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Quando o Império morreu de sede

Em 1889, uma grave crise hídrica só foi resolvida com a mobilização do povo, uma
imprensa combativa e a habilidade de um jovem engenheiro. O governo não durou
muito


Rio de Janeiro, capital do Império, início de 1889. O clima é quente. Auge do verão, a cidade
alterna períodos de calor e secura com dias de chuvas torrenciais. Não há um sistema de
esgoto eficiente. Áreas sujeitas a inundação no entorno do centro urbano favorecem a
proliferação de mosquitos, hospedeiros de doenças que assolam toda a população desde os
tempos da colônia. No final do século XIX, médicos e cientistas já haviam percebido a relação
entre epidemias tropicais e a má-gestão da água.

As semanas passam e as chuvas ficam mais raras. O calor aumenta. Com ele, a febre amarela.
Aqueles que tem condição financeira no Rio de Janeiro, tomam o trem e sobem a serra de
Petrópolis. Aproveitam, como Pedro II e sua família, o clima ameno da cidade imperial. Na
corte do Rio de Janeiro, fica quem tem que trabalhar. Ou seja, a maioria da população.

Dois de fevereiro de 1889, a epidemia aumenta cada vez mais. A Revista Illustrada, dirigida
pelo redator-caricaturista Angelo Agostini, propõe “medidas sanitárias” para resolver o
problema. Entre elas, aumentar o abastecimento de água. Ao longo do mês, o problema se
agrava. No dia 9, a mesma revista denuncia a situação alarmante: enquanto o surto de febre
mata crianças indefesas, os funcionários do governo não fazem nada além de consultar livros
e escrever ofícios.
O carnaval vai, a febre amarela fica

Final de fevereiro. O carnaval se aproxima. Os problemas continuam. Mas o que importa é a


festa. Na semana seguinte a revista Ilustrada abre os olhos do público: o carnaval vai embora,
mas a febre amarela volta para matar mais pessoas. Enquanto isso os ministros continuam
distantes das necessidades reais da população.

Agora o problema divide a opinião pública e a imprensa. De um lado, partidários do governo,


como José do Patrocínio que dirige o jornal Cidade do Rio, que dirige. Do outro lado, críticos
do Império, como Rui Barbosa. Seu palanque é o jornal Diário de Notícias.

O jornal de José do Patrocínio tenta minimizar a crise. Diz, na edição de 9 de março, que o
problema não é deste governo (o jornal governista conseguia livrar a cara de um governo que
estava no poder já tinha quase cinco décadas). A falta d’água, argumentava, é uma questão
antiga e, para resolvê-la, é necessário pelo menos um ano de trabalho. Sabe-se que os dois
meses de falta de chuva, aliados às altas temperaturas e ao aumento do consumo de água –
reflexo, sobretudo, das questões sanitárias – transformava o problema em uma verdadeira
crise de abastecimento hídrico. Portanto, a responsabilidade, na visão da imprensa aliada ao
governo, era dos administradores anteriores, do clima e, é claro, das pessoas que consumiam
água.

O povo vai às ruas pela água

O editorial do Diário de Notícias de domingo, 10 de março de 1889, na primeira página,


critica o governo sem rodeios. A febre amarela, que já tomou a cidade e agora se alastra pelo
interior, é apenas uma consequência. A causa é a seca. A solução: “água, água, água”. O
governo, diz a matéria, não a coloca ao alcance da população por que não quer. Aponta uma
possível saída: as águas da Serra do Comércio, a cerca de sessenta quilômetros ao noroeste da
cidade, atual Baixada Fluminense. A redação do jornal ouve alguns especialistas e declara ao
público que o problema pode ser resolvido em apenas seis dias. O editorial tem como alvo o
Ministério da Agricultura, que barganha os preços de mananciais próximos à corte. Seus donos
pedem 470 contos de réis. O ministério oferece quatrocentos – a falta d’água era, para as
pessoas que controlavam as suas fontes, uma ótima oportunidade para lucrar.
O jornalista convoca a população: “Se o povo do Rio encher a rua e disser que quer e terá
água, tê-la-á.” A discussão ganha as ruas.
No dia 11, o jornal de Rui Barbosa critica novamente o governo, divulgando o número de
mortos pela febre. A reação popular é imediata. No dia seguinte, terça-feira, 12 de março,
cerca de duas mil pessoas marcham no centro da cidade em um protesto pedindo água – uma
quantidade nada desprezível para as demonstrações públicas na época. O povo carrega
estandartes e cobra providências. O movimento é desqualificado pelo jornal Cidade do Rio,
que o chama de “passeata fúnebre”.
Um dia antes do protesto, entretanto, o governo já se via encurralado, situação que só se
tornou mais urgente com o povo na rua.

A solução de Paulo de Frontin


Sábado, 16 de março de 1889. Primeira página do Diário de Notícias, “Água em seis dias!” Sob
este título, é publicada uma carta assinada por Paulo de Frontin. Seu autor, à época com 39
anos, um professor da primeira instituição do país dedicada à engenharia civil, a Escola
Politécnica do Rio de Janeiro, propõe aumentar o abastecimento de água da cidade em 15
milhões de litros diários (o abastecimento normal, sem a seca, era de 70 milhões de litros).
Diz que o prazo de seis dias é razoável e dá o preço de oitenta contos de réis. A compra dos
mananciais, por sua vez, ficaria em menos de noventa contos.
O jornal de José do Patrocínio, que também recebeu a carta, debocha de Paulo Frontin,
ilustre desconhecido que quer, em um prazo menor do que aquele em que o Criador fez o
mundo, matar a sede do povo.

No dia seguinte, um domingo, a primeira turma de engenheiros e operários do Largo de São


Francisco, sede da Escola Politécnica, partiu para a Serra do Comércio. O governo, que havia
prometido ajuda no transporte da tubulação, nada faz. Segundo o jornal governista Cidade do
Rio, tudo não passou de um mal-entendido. Já percebendo que havia comprado uma briga
perdida, o periódico muda o tom. Diz que o povo pediu água e “água há de vir”.
Na segunda-feira, pouco antes das oito da noite, Paulo de Frontin parte do centro com uma
comitiva de trezentas pessoas. Depois de uma hora, chegam à estação da estrada de ferro Rio
do Ouro, na ponta do Caju. O número de trabalhadores ainda é insuficiente. Os jornais
publicam anúncios da Comissão Frontin convocando operários para a obra na serra, pagando
cinco mil-réis por dia. Na quarta-feira, dia 20, já são quinhentos trabalhadores que, sob
chuvas torrenciais, abrem cinco quilômetros de valas. Todos os dias candidatos se alistam
para participar das obras. O leque social que os abrange é vasto. De “simples” trabalhadores
braçais e estudantes de engenharia a médicos voluntários, entusiasmados com a iminente
vitória da razão científica e da mobilização popular sobre as politicagens do governo central.
Água em seis dias

Na quinta-feira, dia 21, já são quase mil trabalhadores, mesmo sem a ajuda de operários
prometidos pelo Império. Em telegrama, o correspondente do Diário de Notícias resume a
situação: “Geral êxito, esplêndido triunfo.” No dia seguinte, 350 homens sob a orientação do
engenheiro Carlos Sampaio abrem uma vala de quatro quilômetros e fazem uma calha com
folhas de zinco ligando a cachoeira de Macuco a um novo reservatório, construído havia
apenas dois anos, chamado Barrelão. Frontin organiza e distribui o trabalho em outras
subcomissões, que, no mesmo compasso, vão finalizando o projeto.

Os correspondentes enviam mensagens aos seus respectivos jornais e revistas, informando a


vitória do empreendimento. A quantidade de água conseguida pelas obras é superior aos 15
milhões de litros propostos pelo engenheiro. A engenharia oficial, junto com o ministro e o
diretor de águas, haviam, por outro lado, sido colocados em xeque.
O engenheiro Paulo Frontin chegou ao Rio de Janeiro, sede da corte, naquela mesma segunda-
feira. Ao contrário do povo, os ministros do governo não foram recebe-lo. Os funcionários
responsáveis pelas águas da corte tiveram oito anos para resolver o problema de
abastecimento e não conseguiram. Tentando se redimir, o governo anuncia um contrato com
Frontin para manutenção das obras. O agora ilustre personagem é conduzido com festa pelas
ruas do centro, seguindo para a Rua do Ouvidor, onde discursa em frente às redações dos
jornais.
A charge publicada no dia 30 de março pela Revista Illustrada (ver a imagem no início do
texto) resume todo o episódio. As águas trazidas por Frontin arrastam toda a ineficiente
estrutura do governo.
Pouco mais de seis meses depois o Império cairia no Brasil, efeito de um movimento de
militares descontentes e republicanos conspiradores. Mas suas engrenagens ineficazes já
haviam sido expostas ao público por um desconhecido engenheiro e 17 milhões de litros de
água. Em apenas seis dias.

Rodrigo Elias é editor e Marcello Scarrone é pesquisador da Revista de História da Biblioteca


Nacional. Uma versão anterior deste artigo foi publicada na revista Nossa História, em
setembro de 2004.

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