PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA SOCIAL – UFAM
MESTRADO DISCIPLINA: Tópicos Especiais em Antropologia VIII – Leitura e produção de Textos Etnográficos. ALUNO: Jonas Carvalho Pinto
Resenha “Os gêneros do discurso” de Mikhail Bakhtin.
O uso da linguagem se expressa nas mais variadas formas e, neste sentido, a
língua é acionada na forma de enunciados escritos e orais. Estes enunciados estão condicionados e ligados a cada campo de atividade humana por elementos indissolúveis, quais sejam: conteúdo temático, estilo e construção composicional. Mikhail Bakhtin compreende ‘gêneros do discurso’ como “tipos relativamente estáveis de enunciados em cada campo de utilização da língua”. Enunciados estes que possuem ou refletem particularmente condições e finalidades específicas. Esses gêneros do discurso são bastante heterogêneos e, se tentarmos conceitua-los, defini- los ou sistematizá-los, apresentam traços característicos gerais abstratos e vazios. Segundo Bakhtin, a questão linguística geral do enunciado e dos seus tipos quase não eram levados em conta nos estudos do gênero literário. Bakhtin denota a existência dos gêneros primários e secundários relacionada à definição da natureza geral do enunciado. Bakhtin afirma que enunciado não é uma unidade convencional e sim uma unidade real, a qual é estritamente delimitada pela alternância de sujeitos falantes. É no diálogo real que esta alternância dos sujeitos falantes é mais facilmente percebida. Os enunciados dos interlocutores (parceiros do diálogo) ou as chamadas réplicas alternam-se no diálogo, o qual, segundo Bakhtin, por sua clareza e simplicidade, é a forma clássica da comunicação verbal. No ato conversacional, há alternância dos sujeitos falantes, que emitem enunciados. Neste processo o receptor não é um ser passivo, ao contrário, ao ouvir e compreender o enunciado, este toma para si atitudes responsivas, ou seja, ele pode concordar ou não, pode opinar, direcionar, interromper, discutir, enfim exercer papel ativo no ato comunicacional. Não é intenção do locutor uma reação passiva por parte do receptor, mas sim um feedback, uma vez que o locutor age no sentido de induzir uma resposta, atua sobre o outro no sentido de convencê-lo, influenciá-lo. Bakhtin afirma que esta atitude é a principal característica do enunciado. Salienta, também, que o enunciado é único, não pode ser repetido, apenas citado, haja vista que advém de discursos proferidos no exato momento da interação social. Os gêneros sofrem modificações em função da situação sócio histórica em que estão inseridos. Cada situação histórica e social dá origem a um gênero com suas características peculiares. Levando-se em consideração a infinidade de situações comunicativas e que essas só são possíveis graças à utilização da língua, pode-se perceber infinitos gêneros discursivos. Bakhtin relaciona a formação de novos gêneros ao aparecimento de novas esferas da atividade humana, com finalidades discursivas específicas. Esta imensa heterogeneidade fez com que Bakhtin propusesse _ reitera- se _ uma classificação dos gêneros do discurso em dois grupos: primários e secundários. Os primários relacionam-se às situações comunicativas cotidianas, espontâneas, informais e imediatas, como a carta, o bilhete, o diálogo cotidiano. Os gêneros secundários, geralmente mediados pela escrita, aparecem em situações comunicativas mais complexas e elaboradas, como o teatro, o romance, as teses científicas, etc. Tanto os gêneros primários quanto os secundários possuem a mesma essência, em outras palavras, ambos são compostos por fenômenos da mesma natureza, os enunciados verbais. O que os diferencia é o nível de complexidade em que se apresentam. Para Bakhtin, o discurso deve ser analisado e estudado pela gramática e pela estilística numa abordagem orgânica mutuamente interpenetrável visando superar concepções simplistas como o denominado “fluxo discursivo” da comunicação. “Além do mais, o estudo do enunciado como unidade real da comunicação discursiva permitirá compreender de modo mais correto também a natureza das unidades da língua enquanto sistema, as palavras e orações. De forma conclusiva Bakhtin diz que a língua como sistema possui recursos lexicais, morfológicos e sintáticos como recursos linguísticos para exprimir o direcionamento formal discursivo. A expressão desse direcionamento real nunca se esgota nesses recursos linguísticos especiais gramaticais. Ademais, além de todos os recursos gramaticais e linguísticos, o destinatário de apresenta com maior ou menor grau de influência nos processos discursivos no diálogo, na resposta do outro. Bakhtin conclui fazendo seu texto fazendo uma crítica a analise estilística tradicional: Quando se analisa uma oração isolada, destacada do contexto, os vestígios do direcionamento e da influência da resposta antecipável, as ressonâncias dialógicas sobre os enunciados antecedentes dos outros, os vestígios enfraquecidos da alternância dos sujeitos do discurso, que sulcaram de dentro o enunciado, perdem-se, obliteram-se, porque tudo isso é estranho à natureza da oração como unidade da língua. Todos esses fenômenos estão ligados ao todo do enunciado, e onde esse todo desaparece do campo de visão do analisador deixam de existir para ele. Nisto reside uma das causas da já referida estreiteza da estilística tradicional. A analise estilística, que abrange todos os aspectos do estilo, só é possível como analise de um enunciado pleno e só naquela cadeia da comunicação discursiva da qual esse enunciado e um elo inseparável (BAKHTIN, p. 306).