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15/06/2018 ANAMORFOSE - E-Dicionário de Termos Literários

U a
A B C D É F G H Í J K L M N O P

Q R S T Ü V W Z

À- Ab Ac Ad Af Ag Aj Ak Al Am An Ap Ar

As At Au Av

ANAMORFOSE
by Latuf Isaias Mucci | Dez 29, 2009 | A | 0 comments

Étimo de origem grega –


αναμόρφωση
-, que se traduz, no vernáculo, por “reformulação”, “forma
reconstituída”, “formado de novo”, a anamorfose (anamorphotisches
Bild, em alemão, anamorfosi,
em italiano, anamorfosis, em
espanhol, vertekend beeld ,
em holandês, anamorphose, em
francês, anamorphosis, em
inglês) constitui um efeito de ilusão ótica, uma projeção distorcida de
uma imagem ou uma perspectiva, que requer do espectador o uso de algum
instrumento ou o deslocamento para algum outro ângulo a m de
reconstituir a imagem. O portador de miopia, por exemplo, vive em
situação de anamorfose, necessitando de óculos que lhe corrijam a
distorção da visão; já Pedro Paulo Mucci, pintor brasileiro, da cidade
de Macaé-RJ,  extremamente míope,
recusava-se, na hora de pintar, a usar óculos, porque queria representar
as coisas do jeito como as percebia, sem o artifício de lentes, daí
resultando uma pintura diluída, esfumaçada, disforme, mesmo se
incrustando um alto grau de erotismo. Deformação reversível de uma
imagem produzida mediante um procedimento ótico, como, por exemplo,
utilizando-se um espelho curvo ou cilíndrico, ou através de um

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procedimento matemático, a anamorfose, ou “perspectiva secreta”, segundo


Albrecht  Dürer (1471-1528),
 utiliza-se em arte como efeito
perspectivo para forçar o observador a tomar um ponto de vista
determinadamente preestabelecido ou privilegiado, a partir do qual a
imagem recobrará uma forma proporcional e clara. Como método, a
anamorfose foi descrita nos estudos sobre perspectiva de Piero da la
Francesca (1416-1492), como no
tratado De prospectiva pingendi.
           
A anamorfose estrutura-se tanto no campo da pintura quanto no da
matemática, porque se produz, inclusive, para além do uso do espelho,
como o fazem, empiricamente, muitos pintores, com base num cálculo
grá co da distorção.  Obviamente,
aqui se ocupa do lugar artístico dessa instigante categoria, que pode
ser de perspectiva – a anamorfose oblíqua renascentista, que data do
século XV – ou de espelho – a anamorfose catóptrica, 
praticada no barroco século XVII. Em ambas as eras, a anamorfose
funcionou para esconder signi cados alternativos da obra, como, por
exemplo, alguma obscenidade.
           
O  ícone da
anamorfose é o quadro  The
Ambassadors, de 1533 – um óleo sobre tela, de
 209 x 207 cm, exposto na

National Gallery,
em

Londres
-, de
Hans Holbein, o Jovem
(em

alemão,  Hans
Holbein der Jüngere), nascido em Augsburgo, em 1497 ou
1498, morto em Londres, em 1543, considerado um dos mestres do retrato
no
Renascimento, tendo sido, igualmente,
 desenhista de xilogravuras,
vidrarias e peças de joalheria. O título real desse quadro é
Jean de Dinteville et Georges de Selve

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(os dois embaixadores retratados), constituindo, portanto, uma


anamorfose o nome pelo qual veio a ser conhecido.
           
Importantíssima na história da arte, essa obra do artista alemão
possui, para além de sua excelência plástica, uma riqueza simbólica, em
grande parte devida ao enigma do objeto que aparece em primeiro plano,
enigma apenas deslindado no século XX, quando o historiador de arte
lituano-francês

Jurgis Baltrusaitis
(1903-1988), seguindo, elmente, seu postulado
« J’ai une seule méthode de
travail : aller à la source, chercher les vrais textes, au-delà des
articles de synthèse (…) C’est en allant à la source qu’on arrive à
une vision exacte des choses »,
 veri cou
que o misterioso osso de sépia – tridimensional, aparentemente informe,
que, sob o efeito da deformação ótica só aparece corretamente se 
o espectador  se 
posicionar  à direita da
peça e a alguns metros de distância – é a anamorfose de uma caveira,
constituindo, por conseguinte, uma alegoria da vaidade humana (note-se
que, na boina de Jean de Dinteville, o embaixador que encomendou o
retrato, há a imagem, essa, sim,  realista
de um crânio):
« Un singulier objet, pareil à un
os de seiche, otte au-dessus du sol : c’est l’anamorphose d’un crâne
qui se redresse lorsqu’on se place tout près, au-dessus, en regardant
vers la gauche. Un sens caché et une solennité pèsent lourdement sur
toute la scène ». Na introdução de seu livro
Anamorphoses, ou Thaumaturgis opticus,
encuncia :
 « La
perspective est généralement considérée, dans l’histoire de l’art, comme
quelque chose de réaliste restituant la 3ème dimension. C’est avant tout
un arti ce qui peut servir à toutes les ns. Nous en traitons ici le
côté fantastique et aberrant : une perspective dépravée par une
démonstration logique de ses lois ».
Para corrigir a deformação, o contemplador do quadro pode valer-se das
costas de uma colher, de modo que o re exo sobre a superfície curva
desse utensílio doméstico elimine o efeito da perspectiva na pintura.
           

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Por seu turno, Jacques Lacan (1901-1981) debruçou-se, em seus


seminários, enfocando  o
olhar e a constituição do sujeito e de sua relação com a visão, 
sobre o enigmático objeto, analisando-o no quadro da psicanálise
e da semiologia, onde fulge a alegoria :
 
  2
Comment
se fait-il que personne n’ait jamais songé à y évoquer quelque chose qui
ressemble à l’effet d’une érection.
[…] Que voyez-vous qu’est cet objet, étrange, suspendu, oblique au
premier plan en avant de ces deux personnages dont la valeur comme
regard, je pense, vous est apparue à tous, ces deux personnages gés,
raidis dans leur ornement monstrateur entre lesquels toute une série
d’objets qui ne sont rien d’autre, que ces objets là même qui dans la
peinture de l’époque gurent, les symboles de la veritas. 
Car le secret de ce tableau, dont je vous ai rappelé les résonances, les
parentés avec les vanitas, de ce tableau fascinant de présenter, entre
les deux personnages parés et xes, tout ce qui rappelle, dans la
perspective de l’époque, la vanité des arts et des sciences, – le secret
de ce tableau est donné au moment où, nous éloignant légèrement de lui,
peu à peu, vers la gauche, puis nous retournant, nous voyons ce que
signi e l’objet ottant magique. Il nous re ète notre propre néant,
dans la gure de la tête de mort. Usage donc de la dimension géométrale
de la vision pour captiver le sujet, rapport évident au désir qui,
pourtant, reste énigmatique. 
 
Outra leitura intertextual do
misterioso objeto, construído  sob
o signo da anamorfose, será considerá-lo como uma legenda plástica
 do grave enunciado « Memento
mori », lembrando, tanto a seu criador quanto
 aos protagonistas da obra e
 a seus atemporias contempladores,
que cada um irá morrer e que tudo é vaidade.
           
Outro paradigmático cultor da anamorfose da perspectiva foi o
renascentista Leonardo da Vinci (1452-1519), que, em alguns de seus
estudos, apontou exemplos de guras anamorfósicas e cujo
 Codex Atlanticus
(1485) realiza a anamorfose do rosto de um criança e de um olho.
Já o barroco praticou a anamorfose na técnica do

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trompe-l’oeil, que cria, em


murais, ilusões arquitetônicas, de que são exemplos ímpares os
grandiosos afrescos da cúpula e da abóbada da Igreja de Santo Inácio, em
Roma, pintadas, entre 1685 e 1694,  pelo
jesuíta Andrea Pozzo (1642-1709), que alegorizam, em alucinante
perspectiva, com o recurso do
trompe-l’oeil,  a apoteose do
fundador da Companhia de Jesus.
No século XX, a anamorfose foi relida, para apenas citar dois exemplos
nucleares,  na obra de Marcel
Duchamp (1887-1968), cujas instalações 

Le Grand Verre (1915-1923 ) e


La Mariée mise à nu par ses
célibataires, même, iniciada em 1915 e propositalmente 
inacabada en 1925, são 
paráfrases de anamorfose; também Salvador Dalí (1904-1989) utilizou, em inúmeras
telas, o efeito da anamorfose. Valorizada no
modernismo, por exemplo pelo brasileiro Cândido Portinari (1903-1962), a
pintura mural lança mão da anamorfose, que produz uma impressão de
relevo e de realidade espacial. Pintando, não mais olhando
diretamente a realidade, mas guiando-se somente pelo que se re ete em
um espelho cônico, cilíndrico ou piramidal, o artista, operando 
sob o código da anamorfose,  produz
obra, que, inclusive, se constitui uma sátira ou crítica social.
Exemplos contemporâneos de anamorfose encontram-se no cinemascope, que
usa lentes  anamór cas para
projetar uma imagem mais ampla a partir de uma estrutura mais estreita
de lme. Outro uso da anamorfose aparece, ainda, nos avisos de trânsito,
como « Crianças atravessando », quando facilita a leitura dos motoristas ;
os nomes « Ambulância » e « Polícia », nos respectivos veículos, seguem
o processo da anamorfose, porque promovem a leitura especular invertida ;
também a publicidade, com o intuito de maior visibilidade da propaganda
dos itens,  recorre a esse
fantástico  recurso. A anamorfose
é, ainda, o  fenômeno dos 
espelhos deformadores, que se encontram, como ludismo, em lugares
públicos.
No belíssimo lme The 
brothers Grimm (2005 ), dirigido Terry Gilliam, há uma cena
seminal, quando, na torre da oresta encantada, o herói-escritor Jake,
representado por Heath Ledger (1979-2008), escala-a a m de libertar a

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rainha seqüestrada (Mônica Belucci): um imenso espelho opera uma


anamorfose, porque fantasticamente projeta a imagem de Jake e da rainha
jovem juntos, quando, na “realidade” ccional da imagem
cinematográ ca, os personagens estão separados: Jake encontra-se no
centro da sala, ao passo que a rainha, velhíssima, 
está dormindo. Na mesma seqüência de cenas, o estilhaçamento
fragoroso do espelho mágico alegoriza a quebra do feitiço, dado que,
fragmentando-se totalmente, 
a rainha, belamente rejuvenescida, 
volta a ser uma bruxa em fragmentos especulares. Também existe um
lme, precisamente intitulado
Anamorph (2007),
dirigido por

Henry S. Miller
e estrelado por

Willem Dafoe,
que representa um eventual detetive, chamado Stan Aubray, que se dá
conta da semelhança de um caso anterior ao que deve, agora, investigar.
Como indica seu  próprio
título, a película baseia-se no conceito de anamorfose, que manipula as
leis da perspectiva para criar, numa mesma tela, duas imagens que
competem entre si. O detetive deverá desvendar o enigma de duas
horrendas imagens distorcidas.
Presença contundente, portanto, em várias linguagens da arte – pintura,
arquitetura, cinema, publicidade, instalações -, a anamorfose estrutura,
igualmente, o texto literário. Quanto ao parentesco entre literatura e
pintura, as correspondências vão além da parelha destes célebres
 versos horacianos, onde pulsa,
porque aludem ao distanciamento para a percepção e o gosto, 
a anamorfose:
 
 ut
pictura poesis; erit quae, si propius stes,
te capiat magis, et quaedam, si longius abstes
(“como a pintura é a poesia; coisas há que de perto
mais te agradam e outras, se à distância estiveres”).
 
Esses versos sofrem anamorfose na música, por exemplo – “ut
musica, pictura”- (MUCCI, 1993, p.125-138). 
A literatura espelha-se, muitas vezes, na pintura, como no caso

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paradigmático de

Dostoïevski (1821-1881), que, grande admirador de Holbein, cou


chocado quando viu, no

Kunstmuseum Basel,
em Basiléia, na Suíça,  três
séculos mais tarde, o quadro  O
corpo de Cristo morto no túmulo (1521), que poderia, segundo ele, 
fazer perder a fé ; foi tão impactante a impressão da pintura 
sobre o escritor russo que ele a descreve 
em seu romance O idiota
(1868). No caso brasileiro, cite-se, de novo,
 Portinari que, intoxicado pelas
tintas, levou para a poesia a arte de sua pintura, como analisou,
belamente, em sua dissertação de mestrado
Portinari, poeta ocasional,
Kátia Nazareth Fideles Devino.
           
No cubismo, de que um dos postulados fundamentais é, precisamente,
por deformar as formas, a anamorfose, veri ca-se a signi cativa tensão
entre pintura e literatura. Conforme observa Carlos Ceia, essa vanguarda
modernista, que
 tinha
por m " ‘descompor e recompor a realidade’,
 rejeitou as técnicas
tradicionais de perspectiva bem como a ideia de arte como imitação da
natureza e privilegiou a bidimensionalidade e a fragmentaridade dos
objectos”.  Mencionando a
migração do cubismo plástico para outras artes, o organizador deste
Dicionário intertextualiza o caso de poetas cubistas, como Mário de
Sá-Carneiro (1890-1916) e Fernando Pessoa (1888-1935), dois expoentes do
modernismo português. Ao poema citado de 
Sá-Carneiro, “Cinco horas”,  acrescente-se
este outro, “Epígrafe”  (p.
191), onde o signo “espelho” distorce, ainda mais, uma identidade em
frangalhos e em vertiginosa sinestesia:
A sala do castelo é deserta e espelhada.
 
Tenho medo de Mim. Quem sou? Donde cheguei? …
Aqui, tudo já foi … Em sombra estilizada,
A cor morreu — e até o ar é uma ruína …

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Vem de Outro tempo a luz que me ilumina —


Um som opaco me dilui em Rei …
 
De Pessoa, Ceia cita:  “Álvaro
de Campos, num dos poemas dedicados a Walt Whitman, "Futilidade,
irrealidade, (…) estática de toda a arte" (s.d.), esboça um poema
de inspiração cubista”, de que destaco os versos nais, onde a
anamorfose transgride, gloriosamente, 
a mímesis e conjuga paráfrase e paródia:
 
Eu nunca farei senão copiar um eco das coisas,
O re exo das coisas reais no espelho baço de mim.
 
         
Na mais recente contemporaneidade, o espelho –
emblema e meio privilegiado  da
anamorfose -, brilha e dança  na
canção  “Viva
la vida”,
da banda inglesa Coldplay,
premiada no Grammy Awards
como a melhor canção de 2009; 
repete-se duas vezes esta estrofe:
 
I hear Jerusalem bells a ringing
Roman Cavalry choirs are singing
Be my mirror, my sword and shield
My missionaries in a foreign eld.
 
Essa repetição não é mero refrão, mas  metalinguagem
e jogo de mise en abîme.
Note-se que a função apelativa, que implica o ouvinte e o espectador do
vídeo, pronuncia-se por um sujeito lírico, enredado em mitos (os sinos
de Jerusalém e os coros da Cavalaria Romana), misturando a metáfora do
espelho com a metáfora da espada, do escudo e com a alegoria de um
missionário em terra estrangeira. Retoma-se, dessarte, pós-modernamente, 
a metáfora romântica da mímesis como lâmpada (espelho) que
passeia, re etindo o contexto, porém um contexto sobretudo fantástico.
O quarto álbum do grupo, em que se gravou “Viva
la vida”,  foi lançado no dia

12 de Junho de

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2008 nos
Estados Unidos, intitulado

Viva la Vida or Death and All His Friends. Chris Martin,


vocalista da banda,  a rmou que
escolheu o nome após vê-lo em um quadro da artista mexicana

Frida Kahlo (1907-1954). "Ela passou por muita coisa, claro, e aí


começou uma grande pintura em sua casa que dizia Viva la Vida or
Death and All His Friends. Eu simplesmente amei a ousadia disso",
disse o cantor, se referindo a Frida, que teve diversos problemas de
saúde”. Então, entre pintura e canção, o
 intertexto articula, também, a anamorfose, gura especular que
distorce dores e amores.
           
Pergunta-se: qual a imagem certa? Será real o que vemos ou somos
vítimas de alguma anamorfose? De abismo em abismo, uma anamorfose gera
outra anamorfose ad in nitum,
como a semiose ilimitada, segundo Peirce (1839-1914). No fundo, seja do
quadro de pintura, seja do texto literário, não há imagem certa do
Universo.
           
No jogo de espelhos, a auto-re exividade e a
re exividade, 
de acordo com Carlos Ceia,
levam  o homem descobrir 
“que pode ironizar sobre a sua própria condição humana, então
podemos falar de uma nova ordem. Assim quando a certeza cede lugar ao
simulacro da certeza e quando todo este processo se revela
textualmente”, estamos diante
do processo da anamorfose. No terreno úbere da re exividade e da
auto-re exividade, a anamorfose encena, então,
 o re exo imaginário de tudo o
que se possa considerar representação do real: nas luzes dos espelhos,
mágicos, enfeitiçados, encantados, toda representação é uma quimera, um
fogo fátuo, um engodo, talvez. Lembremo-nos 
dos colonizadores que, oferecendo cacos de espelhos aos
ameríndios, ludibriavam-nos inexoravelmente.
Será a anamorfose a paródia da mímesis, na medida em que ilude a própria
ilusão da representação. No abismo da representação, a anamorfose,
deformadamente,  opera a
prestidigitação da mise en abîme

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que, segundo Annabela Rita,


 “consiste
num processo de re exividade literária, de duplicação especular”.
Verdadeiros dândis, que, conforme Baudelaire, vivem e dormem diante do
espelho, os poetas olham-se, eternamente, no espelho das palavras: o que
vêm aí? Espelhos, fragmentos de espelhos, superfícies iluminadas, os
poemas elucubram anamorfoses de um real, sempre fantástico.
      
Uma brevíssima antologia da melhor poesia re ete a magia literária do
espelho:
 
Le miroir
Charles Baudelaire
 
Un homme épouvantable entre et se regarde dans la glace.
“- Pourquoi vous regardez-vous au miroir, puisque vous ne pouvez vous y
voir qu’avec déplaisir?”
L’homme epóuvantable me répond: “ Monsieur, d’après les immortels
principes de 89, tous les hommes sont égaux en droits; donc je possède
le droit de me mirer; avec plaisir ou déplaisir, cela ne regarde que ma
conscience.”
Au nom du bon sens, j’avais sans doute raison; mais, au point de vue de
la loi, il n’avait pas tord
(p. 201).
 

Mulher ao espelho
 Cecília
Meireles
 
Hoje que seja esta ou aquela,
pouco me importa.
Quero apenas parecer bela,
pois, seja qual for, estou morta.
Já fui loura, já fui morena,

fui Margarida e Beatriz.

fui Maria e Madalena.

não pude ser como quis.
Que mal faz, esta cor ngida

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do
meu cabelo, e do meu rosto,
se
tudo é tinta: o mundo, a vida,
o
contentamento, o desgosto?
Por fora, serei como queira
a
moda, que me vai matando.
Que me levem pele e caveira
ao
nada, não me importa quando.
Mas quem viu, tão dilacerados,
olhos, braços e sonhos seus
se
morreu pelos seus pecados,
falará com Deus.
Falará, coberta de luzes,
do
alto penteado ao rubro artelho.
Porque uns expiram sobre cruzes,
outros, buscando-se no espelho.
 
AL ESPEJO
Jorge Luis Borges
¿Por qué persistes, incesante espejo?
¿Por qué duplicas, misterioso hermano,
el movimiento de mi mano?
¿Por qué en la sombra el súbito re ejo?
Eres el otro yo de que habla el griego
y acechas desde siempre. En la tersura
del agua incierta o del cristal que dura
me buscas y es inútil estar ciego.
El hecho de no verte y de saberte
te agrega horror, cosa de magia que osas
multiplicar la cifra de las cosas
que somos y que abarcan nuestra suerte.
Cuando esté muerto, copiarás a otro
y luego a otro, a otro, a otro, a otro…
 
MIRROR
 

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Silvia Plath
I am silver and exact. I have no preconceptions.
Whatever I see, I swallow immediately.
Just as it is, unmisted by love or dislike
I am not cruel, only truthful —
The eye of a little god, four-cornered.
Most of the time I meditate on the opposite wall.
It is pink, with speckles. I have looked at it so long
I think it is a part of my heart. But it ickers.
Faces and darkness separate us over and over.
Now I am a lake. A woman bends over me.
Searching my reaches for what she really is.
Then she turns to those liars, the candles or the moon.
I see her back, and re ect it faithfully
She rewards me with tears and an agitation of hands.
I am important to her. She comes and goes.
Each morning it is her face that replaces the darkness.
In me she has drowned a young girl, and in me an old woman
Rises toward her day after day, like a terrible sh.
 
285
Fernando Pessoa, sob a 
persona de 
Alberto Caeiro
O espelho re ecte certo; não erra porque não pensa.
Pensar é essencialmente errar.
Errar é essencialmente estar cego e surdo.
VERSOS DE NATAL
Manuel Bandeira
Espelho, amigo verdadeiro,
Tu re etes as minhas rugas,
Os meus cabelos brancos,
Os meus olhos míopes e cansados.
Espelho, amigo verdadeiro,
Mestre do realismo exato e minucioso,
Obrigado, obrigado!
Mas se fosses mágico,
Penetrarias até o fundo desse homem triste,
Descobririas o menino que sustenta esse homem,
O menino que não quer morrer,
Que não morrerá senão comigo,
O menino que todos os anos na véspera do Natal

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Pensa ainda em pôr os seus sapatinhos atrás da porta.


LE MIROIR D’UN MOMENT
Paul Eluard
Il dissipe le jour,
Il montre aux hommes les images déliées de l’apparence,
Il enlève aux hommes la possibilité de se distraire.
Il est dur comme la pierre,
La pierre informe,
La pierre du mouvement et de la rue,
Et son éclat est tel que toutes les armures, tous les
      masques en sont faussés.
Ce que la main a pris dédaigne même de pendre la
      forme de la main,
Ce qui a été compris n’existe plus,
L’oiseau s’est confondu avec le vent,
Le ciel avec sa vérité,
L’homme avec sa realité.
 
O ESPELHO
Mário Quintana
E como eu passasse por diante do espelho
não vi meu quarto com as suas estantes
nem este meu rosto
onde escorre o tempo.
Vi primeiro uns retratos na parede:
janelas onde olham avós hirsutos
e as vovozinhas de saia-balão
Como pára-quedistas às avessas que subissem do
                                     
fundo do tempo.
O relógio marcava a hora
mas não dizia o dia. O Tempo,
desconcertado,
estava parado.
Sim, estava parado
Em cima do telhado…
Como um catavento que perdeu as asas!
 
           
Perguntar-se-á o poeta, o leitor do poeta, o escritor do poeta:
até quando hemos  de nos
perder no jogo de espelhos, onde a anamorfose rege o canto dos signos?

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{bibliogra a}
BALTRUSALTIS, Jurgis. Anamorphoses, ou Thaumaturgis opticus ( 1984) .
BANDEIRA, Manuel. Poemas (s.d.). BAUDELAIRE, Charles. Oeuvres complètes (1986).
BORGES, Jorge Luis. Obras completas II (2000). DEVINO, Kátia Nazareth Fideles.
Portinari, poeta ocasional (2005). ELUARD, Paul. Poèmes (1999). HORÁCIO. Arte poética.
Trad. R. M. Rosado Fernandes (s.d.). LACAN, Jacques. Le séminaire, livre XI, Les quatre
concepts fondamentaux de la psychanalyse (1964). MEIRELES, Cecília. Obra poética (1987).
MUCCI, Latuf Isaias. A poética do Esteticismo (1993). PESSOA, Fernando. Obra poética
(1977). PLATH, Silvia. Poems (1994). SÁ-CARNEIRO, Mário de. Obra poética completa
(1991). QUINTANA, Mário. Poesia completa (2006).
http://www.coldplay.com

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