Aula 02
AULA 2
TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL:
DIREITOS DA PERSONALIDADE
Sumário
Sumário .................................................................................................... 1
Considerações Iniciais ................................................................................ 2
TEORIA GERAL........................................................................................... 2
2. Direitos da personalidade ........................................................................ 2
1. Características .................................................................................... 2
2. Distinções ........................................................................................... 5
3. Direitos da personalidade e o Código Civil .............................................. 7
4. Pessoa jurídica .................................................................................. 15
Legislação pertinente ................................................................................ 17
Jurisprudência e Súmulas Correlatas .......................................................... 18
Questões ................................................................................................. 38
Questões sem comentários ..................................................................... 38
Gabaritos ............................................................................................. 59
Questões com comentários ..................................................................... 64
Resumo ................................................................................................ 101
Considerações Finais .............................................................................. 104
Considerações Iniciais
Na aula passada, tratamos dos conceitos iniciais de Direito Civil, com algumas
das noções que formam a base de compreensão dos demais institutos de Direito
Civil, que costumam cair com grande frequência nas provas. Embora parecesse
apenas introdutória, compreender bem os temas que giram em torno das pessoas
naturais e jurídica é de suma importância para sua prova.
Hoje, trataremos, em continuidade, de um tema que orbita ao redor do tema das
pessoas: os direitos de personalidade. É uma parte da disciplina que começou a
cair com mais frequência nas últimas provas, especialmente tocante à
jurisprudência.
Você deve prestar atenção, porque são questões em geral mais fáceis, quando
voltadas ao CC/2002, mas às vezes temos questões mais “chatas”, quando
voltadas à jurisprudência recente assentada no STJ e no STF, em detalhe.
Lembro a você que após o levantamento que fiz em relação às questões das
provas de Nível Superior, A PARTE GERAL DO CÓDIGO CIVIL É A QUE TEM,
DISPARADO, O MAIOR NÚMERO DE QUESTÕES NAS PROVAS.
Nas provas das Carreiras Jurídicas, temos um número crescente de
questões envolvendo os direitos de personalidade nos últimos tempos.
No entanto, a PC/MG nada questionou, na última prova, sobre o assunto. Ainda
assim, como estão se tornando mais frequentes esses questionamentos e, em
certa medida, está a “na moda” fazer questionamentos sobre entendimentos
jurisprudenciais acerca dos direitos da personalidade, fique atento!
TEORIA GERAL
2. Direitos da personalidade
1. Características
Quando adquire personalidade, a pessoa passa a ter uma série de
direitos oriundos dessa personalidade. São os chamados direitos de
personalidade, que têm por objeto os bens e valores essenciais da pessoa.
A. Absolutos
B. Indisponíveis
• Insuscetíveis de alienação
• Porém, são disponíveis os efeitos patrimoniais de todos os direitos
de personalidade e os próprios direitos de personalidade são
disponíveis, a depender da situação, como o direito à imagem ou
ao corpo, por exemplo
C. Irrenunciáveis
D. Imprescritíveis
E. Extrapatrimoniais
F. Inatos
2. Distinções
Os direitos de personalidade são um todo unitário, mas dinâmico, que engloba
os valores essenciais da pessoa. É possível falar em um direito geral de
personalidade que se desdobra em direitos especiais da personalidade.
Esse direito geral de personalidade tutela a
personalidade de modo amplo, ao passo que os
direitos especiais de personalidade tutelam cada
aspecto específico dela.
Como diferenciar os direitos de personalidade dos direitos humanos e
dos direitos fundamentais? Segundo Anderson Schreiber todos esses termos
são unívocos, eis que tratam todos da proteção da pessoa, da proteção dos
diferentes atributos da personalidade humana merecedores de tutela jurídica.
O que os distingue, fundamentalmente, é o plano de
proteção em que essa personalidade se manifesta. No
plano internacional, temos os direitos humanos, cuja base
é a Declaração das Nações Unidas, de 1948. Geralmente,
esses direitos são associados à humanidade em geral e aos ataques à pessoa
humana por Estados do ponto de vista internacional.
• CF/1988
• Plano constitucional
Direitos Fundamentais • Liberdades Públicas
• Pessoa X Estado nacional
psicofísica. No entanto, uma classificação é desnecessária para sua prova, eis que
o examinador não fará questionamentos dessa ordem. Deve-se, ao contrário,
analisar os direitos de personalidade inscritos no CC/2002.
difamatória (art. 17). Do mesmo modo, sem autorização, não se pode usar
o nome alheio em propaganda comercial (art. 18).
Mas não só. A LRP ainda prevê duas hipóteses de alteração do nome. O art. 58,
desde a redação da Lei 9.708/1998, permite a sua
substituição por apelidos públicos notórios. O
parágrafo único ainda prevê que a substituição do prenome
será ainda admitida em razão de fundada coação ou ameaça decorrente da
colaboração com a apuração de crime, por determinação, em sentença, de juiz
competente, ouvido o MP.
Além disso, o art. 55, parágrafo único, da LRP prevê que os oficiais do registro
civil não registrarão prenomes suscetíveis de expor ao
ridículo os seus portadores. Quando os pais não se
conformarem com a recusa do oficial, este submeterá por escrito o caso,
independente da cobrança de quaisquer emolumentos, à decisão do Juiz
competente.
Não é incomum que os filhos são apreciem os nomes dados pelos pais. O nome
tem essa peculiaridade bastante própria, já que se trata de algo imutável, mas
que escapa à nossa escolha. Nossos pais escolhem nosso nome à nossa revelia
(obviamente), porque é necessário haver essa individualização nominal desde o
início da vida extrauterina.
Por conta disso, o art. 56 da LRP prevê que a pessoa, no
primeiro ano após ter atingido a maioridade civil,
poderá, pessoalmente ou por procurador bastante,
alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos
de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa.
Por outro lado, o filho socioafetivo, havendo motivo ponderável, poderá requerer
ao juiz competente que, no registro de nascimento, seja averbado o nome de
família de seu padrasto ou de sua madrasta, desde que haja expressa
concordância destes, sem prejuízo de seus apelidos de família (art. 57,
§8º). É o reflexo da multiparentalidade nos nomes, em consecução aos princípios
constitucionais.
Pela combinação dos arts. 1.618 do CC/2002 e do art. 47, §5º do ECA permitem
que haja alteração do nome do adotado, para que sejam incluídos os nomes de
família dos adotantes. Mais, podem os adotantes alterar o prenome do adotado,
enquanto for ele menor. O art. 1.627 estabelece que a decisão confere ao
adotado o sobrenome do adotante, podendo determinar a modificação
de seu prenome, se menor, a pedido do adotante ou do adotado.
Situação peculiar de possibilidade de alteração do nome ocorre no caso
de estrangeiros. O art. 43 da Lei 6.815/1980 – Estatuto do Estrangeiro, previa
que o nome do estrangeiro poderia ser alterado:
I - se estiver comprovadamente errado;
II - se tiver sentido pejorativo ou expuser o titular ao ridículo;
III - se for de pronunciação e compreensão difíceis e puder ser traduzido ou adaptado à
prosódia da língua portuguesa.
No entanto, o Estatuto foi revogado pela Lei 13.445/2017, a Lei de Migração.
Esta passou a prever, genericamente, em seu art. 71, §1º que no curso do
4. Pessoa jurídica
De modo a afastar qualquer dúvida, o art. 52 do CC/2002 estende às pessoas
jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade. Obviamente,
determinados direitos de personalidade não se aplicam à pessoa jurídica, como o
direito à liberdade sexual, à intimidade etc.
Legislação pertinente
Quanto aos temas de hoje, não há muita legislação, mesmo dentro do CC/2002.
Mais importantes são algumas decisões proferidas pelo STJ e pelo STF a respeito
da operacionalização dos direitos da personalidade, seja quanto à sua limitação,
seja quanto à sua extensão. Foco, sempre!
vida privada, a procedência da ação pelo fato da publicação não autorizada de foto e nome
do autor (REsp 1235926/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em
15/03/2012, DJe 14/11/2012).
O STJ permite que a pessoa transexual altere seu prenome, que lhe causa
vergonha e óbvios problemas na relação para com os demais, desde que feita a
cirurgia de redefinição de sexo (transgenitalização):
DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TRANSEXUAL SUBMETIDO À CIRURGIA DE
REDESIGNAÇÃO SEXUAL. ALTERAÇÃO DO PRENOME E DESIGNATIVO DE SEXO. PRINCÍPIO
DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.
- Sob a perspectiva dos princípios da Bioética ? de beneficência, autonomia e justiça ?, a
dignidade da pessoa humana deve ser resguardada, em um âmbito de tolerância, para que
a mitigação do sofrimento humano possa ser o sustentáculo de decisões judiciais, no sentido
de salvaguardar o bem supremo e foco principal do Direito: o ser humano em sua
integridade física, psicológica, socioambiental
b e ético-espiritual.
- A afirmação da identidade sexual, compreendida pela identidade humana, encerra a
realização da dignidade, no que tange à possibilidade de expressar todos os atributos e
características do gênero imanente a cada pessoa. Para o transexual, ter uma vida digna
importa em ver reconhecida a sua identidade sexual, sob a ótica psicossocial, a refletir a
verdade real por ele vivenciada e que se reflete na sociedade.
- A falta de fôlego do Direito em acompanhar o fato social exige, pois, a invocação dos
princípios que funcionam como fontes de oxigenação do ordenamento jurídico,
marcadamente a dignidade da pessoa humana ? cláusula geral que permite a tutela integral
e unitária da pessoa, na solução das questões de interesse existencial humano.
- Em última análise, afirmar a dignidade humana significa para cada um manifestar sua
verdadeira identidade, o que inclui o reconhecimento da real identidade sexual, em respeito
à pessoa humana como valor absoluto.
- Somos todos filhos agraciados da liberdade do ser, tendo em perspectiva a transformação
estrutural por que passa a família, que hoje apresenta molde eudemonista, cujo alvo é a
promoção de cada um de seus componentes, em especial da prole, com o insigne propósito
instrumental de torná-los aptos de realizar os atributos de sua personalidade e afirmar a
sua dignidade como pessoa humana.
- A situação fática experimentada pelo recorrente tem origem em idêntica problemática pela
qual passam os transexuais em sua maioria: um ser humano aprisionado à anatomia de
homem, com o sexo psicossocial feminino, que, após ser submetido à cirurgia de
redesignação sexual, com a adequação dos genitais à imagem que tem de si e perante a
sociedade, encontra obstáculos na vida civil, porque sua aparência morfológica não condiz
com o registro de nascimento, quanto ao nome e designativo de sexo.
- Conservar o ?sexo masculino? no assento de nascimento do recorrente, em favor da
realidade biológica e em detrimento das realidades psicológica e social, bem como
morfológica, pois a aparência do transexual redesignado, em tudo se assemelha ao sexo
feminino, equivaleria a manter o recorrente em estado de anomalia, deixando de reconhecer
seu direito de viver dignamente.
- Assim, tendo o recorrente se submetido à cirurgia de redesignação sexual, nos termos do
acórdão recorrido, existindo, portanto, motivo apto a ensejar a alteração para a mudança
de sexo no registro civil, e a fim de que os assentos sejam capazes de cumprir sua
verdadeira função, qual seja, a de dar publicidade aos fatos relevantes da vida social do
indivíduo, forçosa se mostra a admissibilidade da pretensão do recorrente, devendo ser
alterado seu assento de nascimento a fim de que nele conste o sexo feminino, pelo qual é
socialmente reconhecido.
meio ambiente, a compor a paisagem como um todo, sua representação (por meio de
pinturas, desenhos, fotografias e procedimentos audiovisuais), por qualquer observador,
não configura, em princípio, violação ao direito autoral. A obra arquitetônica, ainda que
situada permanentemente em propriedade privada, sendo possível visualizá-la a partir de
um local público, integra, de igual modo, o meio ambiente e a paisagem como um todo, a
viabilizar, nesse contexto (paisagístico) a sua representação, o que, também, não conduziria
à violação do direito do autor. A hipótese, todavia, não é de mera representação da
paisagem, em que inserida a obra arquitetônica, mas sim de representação unicamente da
obra arquitetônica, com a finalidade lucrativa. Refoge, em absoluto, do âmbito de aplicação
do art. 48 da Lei n. 9.610/1998, a representação por terceiro de obra arquitetônica com
finalidade comercial, que, como detidamente demonstrado, consubstancia direito exclusivo
de seu autor. 4. O art. 103, da Lei n. 9.610/1998, veicula sanção civil específica pela
violação de determinado direito autoral (editar fraudulentamente obra sem autorização do
titular), e não, propriamente, um parâmetro de reparação pelo dano material percebido pelo
autor da obra. Na espécie, não houve edição/reprodução da obra, compreendida esta como
a confecção de cópia ou exemplar da obra em si, e, muito menos, reprodução fraudulenta
da obra, que pressupõe má-fé, ou seja, deliberado propósito de contrafação. 5. A
mensuração do dano material deve ser certa e determinada, não comportando meras
9
conjecturas. In casu, o autor deve obter a reparação pela violação de direito patrimonial,
consistente na remuneração pela representação de sua obra ajustada, devidamente
atualizada, nos exatos termos em que se deu a contratação entre a fabricante de tintas, de
renome no seguimento, e o suposto titular do direito autoral, os proprietários da casa
retratada. Inexiste razão idônea para compreender que esta contratação não observou a
praxe mercadológica para a concessão dos direitos de utilização da imagem, com a prática
de valores igualmente condizentes com o objeto contratado. 6. A criação intelectual é
expressão artística do indivíduo; a obra, como criação do espírito, guarda em si aspectos
indissociáveis da personalidade de seu criador. Nessa extensão, a defesa e a proteção da
autoria e da integridade da obra ressaem como direitos da personalidade do autor,
irrenunciáveis e inalienáveis. Por conseguinte, a mera utilização da obra, sem a devida
atribuição do crédito autoral representa, por si, violação de um direito da personalidade do
autor e, como tal, indenizável. 7. Recurso especial da fabricante de tintas improvido; e
recurso especial do autor da obra parcialmente provido. (REsp 1562617/SP, Rel. Ministro
MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/11/2016, DJe 30/11/2016).
O STJ já definiu que a indenização pelos danos ocorridos durante o Regime Militar
pelos agentes estatais conta-se de acordo com os prazos fixados na Lei Especial:
RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. PRISÃO, TORTURA
E MORTE DO PAI E MARIDO DAS RECORRIDAS. REGIME MILITAR. ALEGADA PRESCRIÇÃO.
INOCORRÊNCIA. LEI N. 9.140/95. RECONHECIMENTO OFICIAL DO FALECIMENTO, PELA
COMISSÃO ESPECIAL DE DESAPARECIDOS POLÍTICOS, EM 1996. DIES A QUO PARA A
CONTAGEM DO PRAZO PRESCRICIONAL.
A Lei n. 9.140, de 04.12.95, reabriu o prazo para investigação, e consequente
reconhecimento de mortes decorrentes de perseguição política no período de 2 de setembro
de 1961 a 05 de outubro de 1998, para possibilitar tanto os registros de óbito dessas
pessoas como as indenizações para reparar os danos causados pelo Estado às pessoas
perseguidas, ou ao seu cônjuge, companheiro ou companheira, descendentes, ascendentes
ou colaterais até o quarto grau.
Na hipótese em exame, o reconhecimento, pela Comissão Especial dos Desaparecidos
Políticos, do falecimento, em 1973, de Jarbas Pereira Marques, pai e esposo das recorridas,
deu-se com a publicação do Extrato da Ata da Terceira Sessão Ordinária realizada em 08
de fevereiro de 1996 (fl. 250), dies a quo para a contagem do prazo prescricional.
Com efeito, o prazo de prescrição somente tem início quando há o reconhecimento, por
parte do Estado, da morte da pessoa perseguida na época do regime de exceção
constitucional, momento em que seus familiares terão tomado ciência definitiva e oficial de
seu falecimento por culpa do Estado.
Dessarte, ante a ausência de qualquer reconhecimento oficial pelo Estado do falecimento
de Jarbas Pereira Marques até o ano de 1996, a prescrição deve ser afastada, uma vez que
o ajuizamento da ação se deu em 02 de fevereiro de 1993.No 10.536, DE 14 DE AGOSTO
DE 2002.
Ainda que assim não fosse, em se tratando de lesão à integridade física, deve-se entender
que esse direito é imprescritível, pois não há confundi-lo com seus efeitos patrimoniais
reflexos e dependentes.
"O dano noticiado, caso seja provado, atinge o mais consagrado direito da cidadania: o de
respeito pelo Estado à vida e de respeito à dignidade humana. O delito de tortura é
hediondo. A imprescritibilidade deve ser a regra quando se busca indenização por danos
morais consequentes da sua prática" (REsp n. 379.414/PR, Rel. Min. José Delgado, in DJ de
17.02.2003). Recurso especial não conhecido (REsp 449.000/PE, Rel. Ministro FRANCIULLI
NETTO, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/06/2003, DJ 30/06/2003, p. 195).
A pessoa privada, ainda que em ambiente público, não deixa de ter sua
intimidade protegida quanto a exibição de sua imagem extrapola os limites
normalmente previstos:
RECURSO ESPECIAL. CIVIL. DIREITO DE IMAGEM. PUBLICAÇÃO DE FOTOGRAFIA.
MULHER DE BIQUÍNI NA PRAIA. EXATA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PESSOA. AUTORIZAÇÃO
PRÉVIA OU POSTERIOR. INEXISTÊNCIA. REVISTA DE CONOTAÇÃO ERÓTICA. PROVEITO
ECONÔMICO. USO INDEVIDO DA IMAGEM. DANO MORAL CONFIGURADO (SÚMULA
403/STJ). RECURSO PROVIDO. 1. No tocante à liberdade de imprensa, em situações
como a do presente caso, há de ser feita a devida ponderação entre os direitos
constitucionais em tensão, levando-se em consideração as premissas do caso concreto
firmadas pelas instâncias ordinárias. Tem-se, de um lado, a livre expressão da atividade
intelectual, artística e de comunicação e informação, com ampla liberdade de publicação
e abordagem de temas, assuntos, notícias e imagens de interesse, inclusive recreativo,
da coletividade (CF, art. 5º, IX), e, de outro lado, o direito à intimidade, abrangendo a
privacidade, a honra e a imagem da pessoa (CF, art. 5º, X). 2. No caso, soma-se à
circunstância da exposição, sem autorização, da imagem da pessoa em revista de
conotação erótica, a exibição do corpo feminino em traje de praia, em ângulo
provocante, com utilização de dizeres e linguagem ousada, compondo um contexto
realmente constrangedor e violador dos direitos da personalidade. 3. Não se pode deduzir
que a mulher formosa, que se apresente espontaneamente de biquíni na praia, ambiente
adequado, esteja a concordar tacitamente com a divulgação de sua imagem em revista
masculina de conteúdo erótico, e tenha ainda de considerar tal exposição como um
"elogio". 4. De acordo com a Súmula 403/STJ: "Independe de prova do prejuízo a
indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou
comerciais." 5. Recurso especial provido. (REsp 1243699/RJ, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO,
QUARTA TURMA, julgado em 21/06/2016, DJe 22/08/2016).
Situação muito comum de questionamento nas Cortes tem a ver com matérias
jornalísticas que imputam fatos criminosos a determinada pessoa.
Independentemente de a pessoa ser culpada ou não, evidente que tais matérias
podem causar “danos” à imagem do retratado. Ainda assim, entende o STJ que
se permite tais matérias, ainda que não se tenha certeza sobre a
culpabilidade da pessoa, desde que em retratações “comuns”, sem exageros.
Isso assume especial relevo quando a pessoa em questão é uma autoridade
pública ou celebridade, que naturalmente despertam maior interesse do público:
RECURSO ESPECIAL - CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO CONDENATÓRIA - PRETENSÃO
DE COMPENSAÇÃO DOS DANOS EXTRAPATRIMONIAIS EXPERIMENTADOS EM VIRTUDE DE
MATÉRIA JORNALÍSTICA PUBLICADA EM REVISTA - INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS QUE
JULGARAM PROCEDENTE O PEDIDO PARA CONDENAR A REQUERIDA AO PAGAMENTO DE
INDENIZAÇÃO PELOS DANOS MORAIS - INSURGÊNCIA DA RÉ - RESPONSABILIDADE CIVIL
AFASTADA - ABORDAGEM DA MATÉRIA INSERTA NOS LIMITES DA LIBERDADE DE
EXPRESSÃO JORNALÍSTICA ASSEGURADA PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA - RECURSO
ESPECIAL PROVIDO. 4. No que diz respeito à violação dos dispositivos da Lei de Imprensa,
em que pese declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da
ADPF 130/DF, esta Corte tem autorizado o conhecimento do recurso especial, a fim de
analisar a tese de inexistência de responsabilidade civil e a quantificação da indenização
arbitrada. Precedentes. 4.1. O teor da notícia é fato incontroverso nos autos, portanto
proceder a sua análise e o seu devido enquadramento no sistema normativo, a fim de obter
determinada consequência jurídica (procedência ou improcedência do pedido), é tarefa
compatível com a natureza excepcional do recurso especial, a qual não se confunde com o
caráter não absoluto da liberdade de informação jornalística, a ser mitigada nas hipóteses
previstas no artigo 5º e incisos ali enumerados, isto é, em se tratando de direitos e garantias
individuais relacionadas aos direitos de personalidade. A partir do parágrafo primeiro do
artigo 220 da Carta Magna, observa-se estar reservando à lei (infraconstitucional) a
possibilidade, dentro dos limites ali estabelecidos (direitos da personalidade), de disciplinar
tais restrições. 2.1 Especificamente quanto à hipótese dos autos - situação particular -,
envolvendo direitos de personalidade (a imagem) de crianças e adolescentes, concebidos
como pessoas em desenvolvimento, observa-se a existência de prévia eleição legislativa de
interesse prevalecente, decorrência da própria proteção constitucional a eles destinada,
consubstanciada na adoção da proteção integral e do melhor interesse (artigo 227 da
Constituição Federal) 2.2 Essa especial proteção à imagem e identidade das crianças e
adolescentes justifica-se na medida em que a personalidade infanto-juvenil tem
características distintas da personalidade adulta, porquanto as crianças e adolescentes
estão em fase de desenvolvimento. Com efeito, à preservação de sua dignidade, tornou-se
imperativa a proteção especial do ordenamento jurídico, consoante preceituado pela
Constituição Federal e positivado no âmbito infraconstitucional. 2.3 Trata-se, pois, de
verdadeira política pública eleita pelo Constituinte e incorporada, no âmbito
infraconstitucional, por meio do Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual faz expressa
alusão à impossibilidade de veiculação da imagem de adolescentes a quem se atribua a
autoria de ato infracional, consoante prescrevem os artigos 143 e 247 do mencionado
diploma legal. 2.4 Os citados dispositivos têm por objetivo precípuo a proteção integral da
identidade da criança e do adolescente que cometem comportamento conflitante com a lei,
de modo a buscar, com isso, preservar não apenas seus nomes ou suas imagens, mas,
sobretudo, suas próprias pessoas, pois se encontram na condição peculiar de
desenvolvimento, fase em que seu caráter ainda está em formação. Ao editá-las, o
legislador houve por bem protegê-los/preservá-los de qualquer divulgação depreciativa de
sua imagem, de maneira a, pelo menos, minorar a repercussão negativa que atos dessa
natureza trazem ao psíquico de qualquer ser humano. 2.5 O direito à imagem protege a
representação física do corpo humano, de qualquer de suas partes ou, ainda, de traços
característicos da pessoa pelos quais ela possa ser reconhecida (identidade). Nesse sentido,
a imagem é objeto de um direito autônomo, embora sua violação venha associada,
frequentemente, à de outros direitos da personalidade, sobretudo à honra. A autonomia do
mencionado dano encontra respaldo, aliás, na própria Constituição Federal, ao preceituar,
no inciso X do artigo 5º ser "assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além
da indenização por dano material, moral ou à imagem". 2.6 Desse modo, em casos como o
ora em análise, considerando, sobretudo, a especial proteção concedida à imagem e
identidade das crianças e adolescentes, a violação da norma e a caracterização do ato como
ilícito encontram-se intrinsecamente relacionadas à própria configuração do dano, vale
afirmar, uma vez infringido o conteúdo da norma protetiva, vulnera-se a imagem da criança
ou do adolescente, violando o direito ao resguardo/preservação de sua imagem/identidade.
Essa é uma situação típica do chamado dano extrapatrimonial presumido (in re ipsa), caso
em que a prova do abalo psicológico ou de efetiva lesão à honra é completamente
despicienda. 2.7 Por fim, não se olvida que o caso em tela contenha peculiaridades, tais
como a efetiva participação do autor/adolescente no evento narrado, o fato de esse, à
época, estar próximo de completar dezoito anos, bem assim a tentativa de mitigação do
prejuízo pela divulgação de errata na edição posterior do Jornal. Contudo, essas
singularidades não são hábeis a afastar a obrigação de indenizar, conforme orientação
adotada ao longo deste voto. Efetivamente, referidas circunstâncias devem ser (e, neste
caso, foram) levadas em consideração quando do arbitramento da verba compensatória. 3.
RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. (REsp 1297660/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE
SALOMÃO, Rel. p/ Acórdão Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em
07/10/2014, DJe 16/10/2015).
Pouco tempo depois, o mesmo STJ definiu que mesmo o nascituro é detentor
de direitos de personalidade, pela proteção dada a ele pelo CC/2002, mesmo
antes do nascimento com vida. Assim, o nascituro também pode receber
indenização do DPVAT em caso de morte causada pelo aborto:
DIREITO CIVIL. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. ABORTO. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO
OBRIGATÓRIO. DPVAT. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. ENQUADRAMENTO JURÍDICO DO
NASCITURO. ART. 2º DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. EXEGESE SISTEMÁTICA. ORDENAMENTO
JURÍDICO QUE ACENTUA A CONDIÇÃO DE PESSOA DO NASCITURO. VIDA INTRAUTERINA.
PERECIMENTO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. ART. 3º, INCISO I, DA LEI N. 6.194/1974.
INCIDÊNCIA. 1. A despeito da literalidade do art. 2º do Código Civil - que condiciona a
aquisição de personalidade jurídica ao nascimento -, o ordenamento jurídico pátrio aponta
sinais de que não há essa indissolúvel vinculação entre o nascimento com vida e o conceito
de pessoa, de personalidade jurídica e de titularização de direitos, como pode aparentar a
leitura mais simplificada da lei. 2. Entre outros, registram-se como indicativos de que o
direito brasileiro confere ao nascituro a condição de pessoa, titular de direitos: exegese
sistemática dos arts. 1º, 2º, 6º e 45, caput, do Código Civil; direito do nascituro de receber
doação, herança e de ser curatelado (arts. 542, 1.779 e 1.798 do Código Civil); a especial
proteção conferida à gestante, assegurando-se-lhe atendimento pré-natal (art. 8º do ECA,
o qual, ao fim e ao cabo, visa a garantir o direito à vida e à saúde do nascituro); alimentos
gravídicos, cuja titularidade é, na verdade, do nascituro e não da mãe (Lei n. 11.804/2008);
no direito penal a condição de pessoa viva do nascituro - embora não nascida - é afirmada
sem a menor cerimônia, pois o crime de aborto (arts. 124 a 127 do CP) sempre esteve
alocado no título referente a "crimes contra a pessoa" e especificamente no capítulo "dos
crimes contra a vida" - tutela da vida humana em formação, a chamada vida intrauterina
(MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal, volume II. 25 ed. São Paulo: Atlas,
2007, p. 62-63; NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal. 8 ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2012, p. 658). 3. As teorias mais restritivas dos direitos do nascituro
- natalista e da personalidade condicional - fincam raízes na ordem jurídica superada pela
Constituição Federal de 1988 e pelo Código Civil de 2002. O paradigma no qual foram
edificadas transitava, essencialmente, dentro da órbita dos direitos patrimoniais. Porém,
atualmente isso não mais se sustenta. Reconhecem-se, corriqueiramente, amplos catálogos
de direitos não patrimoniais ou de bens imateriais da pessoa - como a honra, o nome,
imagem, integridade moral e psíquica, entre outros. 4. Ademais, hoje, mesmo que se adote
qualquer das outras duas teorias restritivas, há de se reconhecer a titularidade de direitos
da personalidade ao nascituro, dos quais o direito à vida é o mais importante. Garantir ao
nascituro expectativas de direitos, ou mesmo direitos condicionados ao nascimento, só faz
sentido se lhe for garantido também o direito de nascer, o direito à vida, que é direito
pressuposto a todos os demais. 5. Portanto, é procedente o pedido de indenização referente
ao seguro DPVAT, com base no que dispõe o art. 3º da Lei n. 6.194/1974. Se o preceito
legal garante indenização por morte, o aborto causado pelo acidente subsume-se à perfeição
ao comando normativo, haja vista que outra coisa não ocorreu, senão a morte do nascituro,
ou o perecimento de uma vida intrauterina. 6. Recurso especial provido. (REsp 1415727/SC,
Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 04/09/2014, DJe
29/09/2014).
expressa do doador de órgãos em vida prevalece sobre a vontade dos familiares, portanto,
a aplicação do art. 4º da Lei n. 9.434/97 ficou restrita à hipótese de silêncio do potencial
doador.
O tormentoso caso das situações nas quais o paciente pretende não ser tratado
medicamente começa a aparecer na jurisprudência. Talvez o caso mais antigo
que dá ensejo a essa discussão seja o da transfusão sanguínea em pacientes
que são Testemunhas de Jeová, crença que proíbe seus membros de
receberem hemácias humanas de terceiros, por razões que não nos cabem
comentar.
O que se fixou nesses casos?
Primeiro: paciente que chega ao hospital com risco de morte iminente,
deve receber sangue alheio, independentemente da idade e da crença
religiosa. Nesse caso, sobressai-se o direito à vida, tendo em vista o risco
real de a vida se perder. Mesmo que terceiros conclamem a escusa religiosa, a
transfusão deve ocorrer.
Segundo: paciente maior que chega ao hospital, sem risco de morrer
iminentemente, mas com potencial risco à saúde ou à vida. Nesse caso,
sobressai-se a liberdade de escolha, tendo em vista a possibilidade de a
pessoa refletir sobre os impactos da decisão posteriormente. Mesmo que isso
signifique risco real à vida, respeita-se a vontade do paciente.
Terceiro: paciente menor que chega ao hospital, sem risco de morrer
iminentemente, mas com potencial risco à saúde ou à vida, com os pais
ou responsáveis legais pretendendo a escusa de crença religiosa. Nesse
caso, sobressai-se o direito à vida, tendo em vista a incapacidade (jurídica)
do próprio paciente em refletir sobre os impactos da decisão posteriormente e
potencial de risco permanente à saúde.
De qualquer forma, em qualquer caso, caso estejam disponíveis tratamentos
alternativos à transfusão, eles devem ser ofertados e tentados, sob pena de
responsabilização de médicos e pacientes.
Como o direito brasileiro não tem tantos outros casos envolvendo liberdade de
escolha e recusa de tratamentos médicos, utiliza-se, de regra, como padrão, as
decisões envolvendo a transfusão sanguínea para as Testemunhas de Jeová:
PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO. (1) IMPETRAÇÃO COMO SUCEDÂNEO
RECURSAL, APRESENTADA DEPOIS DA INTERPOSIÇÃO DE TODOS OS RECURSOS
CABÍVEIS. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. (2) QUESTÕES DIVERSAS DAQUELAS JÁ
ASSENTADAS EM ARESP E RHC POR ESTA CORTE. PATENTE ILEGALIDADE.
RECONHECIMENTO. (3) LIBERDADE RELIGIOSA. ÂMBITO DE EXERCÍCIO. BIOÉTICA E
BIODIREITO: PRINCÍPIO DA AUTONOMIA. RELEVÂNCIA DO CONSENTIMENTO ATINENTE À
SITUAÇÃO DE RISCO DE VIDA DE ADOLESCENTE. DEVER MÉDICO DE INTERVENÇÃO.
ATIPICIDADE DA CONDUTA. RECONHECIMENTO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. É
imperiosa a necessidade de racionalização do emprego do habeas corpus, em prestígio ao
âmbito de cognição da garantia constitucional, e, em louvor à lógica do sistema recursal. In
casu, foi impetrada indevidamente a ordem depois de interpostos todos os recursos
cabíveis, no âmbito infraconstitucional, contra a pronúncia, após ter sido aqui decidido o
AResp interposto na mesma causa. Impetração com feições de sucedâneo recursal
inominado. 2. Não há ofensa ao quanto assentado por esta Corte, quando da apreciação de
agravo em recurso especial e em recurso em habeas corpus, na medida em que são trazidos
a debate aspectos distintos dos que outrora cuidados. 3. Na espécie, como já assinalado
nos votos vencidos, proferidos na origem, em sede de recurso em sentido estrito e
embargos infringentes, tem-se como decisivo, para o desate da responsabilização criminal,
a aferição do relevo do consentimento dos pacientes para o advento do resultado tido como
delitivo. Em verdade, como inexistem direitos absolutos em nossa ordem constitucional, de
igual forma a liberdade religiosa também se sujeita ao concerto axiológico, acomodando-se
diante das demais condicionantes valorativas. Desta maneira, no caso em foco, ter-se-ia
que aquilatar, a fim de bem se equacionar a expressão penal da conduta dos envolvidos,
em que medida teria impacto a manifestação de vontade, religiosamente inspirada, dos
pacientes. No juízo de ponderação, o peso dos bens jurídicos, de um lado, a vida e o superior
interesse do adolescente, que ainda não teria discernimento suficiente (ao menos em
termos legais) para deliberar sobre os rumos de seu tratamento médico, sobrepairam sobre,
de outro lado, a convicção religiosa dos pais, que teriam se manifestado contrariamente à
transfusão de sangue. Nesse panorama, tem-se como inócua a negativa de concordância
para a providência terapêutica, agigantando-se, ademais, a omissão do hospital, que,
entendendo que seria imperiosa a intervenção, deveria, independentemente de qualquer
posição dos pais, ter avançado pelo tratamento que entendiam ser o imprescindível para
evitar a morte. Portanto, não há falar em tipicidade da conduta dos pais que, tendo levado
sua filha para o hospital, mostrando que com ela se preocupavam, por convicção religiosa,
não ofereceram consentimento para transfusão de sangue - pois, tal manifestação era
indiferente para os médicos, que, nesse cenário, tinham o dever de salvar a vida. Contudo,
os médicos do hospital, crendo que se tratava de medida indispensável para se evitar a
morte, não poderiam privar a adolescente de qualquer procedimento, mas, antes, a eles
cumpria avançar no cumprimento de seu dever profissional. 4. Ordem não conhecida,
expedido habeas corpus de ofício para, reconhecida a atipicidade do comportamento
irrogado, extinguir a ação penal em razão da atipicidade do comportamento irrogado aos
pacientes. (HC 268.459/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA
TURMA, julgado em 02/09/2014, DJe 28/10/2014).
11. É evidente o legítimo interesse público em que seja dada publicidade da resposta estatal
ao fenômeno criminal. Não obstante, é imperioso também ressaltar que o interesse público
- além de ser conceito de significação fluida - não coincide com o interesse do público, que
é guiado, no mais das vezes, por sentimento de execração pública, praceamento da pessoa
humana, condenação sumária e vingança continuada.
12. Assim como é acolhido no direito estrangeiro, é imperiosa a aplicabilidade do direito ao
esquecimento no cenário interno, com base não só na principiologia decorrente dos direitos
fundamentais e da dignidade da pessoa humana, mas também diretamente do direito
positivo infraconstitucional. A assertiva de que uma notícia lícita não se transforma em ilícita
com o simples passar do tempo não tem nenhuma base jurídica. O ordenamento é repleto
de previsões em que a significação conferida pelo Direito à passagem do tempo é
exatamente o esquecimento e a estabilização do passado, mostrando-se ilícito sim reagitar
o que a lei pretende sepultar. Precedentes de direito comparado.
13. Nesse passo, o Direito estabiliza o passado e confere previsibilidade ao futuro por
institutos bem conhecidos de todos: prescrição, decadência, perdão, anistia, irretroatividade
da lei, respeito ao direito adquirido, ato jurídico perfeito, coisa julgada, prazo máximo para
que o nome de inadimplentes figure em cadastros restritivos de crédito, reabilitação penal
e o direito ao sigilo quanto à folha de antecedentes daqueles que já cumpriram pena (art.
93 do Código Penal, art. 748 do Código de Processo Penal e art. 202 da Lei de Execuções
Penais). Doutrina e precedentes.
14. Se os condenados que já cumpriram a pena têm direito ao sigilo da folha de
antecedentes, assim também a exclusão dos registros da condenação no Instituto de
Identificação, por maiores e melhores razões aqueles que foram absolvidos não podem
permanecer com esse estigma, conferindo-lhes a lei o mesmo direito de serem esquecidos.
15. Ao crime, por si só, subjaz um natural interesse público, caso contrário nem seria crime,
e eventuais violações de direito resolver-se-iam nos domínios da responsabilidade civil. E
esse interesse público, que é, em alguma medida, satisfeito pela publicidade do processo
penal, finca raízes essencialmente na fiscalização social da resposta estatal que será dada
ao fato. Se é assim, o interesse público que orbita o fenômeno criminal tende a desaparecer
na medida em que também se esgota a resposta penal conferida ao fato criminoso, a qual,
certamente, encontra seu último suspiro, com a extinção da pena ou com a absolvição,
ambas consumadas irreversivelmente. E é nesse interregno temporal que se perfaz também
a vida útil da informação criminal, ou seja, enquanto durar a causa que a legitimava. Após
essa vida útil da informação seu uso só pode ambicionar, ou um interesse histórico, ou uma
pretensão subalterna, estigmatizante, tendente a perpetuar no tempo as misérias humanas.
16. Com efeito, o reconhecimento do direito ao esquecimento dos condenados que
cumpriram integralmente a pena e, sobretudo, dos que foram absolvidos em processo
criminal, além de sinalizar uma evolução cultural da sociedade, confere concretude a um
ordenamento jurídico que, entre a memória - que é a conexão do presente com o passado
- e a esperança - que é o vínculo do futuro com o presente -, fez clara opção pela segunda.
E é por essa ótica que o direito ao esquecimento revela sua maior nobreza, pois afirma-se,
na verdade, como um direito à esperança, em absoluta sintonia com a presunção legal e
constitucional de regenerabilidade da pessoa humana.
17. Ressalvam-se do direito ao esquecimento os fatos genuinamente históricos -
historicidade essa que deve ser analisada em concreto -, cujo interesse público e social deve
sobreviver à passagem do tempo, desde que a narrativa desvinculada dos envolvidos se
fizer impraticável.
18. No caso concreto, a despeito de a Chacina da Candelária ter se tornado - com muita
razão - um fato histórico, que expôs as chagas do País ao mundo, tornando-se símbolo da
precária proteção estatal conferida aos direitos humanos da criança e do adolescente em
situação de risco, o certo é que a fatídica história seria bem contada e de forma fidedigna
sem que para isso a imagem e o nome do autor precisassem ser expostos em rede nacional.
Nem a liberdade de imprensa seria tolhida, nem a honra do autor seria maculada, caso se
Questões
Questões sem comentários
12. 2015 – TRT 16ª Região – TRT 16ª Região – Juiz do Trabalho
Substituto
A respeito da pessoa natural, assinale a opção CORRETA:
a) De acordo com a teoria natalista, adotada pelo Direito Civil brasileiro, a
personalidade jurídica do indivíduo surge desde o momento da sua
concepção, justificando, pois, a observância de todos os direitos da
personalidade e patrimoniais do nascituro. Dessa forma, ao nascituro é
reconhecida tanto a personalidade jurídica formal quanto a personalidade
jurídica material.
b) Uma vez judicialmente declarada a incapacidade por enfermidade ou
deficiência mental, os atos praticados pelo incapaz serão considerados
Gabaritos
12. 2015 – TRT 16ª Região – TRT 16ª Região – Juiz do Trabalho
Substituto
NENHUMA
quer que seja, sob pena de responsabilização civil pelos danos decorrentes de tal
conduta (REsp 1065397/MT, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA,
julgado em 04/11/2010, DJe 16/02/2011)”
O item II está correto, já que a violação da imagem, em si, já determinada o
dano.
O item III está incorreto, pois a divulgação de informações fidedignas e de
interesse público dispensa a autorização da pessoa, mas isso não inclui a situação
de violação de honra e imagem. A respeito do caso, o STJ: “A liberdade de
informação deve estar atenta ao dever de veracidade, pois a falsidade dos dados
divulgados manipula em vez de formar a opinião pública, bem como ao interesse
público, pois nem toda informação verdadeira é relevante para o convívio em
sociedade. 5. A honra e imagem dos cidadãos não são violados quando se
divulgam informações verdadeiras e fidedignas a seu respeito e que, além disso,
são do interesse público. 6. O veículo de comunicação exime-se de culpa quando
busca fontes fidedignas, quando exerce atividade investigativa, ouve as diversas
partes interessadas e afasta quaisquer dúvidas sérias quanto à veracidade do que
divulgará (STJ - RECURSO ESPECIAL REsp 1297567 RJ 2011/0262188-2)”.
O item IV está correto, porque a publicação de imagens deve resguardar a
intimidade das vítimas retratadas e de seus acompanhantes: “RECURSO
ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E POR VIOLAÇÃO DE
DIREITO DE IMAGEM. PUBLICAÇÃO NÃO AUTORIZADA DE FOTO E NOME DO
AUTOR, QUE ACOMPANHAVA A VÍTIMA QUANDO DE AGRESSÃO, DE QUE
RESULTOU A MORTE, PRATICADA POR "SKINHEADS" POR MOTIVAÇÃO
HOMOFÓBICA. 2. Julgada improcedente ação de indenização por danos morais.
ante a publicação de notícia jornalística de agressão e homicídio, motivado por
homofobia, praticado por "skinheads", contra jovem, que era acompanhado pelo
autor, em praça da capital paulista, é adequada, contudo, nas circunstâncias do
caso, concernente à vida privada, a procedência da ação pelo fato da publicação
não autorizada de foto e nome do autor (REsp 1235926/SP, Rel. Ministro SIDNEI
BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/03/2012, DJe 14/11/2012)”.
A alternativa C está correta, portanto.
(D) Herdeiro não pode pleitear perdas e danos por violação de direito da
personalidade de pessoa morta, por se tratar de direito personalíssimo,
intransmissível e que se extingue com a morte.
(E) O pseudônimo não goza de proteção legal em razão da proibição
constitucional ao anonimato.
Comentários
A alternativa A está incorreta, conforme estabelece o STJ, majoritariamente,
dado que o fim jornalístico retira a exigência.
A alternativa B está incorreta, eis que há evidentes exceções há
intransmissibilidade e irrenunciabilidade dos direitos sobre o próprio corpo, como,
por exemplo, os lutadores esportivos em relação aos danos físicos ou a
transmissão dos direitos em caso de morte.
A alternativa C está correta, na forma do art. 14: “É válida, com objetivo
científico, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em
parte, para depois da morte”.
A alternativa D está incorreta, de acordo com o art. 12, parágrafo único: “Em
se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste
artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral
até o quarto grau”.
A alternativa E está incorreta, consoante regra literal do art. 19: “O pseudônimo
adotado para atividades lícitas goza da proteção que se dá ao nome”.
O item está correto, na forma do art. 11: “Com exceção dos casos previstos em
lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não
podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária”.
A alternativa C está incorreta, de acordo com o art. 18: “Sem autorização, não
se pode usar o nome alheio em propaganda comercial”.
A alternativa D está correta, conforme o art. 19: “O pseudônimo adotado para
atividades lícitas goza da proteção que se dá ao nome”.
A alternativa E está incorreta, por aplicação da regra do art. 12: “Pode-se exigir
que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e
danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei”.
12. 2015 – TRT 16ª Região – TRT 16ª Região – Juiz do Trabalho
Substituto
A respeito da pessoa natural, assinale a opção CORRETA:
a) De acordo com a teoria natalista, adotada pelo Direito Civil brasileiro, a
personalidade jurídica do indivíduo surge desde o momento da sua
Comentários
O item está incorreto, segundo o art. 11: “Com exceção dos casos previstos em
lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não
podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária”.
A alternativa A está incorreta, pela parte final do art. 12, parágrafo único: “Em
se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste
artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral
até o quarto grau”.
A alternativa B está incorreta, já que a liberdade é também um direito de
personalidade.
A alternativa C está incorreta, pois os direitos de personalidade são
extrapatrimoniais, ainda que possam ter efeitos patrimoniais.
A alternativa D está correta, pela previsão do art. 11: “Com exceção dos casos
previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e
irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária”. Atente,
porém, porque tecnicamente a limitação voluntária, na dicção do artigo, só
poderia ocorrer nos casos previstos em lei, ao passo que o exercício pode passar
a ideia de ser uma possibilidade geral, “sempre que não ocorra de forma geral e
permanente”.
A alternativa E está incorreta, segundo o art. 52: “Aplica-se às pessoas
jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade”.
II. Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos de personalidade são
intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer
limitação voluntária.
III. Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio
corpo quando importar diminuição permanente da integridade física ou
contrariar os bons costumes.
IV. É anulável o negócio concluído pelo representante em conflito de
interesses com o representado se tal fato era ou devia ser do conhecimento
de quem com aquele tratou.
V. No caso de pessoas públicas, o âmbito de proteção dos direitos da
personalidade se vê diminuído, sendo admitida, em tese, a divulgação de
informações aptas a formar o juízo crítico dos eleitores sobre o caráter do
candidato.
a) Está correta apenas a assertiva V.
b) Estão corretas apenas as assertivas I e II.
c) Estão corretas apenas as assertivas I, III, e IV.
d) Estão corretas apenas as assertivas II, III e V.
e) Estão corretas todas as assertivas.
Comentários
O item I está correto, conforme julgamento do STJ no REsp 1433187: “A
supressão devidamente justificada de um patronímico em virtude do casamento
realiza importante direito da personalidade, desde que não prejudique a plena
ancestralidade nem a sociedade”.
O item II está correto, pela previsão do art. 11: “Com exceção dos casos
previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e
irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária”.
O item III está correto, consoante regra do art. 13: “Salvo por exigência médica,
é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição
permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes”.
O item IV está correto, na forma do art. 119: “É anulável o negócio concluído
pelo representante em conflito de interesses com o representado, se tal fato era
ou devia ser do conhecimento de quem com aquele tratou."
O item V está correto, pela literalidade do entendimento do STJ no REsp 253.058
sobre os políticos em geral.
A alternativa E está correta, portanto.
por exemplo, aos danos morais decorrentes da morte do pai causada por ato
ilícito.
Comentários
O item está incorreto, segundo variadas decisões do STJ que garantem ao
nascituro proteção, incluindo indenização por danos morais.
Resumo
A. Absolutos
B. Indisponíveis
• Insuscetíveis de alienação
• Porém, são disponíveis os efeitos patrimoniais de todos os direitos
de personalidade e os próprios direitos de personalidade são
disponíveis, a depender da situação, como o direito à imagem ou
ao corpo, por exemplo
C. Irrenunciáveis
D. Imprescritíveis
E. Extrapatrimoniais
F. Inatos
• CF/1988
• Plano constitucional
Direitos Fundamentais • Liberdades Públicas
• Pessoa X Estado nacional
Considerações Finais
Chegamos ao final desta aula. Vimos os temas que orbitam ao redor dos Direitos
da Personalidade. São temas, atualmente, muito mais afeitos à jurisprudência do
que à legislação, dado que o CC/2002 é altamente lacunoso a respeito deles.
Quaisquer dúvidas, sugestões ou críticas entrem em contato conosco. Estou
disponível no fórum no Curso, por e-mail e, inclusive, pelo Facebook.
Aguardo vocês na próxima aula. Até lá!
Paulo H M Sousa
prof.phms@gmail.com
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