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GILBERTO Coao LEIVAS I RENATO ScALCO IsQUIERDo I RoGER RAUPP
Rios I RoNALDO GATTI DE ALBUQUERQUE I TEORI ALBINO ZAVASCKI
1

ENTRE E
NAS RELAÇÕES DE CONSUMO*
JUDITH MARTINS-COSTA

"No outro quarto, Rateau observava a tela, inteiramente branca, ape-


nas com uma inscrição no meio, em caracteres minúsculos. Era uma palavra
que se podia decifrar, talvez fosse solitário ou talvez fosse solidário."- AulERT
CAMUS.

SUMÁRIO: Introdução- 1.1 As relações de mercado e a diretriz da


solidariedade social: 1.1.1 As concepções naturalista e normativa de
mercado; 1.1.2 Mercado e solidariedade social na dialética entre o di-
reito privado e o direito constitucional; 1.1.3 Operabilidade da diretriz
da solidariedade social nas relações de mercado- 1.2 A boa-fé objeti-
va como norma conformadora, concretizadora e sistematizadora da
solidariedade social: 1.2.1 A boa-fé como mandado de otimização dos
deveres e cânone de interpretação; 1.2.2 A boa-fé como técnica de
expansão das hipóteses de abusividade contratual; 1.2.3 A boa-fé como
regra de "interpretação congruente"- 1.3 Conclusão- Bibliografia.

O princípio da boa-fé objetiva informa todo o direito obrigacionaF


maneira especial, está presente no sistema das relações jurídicas de
como um dos seus princípios nucleares. 2

estre trabalho à amiga Teresa Negreiros e agradeço ao acadêmico


Direito Alexandre Pereira Dutra o auxílio na seleção da jurisprudência.
este tema em A boa-fé no direito privado (sistema e tópica no
nmi'P.o'"' obrigacional), RT, 1999.
de Defesa do Consumidor, art. 4. 0 , inciso III.
612 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 613

Constituindo um dos eixos centrais da compreensão '"'u'~-·~- das relações de mercado? 7 Como essas rela-
sistema- ou microssistema- das relações jurídicas de cvau•-"""' com os atributos conotados à boa-fé? Em que medi-
ta desde logo situar os contornos da boa-fé objetiva- já que de fundamento?
é a sua conceituação taxativa ou definitória -,contornos que pelo pretendo propor estas reflexões, que parti-
melhor compreendidos se se ti ver presente a distinção dogmática 'u;;,uu·-~
considerações acerca dos laços existentes entre a dire-
boa-fé subjetiva e a boa-fé objetiva. da solidariedade social e as relações de mercado
Muito embora ambas as expressões encontrem no para posteriormente a compreensão da boa-fé objetiva
pio geral da confiança que domina todo o ordenamento, cada norma conformadora, concretizadora e sistematizadora dos de-
sempenha, dogmaticamente, distintos papéis. A boa-fé subjetiva constitucionais de solidariedade social no âmbito das relações
a idéia naturalista da boa-fé, aquela que, por antinomia, é de consumo (1.2).
má-fé. Diz-se subjetiva a boa-fé compreendida como estado
co, estado de consciência caracterizado pela ignorância de se
lesar direitos ou interesses alheios, tendo forte atuação nos direito
notadamente no direito possessório, 3 o que vai justificar, por a já longínqua década de 50, Tulio Ascarelli produziu notável
uma das formas da usucapião. 4 apontando as repercussões, no Direito, da superação de uma
dicotomia aristotélica, aquela que encerrava em pólos excluden-
Diferentemente, a expressão boa-fé objetiva designa seja
lllUUV'U".,~~ estado natural e estado artificial, movimento natural e
rio de interpretação dos negócios jurídicos, seja uma norma de
O conceito de mercado enfrenta essa dicotomia
que impõe aos participantes da relação obrigacional um
articulando-se, no ordenamento jurídico brasileiro, com a idéia
pela lealdade, pela colaboração intersubjetiva no tráfico ..,_1;v~.·uu,
iUa!.!vUUUv social ( 1.1.2).
consideração dos legítimos interesses da contraparte. Nas
tratuais, o que se exige é uma atitude positiva de cooperação, e,
concepções naturalista e nonnativa de mercado
sendo, o princípio é a fonte normativa impositiva de COlllP<OrtUJ
que se devem pautar por um específico standard ou arquétipo,
A intuição de Ascarelli ao enfrentar o tema da dicotomia entre o
a conduta segundo a boa-fé. 6
e o artificial gerou rendosos frutos: retoma-o Natalino Irti, 9 para
Diante dessas noções, poderia soar estranha a relação a sua sobrevivência nas duas grandes concepções que, na carac-
título entre boa-fé objetiva e relações de mercado. Como do que seja o mercado, percorrem a história dos últimos séculos,
estes atributos - lealdade, colaboração com a contraparte, :ana1o-se. por ignorância ou clandestinamente, na vida intelectual dos
ção pelos legítimos interesses do alter, na relação .·F'"'"''""' dias: de um lado, a concepção naturalista de mercado, de outro, a
:onc:ep1;ão "artificial" ou normativa.
(3)
Vg., arts. 510,511,514,516 e, a contrario, arts. 513,515,517,
grafo único, e 619, todos do vigente Código Civil. as acepções do termo "mercado", vide Pietro Schlesinger, I mercati
(4)
Assim a usucapião ordinária ou brevi temporis. , in Rivista di Diritto Civile, n. 2, 1994, p. 187.
(5)
António Manuel Menezes Cordeiro, Direito das obrigações, 2.' Ascarellí, Ordinamento giuridico e realtà sociale, publicado original-
I, Lisboa, Associação Acadêmica da Faculdade de Direito da in Problemi giuridici, Milano, Giuffré, 1959, e republicado in /l di-
de Lisboa, p. 141. privato nella società moderna, Stefano Rodotà (org.), Bologna, Il
(6)
Há, inegavelmente, distinção funcional entre o "agir de boa-fé" 1971, p. 83-93.
segundo a boa-fé", a primeira expressão conotando a boa-fé Concetto giuridico di mercato e dovere di solidarietá, in
segunda, a boa-fé objetiva. uwnn,rn del mercato, Roma, Laterza, 1998, p. 82.
614 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 615

A concepção naturalista, que tem origem nas ~~~"u'''~ :-~uJuli!UIJ.


diz Ascarelli, "o modelo de um
tas do séc. XVIII, compreende o mercado como o das forças individuais naturalistamente compreendidas,
da espontaneidade, que "mãos invisíveis" orientam na - .. ~"''v a função precípua das leis era a de garantia, era a de,
comum. 10 Não haveria, assim, necessidade de intervenções dizer, a da eliminação dos obstáculos que a regula-
vas (legislativas ou administrativas) no mercado, reino natural interpunha à realização desta ordem". 16 A ordem econô-
nomia. Este seria, por sua vez, de todo apartado da esfera da " ordem", era- para empregar uma outra formulação di co-
dizendo-se. "naturalista" a concepção justamente - cosmos e não taxis. Cosmos porque ordem espontânea que
cado o regime natural das relações econômicas. 11 Como regularidade do comportamento dos elementos que compre-
necessária, atam-se nesta concepção naturalista de mercado a) e não tem, justo porque é espontânea, um fim que a polarize. Não
cepção do Direito como instrumento meramente fixador das portanto taxis, já que esta indica a ordem resultante de ação exóge-
jogo econômico-social e garantidor das escolhas individuais ímposta e, nesta medida, o produto de um desenho, de uma vonta-
definidoras dos fins a perseguir, b) a idéia do Estado como~
dessas garantias e c) como o concessor dos instrumentos que gócios jurídicos, qual seja a "autonomia negociai''. "Autonomia da vonta-
litariam a outros a definição dos fins e o alcance de escopos de" designa uma construção ideológica, datada dos finais do século passa-
mente estabelecidos. por alguns juristas para opor-se aos excessos do liberalismo econômico,
ror1swcuu1uv "un mythe volontairement entretenu par les déctrateurs de
Daí o modelo da "nomocracia estática" 12 traçado no
1uuau:suu~, pour mieux cri ti quer les exces", como aponta Marie-Lau-
lismo liberal, segundo o qual, diz Comparato, não compete a
Izorche, em La liberté contractuelle, estudo publicado em Droits et liber-
guiar a sociedade civil para a realização de fins comuns, fnndairne,ntaux.Paris, Dalloz, 1997, p. 503. Para o sucesso desta constru-
diversamente, "propiciar, sob a égide de leis gerais, constantes e foram adotados e distorcidos alguns dos postulados kantianos atinen-
mes, condições de segurança - física e jurídica - à vida tes à "liberdade individual", liberdade natural e moral de querer ou de de-
Aos indivíduos, por sua vez, competiria "fixar suas finalidades terminar-se de tal ou qual modo, identificando-se a busca do fundamento
no respeito às leis asseguradoras de uma convivência harmônica do poder objetivamente reconhecido aos sujeitos, pelo ordenamento, de criar
colhas individuais" .14 normas jurídicas ("poder negociai''), com a vontade real ou psicológica dos
sujeitos para criar normas jurídicas, vontade que, nesta acepção, seria a raiz
Esta concepção foi desenvolvida no século passado, não por
ou causa dos efeitos jurídicos. Modemamente, contudo, descartada a liga-
o século da polarização dicotômica entre codificação e
ção com a vontade como gênese de relações jurídicas, designa-se, como
uma e outra também vistas, distorcida e antinomicamente, auL'u"''""'aprivada" (dita, no campo dos negócios, "autonomia negociai"),
da autonomia "da vontade" 15 e o espelho do interesse público. seja um fato objetivo, vale dizer, o poder, reconhecido pelo ordenamento
jurídico aos particulares, e nos limites traçados pela ordem jurídica, de auto-
<lDJ Idem, ibidem. regular os seus interesses, estabelecendo certos efeitos aos negócios que
pactuam, seja a fonte de onde derivam certos direitos e obrigações (fonte
<llJ Idem, ibidem.
12
negociai), sejam as normas criadas pela autonomia privada, as quais têm
< ) A expressão é de Fábio Konder Comparato, Ensaio sobre o juízo de um conteúdo próprio, determinado pelas normas estatais (normas heterô-
tucionalidade de políticas públicas, in Estudos em homenagem a nomas, legais ou jurisdicionais) que as limitam, subtraindo ao poder priva-
Ataliba, (org.) Celso Antônio Bandeira de Mello, São Paulo, autônomo certas matérias, certos grupos de relações, reservadas à regu-
350. lação pelo Estado. (Para estas observações, vide, ainda, Luigi Ferri, La au-
13
< J Fábio Konder Comparato, op. cit., p. 350. tonomia privada, trad. esp., Madrid, Revista de Derecho Privado, e Miguel
o•J Idem, ibidem. Reale, Fontes e modelos no direito- Para um novo paradigma hermenêu-
15
< J A expressão "autonomia da vontade" não deve ser confundida tica, São Paulo, Saraiva, 1994.)
ceito de "autonomia privada" nem com a sua expressão no Tulio Ascarelli, op. cit., p. 84.
616 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 617

de capaz de escolher fins. 17 Cosmos e natureza e a economia, também o Direito não é neutro. Consiste na
20
mia e política, sociedade civil e Estado: o projeto r.n.'"'"''~ "'-ll'-'"U''-', é tecido por humana escolha, é produção de
ia era um projeto fundamentalmente au:or.orn(ICI'J. ,.vu.•~~·- de decisões. Por isto distingue-se concepção
A afirmação da fundamental "naturalidade" da a concepção "artificial" ou normativa- artificial porque não
é "construída", porque perspectiva o mercado como
explica a razão pela qual as análises oitocentistas que se
o Direito, enquanto emanação de bem precisas esco-
postulados estabelecidos, um século antes, por
vu·~~M·~, constitui, governa, orienta e controlaY Não mais o mer-
como argumento central, seja a possibilidade de o
oroo um "dado", portanto, mas como um "construído": de garan-
equilibrar-se automaticamente sobre os diversos níveis uv'"'u" uro econômico considerado natural, as regras jurídicas
possibilidade de esta ordem econômica "natural" ~,.,.,,,w,,~
a ser vistas como elementos de uma determinada estrutura so-
entre o egoísmo individual, de um lado, e a ordem e Taxis, igualmente, é a ordem econômica, pois qualquer ordem,
de outro, "mostrando como o primeiro era o instrumento para a espontânea ou deliberada, tem necessidade de normas "que a fun-
ção da segunda" . 18 constituam", porque, como sintetiza lapidarmente Irti, "não há
À veste da naturalidade seguiu-se a construção do da e um depois, mas simultaneidade lógica". 23
dade da economia, de sua fundamental apoliticidade, que tinha esta concepção, não há mercado fora das decisões políticas e
mão siamês o mito da neutralidade técnica das regras escolhas legislativas de uma sociedade: o mercado é, com efei-
Mitos duradouros, ainda infiltrados em tantos corações e -'-"'-·llL'-·", egiroe normativo da atividade econômica", ou, mais amplamen-
contudo, nada inocentes. Considerar a economia como ap<)mlca juridico das relações econômicas. 24 O que consiste em con-
Irti quem o diz - nada mais é do que "contrapor uma nnlllhr•<> como assinalara Karl Renner nos anos 20, que todas as insti-
política". Em outras palavras, considerar a economia como econômicas são, ao mesmo tempo, instituições jurídicas, muito
mais exprime do que uma firme e bem determinada orientação ambas nem sempre coincidam, nem sempre possam subsumir-
nas outras. 25
<"J A formulação dicotômica é de F. A vou Hayek, retomada por
desenvolve, criticamente in L'ordine giuridico del mercato, Teoria generale del diritto e il problema dei mercato, in Rivis-
"Cosmos", diz o autor, "e 1' ordine spontaneo, il qual e risulta . Diritto Civile, n. 1, 1999, p. 12.
tà dei comportamenti che esso comprende. Esso e, in questo Conceito giuridico di mercato e dovere di solidarietá, in
tema endogeno, intrínseco o, como dicono i cibemetici, giuridico del mercato, cit., p. 82.
auto-organizzato. Una taxis, invece, edetermínata da un' azione noção de "estrutura", explica Miguel Reale, indica "um conjunto de ele-
al di fuori dell' ordine ed e nello stesso senso esogena o imposta. que entre si se correlacionam e se implicam de modo a representar
appunto perché spontaneo, non há un scopo ( ... )La taxis, · campo unitário de significações". Nas estruturas sociais como o Di-
tato di un disegno, di una volontà che, scegliendo fini os elementos mais significativos são a "totalidade plural, comple-
gerarchia particolare di fini, e in grado di attribuire qualsiasi ""'''"auv, historicidade, vetorialidade, tensionalidade e durabilidade",
goli elementi e di disporli in modo conforme agli scopi em maior ou menor grau. (Veja-se Miguel Reale, Fontes e
<"J Tulio Ascarelli, Ordinamento giuridico e realtà sociale, cit., p. no direito -Para um novo paradigma hermenêutica, São Paulo,
<' 9 J Natalino Irti, Concetto giuridico di mercato e do vere di 1994, p. 5 e 7).
L'ordine giuridico deZ mercato, cit., p. 82, referindo à L'ordine giuridico del mercato, cit., p. 9.
Smitt, no sentido de tal atitude configurar uma "tentativa de Concetto giuridico di mercato e dovere di solidarietá, in
que, no próprio fato de assegurar a neutralidade da economia, giuridico del mercato, cit., p. 82
por a universalidade dos negócios à particularidade da Renner, Gli istituti del diritto privato e la loro funzione sociale, trad.
isto sim, "un fermo e rígido orientamento político". de Comelia Mittendorfer, Bologna, Il Mulino, 1981, p. 49.
618 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 619

É bem verdade que o século XX evidenciou este P"'"'-"'''-'llla. econômica, admite-se que o mercado é regido por normas
vendo o mito da naturalidade, tão caro aos fisiocratas, pois un""'""''-"~,não já derivadas de "mãos invisíveis", mas constituídas
nitidamente, o Direito passa a ser utilizado como um instrumento e firme visibilidade das normas jurídicas" .31 Mãos visíveis,
nado a impor imperativos sociais e políticos sobre a economia e publicamente visíveis. As escolhas políticas, expressas juri-
Em "radical oposição" à precedente nomocracia estática, ' imprimem fisionomia ao mundo das trocas, conferem a sua
parato, "a legitimidade do Estado contemporâneo passou a ser a -··'"''"'-- forma, o seu específico modelo. Daí o "duplo caráter do Direi-
dade de realizar, com ou sem a participação ativa da sociedade_ 0 ou sua "dupla instrumentalidade", tese de Reich apontada por Grau, 32
representa o mais novo critério de sua qualidade democrática - 'al que o Direito instrumenta o desenvolvimento das relações
objetivos democráticos" _27 O Estado social é justamente aquele no ercado e instrumenta, por igual, a atuação do próprio Estado. O que
os poderes públicos, para além de produzir normas, "dirigem dizer que certas escolhas, políticas, e certos controles, jurídi-
mente a coletividade para o alcance de metas determinadas". 28 produzem tantos modelos de mercados e de Estados quantos forem
Nesta perspectiva, de mero instrumento apto a dispor os meios odelos concebidos pelas normas jurídicas reguladoras, orientadoras
que outros- os indivíduos- colimassem os fins que almejassem np_,-~"'c"''" das relações de mercado. 33
passa o Direito a ser tido como instrumento impositivo de fins, de nn''""'"~­ Se há vários modelos de mercado - regime normativo das trocas
políticos, econômicos e sociais, assumindo, assim, o que Reich ae11orrun:~"' .vu\JHll.V~U - , é preciso saber qual é o modelo que a ordem constitucional,
de "uma função substantiva, finalística", voltando-se à fixação e -"'-""'.:I::r'.vuw taxis e não cosmos, entre nós desenha, modela e projeta.
ção de metas que têm por escopo "viabilizar a democracia também na se é a ordem constitucional, tradicionalmente tida como pública, que
nomia, para uma melhor distribuição de recursos, para uma retus[nOllllc:kl· modela e conforma as relações econômicas privadas, até então
de renda mais justa e por uma proteção dos socialmente mais fracos e discn:.:.
J!l'-'''"u.u~·~u nos Códigos Civil e Comercial, uma outra dualidade se es-
minados". 29 Dissolvem-se, assim, outros divórcios até então incontestes:6
a que opunha, dicotomicamente, o direito público e o privado.
divórcio entre a ordem econômica e a ordem jurídico-política, o n"'"""'""
entre o direito privado e o direito público, o divórcio entre ordem "natural''
e ordem artificial, entre cosmos e taxis, respectivamente.
.1.2 Mercado e solidariedade social na dialética entre o direito priva-
do e o direito constitucional
Dissolve-se inicialmente o divórcio entre a ordem econômica e a
ordem jurídica, fenômeno que, entre nós, foi denunciado com vigor Não há dúvidas de que no Brasil não vigora a concepção naturalis-
Eros Roberto Grau. 30 Enquanto regime normativo, ordem das trocas, de mercado, mas a concepção normativa. Basta a leitura dos arts. 1. 0 ,
e 170 da Constituição Federal para alcançar esta conclusão.
2
< •J Assim, entre outros, a análise de Norbert Reich, Intervenção do Estado Afirma o art. 1. ter a República como fundamentos, entre outros,
0

economia- Reflexões sobre a pós-modernidade na teoria jurídica, in RDP, princípios da dignidade da pessoa humana e os valores sociais do
v. 94/266. ·""-''"-"'v e da livre iniciativa (incisos III e IV). 34 Por sua vez, o art. 3. vai
0

2
< 'J Fábio Konder Comparato, Juízo de constitucionalidade de políticas
cas, cit., p. 350.
2
< 'J Fábio Konder Comparato, Juízo de constitucionalidade de políticas Natalino Irti, L' ordine giuridico del mercato, cit., p. 1 L
cas, cit., p. 351. Eros Grau, na primeira edição de A ordem econômica na Constituição de
29
< J Norbert Reich, Intervenção do Estado na economia - Reflexões 1988, São Paulo, 1990, p. 30-33.
pós-modernidade na teoria jurídica, cit., p. 266. Veja-se também Natalino Irti, Concetto giuridico di mercato e dovere di
<' 0J Eros Grau, A ordem econômica na Constituição de 1988", 5. ed., São solidarietá, cit., p. 83.
lo, Malheiros, 2000, em especial o capítulo 2. Veja-se, em especial, Acentuando a valorização do trabalho e a livre iniciativa como "elementos
à expressão "Constituição econômica", no mesmo capítulo. fundadores da ordem econômica", dirá Paulo Henrique Rocha Scott: "A
620 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 621

preceituar ser da República a construção de social que exprime uma forma de conduta correspondente às
sociedade justa e solidária". Já o art. 170 situará como "'"''N"·~ de convivência de toda e qualquer comunidade que se queira
fundante da ordem (jurídico) econômica, entre outros, a implicando a superação de uma visão meramente individualista
sumidor (inciso V), defesa que se põe como um dos para papel de cada um dos seus singulares membros e assim configurando
os objetivos que estão previstos no seu vale dizer, o de de coesão da estrutura sociaP 7 Essa categoria social (e igual-
uma existência digna a todos, conforme os ditames da e política) é apreendida pelo Direito na Constituição, indican-
A referência a esses textos serve para acentuar que, ao gerais, a exigência de evitar, ou ao menos reduzir, a confli-
como objetivo fundamental da República a construção de uma social mediante a superação de uma visão estreitamente egoísti-
de livre, justa e solidária, a Constituição conformou um modelo de Direito.38 Torna-se, pois, exigência ético-jurídica de tipo político,
cado assentado, de um lado, na liberdade de iniciativa econômi papel é o de desenvolver "uma função de endereço político acerca do
outro, na valorização do trabalho e na defesa do consumidor, flmcionrune:nto do próprio ordenamento jurídico". 39
conducentes, todavia, à consecução de um preciso fim- a Do ponto de vista metodológico, este tipo de norma vem designado
uma sociedade solidária -livre, justa e solidária, como afirma o art. expressões "norma-objetivo" 40 ou policy,41 sendo razoável supor
Há, portanto, uma relação íntima entre mercado e
social. Esta é norma conformadora daquele, tanto quanto a Assim exprime Giovanni Maria Uda, Integrazione del contratto, solidarietà
da iniciativa privada e do trabalho, dissolvendo-se, nesta persrlectw:~\<'lil sociale e corrispettività delle prestazioni, in Rivista di Diritto Commerci-
antinomia entre a valorização do trabalho e a livre iniciativa,3 5 pois ale, 1990, n. 5-6, p. 332.
bas se devem conjugar em atenção ao fim comum que as polariza, G. M. Uda, op. cit., p. 333.
seja a construção de uma sociedade solidária. 36 Idem, ibidem.
A expressão "sociedade solidária" tem, no entanto, amplissíma A expressão é de Eros Roberto Grau, in Interpretando o Código de Defesa
gueza semântica e precisa ser, nos mais variados campos da vida do Consumidor: algumas notas, in Revista Direito do Consumidor, v. 5, p.
devidamente densificada. Antes de mais, a palavra "solidariedade" 183, para indicar o modelo de normas que não configuram nem normas de
conduta nem normas de organização, mas que impõem fins a serem perse-
guidos e que passam a compor o ordenamento quando o Estado passa a ser
sua presença no caput do art. 170 da Constituição, cabe destacar, não um implementador de políticas públicas. Não se confundem com as chama-
substancia mero enunciado descritivo, mas a intenção clara de das "normas programáticas", porque obedecem a diverso critério classifi-
de uma norma condicionadora, por meio da qual ficassem ·-c,"'''"""' catório: enquanto estas obedecem ao critério da eficácia, as normas-objeti-
fixados( ... ) os pontos de partida, os alicerces, o 'lugar comum vo são assim classificadas em vista do critério do conteúdo. Veja-se, do
essência' sem o qual não se pode falar da existência de uma ordem mesmo autor, Contribuição para a interpretação e crítica da ordem econô-
mica constitucional brasileira". (Direito constitucional econômico- mica na Constituição de 1988, 1. ed., cit., p. 183, na qual ele explícita:
do e normalização da economia, Porto Alegre, Sérgio Antonio Fabris, "Procurando pontualizar a função que desempenham, no interior do siste-
p. 33.) ma jurídico, podemos referi-las como normas que explicitam resultados e
35
< > Sobre os princípios reitores da ordem econômica e o perfil de uma""''""'""'' fins em relação a cuja realização estão comprometidas outras normas, estas
mia de mercado socialmente orientada", Miguel Reale Jr., lm~orJstituCIOIJil!ê' de conduta e de organização. A importância delas, de outra parte, como
lidade do controle de preços, parecer in Casos de direito rnn<t,w,,.u~,rrak.' critério indiciário dos fins a que se voltam estas últimas, normas de conduta
São Paulo, RT, 1992, p. 19. e de organização, é extremada".
36
< > Veja-se o ensaio de Giorgio Oppo, Diritto privato e interessi pubblicí, A expressão é de Ronald Dworkin, para indicar as pautas que estabelecem
Rivista di Diritto Civile, 1994, n. 1, p. 25, no qual são arrolados os objetivos a serem alcançados, em regra referidos a aspectos econômicos,
de convergência e divergência e apontada a possibilidade de ,....,,.c,onur políticos ou sociais, e assim distintas dos princípios, porque estes têm con-
scelte certamente non facili, una effetiva armonia tra privato e oull:lbl!CO teúdo axiológico, voltando-se funcionalmente ao atingimento de imperati-
622 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 623

que dela decorram - para a construção de uma sociedade soli- Fala-se, assim, em "distinção entre o público e o direito privado"
dária- não só políticas públicas, ações e atividades que a implementem, e em "dicotomia entre o direito público e o direito privado" como ex-
mas, por igual, certos deveres de solidariedade que se impõem a todas pressões sinônimas. Contudo, "distinção" e "dicotomia" não são termos
as relações de mercado e conformam o seu efetivo modelo. outras que ser usados um pelo outro. Uma distinção dicotômica é aque-
palavras, o que quero acentuar é que, justamente porque constitui "nor- la pela adverte Bobbio em célebre passagem, "se pode demonstrar
ma-objetivo", o estatuído no art. 3. 0 da Constituição Federal configura a capacidade: a) de dividir um universo em duas esferas,
"critério indiciário d(os) fins", 42 que devem ser implementados no sentido de que todos os entes daquele universo nelas
normas de conduta, nesta medida corolários imperativos, e necessaria- sem nenhuma exclusão, e reciprocamente exclusivas, no
mente incidentes nas relações de mercado, da diretriz que busca a cons- de que um ente compreendido na primeira não pode ser com-
trução de uma sociedade solidária. ,nr."'"'"""u''" contemporaneamente na segunda; b) de estabelecer uma di-
Ora, o trato desta matéria- qual seja a implementação, pelas nor- que é ao mesmo tempo total, enquanto todos os entes aos quais
mas de conduta, normalmente previstas na legislação ordinária e nos: !ltu.cuu•'-'HL'- e potencialmente a disciplina se refere devem nela ter lugar,

contratos, da norma constitucional impositiva da solidariedade social enquanto tende a fazer convergir em sua direção outras di-
conduz a uma importante questão metodológica, que é a de saber .cv,,vuuuú que se tomam, em relação a ela, secundárias". 44
incidem as normas constitucionais nas relações interpri vadas. A ela sub- A divisão dicotômica apresentou-se como necessidade na constru-
jaz, por sua vez, uma questão de fundo antes já aventada, a saber, a do Estado liberal oitocentista. O Estado Democrático de Direito,
separação dicotômica entre o direito constitucional e o direito
a:s1>.lUC!JlU Tarso Genro, 45 fundou-se na separação entre legalidade e ética
"Lutar com palavras é a luta mais vã", 43 escreveu nosso o que foi importante para permitir o seu processo de afirmação
poeta. E é a luta mais vã não apenas porque "o inútil duelo jamais IU311V<Jl'-'"'no século XIX, mas resultou no positivismo legalista. Fundou-
resolve". Também é porque, para os juristas, as palavras por igual, na separação entre Estado e sociedade, na base da qual
perigosos instrumentos de trabalho, como os bisturis os são para a convicção de que deveria o Estado não tanto dirigir a sociedade,
cirurgião, e a pá é o meio que tem o pedreiro para cimentar s exercer sobre ela o poder de império e um ius iurisdictionis46 aplai-
mente uma parede. Para nós, as palavras são instrumentos de ' dicotomizando inclusive as ordens ou formas de regulação jurídi-
são. Se manejados deficientemente, estes nossos bisturis contidas no seu interior: para um grupo de relações, o direito público,
danos, pelo menos os danos da incompreensão e da uallíficac:ã' outro, o direito privado. E essa mesma dicotomia apresentou-se
Porque qualificar é compreender . conseqüência (e por vezes como causa) de outras trabalhadas di-
O tema da distinção entre o direito público e o direito 'GVl''-'luw;;.· Estado e sociedade civil, política e economia, Direito e Eco-

entre normas constitucionais e normas de leis infraconstitucionais lei e contrato, relações (sociais) de verticalidade e relações (so-
das, entre Constituição e Código Civil, em suma, tem sido de horizontalidade, Constituição e Código Civil, normas de orga-
mente tratado ora como mera distinção, ora como distinção , normas de conduta, interesse público e interesse privado.

vos de justiça, de honestidade ou de outras dimensões da moral (v. Norberto Bobbio, Estado, governo, sociedade- Para uma teoria geral da
rights seriously, que li na tradução espanhola de Marta Gustasvino, política, trad. de Marco Aurélio Nogueira, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1987,
derechos en seria, Barcelona, Ariel, 1989). p. 13-14.
<42 ) A expressão sublinhada é de Eros Grau, in A ordem econômica na Tarso Genro, A relação da administração pública com a sociedade, in Anais
tuição de 1988, 1. ed., 1990, cit., p. 183. do XXIV Encontro Nacional de Procuradores Municipais, Porto Alegre,
<•'i Carlos Drummond de Andrade, O lutador, ora in Reunião, Livraria 1998, p. 57.
Olímpio Editora, 1973, p. 67. Luciano Parejo Alfonso, citado, p. 11.
624 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 625

Hoje, como se sabe, os dados da equação dicotômica é abrangente de normas cujo conteúdo material em muito
dos. Nas democracias contemporâneas, o Estado não é ""'""JU''"'"'- a mera regulação da organização estatal. Carreia para o seu
sociedade, está sujeito à dinâmica dos movimentos sociais, normas materialmente privadas (e também penais, administrati-
lizando-se pelas condições da vida coletiva. 47 Mudada a co1nn:re etc.) e é compreensivo de diretivas e princípios dotados de
do papel do Estado e a sua articulação com a sociedade eficácia normativa cuja incidência opera em todo o ordena-
tuição passou a ter, desde a segunda metade do século qual fala-se até em um "direito civil constitucional". 52
mente modificado o seu modelo. De mero conjunto de normas de também no que concerne ao direito privado, os dados do
nização da estrutura política do Estado, passa a receber, oit1xentistaforam subvertidos. Hoje já não é concebível visuali-
as declarações dos direitos humanos, acresce-lhes outros, o privado reduzindo-o ao Código Civil, ao Código Comer-
ciais e direitos difusos, renomeia-as sob o título de direitos a uma ou outra "lei extravagante". Não é mais concebível enten-
tais, soma-lhes garantias, também ditas fundamentais, traz para privado como um conjunto de regras de conduta neutras,
corpus matérias de direito privado e arrola valores e objetivos e e técnicas, isto é, regras tão-somente instrumentais, passíveis
imputando a sua implementação tanto .ao Estado quanto à postas, criadas e desenvolvidas por uma autoridade estatal onisci-
Mais do que tudo, a Constituição passa a co limar fins de ordem totalitária e totalizante e, neste sentido, divorciada da criadora ex-
econômica, social, a implementar políticas, "normas-objetivo",4« . cotidiana dos usos da sociedade civil e dos valores fundamen-
que vinculam o Estado e a comunidade. na, ou deduzidos da Constituição.
Política, norma-objetivo, policy, é programa de ação. É Opassar do tempo provoca pentimentos. Na arte é conhecido o fenô-
"conjunto organizado de normas e atos tendentes à realização que haviam renovado o desenho original, acrescentando-
objetivo deterrninado". 49 Não mais se pode, pois, ver o direito não pensados pelo primitivo autor, começam a desgastar e,
muito especialmente o Direito Constitucional, como o mero permitem vislumbrar os seus primeiros lineamentos, a ori-
lllJIHAuv.

das normas de organização da estrutura e das funções do Estado artística. Assim também no Direito. Desbastado da conotação
seus poderes. Desenhando a Carta Fundamental modelos de egoísta", que lhe fora ideologicamente emprestada no final do
formador e impositivo para o Estado e para toda a sociedade,5° XIX, como crítica ao excessivo liberalismo consagrado pela Revo-
se a era da "Constituição dirigente". 51 rancesa,53 que afirmou a centralidade do indivíduo,54 hoje o direito
reapresenta-se como o Direito da cive: "Entendamos o direito
Significa dizer que o Estado social de Direito reorganiza a
estatal em função de finalidades coletivas e, bem por isso, entre
alhures, o modelo vigente de Constituição, desde a segunda entre nós, o pioneiro trabalho de Maria Celina Bodin de Moraes, A
de um direito civil constitucional, in Revista de Direito Civil, n.
p. 21. Registro, contudo, compreender esta expressão apenas em seu
47
< > Idem, ibidem. significante de uma mudança no modo de compreender a relação en-
< •> Vide notas 39 e 40. a Constituição e o direito privado, pois não se pode imaginar um direito
4

<49> Fábio Konder Comparato, Juízo de constitucionalidade e políticas que seja a- ou in-constitucional.
cas, cit., p. 353. iniciar sua crítica ao "direito civil clássico", Maria Celina Bodin de
< > Eros Roberto Grau, A ordem econômica na Constituição de 1988,
50 toma como ponto de partida o direito civil pós-napoleônico e, a
lo, Malheiros, 2000, p. 37. deste, situa a distinção dicotômica em relação ao Direito Público. A
5
< '> A expressão tomou-se difundida pela obra de J.J. Gomes '-'"uv'""'"' marca (e por isto a dicotomia) residiria na oposição entre os interesses
tituição dirigente e vinculação do legislador, Coimbra, Coimbr o público e o privado. (Op. cit., p. 22.)
1982. Trata exaustivamente do tema Eros Roberto Grau, A ordem , ao situar o direito do indivíduo diante do poder absoluto,
cana Constituição de 1988, 5. ed., cit., p. 61 e ss. sepultou valores e instituições de cunho comunitário até
626 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 627

privado na nobre acepção de direito direito sim dos~~-~'-~~ ' e direito privado assim, numa relação ou de
1t;1u,.... u-~·~
ou de dialética complementaridade. Coincidência quando
dos particulares uti cives; direito dos particulares como portadores
própria singularidade, mas também da necessidade de coJtnunic:á-1,. como seu princ1p1o a dignidade da pessoa, pois
outros; da necessidade de isolar-se (que é algo a ser -''-'''IY"'nauo por acaso que, a par de a Constituição arrolá-lo já em seu primeiro
bém de associar-se; da necessidade de defender a própria..,,.,~~--' a classificação do Código58 inicia com a proteção à pessoa e à sua
,nu•u'""~~V· Complementaridade quando às normas infraconstitucio-
mas também de desenvolvê-la na comunidade que a
comprime", afirma, magnificamente, Giorgio Oppo. 55 dos fica reservado o papel de especificar, de detalhar a completa irnple-
dos princípios constitucionais, e, bem assim, de suas diretivas. 59
culares, do que é, pois, de interesse particular na tríplice dimensão
(direito da personalidade), do ter (direito de propriedade) e do agir Esta perspectiva é hoje pacífica na mais atualizada doutrina. Como
to das obrigações, dos contratos e da empresa), mas que nem por Teresa Negreiros, "pouco a pouco difunde-se entre nós a idéia
contrapõe ao que é interesse público, pois direito dos j..J«Llll,ul<ir os princípios atuam na estruturação e na fecundação do sistema
vivem em comunidade, na ordem civil, ordem taxionômica, que não mais lhes cabe o papel de fonte meramente suple-
da, e normativamente construída. auto-integração do ordenamento, como aquela suposta pela dicção
4. o da Lei de Introdução do Código Civil brasileiro". 60 E não só os
Por isso, a relação entre o interesse público e o direito
também as diretrizes, ou "normas-objetivo" postas na Cons-
é, diz Oppo, uma relação de necessária colisão, jamais cm1stítui1rrdo
de modo que a tarefa de reconstrução do direito privado na
relação de indiferença: "a relação ou é de coincidência ou- num
exige a atenta concretização das normas constitucionais, in-
sentido - de limite, de coordenação, de instrumentalidade, como é
a percepção dos deveres que delas defluem.
do pela unidade da ordemjurídica". 56 É, nas palavras de
relação de dialética complementaridade, constituindo ambas Assim o tantas vezes descurado art. 3. 0 da Constituição Federal.
vas distintas, situadas por vezes em tensão, por vezes em afirma Eros Roberto Grau, 61 da consagração de princípio
porém complementarmente correlacionadas e mutuamente uu•-lvJt«uimpositivo, no dizer de Canotilho, ou diretriz (Dworkin),
no processo de ordenação jurídica da experiência social. norma-objetivo, evidenciando-se o seu caráter constitucional
. Livre é a sociedade "sob o primado da liberdade, em todas
manifestações e não apenas enquanto liberdade formal, mas so-
então laboriosamente construídos pela sociedade (para este como liberdade real". 62 Justa é a sociedade que realiza a justiça
se, por todos, Paolo Grossi, L'ordine giuridico medievale,
sa, 1995, e, no que concerne aos reflexos deste processo no
propriedade, Bartolomé Clavero, Les domaines de la proprieté: 1 ao projeto de Código Civil brasileiro, já que o vigente Código
propiedades y propiedad en el laboratorio revolucionaria, in dedica capítulo específico aos direitos da personalidade.
Fiorentini per la storia deZ pensiero giuridico moderno, v. 27, a propósito, Maria Celina Bodin de Moraes: "Os valores propug-
1998). Porém o individualismo faz sua entrada no pensamento pela Constituição estão presentes em todos os recantos do tecido
na passagem do século XIV ao século XV, quando, por obra da resultando, em conseqüência, inaceitável a rígida contraposição
de Guilherme d'Occam, o homem é visto não mais como direito público e direito privado" (op. cit., p. 24).
Direito, mas como seu sujeito. Negreiros, Dicotomia público-privado frente ao problema da coli-
55
< ) Giorgio Oppo, Diritto privato e interessi pubblici, in Rivista dí de princípios, in Teoria dos direitos fundamentais, (org.) Ricardo Lobo
le, 1994, n. 1, p. 26 (traduzi). Rio de Janeiro, Renovar, 1999, p. 343.
56
< ) Idem, ibidem (traduzi). Roberto Grau, A ordem econômica na Constituição de 1988, 5. ed.,
57 p. 241.
< J Miguel Reale, O projeto do Código Civil - Situação atual e
fundamentais, São Paulo, Saraiva, 1986.
628 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 629

social. E solidária "é a sociedade que não inimiza os homens previdenciário, as regras que consagram a responsabilida-
que se realiza no retomo, tanto quanto historicamente etc. são exemplos tradicionais de sua atuação. A novidade
chaft- a energia que vem da densidade populacional das relações obrigacionais- por muito tempo tidas
afastando os homens uns dos outros". 63 como o reino do interesse individual, até mesmo "egoís-
- como relações que podem e devem concretizar, em larga medida,
Contudo, tanto quanto as expressões "liberdade" e "justiça", é
de solidariedade social.
sa a carga denotativa da expressão "solidariedade" e vaga é a
são a deveres que lhe seriam conotados. Por certo, a existência de Como, no entanto, esses deveres estão previstos? Como passam do
res decorrentes da solidariedade social impõe-se ao intérprete da das proposições constitucionais à concreta realidade co ti-
tituição, à medida que não seria admissível considerar as suas então a questão de saber como especificá-los, e a quem é
como vazias de significado e eficácia verdadeiramente ~v•"•uacu esta tarefa, pois não se pode imaginar que a configuração des-
vendo-se, por isso mesmo, buscar a sua concreção. Como alerta deveres fique exclusivamente ao completo alvedrio do intérprete.
rato, "tais objetivos são juridicamente vinculantes para todos os técnicas encontram-se articuladas neste mister.
do Estado e também para os detentores do poder econômico ou A primeira é a sua explicitação em lei ordinária e em atos administra-
fora do Estado", 64 não podendo ser posta em dúvida, "nesta Como acentua Irti em relação ao direito italiano - cuja Constituição
evolução jurídica", 65 a juridicidade das normas que declaram tais tem norma impositiva da solidariedade66 - ,os deveres constitucio-
que impõem a realização de determinado programa de de solidariedade exigem a mediação da lei ordinária e do ato adminis-
67 com isto significando dizer que esses deveres devem estar previs-
Nesta medida cabe tentar examinar como opera, nas a legislação infraconstitucional ou em atos administrativos, voltando-
mercado, a sua concreção, apontando-se aos métodos ..·''"'"'"'R uc;;J~ul'""'"'v das concretas situações intersubjetivas, pois a solidariedade
permitir a inserção de diretriz da solidariedade social nas co11dutas concebível em abstrato, "fora de uma situação concreta que desenhe o
Direito é chamado a regular. propício a que vivifiquem as relações cotidianas". 68
oro efeito, o auxílio da lei, para organizar os deveres, e o dajuris-
1.1. 3 Operabilidade da diretriz da solidariedade social nas . para definir a sua extensão e o seu alcance, é indispensável.
mercado muitas vezes os preveja expressamente, a legislação infra-
Ll"'''v''""" também pode, ao invés de tão-somente puntualizar os
Para além de sua ampla vagueza semântica, a expressão
ensejar a sua construção por via da atividade judicial, na hipó-
que decorrem da solidariedade social" possui largo espectro de e contemplar cláusulas gerais ou conceitos indeterminados que
ção. É certo que indica deveres instrumentais, pois têm como o acolhimento concreto da diretriz em um âmbito de regulação
permitir a implementação do objetivo posto no art. 3. 0 da específico. Como já tive ocasião de assinalar, 69 as cláusulas
Federal, espraiando-se por uma imensa diversidade de
e encontrando os mais diversos meios de atuação. Normas
implementam planos econômicos, certas regras tributárias, 2: La Repubblica riconosce e garantisce i diritti inviolabili dell'uomo,
como singolo sai nelle formazioni sociali, ove si svolge la sua persona-
das regulações premiais, preceitos de direito administrativo, de
e richiede l'adempimento dei doveri inderogabili di solidarietà politi-
urbanístico, de direito econômico em sentido estrito, de direito
economica e sociale".
Irti, Concetto giuridico di mercato e do vere di solidarietá, cit., p. 87.
63
< ) Idem, ibidem, p. 242. ibidem.
6
< •J Fábio Konder Comparato, Juízo de constitucionalidade de vul"ttu;u~ nossos A boa-fé no direito privado, e O direito privado como constru-
cas, cit., p. 353. as cláusulas gerais no projeto do Código Civil brasileiro, in Revista de
65
< J Idem, ibidem. Legislativa, v. 139, Brasília, 1998.
630 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 631

gerais constituem técnica legislativa que conforma o meio hábil direção a um princípio ou regra postos na lei infra-
permitir o ingresso, no ordenamento jurídico codificado, de
de standards, arquétipos exemplares de comportamento, de três modos acima sucintamente delineados ocorrerá a inser-
conduta não previstos legislativamente (e, por vezes, nos casos constitucional nas relações obrigacionais de mercado.
tos, também não advindos da autonomia privada), de direitos e
configurados segundo os usos do tráfego jurídico, de a"'''"'"""""' que o termo "mercado" designa o estatuto jurídico das
cas, sociais e políticas e de normas constantes de universos econômicas. As relações econômicas de troca de bens- produ-
cos, viabilizando a sua sistematização e permanente serviços- são instrumentalizadas, por sua vez, por institutos jurídi-
no ordenamento positivo. do das obrigações - notadamente os negócios jurídicos. O
assentou lapidarmente Enzo Roppo, é a veste jurídica das ope-
Isso porque, nas cláusulas gerais, a formulação da hipótese econômicas, operações de circulação de riqueza. 73 Constituem,
procedida mediante o emprego de conceitos cujos termos têm
0 meio através do qual é instrumentalizada a circulação da riqueza,
dos intencionalmente vagos e abertos, os chamados "conceitos por isto instituto central da economia capitalista.
indeterminados". Como estão situadas setorialmente, au.uuam
ereta regulação de determinados domínios de casos- v. g, na Ora, antiga e ainda valiosíssima lição doutrinária ensina que as
lidade civil, no direito dos contratos, nas relações pessoais de obrigacionais constituem nada mais, nada menos, do que reZa-
nos direitos de personalidade- viabilizando a sua sistematização de cooperação. 74 As relações obrigacionais, como é por todos sabi-
a sua introdução ordenada no sistema jurídico. Constituem,
via privilegiada para a contínua construção e reconstrução da realização prática do direito terá sido compreendida de forma equivocada",
de dos princípios e das diretivas, desde que a jurisprudência, co com isto acentuando que se concretiza a norma ao invés de interpretar o
ponsabilidade, senso ético e sabedoria, saiba retirar todas as texto da norma, a interpretação consistindo um dos elementos - dos mais
cias que esta técnica enseja. importantes, por certo, mas não o único- do processo de concretização.
(Métodos de trabalho do direito constitucional, 2. ed. São Paulo, Max Li-
Por fim, atua, ainda, a diretriz, pela direta incidência da monad, 2000, p. 61.)
ção,7° de duas formas distintas: negativamente, isto é, limitando A questão da eficácia das normas constitucionais nas relações interprivadas
pedindo a eficácia de norma infraconstitucional que com ela não é pacífica, aqui e no direito comparado. Para um exame consultem-se,
positivamente, em caso de lacuna legislativa, por via da entre outros, Konrad Hesse, Derecho constitucional y derecho privado, trad.
de Ignácio Gutierrez Gutierrez, Madrid, Civitas, 1995; Gilmar Ferreira
70
Mendes, Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade, São Paulo,
< J A jurisprudência brasileira começa a se pronunciar sobre o tema da Ed. Celso Bastos, 1998, em especial cap. 8; e, para o direito italiano, Pietro
cia, direta ou indireta, da Constituição, na relação de direito privado, Perlingieri, Il diritto civile nella legalità costituzionale, Nápoles, Ed. Sci-
do ocorre a violação de direito fundamental. Nesse sentido, acórdão entifiche Italiane, 1991, notadamente p. 189-200.
HC 12.547/DF, rel. min. Ruy Rosado de Aguiar, em cujos furtdarnen Enzo Roppo, O contrato, Coimbra, Almedina, 1988.
lê: "Não me parece que a eficácia na relação de direito privado seja
Enu1io Betti, Teoria geral de las obligaciones, Madrid, Ed. Revista de Derecho
indireta, pois bem pode acontecer que o caso concreto exija a Privado, 1969, t. I. Como é sabido, a expressão indica, primeiramente, o critério
imediata do preceito constitucional, quando inexistir norma utilizado pelo autor para extremar as relações de direito obrigacional das rela-
cional que admita interpretação de acordo com a diretiva '-Vitl~tlltu'-'" ções de direito real. Nas relações de direito real resolve-se um problema de
faltar cláusula geral aplicável naquela situação, muito embora esteja atribuição de bens, enquanto nas relações de direito obrigacional resolve-se um
te a violação de direito fundamental". Observo, no entanto, que a problema de cooperação ou de reparação nas hipóteses de responsabilidade
dade social não configura "direito fundamental", mas diretriz. civil. No primeiro caso, trata-se de atribuir bens a uma pessoa, ou da correlativa
70
< Alerta Friedrich Müller: "Enquanto forem indicadas como ' ""'"'uo,au. no segundo caso, trata-se de cooperação, devida por um membro do
práxis e da ciência jurídicas somente regras de interpretação, a conjunto social no interesse típico de outro membro do conjunto social.
632 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 633

do, têm como elemento nuclear uma prestação, positiva ou que num contrato bilateral têm interesses antagônicos, mas conver-
que se revela como desenvolvimento de uma atuem, em vista do interesse legítimo do alter. Compre-
de um obrar ou como assunção de uma >nr.-.h·"n1 a razão qual as de uma relação obrigacional
cios. 75 Na sua tríplice dimensão, explica distingue-se, na ser vistas como entidades isoladas e estranhas, atomistica-
ção, um momento subjetivo, que se refere à conduta de cooperaç 79 constituindo a necessidade de colaboração inter-

putada ao devedor, e um momento objetivo, ao qual se refere a como afirmou Menezes Cordeiro, "principio geral da discipli-
que a prestação é chamada a trazer ao utilidade de so
e que normalmente coincide com cada conduta de cooperação. 76 e é o mesmo autor quem "se o direito das obrigações
A conjugação desses momentos, subjetivo e objetivo, colaboração intersubjetiva, implica, dada a sua natureza de Di-
adimplemento, finalidade da relação, que a polariza e atrai, inserido em determinada sociedade, um certo tipo de colabora-
que a relação obrigacional desenvolve-se como um processo em uma colaboração informada pelos valores próprios da ordemjuri-
à sua finalidade, que é a solutio, o adimplemento. 77 A utilidade, ômica considerada". 81 E entra a relação entre a solida-
to objetivo, diz respeito ao "programa econômico contratual", isto e o principio da boa-fé objetiva. 82 Porque, nas relações
relação econômica de base que se apresenta como a causa o que se exige é uma atitude positiva de cooperação, de
ajuste. Já a cooperação, momento subjetivo porque ligada à uma atitude em favor do interesse alheio, designando neste
sujeitos, não está reduzida ao cumprimento do dever principal, a expressão boa-fé "um critério de conduta inspirado e infor-
espraiando pelos deveres ditos secundários, anexos, colaterais ou pelo interesse da outra parte, conduta dirigida ao cumprimento
mentais, 78 que encontram a sua fonte ou em dispositivo legal, da de cooperação da contraparte". 83 Assim, os de-
cláusula contratual, ou no princípio da boa-fé.
A particularidade dos deveres instrumentais está em que o
copo diz com o exato processamento da relação obrigacional
· Manuel Menezes Cordeiro, Direito das obrigações, cit., p. 143.
da como uma totalidade unificada finalisticamente. Daí a ·
por exemplo, do dever de lealdade, que implica o dever de ibidem.
condutas que possam prejudicar o parceiro contratual ou co1rnnron trabalho de grande importância, porque rompe com a perspectiva tradi-
que secciona o direito privado das normativas constitucionais, recon-
utilidade buscada no contrato, o programa econômico que
Teresa Negreiros o princípio da boa-fé objetiva ao princípio constitu-
momento objetivo da prestação.
da dignidade da pessoa humana (Fundamentos para uma interpreta-
Nesta medida compreende-se a razão pela qual, para que a constitucional do princípio da boa-fé objetiva, Rio de Janeiro,Renovar,
dade de um contrato seja eficazmente atingida, é necessário que Sem discordar deste entendimento, entendo, porém, que este é medi-
' neste campo específico, pela diretriz da solidariedade, que se aproxi-
75
da boa-fé objetiva em grau mais próximo. Assim apontei em Crise e
< J Emílio Betti, op. cit., p. 37-43. Jllll-""'''u da idéia de contrato no direito brasileiro, in Revista Direito do
76
< ) Idem, ibidem, p. 37-38. Examinei a relação obrigacional de , v. 4, p. 138. Há esta mediação porque, em última instância, toda
relação de cooperação em A incidência do princípio da boa-fé no norma do ordenamento funda-se no princípio da dignidade, cuja
pré-negociai: reflexões em torno de uma notícia jornalística, in projeta-se por todo o ordenamento. A eficácia, porém, é dimensão
reito do Consumidor, v. 4, p. 140 e ss. ces:sari.arntemte graduada, que exige mediações. Por seu específico signifi-
cn) Veja-se, por todos, Clóvis do Couto e Silva, A obrigação como a solidariedade social, exigência também decorrente do reconhecimen-
São Paulo, José Bushatsky, 1976. •u•.<umuc!ll'u dignidade da pessoa, atine, no meu entender, com a boa-fé
7
< 'J Para o exame e indicação da bibliografia, nosso A boa-fé no de modo mais direto ou imediato.
do, cit., p. 437 e ss. Teoria general de las obligaciones, cit., p. 86.
634 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 635

veres de cooperação derivados da conduta segundo a e esclarecimento; de informação; de consideração com os legí-
e especificam, neste campo da vida jurídica, a interesses do parceiro contratual; de proteção ou tutela com a pes-
solidariedade social, seja na relação contratual, seja na --~~"'~'v oatrinaôxno da contraparte; de abstenção de condutas que possam
cionallato sensu considerada, inclusive a resultante de atos o programa contratual; de omissão e de segredo, em certas
87
Se o sentido geral da boa-fé é o de nortear o teor da deveres que podem anteceder o contrato, na chamada fase
intersubjetiva, especialmente no direito das obrigações, é Jll"'~--·-., 88 ou mesmo prolongar-se findo o negócio, hipótese da
89
fé produz deveres instrumentais e "avoluntaristas" e Jw,auJlH'-'"'"'·'"' pós-contratual.

certos casos, o exercício de direitos. 85 Assim como ocorre a criação de deveres, pode ainda verificar-
São instrumentais os deveres decorrentes da boa-fé, incidência da boa-fé, a limitação do exercício de direitos
cionando o contrato à sua função, operacionalizam a
riedade, e são "avoluntaristas" porque não derivam, uc1;c~sarulm 131060, rel. des. Moacyr Adiers, j. em 26.06.1997, nos seguintes ter-
do exercício da autonomia privada nem de punctual explicitação Infringe a boa-fé objetiva a médica que, tendo sido licenciada
tiva, mas têm sua fonte no princípio da boa-fé objetiva, · tratamento de sua saúde no cargo público que ocupa, vem, no período
relação a ambos os participantes da relação obrigacional. da licença, a atender paciente particular ou a trabalhar em instituição hospi-
talarparticular, comprometendo a sua plena recuperação, objetivo da licen-
vamente, os deveres de lealdade, 86 de cuidado, previdência e
ça deferida".
a explicitação deste tema, ver o nosso A boa-fé no direito privado, cit.,
<84J Na mais recente literatura jurídica italiana se entende que a boa-fé, especial p. 437 e ss.
princípio geral, "si dovrebbe desumere dal principio di solidarietà, exemplar acórdão do TJRGS, Ap. Civ. 598209179, 10." C. Civ., rei. des.
dotto nel nostro ordinamento dall' art. 1175 dei Codice Civile ed Cunha Vieira, ementado nos seguintes termos: "Responsabilidade
rango di principio costituzionale in forza dell'art. 2, secondo cui ou culpa in contrahendo. Tendo havido tratativas sérias refe-
degli interessi dei sogetti si attua non solo garantendo la sfera · à locação de imóvel, rompidas pela requerida sem justificativa e sem
ognuno (ché cio sareble il normale contenuto dei principio del dos deveres anexos decorrentes do princípio da boa-fé objeti-
alterum laedere), ma altresl prevvedendo che 1' esercizio dei diritti cabe indenização. Lições doutrinárias. Apelo provido em parte".
sa avvenire in maniera tale da comportare un eccessivo sacrifício
sentido, TJRGS, Ap. Civ. 70001037597, 9." C. Civ., rei. des. Paulo de
teres si altrui" (Francesco Manganaro, Principio di buona fede e
Vieira Sanseverino, j. 14.06.2000, assim ementada: "Responsabilida-
delle ammínistrazioni pubbliche, Nápoles, Edizioni Scíentít1:ch1e
civil. Fato do serviço. Protesto indevido de duplicata. Dano moral. Art.l4
1995, p. 24-25). Atente-se que, entre nós, no projeto do
CDC. 1) Ato ilícito consistente no encaminhamento para protesto dedu-
boa-fé é invocada não apenas no domínio contratual, onde é um
já paga, ainda que com atraso, pela devedora. 2) Responsabilidade
pios cardeais (art. 422), mas, por igual, em tema de abuso, numa
e solidária da empresa mandante, ainda que a falha do serviço de
cláusula geral de ilicitude (art. 187), como um dos fundamentos do
tenha sido praticada pelo banco mandatário a quem transferida a
indenizar e, em matéria de condições, na regulação geral do
do título. Conseqüente legitimidade para compor o pólo passivo da
co (art.128), estando ainda prevista como norma de interpretação
3) Ausência de prova da culpa exclusiva de terceiro (banco manda-
cios jurídicos (art. 113), entre outras referências tópicas.
cujo ônus era da fornecedora apelante. Art. 14, § 3.0 , H, do CDC. 4)
<' 5l Assim o nosso A boa-fé no direito privado, cit., p. 438. · do dever de diligência pela fornecedora apelante, decorreu-
<86l TJRGS, Ap. Civ. 596251181, 1.· C. Civ., rei. des. Armínio José objetiva, no período pós-contratual, em face da não comprovação
Lima daRosa,j. em 18.03.1998, em cuja ementa se lê: "Ação medidas necessárias para o recolhimento do título posto em cobrança
ria. Imóvel que integra loteamento industrial e alienado a preço Ônus da prova do fornecedor. Art. 14, § 3.0 , II, do CDC. 5) Arbitra-
à reivindicante, com a condição de ser implementada construção, da indenização correspondente ao dano moral em montante razoável
o foi em tempo hábil. Resolução do negócio jurídico. Boa-fé objetiv salários mínimos) em consonância com a orientação da Câmara para ca-
dência da ação e da denunciação. Apelos providos". Por igual, análogos. Sentença procedência mantida. Apelação desprovida".
636 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 637

subjetivos ou de direitos formativos. Isto por hipótese designada


quando a boa-fé enseja a aplicação da teoria dos atos quoque. 93
invocação da regra que veda venire Estes deveres e limitações não são passíveis de definição a
coíbe a abusiva invocação da exceção de contrato não necessários para a realização do "programa contratual"
da exceptio non rite contractus; quando o no aspecto objetivo e econômico-social)94 concretamente
do poder formativo extintivo de resolução, quando ocorreu 0 "''-'J'"~~· Portanto, sua especificação depende de cada contrato, à
plemento substancial da obrigação; 90 veda a sua relação econômica de base, afirmando Ruy Rosado de Aguiar
por inadimplemento antecipado da obrigação; 91 ou, boa-fé "implica a criação de uma norma para o caso de acordo com
impede a exigibilidade de um direito se o titular permaneceu
por longo tempo, por forma a criar na contra parte a legítima
ti v a de que o mesmo não mais seria exercido (supressio ); 92 ou do TJRGS na Ap. Civ. 70001376607, 2.a C. Civ., rel. des. Maria Isabel
de Azevedo Sousa, j. em 13.09.2000, in verbis: "Administrativo. Serviço
de fornecimento de energia elétrica. Contrato de mútuo firmado
90
< ) Exemplar é o acórdão TJRGS no AI 70000023633, 1." C. de Férias, usuário e a concessionária. Correção monetária. Cláusula contratual.
Paulo de Tarso Vieira Sanseverino,j. em 18.11.1999, in verbis:" da boa-fé. Limitação do exercício do direito subjetivo. Supressio.
busca e apreensão. Alienação fiduciária. Função de controle da boa-fé A supressio constitui-se em limitação ao exercício de direito subjetivo
tiva. Adimplemento Substancial. Tendo o devedor cumprido paralisa a pretensão em razão do princípio da boa-fé objetiva. Para sua
mente sua obrigação, imperiosa se revela a manutenção do contrato '"""w"'""v, exige-se (i) decurso de prazo sem exercício do direito com
lado. Atentatório ao princípio da boa-fé objetiva almejar-se a objetivos de que o direito não mais seria exercido e (ii) desequilí-
de posse do bem alienado fiduciariamente quando o devedor ação do tempo, entre o benefício do credor e o prejuízo do deve-
quase totalidade do débito (vinte e uma de vinte e quatro "'"''<t''~"· Lição de Menezes Cordeiro. 2. Não caracteriza conduta contrária à
tando apenas três parcelas a serem solvidas. Limitação do direito o exercício do direito de exigir a restituição atualizada de quantia
extintivo do credor de resolução do contrato de financiamento pela depois de transcorridos mais de quinze anos se tal não gera
cia do princípio da boa-fé objetiva em sua função de controle. desproporcional ao devedor em relação ao benefício do cre-
abusivo do direito subjetivo de resolução, máxime quando o veícu . Hipótese em que o mútuo não só permitiu a expansão da rede pública
lizado como instrumento de trabalho para o agravante (transporte concessionário de serviço público de energia elétrica como também a
Agravo provido". :plc>ra<;ao econômica do serviço mediante a cobrança de tarifa, sendo que
91
< ) TJRGS 596071530, 5." C. Civ., rei. des. Paulo Augusto Monte a par da contraprestação, engloba a amortização dos bens reversíveis.
23.05.1996. Muito embora tenha o relator fundamentado a decisão na portanto, desequilíbrio entre o valor atualizado a ser restituído e o
do dever de lealdade, o caso poderia ser fundamentado na doutrina do ""~"'"~'v fruído pelo apelado durante todo este tempo, não há falar em pa-
plemento antecipado, pois, não tendo sido realizadas as obras de .rl11JtSa\;ao do direito subjetivo. 3. Conquanto tenha o contrato de mútuo fir-
ra, o contrato não poderia ser adimplido no seu termo, como pode entre o usuário e a concessionária do serviço público de energia elé-
ementa: "Contrato. Resolução. Boa-fé objetiva. À medida que a para custeio das despesas a cargo desta de implantação do fomecimen-
incidia com a realidade, mormente no acesso ao loteamento e no trato stabelecido que a quantia seria restituída sem correção monetária, tem
tico, razão igualmente do afastamento da corretora que procedia às o usuário de receber o montante atualizado pena de arcar com os
violou preceito de boa-fé objetiva, não elidindo a demanda sua que devem ser suportados pela concessionária e para cuja presta-
de com a regularização do empreendimento no Registro de Imóveis é remunerado na forma de contrato de concessão. Recurso desprovido".
cipalidade; todavia, deve ser afastada da condenação a primeira o exame dessas hipóteses, António Manuel Menezes Cordeiro, Da
não integrou o patrimônio da demandada, tratando-se da comissão no direito civil, Coimbra, Almedina, 1989, e o meu A boa-fé no
que também contribuiu para o ajuste. Apelo provido, em parte". privado, cit., p. 455 e ss.
<n) Nesse sentido, conquanto para afirmar que na hipótese concreta M. Uda, op. cit., p. 306. Fazendo expressa referência, nos fundamentos
ocorrido a supressio, mas realizando proficiente análise da voto, ao "programa contratual", e bem examinando a sua relevância ao
MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 639
638 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO

•uu~"·- em que a boa-fé não vem o


os dados objetivos que ele mesmo apresenta, atendendo à •vu...,u,au~::
ter base constitucional na solidariedade social, deve ser utili-
cial e econômica em que o contrato opera, ainda que isto o
a disposição existente não seja para regulamen-
do círculo da vontade". 95 97
caso concreto.
É que, se apenas a autonomia privada estivesse no centro
No do CDC, no qual a boa-fé vem explicitamente referida,
plina contratual, inerte restaria, neste campo, a diretriz da -~··~""!'
funções de criação de deveres, limite de direitos e de interpretação
social. Incidindo a boa-fé, não é, porém, o que ocorre, -v••v"'"''"~ru
do contrato são ainda acrescidas. Vale a pena, por isto,
a solidariedade social na relação contratual, tendo em conta a
agora a boa-fé objetiva considerada em sua ligação com a
econômica subjacente ao contrato segundo todos os critérios
da solidariedade social no âmbito específico das relações de
que informam esta figura.
paradigma que são das relações de mercado.
Em suma, em paralelo aos deveres derivados do exercício da
nomia privada e daqueles especificamente cominados na lei, os
decorrentes da boa-fé, concretizados por via da atividade· ·
no campo de função demarcado pela relação obrigacional
tornando operativa, a diretriz constitucional. Daí também a sua de Defesa do Consumidor teve a vantagem, sobre o or-
hermenêutico-integrativa, 96 pela qual, mesmo naqueles campos de direito privado comum, de deixar expresso em seu texto o
de agir segundo a boa-fé objetiva. 98 Mas não se pense que
deslinde da questão, o acórdão TJRGS, Ap. Civ. 597093707, 5.• do advento do CDC o princípio da boa-fé não vigorava entre nós,
rel. des. Araken de Assis, j. 07.08.1997, em cuja ementa se lê: estava positivado: a positivação é um processo99 decorrente de
Seguro Saúde. Recusa da Seguradora de liberar senha ao uma das fontes reconhecidas como fontes de produção jurídi-
tência de infração ao princípio da boa-fé. Inadmissibilidade do uma das quais é a jurisdição- e, incontroversamente, por viajudi-
pelo descumprimento de dever contratual. 1. Não há ilícito princípio já havia sido positivado.
quebra do princípio da boa-fé, quando a seguradora, à vista de
coberto no contrato, se recusa a liberar senha ao segurado, tanto
te obrigada ao reembolso das despesas médico-hospitalares. O uso da boa-fé objetiva, nessa senda, aponta à confiança que as partes
o inadimplemento de dever contratual - ilícito relativo -, no momento de celebrar o ato, de que cada uma cumpriria suas
prestação pecuniária, não autoriza indenização de dano moral, . Portanto, tem-se que o incumprimento da primeira prestação já a
tal caso, incide regra limitadora da liquidação do dano (CC, art. à sanção estabelecida. Lições doutrinárias. Agravo de instrumento
,
Apelação desprovida".
(95l Ruy Rosado Aguiar Jr., A boa-fé nas relações de consumo, in sentido também a opinião de F. Manganaro, op. cit., p. 27.
reito do Consumidor, n. 14, 1995, p. 25. ódigo Civil não contém norma expressa determinando o comporta-
96
( J Com a perfeita apreensão desta função da boa-fé é o acórd~o ~o contratual segundo a boa-fé objetiva, à diferença do Código pro-
Agln 197150196, rei. des. Roberto Expedito da Cunha Madrid,J. 1 que a contém no art. 422. O Código Comercial a prevê como
nestes termos:"Interpretação de ato jurídico. Acordo hmnoJ:og::u: de interpretação e integração do comportamento contratual no
mente. Inexecução obrigacional. Previsão de reintegração na 131, inciso I.
Termo. Princípio da boa-fé objetiva. Função interpretativa. neste sentido, Giuseppe Zacharia, Sul concetto di positività dei diritto,
que o incumprimento, na espécie, era o relativo, ou seja, o positivo e positività deZ diritto, Turim, Ed. Giappichelli, 1991, p.
trava-se em mora, inexistindo impossibilidade absoluta que
inexoravelmente, à premência de estabelecerem novas regras por todos, Miguel Real e, Fontes e modelos no direito- Para um novo
menta da obrigação, tiveram por bem buscar diverso modo hermenêutica, cit.
çassem o fim do processo obrigacional, que é, exatamente, seu
640 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO
MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 641

A vantagem a que me refiro, decorrente da sua concreta opera


cípio, é que agora está de certa forma facilitada a tarefa do É o que ocorre, por cAÇUJliJHJ.
aplicador, o que é deveras importante numa de ''"'"·v1 attnl1 '""-Junnn>v, que domina a !c~~u,,a...,<<v
mania como a nossa, ainda centrada no fetiche da lei.
o real
Estando prevista em texto legal- assim o art. 4. 0
,

e o art. 51, inciso IV, ambos do CDC -,a boa-fé mais


desempenhar as suas funções implementadoras
riedade social, conformando-os, concretizando-os e
•a•nu"'"'" o reequilíbrio, ao fornecedor são
nas relações obrigacionais. Possibilitam o implemento destas
flf';l~ull"''·''"''""'
de previsão casuística, seja por decorrência do
força otimizadora (1.2.1) e expansionista da boa-fé objetiva,
voltada, fundamentalmente, ao regramento das hipóteses de abuso uma série de deveres que visam minimizar o
bem como a sua eficácia na interpretação e na integração de tcvun,a '"''-' ....""'""'·'-'L'" agrega ou combina normas semanti-

jurídicos de direito das obrigações (2.2.3). vagas com normas semanticamente cerradas e imperativas,
no seu substrato a necessidade, pelas transformações
1.2.1 A boa-fé como mandado de otimização dos deveres e sofre atualmente a ordem econômica são freqüentes no-
interpretação de articulação negociai), de minimizar os riscos das fissu-
et.AIUIJ''H'·"''-' sociais que só aumentariam se tudo fosse para a
É comumente reconhecida à boa-fé objetiva uma vala da autonomia privada. A combinação entre flexibilidade
ção, qual seja a de atuar como cânone hermenêutico e e imperatividade tende a assegurar, como assinala José Edu ar-
como fonte de deveres jurídicos e como limite ao exercício "um equilíbrio substantivo" entre os partícipes das relações
tos subjetivos. 101 na economia globalizada, criando, na medida do
Ao determinar, no art. 4. 0 , que a Política Nacional "as condições para a consecução de padrões básicos de soli-
Consumo tem como objetivos, entre outros, "a transparência e a e cooperação". 106
nia das relações de consumo", atendidos, entre outros, os
harmonização dos interesses dos participantes daquelas Utilizo as lições de Dworkin, neste ponto aproximadas do que desen-
fim de serem viabilizados os princípios nos quais se funda a volveu Robert Alexy em Teoria de los derechos fundamentales, Madrid,
nômica, "sempre com base na boa-fé e no equilíbrio" daquelas Ed. Centro de Estudios Constitucionales, 1993, em especial p. 81-93.
o CDC acolheu, incontroversamente, essa tríplice função. Foi Equipara Cláudia Lima Marques o princípio do equilíbrio ao princípio da
além, pois, ao conjugar a conduta segundo a boa-fé com o eqüidade, tomando-o também como "princípio básico" do CDC (Contratos
posições do pólo fornecedor e do pólo consumidor, agregou-lhe no Código de Defesa do Consumidor, 3. ed., São Paulo, RT, 1999, p. 390-
função corretora do desequilíbrio contratual. 391).
É que, constituindo princípio jurídico, a boa-fé objetiva Utilizo a categorização proposta por Friederich Muller, que, no exame da
dimensão diversa daquela que é atribuída às regras jurídicas: sua percebe não ser esta uma "propriedade" dos textos, assim
entre a "norma" ("norma-decisão" e "norma.jurídica" e o "tex-
da norma". Ver Discours de la méthodejuridique, trad. francesa de Oli-
(10IJ A boajé no direito privado, cit., p. 427 e ss.
vier Paris, PUF, 1996, em especial p. 186-207).
(10ZJ Não só as partes contratuais, portanto, mas todos os que, medíata
Eduardo Faria, O direito na economia globalizada, tese apresentada
diatamente, participam da relação jurídica de consumo. Veja-se,
concurso para professor titular do Departamento de Filosofia e Teoria
plo, a extensão promovida pelo art. 29.
do Direito da Universidade de São Paulo, 1999, p. 304.
MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 643
642 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO

'"''-''-"c'"~ exí~m1Dlru neste sentido encontra-se na do


No que concerne às relações obrigacionais de ~"u"•uuu.
agir conforme à boa-fé objetiva está previsto de segundo o voto do ministro Ruy Rosado de Aguiar "o
letc,._uu"'~·~ bancário que põe à disposição dos seus clientes uma área
por exemplo, nos artigos 6. 0 , incisos III, Ve
· 18; 20; 28; 31; 36 e parágrafo único; 39; 46; e 47. :tac1onam"en1:o de veículos assume o dever, derivado da boa-fé obje-
cn~w'"'-· os bens e a pessoa do usuário". 109 Como se vê, não teve
das normas passíveis de concretização a destes
específico campo das relações de consumo, seja a '"""''"'··"-'~ apenas os deveres principais, decorrentes do contrato
básicos, do regime de riscos, do regime de vícios, dos mas a totalidade dos interesses envolvidos. A proteção dos bens
mação e esclarecimento, do regramento da responsabilidade do usuário (consumidor) dos serviços bancários encontra-se
etc. Apesar do cuidado do legislador em tentar prever as tir:a:menre vinculada à relação de consumo dos serviços bancários
hipóteses, sabe-se, contudo, que é missão impossível tentar o banco e os usuários dos seus serviços. Não estando orientados
em um texto legislativo todas as possibilidades e vicissitudes ao cumprimento da prestação principal, esses deveres estão
de. Assim, mesmo em hipóteses não tipificadamente previstas, à otimização da relação obrigacional visualizada complessiva-
objetiva, por configurar o que Miguel Reale denominou de à satisfação dos interesses globais envolvidos.
aberto", 107 pode ser utilizada pelo intérprete/concretizador da Certo é, porém, que a boa-fé não se equipara à regra de eqüidade,
determinação de outros deveres, que sejam com ela coJnpatí,re qual é, por vezes, equivocadamente confundida. Enquanto a boa-
plementem a diretriz da solidariedade social, da qual o princípio função generalizante e ressistematizadora, partindo-se do caso
líbrio dos participantes da relação de consumo é decorrência. buscar a solução nas regras oferecidas pelo sistema, a eqüida-
Como princípio jurídico que é, a boa-fé se caracteriza por função individualizante, que se esgota no caso, permitindo a lei,
tuir "mandado de otimização de condutas", isto é, norma que casos, uma solução à lide não fundada nas regras do siste-
que algo seja realizado (que se cumpram os deveres contratu Trunbém não é a boa-fé norma amoldada à plana subsunção, nem
incidentes na relação obrigacional) na maior medida possível, ser in abstracto, carecendo de concretização e, por isso,
com as possibilidades fáticas e jurídicas existentes, como do intérprete redobrada atenção aos aspectos de fato, às con-
Alexy .108 Na otimização do comportamento contratual, a boa-fé circunstâncias nas quais será aplicado o princípio, para que, só
a identificação concreta, em face das peculiaridades ..,._, ....~ ...., bem especificado o dever acaso infringido, a lacuna a colmatar ou
relação obrigacional, de novos deveres, que não estão expressos subjetivo carecedor de limite, volte o juiz às regras do sistema
trato nem nascem de disposição legislativa pontual, os já se amoldem à justa solução do litígio.
res avoluntaristas e instrumentais que envolvem todo o força de sua incidência deverá obedecer ao princípio do escalo-
relação, a globalidade dos interesses envolvidos. os deveres que produz manifestam-se de forma graduada,
a natureza do vínculo, explicando Clóvis do Couto e Silva
<107) A expressão está em O projeto do Código Civil- Situação atual
negócios bilaterais- v.g, os contratos de intercâmbio- o inte-
mas fundamentais, cit., p. 8.
conferido a cada participante da relação jurídica (me a res agitur)
a sua fronteira nos interesses do outro figurante, dignos de
<IOBJ Robert Alexy, Teoría de los derechosfundamentales, cit., p. 86.
cita Humberto Bergman A vila (A distinção entre princípios e
protegidos" (de modo que) "o princípio da boa-fé opera, aqui,
finição do dever de proporcionalidade, in Revista da vamente, como mandamento de consideração"Y 1
culdade de Direito da USP, v. 1, 1999, p. 34), são IJV''"wutu<"
vas, porque a aplicação dos princípios depende dos princípios e , 4.' T, Agr. Reg. no AI 47. 901-3-SP,j. 12.09.1994.
eles se contrapõem; fáticas, porque o conteúdo dos princípios
o desenvolvimento do tema, o nosso A boa-fé no direito privado, cit.,
de conduta só pode ser determinado quando diante dos fatos".
-338.
mo, na aplicação dos princípios, quaisquer que forem, está o ·
lado ao "dever de proporcionalidade", que leva à ponderação. do Couto e Silva, A obrigação como processo, cit., p. 30.
644 A DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 645

incumbem tanto ao fornecedor ao consumi-


que alude expressa-
""'''-"""H'~" da A
u~,,~··-u a boa-fé ob-
ver de em conta o
conteúdo do dever do
ou se contradiz
comt)ortarnento gerou, estará incorreu-
que deriva da boa-fé
deve o consumidor in-
dever de

u•t:,"'"~-~ a
~..-uuuau~ra, ou a contradizer as legítimas

Civ. 597019439, 6." C. Civ., rei. des. Antônio Janyr


j. 12.11.1997, nestes termos: "Apelação cível. Seguro saúde.
de circunstância relevante. Princípio da boa-fé objetiva. Falece
segurado que omite circunstância relevante, capaz de aumentar o
mais quando demonstrado o liame de causalidade entre aque-
o fato que se pretende acobertado. Recurso provido". O acórdão consig-
voto vencido que negava provimento ao recurso em face da hipossufi-
I-"'-'0U'"'u"do consumidor, entendendo caber à seguradora a prova da
·uvi>Jval!u<•uco do segurado. Na espécie, contudo, o voto vencedor considerou
comprovada a atitude desleal pelo fato do preenchimento do
sobre as condições da saúde da beneficiada sem fazer quais-
ressalvas aos itens "consignados de modo indiscutivelmente compreen-
Sendo mandamento de consideração para com os legítimos
resses do parceiro contratual (ou pré, ou pós-contratual), os 0
E. I. 598007607, 3. Grupo C. Cíveis, rel. des. Antônio Janyr
'Agnol,j. 03.04.1998, in verbís: "Seguro privado. Saúde. Aids. Desco-
. da doença. Não age contrariamente à boa-fé quem, ao firmar a
(ll2J Clóvis do Couto e Silva, A Obrigação como Processo, cit., p. 31.
(113)
de seguro, conhecimento não tinha da doença- Aids- que, poste-
Na doutrina gaúcha, veja-se V era Maria Jacob de Fradera, in A exame laboratorial veio a detectar, não se safando a seguradora,
ção da proibição de publicidade enganosa e abusiva à luz do a alegação de que tal doença se encontrava entre as excluídas, pois não
boa-fé: o dever de informar no Código de Defesa do Consumidor, de pronto, as cláusulas gerais, remetidas posteriormente, registro
ta Direito do Consumidor, v. 4, p. 173, e Cláudia Lima Marques, em folheto que alcançado na oportunidade da avença. Embar-
no Código de Defesa do Consumidor, cit., p. 324 e ss. infringentes desacolhidos".
646 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO
MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL

que uma suscita no outro


nas precisas palavras de Anelise Becker, "o prejuízo que expe-
sucessivamente, desilude, pois não é lícito
uma das partes por obra de uma exagerada desproporção entre o
p0rtament0, frustrandO a expectativa legitimamente uv.>iJ<;;HdU<l
entre as prestações intercambiadas, concomitante à sua formação,
ressante, é, por isso, referir caso em que, embora de """"··ua
do aproveitamento, por parte do beneficiado, de uma situação de
boa-fé serviu para afastar pretensões indenizatórias de consumidor
em que então se encontrava o prejudicado" .119 Pressupõe,
por seu comportamento, havia colaborado decisivamente para a
contrato bilateral, comutativo 120 e sinalagmático, no qual haja
rência do prejuízo alegado. Tratou-se de consumidora
'v"''"'u"J·, ... entre as prestações, ocorrendo a desproporção já no momen-
mente, pagava com grandes atrasos as prestações
formação do vínculo, o que diferencia a lesão da excessiva onerosi-
Com isso, motivou que a loja fornecedora a cadastrasse no
que é superveniente à conclusão do contrato.
Proteção ao Crédito (SPC). Pagando também a última prestação
da, e não tendo tido o imediato cancelamento no SPC, ingressou O desequilíbrio deve ser mensurado, tendo-se em conta o contrato
sumidora em juízo postulando indenização por danos =~·'-n·--'-' uma totalidade, isto é, não devem ser consideradas apenas as presta-
A decisão do TJRGS foi pela improcedência da ação, principais. No âmbito do CDC pode o juiz "modificar as prestações"
assim o julgado: "se a autora, reiteradamente, pagou com eio da nulificação da cláusula lesionária, pois se trata de vício que
prestações, isto deu suporte ao cadastramento permitido em lei e o negócio em sua validade, assim buscando o reequih'brio contratuaL 12 1
nou os possíveis prejuízos, e não o fato de a loja não ter mandado
a prestação atrasada por outra posterior, como sendo a de (Cláusulas abusivas no Código do Consumidor, in A proteção do
positivação, no SPC" . 117 Dano extrapatrimonial só haveria, f:mJsu,mütorno Brasil e no Mercosul, (org.) Cláudia Lima Marques, Porto
a consumidora não tivesse, legitimamente, despertado no Ed. Livraria do Advogado, 1994, p. 16). Veja-se, ainda, Jean-Louis
serviços a expectativa do reiterado atraso, que configurou o seu Ga:zzani':ga, lntroduction historique au droit des obligations PUF Paris
tamento durante todo o processar da relação contratual e, mesmo 1992, p. 139, e Caio Mario da Silva Pereira, Lesão nos Con;ratos, 'Rio d~
tivesse seu nome cadastrado no SPC. Forense, 1993.
Becker, Elementos para uma teoria geral da lesão de contratos,
Já no que conceme ao específico dever de reequiliôrio
.·m•·•,,.,~f"<•n de mestrado apresentada no programa de pós-graduação em
regra do art. 5. 0 , inciso V, primeira parte, confere ao juiz o da UFRGS, Porto Alegre, 1996, p. 8.
modificar as cláusulas contratuais, que, já no momento da
discutida a possibilidade de ocorrer lesão nos contratos aleatórios. Segundo
ajuste, estabelecem prestações desproporcionais. Trata-se do Becker, "para que os contratos aleatórios sejam imunes à lesão, os
do antiqüíssimo instituto da lesão, advindo do direito romano, 1 e chances de cada um dos contratantes devem estar equilibrados no
em que é formado, e, pois, para conservar tal caráter, a lesão deve
CII•J Veja-se o desenvolvimento deste tema no nosso A boa-fé no diagnosticável apenas quando cessada a incerteza (à medida que), somen-
do, cit., p. 466 e ss, e Enrico dell' Aquilla, La correttezza nel assim este desequilíbrio não colocará em perigo a validade do contrato,
Giuffré, 1980, p. 97 e ss. conseqüência normal de sua execução" (op. cit., p. 96-97).
(II?J TJRGS, 9: C. Civ., relatora a desembargadora Rejane de Castro expressiva neste sentido foi a adotada pelo TJRGS na Ap. Civ.
70000101428, j. 22.09.2000. 05167, j. em 08.08.1996 pela Sexta Câmara Cível, rel. des. Arminio
Abreu Lima da Rosa, assim ementada: "Contrato de financiamento.
(IISJ A laesio enormis vem do direito romano, enquanto a laesio
· onerosidade. Embora não se aplique, diretamente, aos contratos
resulta da construção canonista. A figura vinha prevista nas
o CDC pode ser objeto de utilização analógica quando manifesta
Filipinas (Livro IV, Tit. XIII) e por Teixeira de Freitas, na
de interesses remuneratórios do capital. Caso em que, de
art. 359, aí prevendo o que Ruy Rosado de Aguiar Júnior
caberia recorrer a princípios gerais de Direito e evitar locupletamento
"lesão pura, onde não havia vício de vontade, mas "'~',u"uv,,u,,.
de uma das partes. Mantença da TR, juros moratórios de 1% ao
na simples quebra de equivalência entre as prestações,
e multa. Apelo provido em parte". Embora discordando da afirmativa
648 DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 649

'"'";u...~.cu.•.._ da pessoa hu-


que o consumidor é um in-
em bases retomar
u"''~~CAUU da modernidade, em o sapere aude kantia-
apresentar-se onerosa em pois ao limite que Finkielkraut de "une
momento da conclusão, significava a razoável enfin devenue adolescente". 126 O que se é o risco extraor-
custo e do previsível benefício a álea que excede o marco do isto é,
prestação. 124 Termo de comríar:lC que supõe "o sacrifício econômico do devedor de modo despro-
..,.~,U~·~~ em relação à vantagem do credor" .127
Em assim ocorrendo - e esta é a ratio iuris da regra posta no art.
inicial, posto entender a incidência do CDC também aos contratos
segunda - a obrigação estaria "em oposição com a
rios, e tendo crítica à utilização da expressão "excessiva onerosidade'
te contexto em que se trata mais propriamente da lesão,
a que está destinada se o seu cumprimento
aplicação do instituto previsto no art. 5.0 , inciso grave perigo à econômica do devedor e
conducente à modificação, pelo Judiciário, dos termos do a sua integridade patmno>mlH
(122)
Código Civil, artigos 865, primeira parte, 866, 869, 879 e 882.
de cooperação, e esta é "imanente", como
(123) :lv1•«'-''"U'VW.V tenho exposto, verifica-se "a exigência de solidariedade
Assim caso em que ocorreu a não atualização monetária das pre:sta.çõ<~s
entre os que são partícipes de um destino comum",
mutuário, consumidor de serviços bancários, havendo a "'«"u''"''"<"u
uuh''"'"''v"""''"" contrária a esta exigência "um sacrifício unilateral
vida, por parte do banco, o que conduziu ao desequilíbrio. Acórdão do
GS assim decidiu: "Ação indenizatória. Locupletamento ilícito. Mútuo em favor de outra" .129
garantia de duplicatas. Retenção de valores não corrigidos. Código de
fesa do Consumidor. Aplicação ampla. Serviços e bens. Em op1~ra(;õe: sessória. Revisão do contrato. Possibilidade de revisão ante o princípio da
mútuo com garantia de duplicatas, uma vez caucionadas, quando relatividade do contrato, prevalecente sobre o princípio do pacta sunt ser-
das, os valores depositados não sofreram atualização monetária, com vanda, a fim de assegurar a real concretização do equilíbrio da relação con-
resultou locupletamento ilícito do banco, pois a dívida do mutuário tratual, como da liberdade e igualdade entre as partes. ( ... )Ação possessó-
foi atualizada. A alegação de cláusula permitindo a não-aplicabili ria. Ante a onerosidade excessiva das cláusulas contratuais, não se consti-
correção monetária e juros é abusiva, injusta e não tem sustentação no tuiu validamente a mora, com o que improcede a ação possessória, ainda
gado princípio contratual 'pacta sunt servanda', diante da evolução da mais pela descaracterização do contrato de leasing. Apelação provida" (rei.
ria geral dos contratos e da indiscutível lesão ao patrimônio do des. Henrique Oswaldo Poeta Roenick, j. em 05.08.1999).
que merece ser ressarcido. Tem aplicação o Código de Defesa do Effil1io Teoría general de las obligaciones, cit., p. 211.
dor, abrangendo as atividades financeiras, tanto a prestação de serviços Alain Finkielkraut, La défaite de la pensée, Paris, Gallimard, 1987, p. 168.
a aquisição de bens para exercer a atividade produtiva" (5.' C. Civ. Emilio Betti, op. cit., p. 214.
Civ. 196.233.621, rel. des. SilvestreJasson Ayres Torres,j. em22.05 Idem, ibidem.
(124)
Assim acórdão da Décima Quarta C. Cível do TJRGS: " Idem, ibidem, p. 215. Assim também decidiu o TJRGS em caso que, con-
cantil. Ação de revisão de cláusulas contratuais conexa à uo;;;•urutU<L quanto afastada a incidência do CDC, se decidiu pela revisão do contrato
A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO
MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 1

Observe-se, que a norma não exige que a


do citado art. 6. 0 , inciso V, segunda à teoria da
tenha por causa acontecimentos extraordinários ou ,..,, .... ,..,a . . ,
francesa, nem mesmo à versão italiana excessiva
zão pela qual, apesar da referência, na à excessiva
"'"-""·"'"· que exigem diversos requisitos.
mais proximamente se trata da adoção da teoria da base nn,,o ...,._
negócio. Nesta é imediata a correlação entre a revisão do""'"""~·­ Presente essa normativa, a revisão do contrato, por ato judicial,
princípio da boa-fé, o que, de resto, vem do Direito ""w'v''"""' o conteúdo contratual à relação de "pesos" original, pois
-•~UULV.

relata Hattenhauer, 130 ao comentar a pioneira sentença 28 d exigência de uma solidária distribuição dos riscos. Deve-se ter
v~mbro de 1923 _do Tribunal Supremo.m Igualmente, entre nós,e todavia, um critério objetivo, a saber, a relação estabelecida
v1s do Couto e S1lva estabelecera essa correlação, m acolhida o custo inicial da prestação diante do benefício representado, para
0 0

nspru dAenc1a, 133 com o que não se justifica, no meu entender, contraprestação. Se, contudo, a revisão conduzir a que o
o seu sentido original como regramento objetivo de inte-
de sentido e de determinada função econômico-social, aí
com fun~~~ento na boa-fé, in verbis:" Locação. Ação revisional de caberá o remédio extremo da resolução.
to. Poss1b1lrdade. Excesso de onerosidade. Moeda estrangeira.
do valor do aluguel pela variação do dólar americano ..... ,"v 0 ,," 11 Aí estão postos deveres e direitos que têm fundamento na solida-
Aplica~ili~ade do CDC. ( ... )Inaplicável nos contratos de locação, em social, pelo qual se exige evitar ou reduzir os conflitos sociais,
da ausencta de relação de consumo. No entanto, diante das nec:nll:~r­ onl1ec:endo o Direito que uma das formas de atingir este escopo con-
~a ~itua!ão e~on?~ica vigente após a edição do Plano Real, em em ter presente formas de atenuação da vulnerabilidade.
mdrces ~nflacronanos têm sido insignificantes, impõe-se a análise
caso a frm de se verificar a possibilidade ou não de revisão dos
pretendidos revisar. Na espécie, considerando a indexação dos
contratados pela variação do dólar americano e a elevação súbit
rf- a
pe eltamente possível a revisão do contrato firmado pelas partes
na boa-fé objetiva" (Ap. Civ. 70000078626, 15." C. Civ., rel. de~.
Raupp Ruschel,j. em 22.03.2000).
(130) H ans H attenhauer, Conceptos fundamentales del derecho civil, trad.
nhola, Barcelona, Ed. Ariel, 1987, p. 90.
(131)
RGZ, 107, 78, p. 87 e ss, apud Hattenhauer, op. e p. acima reten<1os.
essa decisão precisou-se que não era somente o devedor, mas Tem sido reconhecida à boa-fé objetiva a função de limitação do
partícipes da relação contratual que deveriam suportar, coruu11tarner de direitos subjetivos, permitindo o alargamento, para além
prejuízos da inflação, fundando-se o decidido justamente na hipóteses tradicionais do abuso de direito, 134 da doutrina da inadmis-
ral da boa-fé objetiva inscrita no§ 242 do Código Civil. do exercício, em certas condições, de direitos subjetivos e de
a adstrição ao pactuado (pacta sunt servanda) devia amoldar-se à jurídicas. A boa-fé atua, assim, como norma que não admite
e aos costumes do tráfego jurídico, reformulou-se, no direito que contrariem o mandamento de agir com lealdade e corre-
te?ria da base do negócio e o antigo princípio da equivalência, o que afasta o exercício abusivo de posições jurídicas, notadamente
afirma Hattenhauer, "a teoria das relações obrigacionais âmbito contratual.
novos caminhos".
132
< > Clóvis do Couto e Silva, Teoria da base do negócio, in
655, 1990. Código Civil, art. 160, inciso I, a contrario. No sistema do Código Civil, a
133 abusividade está no plano da ilicitude, conduzindo, pois, à tutela reparató-
< > Exemplificativamente, acórdão do TJRGS, Ap. Civ. 588059113, 5.'
ria. Já no CDC é diverso o conceito de abusividade, que recai no plano da
rel. des. Ruy Rosado de Aguiar Jr., j. em 06.12.1988.
validade dos atos, conduzindo à sua nulificação.
652 A DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 653

Se assim ocorre na esfera do direito comum, com


no âmbito do contratual é a marca
mante do u"'""''~uJLu

se, nas ''"''~'"''J'"'"'


tual do tornec:ed<)r
Cabe bem marcar esta com
Bourgoignie para a necessidade de levar em conta as r~:n-"rt"''"'~•;
cercam o exercício da de consumo na
de controle abstrato das pois "o que
lar abusivo em relação ao comércio ou à concorrência
respeito ao consumidor". 135 Neste ambiente '"''"'''-'H''-''-'J'-'"'r
cas abusivas podem ser geradas também O recurso à boa-fé apresenta-se, assim, como o instrumento que per-
consumidor sobre o produto ou ou ao e à Administração esta, até mesmo mediante a
ou errônea, pela agressividade dos métodos de de portarias e outros atos de caráter ou
dade, para o aderente, de bem avaliar os riscos, 136 expandir as hipóteses previstas de forma especificada no
mente, não se numa relação em que os limitar e coibir o exercício de condutas contratuais que, por
em posição de da conduta segundo a caracterizam e
Por isso é que, como é por todos
de listar os casos de cominando-lhes, como Hipótese em que se estará diante de lesão enorme. Sobre o tema, remeto a
a nulidade, mas não lhes atribuindo o caráter de Ruy Rosado de Aguiar Júnior, op. p. 15 e ss.
IH do art. 51 reenvia o intérprete à averiguação, nos casos Como acentuei emA boajé no direito privado, é característica das cláusu-
outras hipóteses de abusividade, que, para ser las como a da boa-fé objetiva, promover a ressistematização de no-
configurar "iniqüidade", "abusividade", 137 "desvantagem vos casos, "descobertos" ou "criados" por via judicial, acomodando-os no
incompatibilidade com a "eqüidade", ou, ainda, que desbordem da sistema. Essa função ressistematizadora, para a qual é necessário, no pri-
duta segundo a boa-fé. meiro momento, o uso do raciocínio tópico, diz respeito à própria concre-
ção das cláusulas gerais, a qual só pode operar "perante o caso concreto ou
Ressalvadas as críticas de ordem técnica que se IJV'"'-'11<UH grupos de casos considerados típicos" (p. 340). Assim, em matéria de abu-
redação do texto, parece evidente concluir que, ao conjugar a so, a dos tópicos oferecidos pela lei, podem ser reagrupados "grupos
de hipóteses com a sua previsão "aberta", o CDC IJV•>"H'1wcv de casos típicos" de conduta contratual abusiva, conforrne os casos forem
se apresentando na vida prática, sendo então reunidos ou agrupados confor-
(135)
me as suas características. Este proceder é indispensável para o próprio
Thíerry Bourgoignie, O conceito de abusivídade em relação aos progresso do Direito, pois, como aludi, "pouco a pouco a jurisprudência
dores e a necessidade de seu controle através de uma cláusula formará espécies de 'catálogos de casos' em que foi similar a ratio deciden-
Revista Direito do Consumidor, v. 6, 1993, p. 11-12. di, podendo estes se expressarem inclusive através de súmulas. Estes casos
(136)
Idem, ibidem, p. 12-13. serão reconduzidos à cláusula geral que veda o comportamento contrário à
(137)
A tautologia está expressa em lei, conjugando-se o título da boa-fé, adquirindo, assim, as norrnas decorrentes da dicção judicial o cará-
com o caput do art. 51 e a referência feita no seu inciso ter de norrna aplicável a outros casos em que se verificam circunstâncias
a) as cláusulas abusivas são nulas, sendo nulas as cláusulas que ''u"u",'""~ ou similares( ... ) ocorrendo, por igual, a possibilidade da constan-
çam obrigações consideradas abusivas. te incorporação de novos casos" (idem, p. 331-332).
654 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 655

atentam contra a diretriz da solidariedade, 140 '-'VJlH'-I!uwuuu, as funções da boa-fé como norma concretizadora e conforma-
um aspecto da função corretora a ser exercida pela jurisdição.t4t da solidariedade social, vale ainda referir a sua função
de não menor A vagueza semântica e
Aliás, em trabalho pioneiro nesta matéria, 142 acentuou abstrato da diretriz constitucional da solidariedade dificultam a
Amaral Júnior o caráter central da boa-fé objetiva no controle das visualização dos deveres que se alocarão nos casos concretos. É
sulas abusivas nas relações de consumo, permitindo que, por seu nesta perspectiva, a existência de "marcos setoriais" per-
médio, seja compreendido "o nexo de causalidade entre a da sua sistematização num certo domínio de casos, evitando a
conceito de equilíbrio das posições contratuais, sem o
1e 11,au'-'"\'""v das decisões que, expressa ou neles en-
entender a noção de abusividade encontrada no art. 51 do o seu fundamento. A boa-fé funciona, assim, como o que Clóvis
fé objetiva e equilíbrio entre as partes que, como tenho Couto e Silva denominou de "elemento de conexão", 145 que permite,
mente acentuado, constituem os instrumentos para a concreção, a rubrica de uma mesma referência semântica, agrupar os casos simi-
específico recorte da ordem econômica, da diretriz facilitando a pesquisa das decisões judiciais e a reintrodução das
solidariedade social, incidente nas relações interpri vadas. 144 encontradas no sistema das relações de consumo.

140
< ) V.g, acórdão do TJRGS na APC 596230888, 5: C. Cív., rel. Des. A boa-fé como regra de "interpretação congruente"
lipe Brasil Santos,j. 05. 06.1997, em cuja ementa se lê: "Contrato de
ro-saúde. Abusividade. Cláusula de vigência temporária. Não é de ser descurada, por fim, a função hermenêutico-integrati-
Nulidade. Por impedir a própria consecução da finalidade do boa-fé, seja para a interpretação das regras contratuais, seja para a
é de propiciar ao consumidor tranqüilidade no que respeita ao 111 i:l.ta~·av de lacunas. Nenhuma norma jurídica é capaz, por si só, de
médico para si e sua família, a cláusula contratual de vigência diretivas para o intérprete, por isto constituindo a interpretação
por prazo exíguo, viola o princípio da boa-fé, caracterizando-se incindível do próprio fenômeno jurídico, razão tendo quem
0
siva e, por conseqüência, nula (art. 51, IV, e§ 1. I, Lei 8.078/90.
,
que "o Direito é positivo apenas enquanto interpretado". 146
141
< ) Acerca da função do Judiciário como "controlador da legitimidade"
apenas da legalidade, veja-se Miguel Reale Júnior, Crimes de Ultrapassadas definitivamente as convicções que viam na interpreta-
dade dos magistrados, in Revista Cidadania e Justiça, ano 4, n. 8, apenas a caracterização de um momento lógico, admite-se hoje caber
2000, p. 74. · uma "participação estrutural" no processo formativo do Direito, 147
142
< l Alberto Amaral Júnior, A boa-fé e o controle das cláusulas cor1tratuai ·:mrto-s:e. também, que as palavras da lei não têm um conteúdo "pró-
sivas nas relações de consumo, in Revista Direito do Consumidor, v. ou "imanente", mas apenas contextual: o significado de um texto é
Paulo, 1993, p. 27. ll.a!.H'-'''""' ligado às circunstâncias, aos "fatores vitais" determinantes

143
< l Idem, ibidem, p. 27. ;onltexlto da aplicação, só assim ultrapassando-se a distância que separa
148
144 ""'''udcuc; da lei à concreta situação jurídica do caso singular.
< l Exemplar, neste sentido, é a fundamentação do voto proferido pelo
Ruy Rosado de Aguiar Júnior, relator do AgRg 49.124-2-RS, in verb
so, portanto, que essas novas exigências éticas feitas para a Clóvis do Couto e Silva, O princípio da boa-fé no direito brasileiro e portu-
tráfico comercial e que se estendem para todos os ramos do Direito guês, in Estudos de direito civil brasileiro e português, São Paulo, RT,
para o campo processual, devem orientar o comportamento das 1980, p. 62.
trata de simples preceito moral, porque sua exigibilidade decorre Assim, F. Viola, e G. Zaccaria, Diritto e interpretazione, Roma-Bari, La-
mediata da Constituição da República, pela teoria da Drittwirkun terza, 1999, p. 184, com uma bem lançada síntese da teoria hermenêutica e
a qual as regras asseguradoras dos direitos fundamentais do cidadão as adequadas remissões ao pensamento de Gadamer e Esser.
cem enunciados que devem regular não apenas as suas relações
Idem, ibidem, p. 180.
do, mas orientam todo o campo da autonomia privada, sobre o
mente incidem" (in RSTJ, n. 66, p. 15-29, fev. 1995, especialmente Idem, ibidem, p. 183.
656 DO DIREITO PRIVADO MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 657

da coerência", que, os
perde o sentido formalista que revestira no ms.vo;sití
tendido de modo o que
a assegurar o interesse que se mais
em termos de custo social", o no contexto do programa
Em outras ua,,av.•a·' à divisão dos
ção da boa-fé deve ser aos fatos '-'V'""''uc• IJHUI.!IJ!u da boa-fé, no caso, longe de cru~aclterizar

normas do não podendo servir de anteparo d fenômeno estático, constituiu verdadeiramente "momento compreen-
dor. Este deve percorrer a relação entre o caso e a norma, entre o como deve ser a atividade hermenêutica, que requer, do
"dever-ser", 150 para então promanar a decisão. Exemplar é, neste '"'''""w o interrogar a si mesmo e atentar para o fato em julgamento,
acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul 151 em u'"""''·'a então, percebido o problema, voltar ao sistema direcionado pelo va-
contrato de seguro automobilístico que a responsabilidade da solidariedade social, tal qual deve esta realizar-se nas relações obri-
em caso de para "danos pessoais". a concretização do princípio da boa-fé.
empresa a pagar indenização por danos ex1tra]patnn1orliai:s,
que a expressão "danos pessoais" indicava tão só os
assentou o julgador o primeiro elemento contextual,
!idade da da dor dano rr.v-n"'"" as referências acima assinaladas não esgotam o vasto
dano moral ou psicológico, forte na bioestrutura de ser HUJL.uauv, das relações entre o Direito e o mercado, nem mesmo o das fun-
e psicologicamente A divisão existente - corpo e desempenhadas pela boa-fé na relação obrigacional. Compreender
por tem o fim apenas pedagógico, para das antigas dicotomias, perceber a fundamental artificiali-
pessoa humana e não como pretende a seguradora". n:o•·"'-'J"'" de mercado e a sua também fundamental inserção na
tlUJlui\~v-·...,vu::.'•n••c•·vu.a•e em seus valores pode ser, no entanto, de
Em seguida, recorreu o magistrado ao princípio da boa-fé valia para uma jurisprudência que se quer para uma
va, estatuindo que, na dúvida quanto ao significado de cu•.u::.;ua que pretenda realizar, de modo transformador, a reconstrução
posta por uma das partes, "a interpretação deve ser no sentido dos modelos do sistema.
favorável a quem a redigiu", assim reenviando ao da
tatio contra preferentem, ou ainda à regra in dubio contra .«tn?ut,7tm esta tarefa de reconstrução dogmática absolutamente não
para a jurisprudência, nem para a doutrina, uma tarefa arbitrária.
que, assinalou, "é especialmente importante hoje em devido à
se trata de invocar a boa-fé contratual, esta se encontra "contida
são dos contratos padronizados e de adesão".
da realidade do contrato, sua tipicidade, estrutura e funciona-
No e vir" entre o texto e o contexto, não esqueceu com aplicação dos princípios admitidos pelo sistema" .152 Toda e
função econômica do contrato, afirmando constituir este reconstrução dogmática está, em primeiro lugar, atada aos va-
o revestimento jurídico de uma operação econômica" e diretivas do ordenamento, que exigem do juiz não apenas ato de
mas, fundamentalmente, ato de conhecimento e de responsabi-
c149) Idem, ibidem, p. 184. razão qual a exigência constitucional da motivação da seu-
('
50
) Idem, ibidem, p. 186. deve ser acrescida pela mais completa explicitação dos elementos
151
< ) TJRGS, EI 196032114, 4. 0 Grupo de C. Cíveis, rei. Des. Roberto
da Cunha Madrid,j. em 17.03.1997. Rosado de Aguiar Júnior, A boa-fé nas relações de consumo, cit., p. 25.
658 A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO
MERCADO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 659

de fato e de direito que ensejaram, na hipótese a Thierry. O conceito de abusividade em relação aos consumi-
da boa-fé. Em segundo lugar, depende do domínio técnico do dores e a necessidade de seu controle através de uma cláusula geral, in Re-
do acerca dos mecanismos, metodológicos e dogmáticos, que vista Direito do Consumidor, v. 6, São Paulo, 1993.
a solução justa nos quadros do ordenamento. Só nesta ·~~''-'-"'"' J. J. Gomes, Constituição dirigente e vinculação do legislador,
será chamar-se ao caso a diretriz da solidariedade social, Coimbra: Coimbra Editora, 1982.
está, nas relações obrigacionais, às técnicas e institutos oferecidos
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