1. Maribel Dietz. Wandering monks, virgins, and pilgrims: ascetic travel in the
Mediterranean. Pennsylvania State University Press, 2005.
2. Jerrilynn Denise Dodds. Architecture and Ideology in Early Medieval Spain.
Pennsylvania State University Press; 2 edition, 1994.
artéria romana, por onde passaram as hostes invasoras, é opinião de
alguns autores que a pequena capela não poderia ter resistido à
invasão. Teria havido, portanto, uma reconstrução de características
moçárabes nos séculos X ou XI após a reconquista cristã, não sendo a
actual capela a originariamente mandada construir pelo Santo3, como
outros supõem4.
Reconstruída ou não a capela, o culto de São Frutuoso nunca deixou
de existir, e no século XI ter-se-á tornado tão enraizado que, em 1102,
o Arcebispo de Compostela, temendo a concorrência da devoção à de
São Tiago, numa visita a Braga, aproveitando a ausência de Geraldo de
Moissac, prelado de Braga, furtivamente apoderou-se das relíquias de
Montélios e transportou-as para Compostela. A partir de então o culto
de São Frutuoso perdeu progressivamente importância.
No Século XVII o Arcebispo D. Diogo de Sousa efectuou obras no
mosteiro de S. Salvador e ali instalou os monges capuchos da ordem
de S. Francisco. Estes, crescendo em número, iniciaram, em 1728, a
construção de nova Igreja, fazendo-a acoplada ao mausoléu de S.
Frutuoso, que foi amputado e incluído na nova construção. Só no início
do século XX o monumento saiu do esquecimento, após a
desobstrução das paredes que o cobriam, e a reconstrução iniciou-se
em 1931 com Moura Coutinho4. A discórdia quanto à sua origem,
tratando-se ou não de uma construção posterior à primitiva, e a
polémica no que diz respeito ao restauro de monumentos antigos,
envolveu a reconstrução que nunca foi integralmente concluída.
3. Miguel Carrilho da Silva Pinto. A Igreja de S. Frutuoso de Montélios. ASPA, Braga, 1983.
4. João de Moura Coutinho. As artes pré-românicas em Portugal: São Frutuoso de
Montélios. Edição da Aspa, Braga, 1978.
5. Elisabetta Pagello. La materia e l'idea: significati e simboli nell'architettura antica.
Guida, 2003.
6. João de Moura Coutinho. Op. Cit.
martyria e mausoléus, onde assume relação simbólica, pela associação
ao triclínio, com o banquete eucarístico5. Seria, por outro lado,
igualmente significativa a aproximação da formação tríptica à
simbologia da Trindade6.
Os volumes exteriores individualizam-se bem numa distribuição
simétrica e harmoniosa. Nas paredes sobressaiem as arcaturas cegas,
alternando, ao contrário do que sucede no mausoléu de Galla Placídia,
arcos hemicirculares e em mitra. Esta disposição foi frequentemente
utilizada na decoração dos sarcófagos paleocristãos, como é o caso do
famoso sarcófago de Julius Bassus, justificando-se, pela sua difusão, a
inclusão em edifícios, como no interior do Baptistério dos Ortodoxos
em Ravena. A junção de dois arcos e uma mitra ou um arco e duas
mitras, como ocorre no Baptistério de São João de Poitiers, carregavam
a simbologia da Trindade.
Circundando o corpo central e servindo de base à cornija
desenvolve-se um friso que assenta em pequenos arcos geminados
ultrapassados que alternam, aos pares, com pequenos arcos de mitra.
O friso mostra flores-de-lis rodeadas por semicírculos justapostos sobre
um relevo de corda. Friso simples de corda contorna todo o edifício
cortando as arcaduras cegas, repete-se no corpo central ao nível da
base das janelas e emoldura os tímpanos dos frontões. Estes frisos
permitem estabelecer um ritmo decorativo que se acentua no
contraste do material escolhido, em calcário branco, com o negro do
granito dos silhares7.
Na parede exterior do lado norte da abside da cabeceira escava-se,
em toda a espessura da parede e fechado para o interior, o arcossólio
que abrigou o sarcófago de São Frutuoso, com tradição na prática
funerária das catacumbas dos primeiros cristãos. Num último gesto de
humildade, cumpriu a preceito canónico8.
Exceptuando, como já dito, os motivos decorativos, o material
empregue foi o granito da região, talhado em formas rectangulares,
regulares na altura mas não no comprimento. Nos três braços da cruz
e nas empenas do corpo central abrem-se vãos de pequenas janelas
com arco ultrapassado. Ainda que actualmente apenas visível na
elevação central, todas seriam geminadas, divididas por colunelo
central de mármore.
centro por flôr de lótus. São obra dos artistas que erigiram o
monumento primitivo, tomando inspiração coríntia e, provavelmente,
em construção romana de prévia existência no local, segundo os
defensores da originalidade da igreja. Porém, outros vêem neste
primoroso modelado o trabalho de uma reconstrução posterior.