A Proposta deverá ter até 7 (sete) páginas, excluindo a bibliografia e a capa, no formato
A4, espaçamento 1,5 entre linhas, fonte Times New Roman 12. Na capa, deverá ser
indicado o título do projeto e a linha de pesquisa, conforme anexo III. Na capa e em
nenhum outro lugar da Proposta não deverá constar o nome do/a candidato/a, somente o
número de identificação emitido no ato na inscrição. Aos/Às inscritos/as, via postal, a
Secretaria do PPG/SOL cuidará de enviar recibo com o número de inscrição, que será
devidamente registrado em toda a documentação do/a candidato/a. Os critérios de
avaliação para esta etapa estão explicitados no item 6.2.1 deste edital.
PROPOSTA DE DISSERTAÇÃO
O tema das ações afirmativas e da promoção da diversidade tem sido objeto de crescente
reflexão no Brasil. Especificamente, as iniciativas voltadas ao enfrentamento da desigualdade
racial tem sido objeto de ampla discussão e, sobretudo, polêmica, desde quando se começa a
discutir a implementação de tais ações no âmbito do ensino superior público brasileiro até, pelo
menos, a consagração destas políticas com a Lei 12.770/2014, conhecida como Lei de Cotas. As
ações afirmativas, deve-se pôr em relevo, modificaram substancialmente o recrutamento de
instituições que abrigavam parte do núcleo mais relevante de oposição a tais políticas, os
segmentos de maior renda e escolaridade da população, incluídos aí os docentes universitários.
(CAMPOS, 2008; SANTOS, 2012a; DAFLON; FERES JÚNIOR; MORATELLI, 2014;
ALMEIDA FILHO et al, 2005).
Mais que isso, a produção acadêmica deste campo empírico permite perceber a questão
das ações afirmativas como crucial para a compreensão da expansão do ensino superior público
brasileiro ocorrido no início do século XXI. Explorações quantitativas acerca do aumento
considerável de estudantes negros e pobres nas universidades públicas e o seu desempenho
acadêmico e evasão, bem como estudos qualitativos acerca da sua participação na vida
universitária permitem absorver o tamanho do impacto que estas políticas significaram no
cotidiano das instituições públicas, consideradas, via de regra, a elite do ensino superior
brasileiro (PINHEIRO, 2010; NERY; COSTA, 2009a; 2009b; RIBEIRO et al, 2014; CICALÓ,
2012; PASSOS, 2015; SANTOS, 2013; BARRETO, 2008; 2015; QUEIROZ; SANTOS, 2006;
GUIMARÃES et al, 2010).
Porém, percebi ao longo da exploração da literatura uma lacuna importante, no que
tange ao papel que os docentes cumprem neste processo. Havia uma documentação acerca das
resistências ao processo de adoção das políticas afirmativas, tendo como núcleo fundamental um
grupo que compraz os setores médios e superiores em termos de renda, pessoas com ensino
superior e brancas, na sociedade em geral (QUEIROZ E SANTOS, 2006), que se reflete numa
documentação da resistência específica na categoria docente nos processos de decisão sobre as
cotas (SANTOS, 2012a; ALMEIDA FILHO et al, 2005; CAMPOS, 2008). Essa resistência,
porém, deixa de ser um fator de análise central quando se examina os efeitos das políticas
afirmativas. Ao longo da minha trajetória na graduação, busquei explorar evidências,
especificamente na área do Direito, curso de prestígio que, por um lado, teve seu corpo discente
muito afetado pelas cotas (SANTOS, 2013) e por outro, expressa no seu corpo docente repleto de
membros de outras carreiras de Estado o pólo superior da segmentação racial e de gênero da
sociedade (BARRETO, 2015; SILVA; SILVA, 2014), de que docentes tem percepções e
comportamentos peculiares acerca das ações afirmativas, influenciados pela sua trajetória de
vida, sua área de atuação e pelo referido contexto de inclusão, com impacto na vida acadêmica
nos beneficiários de ações afirmativas.
Esta investigação visa explorar, portanto, os mecanismos de reprodução das
desigualdades estruturais com base em raça, no campo específico da educação superior. Assim,
tomo o trabalho anterior como um ponto de partida sobre aspectos particulares das instituições
que assumem a inclusão como princípio ao aprovar políticas afirmativas: o comportamento e as
opiniões dos servidores públicos que, em tese, devem fazer esta política se viabilizar
concretamente. Assim, objetivo ampliar o escopo desta investigação e aprofundar nos temas já
trabalhados.
Para tanto, a pesquisa deve se referenciar centralmente na literatura acerca das ações
afirmativas, em especial seus resultados no Brasil. Também, deverá cobrir o histórico do
pensamento racial brasileiro, a fim de encontrar apoio para analisar posicionamentos que, por
vezes, se fundam em concepções já clássicas no país; e também aprofundar na literatura sobre as
relações raciais em sentido mais amplo, com foco na ideia de racismo institucional ou estrutural
e as demarcações destes conceitos com o de discriminação, a fim de perceber como estas
manifestações se expressam no caso em tela (FREYRE, 2003; FERNANDES, 1987; 2008;
RAMOS, 1995; GUIMARÃES, 1995; CICALÓ, 2012; DAFLON; FERES JÚNIOR; CAMPOS,
2013; SANTOS, 2012a; SANTOS, 2013; FERES JÚNIOR; DAFLON, 2014)
Também é necessário explorar a literatura que abarca um conjunto de temas que, mesmo
não sendo a questão de pesquisa, acabam por influenciar muito as entrevistas e os dados
coletados. A questão de classe, haja vista que os profissionais do direito se situam numa posição
peculiar neste aspecto; a mobilidade social, pela inclusão recente ou pela própria trajetória dos
possíveis entrevistados; ou ainda, a questão de gênero, também evidente a partir das explorações
já feitas sobre o tema desta pesquisa, podem e devem ser abordadas interseccionalmente
(SOUZA, 2012; POCHMANN, 2014; CRENSHAW, 2002; COLLINS, 2016; FRASER, 2006;).
Ainda, é preciso buscar referências para aprofundar nas ideias de posição e
comportamento, a fim de tratar com mais robustez a ideia de estratégias de colaboração ou
resistência ao processo de inclusão. Tornar mais sólidos os entendimentos acerca destes marcos
analíticos é importante para o trabalho.
Por fim, é importante buscar referências na discussão sobre a universidade em geral e o
papel do docente no contexto universitário, levando em conta a ideia de inclusão. Tratar com
propriedade sobre esta complexa instituição e sobre aqueles que fazem parte dela é
importantíssimo, do ponto de vista da qualidade final do argumento do trabalho.
3. Objeto de Estudo
Este projeto traz como seu objeto central as posições sobre as ações afirmativas que
docentes de Direito de universidades públicas com diferentes trajetórias na implementação destas
políticas tem, como elas se formam e se justificam, e a partir disso, os padrões de colaboração ou
resistência ao processo de inclusão social a partir de políticas afirmativas em contextos
diferentes. A reflexão de fundo é qual papel os docentes, enquanto agentes de uma instituição
que optou por estas políticas, assumem que devem ter e/ou de fato desempenham, implicando
numa reflexão sobre qual pode ser esse papel, levando em conta a sua posição particular de
servidores públicos que lidam diretamente com os beneficiários de uma política pública.
O objetivo geral da pesquisa é comparar diferentes estratégias de colaboração ou
resistência ao processo de inclusão, em diferentes universidades, a partir das falas dos docentes
acerca de suas trajetórias, posições e comportamentos sobre a questão das ações afirmativas. Em
específico, identificar estratégias em contraste com o contexto local das ações afirmativas;
identificar como se articulam discursos sobre trajetórias profissionais e de vida e posições sobre
as ações afirmativas na formação das atitudes e comportamentos; comparar o que os docentes
avaliam ser seu papel neste processo, e quais atitudes concretas narram neste sentido; refletir
sobre como o desenho das políticas se relaciona com estes comportamentos, e como estes, por
sua vez, impactam no resultado daquelas. Assim, se perceberá como o racismo e a desigualdade
racial operam partido do âmbito institucional para a realidade concreta, reproduzindo ou criando
processos que redundam, em última instância, em mecanismos de aumento, manutenção ou
mitigação das desigualdades discutidas.
É relevante discutir a universidade pública pois estas passaram por intenso debate acerca
da legitimidade e relevância das políticas afirmativas, consignando-se como o centro de uma
discussão muito mais ampla acerca das políticas afirmativas. As posições dos docentes são
importantes, uma vez que estes tem ampla liberdade e discricionariedade na condução do ensino
universitário, com relevantes impactos na vida dos estudantes.
Por fim, se a instituição universitária tem um perfil docente que se aproxima muito do
núcleo mais resistente às ações afirmativas, a Faculdade de Direito em específico o tem ainda
mais, inclusive com uma importante presença de docentes que seguem carreiras de Estado
também marcadas por essas características socioeconômicas, raciais e de status (BARRETO,
2015; SILVA; SILVA, 2014). Assim, estudar Faculdades de Direito significa penetrar num
campo duplamente interessante: por um lado, muito afetados pelas políticas de cotas, o corpo
estudantil delas se transformaram; por outro, há uma expectativa de encontrar maior variedade de
posições e formas de lidar com essa política entre os docentes, haja vista a controvérsia que se
instala nesse segmento da sociedade.
4. Procedimentos de Pesquisa