Se tenciona ler o artigo sobre o vinho, peço-lhe que o leia até ao fim, antes de tirar
as suas conclusões. Este artigo poderá ser copiado livremente, mas com duas
condições: Em primeiro lugar, que seja feita uma divulgação da totalidade do artigo
e não somente a parte que mais se adapta às suas idéias, e em segundo lugar, que
seja mencionada a sua origem, a “Estudos bíblicos sem fronteiras teológicas” ou a
“Site-berea”. Que o Senhor o oriente na leitura deste estudo.
O vinho, na Bíblia
Introdução
Recebi há dias esta mensagem dum jovem irmão em Cristo, de Campinas, no Estado de São
Paulo – Brasil.
A Paz do Senhor,
Irmão Camilo, saudades, como vai! Já faz tempo que não nos falamos, aliás estive fora
da internet uns dias, resolvendo problemas, mas graças a Deus sempre com Jesus no
barco.
Gostaria que o irmão, mais uma vez me respondesse a questões voltadas à Bíblia, e
desta vez gostaria que o irmão me esclarecesse melhor, o que o apóstolo Paulo estava
querendo dizer a Timóteo quando implicou sobre que os diáconos deveriam não ser
dados a muito “vinho”, Várias passagens na Bíblia falam do vinho, do suco da uva,
segundo o dicionário, mas porque não ser dado a muito suco de uva, ou qual a
explicação à luz da Bíblia, pois, também o apostolo, fala para não nos enchermos do
“vinho”, em que há contenda, mas do Espírito de Deus!
Aguardo resposta,
Qual terá sido o motivo que levou este jovem a fazer-me esta pergunta? Não é caso
isolado, pois alguns outros brasileiros, na maioria jovens, encontram a minha página na
internet e resolvem contactar-me, fazendo perguntas a que tento responder, embora não
seja pastor e não fale em nome de nenhuma igreja. É interessante, que estando em
Portugal, são em muito maior número os brasileiros que me contatam do que os
portugueses. Talvez em parte, seja pela minha página “Estudos bíblicos sem fronteiras
teológicas”, uma página que somente se preocupa com a fidelidade aos textos bíblicos,
sem se preocupar com as tradições, sejam elas católicas, evangélicas ou ortodoxas.
Mas, será que faz sentido, um jovem diácono brasileiro, dirigir esta pergunta para o outro
lado do Atlântico ?
Penso que sim, que esta troca de pensamentos e opiniões entre os dois lados do Atlântico,
do Brasil para Portugal, e de Portugal para o Brasil, é salutar e é uma forma de testar as
nossas convicções teológicas, uma forma de saber se uma determinada afirmação ou
opinião tem fundamento bíblico ou se será somente fruto do nosso contexto cultural ou
histórico. É que o genuíno Evangelho que Cristo nos apresentou, é universal, é para todas
as épocas e todas as culturas. Podemos testar a veracidade das nossas convicções, até
mesmo dentro do nosso espaço lusófono, pois se determinada afirmação não for válida em
Curitiba no sul do Brasil, em São Paulo, no interior da Amazônia, em Lisboa, em Nampula
no norte de Moçambique, na Guiné, nas Ilhas de Cabo Verde, nas ilhas dos Açores, no
meio do Atlântico ou na Marinha Grande no centro de Portugal, onde me encontro, então é
porque não se trata duma genuína afirmação bíblica eterna e universal, mas somente um
aspecto da nossa cultura.
Os aspectos culturais podem e devem ser questionados, mas com precaução. Pelo fato de
determinada afirmação não ser bíblica, não significa que não seja útil a sua preservação,
enquanto se mantiver o contexto cultural que lhe deu origem. Mas deverá ser apresentada
como tal, como simples tradição e não como mensagem do Senhor, pois a Bíblia não pode
ser alterada.
Diferenças culturais
Esta diferença de atitudes tem uma origem histórica, pois o Brasil foi evangelizado
principalmente por missionários americanos, cuja tradição os proibia de beber vinho. Por
um lado, temos de ser compreensivos para com a sua atitude, pois vinham duma cultura
sem tradição vinícola, enviados por igrejas que não sabiam diferenciar o verdadeiro vinho,
do whisky, cachaça ou outras bebidas destiladas com elevado teor alcoólico e ao chegar ao
Brasil, onde a igreja mãe nos USA esperava que fundassem uma igreja que fosse uma
cópia fiel da igreja mãe, encontraram um povo em que o alcoolismo era um dos principais
problemas. A sua reação foi certamente a continuidade da tradição americana, que tinham
aprendido desde crianças, que o crente não pode beber. O Evangelho divulgou-se em todo
o Brasil principalmente entre a classe mais humilde, que nunca questionou tais ensinos em
face das Escrituras.
Segundo informação que consegui obter na literatura consultada, com especial referência
para o Dicionário Bíblico de Davis, a “International Standard Bible Encyclopaedia” e o
Dicionário de Teologia Bíblica da Bauer, (Edições Loyola) quase toda a bebida alcoólica que
se fabricava em Israel era vinho genuíno, vinho de uvas, que eram colhidas maduras e
transportadas em cestos para o lagar escavado em rocha, com cerca de 2 a 3 metros
quadrados de superfície e 40 a 50cm de profundidade. Pelas descrições que obtive, penso
que não seriam muito diferentes dos lagares que temos nesta zona do centro de Portugal,
onde me encontro, embora a maior parte desses antigos lagares, já não funcione devido a
outros métodos mais modernos e mais rentáveis que os tornaram obsoletos. Parece que a
única diferença é que estes antigos lagares que ainda temos em Portugal são de betão. É
possível que também haja lagares escavados em rocha, mas nunca os vi.
As uvas eram pisadas e o suco da uva, para empregar a expressão mais utilizada no Brasil,
ou o sumo da uva, expressão mais vulgar em Portugal e nos países africanos que falam a
nossa língua, embora o termo mais correto seja o mosto, escorria para uma vasilha ou
outro compartimento de menores dimensões. Penso que este sistema se manteve
praticamente inalterável há milênios, pois já era assim no antigo Egito, antes de Israel
existir como nação. Só nos nossos dias é que está a ser alterado, mas quanto a essa parte,
o melhor é pedir a colaboração a quem sabe, que não são os teólogos, mas os
especialistas no assunto, como é o caso da jovem engenheira de alimentação Ângela Faria,
membro da Igreja Batista da Maceira – Portugal, a quem vou pedir para nos falar do vinho
dos nossos dias.
Tal como nos nossos dias, pois as leis da química e da biologia não mudaram, o mosto
sofria a fermentação alcoólica, dando origem ao vinho e este, após a fermentação acética
dava origem ao vinagre. A palavra grega “oxos”, ou a hebraica “homes”, tanto podia
designar vinho como vinagre.
Devo afirmar em primeiro lugar, que não há na Bíblia, passagens didáticas sobre o vinho,
que definam com o rigor científico dos nossos dias o que é propriamente o vinho, e as suas
características químicas e bacteriológicas, mas vamos fazer referência às várias palavras,
quer no hebraico do Antigo Testamento, quer no grego do Novo Testamento.
A expressão mais utilizada, que é traduzida por vinho, é a palavra hebraica “yayin”
equivalente à palavra grega “oinos” e à palavra latina “vinus” que deu vinho na nossa
língua. Essa palavra aparece em Gênesis 9:21 e Gênesis 19:32, onde pelos seus efeitos,
não há dúvida de que era mesmo vinho que foi consumido descontroladamente.
A palavra “tirosh” que aparece em Números 18:12, Neemias 10:37, Joel 2:24 a maior parte
das nossas melhores versões da Bíblia traduziu por mosto ou vinho novo. Na passagem de
Joel, não há dúvida de que era mosto, pois se ainda estava a transbordar no lagar,
certamente que ainda não tinha fermentado. No entanto, nas outras passagens é por vezes
traduzida por vinho, ou vinho novo.
Outra palavra que aparece por exemplo em Atos 2:13 é a palavra “gleukos”, que a maior
parte das nossas versões traduz por mosto.
Penso que ao considerar estas palavras, não podemos ignorar o contexto histórico destes
textos. Presentemente, todas as garrafas de vinho em Portugal, têm a indicação do teor
alcoólico que é determinado pelo laboratório de análises da adega cooperativa onde o
vinho foi produzido, mas nessa época ainda não havia equipamento para determinar a
composição do vinho. Não é de estranhar que apareçam casos intermédios, em que não
está bem definido do que se trata. Assim, como classificar o “vinho”, uma semana depois
das uvas serem prensadas ? Ainda falta muito para ser vinho “oinos”, mas a fermentação
alcoólica já se iniciou e já não é o genuíno mosto “gleukos”. Neste caso, talvez a
designação mais correta fosse o “tirosh”, que por vezes é traduzido por vinho novo. Um
caso em que há certa indefinição é a passagem que já mencionei em Atos 2:13, pois
“gleukos” significa mosto. Mas será que eles poderiam estar embriagados com mosto, o tal
suco da uva ? Penso que mais correta neste ponto será a Bíblia de Jerusalém que traduz
por “vinho doce” dando a idéia dum início de fermentação alcoólica. Mas não há dúvida de
que o vinho velho, já fermentado era o mais apreciado, segundo vemos no próprio
evangelho de Lucas 5:39 onde aparece a expressão grega mais utilizada “oinos”.
Atos 2:13
Lucas 5:39
Uma vez que a vindima está relacionada com a época do ano e se efetua só uma vez por
ano, o natural era terem o mosto só nessa época, nos dias em que as uvas eram pisadas,
uma vez que ainda não havia a cultura em estufas, para se obter uvas fora da época, nem
meios de congelamento para conservação do mosto, técnicas que são bem dos nossos
dias.
Havia também o “mesek” ou “mimsak” que aparece em Salmos 75:8, Provérbios 23:30,
Isaías 55:11 que era o vinho misturado com especiarias.
Havia também bebidas alcoólicas fabricadas com outros frutos, que não eram propriamente
o verdadeiro vinho de uva, mas produtos da fermentação da cevada (antepassado da
cerveja?), da tâmara, da maçã e de outros frutos.
Utilidade do vinho
É evidente que a maior utilidade do vinho, o vulgar vinho do ano, o “yayin” do Antigo
Testamento, ou o “oinos” do Novo Testamento, tal como se passa nos países de tradição
vinícola, como Portugal, era para ser bebido às refeições. Era a bebida do pobre, embora
houvesse outros tipos de vinho a custos mais elevados, só acessíveis a uma minoria.
Há no entanto, várias passagens em que o vinho era utilizado como medicamento. É o caso
de Lucas 10:34, na parábola do bom samaritano, em que este deitou azeite e vinho nas
feridas. Temos também em I Timóteo 5:23 o caso de Paulo a aconselhar Timóteo a beber
um pouco de vinho por causa das suas enfermidades.
Lucas 10:34
I Timóteo 5:23
No Antigo Testamento, encontram-se passagens que determinavam as ofertas de vinho
dedicadas ao Senhor, em Êxodo 29:40, Levítico 23:13, Deuteronômio 14:26 onde aparece a
mesma palavra “yayin” que serviu para embebedar a Noé em Gênesis 9:20, palavra que
aparece, quer isolada, quer associada a outras palavras.
Gênesis 9:20
Êxodo 29:40
Levítico 23:13
Deutero-
nômio
14:26
Também Melquisedeque, rei de Salém e sacerdote do Deus altíssimo, tantas vezes citado
como um exemplo digno de se seguir, quando se fala no dízimo, em Gênesis 14:18 trouxe
pão e vinho “yayin”.
Gênesis 14:18
Como evangélicos, a Bíblia é para todos nós, a tal espada de dois gumes, que tanto dá
para cortar para um lado como para o outro.... já todos nós sabemos disso. Mas dentro da
própria Bíblia, temos como supremo exemplo a figura do nosso Mestre, as suas idéias e o
seu comportamento e é isso que nos interessa.
Vejamos em primeiro lugar o que é possível conhecer sobre o vinho, no contexto cultural
em que Jesus viveu, em que havia uma secular tradição vinícola.
Muito dessa tradição, é bem parecido com o que se passa em quase todos os países
mediterrâneos, enceto o Norte de África, onde devido ao islamismo se perdeu a tradição
vinícola, mas ainda hoje, embora os hábitos estejam a mudar, é possível ver em algumas
antigas casas de campo em Portugal, Espanha, sul da França, Itália e Grécia, o fabrico de
vinho no lagar como se fazia no tempo de Jesus.
No Israel dessa época, havia os que exageravam no consumo do vinho e outras bebidas de
teor alcoólico muito mais elevado, e havia também os que se abstinham do vinho, como era
o caso dos recabitas, uma comunidade sectária que levava vida nômade e não praticava a
cultura da vinha nem qualquer tipo de agricultura, como vemos em Jeremias 35:12-15.
Havia também alguns casos em que se abstinham do vinho e certas comidas, geralmente
durante um certo período, para se dedicarem ao Senhor, e temos também os que faziam o
voto de nazireu, como era provavelmente o caso de João Batista, mas estes nem bebiam
vinho nem comiam uvas frescas nem secas, portanto também não poderiam beber do
mosto da uva, como vemos em Números 6:3.
Lendo os evangelhos atentamente e sem preconceitos, temos de concluir que Jesus bebia
vinho normalmente, como bebiam todos no seu contexto cultural.
É verdade que em Mateus 11:19, Jesus é acusado de ser comilão e beberrão.
Mateus 11:19
Vemos que a palavra utilizada no grego é “oinos” e beberrão poderia ter sido traduzido por
bebedor de “oinos”. Claro que não podemos aceitar esta acusação. O que deve ter
acontecido, é os seguidores de João Batista imaginarem um Messias do tipo de João
Batista, e quando viram que Jesus, em vez de se isolar no deserto ou no interior do Templo,
procurou aproximar-se dos pobres, sem fazer distinção alguma, ficaram escandalizados. E
ainda mais escandalizados ficaram, ao ver Jesus a beber com os pecadores e logo o
acusaram de beberrão. Isto ainda acontece nos nossos dias com esses “santarrões” que se
afastam do homem pecador e também querem confinar Jesus ao seu reduzido espaço
litúrgico.
A Bíblia apresenta várias passagens em que se alerta para o abuso do vinho. Encontramos
esses avisos em I Coríntios 5:11 e I Coríntios 6:10, Gálatas 5:21, Efésios 5:18 e I Pedro 4:3.
Embora não tenhas mencionado as passagens, certamente por não ser necessário, de tal
maneira elas são conhecidas de todos nós, não tenho dúvidas de que te referes a I Timóteo
3:8 e Efésios 5:18.
Tens toda a razão nas dúvidas que levantas, e a tua atitude de questionar o que te
ensinaram, está perfeitamente de acordo com a mentalidade dos bereanos que Paulo
elogiou, apresentando-os como um exemplo de estudantes da Bíblia. Isso foi assim no
tempo de Paulo, embora essa mentalidade ficasse esquecida durante vários séculos.
Durante toda a idade média a Bíblia ficou esquecida, para se ensinar a tradição da Igreja,
produto da mente humana. No entanto, a mentalidade dos bereanos voltou a reviver nos
tempos da Reforma Protestante, quando a opinião das “Autoridades Eclesiásticas” foi posta
em dúvida pelo povo que depois de tantos séculos, voltara a ter acesso às Santas
Escrituras. Parece-me que nos nossos dias, temos de reaprender que a Bíblia, e em
particular os ensinos do nosso Mestre, são a nossa única e insubstituível fonte de
conhecimento de Deus e o nosso padrão de comportamento, ou como dizia Lutero
“Somente a Escritura”.
Por vezes, quando se levantam questões um tanto incômodas para os nossos “entendidos”,
quando há falta de argumentos, é vulgar a afirmação: “A Bíblia em português diz isto...
(como se não conhecêssemos a nossa língua!!!). Mas nos textos originais aparece outra
coisa. O irmão sabe hebraico ? Conhece o grego ?.....” E assim acaba a conversa.
Penso que nós, os que não sabemos grego nem hebraico, não temos necessidade de nos
reduzirmos ao silêncio perante tais argumentos. O estudo das Escrituras é demasiado
importante para que possamos confiar em quem quer que seja, muito menos nos teólogos,
embora com todo o respeito que nos merecem, pois a história da Igreja, tanto no passado
como no presente, está cheia de exemplos de como a Bíblia tem sido deturpada, por vezes
até com boas intenções, por pessoas que pensaram estar prestando um bom serviço à
Igreja do Senhor. A melhor maneira de salvaguardar esses desvios doutrinários, é a Bíblia
ser interpretada por aqueles a quem o Senhor a dirigiu, pelo próprio povo evangélico.
Assim, mais importante do que a minha opinião ou a minha explicação para a tua pergunta,
é examinares pessoalmente os textos em grego dessas passagens, que vou juntar a seguir.
Se a palavra que encontrares for “gleukos”, como está em Atos 2:13, então é mosto, ou
suco de uva, mas se encontrares “oinos”, escrito com letras gregas, então é vinho, o tal
vinho de uva já fermentado.
I Timóteo 3:8
Efésios 5:18
Meu querido e jovem irmão. Fico feliz por me dirigires esta pergunta, um tanto polêmica,
mas o apelo que te faço é que não acredites em mim, nem em ninguém, mas apega-te às
Escrituras, em especial aos textos originais, que afinal concordam com a nossa Bíblia em
português.
Verifica-se uma certa unanimidade em todas as boas traduções que consultei, traduções
efetuadas a partir das cópias dos manuscritos originais. Em Mateus 26:26-29, Marcos
14:22-25 e Lucas 22:1720 tanto Ferreira de Almeida, como a Jerusalém, e a TEB traduzem
por fruto da vide, ou da videira e em I Coríntios 11:23-26 referem-se a cálice. A TOB refere-
se a “fruit de la vigne” e “cette coupe” respectivamente, Reina Valera menciona “fruto de la
vid” e “copa” e a Vulgata Latina menciona “genimine vitis” e “calix”.
Essa passagem em Atos, é muito significativa, pois culturalmente está bem próxima da
nossa cultura. Em Portugal, quando se convida alguém a “tomar um copo”, subentende-se
que será um copo de vinho, pois se não for de vinho, será necessário mencionar que é um
copo de cerveja ou um copo de água... mas se nada se disser sobre o conteúdo do copo,
certamente que será de vinho. Parece ter sido esse o critério seguido por Lucas, quando
escreveu o livro de Atos mencionando o cálice sem referir o seu conteúdo.
Outro argumento utilizado para “provar” que na Ceia do Senhor não foi utilizado vinho, mas
somente o mosto, que teria de ser conservado desde a vindima do ano anterior, pois esta
se fazia em Agosto e Setembro e eles estavam na época da Páscoa (14 de Abib) que
corresponde aos meses de Abril ou Maio, é o fato do Êxodo 12:14-30 proibir que, nesses
sete dias da festa pascal, houvesse fermento nas casas dos judeus. Este argumento, não
toma em consideração a época e a cultura, pois fermentação do vinho, nunca na Bíblia foi
considerada como fermento e o contexto desses versículos mostram claramente que toda a
ênfase é colocada nos pães asmos. Quem comesse pão levedado na época da Páscoa, de
acordo com o versículo 15, seria “cortado” ou “eliminado” de Israel, uma forma de se referir
à pena de morte. Mas ao aceitar este argumento como válido, então teríamos
principalmente de rejeitar a utilização do vulgar pão, nos nossos cultos de Ceia do
Senhor,para passar a utilizar a hóstia, como fazem os católicos. É verdade que o Antigo
Testamento por vezes fala no fermento associando-o à impureza e ao pecado, mas Jesus
não deu apoio a esta velha idéia sobre o fermento, quando em Mateus 13:33 compara o
próprio Reino de Deus com um pouco de fermento. Penso que isso é um bom passatempo
para os “fariseus” dos nossos dias que ainda não compreenderam que a mensagem de
Jesus não está subordinada à mentalidade veterotestamentária, pois muitos critérios foram
anulados ou profundamente alterados, e a Ceia do Senhor não é uma comemoração da
Páscoa judaica: Não se fala do cordeiro pascal e os elementos centrais são o pão e o
vinho. Mas há outra profunda diferença. É que a morte, o cadáver, que era o máximo de
impureza, em especial em Levítico, que tornava impuro quem nele tocasse, passa a ser
fonte de benção e de vida, passa a ser o único caminho para Deus.
Bodas de Caná
Um dos primeiros milagres de Jesus, pelo menos é o primeiro que ficou registrado,
encontra-se em João 2:1-12.
Segundo os textos bíblicos, Jesus transformou a água em vinho. A palavra que aparece nos
versículos 3, 9 e 10, nas cópias dos manuscritos em grego, não é “gleukos” nem “tirosh”
que possam ser traduzidas por mosto, mas é a palavra “oinos” que significa vinho, o
verdadeiro vinho de uva, já fermentado.
João 2:1-12
1) Dizem alguns, que após esgotado o vinho, foi servida água, em tom de piada que foi
bem aceite por todos.
2) Se o objetivo do milagre era manifestar a glória de Deus, não poderia ter sido verdadeiro
vinho, depois dos convidados já terem bebido muito.
Prefiro não comentar estes argumentos, mas não posso deixar de lamentar a forma como
torcem as Escrituras para as adaptar às suas tradições.
Podemos imaginar o que seria dum convidado que chegasse atrasado ao casamento em
Caná. A primeira preocupação seria procurar uma talha com água para as purificações
rituais. Mas chega à primeira talha que encontra cheia de vinho e pensa... Não é aqui. Deve
ser aquela outra talha, mas na outra também só há vinho e é assim em todas as seis
talhas. Então, como cumprir a Lei de Moisés ? Não ficou água para as lavagens rituais,
nem há água para se misturar no vinho. Então, a grande preocupação; agora o que fazer ?
Abandonar a festa entristecendo os noivos ou aproximar-se dos outros convidados sem as
lavagens rituais ?...
Estes problemas sem solução, podem acontecer nos nossos dias, se não aceitarmos que o
Mestre chegou, e está entre nós!!.... Tudo o mais está ultrapassado. Ou nos juntamos e nos
alegramos com os pecadores salvos por Jesus, ou então, temos de nos juntar aos “fariseus
do nosso tempo”, que colocam as suas tradições acima da Boa Nova que Cristo nos
anunciou.
Vinho – 2
Em Portugal, desde o início da Nacionalidade até aos nossos dias, o vinho ocupou sempre
um lugar de destaque na economia agrária, nomeadamente a partir do século XIV, nas
exportações portuguesas para o estrangeiro (estas eram primeiramente de diversos vinhos
com uma qualidade variada, mas desde o século XVII salientou-se o comércio do vinho do
Porto). Sendo um produto com uma longa tradição que se estende até á mesa no momento
da confraternização, ao saborear do vinho, é uma herança que passa de geração em
geração, feita de amor à terra e ao clima ameno com que fomos abençoados.
Constituição da uva:
O engaço é:
pobre em açucares,
médio em ácidos salificados,
rico em polifenóis (taninos) responsáveis por grande parte da adstringência
(sensação de “boca grossa”, acontece quando mastigamos algum fruto que não
esteja maduro ou ingerimos um vinho) dos vinhos e baixa acidez (pH >4).
A película contém:
vitaminas (vestígios).
A grainha contém:
.água (36 – 40%),
.óleos (10 – 12%),
.taninos (5 – 8%),
.matérias ácidas voláteis (1%),
.matérias azotadas (1 – 2%)
.matérias hidrocarbonadas (34 – 36%).
Da vinha à garrafa:
1) Escolha de castas
2) Tratamentos fitossanitários
3) Controlo de maturação
4) Sumo de uva
5) Esmagamento
6) Esgotamento - Prensagem
7) Maceração - Defecação
8) Fermentação
9) Vinho - Armazenagem
10) Colagem - Filtração
11) Tratamento pelo frio - Filtração
12) Engarrafamento
Viticultura - Ponto 1) a 4)
Vinificação - Ponto 2) a 9)
Enologia - Ponto 9) a 12)
Nota: Estas operações são algumas das necessárias para a transformação do sumo de uva
(suco de uva) em vinho. As técnicas variam quando se quer produzir um vinho tinto ou um
vinho branco, e ainda, por exemplo um vinho VQPRD (vinho de qualidade produzido em
região demarcada) ou um vinho corrente.
Comparação entre vinho (produto obtido através de uma fermentação) e outro gênero
de bebidas (produtos obtidos principalmente através de destilação)
Vinho: bebida alcoólica obtida por fermentação do mosto de uva, sendo composto por
água (componente majoritário), álcool etílico (7% a 17% de volume) e por cerca de
duzentos componentes diferentes dentro dos quais destaco os ácidos orgânicos (málico,
tartárico, cítrico, acético e carbónico), polifenóis (tanino e corantes autociânicos), glicerina,
glúcidos (glucose, frutose, pentose), substâncias nitrogenadas (aminoácidos, proteínas,
aminas), sais minerais (fosfatos, sulfatos, cloretos, potássio, cálcio) e substâncias voláteis
(aldeídos, acetonas, ésteres).
Acidez:
-acidez total: é através de titulação com soda que chegamos a este resultado
usando o azul de bromatimol como indicador, o resultado vem expresso em gramas
de ácido tartárico por litro,
Nota: Estas são apenas algumas das análises que podem ser efetuadas ao vinho. Existe
também muito mais legislação que está sempre a ser atualizada, embora a maioria dos
laboratórios utilize nas análises de rotina as por mim referidas.
Vinho – 3
Bebidas alcoólicas são bebidas que, como o seu nome indica, contêm álcool. O álcool
etílico ou etanol, molécula de formula química CH3 CH2OH é o principal álcool destas
bebidas que o contém em diferentes concentrações.
Bebidas fermentadas, tais como o vinho (de 8º a 13º), a cerveja (de 4º a 8º), a
água-pé e a cidra (da fermentação do sumo de maçã, raramente ultrapassa os 4 a
5º).
Dado que as várias bebidas alcoólicas vulgarmente usadas, têm diferentes graduações,
obviamente que elas podem fornecer ao organismo idênticas quantidades de álcool se
ingeridas em volumes diferentes. Os copos habitualmente usados para as diferentes
bebidas, têm idêntica quantidade de álcool, isto é, 8 a 12 gramas de álcool puro,
aproximadamente (porque as bebidas mais graduadas se servem nos copos mais
pequenos, e as menos graduadas, nos maiores).
Não são as bebidas alcoólicas que fazem bêbados e bebedores excessivos. Pessoas
dependentes dos efeitos psico-comportamentais do álcool e pessoas solicitadas pelo meio
e desconhecedoras de quando, quanto e o que beber é que se tornam bebedores regulares
abusivos.
Se é adulto e saudável e aprecia “uma boa pinga”, beba com gozo e moderação enquanto
come, ou logo depois. Prefira vinhos tintos ou brancos, garantidamente “honestos” e
naturais. Guarde as outras bebidas alcoólicas para saborear parcimoniosamente só em
momentos especiais. Recorde-se que para “matar a sede”, nada melhor do que água
simples. Quanto mais forte a bebida e mais vazio o estômago, maior e mais rápida é a
absorção e a elevação do teor alcoólico no sangue e mais provável é que esses teores
ultrapassem a capacidade fisiológica de desintoxicação.
Com almoços e jantares ligeiros é aconselhável ficar por metade dessas quantidades. E
fora das refeições, nada!
As mulheres devem quedar-se por 70% das quantidades referidas, já que têm uma
capacidade de metabolizar o álcool, inferior à dos homens.
Defende-se que antes dos 17 - 18 anos não se devem consumir bebidas alcoólicas, porque
os sistemas desintoxicantes do organismo não são ainda suficientemente eficazes. O
contacto com o álcool antes de completada a maturação causa subdesenvolvimento do
organismo, prejudica a imunocompetência, afeta as capacidades intelectivas, contribui para
o insucesso escolar e dificulta a aprendizagem profissional.
CONCLUSÃO
Outra coisa é beber com moderação e oportunidade. Mas coisa boa, talvez seja beber com
moderação e oportunidade vinho tinto de qualidade.
BIBLIOGRAFIA
MANUAL DE ALCOOLOGIA - Maria Lucília Mercês de Melo, Augusto Pinheiro Pinto, Maria
Henriqueta Frazão, José Pereira da Rocha - Coimbra 1988
Isaque dos Santos Pereira, Assistente Graduado de Clínica Geral, Leiria – Portugal
Vinho – 4 (Camilo Coelho)
Conclusão
Ao chegar ao fim deste estudo, é natural que alguns dos leitores da “Estudos bíblicos sem
fronteiras teológicas” me perguntem: “Mas então, se esta é uma página evangélica na
internet, não deveria ter mais consideração pelas nossas tradições evangélicas ?”
Confirmo que a “Estudos bíblicos sem fronteiras teológicas” é uma página evangélica, mas
empregamos o termo evangélica, querendo afirmar que está ao serviço do Evangelho, o
que não implica necessariamente, estar ao serviço das tradições das igrejas evangélicas.
Claro que não podemos ignorar que esta página será visitada por muitos evangélicos,
católicos, ateus ou agnósticos, mas ao apresentar estes estudos sobre o Evangelho, não
tencionamos ser influenciados pelas tradições de evangélicos ou católicos, pois como diz
Paolo Ricca, Professor da Faculdade Valdense de Teologia, “O pregador não deve ser
cúmplice das idéias da comunidade ou de uma pessoa individualmente.” Não é o fato de
determinada idéia ser aceite pelas nossas igrejas que nos deve pressionar a aceitá-la, pois
a Bíblia e mais concretamente os evangelhos e a palavra de Jesus, são o nosso único e
insubstituível ponto de referência.
Penso que este estudo sobre o vinho nas Escrituras, tem mais interesse para os brasileiros
e outros leitores de língua portuguesa do que para os portugueses, pois estes últimos, têm
uma antiga tradição vinícola e geralmente sabem o que podem e quanto podem beber, mas
penso que mesmo estes terão interesse nos esclarecimentos do Dr. Isaque Pereira como
médico e da Engenheira de alimentação Ângela Faria.
Dois mil anos nos separam do nosso Mestre, que todos ansiamos por conhecer melhor.
Temos algumas informações e damos graças a Deus, em primeiro lugar, pela preservação
dos textos bíblicos, em especial dos evangelhos, mas temos também a tradição que nos
apresentam as igrejas do nosso tempo e dou graças a Deus pela ação de católicos,
protestantes ou ortodoxos, pois nos dão alguma informação sobre o nosso Mestre, mas por
vezes temos a sensação de estar perante uma velha estátua, que foi construída há dois mil
anos, mas que presentemente já está suja pelo tempo e pelos excrementos dos pássaros.
Há muita tradição, produto da mente humana, que foi acrescentada à mensagem das
Escrituras, por vezes por motivos econômicos, como no caso das indulgências ou da
obrigatoriedade do dízimo, mas geralmente com boas intenções, por teólogos que
pensaram “ajudar” o Senhor, acrescentando suas convicções pessoais ao Evangelho,
pensando ingenuamente que Deus necessitava da sua ajuda para retificar ou completar a
sua revelação ao homem.
O desafio que o Senhor coloca perante todos nós, é de limpar a velha estátua, para tentar
chegar às origens, ao tempo em que Jesus apresentou o seu Evangelho. Claro que haverá
reação dos que se habituaram a ver a velha estátua enegrecida pelo tempo e pela sujidade
e preferem que assim continue.
Que o Espírito do Senhor nos encaminhe para separar do verdadeiro Evangelho, tudo que
é tradição católica, por vezes medieval, ou tradição e erros do protestantismo, com origem
em contextos culturais que nada têm a ver com os nossos e muito menos com esse Jesus,
que não era português nem brasileiro, não era europeu nem africano, não era católico, nem
evangélico, nem ortodoxo, mas que é a PALAVRA DE DEUS, que se manifestou há 2000
anos, num país pobre da Ásia menor, chamado Israel.
Parece-me, pelo que já foi dito, que podemos tirar as seguintes conclusões:
1) O vinho era bebida que geralmente fazia parte das refeições, no contexto cultural em que
Jesus viveu, e o nosso Mestre, integrado na sua cultura, tomava vinho assim como todo o
homem do seu tempo.
Mas há outro aspecto que não podemos ignorar. Embora para todos nós, que nos
entendemos em português, quer brasileiros, portugueses, angolanos, moçambicanos, etc, a
palavra vinho tenha o mesmo significado, a semântica desta palavra nem sempre é a
mesma, pois em Portugal, vinho é a bebida do pobre, assim como acontecia no contexto
cultural em que Jesus viveu, mas a realidade quer no Brasil, quer noutros países lusófonos,
é bem diferente.
Vejamos o que representa para o brasileiro da classe mais humilde, que receba o seu
vencimento mínimo, o custo duma garrafa de vinho brasileiro e fazer as mesmas contas em
relação ao vencimento mínimo em Portugal, no corrente ano de 2001. Vou fazer as contas
em reais, pois esta parte tem mais interesse para os leitores do Brasil, já que em Portugal
ninguém tem dúvidas de que vinho não é aguardente.
No Brasil, uma garrafa de 0.7 litros custa 4 reais, o que dá 4/0.7= 5.7 reais/litro. Para o
brasileiro mais humilde, que receba o vencimento mínimo de 180 reais, um litro de vinho
corresponde a 5.7/180=0.0317 ou seja 3% do seu vencimento.
Em Portugal, o pobre geralmente não compra vinho à garrafa, mas ao garrafão que sai
mais barato. Um garrafão de 5 litros custa entre 6 a 12 reais em moeda brasileira.
Considerando um valor médio de 10 reais, o que daria 2 reais/litro, para o português mais
humilde, que receba o vencimento mínimo de 670 reais, teremos de concluir que um litro de
vinho representa 2/670=0.003 ou seja 0.3% do seu vencimento.
Julgo que ao falar em vinho, no Brasil e em Portugal, não podemos esquecer de que
embora em teoria seja a mesma coisa, estamos a utilizar a mesma palavra com uma
semântica bem diferente dos dois lados do Atlântico. Em Portugal, assim como em Israel no
tempo de Jesus, vinho é a bebida do pobre, mas no Brasil isso já não funciona, pois o
pobre no Brasil geralmente não tem acesso ao vinho e por vezes acaba por confundir vinho
com cachaça, que pode comprar a 1,5 a 2 reais/litro.
Gostaria ainda de meditar no uso do vinho na Ceia do Senhor, mas devido ao tamanho um
tanto exagerado deste estudo, vou abrir outra página dedicada ao assunto, pelo que
convido o leitor a ler o artigo “Ceia do Senhor”.
Espero que quem tenha entrado neste artigo, o tenha lido até ao fim, ou que pelo menos
tenha lido esta conclusão, pois gostaria que ficasse bem claro que o vinho que Jesus bebia,
era o genuíno vinho de uva, não era cachaça nem whisky, cujo teor alcoólico é muito mais
elevado do que o do vinho natural, o suco de uva fermentado.
Não posso dizer que a Bíblia proíbe a cachaça ou o whisky, pois em Números 28:7 a
“bebida forte” faz parte das ofertas no Templo, e em Deuteronômio 14:26, o judeu que
oferecesse o holocausto, era convidado a comer da sua própria oferta, incluindo “bebida
forte”, no próprio Templo. Mas como já vimos, não é recomendável o uso de “bebidas
fortes” (aguardente, cachaça. whisky etc.), a não ser com muita moderação, pelos motivos
que a medicina nos apresenta. E no caso do genuíno vinho de uva, há que ter em atenção
os pormenores para que nos alertam os dois especialistas no assunto, pois os efeitos
benéficos para o nosso organismo, só são válidos se soubermos beber tendo em atenção
todos os pormenores já apresentados.
Tivemos também a valiosa colaboração do médico Dr. Isaque Pereira, também membro da
Igreja Batista da Maceira, a quem apresentamos os nossos agradecimentos.
Quero ainda mencionar o Pastor e Professor de Psicologia Dr. Orlando Caetano pela sua
preciosa ajuda no Hebraico e no Grego. Este autor é já bem conhecido dos leitores desta
página da internet através dos seus artigos.
Que o Senhor nos conceda o bom senso, para tomarmos a opção correta quanto às nossas
bebidas.