, 2017, p. 13-
14, tradução nossa). Os urbanistas, muitas vezes, desconsideram que o urbano
não é algo fixo ou palpável como uma construção ou um monumento, sendo
suas qualidades construídas por e para os passantes. O autor afirma que o
urbano não é um lugar em si e sim um “ter lugar” onde os corpos ocupam a
extensão e o tempo, se organizando e desorganizando a passo que a cidade é
preenchida por corpos, criando uma "harmonia confusa" (CAUQUELIN, 1982,
apud DELGADO, 2017, p. 13).

O projetista pretende criar uma cidade operacionalmente eficiente e com


usos práticos e inteligíveis. Entretanto, não é ele que legitima a cidade e sim a
sociedade que vai ocupá-la e preenchê-la de sentido.

A partir dessa análise, é possível aplicar a dialética do urbano e a cidade


na relação entre a sociedade cubana – comunidade aqui representada não como
apresentada na sociologia, mas sim como um grupo de pessoas que protagoniza
um ambiente – e seus cartazes de propaganda produzidos logo após a
Revolução de 1959.

4 (...) não é um esquema de pontos, nem um quadro vazio, nem um invólucro, muito menos
forma que é imposta aos fatos. É uma mera atividade, uma ação interminável cujos protagonistas
são os usuários que reinterpretam a forma urbana das formas que acessam e nelas caminham.
2
Cuba passou por uma grande transformação após a Revolução: o país
transacionava de sistema político e socioeconômico – do capitalismo para o
socialismo – o que ocasionou o embargo econômico promovido pelos Estados
Unidos, ao mesmo tempo em que a União Soviética o apoiou e o "apadrinhou”,
em meio à Guerra Fria protagonizada por essas duas potências. A ilha
caribenha, então, se modificou e se reestruturou profundamente para a criação
de uma nova organização social e comunitária.

A influência exercida pelo país soviético sobre Cuba foi muito além
de um modelo econômico e um sistema político. A ingerência de
Moscou sobre La Habana remodelou todo o modo de vida da
sociedade cubana (GUALANDI, 2016, p. 47).

A maneira de divulgar e propagar a nova dinâmica social cubana foi


sugestionada pela propaganda socialista da pátria fiadora. "Em Cuba, assim
como na URSS, a propaganda se tornou uma das mais importantes ferramentas
de persuasão social" (GUALANDI, 2016, p. 47). E, certamente, algumas
similaridades se apresentam na propaganda cubana e soviética. Nas duas
nações, por exemplo, a propaganda era mediada por cartazes de serigrafia e
serviam para dois fins específicos: político e cultural.

Particularmente no âmbito cubano, os cartazes produzidos eram


distribuídos pela cidade para divulgar tanto o novo sistema político quanto
eventos culturais, como teatro, cinema, shows de música e etc. Na Capital
cubana, os cartazes eram distribuídos por toda a cidade para propagar esses
eventos. Os pontos de exposição dos pôsteres eram escolhidos
estrategicamente para alcançar o maior número de pessoas, visando maximizar
a disseminação da informação. Desse modo, é plausível considerar que a
produção e a distribuição foram planejadas e tinham finalidades e intenções
claras ao serem executadas e adicionadas à cidade, bem como um projeto
urbanístico o tem.

A dialética acontece quando, a partir da distribuição e exposição pública


dos cartazes, os passantes começam a retirá-los das ruas sem aparente
intensão de protesto ou como ato de desgosto, mas sim como apreço ao objeto

3
artístico. A sociedade começa a se apropriar dos cartazes disponíveis nas ruas
de Cuba levando-os como suvenires para suas casas e escritórios, atribuindo
relevância artística às serigrafias e criando um mercado paralelo de
colecionismo, de decoração e comercial.

Mesmo partindo de uma ideia preconcebida e com objetivo e função


claros – os cartazes de propagação do regime e de eventos culturais que foram
distribuídos de maneira organizada e calculada (cidade) – não impossibilitou
e/ou previu a reação da comunidade, que se apoderou dos objetos serigráficos
para dar-lhes novo significado e redirecionar o planejamento inicial (urbano).

Em outras palavras, ainda que a cidade seja projetada com diretrizes


definidas e específicas, é o passante, a partir da ocupação do espaço, que vai
legitimar suas funções. Sobre o assunto, Delgado diz que "no espaço projetado
não há presenças, e por não haver, também não há ausências" (DELGADO,
2007, p. 15, tradução nossa) e continua

En cambio, el espacio urbano real - no el concebido - conoce la


heterogeneidad innumerable de las acciones y de los actores. (...) Ahí
no hay más remedio que aceptar someterse a las miradas y a las
iniciativas imprevistas de los otros5 (DELGADO, 2007, p. 15).

A cidade, que é formada por um imenso número de pessoas – e na qual


a grande maioria não se conhece – fica à mercê das ações desses passantes, o
que torna improvável antever as reações e os usos aplicados a ela. Não é
possível prenunciar as práticas da sociedade, posto que seus atos não partem
de uma organização ou instituição oficial – oficial como organização
governamental –, mas sim de um organismo vivo e que só define as funções da
cidade a partir do seu uso.

As comunidades tendem a “se comportar de forma descontínua”


(DELGADO, 2007, p. 86, tradução nossa) e isso se agrava nas sociedades que
sob mudanças, como Cuba na década de 1960, onde toda a sua lógica urbana
estava sendo modificada e os códigos reinterpretados.

5Por outro lado, o espaço urbano real - não o concebido - conhece a numerosa heterogeneidade
de ações e atores. (...) Deste modo, não há escolha senão concordar em submeter à aparência
e às iniciativas imprevistas dos outros.
4
Os cartazes dispostos pelas cidades, que deveriam auxiliar na
propagação de informação à população, são recebidos pela comunidade que os
ressignificam, dando novo uso e valor aos pôsteres. Essa ação não foi decidida
ou determinada previamente, mas aconteceu a partir da interação entre a
população e os cartazes.

Delgado utiliza a definição que Radclife-Brown propõe para explicar essa


estrutura social e a assume como "um enorme número de ações e interações de
seres humanos, agindo individualmente ou em combinações ou grupos"
(RADCLIFE-BROWN, 1995, apud DELGADO, 2007, p. 89, tradução nossa) que
se molda a partir dos mais diversos fatores externos e internos.

Tenemos ahí, sin duda, una ecología, un nicho o entorno físico al que
amoldarse, no sólo constituido por los elementos morfológicos más
permanentes - las fachadas de los edificios, los elementos del
mobiliario urbano, los monumentos, etcétera -, sino también por otros
factores mudables, como la hora, las condiciones climáticas, si el día
es festivo o laboral y, además, por la infinidad de acontecimientos que
suscitan la versatilidad inmensa de los usos - con frecuencia
inopinados - de los propios viandantes, que conforman un medio
ambiente cambiante, que funciona como una pregnancia de formas
sensibles: visiones instantáneas, sonidos que irrumpen de pronto o que
son como un murmullo de fondo, olores, colores..., que se organizan
en configuraciones que parecen condenadas a pasarse el tiempo
haciéndose y deshaciéndose6 (DELGADO, 2007, P. 89).

A apropriação dos cartazes cubanos, por parte da população, legitima, dá


sentido e valor artístico para além da propaganda. A partir da validação da
comunidade, a serigrafia cubana de propaganda amplia seu campo de ação,
alcançando status de arte e participando desse circuito. Inúmeras exposições
coletivas e individuais foram realizadas, dentro e fora do país, levando a
serigrafia cubana para além da ilha caribenha. Prêmios nacionais e
internacionais foram conquistados pelos artistas produtores de serigrafia,
concebendo ainda mais força aos cartazes.

6 Temos portanto, sem dúvida, uma ecologia, um nicho ou ambiente físico a ser moldado, não
só constituído pelos elementos morfológicos mas permanentes – as fachadas dos edifícios, os
elementos do mobiliário urbano, os monumentos, etc. –, mas também por outros fatores de
mutáveis, como o tempo, as condições climáticas, se o dia é feriado ou dia útil e, além disso,
pela infinidade de eventos que suscitam a imensa versatilidade dos usos - muitas vezes
inapropriados – dos próprios pedestres, que compõem um ambiente variável, que funciona como
gerador de formas sensíveis: visões instantâneas, sons surgem repentinamente ou que são
como um ruído do ambiente, cheiros, cores ..., que se organizam em configurações que parecem
condenadas a passar o tempo fazendo-se e desfazendo-se.
5
A investida da população modificou o plano inicial para esses objetos, mas
o Estado se aproveitou desse novo significado para ampliar seu campo de
atuação. A partir disso, pode-se considerar que a cidade e o urbano se
autorregulam, trata-se de um ambiente social organizado, mas em constante
reorganização. Não é possível antecipar a ação do urbano, mas é possível
adequar-se a ela.

Podríamos decir que la vida social en espacios públicos se caracteriza


no tanto por estar ordenada, como por estar permanentemente
ordenándose, en una labor de Sísifo de la que no siempre es posible
conocer ni el resultado ni la finalidad, porque no le es dado cristalizar
jamás, a no ser dejando de ser lo que hasta entonces era:
especificamente urbana, es decir, organizada a partir y en torno a la
movilidad7 (DELGADO, 2007, p. 90).

Geradoras de um espaço social, a cidade e o urbano são duas instituições


que funcionam de maneira autônomas, porém dependem uma da outra para ter
todas as suas funções preenchidas. A cidade organiza o ambiente funcional, o
urbano dá sentido ao atravessá-la com a ações humanas, que são aproveitadas
e reorganizadas pela cidade, criando assim um clico prático para a formação de
um sistema social. Essa organização não é definida ou parte de um tratado
prévio, é apenas a partir das interações entre um e outro que as demandas e as
ações são definidas, ainda que momentaneamente, já que essas vivem em
constante transformação.

Isso posto, torna-se possível ver o complexo jogo organizacional em


Cuba, a partir dos cartazes de propaganda cubanos. A função dos pôsteres foi
se transformando e sendo transformada continuamente, alterando seus
propósitos por diversas vezes. A principal finalidade dos cartazes de propaganda
– a difusão de ideias, ideais e de eventos culturais – ganha outras características
à medida que se modifica. O valor artístico dado às serigrafias de propaganda
criou uma movimentação intensa e vigorosa na cidade, dando grande
importância aos cartazes e tornando-os parte reconhecível da cultura cubana

7 Poderíamos dizer que a vida social nos espaços públicos se caracteriza não tanto por ser
organizada, mas sim por estar constantemente se organizando, em uma obra de Sísifo, da qual
nem sempre é possível conhecer o resultado ou o propósito, porque nunca é concebido para
cristalizar, a menos que deixe de ser o que era até então: especificamente urbano, ou seja,
organizado a partir e ao redor da mobilidade.
6
para posicionar o País como referência no cenário artístico mundial. Portando,
conclui-se que o que é apresentado pela cidade é modificado pelo urbano, que
cria uma dinâmica que se transforma continuadamente para a geração de um
ambiente social gerado por e para a comunidade.

REFERÊNCIAS

DELGADO, Manoel. Sociedades Movedizas: paso hacia una atropología de las


calles. Barcelona, Espanha: Editorial Anagrama, 2007.

GUEDES, Alexandre Linhares (Org.). Cartazes Cubanos: um olhar sobre o


cinema mundial. Rio de Janeiro: Impressio: Letra e Imagem, 2009.

GOODMAN, Carole; SOTOLONGO, Claudio. Soy Cuba: el cartel de cine en


Cuba después de la revolución. México: Trilce Ediciones, 2011.

GUALANDI, LEILA K. Arte, Publicidade e Propaganda: uma análise sobre os


cartazes de propaganda do cinema cubano como arte visual. Monografia
(Monografia em Arte Plásticas) – UFES. Vitória, Espirito Santo, 2016.

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