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Título do Projeto

“A internacionalização de um híbrido bioenergético: traduções transnacionais da


Macaúba”

Pesquisadores
Daniela Alves de Alves - Doutora em Sociologia (UFRGS); Professora Adjunta
(DCS-UFV)
Victor Luiz Alves Mourão - Doutor em Sociologia (IESP-UERJ); Professor Adjunto
(DCS-UFV)

Resumo:

Este projeto busca olhar para o processo de internacionalização da ciência a partir dos
diversos agentes constituintes de um laboratório. Tendo como embasamento a literatura
produzida no campo da Ciência Tecnologia e Sociedade (CTS), especialmente a teoria ator-rede,
o projeto buscará compreender as relações e os agentes imbricados na formação de uma rede
internacional de pesquisa sobre a Macaúba.

Palavras-chave:​ Internacionalização, redes, Macaúba.

Introdução:
A internacionalização da ciência e da tecnologia (CT) tem sido um tema de extrema
relevância e atualidade no contexto contemporâneo. Multiplicam-se as iniciativas dos países,
institutos de pesquisa e universidades em estabelecer acordos bilaterais ou multilaterais de
cooperação científica e tecnológica, com o objetivo de trocar, compartilhar ou transferir
informações, tecnologias, processos, métodos, resultados de pesquisa. A pesquisa científica tem
sido um ​lócus privilegiado das relações internacionais no âmbito diplomático em um contexto
em que as universidades e institutos de pesquisa são vistos como alicerces do desenvolvimento
técnico e científico das diferentes nações.
Critérios internacionais de avaliação e validação do conhecimento técnico científico dos
pesquisadores e das revistas têm sido utilizados no Brasil como parâmetro de produtividade e de
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qualidade dos conhecimentos científicos produzidos. ​Os documentos institucionais das áreas de
conhecimento voltados para a avaliação da pesquisa nacional dão relevância à produção
científica internacionalizada, e as revistas científicas estrangeiras costumam ter uma presença
massiva nos estratos superiores da avaliação QUALIS de periódicos científicos.
A busca pela maior inserção na pesquisa internacional também é influenciada pelo
cenário internacional de busca por soluções conjuntas, embora desiguais, para problemas globais
tais como o impacto poluente crescente do consumo de energia e as mudanças climáticas. Neste
cenário, os grupos e laboratórios voltados para a pesquisa em fontes alternativas de energia são
inseridos na discussão técnica, científica e diplomática internacional em razão do alto grau de
relevância global das temáticas pesquisadas.
No ano de 2017 conduzimos uma pesquisa sobre a internacionalização dos grupos e
laboratórios de pesquisa em bioenergia. Entrevistamos o diretor de relações internacionais da
UFV, e cinco pesquisadores desta área, sendo quatro da UFV e um da UFMG. A proposta é que
aprofundemos o campo de pesquisa ao longo de 2018 ao realizar uma etnografia de um dos
laboratórios mais importantes nesta área em Minas Gerais.
Estamos diante de uma rede extensa de áreas distintas do conhecimento, produzindo em
seus laboratórios dados e fatos tecnocientíficos que já emergem transnacionais, especialmente no
campo dos tratados internacionais e das políticas locais. Há inúmeras agências enredadas nos
fatos tecnocientíficos, que são complexos, híbridos e globais. Esta rede que associa fluxos que
vão do global ao local, das políticas econômicas e científicas até a prática mais cotidiana da
produção do conhecimento, pode ser observada desde dentro do ambiente micro do laboratório,
como fazem os estudos etnográficos de laboratório. Como nos sugere Latour (2000),
consideramos que as fronteiras entre o interior e o exterior são porosas, já que as redes que
sustentam as atividades de pesquisa nos laboratórios se estendem para fora dele, canalizando
deslocamentos de pesquisadores e fatos científicos na trilha das inscrições “externas” e
transversais ao laboratório. Este movimento de deslocamento pela rede sociotécnica
internacional de pesquisa sobre a macaúba, é o aprofundamento a ser realizado neste momento
da do projeto ora proposto.
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Objetivo Geral:
O Objetivo geral do projeto é aprofundar o conhecimento sobre as práticas de formação
de redes sociotécnicas transnacionais de pesquisa em Macaúba sob a perspectiva bioeconômica.

Objetivos Específicos:
1. Analisar as dinâmicas internacionais da produção do conhecimento
científico-tecnológico, nas quais se insere a pesquisa brasileira sobre macaúba a partir do
laboratório etnografado;
2. Discutir teóricamente as concepções de centro e periferia do conhecimento científico;
3. Cartografar e diagramar, Ilustrando as dinâmicas e os processos de formação de redes
internacionais de pesquisa;
4. Etnografar as práticas, procedimentos e experiências subjetivas singulares de um
laboratório de produção do conhecimento em macaúba (rede macaúba de pesquisa
REMAPE).

Justificativa:

O presente projeto se insere numa linha de produção de conhecimento em Ciências


Sociais cada vez mais relevante para a compreensão da globalização dos conhecimentos, das
técnicas e dos efeitos do desenvolvimento científico e tecnológico. A produção científica é vista
sobretudo como uma atividade social e política e, neste sentido, cada descoberta possui um
ambiente e um contexto propício na qual pode germinar. Para Latour (2011, p. 229), a
construção de um sociograma - a disposição das relações sociais dos humanos - é correlata e tão
relevante quanto a construção de um tecnograma - a disposição dos elementos tecnológicos em
uma rede. Neste sentido, nos interessa delinear o contexto do sociograma e do tecnograma da
pesquisa sobre macaúba.
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Para Latour (1997, p.18) o antropólogo na sua busca pelas relações simbólicas, é atraído
para o estudo das mais diversas tribos, porém se retrai quando se trata de engenheiros, médicos e
ciências duras em geral.
A busca pelo estudo etnográfico de um laboratório se faz necessária na medida em que
podemos melhor compreender, em toda a sua materialidade, os ambientes acadêmicos de
produção do conhecimento. Um laboratório é composto por uma gama de materiais
heterogêneos, tais como pessoas, expertises, equipamentos, instrumentos, documentos,
legislações, recursos financeiros. No entanto, é comum que vários desses agentes fundamentais
na produção do conteúdo científico sejam ignorados na apresentação discursiva e simbólica de
tais espaços acadêmicos. Latour (1997, p. 19) critica este tipo de literatura pois ao excluir a
dimensão social tramada em conjunto com o desenvolver dos fatos tecnológicos esta leitura
coloca a ciência em um patamar inquestionável e não consegue ver as contradições nos processos
de construção científica.
No processo de observação de um laboratório, encontra-se um encantamento inicial, em
que o etnógrafo busca fazer sentido e categorizar a todo momento as relações travadas pelos
diversos elementos que compõe este ambiente científico. Uma abordagem interessante proposta
por STRATHERN (2014, p. 354) para resolver isto é a participação nas relações se assim o
pesquisador for convidado a fazê-lo, as informações devem ser vistas de maneira residual, e o
diário de campo deve descrever os fenômenos ocorridos no momento em que se observa para
que haja uma busca sobre as conexões feitas em um momento ulterior da pesquisa. Não está
evidente para o pesquisador o sentido de todas as ações tomadas e as influências quotidianas do
universo observado, então é necessário voltar às informações no momento da escrita para
compreender o que se está escrevendo. Esta busca metodológica é o que STRATHERN (2014,
p.350) coloca como “momento etnográfico”:
“​[…] Poderíamos dizer que o momento etnográfico funciona como exemplo de uma relação que junta o
que é entendido (que é analisado no momento da observação) à necessidade de entender (o que é observado no
momento da análise). É claro que a relação entre o que já foi apreendido e o que parece exigir apreensão é
infinitamente regressiva, isto é, ela desliza por todos os tipos de escala (e, mesmo na escala mais mínima, a
observação e a análise contêm, em cada uma delas, a relação entre as duas). Todo momento etnográfico, que é um
momento de conhecimento ou de discernimento, denota uma relação entre a imersão e o movimento[...]”
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O laboratório a ser etnografado foi escolhido na medida em que tem se destacado


nacional e internacionalmente na pesquisa de matéria-prima nativa da América Latina. A partir
de uma revisão bibliográfica prévia, pôde-se notar que os estudos sobre a Macaúba (cujo nome
científico é ​Acrocomia Aculeata​) têm um marco forte no ambiente político brasileiro a partir da
década de 80, remetido especialmente à criação do programa Pró-óleo no período militar.
Segundo Távora (2011, p. 16) sucessivas crises do petróleo mostravam a dependência da
importação do combustível fóssil, comprometendo o abastecimento. Durante as crises
instauradas na década de 70 os programas Pró-álcool e Pró-óleo foram pensados como maneira
de gerar autonomia energética no país. Neste período, fomentado pelo Pró-óleo, a pesquisa sobre
a Macaúba floresceu, tendo como um dos expoentes o pesquisador Hebert Martins (Azevedo
Filho, Colombo e Berton, 2012)1. Desde 2015, o Programa Nacional de Produção e Uso de
Biodiesel estimulou o campo científico e técnico em buscar oleaginosas alternativas na produção
de energia, embora a soja tenha se transformado desde então na principal matéria prima do
biodiesel brasileiro, inviabilizando a criação de um mercado mais plural, inclusivo e social nesta
área (CASTRO e ALVES, 2016).

Metodologia:
O presente projeto busca aprofundar resultados de pesquisa em andamento sobre a
produção do conhecimento internacionalizado em bioenergia, em Minas Gerais. Além das
entrevistas a serem realizadas, aprofundaremos a dimensão cotidiana da pesquisa com Macaúba.
O contato prévio com pesquisadores da área permitirá lançarmos mão da etnografia enquanto
ferramenta de estudo da formação da rede de pesquisa e fabricação científica sobre a Macaúba.
A origem da etnografia está em Franz Boas, (1848-1942) e em Bronislaw Malinowski
(1884-1842), que via na vida dos nativos que ele estudava uma lógica própria que precisava ser
descoberta. Foi Malinowski que instituiu a técnica de observação participante, pela qual o
pesquisador deveria passar por um período de imersão e de convivência cotidiana com os nativos
para ter acesso a sua cultura. Para estudar uma sociedade, uma comunidade, é assim necessário

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Notícia veiculada pelo portal CI Florestas: “Macaúba: história do nascimento de uma cultura - Sérgio Y.
Motoike, Antônio P. Nacif e José Mauro V. Paes fazem um balanço do histórico da Macaúba e suas
perspectivas”, disponível em: <​http://www.ciflorestas.com.br/conteudo.php?id=7015​>
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viver, falar, pensar e sentir com e como os nativos. A influência desta abordagem tem sido, desde
então, bastante relevante, sendo extremamente influente na pesquisa em ciências sociais e, em
particular, no campo dos estudos sociais das ciências (Goldenberg, 1999).
Os estudos de laboratório foram inaugurados na década de 1970 por três estudos
seminais: “Art and artifact in laboratory science: A study of shop work and shop talk in a
research laboratory”, de Michael Lynch; “Laboratory life. The Social Construction of Scientific
Facts”, de Bruno Latour e Steve Woolgar e “Manufacture of Knowledge: An Essay on the
Constructivist and Contextual Nature of Science”, de Karin Knorr-Cetina. Nestas obras, os fatos
científicos foram desnaturalizados, abertos, escrutinados, de tal forma que se pudesse tratar a
ciência de forma simétrica a outras produções simbólicas e materiais da sociedade, tal qual foi
proposto por David Bloor (2010).
No presente projeto, a etnografia consistirá em um acompanhamento presencial das
atividades, descrição e interpretação do que o pesquisador realiza e experimenta no laboratório,
especialmente nas dimensões do fazer científico que estiverem imiscuídas na conformação de
redes internacionais, tais como a troca de dados, de pessoas, de conhecimento e de
reciprocidades, com redes e pessoas de outros países e regiões. A etnografia pressupõe, conforme
colocado por Roberto Cardoso Oliveira (1996), três dimensões: Olhar, Ouvir e Escrever. O Olhar
constitui-se como um processo de refração no qual o pesquisador é capaz de enxergar os
elementos constitutivos do cotidiano pesquisa - em nosso caso, o laboratório - e como moldam as
interações presentes. O Ouvir possibilita um processo de compreensão das relações que os atores
que constituem o campo travam entre si, sendo necessário um ouvir que ultrapasse a relação de
pesquisador/informante, que se limita a apenas apreender a voz dos elementos estudados tal
como se fosse uma aspiração asséptica do conhecimento. O processo de Ouvir os atores em um
laboratório deve alcançar o nível dialógico de compreensão entre os mundos do pesquisador e
dos atores de seu campo de estudo. Por fim o Escrever é onde se materializa o conhecimento
estudado, constituído a partir de uma relação entre o conhecer e o comunicar, onde se descreve e
analisa o que se observou em campo. Trata-se de uma segunda parte do processo de pesquisa,
realizado após a coleta dos dados nos processos de Olhar e Ouvir, possibilitando uma reflexão ou
uma inferência do pensamento do pesquisador sobre a observação participante experienciada.
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Uma das abordagens mais influentes no campo dos estudos sociais de ciência e
tecnologia, é a teoria Ator-rede (TAR no Brasil, ANT - Actor-Network Theory - nos países
anglófonos), desenvolvida por pesquisadores como Bruno Latour e John Law. Um dos conceitos
centrais desta abordagem é o de simetria, trabalhado por Latour & Woolgar (1997, p. 24) no
sentido de nivelar analiticamente a arregimentação de elementos da natureza e da sociedade na
interpretação da construção dos fatos científicos. Latour (2005, 2011) aprofunda a simetria
quando trata como atores da construção social não somente os humanos, mas um coletivo de
híbridos, de humanos e não humanos, que de alguma forma modificam e são modificados no
processo de construção de fatos científicos.
A utilização de representações gráficas nas ciências sociais começa com Deleuze,
Influenciado pela teoria foucaultiana, ele distancia-se da representação cartográfica de senso
geográfico e pensa em como as relações podem ser representadas. PRADO FILHO & TETI
(2013, p.47) mostra que a cartografia deleuziana, busca ao invés de explicitar acidentes e
topografia dos espaços, busca a construção de diagramas dinâmicos, onde se possa verificar as
linhas de poder, os locais de enfrentamento e resistência sob uma perspectiva micropolítica.
Já sob a perspectiva de análise e representação da teoria ANT, o pesquisador
VENTURINI et. al (2012) busca as formas de elaborar o ​Controversy Mapping proposto por
Latour para representar as controvérsias sociotécnicas de um dado objeto de estudo. A
proposição do mapa não é interventiva, mas antes um produto de compreensão, reflexão e que
busca levar a novos pontos de controvérsias a partir das conexões explicitadas.
A utilização dos gráficos e diagramas para concectar os atores de um laboratório,
busca neste sentido, qualificar as conexões desenvolvidas e as relações de dependência e
articulação entre estes atores. Através da disposição gráfica dos equipamentos, cientistas,
procedimentos e corpo técnico, poderá compreender melhor a formação das caixas pretas e a
constituição do laboratório enquanto um negociador dos diversos interesses que se encontram
nele, como os do mercado, do campo acadêmico nacional e internacional.
Dentro desta perspectiva pode-se analisar a materialidade de um laboratório e o poder de
agência e relação destes diversos elementos tais como as ferramentas, as agências de fomento à
pesquisa, os instrumentos, os pesquisadores, etc, que formam e têm poder de ação sobre a
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construção do fato científico.

Internacionalização e circulação de ideias

A abordagem teórica relativa à internacionalização se mostra diversa. Bourdieu (2002)


afirma que as ideias produzidas não não naturalmente internacionais, sendo antes marcadas por
um referência interna, nacional. Bourdieu explicita que os pesquisadores que produzem ciência
também são marcados por pré-concepções e por disputas oriundas de seus respectivos contextos
nacionais. Neste aspecto o autor vê que a promoção da internacionalização científica não pode se
dar de maneira espontânea, “natural”, pois deixar que tal processo transcorra sem reflexividade
pode significar uma circulação científica deteriorada, de um conhecimento científico de
qualidade inferior. Como resposta a estas problemáticas Bourdieu coloca a importância de se
compreender o contexto em que as ideias são produzidas, transportadas e assimiladas. A
transposição entre campos dos conceitos dependem tanto dos campos que a recebem quanto dos
campos que a criam, uma vez que a má compreensão desses contextos promovem a distorção das
ideias geradas.

Já Leandro Medina (2013) propõe uma classificação sobre a temática da circulação do


conhecimento dentro da sociologia do conhecimento contemporâneo. Seu foco é a produção do
conhecimento como práticas desenvolvidas dentro e através dos laboratórios e universidades, que
contrapõe a temática tradicional de estudar a internacionalização através da dimensão da relação
entre nações centrais e nações periféricas (cf. Law (1999); Latour (2011)). A perspectiva adotada
pelo autor enfatiza as micronegociações que permitem transformar o conhecimento local
periférico em dispositivos transportáveis para qualquer parte do globo e, de maneira
simetricamente inversa, possibilitam a incorporação local de dispositivos criados em contextos
diversos. Dentro desta abordagem o autor enfatiza as estratégias que garantem a materialidade da
transmissão de conhecimento entre mundos sociais diferentes, como por exemplo o conceito de
objeto fronteira de Star e Grieseme (1989). Medina identifica ainda outras três abordagens
recorrentes no campo de estudos sociais sobre a internacionalização da ciência. A primeira
embasada em uma perspectiva positivista, que foca a atenção na difusão dos valores científicos
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produzidos no ocidente através do mundo. Para tal perspectiva, a divisão entre centro e periferia
seria a melhor forma de descrever a produção e a circulação do conhecimento, sendo que alguns
autores destacam o papel relevante da periferia como ​locus ​para coleta de dados e campo teste de
hipóteses das teorias centrais. Uma segunda abordagem mencionada pelo autor é a da teoria
pós-colonial, mais forte nos estudos culturais e na literatura do que na sociologia da ciência.
Nessa perspectiva o processo de constituição do saber é determinado pelo centro, devido a
aspectos desiguais que envolvem a colonialidade do poder, que legitima uma dicotomia na
produção do conhecimento, classificando aquela realizada na periferia como “cultural” em
detrimento do conhecimento científico, produzido no centro (cf. Mignolo (2003); Quijano
(2003)).

Segundo Vessuri (2011), entre os pesquisadores das universidades se estabelecem


lealdades divididas entre os grupos de pesquisa local a que pertencem e os grupos internacionais.
Jasanoff (2012) afirma que práticas científicas imperiais são capazes de produzir coerência e
coesão onde em verdade vigora hibridismo e tensão: a ciência tem sido historicamente utilizada
para a expansão imperial, seja através da governamentalidade das nações e dos indivíduos, seja
através do gerenciamento científico da natureza.

Na terceira perspectiva identificada por Medina, o ponto central é a compreensão dos


grupos sociais interessados na produção e a reprodução do capital científico, vista como uma
realidade universal (cf. Bourdieu, 2002). Estas quatro perspectivas reuniriam parte significativa
da produção contemporânea sobre a circulação de conhecimento científico.

Os resultados da pesquisa conduzida por nós indicam, preliminarmente que há vínculos


com organismos internacionais, com empresas, e com governos, mas em raros casos a
internacionalização da pesquisa é restrita exclusivamente às atividades acadêmicas e,
especialmente, ao que é mobilizado no imaginário vinculado às políticas voltadas para a
promoção da internacionalização enquanto prática de produção conjunta e colaborativa de
conhecimento entre pesquisadores de diferentes nações. Produzimos uma tipologia preliminar de
redes e conexões internacionais no âmbito do conhecimento produzido no interior das
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universidades.
Um dos tipos de redes encontradas no campo é voltada para a extensão tecnológica, na
qual a produção e a difusão do conhecimento está relacionada a uma expertise demandada por
um dos parceiros e concentrada pelo outro. Nesse tipo de redes a prestação de um serviço em
torno de determinado conhecimento é o produto principal.

Já a internacionalização acadêmica é aquela realizada exclusivamente no âmbito de


universidades e institutos públicos de pesquisa: ela é em geral mais voltada para a formação
conjunta de pessoal em nível de pós-graduação, participação conjunta em bancas, e para a
publicação de artigos. A entrevistada Eneida tem como prática regular a participação de, pelo
menos, um de seus parceiros estrangeiros nas bancas de doutorado realizadas pelo seu
laboratório.

Um terceiro tipo, a pesquisa internacional com trajetória de mercado, possui aportes mais
substantivos nas suas fontes de financiamento, o que permite uma prática mais sistemática e
planejada, no entanto se encontra vinculada a flutuações de mercado e a práticas protecionistas.

As pesquisas acadêmicas ​stricto sensu dependem substancialmente dos investimentos


públicos garantidos pelos editais das agências de pesquisa. É quando o pesquisador já
desenvolveu certa notoriedade em sua área que parcerias de instituições empresariais e governos
internacionais estabelecem alianças. As chamadas públicas de financiamento via editais são
fundamentais para a tomada de decisão em relação à realização das pesquisas em geral. Mesmo
no caso acima relatado, o sucesso na formação de uma rede internacional mercadológica só foi
possível após ter aprovado seu projeto de pesquisa sobre uma planta cujo óleo pode ser utilizado
para fins energéticos.

O laboratório como lugar de produção de redes


Neste trabalho buscamos analisar como as redes são produzidas na prática. O foco da
“science-as-practice” está em acompanhar os cientistas em seu trabalho, e não a história das
idéias, a estrutura das teorias científicas ou o cenário institucional da ciência. Uma abordagem
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somente histórica da ciência tem pouca vantagem para a compreensão da maquinaria do


conhecimento em que os agentes estudados tomam parte. O conceito de cultura para
Knorr-Cetina se soma à abordagem da prática, na medida em que agrega o aspecto da não
uniformidade da prática e de suas finalidades; incorpora um rico e denso conjunto de eventos em
curso; é associada com a expressão simbólica do comportamento humano (Knorr-Cetina,1999).
O laboratório enquanto locus de produção científica compreende momentos de aquisição
de dados e tradução destes a partir da análise e modelação. Na instância em que o pesquisador
trabalha com dados, inscrições feitas a partir dos objetos estudados ele também desenvolve uma
rede. Law (1989) em uma de suas etnografias de laboratório explicita nessas duas fases as várias
formações de rede ocorridas. No processo de aquisição de dados, a pesquisadora têm de lidar
com o controle de diversos elementos que compõem outras redes, máquinas, substâncias
químicas, cobaias, todos são arranjados de maneira cuidadosa para que a rede de pesquisa não se
desestabilize. Com uma cautelosa disposição e arranjo de todos estes agentes o pesquisador,
nesta ‘fase experimental​’, ​gera novos componentes que podem agregar e expandir sua rede de
pesquisa.
Porém o convencimento e a transformação do experimento em um novo elemento
depende das inscrições, das análises e disposições dos dados que os objetos pesquisados
deixaram nos instrumentos do laboratório. Para Law (1989), a fase de modelagem de dados é
uma etapa de simplificação do experimento transformando este em um registro. É neste
momento em que os diversos elementos heterogêneos da fase experimental se transformam em
dados homogêneos capazes de serem modelados e dispostos pelo pesquisador.
As inscrições tomam parte importantíssima na construção da rede do pesquisador. Para
Latour & Woolgar (1997) a inscrição consegue conectar-se diretamente com a “substância
original”. O laboratório funciona como uma instância de obtenção de inscrições literárias, pois
são elas que dão autoridade ao pesquisador. No plano científico o documento é valioso, pois o
resumo de toda a energia e recurso empreendido na parte experimental gera, ao fim, um relatório.
Para Knorr-Cetina (1999, p. 379) a comunicação presente na ciência atual liga-se,
inicialmente, a um sistema de recompensa. Por este sistema pode-se analisar quem cita e é
citado, quais áreas possuem maior exposição na área acadêmica. Porém há uma dimensão na
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qual a comunicação também atua, e a relação entre a produção científica e a comunicação da


ciência produzida se torna uma consequência, e é aí onde a veiculação científica se torna um
meio de persuasão.
Nas nossas pesquisas prévias sobre a internacionalização, verificamos uma formação de
conexões de pesquisa principalmente a partir das iniciativas do pesquisadores. Na análise das
falas dos pesquisadores entrevistados da área de bioenergia pudemos verificar que as pesquisas
internacionalizadas de maior substância são desenvolvidas a partir de contatos e relações
pessoais desenvolvidas pelo próprio pesquisador, enquanto as iniciativas institucionais na
realidade brasileira de internacionalização têm dificuldade de se estabelecer.
Sob este aspecto Harry Collins (1974), coloca que as fronteiras que delimitam o círculo
social formado pelos pesquisadores não possuem correspondência com as fronteiras de um
determinado paradigma. O círculo social formado entre pesquisadores, nesta perspectiva, se
caracteriza pela superior densidade de relações estabelecidas entre os membros, em relação aos
não membros (Collins, 1974: 166). Vínculos sociais previamente estabelecidos se constituíram
como o canal precípuo de compartilhamento de conhecimentos e competências tecnocientíficas
(Collins, 1974).
A importância dos vínculos sociais e a capacidade do pesquisador de desenvolvê-los tem
relação também com a imagem de Law(1989) sobre o pesquisador empreendedor, que precisa ser
capaz de arregimentar os mais heterogêneos elementos para que a expansão de sua rede seja
possível. Para o autor, o trabalho de um cientista é muito próximo ao de um empreendedor, pois
o sucesso não vêm somente de sua capacidade de pesquisa, mas de maneira fundamental da
capacidade de organização destes elementos.
O presente projeto pretende reunir as inscrições materializadas nos laboratórios, sejam
eles instrumentos, modelos, relatórios, artigos, falas e práticas sociais.

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