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I l,r,:il r)S

R"ror-a foi o termo usado para


descrever o complexo conjunto de fatos que
durou a maior parte do século XVl, pelo qual
significativa minoria dos membros da lgreja
católica foi perdida para as novas lgrejas
protestantes que se estabeleceram como
rivais do catolicismo romano.
Para promover uma análise imparcial,
isenta de juízos de valor, Keith Randell
I,IJTERO
procurou desvincular-se pessoal e
religiosamente de seu tema. Uma vez que
ainda é necessário dístinguir os fatos das I'I A REIORTVIA
lendas que os religiosos criaram sobre este
acontecimento, a tarefa principal do Autor é
desmitificar a figura de Lutero, substituindo o
enfoque apologético-religioso por uma
AIEII/IA
abordagem histórica e crítica.
Com isso, avança-se não só na
compreensão do movimento desencadeado
por ele, mas também no entendimento das
múltiplas dissidências do luteranismo.

. Ú',zr rlr' it/r't'trr.rr' ,/r, rrrrlruttr'


. Historia

ISBN B5,OBB-054r53-X

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Editor..-.
luetsort.oôá Reis;
eartorlaásliisntel
Sumário
Claudemir S*de An$rade

Ana.,Mahl'd
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Re&'la'ão
Geuid Dib Jardim
. lsaías Zilli §"'
Edição de arto (mlolol
Divina Rocha Corte
Gapa

o,.",lüffiHltç*il.
i,,, r:'' u ,..t,., i.,.,.ii.

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;i.,t
1. O cenário para â Reforma
Introdução
t
J
O que foi a Reforrna? ;+
As causas da Reforrna t2
Causas de longo piazo t2
@ 198& KeÍth Rat
Título originaii Lltther'and..the G Causas de curto prazo 20
Publicado por Hbdder .i4,Stsu.q.htop.,! ho!d, Danton 2. A revolta de Lutero: 1517-1521
Green Sevenoaks, 25
Introdução 25
As origens da revolta 27
-*rf' As tentativas de silenciar Lutero 31
impÉaao c *.bamEto O ponto de vista de Lutero 33
targrotl
ÍEL.:lOfl rg!-tso Frederico, o Sábio 36
llxrlort) 2ra'aoia
A Dieta de Worms 38
3. Os ensinamentos de Lutero 43
1SBN 85 08 05453
Aspublicaçõesde 1520 44
As práticas religiosas 48
19S5 A Bíblia 5I
Todqs os direitos reservados A disserninação §3
Editora Átii:a S-4. A Eucaristia s4
Rua Baráo de lguape, 110- CEP 015SÊ9-0O Apolíticaeasociedade 57
Te t. : PABX 01 1 I 278-9.q2,.? .- Cai xa Foçtàt 866q-,,
(
Os eavaleiros Inrperiais 59
End. Telegráfico "Borr{fivry"'] Fax: (01'tl 27714146 A Guerra dos Camponeses 60
sao'Éaüto'(sp)
O govemo da Igreia 63
A farnília 65
4. Zwingli 67
67
Histórico
69
1
A Reforma em Zurique 'Qr
7l
As tentativas par4 divulgar a Reforma de Zurique
Zwirrgli e Lutero 72 O ceníno paru a ReÍbrma
Uma avaliação - 77
-
5. Os anabatistas 80
Histórico 80
I
I oraspectosair"ffi-*- 81
I er reações aos anabatistas 84
It^ Conclusão 87

6. A política do luteranismo ---..-* 88


Por que Lutero sobreviveu? 88 lntrodução
-
0 estabelecimento e a disseminação do lutcraniamo
na Alemanha 92 A Reforma iem sido mais eshrdada pelos historiadores do
que praticamente qualquer outro assunto. Trata-se de um tema de
A procura de uma solução 98
101
controvénias, que tem fascfnado milhares de estudantes há mui-
O luteranismo na ofensiva
tos séculos, e não há o menor sinal de que esse interesse vá dimi-
Carlos V no ataque 103
nuir. Em poucos de seus aspectos há um consenso geral; mesmo
A Paz de Augsburgo 106
certas questões de detalhamento factual ainda hoje são ardorosa-
7. Vocabulário crítico 108 mente discutidas. A cada ano apÍrÍecom pelo menos dez liwos
baseados em pesquisa original sobre o assunto. O ritrno com que
8. BibliograÍia comentada 110
-- surgem novas evidências é espantoso, e raramente contibui para
tornar o quadro geral mais claro. Cada nova pesquisa tende a lan-
çar dúvidas sobre pelo menos algumas das generalizações sim-
ples, que há muito têm sido consideradas banais. É essencial que
o estudante faça uma avaliação danaíxeza temporária de nossa
compreensão sobre a Reforma e admita que a verdade de hoje
pode muito bem ser a interpretação equivocada de amanhã. Tudo
indica que é justamente esse elemento de incertezp que atrai tan-
la6 Dessoas.Dara o esfudo da Reformã.-
/ '' o.r"mos lembrar que "Reforma" é um conceito inventado
/ pelos historiadores para descrever a seqüência de âtos que leva-
I ram muitos alemães, süços, escandinavos, holandeses e ingleses
\ a voltar as costas para o catolicismo e se tornar membros de igre-
)as protestantes independentes. "Reforma" não era uma expressão
usada na epoca ou por algumas gerações que vieram dept'lis; foi terá de começar tomando conhecimento da abordagem centrada
um conceito popularizado no seculo XVIII por historiadorcs pro- cm Lutero. Sem isso, e muito dificil dar algum sentido à confu-
testantes na Alemanha que. senl questionamento, prcssupttnhanr são de interpretações conflitantes que rodeiam as abordagens
que a "Reforma" havia sido um processo pelo qual um gt'antlc tr[t- nrais amplas do assunto. Entretanto, e bom lembrar, em todos os
mero de cristãos fervorosos que não aceitavat.n os conhccitlos nromentos, que não só Lutero foi importante. Há evidências de
abusos da lgreja católica romperam com ela, pirra Íilrttrar sttir ;rró- que ele teve grande influência, mas isso é muito diferente de afir-
pria religião puriÍicada. A própria palavra "Rclirrnrl" intplicir tlirc rrar que outras pessoas e outros fatores não tiveram grande im-
as mudanças eram para melhor e con'igiarr.r o quc cslirva ct'rittlo. o prlrtância no que acontecia.
modo como o conceito tem siclcl colocaclo h1t trriris tlc tlttzctttos Precisamos lembrar, tambem, do risco de escon'egar des-
anos nos estudos sobre a história da Er"rropa clo sccttlo XVI i'rrrna pcrcebidamente nas pressuposições protestantes rnais comuns so-
grandc vitória propagandística para o protcstattlisttto. Agolrt c titr- lrrc o que ocoÍreu na Refonna quando seguimos uma abordagem
de demais para que se tente abandonar o cot.tccito t»tr ltttttlltr stta crcntrada em Lutero, e é importante compreender que a escolha
denominação. Chamar a Refonna clc "l)c'sc\'ào" rlttt;tttlt' ottlros clas datas de I 517 e I 555 para início e fim da Reforma alemã po-
tantos seculos, até poderia corrigir o cqttívoco. rtuts tlcvctttos ao dc csconder outros pressupostos igualmer,te perigosos. Mais gra-
menos procufat Íer a consciência de c1ttc, Ilo rlr()rrlclll() crll (ltrc sc ve e o que imaginam historiadores da chamada escola Whig (que
aceita a idéia de "Refoma" como qttatlro pirlil lllrr csttrtlo lrisliiri- rccebeu esse nome por compartilhar as mesmas idéias gerais do
co, corremos o risco de engolir botn nírrncro tlc prcsstrposiçõcs partido político inglês dos séculos XVIII e XIX). Os historiadores
questionáveis que são ao mesmo tempo.itrlgirrrtcrtlos tlc vltlor. Wl..tg q* há cem anos tiveram sua maior inÍluenõii,iír[ãGã"à
Se isso acontece com a Reforlra clll sctl ttlttjttttl. ll. cltrio importância de um acontecimento por suas conseqüências ocasio-
da Reforma na Alemanha. é uma realiclatlc ititttkt tttrtis e vttlctttc. nais. Acreditavam na "q{§!g dg-p_Iggl9qso". Para eles, a história
porque os seguidores de Martinho Lutcro tloltrinltvitttt o cs(tttlo cra importante porque explicava como o presente veio a ser o que
do tema e condicionaratn muitas pessoas it itccilltt sr'ttt tltresliottit- ó. Portanto, não estavam muito interessados em avaliar o signifi-
rnentos que !*I9 e luteranismo são sinôrrirtros tlc l(cÍirrnla. cado dos fatos no momento em que aconteciam; preferiam con-
Surgiu toda uma ry*gi, em tomo dc sLIlr vitllr c ltoit'r' tttttittt ccntrar-se no papel que esses fatos desempenhavam na longa ca-
difiãil separa. o. fffiÃ?-aJicçào; isso lL-votr nruitos lrislolirttlorcs clcia de causas e efeitos que vem do passado ao presente.
a insinuar que provavelmente chegaríamos a ttt.mt boit e()rlrl)t'cclt- Nesse contexto em que Lutero teve uma importância cen-
são do que aconteceu durante a Reforma na Alctrtltttlut st ltrlissc- lral para o movimento, automaticamente se admitia que a data do
mos Lutero do centro do palco e o substituíssct.tttls pclo "lrotttcnt irrício da Reforma na Alemanha deveria ser o dia em que ele pro-
comum", sem nos concentramtos no Iíder, mas rt()s litlerrrtltts. o lcstou publicamente sobre o que considerava falhas da lgreja. ls-
argumento é que isso permitiria fotmular respostas sigrrilicrrtivas so implica que, depois de Lutero ter feito seu protesto inicial, era
para perguntas como: "Por que a Refon-tra ocorrctl, olltlc otottctt ccrto que a Reforma acontecesse. Devemos, porém, resistir à ten-
e qnando ocorreu?" ou "Por que se disseminor-r lattlo c lrlo tlc- tlrçào de usar as interpretações posteriores da história; temos de
( pressa'1" e "Que influências ela teve na vida das pcssolrs'/" lcnrbrar que só no final da década de 1520 a unidade da lgreja fi-
Há muito a dizer sobre essa abordagem enquanto Íirt'trrrt tic earia abalada para sempre. Desse modo, 1517 é o ano aqui adota-
determinar prioridades para futuras pesquisas. Sua implctrrctrta- tkr por ser uma conveniente data de início, apenas por ser tradicio-
ção nos últirnos vinte anos deu origem a um enorÍne conjunto tle rurl e ao mesmo tempo tão conveniente (ou inconveniente) quanto
obras publicadas que tem ajudado a corrigir os desequilíbrios tlo rlualquer outra data e não porque esteja assinalando o começo da
passado. O estudante que se aproxima do tema pela primeira vez llclorrla em um sentido mais definido. Não se pode reahnente di-
zer qlue um movimento amplo como a Reforma (ou a Revolução / descrever o complexo conjunto de fatos que durou a maior parte
lndustrial) tenha começado em uma data determinada. I do século XVI, pelo qual uma significativa minoria dos membros
O mesmo se aplica em relação à data do firn cla RcÍbrma na I aa tgrela católica foi perdida para as novas igrejas protestantes
Alemaúa. A tradição de fixá-la em 1555 foi estabelccida por au-
tores luteranos e seguida pela maioria dos outros autorcs. ('ontuclo,
\t qu. .. estabeleceram como rivais da Igreja de Roma. Considera-
va-se que dois conjuntos de acontecimentos a constituíam: o pri-
essa data só tem validade se levantarmos algumas hip(rtcscs rnuito meiro, a origem da Reforma, ocorrendo em quase toda a Alema-
amplas. A Paz de Augsburgo ocolreu em 1555, e otrvolvia gover- nha e centrado na vida e nas atividades de Martinho Lutero; o
nantes de mais de trezentos Estados e territórios virtualrnentc inde- segundo, a Refonna tardia, cuja sede estava loçalizada na Suíça,
pendentes da Alemanha, que acreditavam que todtls os príncipes e
de onde se disseminou para regiões distantes, e que girava em tor-
os govemantes de cada cidade deveriam ter a libcrtlttlc dc cscollrer
no dos ensinamentos de João Calvino. Em conseqüência da Re-
entre as duas religiões catolicismo e luteranistuo c quc todos
- ftrnna, a unidade da cristandade na Europa ocidental foi elimina-
os outros habitantes estariam obrigados a scguil a oricntação de
cla depois de ter existido por mais de mil anos. Essa rnudança
seu govemante ou deviam mudar-se para outr() llstirtkr. ('«rnt isso,
constituiu marco importante na história européia porque abriu a
a gueÍra religiosa na Alemanha foi enccrrada tlrrntttlc: nruitas ge-
pofta para uma incerteza espiritual generalizada. Onde antes havia
rações. Não obstante, esse foi um marco apcnus cttt rclitçlxr ao lu- . : ' - -: I ''
apenas um cã!ffiiõ1le crenças amplamente açeitas como corre-
teranismo; diversos outros grupos protcstárntcs lirlirrn especifica-
tas, agora havia dois. Todos podiam ver que um dos dois deveria
mente excluídos da Paz de Augsburgt'r. I)or isso, gcralrnente se
pressupõe que os luteranos eram o único grupo tle ptrrlcstantes im- estar errado, e muitos começaram a se perguntar qual deles...
portante na Alemanha o que não é vcrdatlc. ( ) rttto tlc I5-55 co- E claro que essa definição da Reforma cgltrada ng§lglgp
mo data final também faz pressupor quc rtatlrt tlc sigrrilic:ativo não deixava totalmente de lado as dimensões políticas, sociais e
ocorreu depois desse momento. De modo gontl, potlc itli'scr vcrda- econômicas das mudanças ocorridas. Essas dimensões, contudo,
de no que diz respeito aos luteranos, mas não liri o t;trc itcortloceu eram vistas mais como periféricas do que centrais, por isso não
com os católicos e outros grupos protestantcs, c()nlo os clrlvinistas. costumavam ser dirctamente estudadas, entrando como "fatores
Portanto, a datação tradicional da Refornra na Ale:ttrtttllt ó urn t mais" ou "maiores conseqüências". As questões importantes
exemplo óbvio de como os limites do tema e a rrtittrcirlt cottttl ele rliziam respeito aos fatos que culminaram no "rompimento com
deveria ser estudado têm sido indevidamentc irtllucrrcilr«los por I{oma": o ponto onde ensinamentos dos reformadores religiosos
* historiadores alemães simpáticos ao luteranisnto. l)cvc-sr: lr:r isso tliferiam dos ensinamentos da Igreja católica e a disseminação,
eilãelfrfimtÊàiêitüã ,aestEliVrí Mur-tai vczcs ú nuris tfilicil ,rrganização e estrutura das recém-çriadas igrejas protestantes'
detectar um desvio "estrutural" desse tipo do quc turt lrrect,rtcctto lrssas são questões de grande significado, em especial quando se
sem rodeios e em geral é bem mais importurntc. rr)rneça a compreender o tema, embora não sejam os assuntos
sobre o qual se concentra hoje a maioria das pesquisas históri-
cls. Não que a abordagem centrada na religião tenha sido sufi-
O que foi a ReÍorma? t'icntemente pesquisada, sem que haja nada de novo a ser encon-
lraclo (ainda que seja tentador pensar que isso aconteceu em
Ate vinte e cinco anos atrás, os historiadores não viant ne- r.clação a Lutero, sobre quem já se escreveram milhares de li-
nhuma dificuldade em concordar a respeito de uma definiçzio gc- vros), mas porque um número çada vez maior de historiadores
ral da Reforma, pressupondo que estivesse quase totalmente rcla- g t;rrcstiona a hipótese de que a Reforma esteja essencialmente re-
cionada com a religião. "lleíorma" foi o termo usado para I l;rci,rnada com a religiào.

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1l

Não se pode negar que a Reforma se converteu em mudan- zimos (os impostos sobre a produção agrícola, pagos à lgreja), ao
ças na organizaçáo, nas crenças e nas práticas religiosas. O que príncipe, que antevia a possibrlidade de tomar para si as terras da
se questiona é se o problema era realmente esse. As rnuclanças lgreja. llá quem afirme que essa situação provocou o apoio gene-
eram desejadas e foram bem rccebidas por razões espirituais ou ralizado à Reforma e e o que dá real significado.
por razões materialistas? Segundo alguns historiadorcs. a RcÍbr- Todas essas interpretações têm como base o Íato de colo-
ma só pode ser bem compreendida quando se adrnite cluc ltli Íun- cAr-se a Reforma num contexto mais amplo, em que ela é apenas
damentalmente uma revolução social.]Argumenta-se cluc rra Ale- run cxemplo de uma tendência mais geral que se pode perceber
manha. por exernpio5riesernr,offiírto e a disseminaçào do nir cpoca. O contexto mais vasto de todos é fornecido pelos histo-
luteranismo só ocorreram por causa de ceúos reprcscntantes da r.iaclores que vêem a Reforma como parte das mudanças radicais
população, em especial os relativamente prósperos habitantes clas tlLrc ocorriam no modo de a maioria das pessoas pensar na vida,
cidades, que se ressentiam profundan-lente das rígidas nurmas da rrl existência e nas idéias que tinham a seu respeito. Há um con-
Igreja sobre detalhes como, por exemplo, as rcgras sobrc je- tr.aste entre o pertsamento medieval e o pensamento moderno. O
jum-.Assim, muitas das pessoas que abraçaram a rcligião refor- l.rcnsamento medieval pode ser tipificado como baseado na certe-
mada faziam isso em grande pafte na expectativa dc sc libcrtarern
de restrições mesquinhas e, finalmente, resolverem suas vidas da dc clue o dever de cada um é aceitar de bom grado a vida que foi
maneira como bem entendessem. As crenças religiosas e a fon.na lrlane.jada para si e a certeza de que os que detêm a autoridade são
de veneração tinharn apenas importância secundária. A meta pri- os porta-vozes de Deus. A Reforma é considerada um exemplo
m ord i a I e ra e I i m i n ar o c o n tlo-l e s-o_c tlcssas mudanças que ocorriam. A Era das Descobertas, na quai
Lql_çf.pf4g p.-! q- [elej-A.
Outros historiadõiãí§üiteniãm (uc a Reforma na Alemanha os europeus exploraram o mundo antes desconhecido para eles, e
foi basicamente uma 999-Stão política. Por um lado, ela é vista co- r Era da Ciência, em que se procurava encontrar novas respostas
mo um primeiro exemplo do nacionalismo alemão, que representa- para velhas perguntas, podem ser tambem consideradas movi-
va um ampld movimento de recusa «le uma situação na qual estran- nrcntos llessa grande mudança" mais que algo baseado na sabedo-
geiros, principalmente italianos que viviam em Rorna, r il do passado.
'Iodas essas idéias sobre a Reformalglêm elementos da
controlavam tantos aspectos da vida na Alemanha e extorquiam
boa parle da riqueza do país. Por outro lado, é descrita como um r e ltlacle. Até certo ponto, as diferentes ..tffãi^Iãtiãffiàõ faiõ
instrumento utilizado por govemantes locais para elin-rinar a in- tle rprc os historiadores têm dado significados variados à pergun-
fluência extcma sobre seus territórios. Os príncipes luteranos ga- trr "O que foi a Refonna?". Algumas respostas são dadas a partir
r tt' trrn ponto de vista atual, com o beneÍ'icio do conhecimento so-
nharam o controle da lgreja, em vcz de este ficar nas mãos do papa
em Roma, o que significava que as decisões legais que envolves- lrr c um amplo círculo da história, antes e depois da Reforma. Des-
.;e nrodo os historiadores podem fazer interpretações que relacio-
sem questões como casamento e herança, e outras de natureza mais
diretamente religiosa, agora estavam inteiramente em suas mãos. n:rrn tendências de uma maneira que seria impossível para os
Para alguns historiadores, a Reforma na Alemanha Íbi ( ()ntcÍnporâneos. Outros autores tentaram identihcar o que os fa-

principalmente uma questão econômica. Segundo eles um perio- tos significavam para as pessoas da epoca. Assim, não sulpreende
do de alta inflação fez com que as pessoas procurassem manciras rltrc sc tenham encontrado tantas respostas diferentes. O fato de a
de reduzir seus problemas financeiros e vissem no rompimento ItcÍirrnra ter afetaclo milhões de pessoas em muitos lttgares e mo-
com Roma um excelente meio de obter essa solução. I-lavia a nrcntos diversos também explica por que é possível encontrar inú-
perspectiva de ganhos financeiros: do canrponês mais humilde, rrrclas respostas, todas aparentemente válidas, para a mesma per-
que equivocadamente iraaginava quc não teria mais de pagar dí- 1,rrrr(ir. l{á tantos indícios e pistas a seguir, que seria impossível
uma equipe de historiadores ou um historiador sozinho estudar tu- muito cuidado para explicar por que a Reforma ocoÍreu dentro de
do, mesmo que dedicasse a vida inteira a essa tarefa. um quadro religioso. Na discussão que3e següãnoíôonõéirtráre-
dFr{.

Toda pesquisa sobre a Reforma tem de ser muito seletiva. rnos nas questoes relrgrosas.
Nessa seleção é muito fácil reunir as evidências que apontem nu- Para quem só viveu numa sociedade leiga (ou laica, ou se-
ma única direção e deixar de fora as que poderiam servir de base cular), onde todos os dias o pensamento gira em torno da aquisi-
para uma conclusão oposta, mesmo não tendo sido essa a intenção ção e do consumo da riqueza material, é dificil compreender o
do historiador. Uma vez formada uma hipótese preliminar a partir que significa viver numa sociedade religiosa. Existem sociedades
da primeira evidência estudada, sempre e possível localizar outras religiosas neste final do século XX por exemplo, no mundo
muçulmano e no indiano -
que raramente são encontradas no
para apoiá-la na diversidade de documentos existentes. Um tema - não acontecia há quinhentos anos,
tão vasto como a Reforma sempre permite que se elabore novas chamado mundo cristão. Isso
definições e novas explicações e que se encontre uma serie de evi- tluando as sociedades da Europa ocidental baseavam-se na reli-
gião. Tudo isso também era ilustrado de três maneiras: na posi-
dências para sustentá-las. Contudo, tambem continuará sendo im-
possível apresentar provas conclusivas de qualquer interpretação çiio social atribuida aos líderes dos diversos setores da sociedade,
nas metas na vida da maioria das pessoas e nas suas reações às si-
particular. Os historiadores também não poderão provar que outra
tuações do cotidiano.
interpretação esteja errada. Por isso, aincerteza permanecerá para
Estamos habituados a uma única estrutura de poder em
sempre e quaisquer análises deverão ser formuladas com muita
nossa sociedade baseada no governo democraticamente eleito.
cautela. Não obstante, se desejam oferecer novas explicações do
Na Europa de 1500 havia duas: o poder civil, representado por
fato, os historiadores devem estar prepara«los para adotar algumas
uln monarca (um rei ou imperador), e o poder eclesiástico, exer-
definições, ainda que provisoriamente. Quando este livro Íbi es-
ciclo pela Igreja, Iiderada pelo papa, em Roma. Esses dois pode-
crito, aceitou-se como a mais convincente interpretação hoje exis-
r cs competiam pela precedência. mas ncnhunt dos dois conseguia
tente o argumento de que, para as pessoas da época, os fatos ocor-
rlorninar o outro por muito tempo. Em geral, ambos aceitavam a
ridos na Reforma alemã diziam respeito essencialmente às rrle ia de que a única solução viável era considerarem-se quase
questões religiosas. Essa decisão naturalmente deterrninou a esco- r1lrrais. Assim, uma pessoa comum teoricamente tinha dois se-
lha dos assuntos a serem discutidos no livro. rrlrorcs: o chefe de Estado e o chefe da lgreia. No cotidiano, essas
1,.r.oasãffii㧠;iífãfi"õ"rtat" .oin-ffiffi""tantes inferiores
t['ssas duas hierarquias: o bailio e o padre.
As causas da Reforma O alemão típico no início do século XVI tinha em Çomum
,,,rrr a maioria dos habitantes da Europa ocidental o fato de estar
Causas de longo ptazo lrroÍirndamente interessado tanto "neste mundo" como no "outro
rrrrrntlo". A mortalidade infantil era elevada, os adultos sobrevi-
Umavez que decidimos aceitar o argumento de que a Re- r,t'rrlcs já eram velhos aos 40 anos e apenas uma minúscula parce-
forma ocorreu basicamente por questões religiosas, devemos l:r th população atingia a iclade de Matusalém de que fala a Bí-
buscar suas causas de longo prazofia situação da religião na epo- l,lrl. Quando a possibilidade da morte espreitava em cada canto,
ca. Quem acredita que a Reforma tem que ver principalmente nirr) cra por simples prudência que as pessoas prestavam especial
com a mudança social, política, econômica ou intelectual, por- :rtt'nçào ao que fosse necessário para garantir uma vida eterna (a
tanto, deve procurar suas causas nessas áreas, mas até mesmo es- ';;rlvução). A vida na Terra em geral era desgraçadamente curta.
sas pessoas têm de levar em conta as questões religiosas com l rr rrrn brevíssimo interlúclio, se comparada ao restante do tem-
po. Somente os tolos ou fracos de vontade estavam preparados algum nclvo entusiasmo? Havia a hipótese de que, se fosse possí-
para ariscar-se à condenação eterna só para poder gozar os efê- vel apresentar um diagnóstico mais correto sobre a situação da re-
meros prazeres do pecado. Para muitos, a mais significativa força ligião na epoca, seriam encontradas respostas para a questào das
motivadora da vida era o-.!gpgig.- gq jgç"2-9.-(g gqlyqgão-; para isso, causas da Reforma. Como seria de se esperar, viu-se que era mui-
i to dificil loçalizar as fontes adequadas de informação. Em geral as
\ tinham de voltar-se para a lgreja.
cvidências que ainda pernanecern sc restringem a áreas localiza-
V Atualmente, grande parte do que nos acontcce ou do que se
tlas e não são conclusivas, porque s('relaÇionarn a aspectos muito
passa à nossa volta pode ser explicado em tennos racionais, o que
nos dá grande segurança. Há quatrocentos anos cra o contrário. rcstritos do comportamento religioso. Por isso, embora tenha sido
Muitas yezes, a única explicação viável era "Deus cluis assim" ou p«rssível concluir que a quantidade de dinheiro dada às institui-
"foi trabalho do demônio". Sempre que havia a amcaça de uma çircs de caridade, ou que as importâncias deiradas em testamento
catástrofe pública ou particular, como a seca, unra praga oLl uma para celebração de missas para os mortos, ou, ainda, que o núme-
desordem civil, um roubo, uma doença grave ou urn potencial r.o de pessoas que freqüentavam a igreja estivesse aumentando ou

prejuízo às colheitas, a reação imediata era apelar para a a.juda di- tlinrinuindo em determinadas cidadezinhas ou distritos. isso não
vina. Normalmente as pessoas não se dirigianr clirctanrcnte a Ilaz nenhuma evidência óbvia em apoio ou contradição às genera-
Deus, pois se acreditava que Ele era inacessívcl aos mortais co- lrzações tradicionalmente aceitas sobre a situação da Igreja no
muns. A aproximação devia ser feita atraves clc scrrs rcprcsen- linal da ldade Média. Evidências concentradas numa área geográ-
tantes na terra, o clero, ou, mais comumente, atravós dos repre- ljca mais ampla como o número de livros e panfletos religio-
sentantes da humanidade nos céus os santos. T'oclos linlranr um sos publicados na - Alemanha tambem não se prestam a uma
santo que acreditavam estar especialmente preparaclo para inter- irrtcrpretação mais fácil, porque - os fatos desconhecidos são sem-
ceder em seu favor. O santo poderia ser o do dia crn (luc nasce- ;.rlc mais extensos que os conhecidos. Desse modo, resta sempre
ram, cujo nome haviam recebido, ou o patrono de seu rrcgócio, de rr possibilidade de que o quadro revelado pelas evidências dis-
sua profissão ou do distrito em que moravam. Para muita gente, poniveis não seja típico. Quando se interpretam os números
especialmente as mulheres, a Virgern Maria era a preÍ'ericla, por lclativos à publicação de material religioso, por exemplo, há o
ser considerada especialmente acessível e muito inÍ'luente . O "cul- tlrrplo problema de a imprensa ser recente o que impossibilita
to dos santos" integrava fortemente a vida cotidiana. As pessoas ('orrparar-se o final do século XV a épocas anteriores e de
caÍregavam amuletos de seus santos onde quer que Íbssem, reza- tlt:lcmrinar a importância desses dados para chegar-se a -conclu-
vam para eles na igreja, ofertavam presentes como caridade em st)cs a respeito dos mais de90o/o da população que não sabiam ler.
() máximo que se pode dizer é que os historiadores estão certos ao
seu nome, dirigiam-lhes promessas de comportamento futuro e
muitas vezes faziam peregrinações a lugares a eles associados, irrlcressar-se em descobrir se a religião estaria se tomando mais
principalmente lugares onde suas reliquias estivessem expostas. i,r'EEfi õyimF-oft ãniãúãvrAá-dãsiê§ioásíopeiío16-qü*e'ã1iGê:
t lc u a Refornia, pbrqüê é§se Íípo Aê-inÍôTfrÍãÇao T"o-dõiiãTêfm'üilfô
.. Havia a crcnça quase universal de que era possível "comprar" fa-
\ ,ores especiais (inclusive a salvação) fazendo diversos tipos de íirltna identificação de sues causas de longo pÍazo. g
A informação reunida até agora permite apenas que se diga
\poas ações".
' Nos últimos anos. os historiadores tentaram investigar a va- rlue há razoáveis evidências tanto de uma redução quanto de um
lidade dessas idéias tão generalizadas sobre a situação da vida rurnento no interesse pela religião formal. De modo que é impos-,- .
religiosa no final da Idade Média. Ficaram especialmente interes- , sivel dizer com qualquer grau de cetleza que a Reforma foi cau- \1
sados em buscar conclusões sobre a "saúde" da religião. Ela esta- 1 sirrla por um crescente entusiasmo pela religiào ou que loi uma )
ria em declínio, estaria num estado de equilíbrio ou seria foco de ' r caçào à queda geral no fervor religioso. Mais pesquisas terào de l'
I6
1l

ser feitas sobre isso e ainda assim não será possível obter uma devidamente redimidos atraves da confissão
a um padre e da pe_
resposta definitiva. Entretanto, sejam quais forem as diferenças nitência recomendada. Devia_se i.."g,rla.Áente
à missa (o servi_
de opinião sobre os rumos da religião popular na época, ninguem ço da Eucaristia em que e.u.een"enaão o sacrifício
da vida de Je_
ainda questionou de modo convincente a idéia de que as crenças sus) ou fazer uma serie de ..boas ações,,,
Uma dessas ..boas
e hipóteses sobre a religião peryneavam todos os aspectos da vida ações" era a compra deindulgências:
àe redução ao tempo a sã.
no final do período medieval. É isso que explica como foi possí- passado no purgatório, freqüentemente
isso representava a dimi_
vel que as idéias distintas a respeito da rehgião tenham se torna- nuição de alguns anos dapena, que às
vezes chegavam a milhões.
do um eixo para a história política da Europa do seculo XVI, a As indulgências eram vendidas iob u
autoriauaúo pupu ô;
um ponto que seria inconcebível quatro séculos mais tarde. rarn a ser um método a mais de obter
rendimentos. Muitos" gou"._
Embora isso aumente ainda mais as incertezas sobre as nantes não permitiam que fossem
vendidas em seu territóriã, por_
causas a longo prazo da Reforma, deve-se dizer tambem que em que o sistema se prestava ao abuso.
Entretanto, no conjunto, há
1500 certamente não havia nenhuma insatisfação disseminada poucas evidências de que o povo
se ressentia com elas. fã.u o pá_
sobre os ensinamentos e as atividades da Igreja. Aparentemente, vo, pareciam um bom negóõio.
a maioria das pessoas acreditava que, se tivessem sido batizadas
logo depois do nascimento, indo à missa pelo menos uma vez por
. Não obstante, havia grandes queixas na Alemanha em rela_
ção a certos aspectos da estrutura à organização
da Igreja. Boa
ano durante toda sua vida adulta e recebendo a "extrema-unção" parte dessa animosidade provinha
do fãto de a Igreja estar sob
(perdão dos pecados, concedido por um padre em nome de Deus) rontrole de estrangeiros: era chefiada pelo
papa, que vivia em
um pouquinho antes da morte, sua salvação estaria garantida, Iloma e. governava grande parte da ftaf ia centrât.
Cuau pupu
desde que não tivessem muitos pecados. Aceitava-se a idéia de clcito vitaliciamente pelos ôardeair, u ,ut"go.iu
mais elevada "ru
na
que provavelmente teriam de passar certo número de anos (algo lricrarquia do clero. Os cardeais, poi
rru ,"Z,iru escolhidos pe_
em tomo de milhares de anos) no purgatório para redimir peca- Io papa. A grande maioria. dos óardeais
qür" todos os papas
dos quejamais haviam confessado a um padre e que, por conse- cram italianos. Isso não teria grande "
significado, não Íbsse o fato
guinte, não foram perdoados por Deus. Mas, havia a certeza cle rlc que o papado, precisando-manter
que o purgatório a sala de espera do céu, cujos oct-tpantes so- r Lrs tentativas dos
ía por4-ao política diante
franceses e dos Habsbu.io, puru dominar
friam tormentos de- menor importância era suportável, embora lirr. tinha uma necessidade quase
a Itá_
-
muito ruim. Certamente, era de longe preferível ao inferno, oncle,
in.*uurirl"t ai rendimentos
t'ionais, que geralmente procurava obter adi_
da Alemanha, a única
acreditava-se, os ocupantes, pecadores absolutamente não-arre- prrrlc da cristandade que ao fltesmo
tempo era rica e não tinha um
pendidos, sofriam a constante tortura do fogo enquanto eram ti()vcmo central forte que resistisse às ãxigências Íinanceiras
atormentados por cheiros de enxofre e pelos sarÇasmos e insultos p;rpa. A cada ano imensas quantidades do
deãinheiro, na forma vi_
de diabos e demônios. :rivcl d-e ouro e prata, saíam da Alemanha
.r, &."çã;-; iüm;. ''
Poucos acreditavam que a Igreja não dava as respostas cer- O papa podia cobrar esse dinheiro ._ g.ur,á"
parte porque
tas ou que a salvação não era acessível a todos os que estivessem ,'r'rr a única pessoa habilitada
a conceder isáçao das inúmeras
preparados para os esforços necessários à sua obtenção. Reco- t'rigârcias. legais impostas pela Igreja.
nhecia-se que isso geralmente era um tanto trabalhoso, pois a t'rlraídas das famílias da elite go-veàante
e, .ãt.", somas eram
aleÀa, quando essas
Igreja ensinava que a vida eterna deveria ser ganha pelo que se comprar postos eteúdos nu tg..Ju pu.a
fazia er,áo pelas crenças que se tinha. Em todo caso, não era uma ll.1,:]i:1T seus filhos
,rius Jovens. A importância era especialmenie
questão de viver sem pecado. De modo geral, admitia-se que es-
áltu ,. .r-i"r;;
lrssç 6sror de idade ou se já tivesie
algum posto, pois "essas in_
sa era uma aspiração irrealista. Exigia-se que os pecados fossem rlrurções eram ilegais e exigiam p.e"ia
dísperisa erp.ciat do papa.
t8
t9

Com cerca de um quinto da Alemanha sob controle de bispos


e sLras famílias do que em proteger ate mesmo os interesses políticos
muito campo para tlo papado. As preocupações espirituais estavam muito embaixo na
arcebispos virtualmente independentcs, havia
nos
essas lucrativas negociações' Essas ocorriam principalmente lista de suas prioridades, a não ser que representassem alguma
arcebispados cla Migúncia, Colônia e Trier, cujos beneticiários ilmeaça aos interesses financeiros. Abertamente, cometiam a maio-
que es-
eram tarnbém membros do grupo de elite de sete eleitores ria dos "pecados mortais" e chegavam às vezes a ridicularizar as
colhiam o imperador do Sacro lmpério Romano' Somas rlenores' práticas religiosas que se esperava que defendessem. Há poucas
mas não insignificantes, eram obtidas de todos os eclesiásticos cvidências de que esse comportamento, ainda que fosse ampla-
."""*-no*au,los e dos leigos que necessitavam de regras espe- rnente conhecido na Alemanha da segunda década do século XVI,
ciais, em geral questões relativas a casamento e herança' os dois carrsasse realmente alguma grande insatisÍaçào. Nesse ponto, os
grandes ríor", iobre os quais a Igreja obtivera controle legal' O historiadores protestantes exageraram. Não se estabeleceu que as
t-rato financeiro com os ricos, naturalmente, tivera influência
ime-
lirltas do papado foram em algum sentido uma causa da Reforma.
pa-
diata sobre o povo. Qualquer que fosse a quantia a ser paga ao SLra importâr.rcia era que o papa e os conselheiros estavam tào ocu-
pa, teria de ier levantada por extorsão do. povo, em geral por pados interpretando os fatos de acordo com seus próprios interes-
meios questionáveis. Assim, as exigências do papado eram obje-
scs nlunclanos, que deixaram de ver o significado espiritual do que
to de preocupação geral. Os primeiros reformadores muito se va-
,,corria, ate que fosse tarde demais para evitar uma cisão na Igreja.
lerarndo fatô de que o papa' que deveria ser o bom pastor' dedi- Da mesma forma, os disseminados abusos dentro da Igreja
cava muito de suas energias a tosquiar seu rebanho' rra Alçmanha causaram mais preocupação aos historiadores do que
A natureza ávida ão papado tendia a espelhar-se em todos is pcssoas da época. A maioria do alto clero se compunha de mem-
os niveis da Igreja na Alemanha. O maior interesse do clero
pa-
lrros da nobreza com pouca instrução geral e nenhuma instrução
recia ser u uqiitiçao de riqueza, e não o bem-estar espiritual da
tcokigica, encaravam seus postos como fonte de poder, prestígio e
população. I'ião ..u o fato de os eclesiásticos serem mundanos
lcrrclirnentos. Muitos párocos, especiahnente em áreas rurais, eram
que provocava o ressentimento: era mais porque eles cobravan.l ('rnrpolreses analfabetos que mal sabiam realtzar os serviços nor-
.*.eisira-ente qualquer coisa que fizessem. deixarrdo para os rrrris cla igreja. Eram comuns o pluralismo (a detcnção de mais de
leigos a opção de pagàr ou arriscar-se à danação eterna' Por isso
rrnr posto, como pároco, bispo, etc.) e o resultante absenteísmo.
haíia um'anticlericalismo generalizado (hostilidade em relação
I nrrn l'reqüentcs os curas ser.n nenhuma instruçâo empregados pa-
à lgreja e aos que nela detinham postos), criando um clima em
r:r strbstituir padres ausentes mas isso não era muito digno de
quã qualqucr ataque à hierarquia da Igreja geraltnente tinha
granae pràbubitidude de ser nluito bem recebido' Coutra esse r(,lr lrara uma populaçào que não sabia muito mais. Há algumas
vistas as demais ( \ r(lôncias de que sentia-se falta de apoio espiritual, particular-
iano de fundo de exploração f-inanceira eram
deficiências da lgreja. nr('ntc em cidadezinhas onde se tornara comum a nomeação de
Os modemos autores protestantes tendem a ser grandes críti- l,rcgarlorcs especiais, cujo dever erafazer scrmões periódicos para
cos do papado do inicio do seculo XVI por seu baixo tom moral' ,lrzcr ris pcssoas em que elas deviarn acreditar uma responsabi-
Os papà. aaquele período - em espccial o notório Rodrigo Bór- lrtLulc que muitos párocos não desejavam ou não eram capazes de
gia,'cujo reinado como Alexandre VI. de 1492-1503' foi o menos ,rsstrnlir. Ainda assirn, parece que o estado da Igreja ern geral, em-
ãain"unt. de todos, tomando o llome dos Bórgia um sinônimo de lxrlr rlcplorável aos olhos modernos, não era uma grande preocu-
assassino, pennissividade sexual e quase todos cls vícios conheci- l,rr(ilo para o cidadão mediano da Alcmanha dos primeiros anos do
dos eram em geral políticos cínicos, mais interessados em sa- .,'r'rrkr XV[. Portanto, não se podc dizcr que essa fosse uma causa
-
tisfazer suas exúntriôidades pessoais e aumentar a fortuna de rrrrpoftante ou direta da Reforma. No máximo, pode-se argumentar
que a situação enfraqueceu a Igreja e tornou mais dificil sua defesa llolanda, ele desenvolveu uma rede de correspondentes em mui-
quando se encontrava sob sério ataque. tos países, através dos quais as últimas descoberlas intelectuais
A pesquisa das causas de longo prazo claramente identifi- circulavam amplamente e as questões do dia eram discutidas. Seu
cáveis no caso da Reforma é um tanto frustrante. Pode-se encon- lconselhamento era procurado por muitas das principais figuras
trar no máximo curtas situações e tendências que tornaram pro- políticas da época. Suas publicações eram escritas em latim, a lín-
vável que quaisquer ataques à Igreja seriam bem recebidos em gua dos letrados, e eram também encontradas em todos os centros
muitos lugares, especialmente na Alemanha. tlc aprendizado de toda a Europa ocidental. A reputaçâo de Desi-
tlcrius Erasmus como pensador e pesquisador era inigualável. Sua
especialidade era o estudo do Novo Testamento e nisso ele mos-
Causas de curto prazo (rava a abordagem típica do humanista. Não estava preparado pa-
nr confiar no texto geralmente aceito a Vulgata, que era uma
Infelizmente, mesmo quando se investigam as possíveis cau- lradução dos textos originais para o latim , mas insistia ern es-
sas de curto prazo, a situação não se torna muito mais clara. As ex- Iuclar os mais antigos manuscritos conhecidos, que eram em gre-
plicações tradiçionais das causas de curto prazo da Reforma ten- go. Chamava atenção para o fato de alguns dos ensinameutos da
dem a começar pelo exame dos humanistas. Eram pesquisadores lgrcja se basearem em textos que na verdade eram traduções equi-
especiaimente interessados no estudo dos textos da Grécia e Roma vocadas feitas por São Jerônimo, o autor da Vulgata. Uma cle suas
antigas, assim como no estudo da Bíblia, usando o texto mais pró- p,r'andes contribuições foi publicar, em 1516, uma versão muito
ximo do original possível. Seu objetivo era descobrir o significado prr:cisa do Novo Testamento em grego, que outros letrados pude-
que o autor pretendera dar inicialmente, em vez de aceitar as inter- rrrrn utilizar no preparo de edições vernaculares da tsíblia (edições
pretações feitas na Idade Média, baseadas em textos incompletos e ('nr suas próprias línguas). Ele mostrou para os pesquisadores que
traduções ruins" O humanismo se tornara çadavez mais importan- Irrrharn instrução e capacidade intelectual para compreender que
te no mundo intelectual dos altamente instruídos durante o século ,,s crlsinamentos e as práticas da Igreja estavam infestados de er-
XV, quando o Renascimento se disseminara para o norte, a partir r, e incoerências. Sentia fortemente que a Igreja deveria estimu-
's
de onde havia surgido, na ltália. No fundo, era uma crença de que l:rl rs pessoas a viver como Cristo, ern yez de ensinar-lhes a bus-
a vida neste mundo não precisava mais ser vista como uma penali- , rrl u salvação com atitudes vazias. Nesse ponto ele fazia eco às
dade a ser cumprida por pecadores antes que suas almas obtives- rtli'ias de um grande mas muito desorganizado bàndo de reforma-
sem a entrada para o céu. Emvez de aceitar docilmente os ensina- ,lorcs que estivera buscando por toda a Europa uma regeneração
mentos e as explicações já estabelecidas, os humanistas queriam as ,'';piritual da lgreja por pelo menos um século.
provas. Essa abordagem não era em geral muito bem recebida na Dadas suas idéias sobre como deveriam agir os cristãos,
Igreja, onde o normal era a obediência sem questionamentos. En- rr;r,r ó de surpreender que Erasmo lançasse ataques ao quc via co-
tretanto, nem todos os homens proeminentes da Igreja eram hostis rrro incredulidade de muitos representantes do alto clero. Sua sá-
a ela, porque se podia dizer que, examinando novamente as evi- rttr liktgio da loucura, em que ridicularizava o típico eclesiásti-
dências, era possível chegar a uma compreensão mais clara de (,) l)urecendo elogiá-lo por Suas faltas, tornou-se o equivalente a
Deus e <le sua vontade. Assim, os humanistas puderam continuar tl ltt:,st-,seller. Na época em que Lutero ficou famoso, havia n-ri-
suas pesquisas setrr ser molestados, desde que nada fizessem para llr;rrcs de seguidores e admiradores de Erasmo em toda a Europa,
contestar a estrutura de poder existente na Igreja. rrrrrilos deles em altos postos.
No início do século XVI, o intelectual humanista de maior Os historiadores tendem a ver a existência de tanto apoio à
destaque era Desiderius Erasmus (1466?-1536). De sua casa, na rr li'lr dâ reforma nos anos anteriores a l5l7 como uma das prin-
22
23

cipais causas da Reforma. Na verclade, contemporâneos chega- r r0lentos. mas até ele permitiu que seu aborrecimento transpare_
ram a dizer que "Erasmo pôs o ovo e Lutero o chocou". Em todo t cSSe, cofl1o nesta carla para Lutero:
caso, a ligação entre Erasmo e seus seguidores e a Reforrna não e
assim tão evidente. Erasmo e muitos dos outros letrados huma- O mundo todo conhece a sua natureza, segundo a qual
vo_
cê jamais guiou a sua pena contra alguéír mais arnarga_
nistas se recusaram a unir-se a Lutero, preferindo ficar com a
mente e, o que é mais odioso, com malícia maior, do que
Igreja e lutar por sua mudança interior. Negavam que fossem res- contra mim [...] Corno podem suas ignóbeis acusações'de
ponsáveis em qualquer sentido pelo que pensavam ser os exces- gue sou um ateu ajudar a discussão? [...] Deseje-me qual_
sos de Lutero. A replica de Erasmo "Eu botei um ovo de gali- quer desgraça que queira, exceto o seu temperamenio,
-
nha, mas o que Lutero chocon foi um pássaro muito diferente" não ser que o Senhor o mude para você.
a

caraçteriza muito bem sua atitude. Em 1520, escreveu ao Legado


-
( )s polltos de vista de Erasmo eram compartilhados
Papal, dizendo o seguinte: por rnuitos
lrrrnranistas. Alguns deles, como Sir Thomas More
da Ir.rglaterra.
A corrupção da Corte Romana talvez necessite reforma am- \'sl;tvilnl ate preparados para morer, se tivessem de renunoiar
a
pla e imediata, mas eu e meus pares náo fomos convidados 'rrr .bcdiôncia à Igreja. Desse modo, e dificil sustentar * idéia cle
a nos encarregarmos de um trabalho desse tipo. Eu preferi- (r,t' u Relomra tenha ocorrido diretamente como
resultado das
ria que as coisas fossem deixadas como estão, em vez de ,rti.itladeq dos humanistas. No entanto, pode_se demor:ritr.ar que
ver uma revoluçáo que ninguém sabe aonde levará. Outros ''' rr lr.ballro ajudou a criar um crirna interectual
podem ser mártires. se gostarem. Nâo aspiro a tal honra. em que os ensi-
,,rr)e,los de Lutero eram bem aceitos. poclemos dizer que. ,ã.
Algumas pessoas me detestam por ser luterano, outras por l,,rsc'pçlo trabalho de Erasmo e seus colegas humanistas. prova_
náo ser luterano. Podeis assegurar-vos de que Erasmus foi r r,lrrrcutc a Refbrma não teria ocorrido.
e sempre será um Íiel súdito da Sé Romana.
Alguns historiadores não quiseram responder à pergunta
r'' rrl: "Por que a Refurra aconteceu'J". Ficaram mais interessa-
Essa seria sua posição até o fim da vida. l)ois anos depois, em
r l.s c.l te.tar descobrir
por que ela havia aconteciclo *aquele mo-
uma carta a um de seus muitos corespondentes, ele esclareceu rr( nlo c onde, em vez de ter ocorrido em outro lugar numa
mais essa postura: outra
lr,rr rr. [)á-se atenção a seus qucstionamL.ntos
porque houve con_
r' :'r.çt-lcs anteriores à autoridade estaberecida
Cada lado me empurra e cada um me censura. Meu silêncio dâ lgreja. Estas
l()ri[ll paralelas às ações de Luter«r de tnuitas maneiras" mas
contra Lutero é interpretado como um consentimento, ao ne_
passo que os luteranos me acusam de haver desertado o rrl*rlil resultara na criação pennanente de igrejas rivais. os dois
Evangelho por medo [..] Não posso ser diferente do que r, l.r'rrrildores normalmente consideraclos precursores
de Lutero
sou, e só posso execrar a dissensão. Só posso gostar da ,,r..f1;l1n Wycliffe (1320?_13g4) e John Huss (136g_1415).
paz e da concórdia. Vejo o quanto é mais fácil começar do \\ rt lill'c na I,glaterra e Huss na Boêrnia (parte da ex-Checosro-
que acalmar um tumulto. .rr;rr'lr) levantaram a voz em oposição aos
abusos na estmtura e
,,rr,:rrrização da lgre.ja e contra seus
ensinamentos, que parecianr
Lutero achava esse ponto de vista totalmente inaceitável e não
' ( .,1I'il as intenções de Deus reveladas na Bíblia. luteio faria a
rr( :lnlt coisa. WyclifÍ'e e Huss atraíram muitos partidários,
demorou muito para infomar sua opinião a Erasmo, em lingua- pre_
gem bastante pesada. Os dois homens rapidamente perderam o r,.rr;rrl.s até para moÍrer em def-esa de sua nova fe. corl Luiero
respeito um pelo outro e, da parte de Lutero, a admiração trans- r, r,ntcccLt o mesmo. Entrctanto, os seguidores
<Ie Wyclilfe, os
formou-se em ódio. Os sentimentos de Erasmo não eram tão 1,, I tls. jamais conseguiram estabelecer uma i dentidaáe própria,
|;r r

fuEEff,
embora tenham se tornado uma corrente identificável dentro da
Igreja da Inglaterra por muitas gerações. Os seguidores de Huss,
os hussitas, tivcram um pouco mais de sorte, especialmente de-
pois de sua prisão c execução como herege, embora portasse um
salvo-corrduto do imperador. Os hussitas conquistaram o domí-
rrio rla lgrc.ja em algumas partes remotas da Boêmia e consegui-
A revolta de Lutero:
rilnr r))anter suas posições, protegendo-se de represálias. Mas não
conscguiram partir para a ofensiva e conquistar novas áreas para
1517 -1521
suas crenças. Os seguidores de Lutero conseguiram.
Por que aconteceu essa diferença? Por que as tenÍativas
de Lutero para reformar a lgreja levaram à ReÍbrma, e as de
Wycliffe e Huss não? Todos eles viveram em épocas em que
eram comuns os abusos da Igreja, e todos atraíram grupos enor-
mcs de seguidores. As diferenças parecem recair nas personali-
dades, nos temperamentos e nas capacidades dos reformadores, e
também no ambiente em que atuavam. Essas questões consti-
tuem a essência dos próximos capítulos. lntrodução
Todos nós estamos acostumados aos noticiários sensacio-
n:rlistas. Editores e jornalistas, especialmente os de jornais popu-
l;rrcs, gostam de exagerar bastante a dramatização das histórias,
;,rgando todo o enfoque na participação do indivíduo o ângulo
rlt' irrteresse humano -
eue assim é desproporcionalmente am-
-: nos aspectos da história
plirrila. Há um enfoque que tem maior
Jrnrbabilidade de atrair o interesse ou despertar as emoções do
público; fatores complicadores são ignorados quando se atraves-
,iiur no caminho da linha principal da história e o resultado final
( nr goral e memorável, mas de modo algum reflete com precisão
,, tlrrc realmente aconteceu. Há sempre uma tendência a adotar
, rsu abordagem para descrever os primórdios da Reforma na
r\ lcrnanha.
Estão presentes todos os ingredientes de uma boa história.
I l;i rrrna personalidade de tamanho maior do que a vida real: Mar-
trrrlro Lutero, um monge que fez os votos de obediência, mas re-
lrt'lou-se contra o Chefe da Igreja. Há muita comrpção nos altos
lxrslos, além de provas incontestáveis de práticas sexuais abu-
'.rr,;rs. Podemos seguir temas populares o fraco vencendo o
l,rrlc. o bom superando o mau, ou a escuridão- da ignorância dis-
26 21

persada pela luz da compreensão mas devemos evitar os ris- ,lrrc opinião é essa e tenha o cuidado de não cltir tra armadilha de
cos de examinar os fatos com a -perspectiva do século XX ou ,.'unii infonnações que sirvam de base a seu ponto tle vista, dci-
através do filtro de nossos preconceitos. vrnilo de lado tudo o que possa contradizê-lo. Naturalmente, não
Esse perigo e tão real para historiadores-pesquisadclrcs e rrc lrata de nenhuma insinuação de que ter algum ponto de vista é
autores de livros escolares quanto para estudantes do último ar.ro :rlso um tanto errado ou repreensível' Deve-se evitar um ponto de
do segundo grau ou universitários. Ninguem aborda a história da r ista jamais admitido explicitan.rente e que, portanto, não pode
Reforma de urn ponto de vista ncutro. Para quem foi criado numa ';i'r questionaclo e modificado à luz rie novas evidências' Ter um
tradição cristã praticante, mesmo não freqüentando muito a igre- porrlo de vista ó inevitável, mcsmo quando sc está compilar.rdo o
ja, há um aspccto com que identificar-se se.ja católico ou pro- r;rrc aparentemente é uma narrativa tactual ol-rjetira, colno a que
testante anics rje estudar quaisquer das evidôncias disponívcis. r.,r, á seguir. Pode não haver tlenhuma afirmaçào analítica mui-
Por n.rais que url estr-rciante ou historiador criacio em contato com r. clara pãra ajuciá-lo a identificar o que e. mas a simples prcfe-
uma religião cristã tente evitar a distorção das idéias preconccbi- r,'rrcia dê um Íato pelo outro a rlerecer inclusào na história de-
o que é e o
das, sempre haverá momentos em que surgirão hipóteses de que l,errde de um julgamer-rto antecipado de valores sobre
urrr ou outro estc.ia fundarnentalmente do lado certo. Tambem ,1rrc não e importante. Por sua vcz, isso estará estreitamente liga-
não é nada flicil para o não-cristão, o agnóstico ou o ateu estudar rlo ro ponto dc vista do autor.
a Refonna a partir de um ponto de vista neutro. Mesmo quando
não existe nenhun.r preconccito inato a supcrar. é muito provável
cxistir uma tendência natural dc posicionar-se ao lado dos rebel- As origens da revolta
des ou das forças da autoridade constituida, da vítima ou do pos-
sível vencedor, do idealista ou do pragmático. Nenhum autor Entre l5l7 e 1521, as ações de Martinho Lutero (1483-
conseguiu escrever qualquer livro sobre a ReÍbrma sem que seu I . t(,) abalaram os alicerces da lgreja católica e ameaçaranl des-
ponto de vista deixasse de ter alguma participaçào. por nrcnor 1,,'tllçar o conceito medieval da cristandade. Depois Cc l52l
que fosse. E bastante comufil que esta apareça com mais evidôn- lrrrr irr uma possibilidade real de que a "lgreja unida" uão sobre-
cia nas análiscs. Podemos, por exemplo, identificar uma "escola \ r\r'ssc. Ilssa situação não era produto de uma serie de atâques
l,r,,gramados para obter esse resultado. Foi apenas uma
católica" e uma "escola protcstante" entre os historiadores que questão
têm estudado Martinho Lutero. ,l, rrrna-coisa-leva-à-outra, até que, de repente' não havia corno
Nem todos os historiadores pertencerx a uma ou outra des- r ,,ll:rr c a única maneira de ir em frente era um cisma (a divisão
sas duas escolas, mas os que não o fazem nâo se tomam automa- ,l.r lsrc'ia etn muitas igrejas). Acabou se tornando tanto uma
ticamente mais confiáveis só porque seus prcconceitos são me- ,;rrr'slr-ro cle fatos controlando pessoas, quanto de pessoas contro-
nos evidentes. Os leitores que estudam Martinho Lutero devcm l,rntlo làtos.
esforçar-se conscientcmente para identificar o ponto de vista de ('omo ocorre com muitos dos grandcs acoutecimeutos da
cada autor com que entram em contato, para então dar os descon- lrr'.tirriu, os motivos iniciais da revolta de Lutero contra Roma
tos necessários e poder decidir até onde aceitar a interpretaçào l,,r;rrrr relativamente banais. Na véspera do Dia de Todos os
apresentada. Nào há nenhuma exceção a essa regra nem mes- '',rrl()s. 31 de otúubro de 1517, ele pregou suas ly'ol'enta e cinco
mo em, relação ao presente volume. /,'\i'\ corltra a venda de indulgências na porta cla catedral dc Wit-
E claro que isso signiÍica que é improvável que o leitor co- r, rrlrr'r'g. a capital do eleitorado da Saxônia' (Na geração ante-
mece um estudo dc Martinho Lutero sem ter ao nlenos uma opi- r,'r . o estado cla Saxônia fora dividido em dois: o eleitorado cla
nião sobre o pcrsonagem ainda que provisória. Procure descobrir ',,rronia. governado por um eleitor, e o ducado da Saxônia, go-
29

vernado por um duque.) As teses estavam em latim e tenciona- "boas ações" inclusive a compra de indulgências. Lutero, ao
vam ser principalmente uma contribuição à discussão acadêmi- L
-
ontrário, acreditava que a salvação era oferecida gratuitamente
ca sobre o tema. O fato de terem sido pregadas na porta da igre- lror Deus a todos. Era necessário apenas ter fé total confiança
ja não era nada incomum. Essa era utrra forma aceita de "tornar -
crrr Deus. As boas ações não eram apenas ineÍtcazes para ganhar
público" um ponto de vista numa época anterior às revistas cien- rr salvação: elas poderiam até mesmo levar à condenação, se con-
tíficas, onde esses documentos seriam publicados atuahnente. O r.rtleradas substituto para afé.
que estava um pouco fora de lugar era o momento da ação. As Desse modo, Lutero não via os desacordos sobre questões
Noventa e cinco teses apaÍeçeraln poucas horas antes do dia do (()nlo a venda de indulgências meramente como assuntos para
ano eln que o eleitor da Saxônia vendia indulgências para quem tliscussão tcológica. Para ele, era uma questão de morte e vida
visitasse sua famosa coleção de relíquias. Era evidente que r'lcrna. Via pessoas Çontinuando a pecar por sentirem-se a salvo
Lutero pretendia que sua argumentaçào recebesse uma grande ,Lr condenação depois de comprar indulgências que prometiam
publicidade. pcrdão para todos os pecados cometidos durante a vida passada
Na época, Lutero era professor na Universidade de Witten- ou lirtura. E,stava convencido de que essas pessoas estavam sen-
berg, recentemente fundada. Seu interesse parlicular era a Bíblia, rLr làtalmente mal conduzidas pela Igreja e sua consciência não
sobre a qual dera palestras na universidade desde que fora man- llrc permitia sentar de braços cruzados setn fazer nada.
dado para lá em I 5l l. Como acontecia com muitos acadêmicos O assunto fora levantado pelas atividades de João Tetzel,
em seu tempo, Lutero era um monge e, corno tal, obrigado a ser- rrrrr Íiade dominicano, que vendia indulgências nas redondezas
vir onde seus superiores o enviâssem: não era, absolutamente, ,lr' Wittenberg. Ele não tinha permissão para entrar nos territórios
um intelectual árido ou insípido corno tantos colegas. Era movi- rhr cleil6r-, por receio de que fosse competir com as indulgências
do pclr uma notável força interior, que não o deixava em paz en- r crrrlidas em Wittenberg. Era um temor bastante realista, porque
quanto estivesse em dúvida sobre a nalnÍeza de Deus e seu rela- I r'tzel vendia indulgências mais "poderosas", jamais oferecidas
cionamento com a humanidade. Esse havia sido o elemento rnais , rrr lrrgar nenhum. Não apenas ofereciam perdão para todos os
importante em sua vida desde que se tornara monge com a idade t','t ;rrlt)s do comprador, mas ainda garantiam a quitação da dívida
de 2l anos, cumprindo uma promessa feita a Sant'Ana, sua pa- , , rrrr o purgatório da alma de urn amigo ou parente que já estives-
droeira, por protegê-lo quando atingido por um raio durante uma .( nl()rto. Em seus sermões, que eram pouco mais que exortações
tempestade. r ( ()nlpra, Tetzel pedia que seu público provasse o quanto amava
Embora ainda não compreendesse perfeitamente essas coi- ,, us yrais ou filhos mortos danclo-lhes o mais valios«l presente de
sas, Lutero percorera um longo caminho desde os tempos em t,,rtos. Tinha um estribilho mais ou menos assim:
que, jovem monge, temia Deus como uma personalidade vingati-
,l moedinha no cofre tilintoLt,
va que punia a humanidade eternamente por todos os pecados co-
tht purgatório a alma saltou!
rnetidos na vida terestre. .Tá então estava convencido de que os
ensinamentos da lgreja sobre essas questões estavam basicamen- I )r'lcnas de milhares de pessoas. inclusive muitas de Wittenberg,
te incorretos. A visão ortodoxa era de que a salvação devia ser l.r.,riun peregrinações especiais até onde ele estivesse para inves-
obtida estando-se "li-zre de pecados" na hora da morte, o que po- rrr totLrs as suas economias enr indulgências. Com esses fatos em
deria ser garantido eliminando-se aos olhos dc Deus todos os pe- rrr,'rrlc, L.utero escreveu suas Noventa e cinco teses.
cados cometidos durante a vida. Era uma espócie de excrcício de l,utero esperava que os argumentos contidos nessas teses
contabilidade: deviam-se adquirir "méritos" suficientes para , rrrr\cncess€tll o arcebispo da Mogúncia sob cuja autoridade
compensar os pecados. O mérito podia ser obtido através das l, lzt'l operava . de que a venda de indulgências deveria ser
3l

suspensa. Assim, enviou-lhe um exemplar das Noventa e cinco Deveria-se ensinar aos cristãos que, a náo ser que tenham
teses, com uma carta que servia de capa em que explicava por posses além de suas necessidades, seu dever é guardar o
necessário para seu próprio lar e de modo algum gastá-lo
que estava tão preocupado.
na compra de perdões. Deveria-se ensinar aos cristáos que
a compra de perdões é voluntária, não obrigatória.
Não me queixo tanto dos altos brados do pregador de in- Deveria-se ensinar aos cristãos que, ao conceder perdões,
dulgências, que afinal náo escutei, mas lamento o falso sig- o papa tem maior necessidade e maior desejo de preces de-
nificado que a elas atribui o povo simples, pobres almas votas para si mesmo do que de dinheiro vivo...
que acreditam que ao comprar as cartas de indulgência ga- Deveria-se ensinar aos cristãosque, se o papa soubesse das
rantiram sua salvaçáo e também que, no momento em que extorsóes dos que pregam as indulgências, ele preÍeriria
o dinheiro tilinta na caixa de coleta, almas são libertas do que a basílica de Sáo Pedro fosse reduzida a cinzas em vez
purgatório e que todos os pecados seráo perdoados com de erigida com a pele, a carne e os ossos de suas ovelhas.
uma dessas cartas... E, por fim. que através dessas indul-
gências o homem fica livre de todos os castigos! Oh, meu
Deus! E assim que essas almas que foram entregues à vos-
sa guarda, caro pai, estão sendo conduzidas pelas trilhas da As tentativas de silenciar Lutero
morte e por elas tereis de prestar contas.
Alberto imediatamente pediu apoio ao papa, exigindo que
O arcebispo, Alberto de Brandenburgo, flcou perturbado Lutero fosse calado. A reação do papa Leão X (1513-21) foi rá-
com essa ameaça a seus planos. Ele contava com o dinheiro lc- pida, dadas as grandes distâncias que a Çorrespondência tinha de
vantado na venda de indulgências para pagar as dívidas que havia percorrer. Decidiu-se que Lutero seria tratado pela estrutura da
contraído ao garantir o comportamento do papa na aquisição do ordem dos monges agostinianos a que pertenõiu. Em abril de
arcebispado, embora popularmente se acreditasse que o dinheiro I 5 1 8 ele assistiu à convenção trienal da ordem e tentou justifi-
coletado seria usado na reconstrução da Catedral de São Pedro, car suas ações. Sua postura foi apoiada de modo geral, para
em Roma. Alberto estava ainda em seus vinte e poucos anos e grande embaraço do papa Leão, que decidiu então tomar o caso
não tinha nenhuma instrução teológica, mas já havia comprado cilr suas próprias mãos. Lutero foi chamado a Roma. Recusou-
um bispado e dois arcebispados, cada um com imensos territórios se. Para persuadi-lo a voltar à razáo, foi enviado à Alemanha o
sobre os quais era o único governante. Com isso, se tornara um cardeal Caetano, representante do papa. O cardeal intimou Lu-
clos príncipes mais poclerosos na Alemanha. tero a ir a seu encontro em outubro de 1518 em Augsburgo e por
Alberto se sentia muito ameaçado por Lutero, cujas Noven- vários dias tentou convencê-lo de seus eÍros. O que havia come-
ta e cinco teses foram rapidamente traduzidas para o alemão, im- çado como um exercício brando da razão rapidamente deterio-
pressas e amplamente distribuídas. Elas calaram fundo em muita rou em uma tentativa de coagir Lutero por ameaças. Caetano
gente. Os que entendiam de teologia reconheciam a força do ata- deixou muito claro que a paciência do papa estava quase no fim
que de Lutero sobre a própria na1.r)reza das indulgências, ao pas- e que logo viriam terríveis castigos se não se retratasse do que
so que a maioria da população, ignorante, mas honesta, foi sendo havia escrito.
novamente desperlada em sua insatisfação sobre a forma como Lutero não mudou de idéia. Sua posição estava claramente
os pobres da Alemanha eram constantemente pressionados, lo- estabelecida desde o início; sua consciência não permitiria que a
grados ou seduzidos a dar dinheiro à Igreja, boa parte do qr:al ia alterasse. Ele argumentava que tinha identificado erros nos ensi-
para um estrangeiro: o papa, em Roma. O apelo de Lutero aos namentos da Igreja; só abandonaria seu ponto de vista se alguérn
sentimentos do povo alernão era muito claro: the mostrasse na Bíblia provas de que estava enganado ou se al-
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guém o convencesse de seus erros por uma"Íazão muito boa". A a verdade sobre a vontade divina quanto o líder da Igreja. O que
posição da Igreja era igualmente clara: sustentava que só o papa havia sido uma insinuação de que o papa excedia seus poderes'
poderia interpretar a Bíblia e tomar decisões sobre os ensinamen- agora era uma reclamação de que ele não tinha absolutamente ne-
tos da lgreja. O dever de todos os católicos era obedecer-lhe, co- nl'rum poder. Onde as pessoas ligadas a Lutero pensaram procu-
mo representante de Deus na Terra. Portanto, a Igreja não tinha rar a refclrma dos abusos, agora estava claro para todos menos
nenhuma necessidade de convencer ninguém de coisa alguma,
-
para os que eram irrealistamente otimistas: não restava nenhuma
devia apenas insistir na boa disciplina. Como se vê, os dois lados possibilidade de que os reformadores chegassem a alguma espé-
discutiam sobre idéias que se entrecÍuzavam sem nenhum ponto cie de acordo com as autoridades estabelecidas da lgreja. No ini-
de contato. cio da discussão, Eck tentara rotular Lutero como hussita, num
Depois da missão fracassada de Caetano, as autoridades pa- esforço para desacreditá-lo aos olhos dos príncipes alemães. Ao
pais se convenceram de que no mínimo sua estratégia estava mal linal, Lutero.orgulhosamente proclamava çoncordar em todos os
orientada. Não ofereciam nenhuma defesa às acusações de Lutero pontos mais importantes com seu predecessor checo, que fora de-
e estavam deixando aberto a ele o caminho para conquistar cada clarado herege e queimado por suas crenças.
vez mais partidários na Alemanha. A credibilidade papal estava Logo depois da Discussão de Leipzig, o papa Leão chegou
tão baixa, que o tradicional apelo à obediência sem questiona- à conclusão de que Lutero se revelara tão extremado, que agora
mento estava sendo rejeitado. Deçidiu-se então enfrentar as con- seria mais seguro ir contra ele çom todas as forças da autoridade
testações de Lutero em debate aberto; foi programada uma dis- da Igreja. Isso seria feito enviando-lhe um documento legal, uma
cussão formal do tipo acadêmico reconhecido, a se realizar em bula, informando sua expulsão da Igreja e avisando que todos os
Leipzig no mês de julho de I 5 19. O doutor Jobann Eck foi esco- cristãos obedientes deveriam recusar-se a quaisquer tratos com
lhido para sustentar a posição da Igreja ele era o debatedor ele. Para garantir que tudo fosse bem divulgado, a bula da exco-
-
mais hábil de toda a Alemanha. Por dezoito dias, as questões fo- munhão deveria ser lida no púlpito de todas as igrejas. A bula da
ram discutidas diante de um corpo de acadêmicos "neutros" e com excomunhão como era hábito, conhecida por suas primeiras
a presença de dignitários locais. Sem dúvida, Eck venceu a com-
- domine foi emitida em junho de I 520. Lute-
palavras, Exsurge
petição mas apenas em termos técnicos. Ele conquistou muitos ro mostrou seu desprezo pelo - papa queimando-a publicamente. O
pontos na- discussão, ao "pegar" Lutero e seus partidários de Wit- rompimento agora era total.
tenberg, fazendo-os apresentar alguns argumentos indefensáveis.
Contudo, não convenceu a ninguém da validade de sua tese, pois
era impossível para a lógica fria superar o que agora se transfor- O ponto de vista de Lutero
mara em crenças ardorosamente sustentadas. Embora Eck se
comportasse como indiscutível vencedor, observadores sem pre- Como um desacordo aparentemente pequeno se desenvol-
conceitos perceberam que o resultado fora muito diferente. vera até chegar a essas proporções? Boa parte da resposta está na
Lutero viera a Leipzig çom a reputação de rebelde. Partiu compreensão das motivações de Lutero. Ele não estava interessa-
sob a suspeita de ser um revolucionário. Eck foi o responsável do em obter poder ou riquezas, nem mesmo em estabelecer uma
por essa mudança, já que havia forçado Lutero a tomar cada um reputação pública para si próprio como teólogo notável. Não era
de seus argumentos para chegar à sua çonclusão lógica. O que fo- absolutamente um político; portanto, não poderia ser influencia-
ra um desafio ao papa por questões menores tornou-se então uma do por argumentos que se concentrassem nas conseqüências de
contenda generalizada de que o crente que estudasse a Bíblia suas ações no que outros pudessem pensar, dizer ou fazer ço-
com a orientação de Deus tinha tanta probabilidade de descobrir - da posição que tomava. Ele também realmente não
mo resultado
se importava se fosse caso de vida ou morte. Era alheio a fatores vrls" como "somente pela fé sereis salvos". Desse modo, a frase
que influenciam as ações da maioria das pessoas, como o desejo liúina sola.fide (somente pela fé) tomou-se aidéía central do pen-
de ser feliz, rico, famoso, amado, aprovado, bem-sucedido ou, sumento de Lutero. Agora, pela primeira vez em sua vidai ele ti-
simplesmente. de sobreviver. rrha a certeza de que estava salvo.
Seus interesses eram egoístas mas, na verdade, voltados Tendo feito essa descoberta, terminou seu período de afli-
para o outro mundo. Sua preocupação mais importante era com a ção pessoal. Mas seria preciso elaborar as implicações da desco-
própria salvação. Assim como muitas pessoas de sua época e de berta. Esse foi o contexto em que a questão das indulgências se
epocas anteriores, ele reconhecia que a vida terrena era breve e tornou tão importante, porque sua eficácia, segundo dizia João
árdua. A doença e a mofte eram lugar-comum e constantemente 'Í'etzel, dependia da pressuposição de que a salvação seria obtida
serviam para lembrar anahxeza transitória do corpo e das coisas através do acúmulo de mérito suficiente aos olhos de Deus para
materiais. O que mais importava eraaalma, que tinha o potencial compensar a conta dos pecados acumulados. Umavez aceito que
para a vida eterna, em relação à qual os poucos anos passados na "boas ações" eram sinal de estar salvo em vez de ser a causa da
Terra eram insignificantes. Contudo, a vida futura da alma (a sal- salvação, era impossível atribuir qualquer valor às indulgências
vação) só estaria garantida se, enquanto estivesse na Terra, seu das penalidades terrenas im-
"dono" agisse da maneira que Deus havia determinado. Nos pri- - a não ser como redução
postas pela lgreja. Era esse caso que Lutero tomava em suas try'o-
meiros anos, aceitara a visão ortodoxa de que os ensinamentos ventd. e cinco teses.
da Igreja mostravam o que era necessário para isso. A paúir do Assim, o que pareceria discordância sobre uma prática me-
momento em que se tomou monge em 1505, aos 2l anos de ida- nor e relativamente recente, na verdade era conseqüência de dife-
de, dedicou-se inteiramente ao que entendera como instruções renças em questões de fundamental importância. Não havia ne-
de Deus. Entretanto, quanto mais examinava a questão, mais se nhuma possibilidade de que Lutero, dado seu empenho pessoal
convencia de que era uma tarefa impossível; ficou profundamen- em relação à idéia de sola fide, estivesse preparado para argu-
te deprimido com sua própria imperfeição e começou a odiar o mentar, e a Igreja era uma complexa estrutura de direitos adquiri-
Deus que parecia estar fazendo um jogo terrível com a humani- dos, que não possuía mecanismos para introduzir tão importante
dade criando regras que condenavam osjogadores ao fracasso mudança em suas crenças, ainda que existisse vontade política de
- condenando-os a uma eternidade no inferno. Contudo,
e depois fazê-lo. A colisão era inevitável.
em seu desespero, não pensou em contestar o que the haviam O que transforÍnou o conflito entre o monge e o papado em
ensinado. algo muito maior do que uma simples discussão teológica foi a
O afloramento de suas idéias aconteceu através de estudos forma como Lutero refletiu sobre as conseqüências de suas idéias
cada yez mais aprofundados da Bíblia. Ele convenceu-se de que nos três anos que se passaram entre as Noventa e cinco teses e a
ali, mais do que nos ensinamentos da lgreja, estava a verdadeira bula Exsurge domine. Com isso, tornara-se completamente evan-
revelação dos desígnios de Deus. Enquanto lutava para desven- gélico o que significava que a única autoridade que aceitaria
dar seu significado, num instante de inspiração deu-se conta de -
como crença ou para aprírlica religiosa era a Bíblia. E, assim, foi
que a salvação estava assegurada por aquilo em que se acredita- levado a rejeitar aidéia de que o papa fosse o vice-rei indicado
va, não pelo que se fazia. Já não via mais Deus como o terrível por Deus na Ter:ra, encarregado das chaves do céu e do inferno,
juiz que pesava cada vida na balança e rejeitava as que estives- pois não se poderia encontrar nenhuma justificativa para isso nas
sem em falta, mas antes como o Deus de amor, que oferecia a sal- escrituras. Aos olhos de Lutero, toda a estrutura de autoridade da
vação gratuitamente a todos os que acreditassem n'Ele e em seu Igreja era inválida por estar inteiramente baseada nessa premissa.
filho, Jesus Cristo. Interpretou a força da frase "pela fe sereis sal- Logicamente, nem o papa nem ninguém cuja autoridade emanas-
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se dele tinha qualquer direito de julgar as idéias de Lutero. Por


bcrto de Brandenburgo. A rivalidade entre as famílias de Alber-
1o e Frederico pela influência na Alemanha era intensa, de modo
essa razão, quando abu\a Exsurge domine foi queimada em pú-
r1r-re seria muito natural que Frederico defendesse um súdito que
blico, os livros da Lei Canônica, que definiam os poderes e príúi-
cas legais da Igreja, também foram entregues às chamas. Lutero ltâcava o inimigo.
deixava muito clara sua rejeição a qualquer autoridade que não Essa motivação foi rapidamente dissimulada em sentimen-
pudesse serjustificada em sua interpretação da Bíblia. Ios de nacionalismo alemão. Por muitos anos propagaram-se as
rlueixas na Alemanha de que o papado conseguiu extrair imensas
quantidades de dinheiro do país, de forma como teria sido impos-
sivel na Espanha, França ou lnglaterra. Lutero soube explorar es-
Frederico, o Sábio sa mina de sentimento antipapal. Suas críticas ao papa eram des-
tlc o início expressas em termos naçionalistas; uma grande parte'
Lutero não foi o primeiro teólogo na Europa ocidental a as-
do apoio popular que tão rapidamente obteve foi conseqüência de
sumir essa postura revolucionária, mas foi o primeiro capaz de
lraver recorrido a um ódio comum ao ganancioso estrangeiro.
sustentá-la e, ao mesmo tempo, de evitar ser condenado à morte
Frederico também tinha esse sentimento. Ao ser chamado a Ro-
por heresia. Antes dele outros tiveram de abjurar ou foram mor-
ma pelo papa Leão, Lutero pôde recusar porque tinha Frederico
tos. Por que isso não asonteceu com Lutero?
firme em suas costas, dizendo que qualquer proÇesso contra o
As razões eram inteiramente políticas. Lutero viveu no es-
Ínonge deveria ser ouvido em solo alemão. Mesmo depois que
tado alemão da Saxônia, onde a influência direta do papa era mí-
saiu a bula Exsurge domine, Frederico preferiu defender-se da
nima. Portanto, trabalhava sob as ordens do eleitor, Frederico, o
acusação de desobediência alegando que ela não teria nenhum
Sábio. Frederico demonstrava simpatia por Lutero desde o prin-
cfeito até que Lutero tivesse oportunidade de responder pessoal-
cípio e Leão X, que desejava manter o apoio do eleitor nas com-
mente a seus acusadores e na Alemanha.
plexas manobras politicas que fazía na Alemanha, não desejava - razões para o apoio de Frederico,
correr o risco de afastá-lo. Preferiu esperar até que Lutero tives-
Contudo, havia mais
além dessas questões 'políticas". Embora não fosse um converti-
se tido todas as oportunidades de se retratar (renegar as afirma-
do de primeira hora às novas crenças religiosas, estava suficien-
ções heréticas). Se a persuasão falhasse, ele poderia chamar Fre-
temente interessado e em contato com o que Lutero ensinava pa-
derico aos deveres como príncipe çristão. Contudo, Frederico
ra compreender que algo de importante ocorria em sua pequena
acabou não sendo tão fácil de dobrar quanto Leão havia espera-
capital. Ele não estava disposto a deter esses acontecimentos ou a
do. Não estava preparado para ser manipulado por ele. Os histo-
permitir que outros o fizessem, até que se resolvesse com certeza
riadores têm a visão ortodoxa de que, sem a proteção de Frederi-
se as afirmações de Lutero estavam certas ou erradas. Isso signi-
co, Lutero teria sido executado como herege logo no começo de
ficava acercar-se da questão de mente aberta e não como obvia-
sua carreira de reformaclor. Ainda não está muito claro por que o
mente faziam as autoridades da Igreja, que partiam do pressupos-
eleitor agiu assim, arriscando-se à ira de todos os que tinham di-
reito e poder para ir contra ele mesmo. Não que houvesse caído to de que Lutero era culpado de heresia para então proÇurar
sob a influência pessoal de Lutero isso não. Ele teve o cuida- evidências que justificassem a pressuposição. Ao tratar do pro-
do de se manter distante para sempre- poder dizer que não chega- blema sobre o que fazer com Lutero, Frederico parece ter come-
ra a encontrar o homem que defendia. Portanto, era impossível çado por defender o que considerava interesses próprios. Num
que seus oponentes se queixassem de que ele havia sido enfeiti- curto espaço de tempo, parecia determinado a ver que as ideias
de Lutero estavam corretas, a perceber que eram aceitas de modo
çado. A primeira vista, sua motivação parece ter sido apenas po-
lítica: os ataques de Lutero aTetzel eram de fato ataques a Al- geral e que muito provavelmente estivessem certas como for-
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ça primordial motivadora para que decidisse garantir sua segu- havia nenhuma necessidade de manter as promessas feitas a um
rança, apesar de toda a tempestade que se preparava contra ele. hcrege. Foi também lembrado que João Huss fora preso e execu-
lado embora estivesse sob salvo-conduto. No entanto, a probabi-
lidade de ser morto não era nenhuma grande preocupação para
A Dieta de Worms I-utero. Ele se considerava nas mãos de Deus e estava certo de
que, se Ele o quisesse vivo, poderia voltar a salvo de Worms.
Frederico não era um príncipe totalmente soberano. Devia LJma das coisas de que tinha çerÍeza era que Deus desejava que
obediência ao Sacro Império Romano, como todos os governan- pregasse o verdadeiro evangelho o mais amplamente possível.
tes de estado na Alemanha. As questões de disputas não-resolvi- Assim, viajou para Worms.
das eram reportadas ao imperador, que presidia uma Dieta (mais Mesmo agora os representantes do papa esperavam que a
ou menos equivalente a um Parlamento) de que participavam os participação de Lutero se limitasse a duas perguntas: se os livros
príncipes e os representates das cidades imperiais. Frederico e o c panfletos que haviam aparecido com seu nome eram realmente
papa Leão consideravam o imperador a pessoa mais adequada cle sua autoria e se ele estava disposto a abandonar as idéias con-
para ser ouvida no processo contra Lutero, pois era evidente que tidas em seus textos. Mas Lutero tinha uma tática melhor. Solici-
a opinião pública na Alemanha não apoiaria nenhum veredito tou que the permitissem pensar nas questões durante a noite. A
vindo de fora. Leão, especialmente, contava com o apoio moral e permissão foi concedida. Na manhã seguinte, respondeu "sim" à
material do imperador. Suas expectativas baseavam-se no conhe- primeira pergunta e começou a explicar por que a segunda não
cimento de que o imperador recém-eleito, Carlos V, embora fos- poderia ser adequadamente respondida ern uma palavra. Seria
se ainda muito jovem e inexperiente, era um católico fervoroso preciso diferenciar cada uma de suas diversas afirmações. Ao fa-
que levava muito a sério sua responsabilidade de proteger os in- zer essa diferenciação, apresentou um resumo claro de sua posi-
teresses da Igreja romana.
ção. Alguns de seus textos expunham doutrinas que até o papa
Carlos V se tornara imperador em 1519, ainda adolescente.
aprovava. Seria pecaminoso repudiá-las. Lutero dizia ter publica-
iá era rei da Espanha e governante das províncias Burgúndias, Co textos...
incluindo a Holanda. Era potencialmente o mais poderoso mo-
narca europeu desde Carlos Magno, setecentos anos antes. Che-
[...] de outra espécie, que falavarn contra o papado e sobre
gou na Alemanha a tempo para a Dieta que cleveria ocorrer na ci- os Íeiters dos papistas. Esses livros os ataeavam como ho-
dade de Worms, em abril de 152tr. As autoridades da Igreja mens que, tani.o poí si..ias doutÍinas como peio vergotrhoso
esperavam que ele garantisse a condenação de Lutero sem conce- exemplo de suas vidas, haviam debilitado o nrundo cristáo
dei'-ltre uma audiência. O argumento era que as pi:blicações de com os males do espírito e da carne. Esse fato ninguém
I-utero eram agora tão numerosas e tão claramente heréticas que pode negar ou esconcjer. A experiência de todos e as quei-
impossibilitavaÍn ciuaiquer defesa. Mas Cal"los estava convencic{o xas de todo o mundo são testemunhas de que, através dos
cle qi"re scria prr-adente pern:itir que Lutero coffill&recessç, para decretos do papa e das muito humanas doutrinas dos ho-
mens, a consciência dos que tinham fé havia sido desgra-
qlle não i.louvesse queixa 'rie tr,:r recebi<1o uÍn tratairfiento desoncs-
to. Ele foi erião çcnvocaclo a çünlparecer em Worms e reçel,eu a çadamente iludida, molestada e destruÍda. Além do maÍs, a
propriedade e os bens, especialmente nestâ industriosa
promessa Ce u--;.n çaivo-4'6-rrl1ir.it^ ,{'JÊ c protetser"ia da prisão, qLral- terra da Alemanha. foram devastados por uma inacreditá-
quer que fc,ss* c lesultado de sua aurliência. vel tirania e continuam sendo incessantemente devasta-
Os rnais pró,,"irnos econsieiharam-no a não comparecer. Sa- dos de uma forma muitíssimo chocante [...] Retirar o que
bia-se rnuito bem que, :;r:gill.rrio cs ensjntrillentos da trgre.ja, não disse nesses textos seria o mesmo que dar força à tirania,
4t

e não apenas abrir janelas mas até mesmo portas para es- tos dos homens mais brilhantes. Não se vos afigureis mais
sa imensa incredulidade [...] sábio do que todos os outros. Náo lanceis dúvida sobre a fé
Há uma terceira espécie de livro que escrevi contra certas mais ortodoxa, instituída por Cristo, o perfeito legislador.
pessoas particulares e, como sáo chamadas, ilustres. Sáo
êssas pessoas que se esforçam para manter a tirania de Ro- Naturalmente, eram as implicações políticas da instância de Lute-
ma e eliminar a piedade que ensino. Contra essas, confesso ro que mais importavam na cabeça de muitos de seus opositores.
ter sido mais severo do que convém à minha religião ou
minha profissão. Mas eu náo me coloco como um santo.
Ele despreza a autoridade dos padres da lgreja, uma autori-
Não é a minha vida que defendo, mas os ensinamentos de
dade que a lgreja aceita. Ele elimina totalmente a obediên-
Cristo. Não é correto que eu renegue essas obras, porque
cia e a autoridade e náo escreve nada que náo tenha o eÍei-
exatamente essa negaçáo novamente produziria uma situa-
ção em que a tirania e a impiedade governariam e grassa-
to de promover a sediçáo, a discórdia, a guerra, o
assassinato, o roubo e o incêndio criminoso, e que não aju-
riam entre o povo de Deus de forma mais violenta do que
jamais aconteceu em épocas anteriores. de a desintegrar completamente a fé cristã. Ele prega um ti-
po de vida desregrada. voluntariosa, sem nenhuma espécie
Entretanto, porque sou um homem e náo Deus, não posso
convocar outra proteção para meus livros exceto Nosso Se- de lei, inteiramente embrutecida. Ele próprio é uma pessoa
nhor Jesus Cristo, oferecido em respeito pelos ensinamen- desregrada, voluntariosa, que condena e suprime todas as
tos d'Ele. [...] Assim, peço a graça de Deus para que Vossa leis. lsso foi mostrado quando ele queimou em público os
Mui Serena Majestade, mui ilustres senhores, ou qualquer decretos e a lei canônica, sem medo e sem pudor. Assim
outro, de alta ou baixa condição, que tenha competência, como demonstra tanta consideraçáo pela espada secular
quanto pela excomunhão do papa e suas punições, ele cau-
sirva de testemunha, exponha meus erros, destitua-me pe-
los textos escritos pelos profetas e os evangelistas. Estou sou um mal maior para a lei e a ordem secular.
mais do que pronto, se provada a acusação a mim feita, a
renunciar a quaisquer erros, não importa quais sejam. Se- Dadas as evidências, só poderia haver urn resultado para ojulga-
rei o primeiro a entregar meus livros às chamas. mento de Lutero em Worms: declarado culpado de heresia. A dú-
vida era saber que providência tomaria Carlos com essa desco-
Igualmente claro foi o processo da Igreja, que continuara todo es- berta. Para horror de Frederico e dos outros poucos príncipes que
se tempo e mais se fortalecia, pois Lutero proporcionava cada simpatizavam com a causa de Lutero, o imperador recLrsou-se a
vez mais evidências de seu pensamento herético. pensar numa solução conciliatória. Ele estava decidido a fazer
com que Lutero e todos os que o apoiavam fossem punidos, a
Não estareis desejando que a Sagrada Escritura seja com- menos que imediatamente concordassem em aceitar os ensina-
preendida através de vossa fantasia e vossas idéias? t...1 Te-
mentos e a autoridade da Igreja. O Edito de Worms, que decidia
reis o direito de abrir um questionamento e levar à discus-
sáo matérias sensatamente estabelecidas pela lgreja a força da lei, confirmava que os termos da bula Exsurge domine
católica, cujo uso, direitos e observâncias nossos pais man- deveriam ser implementados; proibia a qualquer cidadão do im-
tinham com fé absoluta, pelas quais não havia punição ou pério fornecer comida ou abrigo a Lutero ou a quem o apoiasse,
tormento que não enfrentassem, pelas quais sofreriam mil sob pena de prisão e perda da propriedade; além do mais, instruía
mortes antes de se desviarem sequer um fio de cabelo? Pe- todos os que tivessem alguma autoridade em seu território a pro-
dis que nos desviemos da via que nossos pais trilharam curar e queimar os textos do herege. O papa obtivera tudo o que
com fé? [...] Suplico-vos, Martinho, náo vos arrogueis, repi-
havia pretendido, menos a detenção de Lutero.
to, a julgar que sois a única pessoa a conhecer as Escrituras,
o único que apreende sozinho o verdadeiro sentido da Sa- A essa altura. Lutero já havia deixado Worms, depois de
grada Escritura... Não Íazei vosso juízo superior ao de tan- ter sido persuadido por alguns partidários poderosos de que não
havia nada a gaúarfieando e muito a perder se algum entusiasta
resolvesse tômar a lei em suas próprias mãos. Sua "fuga" de
Worms foi muito bem planejada, assim como o subseqüente de-
saparecimento. Enquanto ele e a escolta passavÍrm por uma flo- *r
resta a camiúo de Wittenberg, forám apanhados por um gnrpo
de cavaleiros não-identificados que afastaram-se cavalgando Os ensinamentos de Lutero
com Lutero como seu "cativo". Frederico decidira que a situação
polÍtica estava incerta demais para que o "notório herege" perma-
necesse em outro lugar que não algum esconderijo.

Três anos e meio se.passaram entre a primeira contestação


de Lutero às crenças e práticas da lgeja e sua condenação na
Dieta de Worms. Durante esse tempo, ele deixara de ser um des-
conhecido professor universitário saxão e passara a herói nacio-
nal alemão e teólogo de renome internacional, Praticqrpeple tg-
das as pessoas de instruçâo ou posição social na Europa ocidental
já haviam ouvido falar dele: ou era odiado como agitador que
perturbava o stqtus quo e poderia instigar uma'revolução
social (e religiosa) ahavés de seus ataques às autoridades esta-
belecidas, ou era idolatrado como o profeta dos últimos dias que
resolveria o que havia de errado no mundo. Expectativas e temo-
res em relação a ele erarn'igualmente exagerados. Os represen-
tantes do papa na Dieta de Worms Çonvenceram-se dé que toda
a Alemanha cairia sob os encantos de Lutero, a menos que se
tomassem providências drásticas; muitos dos pobres estavam
convencidos de que de al.guma fonna ele daria fim à exploração
que deles faziam- O que aconteceÍapaÍa que se criassem essas
expectativas e esses pontos de vista opostos?
Lutero eslivera imensamente ocupado desde que as Noven-
ta e cinco teses ü levaram à atenção do público. Continuara a es-
tudar minuciosarnente a Bíblia e repensaÍ as implicações de sua
convicção inicial de que a salvação vem somente da íá. Quanto
mais aumentava a ceÍtez.a de haver cornpreendido o real signifi-
cado da Bíblia, não apenas pregava "a verdade" em Wittenberg, Lutero recusava-se a aceitar que os sacramentos fossem se-
mas também escreveu inútmeros opúsculos que eram impressos e lc. Ele sustentava que só poderia considerar como sacramento al-
tinham enoÍrne circulação. Jamais fora impressa tanta coisa pro- p,o ao mesmo tempo unicamente cristão e estabelecido por Jesus.
veniente da pena de um só homem, com uma notável variedade: [)os sete, apenas dois correspondiam a esses critérios: o batismo
sérios trabalhos acadêmicos em latim, justiflrcativas com minu- c a repartição do pão e do vinho (a Eucaristia católica, celebrada
ciosa defesa de sua posição na Alemanha, além de peças essen- durante a missa) eram claramente justificados pelo Novo Testa-
cialmente propagandísticas atacando o papa em termos bastante rnento. Os outros cinco, segundo o que ensinava a lgreja, eram
ofensivos, dirigidas às pessoas mais simples. Dado que a tecnolo- inválidos. O fato de que negasse anatureza sacramental da con-
gia da época significava imprimir separadamente cada exemplar, Íirmação (pela qual as crianças maiores entravam na congrega-
à custa de muito trabalho, a produção das prensas era colossal. ção dos adultos), do matrimônio (casamento) e da extrema-unção
Entre 1517 e 1520 foram impressos cerca de 300 mil exemplares (pela qual os que estavam à morte tinham seus pecados perdoa-
de suas diversas obras. Contudo, a oferta não cobria a demanda, tlos) na prática era desprovido de grande significado, porque ha-
tal o interesse despertado por Lutero. Cada exemplar passava de via poucas implicações com a mudança provocada por esses ri-
mão em mão, era lido ou escutado com avidez por toda a Alema- tos. Bem mais grave era a negação da penitência e da ordenação
nha, especialmente nas aldeias e cidades, onde vivia a maior par- como sacramentos.
te da população alfabetizada. Pouquíssimas pessoas nas áreas ru- O sacramento da penitência era usado pela Igreja paru ga- t'
rais sabiam ler. rantir que as pessoas se comportassem em geral de acordo corll(r,' r
a moral e a obediência às leis. A Igreja dizia que através desse ,ii
sacramento poderia perdoar os pecados em nome de Deus e que, '
recusando o sacramento a alguém, poderia condenar essa pessoa,,. ,
As publicações de 1520
à danação eterna. Lutero contestava vigorosamente essa afirma-
Em 1520, muitas das idéias de Lutero já estavam bem ela- ção. Para ele, o perdão dos pecados era uma questão privada
entre o fiel e Deus, em que o padre não tinha nenhum papel es-
boradas. Nesse ano, ele escreveu vinte e quatro trabalhos para
sencial a desempenhar. Sendo assim, os padres não poderiam
publicação, inclusive os três que se considera conterem os ensi-
exercer seu papel habitual na concessão de perdões, pelo que co-
namentos do início de sua carreira de reformador. Teologicamen-
bravam. Não que Lutero defendesse a abolição da confissão e a
te, o mais importante era Sobre o cativeiro babilônico da lgreja.
conseqüente absolvição (dizendo às pessoas que seus pecados es-
O título associava o domínio do papa sobre a Igreja à história do
tavam perdoados): estava apenas atraindo a atençáo para o fato
Velho Testamento, em que os israelitas foram levados como es- de que era Deus quem perdoava os pecados. O papel do padre era
cravos para a Babilônia. Foi escrito em latim e dirigia-se a um apenas confirmar que isso acontecia.
público acadêmiço. Lutero sustentava que a cristandade fora cap- O sacramento das ordens (ordenação), pelo qual um ho-
turada e escravizada pelo papado com crenças e práticas criadas mem se tornava padre, estava no centro da estrutura da Igreja ca-
pelo homem e não emanadas da palavra de Deus. O catolicismo tólica. Era a justificativa paratratar os padres Çomo um grupo de
girava em tomo dos sete sacramentos (cerimônias religiosas sa- elite, separado e acima do povo. Por serem os únicos que tinham
gradas), que só poderiam ser ministrados por sacerdotes; afirma- contato direto com Deus, deviam ser especialmente valorizados e
va-se que eram canais vitais de comunicação entre Deus e a hu- respeitados. Não poderiam estar sujeitos às exigências legais que
manidade. Dessa maneira, ninguém poderia ser salvo sem os se aplicavam aos outros cidadãos ou súditos. Os direitos e isen-
serviços da Igreja, administrados pelos padres. ções especiais que o sacerdócio conferia eram a causa de grande
47

parte do ódio dos homens à lgreja, que tar.rto prevalecia na Ale- a São Pedro quando lhe foram entregues as chaves, está
manha. Lutero estava convencido de que era justificado: bastante evidente que estas náo foram dadas apenas a São
Pedro, mas a toda a comunidade. [...]
Desse sacramento, a lgreja de Cristo nada sabe: ele foi in- lnventou-se que o papa, os bispos, padres e mongês são
ventado pela lgreja do papa. Além de náo conter nenhuma chamados de classe espiritual; os príncipes, os senhores.
promessa de graça, que não é declarada em parte alguma, artífices e camponesês são a classe temporal. E uma hábil
mais nenhuma palavra é dita sobre ele em todo o Novo mentira, um expediente hipócrita, mas que ninguém se ate-
Testamento. Ora, é ridículo pronunciar como sacramento morize com isso, porque todos os cristãos realmente per-
de Deus o que em parte alguma se pode comprovar ter sido
tencem ao estado espiritual, não há diÍerenças entre eles,
instituído por Deus. [...] Deixe-se todo homem que apren- senão pela ocupaçáo. [...] Somos todos consagrados sacer-
dotes pelo batismo. [...1
deu a ser cristáo reconhecer o que é ser cristão, e ter certe-
za de que somos todos igualmente sacerdotes, que temos
a mesma força na palavra e em qualquer sacramento, em- l.utero não apenas argumentava a favor do "sacerdócio de todos
bora seja ilícito usar esse poder sem o consentimento da os crentes" mas tambem da reversão do relacionamento tradicio-
comunidade. nal entre a lgreja e o Estado. Durante muitos seculos, o papado
cxigira em geral com ôxito que todas as autoridades lei-
A afirmação de que os sacerdotes não eram diferentes das outras sas, de - -
imperadores e reis para baixo, estivessem sob o controle
pessoas, a não ser quando autorizados pela comunidade para rea- gcral da Igreja e dizia que a intervenção dela nas questões secu-
lizar certas funções, era uma repetição da doutrina do "sacerdó- lares se justificava em situações extremas, ao passo que era proi-
cio de todos os crentes" que ele formulara naquele ano. hido aos leigos interferir nas questões espirituais. Ao rejeitar o
Essa doutrina revolucionária sustentava todo o seu tratado conceito de um domínio espiritual separado, Lutero convidava
dirigido À nobreza cristã da nação alemã sobre a reforma do Es- os governantes leigos da Alemanha a assumir o controle das
tado cristão, mais conhecido como Discurso à nobreza alentã. questões religiosas em seus territórios. Ele havia claramente
Esse panfleto foi escrito em âlemão e, como está implicito em abandonado toda esperança de reformar a Igreja a partir de seu
seu nome, dirigia-se aos govemantes leigos da Alemanha. Seu interior. Seria necessário impor a mudança de fora. Essa idéia,
argumento central era que sucessivos papas haviam pervertido a rnais do que qualquer outra apresentada por Lutero, deveria mar-
verdadeira cristandade e, já que o atual se recusava a corrigir os car o final do conceito medieval da cristandade e introduzir a
abusos claramente levados à sua atenção, a responsabilidade re- rnodema era secular.
caía sobre aqueles a quem Deus concedera poder em questões O terceiro dos textos importantes de 1520 era Sobre a lí-,
leigas. Opunha-se à defesa tradicional do papa, de que ninguém berdade do homem cristão. Lutero desenvolvia nesse texto as
senão ele recebera o poder para agir nas questões espirituais, re- irnplicações de sua crença na "justificativa somente pela fé,,na
jeitando sua afirmação cle prirnazia na Igreja e contestando o qual ansiava por contradizer o argumento de que, se a salvação é
pressuposto de que o clero constituía um grupo de elite distinto obtida apenas pela fó em Deus, não importa o que a pessoa faz ou
com poderes especiais: quantos pecados comcte. Sabia que muitos já interpretavam as-
sim o que dizia e que havia probabilidade de que isso o desacre-
E uma fábula perversamente planejada não po- ditasse aos olhos da maioria de mentalidade moralista. portanto,
- e eles
dem citar uma única letra para confirmá-la essa história tentou esclarecer seu ensinamento sobre as "boas ações":
- ou confir-
de que só o papa pode interpretar as escrituras
mar suas interpretaçÕes. Eles atribuíram essa autoridade a Como diz Cristo, "uma boa árvore náo produz um mau fru-
si mesmos. E, embora digarn que essa autoridade foi dada to, nem uma árvore fraca produz um bom fruto,,. Hoje está
48 49

claro que o fruto náo produz a árvore, nem a árvore cresce rcssavam multo e, com certeza, não eram questões de vida e
no fruto; mas, ao contrário, as árvores produzem os Írutos e nrorte para ele, como a 'Justificativa somente pela fé", o ..sacer_
os frutos crescem nas árvores. tlticio de todos os crentes" e a compreensào do objetivo e nature_
Como antes, as árvores têm de existir antes do fruto e o fru- zu da missa.
to não torna a árvore boa ou ruim, mas, pelo contrário, uma Esses eram assuntos que não podiam ser ignorados, no mí_
árvore de qualquer espécie produz Íruto da mesma espécie,
rrimo porque outros os consideravam importantes e estavam
e, assim, deve primeiro a pessoa do homem ser boa ou má
antes de poder fazer uma boa ou má obra, mas ele próprio ;rrontos a causar problemas por causa deles. Lutero teve de assu_
faz suas obras serem más ou boas. [...] rnir uma posição. Para ele, quando a Bíblia não proibia uma ativi_
Não rejeitamos portanto as boas açoes; não, nós as ado- tlade, esta só deveria ser interrornpida se o bom senso decidisse
tamos e as ensinamos no grau mais elevado. Náo é por t;ue seria melhor assim. Em todo caso, ele estava preparado para
conta delas que o condenamos, mas por conta desse vcr as igrejas sem pinturas e sern imagens, se a comunidade as
acréscimo ímpio e da perversa idéia de buscar através de- considerasse uma distração quando a palawa de Deus era escuta-
las a justificativa. tla; os padres conduzindo os serviços diários ern roupas comuns,
se pensavam que vestimentas dispendiosas poderiam marcá_los
Contudo, esse ensinamento das boas ações "no grau mais como pessoas mais importantes do que realmente eram; os mo_
elevado" não signiÍicava que Lutero era urn puritano em qual- nastérios fechados, se pensavam que seus rendimentos poderianr
quer sentido. Ele não via nenhum pecado em passar bons mo- scrvir a objetivos melhores; os padres casados, se isso eii-inu.se
mentos cantando, dançando em festas e usando boas roupas, des- suas tentações sexuais; o fim da confissão, se fosse um remanes_
de que isso não interferisse nos deveres de cada um. Nisso, era cente da intervenção sacerdotal no relacionamento entre o fiel e
diferente de muitos líderes protestantes que procuravam ligar o Deus; e quebradas as regras do jejum, se elas significassem um
pecado ao pÍazer, acreditando que qualquer "vício da carne" fos- so lrimento desneccssário.
se uma vitória do demônio. Enquanto eles def,rniam como pecado Na prática, tudo isso ocorria em áreas que se tornaram lute_
qualquer atividade que não fosse nitidamente incentivada na Bí- ranas. O próprio Lutero se dispunha a estimular algurnas delas.
blia, Lutero tinha a visão mais libertária de que era pecaminoso tlle não via justificativa na continuação dos monastérios, já que
apenas o explicitamente proibido na Bíblia. As comunidades lu- rejeitava os ensinamentos católicos de que fazer os votos e viver
teranas permitiam aos protestantes que não faziam da religião o de acordo com eles conferia salvação automática. Lutero preferia
centro de suas vidas viver de maneira mais confortável e mais que os rendirnentos dos monasterios fossem mais bem utilizados
agradável. proporcionando alimentos para os pobres e educação para os
jovens. Na Inglaterra, as terras dos monastérios dissolvidos pas_
saram para o rei e para os ricos proprietários; nas áreas da Ale_
As práticas religiosas manha que se tornaram luteranas, a propriedade dos edificios dos
monastérios foi devolvida aos benfeitores originais, se ainda vi_
Lutero adotou a mesma abordagem em relação às práticas viam, ou passavam à comunidade, para fins cáritativos.
religiosas. Enquanto alguns de seus principais seguidores come- Naturalmente, havia o problema do que fazer com os ho_
çavam a irritar-se com certas questões como as pirtturas e ima- mens e mulheres que renunciaram aos votos e retornaram ao
gens uas igrejas, as vestimentas dos padres, a continuidade dos mundo. Lutero ensinava que todo trabalho tinha o mesmo valor
monastérios, o celibato do clero, com a conhssão e o jejum, Lu- aos olhos de Deus e, sendo assim, não houve dificuldade alguma
tero sustentava que essas eram questões secundárias. Não o inte- em permitir que os homens se ocupassem daquilo a qu. ,r.,ellro.
5I

se adaptassem sua habilidade e experiência. Para as mulheres, Quando Lutero casou, todos os onlamentos das igrejas de
não foi tão fácil. Muitas freiras vinham de famílias ricas, porque Wittenberg já haviam sido tirados, mas ele não estava preparado
podiam fazer a doação da quantia normalmente exigida para a t)iu'a unt culto despido de todo o colorido. Era apaixônado por
menina ser admitida no convento. Havia poucos trabalhos dispo- rnirsica. um dos mais preciosos dons de Deus para a humaniàa_
níveis para as mulheres, alem dos serviços domésticos e da la- rle. e desejava que elá tivesse um papel maior nos serviços
da
voura, e estes eram inadequados para pessoas de qualquer tipo de rrircja, que não Íbsse um papel diminuto. Em parte, isso
se faria
educação. A úniça alternativa era o casamento ou o retorno às fa- rrrcentivando o novo elemento, os hinos. parà facilitar,
Lutero
i scroveu e publicou mais de vinte hinos e logo seguiram
mílias. EsÍbrços exaustivos foram feitos para encontrar bons ma- seu
('\ctnplo. Tambem era um entusiasta dos corais,
ridos para o máximo possível das ex-freiras mais jovens. acha=va que de_
r criam pernlanecer nas igrejas e preparou letras e músicás para
Em 1523, nove freiras que renunciaram aos votos foram ..(:rem cantadas.
contrabandeadas para fora do ducado da Saxônia, que perrnane-
Lutero acreditava ser impossível separar totalme,te o culto
cia católico, e levadas para Wittenberg. Finalmente, encontra-
!' a educação, pois via a tarefa da Igreja tanto em termos de ins_
ram-se maridos para todas, menos uma. A Írltima ex-freira, Ka-
lrriir sua congregação na palavra de f)eus, quanto de oÍ'erecer_lhe
therine von Bora, lembrava sempre a Lutero da promessa de
rs preces. Os hinos eram para a veneração, mas também serviam
arranjar-lhe um marido, para que pudesse deixar os serviços do- pura ajudar na memorização das afirmações de fe. Bem
mésticos em que a colocaram. Depois de dois anos e nenhum ma- mais im_
purtante do que os hinos era a Bíblia. Ele sabia que a tarefà
rido adequado à vista, Lutero pensou que deveria oferecer-se pa- eclu_
clcional mais importante para a Igreja era levar o Novo Tes_
ra casar corn ela. Katherine aceitou e o lar de Lutero tornou-se Íilmento para o máximo de pessoas.
um ponto central da Reforma na Alemanha. Katherine sabia lidar
muitíssimo bem com a corrente interminável de visitantes e estu-
dantes residentes, ao mesmo tempo parindo e educando seis Íl- A Bíblia
lhos, além de enfrentar um homem que raramente parava de tra-
balhar o suficiente para ser pouco nrais que uma companhia Na veneração católica, a Bíblia tinha pouquíssima impor_
passagei ra.
tância. Poucos trechos essenciais estavam integiados aos sárvi_
Desse modo, um tanto por acaso, pois nunca tivera inten-
ços, mas eram lidos em latim e às vezes não eram entendidos se_
ção de se casar, Lutero pôde praticar o que ensinava sobre o casa- cluer pelo padre. Não se fazia nenhuma tentativa para garantir
mento. Ele considerava que os devercs para os esposos, filhos e que a congregação soubesse o que significavam as palavras.
pais só eram menos impofiantes que os deveres para com Deus.
A
maioria dos fiéis não achava estranho, pois a principál função da
Desse modo, a vida e os relacionamentos em família estavam no congregação era testemunhar o serviço, e nâo participar dele.
centro da prâtica do luteranismo. Por essa razão, Lutero estava Tarnbém não se considerava conveniente que os leigos estudas-
pronto para estimular os padres a se casarem, a fim de darem sem a Bíblia, pois certamente não iriam compreendê_ia; eles
ape_
bom exemplo a suas congregações. Ele não esperara fazer isso nas deveriam saber no que deveriam acrediíar. Não havia
a me_
ele próprio, porque já estava na meia-idade, com mais de quaren- nor necessidade de que lessem a Bíblia.
ta anos (acima da idade normalmente aceita para o casamento) e Lutero naturalmente discordava fundamentalmente dessa
um futuro nada seguro. Mas terminou fazendo um casamento que ideia do clero como os mediadores entre Deus (e sua palavra) e
durou mais de vinte anos afinal de contas, exatamente o tipo os homens e as mulheres comuns. Ele acreditava que o papel
do
que defendia. - padre era ajudar cada pessoa a entrar em contato direto com
52
53

Deus. Para isso, todos deveriam compreender a Bíblia o máximo


possível o que signifrcava que ela deveria estar numa lingua-
A disseminação
gem que-todos pudessem entender. Havia pelo menos dezoito
traduções da Bíblia para o alemão, mas Lutero sentia que todas
Lutero trabalhou seriamente para garantir que seus
ensina_
rrrentos atingissem o máximo de peisoas possível-
eram muito deficientes, pois continham muitos erros e não se
rl«rr
Era
infatigável e esperava qüe outros com algum talento
,_;;;;_
adaptavam a suas interpretações em diversos trechos. Logo che-
.".r.
;d;
gou à decisão de fazq sua própria tradução. f! exemplo. Os sermões passaram u sJ. quur" a prinãipal
irtividade nas Çongregações reformadas. Dada
Ao ser preso voltando da Dieta de Worms, Lutero foi leva- a nattJrezaevangé_
lica do luteranismo, não é de surpreender que
do ao distante castelo de Wartburgo que pertencia ao eleitor Fre- a maioria desses
scrmões consistisse em exposições de trechos
derico. Ali, tirou seu hábito de monge e passou a viver sob o da Bíblia, com indi_
cações muito claras de como seu conteúdo
pseudônimo de cavalheiro Jorge; apenas os amigos mais íntimos afetaria u ú, u prit*
tla religião e o comportamento diário.
conheciam seu paradeiro. Lutero não desperdiçava o tempo: em os sermões de Lutero eram
longos (normalmente, duravam mais de uma
apenas três meses, traduziu todo o Novo Testamento para o ale- hora), mas seus ou_
vintes pareciam não se incomodar com isso _
mão, impresso e colocado à venda no final de 1522. Embora não o que talvez nos
scja dificil de compreender, condicionados que
estivesse completamente satisfeito com a tradução constante- estamos pela mí_
- seguintes
mente revisada por ele mesmo nos vinte e quatro anos
rlia a tempos de concentração bem mais reáuzidos.
No entanto,
sobreviveram até hoje mais de 2.300 sermões
de Lutero. Ele fala_
-, foi uma grande obra literária. Era uma tradução relativamente va com as pessoas em seu nível, usando exemplos
livre, em que Lutero usou as metáforas comuns na Alemanha da tirados de uma
cxperiência comum e conseguindo também
época (muitas vezes consideradas "materialistas") para ter a cer- esclarecer os misté_
rios da vida, seu objetivo e seu relacionamento
teza de que as pessoas simples compreenderiam as mensagens com Deus. Lutero
correspondia a uma necessidade que muitos
em termos de sua experiência própria. O texto era reforçado por sentiam. Inúmeros
scrmões foram publicados e vendidos em grande
inúmeras xilogravuras que representavam claramente as histórias quantidade.
Em todo caso, Lutero não podia ioda parte com
da Bíblia na Alemanha do século XVI. Rapidamente o livro tor-
"r]u, ", luterános,
seus.sermões. Quanto mais alemães se tornavam
nou-se um marco na língua e na literatura alemã, como trezentos mais
surgia a necessidade de uma declaração das principai,
anos mais tarde a versão autorízada de James I passou a ser para
religião reformada, para que as famílias à, g*po,
.r"riu, àu
os ingleses. locais, em
geral sem um pastor instruído, pudessem "purrà_tu,
A tradução do Velho Testamento foi mais lenta; Lutero já cia aosjovens e aos velhos. Em 1529 Lutero
com eficiên_
não conseguia mais o tempo livre de outras responsabilidades, co- resolveu qu"r_
tão, publicando o seu Grgnde catecismo,voltado "rru
mo os sete meses passados em Wartburgo. Foi publicada em 1534, para os adultos,
e.o Pequeno catecismo, dirigido às crianças.
com a mesma abordagem. Lutero afirmava que um de seus objçti- Ambàs deveriam ser
lidos regularmente por cadicrente, memorizando
vos era "fazer um Moisés tão alemão, que ninguém suspeitasse que u, ,"ça", Àui,
rmportantes. Tornou-se comum que nos Iares
ele erajudeu". O resultado foi uma tradução com a qual o povo luteranos o pai tes_
tasse a família no catecrsmo todós os domingos.
alemão podia se identificar. Centenas de milhares de exemplares Mais uma vez,
Lutero mostrara habilidade e imaginação pãra
foram produzidos enquanto Lutero viveu; eram encontrados em comunicar sua
mensagem. Jamais houvera um método tão ôuidadosamente
quase todos os cantos onde o alemão podia ser lido ou falado. Con- ela_
borado e estruturado para a instrução de crianças.
tudo, produzir a materia-primapara esürdo das revelações de Deus Os catecismos
nas igrejas e nos lares._Lutero esperava também
não era o suficiente. As pessoas precisavam de muita orientação .:ll1_Tud*
trvessem gfan-de destaque nas escolas, mas
que
para poder avaliar o que havia por trás das palavras. dàsapontou_se _ de
moclo geral, não conseguia convencer os outros
dL que as escolas

\,
55

eram uma grande prioridade e, pelo resto de sua vida, continuou transformavam-se no verdadeiro colpo
e sangue de Jesus Cristo.
reclamando da pequena porcentagem de crianças alemãs que fre- A doutrina da transubstancia_ção dependia
ãe uma Çrença de que
qüentava a escola. Parecia-lhe que algo mais deveria ser feito, 'lesus estivesse usando literarmente ar puiuu.u, "Isto
é meu san-
para que houvesse alguma esperança de ter um pastor instruído gue" e "Isto é meu corpo,, ao descrever
o vinho e o pão ,; ;il;
urn .dr;à;
paru cada congregação. Ele estava certo, mas só depois de sua ma Ceia. Ensinava_se que a transubstanciação
rnisterio" -- inexplicávãl em termos
morte a questão foi tratada com seriedade. ."uir,ãu, ".,
verdadeiro. To_
Lutero se preocupava imensamente com a educação, por dos os padres. ainda que pecadores,
tinham poder para realizar
ele inteiramente concebida em termos de religião; contudo, cui- csse milagre e provocar a morte de
Cristo mais uma uar. Co^..
dava bem mais para que o ensino das crenças fosse exercido cor- o corpo de Cristo na missa era considerado
um grande mérito,
retamente. Como outros pensadores religiosos de seu tempo, ti- conferindo aos participantes uma ,uon".
d" graça que podia
nha certeza de que Deus se havia revelado para a humanidade cortrabalançar alguns pecados aos olhos
de úeus. Acreditava_se
através da vida de Jesus Cristo. Assim como os demais reforma- até mesmo que essa graça era estendida
aos mortos que sofriam
dores religiosos evangelicos, estava convencido de que a Biblia no purgatório e que as missas em seu
nome reduziaa arr" ,"*_
continha essa revelação em sua integridade. Como lhe parecia po de sofrimento pelo qual teriam
d. parsà. antes de entrar no
óbvio que Deus sabia muito bem o que queria dizer e só teria céu. Muitas pessoas ricas deixava.
i"r,u.ento dinheiro pa_
uma mensagem sobre qualquer ponto, não tinha a menor dúvida "á de chantre,,,
ra os sacerdotes conhecidos como ,,padres
;;j;rír;
de que não havia mais de uma interpretação correta de qualquer ca responsabilidade era rezar certo
número de missas diariamen_
trecho das escrituras. Portanto, qualquer ponto de vista teológico te em nome de seu benfeitor.
deveria estar certo ou errado: não havia situação intermediária. Cedo Lutero chegou à conclusão de que
a idéia da Eucaris_
Além do mais, se uma interpretação estivesse errada, só poderia tia como sacrificio e como..veículo d. g.ufu
uma perversão
ser trabalho do demônio. Com isso podia levar inocentes ao pe- dos ob.jetivos de Deus. Da.Justificativis-àãente".u pela
fe,, dedu_
cado mortal, causando sua condenação etema, motivo pelo qual zia-se que a participação nas missas
.oni..iu nenhum mérito
Lutero se dispunha a refletir ad nauseam sobre o significado exa- à forma ensinada pela lgreja _ isro "ao
náo ;rg;ifi.uru que ele con_
to de uma frase na escritura e a discutir extensamente diferenças amissa despróvida A. i.portanã*
mínimas de interpretação com agressividade e hostilidade que ::*fy
sentra-se muito envolvido, pois
Emocionalmente,
sua ôelebração lh" p.opo.cionara
desafi am tma razão normal.
:lr^llT de
uuururoo
suas mais profundu,
a preservar a rmporlância"^p..têr.iaJespirituais;
estava
da missa na vãneraçào. Dese_
java que o serviço continuasse
.o.no o a"ra" a inffincia,
A Eucaristia lrras.seus companheiros o persuadiram "oírl""à
de que havia duas mrdun_
ças importantes a fazer.
A questão com que Lutero mais se preocupava era a cele- A missa çra falada em latim e poucos fiéis
da congregação
bração que estava no centro do culto católico, a Eucaristia, ba- entendiam o que era dito. A inclinação
cons.ervadora de Lutero
seada na última Ceia de Jesus com seus discípulos na noite ante- s.eria ma-nter o latim, mas eliminanáo
u, ..i".encias à natureza
rior à crucificação, segundo o Novo Testamento. Os teólogos de sacrificio do sacramento, como havia
feito no início. Contu_
criaram uma complexa serie de credos em torno da Eucaristia. A do, não demorou muito a ser convencido
de que era insustentá_
Igreja ensinava que durante o serviço ocorria uma nova encena- vel a idéia de a missa nâo ser rezadana
ti.rg.rJ uernacular (a lín_
ção literal da morte de Cristo quando, no momento em que o sa- gua local). Em r526 foi publicarla
ruu ,.irao alemã da missa.
cerdote oficiante oferecia o sacrificio, o pão e o vinho no altar Lutero também não demorou llturio para
aceitar o fim da priúica
56 57

de oferecer à congregação apenas o pão durante a missa, justifi- Lutero mais tarde rejeitou a transubstanciação e substituiu-
cado porque seria sacrilégio derramar qualquer gota do sangue a pelo que os autores modernos chamam de consubstanciação,
de Cristo e, oferecendo-se o cálice à congregação, isso fatalmen- embora essa palavra fosse desconhecida no século XVI. A con-
te ocorreria. Por isso, apenas o padre bebia do cálice e todos os substanciação envolvia a possibilidade de haver mais de um "ele-
outros partilhavam o pão. A mudança para o oferecimento da mento" presente num objeto. Segundo o pensamento científico
Eucaristia à congregação nas duas formas pão e vinho tor- da época, os "elementos" poderiam ser materiais, como a terra ou
nou-se a marca das religiões reformadas e-logo passou a consti-
- a água, ou intangíveis, como o fogo e o vento. Lutero explicava
tuir a primeira coisa a ser feita quando uma comunidade saía do sua cloutrina usando a analogiado ferro aquecido: exatamente co-
catolicismo. mo o ferro perrnanece ferro quando o fogo entra e ocupa todas as
Apesar das mudanças que iniciara ou se dispunha a permi- partes dele, o pão continua sendo pão quando o Çorpo de Jesus
tir, em pouco tempo Lutero viu-se acusado de ser, no fundo, um nele penetra durante a Santa Comunhão. Assim, ele acreditava na
papista pelo menos no que dizia respeito à Eucaristia. Muitos dos presença real de Jesus durante a missa, como os católicos.
que o apoiavam sentiram que ele estava se mantendo próximo Nessa questão, mais do que em qualquer outra, Lutero per-
demais da teoria e da prática do catolicismo. Em termos de práti- mitia que seus sentimentos superassem sua capacidade de aná-
ca, sobre a qual tinha mais preferências pessoais que certeza teo- lise. As prolongadas e cada vez mais desesperadas defesas que
lógica, satisfez-se em aprovar uma série de procedimentos con- fazia de sua posição pareciam as de alguém que tentasse raciona-
forme os desejos de çada congregação. Diversas práticas lizar m preconceito. Não que fosse um homem orgulhoso, que
anteriores foram mantidas e as igrejas luteranas açostumaram-se não estivesse disposto a admitir estar errado ou que não desejas-
à continuidade do elaborado cerimonial que muitos protestantes se aprender com os outros. Uma de suas qualidades mais encan-
mais tarde acharam ofensivo, embora ele considerasse boa a mu- tadoras, a que mais ajudou a manter a lealdade cle alguns segui-
dança do nome da missa para "Santa Comunhão" ou "Ceia do dores muito capazes, era sua aberturapara o que estivesse correto
Senhor". Ferozmente, Lutero manteve o ponnenor dos credos e para as novas ideias desde que não provenientes de alguem
teológicos que havia por detrás de sua concepção do serviço; os
-
quejulgasse estar sob influência de Satanás. Entretanto, na teolo-
que discordavam eram primeiro delicadamente corrigidos se gia da Eucaristia, ele havia lutado e rezado durante tanto tempo,
não aceitassem, era provável que se vissem atacados na imprensa - que estava certo de que Deus the havia revelado o verdadeiro sig-
como agentes do demônio. Acabou perdendo muitos fiéis em po- nif,cado. Essa crença apoiava-se no imenso conforto espiritual e
tencial por ser inflexível a respeito da teologia da Eucaristia. íntimo que the vinha da sensação da verdadeira presença de Jesus
O problema em questão era a exata ítatvteza da presença durante a Santa Comunhão. Lutero chegou a odiar qualquer pes-
de Cristo durante o culto. A doutrina católica da transubstancia- soa que dissesse que o culto era apenas simbólico ou que essa
presença era mais espiritual do que substancial.
ção dependia de uma aceitação filosóf,rca de que houvesse dois
aspectos da realidade dos objetos. Estes eram os "açidentes" a
e a-
c'es-
substância imediatamente aparente a nossos sentidos
-
sência", a qualidade intangível que marcava a identidade do ob- Apolíticaeasociedade
jeto. O "acidente" de uma mesa, por exemplo, seria a madeira, e
sua "essência", o que a tornava diferente de uma pilha de leúà, Essa força do sentimento limitava-se às questões que ti-
um banco ou uma cadeira. Por esse raciocínio, durante a missa, a nham que ver com a teologia, em especial a teologia relacionada
"essência" do pão e do vinho transformava-se na came e no san- com a salvação. Era esse o principal interesse de Lutero, a força
gue de Jesus, ao passo que os "acidentes" não se modificavam. que o impelia. De modo geral, ele não se interessava por outras
59
58

questões e era com bastante relutância que dedicava seu tempo a Os Cavaleiros lmPeriais
elas. AIém do amor pela música e de uma preocupação pela edu-
ocorrera no
cação baseada na religião, ocasionalmente se aventurava nos as- O grande momento dos Cavaleiros Imperiais
militares foram
suntos não-religiosos, mas apenas quando sua intervenção fosse início da"Idade Média, quando seus serviços XVI'
muito necessária. De outro modo, contentava-se em deixar à von- pelo imperador' No começo do século
*riiã deviam fideli-
tade quem estivesse interessado em assuntos políticos ou sociais, "pr""iados
essa classe de nobres -àrrã."r, cuios membros.só
insignificância' o
embora dentro de certos parâmetros muito claros. ã;d";;;p"tador, reduzira-se a uma relativa
Alemanha' Seu papel
Lutero era essencialmente um conservador em relação a ;;;á;, É nao'ueiu"ããÀo policial da
que- haviam conseguido
questões políticas e sociais. Não pensava nelas com grande pro- fora assumido pelos príncipes locais
de virtual indepen-
fundidade, era influenciado pelos valores e influências de sua estabe-lecer-se por conta pràptia etn-posiÇão
Cavaleiros em seus ter-
infância, aos quais acrescentara muito pouco através dos estu- ããr"i". Ressentlam-se da préstnça dos.
e detentores
algum castelo
dos das escrituras
-
que geralmente çonhrmavam seus pontos ;ã;t. muitos deles propiietários de
mas não reconheciam sua
de vista; mas convenceu-se de que os problemas mundanos ti- de um razoâvel grupo de soldados'
chegara a um acor-
nham pouca importância em relação às questões espirituais. No ur,o.lAuA"' Uma*seiie desses Cavaleiros
e haviam entrado no
âmago de seu pensamento estava um profundo respeito pela au- ãã'ai*" at realidade de sua situação numa qualidade
toridade. Embora rejeitasse .riolentamente a reivindicação do ;;ri;; "" s" as.o"iaru* à corte do imperador
papa como autoridade da lgreja Cristã, igualmente defendia entretanto' não. fizeram nada disso'
rá"-àiliát"sca. Muitos, alguns com um
com vigor a causa da autoridade nos assuntos seculares. Acre- Constituíam um grupo de líderes mercenários'
fragmentação do
ditava que os governantes leigos, do imperador para baixo, re- ;ü;j; d" ; iiu ítriu de homens, que viam a
como causa
cebiam seu "poder da espada" diretamente de Deus e, portanto, irrie.i" em inúmeros estados semi-independentes
um estilo primitivo.de na-
deveriam ser obedecidos em todas as questões leigas, mesmo ;; ;; problemas. Desenvolveram de ver um império con-
quando suas ações fossem tiranas e injustas, pois somente Deus .i""uiitáo alemão baseado num desejo
e com a eliminação da
poderia retirar os poderes que Ele havia concedido. Se os go- solidado com um controle centralizaào
estrangeira que, menos
vernantes leigos abusavam dos poderes dados por Deus, era a irnrá".i" estrangeira. A dominação tambem o fato de que a
Ele que teriam de prestar contas na vida após a morte. Enquan- ;;;;;r.* uão papa' objetav.am
".u a autoridade leiga
to isso, era clever de todo bom cristão submeter-se às leis e re- iÀi.;u, utrore. ,1. ,"o" úi''pos elrcebispos'.era
Assirn' considera-
gras impostas. em mais ou menos u* qui"o da Alemanha'
As ideias de Lutero sobre os papéis e responsabilidades so- vam Lutero ,r- irrporturie aliado potencial, quando ele se de-
ciais e políticos eram desconhecidas em seus primeiros anos de clarou inimigo do PaPado'
política e militar coe-
proeminência. No entanto, tanto seus parlidários quanto os ini- Os Cavaleiros não eram uma força
quando surgia uma neces-
migos fizeram pressuposições sobre elas. Incorretamente, por rente e- coordenada. uniam-se apenas
qlre os lideravam eram Ulrich von
exemplo, pressupunham que, como se opunha violentamente à ;il;á;. As personalidades tinha um temperamento
autoridade tradicional do papa, era hostil a qualquer Íbrma de au- ;i;i;; e pànz von Sickingàn. Hutten
toridade estabelecida. Naturalmente, isso fez com que as hierar- era um excãlente militar' mas'. alem disso' tam-
dos mais raros:
do apareor-
quias superiores da sociedade temessem sua influência, e os que ;il;;;", filósofo e um relações-públicas'porAntes seus ácidos ata-
desejavam alterações na ordem existente das coisas em geral o *.r,ã a" Lutero, já era bastanie conhecido
ele ordenhava o dinheirti
como
considerassem um messias dos últimos dias, que os conduziria à il;;;; pupu, p.io mun"itu
atração popular que Lutero poderia trazer
vitória na luta pela mudança radical. áf""ra". Percebéndo a
61

para a causa, Hutten persuadiu


Sickingen, o mais notável líder mizar os rendimentos diante das pressões da elevação dos pre-
militar dos Cavaleiros, de que ," a.r"'rlu'of"recer proteção ar_
mada ao professor de Wittenberg. ços. Em relação a muitos outros campesinatos conservadores de
I-ut.ro u-grad"c"u, mas recu_ outros lugares e em outras épocas, foi a mudança, mais do que a
sou a proteção não porque objetasse uà apoio
mas porque era -desnecessário, enquanto desse lado, sinrples dureza da vida, que estimulou a violência nas áfeas ru-
detinhà rais alemãs. Na década de 1520, o aumento das exigências fi-
Frederico, o Sábio. Conrudo. os ";fi;;;;; um
C;";i;;.;; p.oporcionaram nanceiras coincicliu com a disseminação das novas ideias. Gran-
abrigo seguro para muitos reformadores
a" o'rt.u, partes da Are_ de parte do campesinato era profundamente religiosa, apesar das
manha que desejavam seguir, o
e*e-plã ãã ir,".o, mas viam-se exigências econômicas da Igreja. As idéias de Lutero, em espe-
forçados a Íugir por cauiu da hostilidade-dl
gov"rnante rocar. cial a importância atribuida à Bíblia mais do que aos dogmas
Mais do que isso, depois da Dieta ã"-Wà.Ã,
em 1521, decidi_ tradicionais, foram muito bem recebidas, ainda que muitas vezes
ram que estava na hora de conduzir
uma cruzadapoprlá. numa forma pervertida, que ensinava que os dízimos pagos à
a força rerritorial da Igreja u Auo, "tni*
àulefigiao reformada Igreja não sejustificavam e deveriam ser negados. A isso soma-
Lutero. começaram lançãndo " ,rn uàquã ar^i"*u, do arcebispo
de
de Trier. em 152?. _ mas subestimaraÀ
vam-se as crenças ingênuas de que o imperador corrigiria suas
,-rituuçao, o arcebispo faltas se delas tivesse conhecimento, e a idéia de que Lutero vi-
não desmoronou a seus pés. Resistinoo
ú.uru*"rte, ele conse- ria para liderá-los em sua luta.
g11y o +oio.enérgico dqoutros p.ilú;, i;;ais que apreciaram Uma série de rebeliões locais em 1524 transforÍnaram-
unrr-sc para tentar acab1. d,e. um
a ,ei po, todas àom ;
militar dos Cavaleiros. Sickingen foi il;;;; se numa revolta geral em 1525. Ainda que tenha recebido o nome
ã".ràiàao em 1523 e os de Guerra dos Camponeses e embora tivesse um símbolo comum
Cavaleiros, destruídos como foiça pofitica-significativa.
gen.fugiulara a Suíça e Hurten.;.;;ã;-;filis, Sickin_ (o Bundschuh, o sapato usado pelos camponeses) e houvesse um
saúde na Er_rropa do século XVI.
o flagelo da programa comum para eliminação das imposições financei-
Emboru Lr,".o não estivesse ras, faltava à luta um planejamento ou uma coordenação çentral.
pessoalmente envolvido no empreendlr""rto,'o
fato de uruqr. Os grupos locais copiavam os programas e atividades uns dos
ter sido realizado pelo menos parcialmente " con_
em seu nome outros; às vezes reuniam-se para alguma ação, mas nunca era
venceu mais pessoas ainda de que
suas idéiàs eram sinônimo de empreendida uma ação comum, visando algum objetivo real.
anarquia.
Centenas de castelos e templos religiosos foram prlhados, cida-
des foram assaltadas, mas raras vezes houve qualquer tentativa
de substituir a estrutura de autoridade demrbada por algo além
A Guerra dos Gamponeses
das regras do populacho. Assim, não foi muito dificil aos prínci-
pes retomarem seu controle tão logo diminuiu o entusiasmo ini-
sitr"ração
ainda mais prejudicial chegou ao ponto
_ , - - Y-u cul_ cial da revolta. A retomada sofreu represálias em grande escala,
mlnante em 1525. por mai-s de um século, u'inrutirfuçáÀ visando eliminar a liderança potencial de futuros levantes e ate-
camponeses fora dissemin àã,
pos em tempos em crises de?du!?Alemanha, lrrompendo de tem_ morizar os remanescentes, levando-os à submissão. Os príncipes
violência contra as font". arop."r_ tiveram êxito. Há estimativas de que mais de cem mil campone-
são econômica, especialmente
a Igreja e á, p.àprieta.ios da ter_ ses foram executados.
ra. os camponeses sentiam qr"-u_u
frutos de seu trabalho estava indo
gi;à; proporção dos Centenas de padres que haviam se declarado partidários de
pu.u ãui.àr'*ãos e estarzam Lutero seguiram em marcha e combateram ao lado dos campone-
indignados. pois essa quantidade
me os detenrores de direitos sobre"à -ri;;;ada
ano, confor- ses; diversos historiadores contemporâneos e alguns dos moder-
suas;";:; rentavam maxi_ nos católicos afirmam que Lutero conscientemente incentivou a
63

revolta. Não há nenhuma prova para fundamentar essa afirma- nistrodeDeuseservodesuaira'aquemousodaespada


peca da mes-
ção, além da circunstancial evidência de que Lutero expressou
,oOrà tri, companheiros está confiado' e queproteger e não
rna torrnu contra Deus se não punir' se não
simpatia pelas queixas dos camponeses e a comprovação indireta exatamente
cumprir os deveres atribuídos a sua situaÇáo'
de que muitos de seus partidários se uniram aos rebeldes. E bem ãã.ã p""u aquele a quem a espada.não foi confiada no
Se pode casti-
mais provável que Lutero tenha sido inicialmente solidário com a momento em que comete um assassinato'
condição dos camponeses, mas em pouco tempo tenha se horrori- nao oÍaz-ainda que a punição seia tomar a vida e
fai e
todas as mortes
zado com seus excessos. Sua reação foi tão extremada quanto a derramar o sangue - ele será culpado de
ação. Lutero expressou essa opinião em um de seus tratados mais e de todo o mal que esses sujeitos cometerem"'
conlrecidos Contra as hordas camponesas que matam e rou- os governantes, portanto, poá"' seguir despre-o:if.1:::
estlverem
nuÃa luta impetuosa enquanto seus coraçóes
bam, escrito no apogeu da revolta. O tratado apresentava suas
batendo.
ideias sobre as questões políticas: era inflexível ao afirmar que os
camponeses "haviam mereçido enonremente a mofle em corpo e (]uando esse opúsculo saiu do prelo, a matança. dos camponeses
alma". Havia três razões para esse veredito: O momento de sua publicação fez com
i), .rtuuu a pleno vapor- Seus oponentes
Em primeiro lugar, eles juraram ser fiéis à verdade, submis- que Lutero parecesse rnsensível e desumano^'
os
sos e obedientes a seus governantes conforme as ordens Jf,.gu.u- atà a dizer que ele era um vira-casaca' abandonando
Lstimulaclo quando fico* muito claro
q'"1 *:i":],i1:
de Cristo, quando ele diz: "Dai a César o que é de César" e ;;;"ú;; injustiça' são poucas as tentatrvas
"Let everyone be subject unto the higher powers". Porque ;;;*d".. Apesar da evidente
rompem com essa obediência e vão contra os poderes su- àãl"r,irt.ot sua defesa da vingança extremada ":"i":": morrels lliTl:
periores, voluntariamente e com violência, perderam o di- quem fosse' Se
u "oo"nfralar, castigar, chàcinar fosse
reito ao corpo e à alma, como nem os infiéis, malandros e ""J teríeis morte mais aben-
vigaristas perjuros, mentirosos e desobedientes fazem [...] ;l;rii;, bo* s..á p"ara vós! Jamaispalavradivind'' Contra as
à
Em segundo lugar, começam uma rebelião e assaltam e pi- iã"ar, p"ít morrereis obedecendo fez çom que Lutero'
hrtrdas de camponeses que nlatam e roubam
lham violentamente monastérios e castelos que não lhes t:l::^3:
perdesse grande
pertencem [...] ;;i;;;;"t temporariámente, "p'l:
sua poslçao
Em terceiro lugar, mascaram esse terrível e horrível pecado llurr", mais pobies estabeleceu com f,lrmeza
com o Evangelho [...] e convencem o povo a ficar a seu la- Reform? nu Ict:j":al1l:
;;;;-;t g;rérnantes inclinados para a Sickingen estava mals
do nessas abominações. Tornam-se desse modo blasfe- qr". *A"t.ito pelas atividades de Hutten e
mos de Deus e caluniadores de seu Santo Nome, servindo favorá-
ã; ;; r"purudo. Ele não apenas se mostrava claramente
ao demônio sob a aparência externa do Evangelho [...] Ja- '-t pàd".", dos go'e*a"tes territoriais' como haviam sido
mais escutei pecado mais hediondo. ministros
or-Curui"iros Imperúis, mas também os considerava
"ãr
Lutero seguia, advertindo os príncipes sobre o que deveriam fa- de Deus na terra'
zer em tal situação:

Em primeiro lugar, não me oporei a um governante que, O governo da lgreia


mesmo sem tolerar o Evangelho, castigue severamente es-
ses camponeses sem oferecer-lhes julgamento t...1 É seu no desen-
Essa seria uma instância de grande importância
dever puni-los, pois é para isso que empunham a espada e que as igrejas reforma-
volvimento do luteranismo. Signif,icava
são "os ministros de Deus sobre quem recai o mal" [...] e não pensavam em
das dariam o apoio às forças dos príncipes
Um príncipe e senhor deve Iembrar nesse caso que é mi-
65
64

estabelecer-se como sistemas de autoridade rival. Conseqüen- A Íamília


temente, passou a ser tentador para qualquer governante na Ale-
ênfase de Lutero no dever que tinha
o cidadãó de
manha declarar-se a favor da Refonna, estivesse ou não pessoal- A grande
a^seus. ensinamentos sobre
mente envolvido e comprornetido com os ensinamentos de Lute- obedecer ao governante equiparava-se
ã, ,"i""i"r"í-,entos sociais, à* qu" a família^tinha
importância
ro. Assim poderiam esperar libertar-se da intervenção política e
o p,intipe era o chefe do Estado' o pai
financeira do papado, ao mesmo tempo obtendo efetivo controle nrimordial. Assim
"o*o
a" IrÃri* Éra iesponsabilidade sua impor disciplina
da lgreja dentro de seus territórios. #;#; dever des-
No fundo, Lutero não estava muito interessado nos arran- àa, ir-rlia, incluindo "'pà'u, filhos e criados; era cartas de
jos feitos para garantir a supervisão da Igreja no momento em "
"i* .U"Oà.e-fo em tudo' Como demonstram as inúmeras
afeto' mas estes fun-
que se eliminasse a estrutura hierárquica de bispos e arcebispos. ;;;;;;tp"sa, isto não impedia o amor e.o claramente hierárquico'
Para ele, a exigência de disciplina deveria ser introduzida por al- cionavam dentro de um relàcionamento
promoção do
gum sistema, mas dispunha-se a aceitar qualquer coisa que agra- O luteranismo e cor.etamente identificado com a
com
dasse aos príncipes e seus partidários. A estrutura emergente cla- social: seu chauvinismo masculino refletia
ramente estabelecia o goverxante como "chefe" da Ig§a em seu
""nr.*uao.ismo
precisào a éPoca em que vivia'
século' Com
território, como protetor e legislador o que não agradava mui- Lutero foi um dos grandes teólogos daquele
-
to Lutero, porque ele preferia que a autoridade temporal e a espi- ,rru ,,r"nt. requintada e a-aplicação diligente
que dedicava aos
Não obstante' era
ritual permanecessem em mãos diferentes; em todo caso, essa ;;*à;;;ele càmetia pott"oi erros evitáveis'
em qu: muitas vezes apre-
não era questão que de algum modo considerasse vital. menos seguro nas questões práticas,
ou alguma tolice' como no caso
Uma das maiores prioridades para ele e para muitos outros r"ntutu eípantosa ingenuidade
era a manutenção da ordem pública. Poucos eram capazes de á"iigr*iá de relipe, o tandgrave de-H-e-sse' Depois 9T:i:1:
tornou-se o pnncr-
distinguir, como Lutero, entre as questões da fé essencial, nas ri"Jíi"o, o Sábio, eml5}S,Felipe de Hessehomem de tempera-
quais era necessário haver uniformidade, e as menos importan- p"i à"f""tot da causa protestante' Era um
intenso pecador; no instante se-
tes, nas quais essa uniformidade não tinha tanta importância. Pa- mento oscilante: num momento
"p""i,tt"
ra a imensa maioria da população, era preciso haver uniformi- gri*, deprimido' Não encontrava nenhuma
Çom quem se casara quando
jo-
dade em todos os aspectos da religião. Se cada congregação i"*f"ôa,i sexual junto à
"tpo'u sentia-se aÍrasa-
pudesse tomar suas próprias decisões, mesmo nas questões me- r"rn pÀt trrOes dinásticas, mas periodicamente
em .elação à f,rla àe amantes a.quem
recorria' Afi-
nores, certamente isso resultaria em luta e provavelmente em do de remorso
espirituais e
gueffa civil. Seria portanto necessário que as práticas religiosas ã,;h"g* à conclusáo de que suas necessidades
se pudesse casar-se com uma
fossem uniformes em cada estado e que se visse a Igreja conten- sexuaisieriam correspondidas
protestantes de
do toda a população, de modo que não houvesse diferenças que mulher fisicamente atraente' Luteio e outros de que'
levassem à violência comunal. A única estrutura disponível para *uiãi i*pottância, consultados em 1540' advertiram-no aceitár'el que
questão' seria
reforçar essa idéia era o poder civil. Desse modo, no eleitorado L*ü"t" o divórçio estivesse fora de concor-
todos os envolvidos
da Saxônia, o governante era responsável pela indicação de um ;;;;;" segunda esposa se

corpo de Visitadores, cuja tarefa era investigar os arranjos e as dassem; pelo jeito, idéiu -baseava-se em precedente contido
"r,,
no Velho Testamento. Felipe agiu conforme
o aconselhamento'
práticas de cada paróquia. O eleitor deveria garantir que as deci-
de seu casamãnto bígamo se espalhou' o papgl
sões dos Visitadores seriam implementadas. Arranjos semelhan- ouando a noticia
situação impossí-
tes foram feitos em outros estados, conforme o luteranismo ia ffiil?;i;;;.1;J"- Para livrar-se de
"-a
pública. sua reputação foi
sendo adotado. vel, elementiu e a mentira tornou-se
prejudicada para sempre e a posição política da causa protestan-
te ficou seriamente enfraquecida.
O tropeço não foi atípico das ações de Lutero nos anos que
precederam sua morte, em 1546. Ele se tomara um velho arro-
gante (dizia-se até desagradável, maldoso), ainda que isso não
Zwingh
desmereça suas grandes realizações e sirva para lembrar que as
vidas longas raramente são feitas de uma só peça (algo talvez não
muito razoável de esperar-se). Lutero foi um homem com defi-
ciências e algumas falhas, mas a virtude de sua mente, a força de
sua personalidade e a intensidade de suas convicções religiosas
muito contribuíram para mudar o curso da história moderna da
Europa.

Histórico
Devemos fazer um esforço consciente para evitar cair na
armadilha de crer que o início da Reforma foi Lutero' Natural-
+. mente, Lutero foi o gigante que teve enorrne influência nos fatos'
mas outros também tiveram um verdadeiro significado, embora a
l

i
maioria dos historiadores classifique-os corretamente de "perso-
nalidades menores". Muitas dessas "personalidades menores'o
I eram basicamente seguidores de Lutero, que atuavam como cen-
tro da Reforma em suas localidades. Contudo, alguns se conside-
ravam independentes da influência do grande reformador' Res-
sentiam-se de sua superioridade assumida.
A "personalidade menor" que exerceu a maior influência
independente foi Ulrich (ou Huldreich, ou Huldrych ele escre-
-
via seu nome de diversas maneiras) Zwing\i (1484-1531)' Zwin-
gli nasceu, cresceu e passou quase toda sua vida na Suíça, uma
õonfederação livre de treze estados que, embora tivesse uma
composição étnica quase completamente alemã, era remota e in-
depàOente o suficiênte para não ser çonsiderada propriamente
parte da Alemanha' Havia uma antipatia de longa data entre ale-
mães e suíços. Os alemães olhavam de cima para os suíços, con-
siderando-ôs montanheses ignorantes, pauperizados e primitivos.
Uma idéia não muito desprovida de exatidão, que causava muito
69

podero-
ressentimento aos suíços. Havia, portanto, uma tendência natural Em 1518, Zwingli mudou-se para Zurique' o mais
que con-
de que uns rejeiúassem as idéias dos outros; não é de surpreender ,o da Suíça' Erã basicamente uma cidade-estado'
"staOàgt"toes'áreas dos campos circundantes e governada por
que ocorresse uma Reforma independente na Suíça. ãrrri"tã O
Zwingli, como Lutero, era de origem camponesa. Como rl* selecionado em geral por meios democráticos'
inclusive a reli-
Lutero, também se destacara najuventude pela notável capacida- Conselho controlava todos os ãspectos da vida,
"onrãfro
de intelectual. Recebera uma educação tradicional na escola e na niao.e,,i*,ainfluênciadeZwingliemZuriquepoderiaser
universidade, preparando-se para uma carreira eclesiástica. Gra- il;t;;; vez tendo convencido o povo da correção de seus
posição para isso, pois ha-
ças à influência de outros membros de sua família que "fizeram o fonto, a" vista. Estava em excelente
via sido transferido como pregador; seu único dever era ensinar o
bem", havia-se tornado pároco na aldeia de Glarus na tenra idade
de 22 anos, em I 506. Por dez anos peÍÍnaneceu nesse papel, com- oovo. Tradicionalmente,
-Àat os pregadores expunham os enslnamen-
Z*ingri inteiramente na expli
binando o trabalho rotineiro do sacerdócio ao estudo intensivo, ãt' ã; G;j;; "o"ientrou-se
que era sua verdadeira paixão. Em l5 16, dominava tão bem o la- ."ia" aãeibiia. Não tinÀa o menor receio de apontar onde os en-
tim, o grego e o hebraico, que era visto como um dos mais impor- ,iru*".,tot da Igreja pareciam conter de{iciências'
Zurique ti-
tantes eruditos na Suíça. Tinha particular interesse pela Bíblia. Como os-prórperos cidadãos alemães' os de
maneira muito
Quando Erasmo publicou sua edição do Novo Testamento no ori- nham mentalidaàe sàriíssima' Dedicavam-se de
sufi-
ginal grego em I 5 16, foi uma revelação para Zwingli. Conforme às questões religiosas, embora com independência
quanto pode-
ciente para pensar qrr" ,á tão provavel
"speciut estar certos
o estudava, mais se convencia de que muitos dos ensinamentos
o papa como
da Igreja estavam inegavelmente incorretos ou não tinham uma riam ertar ós teólogos prof,tssionais' Respeitavam
temiam' Na verdade' quando Zwingli
justificação evidente pela Bíblia. au Igreja, mai naà o
Essas conclusões eram muito perturbadoras paru Zwinglí,
"tài" a áaáoe, estavam um tanto aborrecidos com o papa por
"r,rgoo que havia contratado
que sempre pensara que as crenças ortodoxas de seu tempo con- sua demora em pagar as tropas mercenárias
havia pouco tempo em Zuiique' Assim, quando Zwingli come-
tinham a verdade divina. Aos poucos, foi tendo de admitir para si
ortodoxos da Igreja' não foi.au-
mesmo que a Igreja estava seriamente equivocada. Era uma çou a contestar os ensinamenios de ensinar
como subversivo e proibido
questão da maior importância, porque, segundo sua compreen- tomaticamente marcado
ele rapidamente acumulou um grande número de
são, o povo, confiando na orientação da Igreja, estava sendo mal- ao contrário,
conduzido e encaminhava-se para a condenação eterna. A menos
-,"grridor". em iodas às classes da população' inclusive entre os
pouco
que alguem ensinasse corretamente a maneira de assegurar sua i*?* poderosos. Passou a fazet parte do Conselho e' emidéias'
"
,"*",; maioria dos conselheiroJ simpatizava com suas
salvação, iriam todos direto para o inferno quando morressem.
Para Zwingll o remédio era simples. Ele estava certo de que a
Bíblia continha uma exposição completa das intenções de Deus
em relação à humanidade. Portanto, seria necessário apenas que A Reforma em Zurique
alguém explicasse ao povo o que a Bíblia realmente dizia. O po- junto a seu
vo não poderia deixar de acreditar no que era tão evidentemente Desde o início Zwingli esforçou-se em insistir
apalavra de Deus e, assim, seria salvo e a vontade divina estaria público que não deveria hàver nenhuma violência contra quem
preciso tl,saT a
realizada. Zwingli tornou-se um perfeito evangélico, acreditando não aceitasse suas rnterpretações da Bíblia' Era
culpar os desin-
que todas as questões religiosas deveriam ser resolvidas afravés persuasão o tempo todo, potque não se poderia
as mudanças nas práticas
de uma correta interpretação da Bíblia. O que não tivesse apoio ioÀuaot po, ,ú ignorâniia' Portanto,
aos poucos' con-
na Bíblia seria inválido. religiosas em Zurique foram sendo realizadas
chados e seus rendimentos passaram para as causas
carltatlvas;
forme a maioria se convencia de sua necessidade. Mais ou menos
a missa foi eliminada e o Cônselho tomou-se o árbitro final em
em 1523, estava claro que essa mudança gradual não satisfazia a
ninguem na cidade. Os que eram a favor da Reforma impacienta- todas as questões religiosas.
vam-se com a continuação do que viam como práticas heréticas,
enquanto para os católicos ortodoxos as contestações às crenças
tradicionais pareciam não ter fim. As tentativas Para divulgar a
O Conselho procurava resolver a situação de qualquer for- Reforma de Zurique
ma. A decisão não deveria ser tomada com base no que era poli-
li par-
ticamente vantajoso, mas conforme o que se mostrara verdadeiro. (l Infelizmente para as perspectivas de paz na Suíça' boa
da Confederação decidiu resistir com ener-
Foram enviadas instruções para que as questões fossem discuti- ri te dos outros estadós
das diante dele, para poderem decidir que ponto de vista estava giu á ait*..inação dos novos ensinamentos, o que tornou
inviá-
correto. O resultado das Discussões de Zurique dejaneiro e outu- iel a estratégia inicial de Zwingli' Ele pensara que serla
bro de 1523 jamais foi posto em dúvida. Os representantes da necessário up"nu, que as pessoas reóebessem um bom ensino da
compreenderiam os elros
lgreja católica recusaram o convite do Conselho, alegando que Bíblia, ac.eàitundo que rapidamente
ãot p.âti.ut anteriores e se uniriam à fé reformada' Contudo'
se
leigos não tinham nenhuma autoridade para decidir questões reli-
não tinham acesso ao povo dos outros
giosas. Isso deixava o caminho aberto para Zwrnglí, que pôde ex- à, pi.guAo."t evangelicos
que a salva-
por suas crenças (mais tarde publicadas com o títlúo Sessenta e .rtãOo"t suíços, nãúeria possível levar a notícia de
fato era inaceitável para
sete proposiçôes) quase sem ter opositores. O que havia começa- çao .rtuuu gaiantida pu.á todot' Esse
do em 1518 como tentativa de produzir uma reÍbrma na Igreja, lwingli pã.u ,, personalidades políticas mais importantes de

agora alcançara o ponto em que era inevitável o rompimento com


"
irri{u",especialmente depois que Berna e 6uf1e estado mais
resolveu unir-se -aos reformadores em
Roma, finalmente oficializado em 1525, quando a missa foi subs- l-portarrt"'aa Suíça
tituída pelo Conselho de Zurique por um serviço inaceitável para
-
is)S. ego.u, cerca de um terço da população suíça vivia em es-
o papa. Naturalmente, a ruptura Íbra retardada por tanto tempo àaot quã continuavam católicos' Zwingli convenceu-se de que'
os pregadores evangélicos
apenas porque o papado fizera vista grossa a quebras anteriores fu.o tátuu. as almas desorientadas,
na disciplina da Igreja, pois não desejava afastar um de seus pou- ã"u"tlu* ter permissão para trabalhar em todas as partes da Con-
e que, se pr."ito, a força militar deveria ser usada' a
cos aliados políticos mais confiáveis e fonte de apoio militar. federação
Também havia necessi«lade de concentrar atenção em Lutero. fim de garanti-lo.
Nos territórios controlados por Zurique, as mudanças da Lãgo ficou claro que os estados católicos não aceitariam
inferi"oridade militar nem se entregariam de bom
grado. Ao
Reforma ocorreram com apoio geral da população e sem nenhu- sua
Ape-
ma perturbação política ou social. Os dois princípios que sus- contrário, começaram a procurar aliados que os apoiassem'
periuasiva àe Zwingli, havia pouco entusiasmo em
tentavam todas as mudanças eram que a Bíblia fosse a única sar da foiça
começar uma guerra ci-
autoridade religiosa, sua interpretação deveria contar com a par- ã.rqrr., ; a"no, ainda em Berna, para
foi declarada a guerra'
ticipação de todos os fieis, e o governo legalmente constituído ,i. fttoficou provado em 1529, quando
um mês os
deveria decidir sobre essa interpretação. Desse modo, com o má- conhecida como Primeira Guerra de Kappel' Durante
àois exércitos opositores ficaram um diante do outro' cuidando
ximo consenso e uma ruptura minima, os padres foram estimula-
p;;"r"ceàm dentro de seus respectivos territórios' A sim-
dos a se casarem; abandonaram-se as regras sobre o jejum; termi- ;;;; de sangue era suficiente para
nou a veneração da Virgem Maria e dos santos; altares, imagens it., p".tp""tiva de derramamentoseria fazer as pazes e procurar uma
e pinturas foram retirados das igrejas; os monastérios Íbram fe- .onvãn"ê-los de que o melhor
72

sobressaiu como reformador


evangéli-
solução para o problema através da diplomacia. Foi impossível, Quando Zwinglise e dar base a seus
pois nerrhum dos lados estava disposto a entregar-se, e em 1531 .o a pubúcar panfletos para explicar
" "Jr.iou pelos oponentes um heretico lu-
ocorreu a Segunda Guerra de Kappel. As forças dos estados pro- pontos de vista, foi considàtado
terano. Partia-se ao pttntipi" àé
q'" eie havia sido convertido
testantes eram muito improvisadas e foram surpreendidas com a
um dos muitos discípulos que
rapidez do ataque das forças católicas, numericamente inferiores. i"f", "or*"ntos de Lutero c eraidéias pelo mundo de lingua ale-
Esse ataque não passou de uma escaramuça, mas os protestantes ;;;;"d";inando ut ná"" imensamente Zwingli' que sus-
foram derrotados. Zwingli, um dos muitos pregadores presentes, r-rià:;t;" ússuposição ofendia independentemente'
morreu. Agora que o arquiteto da política da confrontação havia ;;;r;;;;; .il.guao a suas conclusões
mas afirmava que
monido, Zurique estava preparada para aceitar que cada estado Admitia haver muitos pontos de ser-nelhança'
quando chegou a Zurique' ele expôs:
da Confederação tomasse suas próprias decisões em matéria de ;;';;;"tncidênciJ
religião, e a luta acabou. Assim, a Reforma zwingliana foi detida. o Evangelho de
Ela sobreviveu no norte da Suiça e nas regiões vizinhas do sul da
[..'] como, se Deus quisesse'.eu q'"Sul:
humano ou comentário
Mateus ,"rn n"nl-'à-acrescimo qualquer coisa sobre Lu-
Alemanha, até ser intensamente obscurecida pela disseminação controverso. Ni";;;; ãíui suuia
indulgências'
do calvinismo na segunda metade do século. tero, a náo ,"r. ou""ã"'úÜiá" ttgo sobr" as

Mais tarde, Perguntou com amargura:


Zwingli e Lutero de Roma que na épo-
Por que os cardeais e representantes
de Zurique comeÇaram a me
Por que os historiadores se interessam tanto por Zwingli? ca estavam em nossa cidade luterano até des-
odiar e , ,n" ungu';J'l t"À
Afinal de contas, a longo prazo os efeitos de seus treze anos em "ontioerar-me
ãouiit". que Lutero era um herege?
Zurique foram bastante insignificantes. Ele não fundou um movi-
mento que tivesse grandes repercussões internacionais, nem seu
Dizia'.
pensamento teologico teve alguma influência especial no desen-
alguma vez ter ouvido o no-
volvimento do protestantismo. O interesse se deve mais a que sua Comecei a pregar bem antes de
vida e sua obra proporcionam aos historiadores um esclarecedor me de Lutero, p"ru"i.r. .àí".u1 úpr"nder.grego de. modo
de Cristo a partir das fontes-o^rr
estudo de caso que pode ser usado para iluminar aspectos das ati- ;;Ã;; o.
"n'inuÃ"ntos "Deves ser um luterano' pregars
vidades de Lutero e Calvino. Zwingli era quase exatamente um ãúri.. ó" papistas dizem:
"Prego exa-
exatamente o q'" L""'o escreve"'
Respondo:
contemporâneo de Lutero, mas como veio a público pouco tempo que Paulo escreve' por que- náo me chamais de
tamente o
o'nome de Lutero' pois li pou-
o"rri";;';t.1.1 Ná" ;;;;ó;rei
depois de Lutero, sempre houve a suspeita de que sua obra fosse
em grande parte imitação. Muito se discutiu ate que ponto o pen- co de seus e muitas vezes evitei intencional-
"nt'nurnãnto-t outro nome senáo o de
samento de Zwingli era independente do pensamento de Lutero. mente ler seus tivros' Náo tenho t?l.111.";.ainda que
meu capitáo, Crisio' de quem
sou
Os historiadores tambem se interessaram em compreender por 'l
qualquer homem vtvo'
que o luteranismo, e não o zwinglianismo, estabeleceu-se como a aprecie'Lutero tanto quanto
força dominante no protestanti smo. com seus pro-
Os paralelos entre Zwingli e Calvino são interessantes, é Os historiadores não se Çonvenceram-totalmente justo negar a
que não seria nada
claro, porque ambos fizeram um trabalho importante no mesmo testos, mas agora conÇordavam
torno p"ntudoiindependente' Tudo indica que'
país tão pequeno. Zwingli seu lugar
mesmo se Lutero não tivesse
existido, Zwingliteria seguido
minho reformador que seguiu. o ca_ transformava na carne de Jesus durante a missa. Contudo. era
ReJ; ;;;; de haverem os dois
se
homens chegado a concluJões inflexível ao afirmar que as palavras de Jesus tinham um signiÍi-
qrãr" iãcrriias em rodas as ques_
tões importantes, exceto
q ue Lurero conhecera
,rnu. l,ião há;;;; cado literal. Sua discussão com os católicos cra estarem scndo
z w in gri
bastanre elabora<Jas. Em.
q*,r#T,",Trr:ili:xl# simplistas demais e compreendendo de forma equivocada a ma-

raro com o pensamenro


coÀpens"rãd
".; ir.r,i teve algum con_ neira como o corpo de Cristo estava presente no pão. Zwingli ia
..t. t_ui.ro, ma;;;i;;rrr, mais longe: reieitava o argumento de que as palavras de Jesus ti-
vrncentemente, que não não muiro con_
tinha sido nír"n"ll.fo por vessem significaclo literal e dizia que haviam sido usadas em
As igrcjas luteralras c as zwinglianas ele.
sentido figurado -- ou seja, quando «lisse "e" Jesus queria dizer
.a m. s epu.ada r, up
suadir os dois líderes ",
;;
o. d ; á. ;il""l'#Íà
a "chegar ;.lm ;;;;;;:
,,il;,::
:;fi ilil
,i::. "representa". E.le desdenhava a distâncitr absr,rrda a que Lutero

roi Felipe de Hd... ;r;;;;#jJo


o pacificador mais chegara em seus esforços para demonstrar que sua interpretação
:Tl_oaanre o ponro em oue era defensável. De fato, as distâncias são tais. que ninguém sent
se encon r ra vam as
es fera s geográ Écas "ru
á.- i, tire*i""r;.
mo e do zwinglianismo,. ;il#,.::
e.'íipJ"rrrrr;;'um" Íienre prorestan-
uma excelente base em teologia poderia acompanhá-lo.
te fortemente unida para Quanto mais durava a briga, mais entrincheiravam-se os
cleter CarlosVl'ü p.ir.ip"s católicos dois lados. Quanto mais Zwingli parecia estar com a melhor de-
na tentativa de eliminar
as igre-jas
litar. Ele sabia que os protesiarite,
."f;"";;. com o poderio mi_ Í'esa, rnais determinado Lutero se mostrava para provar que esta-
se deixassem agarrar,um
,..r_ piu.a oportunidade, se va certo. Numa tentativa final para obter o consenso, Felipe dc
a
político nào era partilhado
um _ mas seu sentido dc realismo Hesse persuadiu os dois protagonistas a se encontrarem, diante
estava convencido de o,,o
f-r,"r". r*,rr,,, cada um deles
p",.
de paÍidários importantes. O encontro ocorreu em outubro de
eíbriaesiavaü*i:ff ".-o.*.-",,^':;'-l:l
"ffJ,f",,:'r:Br.:l'ü:.ffi.,1l:Hf 1529, no castelo de Felipe em Marburgo; havia expectativa de
disposro a mudar de opinião
,,il;
tava equivocado. mas nao.p.nroíu; ã .íirl"n."rre de que es_
se
i que, no momento em que estivessem um diante do outro, Lutero
e Zwingli conseguiriam discutir a questão que os separava para
I

niência política' Se uma ;;;,"


isso por conve_ chegar a um entendimento. Felipe ficaria desapontado. Nenhum
il

rirr'r,u no a"o.jo uuf.noua


dade de enconrrar morre. a possibiri- dos dois reformadores conseguiu convencer o outro. Tambem
prematr."
preferível o risco da condenação ;;;";;;;;
nesra vida, seria não estavam dispostos a aceitar que o outro fosse reconhecido
etema.
Em meados da decada ã" como "bom cristão". O encontro, conhecido como Congresso de
ram seus pontos de vista
isãô]", dois rados esraberece_
em publicaçá", a]JuiUriaus Marburgo, foi um fracasso.
mundo de fala alemã. Llrero, por toclo o Em carta para sua nrulher, anunciando o resultado do en-
gumenros com srandes
;;;:;ü,'"nt."luçou seus ar_
contro, Lutero indica onde estava a rnaior dificuldade:
porções de ,ili;;; di_rigidas a
Í_yliqll ::". ãmnosresposru,
corrcentrando_se Dontos
roi u""rirãã"r.r"
";bnsas
mais contido, [...] nossa amistosa conferência em Marburgo termina
em discussâo.;;; mentalidade
seculo XX, a briga pár....rn"rquinha. do agora. Estamos em perfeita união em todos os pontos, ex-
Girava ãm" torno
trcado de uma frase da do signi_ ceto pelo fato de que nossos oponentes insistem em que
Bíblia, ár.iúriar"" i"Jrl,no
clue parriu o pào na última ,o..nro em há apenas pão e vinho na Ceia do Senhor, e de que Cristo
Ceia: rn"u só está ali num sentido espiritual. Hoje o landgrave (Felipe
discordância de Lurero com :Cãil.;;"Jü"u corpo,,. A I

a lgreja rot." a _tsucaristiajá de Hesse) fez o possível para nos unir, na esperança de
Íoi tJiscutida. para ele. esraua
ãrráda"atOllla
u .r.nço ãnodoxa carólica que, embora discordando. nos mantivéssemos como ir-
tra irurr:;rrhsrariciaÇ.'ir .
rlc quc ,;;;;;;;;lr'rir* máos e membros de Cristo. Ele trabalhou muito para que
rcatnrenre
isso ocorresse, mas náo os chamaríamos de irmãos ou rl

I
i
membros de Cristo, embora desejemos o bem para eles e Uma avaliação
que permaneçamos em paz.
EmlíZgestavaclaroqueLuteroeZwingliseencontravam
Seus credos e
questões'
Numa narração mais detalhada do encontro, dadaporZwingli em p#i," ,áo.ào *u'ã'qtàte todas as na his-
uma Çarta para seus partidários, há uma impressão um tanto dife- "*
suas arirudes .,*,,i.]r. ã*uoru 9.luÀa1 que ocupam
".u* ;;;;; uma das personali-
rente: tória seja tão diferente' mal
""tsiderãao
*e",,to XVI' ao passo que Zwingli
dades mais importantes ão
[...] entramos na arena em presença do landgrave e alguns que essa enoÍrn€ diferença?
elembrado fora de seu país' Por na
máximo, umas vinte e quatro pessoas; luta- áxpticacão parcial baseada
outros
mos nessa- noe em mais três outras sessóes, perfazendo as-
É tentador or"'"ããt
"*á quando ele
sim um total de quatro em que. com testemunhas, vence- morte prematura de z;;;íi;;""nioa iustàmente
A primâzia de sua posição nos
mos nossa batalha. Três vezes lançamos a Lutero o fato de atineia o auge a. eo
que em outras ocasióes ele dera uma exposiçáo diÍerente ;$il";;.til;; "uo"'nn'ãn"ia' estava estabelecida
i'iç' p"testànte
sua reputação no sul da
Ale-
daquela na qual agora insistia a respeito dessas suas idéias congresso de Marburgã':'iãã*utu tivesse morrido e
ridículas [...] mas o prezado sujeito nada teve a dizer em ré-
manha. Podia-se u'g"ãJn*
q""' se Luiero
plica ser: "Você sabe, Zwingli, que todos os anti- uns. quinze anos' seus
- a náovárias
gos autores vezes mudaram suas interpretaçóes de 2**Àri sobrevivessê por mais ou menos certa credibilidade a esse ar-
trechos da escritura com o passar do tempo e suas opiniões papéis estariam inuertrdos' Faltaria po-
credol^clmuns' buscavam
amadureceram" I...1 Ele admitiu que a Eucaristia pode ser gumento. Ambos de Zwingli em
"o'nputtitt'uuamse erguia açima
chamada de "símbolo" do corpo de Cristo. Esses sáo líticas semelhantes, mas Lutero
exemplos de suas incontáveis incoerências, absurdos e muitos asPectos' p"t::'1t
loucuras; mas o refutamos tanto, que o próprio landgrave de Lutero sobre as
O mais evidente era a influência
agora passou para o nosso lado, ainda que não o diga em claramente um homem carrs-
q.," oãn"Jrr*utu*' cámo ele era
presença de alguns dos príncipes... Ele deu permissão para como "superior" sem envergo-
que nossos livros sejam lidos com impunidade e no Íuturo mático que os outros reconheciam partidá-
nhar-se, pessoas itu'tt"'-'"
dispuúam a agir como seus
não permitirá que os bispos que concordam com nos§as o que fez com que suas
idéias sejam expulsos de seus lugares [...] A verdade pre- rios e âte mesmo como seus discípulos'
átt'* t ao s ct'e!] ]f,cltl'
valeceu tão manifestamente, que se algum dia um homem ideias fossem,np ru-Int"""a"rlãa" com sua poslçao'
comprometidos
foi derrotado neste mundo, esse homem é Lutero
da sua ousadia e obstinação - por to-
e todos o testemunharam
que se sentiam pessoalmente
tuitót desses-úefes locais se dis-
- o julgamento tenha sido Isso significavu'u-oã- ã'"
também, ainda que, naturalmente, julgamento em questões controver-
punham a submeter-st u t"'
discreto e imparcial. Mesmo assim, Lutero continuou excla-
sas de teologlu, u""gti'u'do
á"Jtt modo- que.se mantivesse a na-
mando que náo fora derrotado, etc. jamais teve
et'angélicõ' Zwingli
tureza unificaau o" como
"i"ti*"nto tipo' Émbora recoúecido
No entanto, o congresso teve resultados positivos. Obte- uma autoridaa" p"'*ãi^ãttt" algo mais
po""os o consideravam
ve-se um consenso natural sobre todos os aspectos da crença, homem de grande sabedoria' conseguiu reunir um
oue um "primeiro ;;
Éle iamais
fora a questão da presença de Jesus durante a Ceia do Senhor. 'g';it;'como Lutero'
Embora Lutero tenha se recusado a açeítar os zwinglianos pro- üando de'seguidores dedicados
de Lutero juntg a9s :l*t'll-
priamente como cristãos, decidira não atacá-los por escrito. Não era upt'uJulnn"ência Zwingli'Lutero
de
Desse modo, pelo menos Felipe teve o conforto de saber que 1;ü;, ;;
"1"r"tla"i"ãt'
lue o distinguia
na mentalidade do
seus companheiros protestantes não estariam se atirando à gar-
"rir,
também estabeleceurimãl;t'tçã" fominánte
auxílio da imprensa'
povo em grande p"* A"if"manha'
com
ganta uns dos outros.
78

instmído para ajudar


Enquanto Zwingli e seus seguidores produziram um mínimo de Além disso, não contava com pessoal
Á'outu a" L"t"'o estàva centralizada
ta universi-
pubhcações, pessoalmente Lutero produziu uma inundação. A para'lit'
diferença não era apenas na quantidade; era também na qualida-
"r." ";;;;t;.
dade, em Wittenberg' Centenas de
rapazes eram atraídos
Alemanha e países vizinhos' Muitos
de: adequação aos objetivos. Os textos de Zwingli eram tranqüi- vindos de todas u, pu*"t-àu
estuai'j1111i-
los e tinlram uma argumentaçáo clara, mas os de Lutero se expri- ;;il;;;; i..ru'utut alpois de muitoí anos. de
luteranos' agindo como mlsslo-
miam nos termos rudes e diretos que atraíam o paladar e os te os quais se tomavam convictos
da dir'ulgação
preconceitos da multidão. Os folhetos e opúsculos de Lutero ;;;l;;-;"munerados' Pode-se traçar o caminho
os estudantes que voltavam
eram procurados com ansiedade, amplamente comprados e rapi- das idéias de Lutero acãmpanhando
Não havia.uma universidade em
damente passavam de mão em mão. Os de Zwingli não. ;;;;*"..,dade de witte;berg' implantado um meca-
As vantagens naturais de que Lutero gozava não podem ser ;;;;;;":;i*rngli moreu anies de haver de sua f1' nortlnto' ele não
ignoradas, ainda que não expliquem por que ele é considerado nismo para instruir o. simpati'antes.
em potencial'
historicamente bem mais importante do que Zwingh. Está claro tinha nenhuma reserva de missionários
um dos interessantes "poderia-
que mesmo sem essas vantagens Lutero teria sido a personalidade Zwinglifoi
",'"'"lA*ente Ele partilhava a mesma visão
dominante da Reforma no mundo alemão. Com elas, sua posição ter_sido,, da historia ao'rã"uro XVI.
t aiipicainsistência alemã de
foi ainda mais notável. A maior vantagem talvez tenha sido adqui- de Lutero, o que muitoJ "iu- "o*o
planejadas com cuidado e
oue a mudançu d"," otá*"r por etapas
1.

rir fama (ou notoriedade, dependendo do ponto de vista) muitos Í arecessidad" d:1,':"1
anos antes de Zwingli que, assim, esteve sempre seguindo sua tri-
f
]ã;ffi;üJ, p"üri"u'' sua ênfâse
conduziu
era
em uma reorlen-
lha. Como as mensagens dos dois eram muito semelhantes, foi ü
piinã. Co"t"qtientàmente, ele ?":1q* virtualmente sem
prática religiosa' obtidos
praticamente impossível paraZwingb criar uma influência distin- T iáçá;;" "r"áo " da Lu-
o-u g1an{es discórdias' Se
nenhum derramamento á" tu"gú
I
ta nas áreas em que o trabalho de Luterojá era conhecido. Ele ha- I modelo que
o
via encontrado boa parte de seu "mercado natural" já tomado. { tero já não fosse ,,-tp"t'oníidade;'nacional"'
poderia ter sido copiado em
Lutero tambem teve sorte na posição geográfica da Saxô- I Zwirrylt estabeleceu ei' Z"rique
nia, seu estado adotivo. Da base em Wittenberg, sua mensagem I grande Parte do norte da E'uroPa'
podia ser irradiada para as áreas densamente populosas do norte,
leste, oeste e sudoeste da Alemanha. A proximidade e a relativa
facilidade de açesso eram questões importantes numa época em
que uma jornada de alguns quilômetros poderia ser um grande
empreendimento, as notícias se espalhavam pelo boca-a-boca e
as idéias eram passadas através de material impresso, muitas ve-
zes levado por um homem a pe. Zwingli não teve nenhuma des-
sas vantagens: ele vivia numa remota região montanhosa, bem
na borda do mundo de fala alemã. Para que sua mensagem obti-
vesse mais do que uma circulação relativamente local, era preci-
so tempo, e tempo num momento em que o luteranismo já esta-
va estabelecido como ortodoxia protestante do norte e leste da
Alemanha e quando já haviam surgido líderes concorrentes no
sul. O zwinglianismo teve, assim, pouco terreno para expansão
fora da Suíça.
8l

Normalmente, os historiadores não se interessaram muito


pelos anabatistas, considerados uma espécie de grupo meio.mar-
girrat . meio maluco da Reforma que de vez em quando se-intro-
íretia na corrente principal dos fatos, mas raramente com alguma
Os anabatistas imporlância. Isso é compreensível: esses radicais tiveram um
pa-
p"i b"* pequeno na modelagern do resultado final da Reforma
l_ não fundàram nenhuma i'stituição que mais tarde se tornasse
pes-
importante e não deixaram nenhum registro que ajudasse os
quitrao."t. Não obstante, nos últimos anos alguns historiadores
norte-americanos passaram a se interessar pelos anabatistas'
Muitos são membrôs de grupos religiosos modernos, descenden-
e cheio de
tes dos anabatistas, o quã reiultou num trabalho sério
pup"i dot refbrmadores religiosos radicais na
empatia sobre o
européia ão seculo XVi' Contudo, há muito mais a fazer
trisiOria
Histórico unr", qrr. *u,1"* as atitudes hoje prevalecentes' Enquanto isso'
continuará havendo uma tendência a desprezar os anabatistas'
Lutero e Zwingli eram os moderados da Reforma. Muitos misturando todos como extremistas insignificantes'
dos que inicialmente os apoiaram logo se impacientaram com sua
Embora sempre tenha sido claro o perigo das generaliza-
ções indiscriminadas sobre um grupo tão desigual como o dos
cautela. Havia a demanda de urn rompimento muito mais radical
anabatistas, deve-se chamar atenção para as tendências comuns
com as velhas crenças e práticas. Dizia-se que o pensamento ini-
que havia entre eles, desde que se perceba que selnpre há muitas
cial não fora tomado em sua conclusão lógica e que assim deve- pessoas
exceções à regra. Por isso, devemos lembrar que poucas
ria ser. De 1522 em diante, essas idéias passaram a ser cada vez todos os aspectos considerados tí-
ou congregaçães se ajustavam a
mais comuns na Saxônia. No início não havia muita coerência
picos dãs ãnáUutittut. Ainda assim, é preciso fazer essas generali-
entre as vozes descontentes, que expressavam principalmente
,açOesparaobter-seumacompreensãodecomoessesradicaisdi-
opiniões individuais em pouco ternpo ficou claro que
feriam dos protestantes "centrais".
muitas pessoas compartilhavam um mesmo ponto de vista e não
estavam a fim de ser intimidadas e calar. Essas pessoas acredita-
vam estar certas e se consideravam escolhidas por Deus como
profetas para divulgar a verdade, o que começaram afazer.
Os aspectos diferenciadores
Esses reformadores religiosos receberam o nome coletivo
Lutero, Zwingli e seus principais seguidores eram evangé-
de "anabatistas", inicialmente usado para descrever os opositores
licos eromperam com Roma porque estavam basicamente certos
radicais de Zwingli em Zurique em meados da década de 1520,
dequeaPalavrareveladanaBibliadeveriaSempreestaràfrente
mas logo passou a ser usado para todos os que defendiam mudan-
dos ensinamentos da lgreja. Tinham uma interpretação acadêmi-
ças rápidas e amplas na religião. A palavra chamava atenção pa- Ça; eram estudiosos lutando para encontrar o significado
real de
ra o fato de que a maioria usava o batismo em adultos
um texto difícil, rancorosamente às turras com interpretações ri-
vo batismo ao contrário do batismo de bebês dos católicos, vais. Apesar de toda sua conversa sobre fé, eles eram muito inte-
-,
luteranos e zwinglianos. lectuaii e baseavam_se muito na lógica, à custa das emoções.
-.- tendia apenas a ser
Poucos dos anabatistas consideravam-se intelectuais e não viam do que entre católicos e outros protestante§
cristãos mais moderados açei-
pnmazia na Bíblia; acreditavam que Deus se comunicava direta- menos evidente. f,q"anto alguns
de todos' os anabatis-
mente com cada fiel por intermédio do Espírito Santo. Aceita- tavam que algrejap"t-ltlu Jparticipação
crentes' que haviam
vam que isso ocorresse enquanto se estudava a Bíblia, mas tam- tas acreditavam qrr, ,o*tn'" ós t'etdàd"itos
A. sua fé no batismo adulto' poderiam en-
bém estavam prontos para admitir a validade das visões e das ffi",il;;**""fro a proteger apÜÍeza de suas con-
vozes interiores. Em geral, reconheciam essas comunicações co- trar. Também estavam decididos
que se mostravam menos ardorosos em
mo a verdadeira Palavra de Deus, ainda quando estivesse em *rr*"t ãrputruraoososanabatistas se enceffavam em grupos ex-
conflito direto com a mensagem da Bíblia. Alguns chegavam a :";"fé. Desse modo,
considerar a Bíblia obra do demônio, planejada para agarrar o in- ;il;;;;q;", ,ru *.it'oiáus hipóteses' mostravam a catafechada
cauto na teia de Satanás razão por que eram bastante vulnerá- nara os de fora'
'"'" "o:;;j;t;vidade não se restringia
- de hábeis demagogos que reivindi- aos rituais religiosos-" A
veis aos delírios amalucados
mundo um lugar malig-
cavam ser mensageiros especialmente escolhidos por Deus. Os maioria dos anabatistas considerava-o
as costas' Procura-
piores excessos ocorriam quando esse tipo de vigaristas conse- ,"'ãir"i" de tentações, e preferia voltar-lhe os apoiavam em seu
vam misturar-se apenas iom aqueles
q-ue
guia um grande séquito que os apoiava.
ET geral isso implicava
Os anabatistas não eram nada originais ao adotar uma in- p-ri"ular àe comportamento'
"ãàig" fisico do resio da comunidade e o encerramento
terpretação mais espiritual da religião. Por mais de cem anos se I con-
"irt,?iãt,"
; auto_suficientes. Mesmo quando mantinham
"*à;à;.massa dos não-crentes' marcavam-se
tut;o*; como pessoas
roupas simples ou formas
muito diferentes. As vezes adotavam
i;rx*[t'pínnNç*t'-1çtr'í,'ffi | I
estilo de vida inteiramenie diferente,
geral' adotavam todo um
;;i;1"; purificadas, mas, de maneiragiiando em torno do traba-
p,uÃ'""t t'*u'"i"tução freqüente' A pieda-
lho pesado, poucos
artr§#T:Tl#riig"lx,,:'ffi:ffi:Í,'ffiilsi;t I I que às vezes. thes é atribuída' de
Muitos anabatistas tambem seguiam uma velha tradiçào do mile- I I terística. A imerecida
'"p*uçao sexual' foi adquirida em
narismo a crença de estarem bem próximos o firn do mundo .
- Vinda de Cristo. previstos na Bíblia. Essa crença leva- I I ir"iàrã, u.uedeira e ticenólosiàaae atípicos nas décadas de
conseqüência da ação à" t"ttot
grupos
a Segunda II
va alguns a acreditar que não havia nada a fazer, senâo aguardar ll l)JU.
1520 e) 1530.
pacientemente o inevitável e a material ização do Reino de Deus. ll b'ig"ái*"r,"
L -^- equívoco descrevê-los
tésatL'v"'e um c:T: "]1:Y:":
cen t"nut de sacerdotes radicais combateram
Outros persuadiram-se de que a Segunda Vinda só ocorreria no ,lIl
rrerdade que muitas 1E^Ê ^ com
^^^ ^6iêz^
certeza'
de 1524-1525 e'
*o-"rio em que todos os não-crentes estivessem mortos e ao lado dos camponeses na guera
- que tentavam livrar o
assim se prepararam para o que entendiam como obra de Deus, ;;;;;ü;t casos de grupãs anabatistas
I foram fatos excepcionais' res-
com espadas na mão e consciências esclarecidas. Visavam lavar ,l mundo de todos o, p""uão*', mas
anaba-
a maioria dos
os pecados do mundo com o sangue dos maus. ll tritos aos primeiros anos da íeforma' Para
Geralmente eles
Essa divisão do mundo entre salvos e condenados eslava ll ;i;;;;,;;á"-riolência "tu u* princípio de vida' do ata-
generalizada entre os anabatistas. Os salvos eram aqueles que não atacavam outros, e muitos n"*i"qo"t defendiam-se
ll literalmente o mandamento "Não matar"
e
concordavam inteiramente com as crenças do grupo de anabatis- õ.;;;ú;iavam-
tas que fazíarn o julgamento; os condenados eram os que discor- |
ll consideravam o sotrlmento de outros
como punição divina pelos
davám. portanto, a ;,"1ãll?à làr*** pecados que houvessem cometido'

_:1* 5
I

85

mais do 9u" ulg"T1:


A recusa em aceitar a mofte de outros em quaisquer cir- existem provas insuficientes para sustentar
mais pesqursas
cunstâncias era realmente uma negação da visão convencional, ;;;;i;;ii.t provisórias geneializadas' Comoo há
a.vanço de muitos
fortemente sustentada por Lutero, de que as autoridades civis ti- ;il;l;Jd talvez sejã possível mapear
o nome de anabatistas
nham uma responsabilidade concedida por Deus para garantir a ;;;;;t ;õ;iu.rlr,"uaot tom -'talvez
e outros' so-
manutençào das leis e a ordem e punir os faltosos. Na verdade, il"i"a" mit, te.tdo alguns existido por poucos anos
.,boa parte dos anabatistas recusava o reconhecimento de qualquer brevivido durante gerações'
o desequilíbrio
I autoridade, exceto a de Deus. Assim, não queriam fazer nada pa- Ao mesmo tempo, seria possível corrigir
bem documenta-
4 ra dar apoio ao que encaravam corno usurpação de poderes das nroduzido pela existência de diversos exemplos
mau comportamento de parte
Jautoridades civis. Nào se dispurrham a pagar impostos. servir ao ã;;;;;i;ente conheciclos de aumentaram bas-
dos anabatistas. Esses casos, muito divulgados,
Iexercito. ter qualquer cargo público ou fazerjuramentos de fide- que se verificavam
t";; medo e o oclio aos radicais religiosos,
!-tiaaAe. Agiam como se não existisse o govemo civil.
" todas as autoridades civis-da ópoca' Foram também os
quo..
"r, da imprensa que
;;;;[.t responsáveis pela divulgação negativa
As reações aos anabatistas ãesclc errtào os anabatistas reccberam'
Thomas Muntzer (1489-1525) foi o mais
notório dos pri-
radicais' Era um pároco que se havia tor-
E natural que não tivessem nenhuma popularidade junto meiros revolucionários
mas rapida-
aos ricos e poderosos. Para estes, suas crenças solapavam a pró- nàã;; dos prirneiros a apoiar Lutero naeSaxônia'
sua falta de interesse
pria base da sociedade; corretamente, temia-se que estivessem mente se clesiludira com a àutcla do líder
rompeu corn Lutero
encorajando a disseminação da desobediência civil e o fim dos ;;l;;-quesrõ"s sociais e políticas' Em.l521'
métodos tradicionais de manutenção da lei e da ordem. Sua pró- einiciouumabreve.,.,=i.ocomoagitador,pregandoqueaSe.
maus' os
pria existência ameaçava desordem e discórdia, já que sua pres- É.rà" deveria ser apressada pela destruição dos
íirJ"
bens deveriam ser
suposição de superioridade espiritual podia inflamar as paixões quais equiparava aos rico's' Dizia qtle seus
famosa relutância
a tal ponto que o ódio popular a eles cefiamente resultava em J"nfir."a"l e redistribuídos entre os pobres A
que fosse.p.rovado
violência. Ate mesmo Lutero e Zwingli, com seu desejo de agir á. er"a..l"" "* prnl,:l"ulquer pregado,r até suas idéias sem
através da persuasão delicada, acabaram aceitando com relutân- ;ig; ;;; ;le permitiu lue'M untzei defend.esse
alatme en-
cia que os anabatistas eram uma força por demais dilaceradora prãtr"-u, por tiês anos' irlaturalmente' espalhou-se o
para permanecerem vivos; concordaram em dcfender sua execu- il;t ;;; àsta,ram uà at vicla, o que atiaía -"n" ryb1:111*:
em uma ocaslao
ção, se se recusassem a abandonar suas crenças. Assim, foram .onrtatiu à causa da Reforma, especialmente dian-
perseguidos onde quer que estivessem. Milhares eram executa- ;;;ili., um de seus característitos sermões extremados
cle. Frederico' enviados pa-
dos, principalmente -- mas não exclusivamente nos Estados te de dois clos parentes mais próximos
relatórios hostis a ele' Foi ime-
católicos. Os que viviam em comunidades protestantes eram ex- ;;;r*iig;, a confiabilidadô dos ainda rrão estava acabado'
pulsos, em vez de mortos. Em parte alguma, a não ser em áreas diatamente exilado. Co"tudo, Muntzer
dos Camponeses em 1524 perrritiu-lhe pra-
remotas e escassamente povoadas da Boêmia, podiam ficar ex- A eclosão da Guerra
da violência e
postos por muito tempo. Criaram e mantiveram algumas comu- t;;;; lu" p."guru. Tornou-sà um dos expoentes publicara sua diatri-
nidades secretas rigorosamente disciplinadas, na Holanda, mas ;;;úô iluclonal, "ont'u uu quais Lutero as hordas de camponeses
de modo geral eram caçados em todos os cantos. Conseqüente- be muiio mal compreendida, Clontro
partidários à derrota
mente, não tem sido facil para os historiadores juntar as peças que ror'bam e matam' Depois de levar.seus
tortura<lo e nrorto em 1525' Sen
para obter um quadro preciso do que ocorreu a eles. Atuahnente írlfitri, foi preso, brutalnrçnte
t .l7l

ódio irracional contra o conjunto da ordem estabelecida não era Conclusão


de modo algum característico de radicais religiosos, embora fre-
cottvctltrlo ' '
qüentemente seja descrito como tal. Os anabatistas continuaram conquistando
suas conBregações, apesar de toda a pcfscli(llç;ri)
Ainda mais estranho e prejudicial paÍa a reputação dos mantiveram []aix.s.
norte dos Paíscs
anabatistas foram os Íatos ocorridos na cidade de Munster, no ÉÃ-uigu.u, regiões, óspãcialmente ao (Holanda)' viviam gran-
u. i'ouincias Unidas
noroeste da Alemanha, em 1534 e 1535. Um grupo de extremis- ;;;;;;;;.u,í graças à boa vonta-
tas do tipo de Thomas Muntzer conseguiu converter os líderes da des números deles em relativa tranqüilidade'
que. fingiam não perce-
cidade à sua causa. Na época, eles podiam oferecer um raro por- ãã"ià -"giurados locais simpatizantes'
só durava porque eles
to seguro aos revolucionários sociais de todos os tipos, especial- ber sua existência. coni"Jo, éssa situaçãó
se atinham uns aos outros sem
antagonizar a vizinhança' Somen-
mente os que acreditavam no derramamento de sangue antes da grandes
Segunda Vinda de Jesus. Os cidadãos que não compartilhavam ;;;;;;ã" -e quase invisiveis' o qie só era possível em
escaparam à des-
esse entusiasmo fugiram ou foram mortos. A reação dos prínci- áreas urbana., qrre muitos grupos-unubatistas
pes, leigos e eclesiástiços, católicos e protcstantes das vizinhan- i.lõ. ô; q* nao tt'- J"g"ridos pela disseminação
apenas
*.:*-
consegulram garan-
,iúo n, segunda metade do século
ças foi igualmente hostil. Convocou-se um exército associado e para a
Munster foi sitiada. ii, u de suas crenças particulares partindo
"ontiníução
America do Norte com os primeiros -colonos'
A história mais conhecida que transcorreu foi que a cidade teologia tão
se visse abandonada à fome até entregar-se. Jan Bockelson, um al- Muitos grupos anaüatistas ofereciam uma
como a apresentada pelo
faiate holandês, estabeleceu um poder ditatorial sobre a popula- coerente e espiritualmlnte satisfatória
não foram capazes de
ção. Declarou-se rei e implantou o que imaginava ser um regime catolicismo ou o tut"'ut'i'-o' Entretanto'
em que não havia
fazer uma contestação ei"tiuu nu*
período
de esplendor do Velho Testamento, com todo o luxo que a cidade
luta das ieligiões só poderia haver
podia proporcionar. O excesso de mulheres foi resolvido com a o.Jiaã lr"imediária' Na A tolerância religiosa era vista em
introdução da poligamia compulsória. Desapareceram a lei e a or- vencedores ou perdedores
de consciência
dem, com exceção dos caprichos do rei Jan. Os fortes abusavam p.eral como inaes".lauet e inviável' A liberdade
flnal do século
dos fracos. Todos os tipos de vícios se espalhavam. Naturalmente, :;';;;;;;;'u* ü'uao organizado comum.no
em estabelecer-se como orto-
tudo isso era caraçteristico apgnas de uma pequena minoria de iüflr. ó r."casso do anaütismo pequenas e bem localiza-
doxia em áreas qr.re não fossem muito
anabatistas que acreditavam no fim do mundo próximo e que não
importava o que se fizesse nesse meio-ternpo, pois Deus já havia das resultava, p"à, da natureza fragmentária do movimen-
deçidido quem estaria ou não salvo. O receio dos instruídos ou ;;, ;;;á; "rn
p.rniiia ;;'h;' coerêncã global e' em parte' de
na luta pe-
dos ricos de que a civilização tivesse apenas a espessura da pele e il;g"*àlizada de seus membros em envolver-se
estivesse sempre sob risco de ser destruída parecia confirmar-se. 1opoder politico. Et;;;, iu*bem' devido às vantagens políti-
cas de que o luteranismo gozava'
Quando a cidade finalmente foi tomada, as forças sitiantes entre-
garam-se ao pÍazeÍ de caçar e matar todos os sobreviventes. Foi
quase uma limpeza ritual depois da conspurcação:, Era como se o
anabatismo fosse uma praga, cujos vestígios deveriam ser inteira-
mente eliminados para que as pessoas pudessem sentir-se nova-
mente cm segurança. Ate o final do século a simples menção de
Munster bastava para provocar em muitas pessoas uma hostilida-
de instantânea e impensada contra os radicais religiosos.

fl
\r
l'tltcro' l'rt'tlt't t"'
príncipes alemães. Com sua recusa a entregar
de poder qtrc ('\rslr:r rr;r
;;;ü;; p.rtrr.uu. o delicado equilíbrio territoriais' llavilr rrtrr
Alemanha entre Carlos e os governantes tit'
usassc a falta de coopct'rtçii.
o.ri*ã t.ãr á" qr" o itftt'aã'
A poltttça do luteranismo eleitor como desculpa [aà inuuAi'
a ganhar e
a Saxônia - e ató
muito
O"nn,
a-perder com seu apolo il
1'].
Frederico tinha pouco
tãô.convicto dos ensitrzr-
Lutero e nem sequet "tí u* seguid-or com idéias ca-
mentos dele. Até sua morte, t*
I SZS' continuava
a venda de indulgências e aceitar
tolicas: custou pu.u uUuJãnar que havia
incontáveis santas relíquias
o desmérito espiritual dás
colecionado co* tanto ãiãáao'
Nao estava disposto a agir até
anos'
;;;;il;vencido de sua correção' o que levou alguns
aberta' UiOu-]:,,1in-!1
Entretanto, manteve t;;;t u
"'i"çu
alguma possibiii«lade de que Lutero talvez esttvesse
houvesse
não quis abandoná-lo'
--'"-"í;
certo,
Por que Lutero sobreviveu? príncip" tn"l:!
Lutero estivesse no territorio de um :?
poderia esperar que multos go-
destino teria sido outro' Não se
cle'um edito imPerial sem terriveis
Teoricamente, Marlinho Lutero era um pária social no mo- vernantes passassem p;;;;" um dos
mento em que desapareceu ao voltar da Dieta de Worms, em maio
ü;ii;;áJ;; r.'9"i* estava em boa posição: sendo
membro de um grupo de eiite de go-
de 1521. Estava sob o banimento imperial: perdera quaisquer di- sete eleitores oo *p"tià, ".ai"nuentia
reitos à proteção. Todos os cidadãos do lmpério deveriam ajudar tgu era grande' O imperador
vemantes territoriais quer
em sua dctenção, se pudessem; não seria crime assassiná-lo. Era gtupo antes de empreender-qual
;;i ;i;;;"r;ordâr.rçia át"tt cuidado em nào pefiur-
uma situação gravíssima. Frederico, o Sábio, não exagerava na ;;;ããJ;.*; imporrârrcia e tãmava muito mais' Frederico gover-
cautela com que insistiu que Lutero desaparecesse totalmente da ;;:ü;, utna Éxcelenteraziao'Além e<1orico;.conseqüentemente'
vista do público; chegou a deixar claro que talvez não fosse o bas- ;;; ; ;"do telativamente grande
de ma-
tante, que teria de entregá-lo ao imperador se a pressão política se pãài" a.f"ra".-r.' po'l"o tam"bém era dificil ameaçá-lo
nem isso fosse o
intensificasse demais. Não era habitual alguem sobreviver por neira convin..,-'t" ., -esmo assim, talvez
muito tempo depois de estar sob o banimento imperial. Lutero
-
bastante, devido , t"' pt"tiiglo
pessoal' Epítetos como "o Sábio"
parece ter sido muito justo no
conseguiu: viveu na Saxônia, fora da prisão, nos vinte e cinco não eram adquiridos iacilmãntá;
ô mais notável governante.na
allos que se seguiram. Por que conseguiu? caso de Frederico, considerado
opi'iots deviam ser respeitadas'
E claro que, especialmente nos primeiros anos, muito de- Alemanha, ,r* ho*"l* tujàt panos plane-
Antes da eleição de Carlos í' eiá
esteve por trás dos
veu ao apoio recebido do governante local, Frederico o eleitor
sobre o título imperial;
da Saxônia que, propositadamente, deixou de levar-adiante os j;;il;;;;, á oo,"iti" ãos'Habsburgos
algúem capaz de coordenar o
termos do Edito cle Worms e providenciou um santuário seguro seu nome tora apresántaào "orno
apoio geral. Era um u'"úo
poattotn-p-1T-^L:ltto - o imperador
para Lutero num de seus castelos -- Wartburgo enquanto fa-
-
zia manobras poiíticas para remediar a situação. O apoio de Fre- .àriu úiudo se fizesse alguma coisa
contra ete'
Frederico era um tábil político' U.tilizou todas as vanta-
derico era firme, mesmo quando seria melhor entrar na linha, qualquer ação decisiva de
conformando-se aos desejos de Carlos V e de grande rnaioria dos gens de sua posiçao"p"t áif*-ftar

i
90

Canlos e tinha especial cuidado


em assegurar que jamais ficaria
sem espaço para manobra,s. dade e não de força. Ele não conseguia dar suficiente atenção ncrrr
adianre, em yez d"
Sempre p.ípuntu
r:rp:19?. o, ;;il;
.áutiiàtilo, "lfuuma recusa às situações de emergência que apareciam com monótona regula-
definitiva. Sua principat tática ridade, muito menos resolver as deficiências estruturais de sous
era ãiz;;; "o_
ensinamenros
Lutero deveriam receber uma de
",
reflexâo mJis culaaaosa do que até
territórios que os tornavam em ceúos aspectos quase ingovemá-
então haviam merecido.. n".o..iu veis. Carlos preferia peÍrnanecer na Alemanha para acompaúar o
tra o dominio italiano da_ lgreja
álJr".*rO" insatisfação con-
Edito de Worms, garantindo que suas instruções fossem fielmente
fosse decidido na "ãiãii.",'p."pondo que o caso
Alemand;;; c;r"rlí'o" cumpridas, mas viu-se obrigado a ir à Espanhatratar de rebeliões
ra a maioria dos alemães, parecia Igrga alemã. pa_
;; que ali ocorriam e só retornou à Alemanha em 1529. Além do
mente por haver parrido dé
;;j, razoâvel,especial_
mais, durante boa parte de seu reinado, esteve envolvido numa lu-
um de ,"u, li-áâ
que sempre maniiestava o
metidos dentro da Igreja, e
desejo d"il;;ÍbffiHJ:itX'.'": ta com a França pela predominância nos negócios da Europa, o
nã";";;ub.i..*"ra de uma organi_ que levou a gueffas demoradas e dispendiosas, principalmente no
zação altemativa. Ao convocar norle da Itália, o que exigia grande parte de sua atenção.
um Conselho Eclesiástico
manha, Frederico faz. na Ale_ De tempos em tempos, era também forçado a desviar sua
nopassadoe,".r.ãJí,lxà'",i:lrilH:fiHTi"#:xf energia para deter o fluxo da expansão do Império Otomano. Era
co responsável pela tomada
áe ae.iso"s erl q-u"rto", de
;,s*i: preciso agir para evitar que os turcos dominassem o Mediterrâ-
práticas. propositalmenre, crença e neo, mas, o que era bem mais grave, também era preciso enfren-
ete ;i;;;;;;rrassunros,
causa de Lutenr u.".::11,__"na, unindo a tar a possibilidade de que parte do próprio Sacro Império Roma-
tava-se o tempo todo como pessoa
,""à*lrla antigos. Apresen_
razoávelãtra, d" uma solução no caísse sob o controle dos muçulmanos com a expansão dos
razoáyel otomanos pelos Bálcãs, ameaçando a pátria de sua família
-_ essencialmente, uma verdade. -
os
A contribuição de Frederi"" Habsburgos na Austria. Esse problema tinha um significado
grande, principalmente em.termos ;;;'u causa de Lutero foi em relação à-sobrevivência de Lutero e do luteranismo, mais do
au gu.urtiá do tempo e espaço
necessários para obter.apoio. que seu valor como distração para a atenção de Carlos. Significa-
No causas também
";d;;:;;;.as propriu
contribuíram para a sobreviuên"ir-;;;;"àã'a va também que era obrigado a eÍlcontrar uma solução conciliató-
da situação o favorecia-:.a natureza
inércia;r;;; polírica do impe_
ria com os príncipes luteranos para conquistar seu apoio na luta
rio durante o século XVI; era quando deveria puni-los pela apostasia ao ca-
difi;il; fr;á."quutqr". coisa. A contra os turcos
tarefa de Carlos era bem
mais delicaãáil;; a de Lutero _ tolicismo, pagava- o preço de concordar com a heresia para obter
que o imperador rinha de já um apoio militar. Não que fosse hipócrita, quando afirmava con-
obrer u .;;;;r;âpuru
tinha apenas de assesurar que agir e Lutero
nada u.oni".Jrr.. Com sisremas siderar um dever a defesa da unidade e pureza da Igreja católica
de comunicaçào precãrios,
;-;.;ü;;,i;;", embrionário e
essa foi evidentemente uma importante força motivadora du-
-rante todo o seu reinado: o caso é que Lutero era praticamente a
uma série complexa de direitos
adqurridos p.o.
roOo lado, Lutero
evidentemente estavâ em- situaçãó menor de todas as suas preocupações.
vantajosa. O prevaricador
mais resoluto ou o manipuluao.fraúl Não obstante, em alguns momentos Carlos dedicou toda
de vencer
,"_ià"ürn" possibilidade
asnegociações-com uma autoridade atenção ao problema dos luteranos. Mesmo assim, não conseguia
superior.
Para piorar tudo. grandes resultados; estava sempre confuso na etema controvérsia
ridades conflitantes. De certa
*r"", ,"rpi" ãnÍientando prio-
^Carlos
maneira, o Aio à" gouernar de definir até onde o imperador tinha direito de interferir nas
pério pessoal tão extensr um im- questôes internas dos territórios que constituiam o império. Ele
;;;,ü
àn de; do - ;e ""'J#,
ff ffirfff"ff#?#T#:ffi l não foi capaz de estabelecer na Alemanha nada parecido com o
grau de autoridade que os reis da França, Inglaterra e Espanha ti-
9l
92

pollcos' inclusive Lutero' che-


nham sobre seus domínios. Alem disso, os governantes territo- papa, nacionalmente' Entretanto'
de uma nova lgreja - sua
riais da Alemanha estavam determinados a não permitir que essa saralll a pensar no t"uútlt"imenio a católica' Espera-
situação mudasse. Para todos os efeitos, consideravam-se gover- ffeia'; I.áiã,".'u au u''"uigt"iaco'hccitla:
fileiras'
nantes autôr.romos de seus territórios, com o direito de dispor tu- ;;;f-.t isso dc dentro de suas ítot esperando a concordância
do como bem dese.jassem, dentro de suas fronteiras. Assin-r, Contuclo. nao p'"iJ'"&'nt
qualquer ondt losse pos-
cle Rorna antes de p'n"tguit'
Enr
quando Carlos tentou agir contra os que apoiavarn [,utero. desco- Y9,1t fosse a elimi-
u *uaunça Áas práticas'
briu que os príncipes católicos teoricamente seus aliaclos natu- sível obter apoio local p'?u regras
nas igrejas' o abandono das
rais muitas vczes não tinham grande entusiasmo por sua cau- nação das pinturas t 'tãgtnt cra emprcendida' As
-
sa. Apegavam-se com certo ciúme ao direito do governante de do iciurn ou algutna ouiã
qut"aula'açao
mas de modo gc-
local'
agir como tlem cntenclesse dentro de seu próprio território, e ao u.r.r, .o,n a concordânc'il io gouttn'nte para detê-la' Em cen-
ela inrpotente
lresmo tempu receavam que o auÍnento no poder do imperador ral isso acontecia porque ele
cantósda Alemanha havia
resultassc num ataque vitorioso aos centros do luteranismo. Sus- tenas de cidatles uratã íãt'*":'::
" sem coordenaÇão e com
peitavan.r que os exércitos usados para restaurar a ortodoxia reli- começado uma Retorma Lxtra-oficial'
lugares' as tnudanças "'lT-*::
giosa seriam mais tarde utilizados para impor a vontade de Car- resultados variarJos' Em muitos
corrseguiam fazer senttr sua
los sobre todos os estados clo imperio. t"f,"t?"*a" ã' "ntftt' à distânciã'cliversos govemantes eram no
Essa divisão politica nas fileiras tlos católicos gurantia uma ;ilü;localidade' Corrtudo'err seus territorios pouco se fa-
*ínin.,o benevolertes ; "*i;;;,
das reformus-^- tt ttu isso
solução menos rápida para o problema de Lutero, ainda que. na- que o
turalmente, r.rzio assegurzrsse o estabelecimento dc uma Igre.ja lu- zia parainibir a Ait"'ilu*fao mudanças fo-
povo desejava. EIn algur-rs íugo"t'
essas-primeiras
terana penxanente e isolada. Isso só ocorreu porque Lutero, seus
partidários e seus aliados capitalizaram em cima da longa pausa Iu,, u.* áoc um"ntauà'' n.'ot"tt *:i11 li: :'XT;
( [*T:::;
5:t
proporcionada pclas manobras de Frederico e as clificuldades de ríos historiadores, há muitas comprovaçoes muito
Lutero esteve pessoalmente
Carlos V. em Wittenberg, onde' é claro'
;;;i;il,-.."úora inicialmente a uma certa distância' em
geral que ss tornou comuln
Os fatos seguiam o modelo quando se fa-
O estabelecimento e a disseminação toclas as cidades t
;;â;;"t da, Alcmanha
'rati""' a tcologia de Lutero à
prática' Um pe-
do luteranismo na Alemanha ziam esforço, putu t*ut
geral liderados por algum pa-
queno grupo .le r"tormldáàt' "Ã
dos textos de Lutero' tentana
Quando Lutero saiu de cena cm maio de I 52 l. não existia
il;';,ã-,!u""t titto '.'.t'itos que não se envolviam de que se-
nada chamado "luteranismo". Por toda a Alemanha havizr um in- oersuadir a maioria ou'^f"t'oot por meio dos
calculável grupo de particlários, que em geral não o conheciam H;H,Jil;"i"rt ttl"t "t'aonçot ttto sc fazia basta-
lorça tle scu cntttsiasmo nonnalmente
sermões públicos' '\
pessoalnrente. Entrc esses seguidores, os sacerdotes e estudiosos para dar continuidade ao mo-
va para conquistar upàio tunti"rltc quer
foram conquistados através de suas publicaçôes teológicas que, ser introduzidas e quem
para muita gente, trazia respostas convincentes para problemas vimento. As mudançàs teriam-de de violência po-
por am€aÇas
de fé que havia muito os perturbava. Aos leigos de toclos os esca- que objetasse u ttu' àiu intimidado entre si em por-
concordavam
lões da sociedade. do príncipe ao camponês que cm certo pular. Raramente os-rJbrãclores para resolvê-los'
a Lutero
menores c multas "I"'-""o"iam
a submeter-se ao veredito
senti«lo o consideravarn um herói ele atraía como contestador c
-.
dos abusos dentro da lgreja, cll-erecendo uma perspectiva de alí- Mesmo assim, algunlãt"tuto'u'-t permanecer e
cidade' eÍn vez de
vio das cobiçosas exigências financeiras dos cleros locais e do preferiam mudar-se para outra
de comunitlatlt:s tt'lot ttt:t
adotar práticas com as quais não concordavam. Dessa maneira, Como esse banclo desorganizado
as idéias reformadoras eram levadas a lugares que não as conhe- **ã'iu se manter diante da hostilitlirtlt'
das reunidas pelo acaso
e l1a prolirll-
ciam muito bem, e o proÇesso ia em frente. do imperadorf f,- parte, a reJpc'sta está na extensão
gozavam' Nos
a Re.forma
Em Wittenberg, tudo isso aconteceu em 1521-1522, en- ;idilil;o"io popular de que Luteronecessário executar dezenas
e
sido
quanto Lutero esteve em Wartburgo. As imagens foram retiradas *ãràãt à"-ãecaàa de 1520 teria
de mill'rares ae prottstanl"s uni"t
at ser possível a restauração do
das igrejas; a rnissa era parcialmente rezada em alemão e a con- fosse difícil' essa
gregação recebia o vinho e o pão; os vinte e cinco sacerdotes que ptr-rã" ãã .uiori.i'*o' ôontudo' ainda que cofflo os séculos ante-
só rezavam missas para os mortos foram obrigados a encerrar seu execução em massa naá s"tia impossível' inteiras' ex-
o rnut'ucre de populações
riores demonstraram
trabalho; os padres se casavam; os monges foram persuadidos a "o- não-muito diferente foi
abandonar os votcs c deixar os monastérios; usava-se o tumulto terminadas por heresia' ÜÃu uÚotaugtrn dos
adotada na própria 'q'r"Àá"hu em
tiZs' ao f,rnal da Guerra
para intimidar quen'l fizesse objeções. Frederico tentava abrandar
o fator decisivo deve ter sido o mesmo que
as coisas, proibindo maiores alterações até obter-se um consenso
ôuÀpon.r.r. Pàtanto,
contra os protestantes'
geral, mas boa i"rarte dos reformadores não o aceitava e o conselho evitou que se organlzasse uma cruzada número de go-
Esse fator o uptlo obtido por um grande
da cidade decidiu ir contra o eleitor e convidar Lutero a voltar pa- ",u
vernantes o.guni'uçã"t Oot
go'"tnot.territoriais' Estes não
ra Wittenberg, o que ele fez de bonr grado, embora soubesse que " retardador das d"]]!:T-n^:t:
atuavam apenas,o*o-Ãttuni Jmo postertores a
Frederico nada faria para protegê-lo se fosse preso por alguérn anos imediatamente
leal ao imperador. A influência pessoal de Lutero fez com que
,r"*n;.":: iuto. uitut nos
cada vez mais comprometidos
Dieta de Worms - tnu' estavam
num instante ele conseguisse persuadir os cidadãos rnais impor- rrt".unu,-ãu fàtta que Frederico' o Sábio' jamais
com a causa os próximos
esteve. Em 1525 in,i*tÁ' distritos'
tantes de que a mudança deveria ser mais lenta e apenas quando especialmente
sua necessidade fosse amplamente reconhecida. Com isso, alguns mistura de congregações católicas'
à Saxônia. era uma enoill1es
dos reformadores mais atuantes resolveram deixar a cidade para ir "onlpià*u
complicar ainda mais' havia
luteranas e radicais' Paia tipt-'' A s't-
em busca de algum ambiente mais solidário nos arredores. Entre do meslno
variações até mesmo entre congregações Na
tãtoi"' da época' inaceitável'
eles, Andreas Carlstadt, um dos colegas de Lutero, professor na tuação era caótica t, Auãot o' ha-
d:: poderia
época era voz corrent;;;;, t*
universidade e um dos que o apoiaram desde o início. tuau t'^*
Fatos semelhantes ocorriam ern centenas de cidades, al- o'guni'ução -:*odos'
religiosa se se desejasse
ver apenas .rr,
estranho
manter a boa ordem puti*à:
deias e vilas no decorrer dos três anos seguintes. A maioria dos "on;trn-to-ã" não muito mais
de que t"-T:T:-
l:-1:
reformadores buscava a liderança de Lutero, embora no sudoeste culo XVI do que a nossa pressuposiçà9 ltol "
Tornou-se' pols' ne-
da Alemanha houvesse acentuada tendência a que fizessem seus ;""" ; demoàracia não possam coexistir' territórios abrigavam uma
próprios caminhos. Lutero respondia prontamente às inúmeras cessário que os governántes cujos
passassem a considerar a
solicitações de conselho, recebia rnuitas delegações, escrevia maioria de comunidad.s .efo.mâdas a se converterem
uma enoÍrne quantidade de cartas e publicava tratados sobre as p"ttiurrrã"a" dà obrigar todos os seus súditos
questões mais discutidas. Era especialmente rápido ern responder ao luteranismo'
Albrecht de Ho-
por escrito aos que discordavam de suas interpretações da Biblia, O primeiro príncipe a dar esse pu:to .i"i
Teutônicos'Os Cavalei-
por mais insignificantes que parecessem essas diferenças. Desse henzollern, g.ao-tt'i'"' Jos Cavaleiros
ordens militares que ha-
ros Teutônico, p"t"n"iu* a uma
das
modo, sua influência sobre os fatos emanava de sua autoridade para retomar
lgreja na ldade Media
natural informal. Ele não estabelecia nenhuma ligação fonnal ,iao estabélecidas pela
junto ao grupo de refonnadores evangelicos de toda a Alemanha. "iã,,
os teritórios dos pagaos q" i*àuçuuam a cristandade de todos
os lados. Eles haviam resistido à invasão dos eslavos ao leste da tuídos rejeitavam o conceito de uma cristandade unida e constl-
Alemanha e obtiveram o controle de parte do que e a Polônia mo- tuíam sua propria Igreja, rivalizando com a romana. Faziatn isso
clerna. Albrecht tornou-se luterano em 1525 e, a conselho de Lu- contra a vontade expressa de seu soberano, o imperador do Sacro
tero, dissolveu unilateralmente a Ordem, declarando-se gover- lmperio Romano. Desse modo, corriarn o risco de screnl ataia-
nante hereditário de suas terras, com o título de "duque da dos e seriamente enfraquecidos, se não derrotados. Ate hoje não
Pússia". Esse "início" não muito característico foi seguido por se tenr a certeza de que estavam dispostos a chegar a esse ponto'
declarações a favor do luteranismo da parte dos príncipes mais A única explicação aparentemente razoável é que as pessoas inlc-
próximos ao centro da fuea protestante. A partir de 1526, o cami- ressadas acreditavarn vigorosamente na Íé reformada c dispu-
nho passou a ser conduzido por l-elipe de Hesse, que se conside- nham-se a aceitar as conseqüências de seu credo. Naturalmente,
rava o líder politico da causa protestante pelos vinte anos seguin- isso não contradiz a possibilidade de que muitos tambem cstives-
tes. João, o sucessor de Fredcrico. o Sábio, tambérn se dispunha a sem motivados pela cobiça e o interesse próprio'
envolver-se e em 1521 o eleitorado da Saxônia era efetivamente A probabilidade de que o interesse próprio fosse uma gran-
luterano. Diversos príncipes seguiram esse exemplo. Embora de motivação se fortalece quando se reflete sobre o que acontecia
nem sempre tivessem estados muito grandes como o conde de fora da Alemanha. O luteranismo conquistou convertidos em
Mansfeld, em cujo território Lutero havia nascido , consti- quase todos os Estados cristãos da Europa; apenas na Suécia e na
tuiam uma significativa força política <Ientro do imperio. Em to- Dinamarca se tornou uma lgreja estabelecida, como ocorreu em
do caso, seu número foi imensamente superado pelo do grupo de tantos E,stados alemães. Na França, E,spanha, Inglaterra, nos Paí-
cidades imperiais que no final de clécada se tornaram luteranas.
ses Baixos e na Itália os lutcranos convertidos eram assassinados,
Nesse grupo estavam muitos dos grandes centros comerciais e fi-
obrigados a fugir ou a esconder-se. A cliferença só se explica em
nanceiros ricos da Alemanha. Seu prestigio era grande e seu po-
função das atitudes distintas dos governantes. Na Suecia, o rei
der, considerável. De modo geral, tinham capacidade para prote-
Gustavus Vasa, que lutava para se estabelecer, precisava deses-
ger-se, com cidades muradas bastante invulneráveis à tecnologia
peradamente de maiores recursos financeiros. Ao aceitar a Refor-
militar da época. Havia cerca de oitenta e cinco cidades cuja rei-
ma luterana em 1527, ele pôde tomar todas as vastas terras da
vindicação do status de Cidade lmperial pelo qual elas não es-
- senão a do imperador Igreja. Na Dinamarca, o rei Cristiano III, cujo direito à Coroa es-
tavam sujeitas a nenhuma outra autoridade
tava sendo contestado, obteve grande apoio popular na década de
reconhecida. Mais de cinqüenta dessas cidades declara-
ram-se a favor da Reforma, embora nem todas aceitassem ser 1530 ao adotar o luteranistno e despojar e expulsar os eclesiásti-
classificadas como luteranas. Com base tão sólida de apoio polí- cos existentes, que eram ricos, poderosos e imensamente odia-
tico real, estava claro que no final de década de 1520 o protestan- dos. Em compensação, os dcmais governantes da Europa oriental
tismo só poderia ser eliminado à custa de uma grande guerra ci- não tinham nenhuma necessidade cle adotar a nova religião' Já
vil. Esta seria muito diferente da Guerra dos Camponeses, na dispunham de considerável poder sobre a tgreja em seus territó-
qual todos os que detinham autoridade se uniram contra súditos rioÀ e não tinhan-r a menor necessiclade dc aliar-se às camadas in-
rebeldes e violentos. Nesta, a questão seria o imperador tentar termeiliárias da sociedade de onde vinha boa parte do apoio a
Lutero
-
contra uma aristocracia cou excesso de poder, como
impor sua vontade a muitos de seus súditos mais importantes pe-
lo poderio militar. Carlos não poderia esperar muito apoio.
-
aconteceu com Gustavus Vasa e Cristiano III. Podemos discernir
Era notável o fato de tantos príncipes e cidades imperiais um moclelo assemelhado mesmo dentro da Alemanha no sul,
muito- influen-
disporem-se a aceitar publicamente a Reforma. Pela primeira vez onde Carlos V e seus parentes llabsburgos eram
na história da Europa os governos de Estados legalmente consti- tes, o luteranismo Íbi mais restrito.

J
A procura de uma solução Qr"rando Carlos voltou novamente sua atençào para os ne-
gócios da Alemarnha em 1530, foi com o objetivtl principal de
E muito tentador que, beneficiados pelo distanciamento do conquistar o tnaior apoio possível, tanto em tenxos de homens
tempo, nos deixemos cair na armadilha de pressupor que era ine- d. dinheiro, para uma gueüa contra os turcos' No ano ante-
"olrrà
rior. os turcos haviam sitiado Viena e pareciam estar a ponto de
vitável o estabelecimento de uma Igreja Luterana completamente
separada. Para a maioria das pessoas que viviam na decada de invadir as províncias ao sul do irr-rpório. Assim, havia razões ur-
1520 essa era uma perspectiva horrorizante. Não se podia sequer gentes para que ele desejasse resolver as questões que poderiam
conceber a ideia de uma divisão permanente da cristandade. Já resultar em divisões. Carlos sentia que era a hora de apresentar
era bastante ruim que houvesse um cisma ternporário, mas dizer aos tlrrcos muçulmanos uma frente cristã unida. Seus esfbrços pa-
que ele poderia continuar era o mesmo que lançar dúvidas sobre ra persuadir o papa a convocar um Concílio haviam sido Íiustra-
a possibilidade de restaurar-se a harmonia pública. Sem esta, o clos pelas táticas de retardamento de Roma, onde se receava que
conflito civil não teria fim, tinha toda probabilidade de levar à esse Concilio tentasse arrancar das mãos do papa o controlc dos
anarquia e à destruição da vida "civilizada". Para a grande maio- ensinamentos da lgreja. Portanto, ele decidiu fazet o trabalho de
ria dos alemães que ocupavam na época posições de responsabi- um Concílio da Igreja numa reunião cia Dieta do ir.r.rperio. Forall
lidade social ou política, a questão não era "se" haveria uma re- convidados teólogos dos dois lados para assistir a essa Dieta, que
conciliação entre a Igreja e os reformadores evangelicos. Era se realizaria em Augsburgo.
apenas uma questão de "quando" e "como". Os protestantes foram incurnbidos de procurar localizar um
Os reformadores não previam o "quando", mas confiavam terreno comum. Pediu-se que apresentassem um estatuto com que
no "como". Como já estava claro que o papa não estaria dispos- todos pudessem concordar, para depois entrar em negociações
to a fazer as mudanças necessárias para a restauração da unida- com os representantes papais. Martinho Lutero, por estar sob o
de, o pronunciamento sobre questões importantes deveria ser banimento imperial, não poderia comparecer' Na verdade, esse
deixado nas mãos de um Concílio da Igreja, constituído pelos re- era um bom augúrio para o êxito do empreendimento, pois ele já
presentantes cle todas as áreas abrangidas pela cristandade. De havia chegado à conclusão de que não seria possível nenhum
maneira geral, defendia-se a idéia de que esse Concílio deveria acordo com o papado sem o sacrificio de elementos essctrciais em
ser realizado na Alemanha, Muitos pensavam que deveria ser seus credos. Alguns de seus partidários mais importantes discor-
um Concílio nacional, com delegados convidados apenas da «lavam; ainda alimentavaln a esperança de que seria possível re-
Alemanha. Essas ideias eram aceitas pela maioria dos católicos formar a Igreja de Rorna, em vez de cortar todos os laços e im-
no império e serviam de base para boa parte das negociações que plalrtar uma organização rival. Estes eram liderados por Felipe
ocorreram entre os dois grupos durante a ausência de Carlos da Melanchthon (1497-1560), que caíra nas graças de Lutero em
Alemanha entre 1522 e 1529. Apenas umavez, na Dieta de Spe- Wittenberg, quando nomeado professor de grego com a idade de
yer, em 1529, os católicos tentaram assegurar a implementação 21 anos. Felipe era um brilhante intelectual, e era considerado
do Edito de Worms. Com isso, os representantes dos Estados re- uma das melhores cabeças da nova geração. No entanto, era qua-
formados frzeram um protesto coletivo contra o abandono do torze anos mais jovem que Lutero e, em muitos aspectos, mais
acordo de que não haveria nenhuma exigência em vigor até de- um discípulo que um colega. Durante muito tempo os historiado-
pois da reunião do Concílio. Os que protestavam passaram a ser res só o viam por esse prisma; mas nas últimas decadas fez-se nm
chamados de protestantes, nome que desde então é aplicado a to- {^ esforço para acentuar a importância de sua contribuição para o
desenvolvimento do luteranismo. Atualmente se vê que ele foi o
I
dos os grupos cristãos que se originaram de um ronrpimento
Í
com a lgreja católica. { grande responsável por reunir a torente de ideias não muito co-

J
r00 101

nexas de Lutero, transformando-as num credo coerente. Ele não sacramentos se náo for devidamente chamado [...] Tais são
atuou como um simples coordenador: acrescentou muito de seu
as principais orientações de nosso ensino e nele nada se
encontra diÍerente da escritura. ou da lgreja católica, ou da
próprio pensamento. Melanchthon mostrou essa independência
lgreja de Roma, conÍorme entendemos de seus aÚtores.
mental em Augsburgo onde, na ausência de Lutero (ainda sob o Não somos hereges. Nosso problema diz respeito a certos
banimento imperial), dispôs-se a omitir da declaração dos pro- abusos que se verificam na lgreja sem nenhuma autoridade
testantes muitas das crenças mais caras a seu líder, inclusive o clara [...] Entre nós, os antigos ritos sáo preservados em
sacerdócio cle todos os crentes. num esforço de torná-las aceitá- grande extensão.
veis para os católicos. O esforço de nada serviu. Lutero estava
certo. Os representantes papais desejavam aceitar soluções con- A impossibilidade de encontrar uma base comum para ser-
ciliatórias dos protestantes, mas não se dispunham a apresentar vir de apoio tomou Carlos irlrpossibilitado de fazet outra coisa
nenhuma. Finalmente, ficou bem claro que não se chegaria a ne- exceto manter-se firme ao lado dos católicos e exigir que o Edi-
nhum acordo aceitável e todos os membros protestantes da Dieta to de Worms fosse executado. Contudo, embora tenha permane-
se retiraram. cido na Alemanha até 1533, sua atenção estava muito voltada
O rompimento não estava cicatrizado, mas os reformado- para os turcos, e ele não fez nenhuma tentativa de fazq valer sua
res já haviam obtido ganhos reais. Peio menos, depois de muitos autoridade sobre os protestantes. Suas esperanças ainda estavam
e muitos anos de tentativas e eÍTos, se apresentava um documen- fixadas num futuro Concílio da lgreja, apesar de ton.rar-se cada
to que podia servir como cimento teológico para a callsa protes- vez mais evidente qtte os refbrmadores haviam abanclonaclo a
tante, embora naturalmente não o fosse para os anabatistas. Essa tentativa de reconciliação. Com certeza, já não estavam mais
declaração de credo, conhecida como a Confissão de Augsburgo, dispostos a pensar em assistir a unr Concíiio, se convocado pelo
era um claro resultado de inúmeras concessões e propositalmen- papa e rcalizado sob seus auspícios. Mas Carlos ainda procurava
te imprecisa em certos pontos, mas constituía a base para a uni- obter exatamente isso...
dade do protestantismo que tão obviamente faltara apenas um
ano antes, no Congresso de Marburgo. A Confissão é considera-
da o mais requintado trabalho de Melanchthon, onde ele conse- O luteranismo na ofensiva
guiu encontrar palavras para servirem de ponte a uma lacuna
quase impossível de ser atravessada: Ainda que houvcsse ulna csperança realista de chegar a um
entendimento conl a Igrcja católica, muitos dos reformadores
Uma única santa lgreja viverá para sempre. Pois a lgreja é a
mais moderados relutaram ent làzcr qualquer coisa que pudesse
congregação dos santos, em que o Evangelho é correta-
mente ensinado e os sacramentos administrados da ma- agravff a situação. Contu«lo, unta vez que as Dietas de Speyer e
neira devida. Para a verdadeira unidade da lgreja basta ha- de Augsburgo ern I 529- l 530 mostravam que só se chegaria a um
ver consenso a respeito do ensinamento do Evangelho e da consenso se os luteranos capitulassem totalmente às exigências
administraçáo dos Sacramentos; não é preciso haver se- do papado, os lideres mais ousados do protestantismo passaram a
melhantes traduçoes dos homens ou semelhantes ritos e exercer considerável influôrrcia sobre o movimento. De longe, o
cerimônias criados por homens [...] O corpo e o sangue de mais poderoso desses li«lercs era Felipe de Hesse ele se diver-
Cristo estáo realmente presentes e são distribuídos na San- -
tia imensamente nas intrigas e manhas políticas que caracteriza-
ta Ceia para todos os que se alimentam; a nossa igreja re-
jeita os que ensinam de outra maneira [...] Ninguém pode- valn as negociações entre Estados que seguiam uma "ativa" polí-
rá ensinar publicamente na igreja ou administrar os tica externa.
102 I0l

Na década de 1520 houve pequenos sucessos no convenct- migo de Carlos, Francisco I da França, para obtenção dos recur-
mento de inúmeros Estados reformistas a fechar alianças de defe- sos flnanceiros necessários para que Felipe armasse o exército
sa mútua para o caso de serem atacados por sua adesão ao protes- maior e mais bem equipado da região na époÇa. Esse exército
tantismo, mas a maioria dos Estados que se haviam declarado a entrou em Wurttemberg e restaurou a autoridade de Ulrich prati-
fuvor de Lutero considerava provocativo esse tipo de aliança. Ha- camente sem oposição. O luteranismo tornou-se a única religião
via mesmo uma impressão disseminada de que, se o imperador permitida no ducado. O abalo ao prestígio dos Habsburgo e dos
tentasse obrigar o cumprimento do Edito de Worms com o pode- católicos foi enorme, especialmente por Carlos ter aceitado a si-
rio militar, não deveria haver resistência, pois isso seria ir contra tuação, sem nenhuma tentativa de revertê-la. Era como se o
os ensinamentos da Bíblia. Depois da Dieta de Worms, a atmosfe- avanço do protestantismo fosse irresistível; seria apenas uma
ra reiuante mudou de modo impressionante: era quase como se o questão de tempo para que o catolicismo desaparecesse na Ale-
reconhecimento de que o rompimento com Roma era permanente manha. Com a morte de seus governantes em 1535 e 1539,
e houvesse liberado uma inundação de energia e determinação Brandenburgo e a Saxônia ducal tornaram-se protestantes
protestante. Com o incentivo de Felipe de Hesse, criou-se uma embora o primeiro não tenha adotado o luteranismo, preferindo
-
aliança eiltre os mais imporlantes Estados protestantes, em l531, um tipo de Reforma moderada não muito diferente da que Hen-
conhecida como a Liga de Schmalkalden, a cidadezinha onde o rique VlIl introduziu na Inglaterra. Agora o equilíbrio do poder
acordo foi firmado. Embora a Liga se apresentasse como u'n sim-
estava evidentemente a Íàvor dos protestantes, em especial por-
ples acordo para a defesa mútua, na verdade ela funcionou como
que os príncipes católicos remanescentes tinham mais receio do
ponto de partida para a luta unificada e atuante pelos interesses
poderio imperial do que da religião reformada; enquanto isso,
protestantes. Ela teve notável sucesso nos primeiros anos, quando
Carlos V continuava acreditando que o cisma poderia ser resol-
um novo poder parecia emergir nas relações intemacionais.
vido através da persuasão.
Carlos V, desesperado por ajuda em 1532, para resistir ao
que parecia ser uma grande ofensiva dos ttircos em direção a
Viena, estava disposto até a suspender todas as ações contra os
membros da Liga em troca de hornens e dinheiro. Esse acordo, a Carlos V no ataque
Trégua Religiosa de Nuremberg, convenceu alguns dos estados
protestantes mais tímidos a juntar-se r\ Liga. No entanto, o ver- Os protestantes estariam em posição vulnerável se Carlos
dadeiro triunfo viria em 1534. O grande ducado de Wurttemberg decidisse que o uso da força seria a melhor maneira de avançar e
era administrado pelos Habsburgos desde 1520, quando o du- se pudesse dedicar toda sua atenção ao caso. Eles não eram de
que, Ulricl.r, fora deposto por quebrar a 1ei imperial: ele assassi- modo algum mais unidos entre si clo que os católicos. Havia ain-
nara um de seus súditos, de modo a poder cortejar a viúva. Por da uma forte relutância da patle de muitos príncipes protestantes
acaso, era também um luterano convicto ainda que fosse um em envolver-se numa guerra com o imperador, apesar do recente
exemplo de govemante que levava muito a sério sua religião pronunciamento de Lutero de que era moralmente correto resistir
mas capaz de atos de grar.rde barbarismo. Felipe de Hesse consi- - ao governante indicado por Deus, desde que isso ocorresse em
derava a restauração de Ulrich um grande impulso para a moral defesa do Evangelho. Assim, alguns estados peÍnaneceram fora
da causa protestante e planejou as operações de modo a mais da Liga de Schmalkalden e a maioria dos que participavaln pro-
uma vez maximizar os efeitos da propaganda. Nào houve nenhu- vavelmente colocariam o interesse próprio acima do bem da co-
ma negociação com o imperador, nem se procurou manter nos letividade. Não seria nada difícil para algum hábil manipulador
limites da lei. Ao contrário, foi feito um acordo com o arquiini- tomar conta da frágil aliança.

1
104 105

Para os refomadores, as dificuldades realmente começa- Maurício da Saxônia, com a promessa de terras e do título de
ram em I 54 1, quando fracassou a Dieta de Regensburgo, a últi- eleitor da Saxônia. Além drsso, imaginou seduzir os schmalkal-
rna tentativa cle Carlos V para unir católicos e protestantes num denianos a atacarem-no, eliminando assim qualquer dúvida de
acordo em seu credo fundamental sob a forrna de palavras. Car- que estivesse em seu direito. O resultado da luta era imprevisível.
los afinal admitiu que não havia nenhuma alternativa realista de O que the deu equilíbrio foi a invasão do eleitorado da Saxônia
coagir os luteranos a voltar à ortodoxia por meio da fbrça militar. pelo duque Mauricio, o que provocou a confusão e abateu em
Sua posição foi reforçada pelos príncipes católicos, que agora muito o moral dos membros da Liga que nào esperavam um ata-
viam uma possível extensão do poder imperial como um mal me- 'que vindo desse lado. A derrota completa da Liga aconteceu na
nor do que a constante expansão do protestantismo haviam es- batalha de Muhlberg em 1547. Seus líderes foram capturados e
perado que desaparecesse naturalmente e se dispunham a apoiar Carlos estava livre para ditar os temos que pudessem peÍmane-
qualquer ação de Carios. Ao mesmo tempo, a credibiHdade do cer em vigor quando já não estivesse presente fisicamente na
mais importante príncipe luterano. Fehpe de Hesse, fora destrui região. Quando jovem, aprendera que era estupidez firmar acor-
da pelo escândalo de sua bigamia e ele estava muito à mercê do dos de paz em termos duros depois de um grande sucesso militar,
imperador. Os protestantes estavam virtualmente sem um líder. deixando poucas alternativas aos derrotados senão reabrir as hos-
Para o reflorescimento do catolicismo na Alemanha era preciso tilidades para tentar obter condições menos prejudiciais.
apeilas que o imperador se livrasse de quaisquer outras distra- Por isso, não houve execuções nem multas, nenhum terri-
ções. Aparentemente, isso poderia acontecer. Fora assinado um tório foi tomado pelos Habsburgos. Ao contrário, convocou-se a
armistício de dez anos com os franceses em 1538, a expansão Dieta para uma reunião em Augsburgo (de setembro de 1547 a
otomana havia sido contida na Hungria e as dificuldades nos Paí- maio de 1548), em que Carlos tentou inutilmente persuadir os
ses Baixos estavam resolvidas. Os protestantes estavam muito três estamentos do império os eleitores, os príncipes e as auto-
apreensivos, e com razão. Contudo, acontecimentos fortuitos os ridades urbanas a aceitar planos para reforçar o govemo cen-
poupavaml por enquanto. Devido a circunstâncias totalmente ex- -
tral, o que transfomaria a Alemanha em algo mais próximo a
ternas ao controle de Carlos, a guerra com a França foi reiniciada uma nação-estado. Houve também um esforço de impor uma
em 1542 e os acordos na Hungria falhararn. O cisma religioso na decisão religiosa em todo o império na forma do Interim de
Alemanha voltou a ser assunto secundário para o imperador. Augsburgo, documento baseado na doutrina católica, com algu-
Carlos tinha sorte. A França foi derrotada em 1544 e, em mas alterações insignificantes, tencionando dar-lhe uma aparên-
retribuição aos termos clementes do tratado de pa2, concordou cia de soluÇão conciliatória com os luteranos. Todos os príncipes
em não oferecer nenhuma ajuda aos protestantes alemães; ao e autoridades urbanas receberam instruções de organizar a reli-
mesmo tempo, a ameaça dos turcos na Hungria não se materiali- gião em seus territórios scgundo o interim. até o momento em
zou. Em 1546, ele finalmente estava livre para dedicar toda sua que um Concílio da lgreja cletermitrasse as questões doutrinárias.
atenção à Alemanha. sabendo que era improvável ter de enfrentar O Ínterim foi quase totalmente ignorado. Na prática, a vitória
crises em algum lugar no futuro irnediato. O imperador mostrou obtida por Carlos nada fez alern de nrostrar a todos quais eram
uma grande habilidade política na situação: deixou claro que não suas duas prioridades no governo do império: garantir um au-
pretendia fazer nenhum ataque geral aos estados protestantes e mento de seu próprio poder à custa dos governantes territoriais e
que visava apenas os infratores de sua legítima autoridade os esmagar.o protestantismo. Mas ele havia subestimado completa-
-
mernbros da Liga de Schmalkalden. Com isso, garantiu a inativi- mente o que poderia ser f'eito. Tudo indica que acreditou que pu-
dade dos estados reformados mais prudentes e tambem conquis- desse ordenar aos govemantes territoriais a volta às práticas cató-
tou o apoio seguro de um importante príncipe luterano, o duque licas, que estes fizessem o mesllto com seus súditos e que tudo
I
106 101

aconteceria simplesmente. Não imaginava que dezenas de milha- trina, religião e fé da mesma, nem cometeremos injúria ou
res de pessoas em todos os níveis da sociedade preferiam morrer violência aos estados que a mantiverem [...]
Por outro lado. nos estados que aceitaram a ConÍissão de
a levar adiante os termos do Ínterim de Augsburgo.
Augsburgo deverão conviver os que adotarem a velhâ reli-
Os historiadores às vezes criticam o imperador por haver gião da mesma maneira por sua religião, fé, costumes na
desperdiçado a única oportunidade que teve de impor sua vonta- igreja, ordenaçoes e cerimônias [...]
de à vida religiosa da Alemanha. Eles comparam esse fracasso No entanto, todos aqueles que não adotarem nenhuma das
com os suÇessos por ele obtidos na Espanha, na ltália, na Austria religióes mencionadas acima não se incluem nessa paz,
e nos Países Baixos. Contudo, essa visão é um tanto injusta. E mas deverão ser totalmente excluídos [...]
verdade que de 1548 em diante ele cometeu erros na Alemanha, Quando aqueles que adotam a velha religião ou a Confis-
são de Augsburgo, em nome de sua religiáo, desejarem ir
cle modo que por volta de 1555 sua posição era mais fraca do que
para outro lugar e ali residir, estando permitidas e concedi-
antes da campanha vitoriosa de 1546-1547, mas devemos lem- das essas idas e vindas, a venda de propriedades e bens
brar que ele mesmo havia estabelecido rnetas praticamente im- não poderá encontrar obstáculos em parte alguma [...J
possíveis de obter. Seu equívoco estava mais nesses objetivos na-
da realistas do que no fracasso em atingi-los. Na decada de 1540 Em cada Estado haveria uma reiigião: o catolicismo ou o lutera-
já era tarde demais para eliminar o luteranismo como religião or- nismo; o governo local tomaria a decisão. Nenhum estado deve-
ganizada em grande parte do norte e leste da Alemanha. ria forçar seus pontos de vista sobre qualquer outro. As pessoas
teriam liberdade de, com seus pertenccs, mudar-se para um esta-
do onde sua religião fosse praticada. Esse arranjo foi elogiado
APaz de Augsburgo quase universalmente como exemplo de tolerância e bom senso
esclarecido. Certamente era, mas tambem indicava que o primei-
A impossibilidade do objetivo foi finalmente reconhecida ro ardor da Refoma havia passado. Lutero estava mofto havia
em 1555, quando, em outra Dieta de Augsburgo, chegou-se a um quase uma década e os reformadores da primeira geração ainda
acordo em que se pressupunha que o cisma era perrnanente e fo- vivos estavam velhos e cansados. Por outro lado, Carlos V, que
ram feitos arranjos para sua administração. Talvez tenha sido por trinta anos fora a força que impelia a batalha para enceÍrar o
muito bom o fato de Carlos não estar presente; o imperador dei- cisma, chegara ao ponto dc adrritir qlle suas enefgias estavam es-
xou esses arranjos nas mãos de seu irmão, Frederico, que em bre- gotadas. A Paz de Augsburgo marcoLl um meio-caminho na Re-
ve iria tomar-lhe o império, enquanto ele estava em viagem pelos forma. A contestação inicial chegara a urn empate quando apaz e
Países Baixos para preparar a entrega de outras de suas responsa- o repouso pareceram prcÍ'críveis à continuidade da luta e da inse-
bilidades a seu filho, o futuro Felipe II da Espanha. Os termos da gurança.
chamada Paz de Augsburgo permaneceriam vigentes até bem Contudo, a batalha estava longe do frm: Calvino. seus par-
dentro do século seguinte e, ainda que sua resistência não tenha tidários, os papas da Clontra-RcÍbrrra e seguidores logo reacen-
sido prevista na época, eram um nítido reconhecimento das reali- deriam os fogos da luta sectária.
dades políticas e religiosas da Alemanha.

Sua Majestade lmperial e nós, os eieitores, príncipes e esta- t


dos do Santo lmpério não combateremos qualquer estado 1

do império por conta da Confissáo de Augsburgo e a dou-


I

_t
l.l "

I09

Renascimento: conjunto de criações artísticas, filosóficas e cien_


tíficas que marcaram o início dos tempos modernos (séculos
XV e XVI), cuja proposta era retomar os padrões e vaiores da
Antigüidade Clássica e romper com as regras medievais, real_
Vocabulário crítico çando a importância do indivíduo.
pia: literalmente, slgnlllca
U to)pta: ..lugar
"lugar nenhum".
_trÍeratmente, signifi ca nenhum" Designa socieda_
de ideal cujo governo garante condições de vida para a popu-
DoDu_
lação. Doutrinas e movimentos sociais transformâdo.", io.am
identificados a esse universo.

Albigenses: heréticos do sul da França (séculos XI a XIII) que re-


jeitavam as doutrinas católicas e consideravam a matéria
como encamação do mal. Suas propostas tiveram difusão em
outras áreas da Europa, incluindo regiões da Alemanha e
da Itália.
Anabatistas: protestantes que recusavam a validade do batismo
de crianças, pois associavam esse sacramento à fé conscien-
te e à graça como encontro responsável e pessoal com Deus.
Foram violentamente perseguidos por outros setores refor-
mistas.
Erastianismo: proposta de submissão da Igreja ao Estado, elabo-
rada por Tomás Erasto, teólogo suíço do século XVI.
Heresia: teorias e movimentos sociais que enfrentaram a ortodo-
xia da fe mantida pela Igreja católica.
Indulgência: perdão dado a pecados, que foi objeto de venda pe-
la Igreja católica, prâtica severamente criticada por Lutero e
um dos principais pontos de partida para a Reforma.
Milenarismo: doutrina que sustentava a duração de um milênio
para o reinado de Cristo na Terra, ao fim do qual ocorreria o
Apocalipse.
Quiliasmo: ver milenarismo.
Trata-se de um manual geral sobre o tema, que realça as ori-
gens religiosas clo processo (heresias, cultos populares, abusos
da lgreja católica, rclaçt)cs entre humanismo e exegese bíbli-
ca) e a influência de Lul.cro c Clalvino. A edição é ilustrada e
B ibli o gr af ta c omen tada* contém urr glossário dc lclnros teológicos.
ELToN, R. A Europa duruntc u l?afitrma. Lisboa, Presença. 1982.
O texto parte da atuação clc Lutcro contra o poder de Roma e
da situação da Alemanha ((larlos V, expansão do luteranismo,
etc.). Discute a formação do protestantismo europeu, a reação
çatolica (Contra-Refonna), indicarrdo aspectos gerais do perío-
do como artes, ciências, expansão ultran'rarina, etc.
ENcsls, Friedrich. As guerras cumponesos na Alemanlta. Lis-
boa, Presença,1975.
Estuda o movimento camponês de 1525 e estabelece paralelos
preliminares com a Revolução de 1848 como exemplo do
BLocu, EmsÍ. Thomas Munzer; teólogo da revolução. Rio de Ja- aproveitamento da ação de massas pelas elites. Aponta cam-
neiro, Tempo Brasileiro, 1973. pos religiosos e sociais na Alemanha do século XVI articula-
Apresenta o trajeto de Munzer, salientando as dimensões de dos à drfusão da Reforma: católico ou reacionário, luterano ou
uma Reforma de base popular e massiva (camponesa), que de- burguês-reÍbmista e revolucionário. Atribui às gueras cam-
safiava os poderes clericais e aristocráticos e qLle foi violenta- ponesas o fàto de a divisão política da Alemanha ter se conso-
mente reprimida. Indica a força comunitária de profecia e uto- lidado naquele período.
pia. Comenta os alcances da teologia de Munzer a FrsvRE, Lucien. Martinho Lutero; um destino. Amadora, Ber-
libertação do homem, o direito do bem e o compromisso entre trand,, 19'76.
Cristo e o mundo. E uma biografia clássica, obra de um historiador que çontri-
Dp,t-uvnapeu, Jean. Nascimento e afirntação da. Re./'orma. Sáo buiu para a renovação de seu campo de estudo, concentrado
Paulo, Pioneira, 1989. principalnrente em cultura e religiosidade da Europa no sécu-
Constitui-se em panorama da Reforma, realizando um balan- 1o XVI. Articula o trajeto pessoal de Lutero à experiência cul-
ço temático sobre Lutero, Calvino e a Contra-Rcforma, dentre tural de sua época com ênfase no espaço erudito, analisando
outros personagens e temas como causas, propagação, confli- questões teológicas e politicas e abordando também o proble-
tos intemos, etc. Alem disso, faz um apanhado de polêmicas ma do camponês.
interpretativas, indica documentos e apresenta uma bibliogra- MousNtpn, Roland. Os sec'ulos XVI e XVII. Trad. de Pedro
fia analitica. Moacyr Campos. São Paulo, Difel, 1968, tomo IV, v. l. (His-
DtcrceNs, A. G. A Refrsrma e a Europa do século XVI. Lrsboa, tória Geral das Civilizações.)
Verbo, s.d. O capítulo "As novas estruturas religiosas: as reformas" apre-
senta o quadro crítico do catolicismo no início dos tempos mo-
dernos, incluindo seus vinculos com a vida política. Identifica
* Esta bibliografiae o "Vocabulário crítico" foram elaborados especialmente pa- os pioneiros da Reforma, dentre eles Lutero, alem de fazer ço-
ra esta edição pelo prof. dr. Marcos A. da Silva. do Departarnento de História
da FFLCH/USP.
mentários a respeito da Contra-Reforma, dos.jesuítas, do refor-
tt2

ço da Inquisição em algumas regiões da Europa, das relações


entre Reforma e capitalismo e ainda das contribuições desse
processo para a tolerância religiosa e política.
WEBER, Max. A ética protestante e o espírito capitalista. Sáo
Paulo, Pioneira,1967.
Trabalhando com "tipos ideais" instrumentos de estudo
que, intencionalmente, enfatizam as características do fenô-
meno em questão para melhor compreendê-lo discute as
-,
relações causais entre a ascese protestante e as práticas capita-
listas, levando em conta avalorizaçào da atividade metódica e
racional. Dessa forma, entende o protestantismo corno impor-
tante dimensão do mundo moderno, com intensos efeitos na
esfera econômica.

A imagem da realeza
[ilarcos Antonio Lopes

243 Guia prático do alfabetizador


[/lar ene Caryalho

?tt  literatura expressionista alemã


Clá!da Cavac!ft

0 movimento operário norte-americano


Jorge Fere ra

Pãlavra e discurso
l\lara Aparec da Baccega

A Bêvoluçâo CientíÍica
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LuteroeaReíormaalemã
Ke th Bafde

Wittgênstêin
João da Penhô

lmprensa alternativa
Brva do Ch nÉrr

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