Anda di halaman 1dari 17

O Supremo Tribunal Federal

O Supremo Tribunal Federal – STF, é o mais elevado órgão do Poder Judiciário


no Brasil e possui sua sede em Brasília. A competência basal do STF está na guarda da
Constituição Federal, como expresso textualmente na mesma em seu Artigo 102; do
mesmo artigo são obtidas as atribuições do dito tribunal que incluem julgar as ações
diretas de inconstitucionalidade – ADI (de que tratam o presente trabalho), além de outras
competências diversas como por exemplo processar e julgar o Presidente da República e
demais ocupantes de cargos com prerrogativa especial de foro quando de infrações na
esfera penal, e ainda julgar em caráter de recurso os habeas-corpus votados em tribunais
superiores como o Superior Tribunal de Justiça – STJ.

A corte é formada por 11 integrantes e sua escolha é regida pelo Artigo 101 da
Lei Maior, que determina que estes integrantes possuam notório saber jurídico e reputação
ilibada além de ter idade no intervalo entre 35 e 65 anos quando de sua nomeação. Esta,
se dá privativamente por indicação do Presidente da República com a necessidade de que
indicado passe pelo crivo do Senado Federal, através de votação por maioria simples
ocorrida após sabatina pública. Os ministros possuem cargo vitalício, ou seja, ocupam
seu lugar no tribunal desde a posse até sua aposentadoria compulsória aos 70 anos de
idade. A corte possui três órgãos: O Presidente, o Plenário e as Turmas. O STF é composto
atualmente pelos ministros e ministras: Celso de Mello, Marco Aurélio Mello, Gilmar
Mendes, Ricardo Lewandowski, Carmen Lúcia, Dias Toffoli, Luiz Fux, Rosa Weber,
Roberto Barroso, Edson Fachin e Alexandre de Moraes; aqui dispostos em ordem
decrescente de antiguidade.

O presidente do STF será escolhido dentre os Ministros que compõem o tribunal


e terá mandato de dois anos, sendo vedada a recondução imediata como dispõe o Artigo
12 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. Atualmente, o presidente do STF
acumula também o cardo de presidente do Conselho Nacional de Justiça – CNJ. Cabe ao
presidente a condução dos trabalhos da corte, o que inclui o poder de pauta, ou seja,
determinar quais ações serão julgadas em cada sessão. Devido ao acúmulo de funções, o
presidente não compõe nenhuma das turmas. Os atuais presidente e vice-presidente são,
respectivamente, a Ministra Carmen Lúcia e o Ministro Dias Toffoli.

1
O plenário do STF é o órgão formado pelos 11 Ministros reunidos para
deliberação. Suas decisões são proferidas através de votos tomados dos ministros e
quantificação destes para formar maioria.

A disposição espacial do plenário dá-se seguindo estes princípios de organização:


Toma o lugar central a Ministra Presidente Carmen Lúcia, sendo ladeada à destra pela
Procuradora Geral da República, atualmente Dra. Raquel Dodge (quando do início do
julgamento da ação, ocupava o cargo o Dr. Rodrigo Janot) e à sinistra por quem ocupar a
Secretaria do STF. Os dez membros restantes do colegiado ocupam seus lugares por
ordem decrescente de antiguidade, tendo o ministro mais antigo sentando-se na primeira
cadeira a direita da Presidente e o segundo ministro mais antigo na primeira cadeira a
esquerda da mesma. A formação completa segue esta regra alternada até o ministro mais
moderno, que obrigatoriamente, ocupará a quinta cadeira a esquerda da presidência.

A ordem de votação dos ministros segue a ordem inversa à supracitada, onde o


Ministro mais moderno é o primeiro a proferir seu voto, deixando a cargo do Ministro
mais antigo o último voto. Há de se considerar ainda, no que tange à ordem de votação,
que o Ministro designado como Relator em cada caso será o primeiro a votar, e a Ministra
Presidente será a última (nos casos em que há voto da presidência), não sendo a
antiguidade destes elemento válido para organizar o ordenamento.

As Turmas do tribunal são formadas com o intuito de dar celeridade e eficiência


aos trabalhos da corte, tornando mais dinâmico o processo de tomada de decisões em
casos em que não seja necessário que se recorra ao plenário. Tais atribuições estão
descritas no Artigo 9 do Regimento Interno do STF e não inclui as ações de
inconstitucionalidade. A Primeira Turma do STF é composta pelos Ministros Marco
Aurélio (que ocupa a presidência da turma), Luiz Fux, Rosa Weber, Roberto Barroso e
Alexandre de Moraes; ao passo que a Segunda Turma tem a composição dos Ministros
Edson Fachin (presidente da mesma), Celso de Mello, Gilmar Mendes, Ricardo
Lewandowski e Dias Toffoli.

Ações Diretas de Inconstitucionalidade

Chama-se Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI, o mecanismo pelo qual se


provoca o STF afim de que o mesmo declare que uma lei ou parte dela não encontra
consonância no texto constitucional, não podendo, portanto, vigorar. A proposição desta

2
ação compete, segundo artigo da Constituição Federal, basilarmente ao Procurador Geral
da República e de forma extensiva ao Presidente da República, Mesa do Senado Federal,
Mesa da Câmara dos Deputados, Mesa de Assembleia Legislativa ou Câmara Distrital,
Governador Estadual ou Distrital, Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil,
Partido político representado no Congresso Nacional ou Confederação sindical ou
entidade de classe de âmbito nacional.

É pertinente enfatizar que de acordo com dispositivo expresso no Artigo 169, §1º
do Regimento Interno do STF, uma vez proposta a ação, dela a parte não poderá desistir.

Ação Direta de Inconstitucionalidade 4275/2009

Tribunal: Supremo Tribunal Federal

Autoria: Procuradoria Geral da República

Relatoria: Ministro Marco Aurélio

Relatório

O julgamento da ADI inicia-se com a Ministra Carmen Lúcia concedendo ao


Ministro Relator Marco Aurélio a palavra para que ele proceda com a leitura do relatório.
O eminente relator elucida às partes do que trata a ADI 4275.

A ação da qual versa o presente trabalho foi ajuizada no Supremo Tribunal Federal
pela então Procuradoria Geral da República, cuja cadeira era preenchida pela Dra.
Deborah Duprat (que ocupava o cargo interinamente) a fim de que se interpretasse o
Artigo 58 da Lei 6015/1973 conforme a Constituição. O artigo supracitado trata dos
registros públicos, o cerne da ação situa-se na possibilidade de alteração de prenome e
gênero no registro civil sem que para tal haja procedimento cirúrgico de
transgenitalização, o qual o Ministro denomina de multilação.

“Art. 58. O prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua substituição por apelidos
públicos notórios.

Parágrafo único. A substituição do prenome será ainda admitida em razão de


fundada coação ou ameaça decorrente da colaboração com a apuração de crime, por

3
determinação, em sentença, de juiz competente, ouvido o Ministério Público. “ Redação
vigente da Lei 6015/1973.

O relator dá então seu parecer em favor do julgamento. Neste momento, pede a


palavra o Ministro Dias Toffoli, onde o mesmo se declara impedido para julgar a proferida
ação.

Pontua-se aqui que a ADI fora protocolada em 21/07/2009 pela Procuradora Geral
da República Deborah Duprat, e a leitura do relatório do Ministro Relator e a sustentação
oral dos Amici Curie se deu em 07/06/2017.

Argumento da Parte Autora (PGR)

O Ministério Público, manifestado na pessoa do Procurador Geral da República,


Dr. Rodrigo Janot inicia sua argumentação refutando a tese da transexualidade como
patogenia, sendo, por outro lado, manifestação da identidade baseada nos princípios de
autodeterminação de identidade, que seriam equiparados aos Direitos Fundamentais
extraídos da Constituição Federal, embasados no princípio da dignidade da pessoa
humana (Artigo 1, inciso III), da igualdade e liberdade (Artigo 5, caput), da vedação de
discriminações odiosas (Artigo 3, inciso IV), e da privacidade (Artigo 5, inciso X).

Um dos pontos fundamentais da sustentação do Dr. Rodrigo Janot é do exercício


da dignidade humana estar ligada às características indenitárias dos cidadãos, que se
representa na ideia de autodeterminação. Esta ideia é a que deve garantir a mudança de
prenome no registro civil e, por conseguinte também do sexo, uma vez que para o
Ministério Público, a congruência entre a identidade e o registro é necessária para o pleno
exercício das garantias elencadas na Lei Maior, visto que uma cirurgia não pode ser
interpretada como o balizador da construção de identidade.

A parte autora faz ainda um contraponto ao pedido da Advocacia Geral da União


– AGU, que pontuou ser necessária a manutenção do registro inicial de sexo e prenome
dos indivíduos que solicitassem as alterações aqui discutidas para que haja proteção de
responsabilidade cível, tributária e penal. Neste ponto, a PGR pondera sobre a
importância de que as responsabilidades fossem preservadas, mas que se fosse feito sem
prejuízo de sigilo do indivíduo.

4
Conclui então o Ministério Público, solicitando procedência da ação, para que
então se conferisse interpretação em consonância à Constituição do Artigo 58 da Lei
6015/1973, garantindo, portanto, a mudança de prenome e sexo no registro civil por parte
de pessoas transgêneros.

Amici Curie

Tendo se manifestado o Ministério Público, a Ministra presidente inicia a oitiva


dos Amici Curie, tendo espaço neste pleito o Instituto Brasileiro de Direito de Família –
IBDFAM; Grupo Dignidade - Pela Cidadania de Gays, Lésbicas e Transgêneros;
Laboratório Integrado em Diversidade Sexual e de Gênero Políticas e Direitos – LIDIS e
Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos – CLAM. A presidência
estipula o tempo para a sustentação oral de cada amicus curie.

Dra. Maria Berenice Dias (IBDFAM)

A exposição da Dra. Maria é iniciada pela exposição de uma tríade de


características de identificação que parecem, para a amicus curie, em descompasso em
uma pessoa transgênero: O sexo biológico, a identidade de gênero e a percepção social
do gênero. Ela evoca o processo pelo qual uma pessoa transgênero pode estar em conflito
com ela mesma devido ao descompasso por ela indicado e que os princípios de justiça os
devem amparar, uma vez que o legislador não o fez expressamente.

Durante sua oitiva, a Dra. Maria aborda com autoridade a questão da cirurgia de
re-designação, e aponta o quão inapropriada é a exigência deste procedimento, uma vez
que ele parece apenas abarcar as mulheres trans, pois para homens transexuais, as
cirurgias existentes ainda são de caráter experimental e de pouco aspecto satisfatório tanto
no que concerne à estética do órgão formado pela cirurgia, quanto da segurança do
procedimento médico.

No tocante a segurança jurídica citada pelo Dr. Janot, é feito paralelo aos casos de
pessoas casadas que possuem alteração no registro civil e que nestes casos não existe uma
preocupação exacerbada quanto à imputabilidade cível, tributária ou penal.

5
Dra. Gisele Alessandra Schmidt e Silva (Grupo Dignidade)

A segunda amicus curie traz à luz da suprema corte, a realidade objetiva das
pessoas transgênero em sua tarefa de obter alteração de prenome e sexo no registro civil,
enunciando que em alguns estados há dificuldades técnicas impostas como a de não ser
clara a quem cabe a competência para a alteração, o traz morosidade aos processos neste
sentido. A sustentação liga o registro do indivíduo ao gênero com o qual se identifica com
o exercício da dignidade da pessoa humana expressa na Lei da República e como caráter
mitigador dos preconceitos arraigados na sociedade frente a essa população
marginalizada.

É também pormenorizada a penosa batalha destes cidadãos para a obtenção da


mudança de prenome e sexo, expressa na subjetividade dos critérios adotados para definir
se aquele indivíduo pertence ao gênero que ele diz se identificar, sendo muitas vezes deles
exigidos laudos médicos, remontando a ideia de patogenicidade relativa a desforia de
gênero que incorre em danos psíquicos aos indivíduos transgêneros.

De tal modo, a conclusão da oradora se dá no pedido de acolhimento parcial do


pedido da PGR, pois pede afastamento das condicionantes que o Ministério Público
solicitou no pedido inicial: Idade mínima fixada em 18 anos, prova de que o indivíduo
esteja vivendo sob o sexo definido por um prazo mínimo de 3 anos e condição atestada
por especialistas.

Dr. Wallace Corbo (LIDIS, CLAM)

O Dr. Wallace pauta sua sustentação oral no caráter violento que um documento
de identidade tem para uma pessoa transgênero, pois o mesmo é constantemente usado
como forma de humilhação pública de uma população. Ele expõe que o Estado é coautor
dessas práticas violentas quando este impede “o indivíduo de ser quem ele é”, nas palavras
que o doutor parafrasea o Ministro Roberto Barroso.

A argumentação volta-se então para o cerne da petição do Ministério Público, ou


seja, os requisitos necessários para alteração de sexo no registro civil, e que não se poderia
tratar um procedimento cirúrgico como o balizador do exercício da dignidade da pessoa
humana e como paradigma de definição do gênero de um indivíduo, que o manifesta com

6
a liberdade e autonomia que o compõem como cidadão, não podendo esta manifestação
ser vilipendiada.

Sobre a cirurgia, a corte é elucidada sobre os elevados custos que a mesma possui
e sobre a ineficácia do Sistema Único de Saúde – SUS para atender as demandas da
população transgênero, uma vez que poucas unidades de saúde realizam o procedimento.
Ele aponta ainda a distinção entre gênero e genitália, e que em uma sociedade onde a
nudez não é admitida, a percepção social de gênero não se dá desta forma, reforçando a
tese de que não se deve outorgar a quem quer que seja um procedimento invasivo.

Após as exposições dos Amici Curie, foi determinada pela Ministra Carmen Lúcia
a suspensão da sessão. Os votos dos Ministros foram tomados inicialmente no dia
28/02/2018.

Votos dos Ministros do Supremo Tribunal Federal

Ministro Marco Aurélio (Relator)

O eminente relator do caso inicia seu voto pela contextualização do conceito de


transexualidade, afim de alicerçar a sustentação vindoura, apontando que esta é uma
inadequação da condição psicológica de identificação de gênero com a manifestação
anatômica do mesmo.

A argumentação do Ministro é centrada na incapacidade de que critérios


morfológicos sejam usados na afirmação da identidade de gênero e de que é necessário
que o Estado passe a compreender a multiplicidade da mente humana como esta se
manifesta na sociedade através, inclusive, dos indivíduos transexuais e lhes deve a tutela
e garantia dos Direitos Fundamentais elencados na Constituição.

Sobre a cirurgia de transgenitalização, o relator sustenta que não cabe a ninguém


e nem ao Estado determinar como cada indivíduo irá manifestar o gênero com o qual se
identifica, pois todos estão amparados pela liberdade e pela privacidade. O ministro
enfatiza que o poder público deve promover a convivência harmônica na sociedade,
exercida na pluralidade e afastada de filtros meramente morais que caibam a alguns
grupos de pessoas. O corolário disto se dá na permissão da alteração do sexo no registro
civil, garantindo que cada qual viva como se percebe, uma vez que a cirurgia apenas altera
um aspecto anatômico.

7
Ao tratar da morfologia, o Ministro pontua, por outro lado, que esta possui sim
relevância na identificação social e condiciona a alteração ao atendimento dos critérios
estabelecidos pelo Conselho Federal de Medicina através da Resolução 1955/2010 em
seus Artigos 3º e 4º

“Art. 3º: Que a definição de transexualismo obedecerá, no mínimo, aos critérios


abaixo enumerados:

1) Desconforto com o sexo anatômico natural;

2) Desejo expresso de eliminar os genitais, perder as características primárias e


secundárias do próprio sexo e ganhar as do sexo oposto;

3) Permanência desses distúrbios de forma contínua e consistente por, no mínimo,


dois anos;

4) Ausência de transtornos mentais. ” (Conselho Federal de Medicina)

“Art. 4º: Que a seleção dos pacientes para cirurgia de transgenitalismo obedecerá à
avaliação de equipe multidisciplinar constituída por médico psiquiatra, cirurgião,
endocrinologista, psicólogo e assistente social, obedecendo os critérios a seguir definidos,
após, no mínimo, dois anos de acompanhamento conjunto:

1) Diagnóstico médico de transgenitalismo;


2) Maior de 21 (vinte e um) anos;
3) Ausência de características físicas inapropriadas para a cirurgia”. (Conselho
Federal de Medicina)

O ministro conclui o voto, portanto, dando parecer favorável ao pedido da PGR,


permitindo que haja alteração de prenome e sexo sem condicionar esta alteração à cirurgia
de redesignação de sexo (que o mesmo denomina de processo de mutilação), guardadas
as ressalvas estipuladas no dispositivo do Conselho Federal de Medicina, equiparando
estas à caráter de avaliação por parte da autoridade judicial. O eminente relator, em vias
de dar garantias à manutenção de eventual responsabilidade jurídica, profere decisão em
vias de haver manutenção dos registros anteriores, desde que de forma sigilosa.

8
Ministro Alexandre de Moraes

O Ministro mais recentemente empossado é o primeiro a proferir juízo de causa


após a manifestação do relator, e o faz em consonância com os já evocados princípios de
autodeterminação e da dignidade da pessoa humana que permeiam todo este julgamento.
O Ministro faz ainda uma análise comparativa com os ordenamentos jurídicos da
Alemanha, Espanha e Portugal, apontando que todos caminham para um entendimento
similar, tratando este processo como evolução dos respectivos ordenamentos, e bem como
o relator trata como mutilação a cirurgia de transgenitazação. Também se manifesta
favorável à manutenção do registro anterior restrito somente ao indivíduo e a autoridade
judicial, quando couber, a fim de resguardar o cidadão de qualquer tipo de prejuízo moral.

O Ministro apresenta divergência do relator, pedindo-lhe vênia, apenas no tocante


aos requisitos por ele fixados, em especial a idade mínima de 21 anos. Para o magistrado,
aos 18 anos já está estabelecido na sociedade o exercício pleno de cidadania e eleva sua
sustentação evocando a saúde psíquica dos indivíduos, que podem ter prejuízos caso haja
letargia na tomada dos procedimentos legais que asseguram dignidade. Uma segunda
divergência é aberta, pois o Ministro Marco Aurélio em seu voto cita apenas o direito aos
transexuais, enquanto o Ministro Alexandre de Moraes o faz citando também os
transgêneros.

Ministro Edson Fachin

O Ministro Fachin inicia seu voto destacando o papel dos Amici Curie como
grandes contribuintes no julgamento exercendo papel fundamental no processo de tomada
de decisão por parte dos togados. O magistrado estabelece uma tríade de princípios para
sustentar o seu voto que está em parcial consonância com o relator. O primeiro destes
princípios elenca que não há igualdade sem discriminações inclui aqui a identidade de
gênero. O segundo deles trata da não interferência do Estado em algo que opera apenas
no foro privado de seus indivíduos. O último valor fundamental, para o Ministro, é a
incompetência do Estado para definir um modelo do que é a expressão de gênero, mesmo
que para fins procedimentais. Os parâmetros explícitos na Lei Maior que o Ministro
Fachin usa para amparar seu voto estão no Artigo 1, inciso III; Artigo 5, inciso X e
também no Artigo 2 do Pacto de São José da Costa Rica.

“Artigo 2. Dever de adotar disposições de direito interno

9
Se o exercício dos direitos e liberdades mencionados no artigo 1 ainda não
estiver garantido por disposições legislativas ou de outra natureza, os Estados Partes
comprometem-se a adotar, de acordo com as suas normas constitucionais e com as
disposições desta Convenção, as medidas legislativas ou de outra natureza que forem
necessárias para tornar efetivos tais direitos e liberdades. ” (Pacto de São José da Costa
Rica).

O magistrado destaca em seu voto a importância da Corte Interamericana de


Direitos Humanos e de como o Brasil deve adotar medidas para se adequar à opinião
consultiva desta, sendo este o instrumento de ratificação para a divergência por ele
estabelecida ao relator novamente no que concerne a existência de uma idade ou outros
fatores limitantes para a solicitação da mudança de gênero no registro civil, uma vez que
para a Corte por ele citada, pois a proteção da identidade de gênero não pode ser
restringida. Estas divergências versam ainda sobre a não patologização da condição de
gênero e Ministro abre ainda divergência, com vênias ao relator, para que não haja
manutenção do registro prévio. Dadas as divergências descritas, o magistrado concorda
com o relator quanto a não exigência de tratamentos hormonais ou cirúrgicos para
plenamente modificar o registro civil de sexo.

Ao passo que o voto se conclui, iniciam-se dois debates na corte, o primeiro entre
o Ministro Fachin e o Ministro Marco Aurélio sobre os termos transexual e transgênero,
o qual o último votante considera o segundo termo mais abrangente e, logo, mais
adequado para a terminologia o presente julgamento.

Um outro debate envolveu além dos ministros aqui citados, o Ministro Ricardo
Lewandowski, que pontua que o entendimento adotado pelo Ministro Fachin pode causar
prejuízo ao ato pretérito jurídico perfeito de registro civil, uma vez que não parece
demandar autorização judicial para a mudança de registro. O Ministro Fachin responde a
isto pontuando que a autoridade judicial só seria solicitada quando fosse provocada em
casos cabíveis. O Ministro Alexandre de Moraes toma parte em momento posterior nesta
discussão, elencando que para a segurança jurídica é necessária a autorização judicial,
pois há relação do Poder Judiciário com autarquias como, por exemplo, o INSS,

10
ocasionando uma célere alteração em todos os registros que por ventura seriam
necessários serem modificados.

Ministro Roberto Barroso

O Ministro Barroso retorna ao centro da questão e celebra que no mérito da


superação do preconceito há consenso, pontuando que a ação julgada contribui nas
palavras dele na “marcha contínua da direção do bem”. O togado inicia seu voto trazendo
o conceito da transexualidade como condição inata e que, logo, deve-se ajuda-las a criar
na sociedade um ambiente inclusivo.

Ao proferir voto, o Ministro acompanha o entendimento do relator, julgando


procedente o requerimento da PGR quanto a não exigência de cirurgia de
transgelitalização como parâmetro para que haja mudança de registro civil, quer para
prenome, quer para sexo.

Em outra mão, o voto do Ministro Barroso apresenta diferenças sensíveis quanto


a questão debatida pelos seus pares frente à necessidade de autorização judicial. Para ele,
se a identidade de gênero é característica auto percebida, não há de haver submissão a
autoridade judicial. O amparo para o voto está na Corte Interamericana de Direitos
Humanos – CIDH que endossa a desburocratização do processo, o que inclui também a
não solicitação de laudos médicos de qualquer natureza ou exigências quanto a exigência
probatória de tempo na condição de transexualidade, os quais o magistrado faz coro ao
demandar espelhamento na interpretação do dispositivo da lei 6015/1973.

O Ministro Barroso acompanha ainda os Ministros Edson Fachin e Alexandre de


Moraes quando abarca em seu voto os transgêneros, por acreditar ser este um termo mais
correto e abrangente.

Ministra Rosa Weber

O voto mais breve foi proferido pela Ministra Rosa. Uma vez que a mesma se
sentiu contemplada pelos argumentos verbalizados pelos Ministros Fachin e Barroso que
a antecederam, e por lançar mão, no voto escrito, dos mesmos dispositivos
Constitucionais de ambos, e assim como estes, acolhendo as sugestões da CIDH, limitou-
se a formalizar seu total acordo com os Ministros supracitados.

11
Ministro Luiz Fux

O Ministro Fux, em seu voto, insere um novo parâmetro para justificar o


atendimento ao mérito da questão central da ADI. Para o magistrado, a busca da felicidade
está no mesmo patamar das já elencadas dignidade da pessoa humana e igualdade que
serviram de estruturação basilar dos votos de seus pares. Ele cita ainda que a adequação
dos registros civis à identidade de gênero percebida pelo indivíduo o auxilia a se sentir
membro pleno da sociedade. O Ministro sustenta que há uma relação íntima entre o
reconhecimento e o exercício pleno de diretos políticos e sociais.

Outro novo paradigma inserido pelo voto do Ministro Fux, é de que para o mesmo,
deve-se adotar o termo transgênero, pois, em seu entendimento, o termo transexual seria
inconstitucional, ferindo os princípios da dignidade da pessoa humana (Artigo 1, inciso
III), da igualdade (Artigo 5, caput), e da intimidade (Artigo 5, inciso X).

O terceiro ponto vem para ir ao encontro do relator ao aderir a tese de


desnecessidade de cirurgia para que haja mudança no registro civil, sendo essa exigência
vai de encontro ao que preconizam alguns elementos da Constituição como o direito à
saúde (Artigo 196), sendo publicamente conhecidos os riscos da mesma. O Ministro
encerra sua argumentação com um adágio categórico “a exigência da cirurgia para que
haja o reconhecimento, carrega em si um não reconhecimento”.

O voto é manifestado em divergência parcial o relator nos mesmos termos


expressos pelo Ministro Edson Fachin. Tendo-se concluído o voto do Ministro Fux, o
Ministro Lewandowski antes de votar solicita que haja suspensão da sessão pelo
adiantado da hora, e a Ministra Carmen Lúcia assim o concede.

Ministro Ricardo Lewandowski

O voto é proferido de forma a trazer como princípios fundamentais os da auto


declaração, autodeterminação e dignidade da pessoa humana para assim suportar a ideia
do relator no acolhimento ao pedido da PGR para que não haja exigência cirúrgica que
preceda mudança de registro civil de gênero ou de prenome.

A concordância com o relator é, porém, apenas no mérito, indo se confrontar a


esta quando se tratam dos requisitos que ali são estabelecidos. Para o Ministro, caberá ao
julgador do caso concreto, valer-se de dispositivos não patologizantes, como oitivas de

12
testemunhas que atestem a condição afirmada pelo solicitante, para que decida
favoravelmente no direito subjetivo quanto à mudança, ou não, de registro civil. O
Ministro também rejeita exigências de caráter temporal.

Percebe-se aqui então que o magistrado retoma a ideia de necessidade de


autorização judicial expressa pretérita à mudança efetiva do registro. O magistrado o faz
suscitando que o assento anterior é um ato jurídico perfeito e que dele incorrem situações
possíveis como existência de credores e antecedentes criminais, aos quais a segurança
jurídica seria prejudicada se houvesse mudança diretamente em cartório. Neste item,
acompanha o relator, bem como o fizera o Ministro Alexeandre.

Ministro Celso de Mello

O decano da corte evoca a identidade de gênero como manifestação autônoma da


vontade do indivíduo, elenca a ideia de que os Direitos Fundamentais se inter-relacionam,
de modo que para que haja pleno exercício de um deles, todos devem estar operantes em
simultâneo. O magistrado cita que o Estado tem papel de não adotar medidas que suscitem
a exclusão jurídica de grupos minoritários, e que portanto, é dever do STF intervir nesse
sentido, como parte de seu dever de guarda da Constituição.

Ele então argumenta em favor da necessidade de reconhecimento da auto


percepção de gênero por parte da sociedade e do Estado, como direito básico do ser
humano. E que o Estado não pode se interpor ao cidadão que deseja alterar seu prenome
ou sexo no assentamento se este desejar assim o fazer em razão da auto determinação por
ele elencada. Tal afronta estaria em descompasso com o princípio da dignidade da pessoa
humana. Tais princípios estão elencados pela CIDH, no Princípio III da Opinião
Consultiva 24 que profere “em decorrência da afirmativa anterior, resta patente o dever
da República da Costa Rica em adotar medidas legislativas e administrativas que pautem
o reconhecimento da identidade de gênero, possibilitando a alteração do registro civil em
conformidade com a identidade de gênero reivindicada por via administrativa” O decano
faz a ponderação, como outros de seus pares o fizeram, que a cirurgia não é parâmetro
para a designação de um indivíduo a um gênero, logo, não pode ser este procedimento
um requisito para a mudança de registro. Ele verbaliza ainda que o Estado não se deve
influenciar por correntes majoritárias para cercear direitos de grupos de minorias. Para o

13
togado, o STF tem como prerrogativa exercer papel contra majoritário afim de
salvaguardar direitos decorrentes de possíveis falhas do legislador.

Acerca do debate instaurado na participação ou não do poder judiciário ser ou não


necessário para a mudança de registro, o Ministro Celso coloca-se em uma posição como
que mediando as teses do Ministro Marco Aurélio e o Ministro Edson Fachin, uma vez
que ele prevê a atuação judiciária, apenas em caso de resolução de dúvidas.

Ministro Gilmar Mendes

O Ministro Gilmar abre seu voto já demonstrando-se favorável ao entendimento


sobre o qual a corte suprema formou maioria, ou seja, a desnecessidade de cirurgia de
transgenitalização para a mudança de prenome ou sexo no registro civil. O Ministro
pontua, porém, que há três correntes sendo formadas entre seus pares, os quais ele as
descreve como: Mudança de gênero com base normativa elencada pelo CFM; mudança
realizada em caráter administrativo, dispensando autorização judicial de qualquer sorte;
e modificação de gênero no registro, desde que comprovada frente a autoridade judicial,
com a qual o magistrado indica defender, tendo sido esta ideia inaugurada pelo Ministro
Alexandre de Moraes.

O togado se funda na segurança jurídica para solidificar a tese por ele proposta,
chegando a exemplificar situações em que a mera alteração em cartório poderia levara a
prejuízo de particulares em questões patrimoniais. Ele cita ainda o dispositivo da Lei
6015/1973 que trata de forma cautelosa toda mudança de prenome e exige salvo raras
exceções expressas no Artigo 110 da mesma Lei, que as mudanças sejam submetidas ao
poder judiciário. O Ministro reflete então o mesmo princípio para a questão do gênero,
fazendo, contudo, a proteção sigilosa do assentamento prévio para não haver prejuízos à
dignidade do indivíduo.

Os princípios da auto afirmação e da não discriminação são evocados na decisão,


que inclui também a alusão feita a casos similares referentes a pessoas homossexuais,
onde os mesmos parâmetros foram usados para determinar inconstitucionalidade de
termos discriminatórios como ratificação do mérito defendido pelo togado. O Ministro
também recorre à Opinião Consultiva da CIDH para dar suporte às ideias por ele
defendidas.

14
Ministra Carmen Lúcia

A Presidente do STF inicia seu voto expressando que a igualdade descrita na


Constituição é uma conquista que deve-se buscar de forma constante, uma vez que os
casos de intolerância se repetem cotidianamente de forma expressa ou velada. E que o ato
de discriminação carrega em si sofrimento do indivíduo ser o que ele é.

A Ministra reforça que os indivíduos são iguais perante lei e que possuem
dignidade paritária onde não há valoração deste direito, entretanto estes são exercidos
dentro de uma pluralidade que só existe porque há diferenças, e que cada um deve
manifestar aquilo que se percebe. Os princípios da Lei da República por ela evocados em
sua sustentação são os da igualdade material, da dignidade da pessoa humana, princípio
da honra e o direito às diferenças. Ela elenca que o Estado deve perceber a condição do
indivíduo e a partir de aí dar-lhe registro mediante a auto percepção, ao invés de impor a
este ser humano que se comporte de forma submissa a um modelo que não lhe cabe. Além
da Lei Maior, a Ministra evoca o Pacto de São José da Costa Rica que consagra os mesmos
princípios.

A Presidente julga procedente a interpretação constitucional do Artigo 58 da Lei


6015/1973 no que concerne a não exigência de procedimentos cirúrgicos ou hormonais,
mas pedindo vênias ao relator, diverge deste quanto a necessidade de ir a juízo solicitar a
alteração de registro bem como na estipulação dos requisitos pautados no CFM.

Resultado

O Supremo Tribunal Federal julgou procedente a ADI para dar interpretação


constitucional ao Artigo 58 da Lei 6015/1973 de modo a reconhecer aos transgêneros que
assim o desejarem, independentemente da cirurgia de transgenitalização, ou da realização
de tratamentos hormonais ou patologizantes, o direito à substituição de prenome e sexo
diretamente no registro civil. O Ministro Marco Aurélio foi vencido no que tange à
requisitos fixados pelo CFM enquanto os Ministros Alexandre de Moraes, Ricardo
Lewandowski e Gilmar Mendes foram vencidos no tocante à necessidade de se ir a juízo
solicitar as alterações aqui descritas. O Ministro Dias Toffoli, em razão de sua
colaboração na mesma ação enquanto Advogado Geral da União quando do início da
ação, declarou-se impedido.

15
Tese Formulada do Resultado

A partir da análise do julgamento dado no STF, pode-se depreender que a corte


máxima do país entende as pessoas transgênero como indivíduos que não se percebem
correspondentes ao sexo biológico por elas possuída, e que dessa auto percepção podem
solicitar alteração nos registros assentados de prenome e sexo sem que lhes seja exigido
laudo médico, procedimento cirúrgico, tempo mínimo ou quais outras condições
patologizantes, uma vez que a mesma corte entende tais procedimentos como vexatórios
e que atentam contra o exercício da liberdade e da dignidade humana, expressos na
Constituição Federal e no Pacto de São José da Costa Rica, elevando esta possibilidade
de mudança ao caráter de Direito Fundamental.

Referências Bibliográficas

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.


Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. 292 p.

BRASIL. Lei nº 6015 de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registros


públicos, e dá outras providências. Disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6015consolidado.htm. Acesso em:
12/05/2018

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Regimento Interno do Supremo Tribunal


Federal. Disponível em:
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=legislacaoRegimentoInterno.
Acesso em: 12/05/2018

CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução nº 1955 de 3 de setembro


de 2010. Dispõe sobre a cirurgia de transgenitalismo e revoga a Resolução CFM nº
1.652/02. Disponível em:
https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2010/1955. Acesso em
12/05/2018

COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIRETOS HUMANOS. Convenção


Americana de Direitos Humanos (1969). Disponível em
https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/c.convencao_americana.htm Acesso em
12/05/2018

16
17

Anda mungkin juga menyukai