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ISSN 1981-2566

MEDIAÇÃO E APRENDIZAGEM DOCENTE

Elaine Sampaio Araujo


FFCLRP-USP, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil
esaraujo@usp.br

Considerações iniciais

A abordagem do tema “mediação e aprendizagem docente ”, neste texto, dar-se-


á a partir das contribuições da teoria histórico-cultural, desenvolvida inicialmente por
Vygotski1, Leontiev e Davidov. O conceito de mediação ocupa, nessa teoria, lugar
central ao compreender-se que as funções psicológicas superiores são processos
mediados culturalmente. O objetivo deste trabalho é, então, propor o conceito de
mediação como (des)encadeador de processos de formação docente.
Neste trabalho começamos por indicar, primeiramente, a gênese do conceito de
mediação considerando a questão da abordagem do materialismo histórico e do
materialismo dialético para a definição de um “novo” objeto e de um “novo método” em
psicologia. As relações entre mediação e desenvolvimento humano serão realizadas a
partir dos estudos de Vygotski sobre a formação das Funções Psicológicas Superiores,
entendidas no campo da significação. Em seguida, procuramos apresentar a questão da
formação docente como processo de aprendizagem, discutindo que esse entendimento
nos conduz ao conceito da formação como um processo que promove o
desenvolvimento. Isto implica, por sua vez, trazer a tese vygotskyana, de que o “bom
aprendizado adianta-se ao desenvolvimento”, para o centro do debate sobre novos
contextos de formação. Razão pela qual a idéia de Zona de Desenvolvimento Proximal
(ZDP), desenvolvida por Vygotsky (1998) será assumida como o campo de
possibilidades para o processo de aprendizagem e desenvolvimento docente, quer ele se
dê nos âmbitos de formação inicial (cursos de licenciatura) ou de formação contínua

1
Optamos, neste texto, pela utilização da grafia Vygotski. Todavia, ela poderá aparecer escrita de outras formas ao longo do texto
quando for referência direta.
(em serviço). Por fim, defendemos que a qualidade de aprendizagem docente vincula-se
com a qualidade de mediação, apresentadas, no caso pelo modo de produção do trabalho
docente.

“Vivo porque amo a vida, amo o dia e a noite, amo a luta, gosto de ver
o homem crescer, lutar contra a natureza e, entre outras, contra a sua
própria natureza...O homem deve ter uma só especialidade: deve ser
um ser humano verdadeiro.”(Makarenko)

1. A gênese do conceito: fenômeno e método

Nas últimas décadas o termo mediação tornou-se “palavra de ordem” entre os


educadores, configurando, muitas vezes, um “discurso fetichizado”, ou um discurso
polissêmico, como o próprio Vygotski reclama ao referir-se ao fato de que a crise da
psicologia trouxe consigo uma compreensão confusa sobre os conceitos que “se
modificam segundo o ponto de vista básico que elege o investigador sobre o objeto”
(Vygotski, 1995, p.139). Dessa maneira, é importante destacar o seu significado para a
teoria histórico-cultural que, ao defender a inexistência de uma relação unívoca entre
ensino e desenvolvimento, apresenta a superação do esquema: sujeito-ação-objeto, pela
tríade sujeito - mediação cultural - objeto social. A superação de um processo simples
de estímulo–resposta, para um processo mais complexo, passa necessariamente pela
incorporação, neste último, de elementos mediadores como os instrumentos e os signos.
Vygotski, ao formular as bases de um novo pensamento que fosse “uma síntese
das concepções antagônicas em bases teóricas completamente novas”, como apresentam
M. Cole e S. Scribner (Vygotsky, 1998, p.8), buscava avançar na psicologia, a partir de
uma abordagem que pudesse descrever e explicar as funções psicológicas superiores
(FPP), –"combinação entre o instrumento e o signo na atividade psicológica" –
(Vygotsky, 1998, p.73). Para esse autor tais funções (que envolvem especialmente
consciência, intenção, planejamento, ações voluntárias e deliberadas e o pensamento),
têm sua gênese nos contextos de aprendizagem compreendidos como processos
mediados culturalmente. E, nessa perspectiva, podemos compreender que,
dialeticamente, essas funções possibilitam “o domínio dos procedimentos e modos
culturais da conduta” (Vygotski, 1995, p.42).
Para dar conta dessa tarefa, Vygotski recorreu aos fundamentos do materialismo
histórico e do materialismo dialético, entendendo o primeiro como o caminho teórico
que indica “os modos de produção, sua organização, seu funcionamento e suas
transformações”(colocar referência) e o segundo como o método de abordagem deste
real, ou seja, “a história da produção do conhecimento, enquanto conhecimento”.
Nesse sentido, a tarefa de Vygotski tinha dois objetivos e desafios a serem
superados. Embora esses desafios estejam relacionados dialeticamente, numa relação
de interdependência, podemos considerar que um deles possuía uma natureza
predominantemente teórica, pertinente ao próprio conceito de FPS e o outro,
intimamente vinculado a esse, relacionado à questão do método. Portanto, o estudo das
Funções Psicológicas Superiores imputava dois debates: o da compreensão sobre o
fenômeno e o do método de abordá-lo. Um “novo método” definiria, também, “um
novo fenômeno”, ou seja, o método está intimamente ligado ao fenômeno da mesma
forma que o fenômeno é “revelado” pelo método. Destarte, o método configura-se como
premissa e produto. Daí a necessidade de um novo método, chamado por ele genético
experimental que, em termos gerais, caracteriza-se por: converter o objeto em processo;
superar a descrição pela explicação científica e permear o estado cristalizado dos
processos psíquicos. (Vygotski, 1995).
A partir dessas considerações, Vygotski, fundamentado em Marx, para quem o
conhecimento “resulta de construção efetuada pelo pensamento e suas operações; e
consiste numa “representação” mental do concreto (Caio Prado Junior, s/d, p.43)
empreende, a partir da teoria do reflexo, um esforço científico de demonstrar que a tese
marxista de formação histórica da consciência estava correta. Isso se realiza à medida
que a crítica que ele faz à “velha psicologia”, se aplica, na verdade, a um determinado
modo de produção do conhecimento “sobre” o homem. Representa, igualmente, a crítica
a uma determinada finalidade social do conhecimento. E ele vai procurar mostrar isso a
partir do estudo da formação das Funções Psicológicas Superiores, o que significou
considerar três dimensões: análise, estrutura e desenvolvimento.
Acerca da análise Vygotski procura demonstrar os limites de um método
analítico, desenvolvido pela psicologia descritiva, por seu caráter reducionista, voltado
ao entendimento do fenômeno como resultado de uma fragmentação das experiências
em determinados elementos, o que tem por consequência uma análise também
fragmentada. A análise desenvolvida pela chamada psicologia associacionista, para o
autor, incorre no mesmo equivoco reducionista, porém em um sentido contrário. Ao
apoiar-se na tese atomística, essa perspectiva compreende que as funções psicológicas
superiores resultam a partir da soma de certos elementos isolados. A superação dessas
abordagens se dá, segundo Vygotski, quando a análise considera o objeto em processo;
superara descrição pela explicação científica e perpassa o estado cristalizado dos
processos psíquicos. (Vygotski, 1995). Essa qualidade de análise configura-se, então, na
base do método genético experimental. E, segundo Vygotski, essas três pontos, tomados
em seu conjunto:
estão determinados por uma nova interpretação da forma de conduta
psicológica superior, que não e uma estrutura puramente psíquica,
como supõe a psicologia descritiva, nem uma simples soma de
processos elementares, como afirmava a psicologia associacionista,
senão uma forma qualitativamente peculiar, nova em realidade, que
aparece no processo de desenvolvimento (Vygotski, 1995p. 106).

Em relação ao conceito de estrutura, considerado de suma importância para


Vygotski (1995, p.121), pelo motivo de que ele assumia o lugar de um enfoque analítico
nos estudos voltados aos processos psicológicos superiores, ele recorre ao conceito de
totalidade, expresso pelo marxismo, para discriminar duas formas de estruturas
relacionadas ao desenvolvimento cultural: a primitiva e a superior. No primeiro caso
incluem-se “um todo psicológico natural” , orientado por leis biológicas e no segundo
caso “uma forma de conduta geneticamente mais complexa”, dirigidas pelo processo de
desenvolvimento cultural. Nesse sentido, o termo estrutura pode ser entendido como
estrutura do processo de conduta.
A terceira dimensão considerada por Vygotski no estudo da formação das
Funções Psicológicas Superiores, diz respeito ao conceito de desenvolvimento. O
entendimento empregado por ele a este conceito vai de encontro ao que então
prevalecia, como “um aumento puramente quantitativo das proporções contidas desde o
princípio no embrião, que aumenta gradualmente, cresce e se converte em um
organismo maduro” (Vygotski, 1995 p.140). Superando essa abordagem biológica,
Vygotski propõe que o desenvolvimento cultural seja compreendido a partir de leis
socioculturais, ou seja, que o processo de formação das Funções Psicológicas
Superiores relacionam-se, dialeticamente, com o desenvolvimento da conduta cultural,
estabelecida por signos e instrumentos. Essa será a questão que desenvolveremos
melhor a seguir.

Mediação e a formação das Funções Psicológicas Superiores

Leontiev (1991), no Tomo I de “Obras Escolhidas de Vygotski”, ao tecer


comentários sobre a relevância dos estudos do autor, nos concede uma síntese impar
sobre a principal contribuição teórico-metodológica de Vygotski, segundo ele:

Fiel a seus pressupostos teóricos, Vygotski não se ocupou de estudar


fenômenos psíquicos entre si, senão de analisar a atividade prática.
Como é sabido, os clássicos do marxismo destacaram desta atividade,
em primeiro lugar sua condição instrumental, o caráter mediado do
processo laboral por meio de ferramentas. Vygotski decidiu começar
mediante uma analogia à análise dos processos psíquicos. Em sua
mente surgiu uma hipótese: não seria possível existir um elemento de
mediação nos processos psíquicos do homem em forma de
instrumentos psíquicos? (Leontiev, 1991, p.429)

A ênfase desses autores na função social dos instrumentos e signos, nos


processos de aprendizagem, resulta, assim, de um aporte teórico marxista, expresso nas
palavras de Vygotski ao explicitar como a ferramenta e o signo orientam o
comportamento humano: "A função do instrumento é servir como um condutor da
influência humana sobre o objeto da atividade; ele é orientado externamente; deve
necessariamente levar a mudanças nos objetos" (Vygotsky, 1998, p.72). A atividade
humana serve-se dos instrumentos para relacionar-se com a natureza.
Em termos gerais, em relação ao signo, Vygotsky (1998, p. 73) considera-o
como "um meio da atividade interna dirigido para o controle do próprio indivíduo". A
atividade humana serve-se dos signos para "dominar-se" individualmente. Ou seja,
Vygotsky considera o desenvolvimento filo e ontogenético: "O controle da natureza e o
controle do comportamento estão intimamente ligados, assim como a alteração
provocada pelo homem sobre a natureza altera a própria natureza do homem"
(Vygotsky, 1998, p.73). A propriedade comum do instrumento e do signo é a sua
natureza de atividade mediadora.
O instrumento encontra-se voltado para uma orientação externa e o signo para
uma orientação interna. A movimentação entre eles dá-se pelo processo de
internalização – "reconstrução interna de uma operação externa", que tem uma dinâmica
essencialmente dialógica e, segundo Vygotsky, segue um percurso de transformações
iniciado com a reconstrução interna de uma atividade externa. O processo interpessoal
transforma-se em um processo intrapessoal, tendo como contexto as relações
estabelecidas entre sujeitos historicamente constituídos, campo por excelência da
mediação.
A partir dessa compreensão é possível a defesa do signo como meio para a
formação das funções psicológicas superiores, ou dito de outro modo, o
desenvolvimento psíquico dá-se a partir de atividades mediadas culturalmente. É nesse
sentido que Vygotski defende que, pela significação (cultural), é o homem quem forma,
no processo de vida social, as conexões no cérebro e, assim, governa o seu próprio
corpo (individual). Isto significa considerar que a educação - como forma social de
organização capaz de levar o indivíduo à apropriação do conhecimento historicamente
acumulado - somente atua como fonte de desenvolvimento do psiquismo quando o
sujeito realiza atividades voltadas à apropriação das capacidades sociais também no
plano reprodutivo. Tal compreensão é expressa por Vygotsky (1998, p.54) ao defender
que: "o uso de signos conduz os seres humanos a uma estrutura específica de
comportamento que se destaca do desenvolvimento biológico e cria novas formas de
processos psicológicos enraizados na cultura".
Desse modo, pode-se entender que a mediação dá-se no campo da significação.
O conceito de significação surge nos estudos de Vygotski (1995) a partir de sua
compreensão de que os instrumentos psicológicos (ou estímulos meios) se constituem
como signos. A significação compreende, assim, a criação e o emprego dos signos
existentes na/pela atividade prática, configurando-se como uma generalização da
realidade que se materializa pela linguagem (em todas as suas formas de manifestação).
O fato de a significação guardar em si a experiência social da humanidade a conforma,
em termos de produção histórica da consciência, como campo de possibilidade no qual a
experiência social da humanidade se torna a experiência de um sujeito:

Assim, psicologicamente, a significação é, estando na minha


consciência (mais ou menos plenamente e sob todos os
aspectos) o reflexo generalizado da realidade elaborada pela
humanidade e fixado sob a forma de conceitos, de um saber ou
mesmo de um saber-fazer (“modo de ação” generalizado,
norma de comportamento etc.) (Leontiev, 197-, p.102,
destaques no original).

A teoria histórico-cultural defende, assim, que o conceito de mediação passa,


necessariamente, pela compreensão do uso e função dos signos e instrumentos na
formação das funções psicológicas superiores. É por essa razão que se afirma, em
termos de desenvolvimento psíquico, que a significação torna possível ao sujeito ao
apropriar-se da experiência social da humanidade (objetivada na língua, nos sistemas de
numeração, nas obras de arte e em toda sorte de produção cultural), desenvolver-se.

Da Formação e da aprendizagem docente


A partir desse entendimento, como pensar a mediação na perspectiva do
processo formativo docente? Acredita-se que, primeiramente, seja necessário
problematizar o conceito de formação. A palavra formação, no senso comum, é
utilizada para designar um período de instrução escolar ao cabo do qual, em via de
regra, forma-se, ou seja, “ganha-se uma nova capacitação”. Expressões comuns como:
"sou formada em matemática"; "formei-me no ano passado", "qual é sua formação
profissional?”, manifestam apenas uma das visões, a de certificação, que podemos
atribuir ao termo formação, daí a necessidade de se ampliar essa perspectiva. A
formação, no sentido aqui atribuído – como aprendizagem – afigura-se como um
processo próprio aos seres vivos, ocorre sempre, ainda que de diferentes formas, com
diferentes intencionalidades e com diferentes qualidades. Dessa maneira, seria possível
dizer-se que formar é sempre um verbo que se conjuga no gerúndio e, como afirma
Barroso (1997), no plural; quer isso ocorra nos contextos de profissionalização inicial
quer isso ocorra nas situações de trabalho.
Ao se considerar a formação do professor como um processo de aprendizagem e
desenvolvimento, há que se considerar, igualmente, a questão da aprendizagem dos
adultos, mas, sobretudo, outra máxima vygotskiana: “o verdadeiro curso do
desenvolvimento do pensamento não vai do individual para o socializado, mas do social
para o individual” (Vygotsky, 1991, p.17). E aqui é importante abrir um parêntese para
explicar o que significa social para esse autor, segundo a leitura de Holzman:

[...] social não significa interpessoal. Interação social não é o


que a criança tem de aprender, nem é a interação social tudo o
que existe no mundo ou tudo o que é possível conhecer. Para
Vygotsky, as atividades dos seres humanos, em todos os
estágios de desenvolvimento e organização, são produtos
sociais e precisam ser vistos como desenvolvimentos históricos,
não como meros desenvolvimentos interpessoais. O social não
se reduz ao interpessoal; a atividade social não é mera interação
social. (Holzman, 2002, p. 98, grifos no original).

Assim, Vygotsky ao discutir sobre a interação entre aprendizado (dimensão


interpessoal) e desenvolvimento (dimensão intrapessoal) defendeu que a aprendizagem
desencadeia os processos internos de desenvolvimento, o que nos remete para uma
determinada compreensão sobre unidade entre aprendizagem e desenvolvimento. Ao
defender que a aprendizagem desencadeia os processos internos de desenvolvimento,
ele atribui um papel preponderante ao aspecto social relacionando-o ao modo de
produção histórico-cultural do conhecimento e do papel dos seres humanos nessa
produção.
Uma vez compreendida a formação como processo de aprendizagem, busca-se,
novamente, em Vygotsky o entendimento desse processo a partir do conceito de Zona
de Desenvolvimento Proximal (ZDP). Segundo esse autor, a aprendizagem deve incidir
na ZDP que é o espaço entre o nível de desenvolvimento real e o nível de
desenvolvimento potencial. Pode-se compreender o nível de desenvolvimento real como
sendo aquele no qual determinados ciclos de desenvolvimentos encontram-se
completados; existe um conhecimento adquirido, na dimensão do instituído. O nível de
desenvolvimento potencial corresponde àquele no qual os ciclos estão se formando, na
dimensão do instituinte. O espaço entre esses dois níveis – a ZDP – apresenta-se como o
campo de possibilidades para a aprendizagem.
A figura a seguir pretende manifestar o movimento dialético que caracteriza a
ZDP.

Nível de Nível de
desenvolvimento Zona de desenvolvimento
real Desenvolvimento potencial
Proximal

Movimento de aprendizagem e desenvolvimento orientado em Vygotski

Esse pensamento de Vygotski solicita um olhar dialógico para o


desenvolvimento mental: retrospectivo para o nível real e prospectivo para nível
potencial. A partir das considerações dele, defende-se que a aprendizagem do professor
também acontece nessa mesma lógica marcada pelo movimento externo – interno, do
interpsicológico para o intrapsicológico. O professor tem, em relação ao seu saber
docente, um nível de desenvolvimento real e um nível de desenvolvimento potencial, e
é na Zona Desenvolvimento Proximal, configurada como um espaço próprio das
relações de mediação, que as ações de formação devem incidir. Todavia, a ZDP não
deve ser compreendida apenas em termos de processos mentais individuais, mas de
processos coletivos, campo por excelência da mediação.
Em termos mais gerais, isso significa estabelecer um outro sentido de
competência, ou seja, romper com a lógica de que o objetivo da formação é tornar o
professor mais competente, segundo a qual os processos de formação docente instauram
uma lógica da “produtividade-consumo-competitividade”, cuja competência restringe-se
à dimensão individual.
Deve-se, ainda, compreender o processo de formação da atividade pedagógica
na coletividade de ensino e a formação da consciência como resultado das mediações
culturais que emergem das condições objetivas do modo de produção do trabalho
docente. Daí resulta, por exemplo, a importância do estágio na formação profissional
dos estudantes de licenciatura, que têm no estágio a possibilidade de compreender os
modos de produção da profissão docente com um parceiro mais experiente. Da mesma
forma, os docentes que já atuam compartilham significados sociais do ser e estar
professor em condições objetivas de trabalho o que inclui, também, a possibilidade de
que os estudantes que estão na Universidade possam, por meio de suas propostas de
intervenção, constituírem-se, circunstancialmente, como parceiros com mais
experiência. Daí que podemos estabelecer que a qualidade de aprendizagem relaciona-
se com a qualidade das mediações.
O exercício da docência configura-se, assim, na perspectiva de mediação
estabelecida pelas relações: professor–estudante, estudante-estudante, professor–
professor, professor–conhecimento–estudante. A escola, como ambiente de trabalho e
de estudo, para o professor e para o estudante, respectivamente, se constitui
primordialmente como espaço social de aprendizagens, para todos.

Dos modos de aprendizagem e desenvolvimento docente

Ao se defender que a qualidade de aprendizagem docente relaciona-se com a


qualidade de mediação, faz-se oportuno compararmos a organização produtiva do
trabalho do professor com a vivenciada pelo artesão nas oficinas pré–capitalistas. Da
organização produtiva nas sociedades pré–capitalistas, representada em grande parte
pelas corporações (guildas), Marglin descreve:
Nas sociedades pré–capitalistas, a produção organizava-se numa
hierarquia estrita – mestre–companheiro–aprendiz, que hoje só
sobrevive no nosso ensino superior [...] no ápice como na base da
hierarquia pré-capitalista encontrava-se o produtor. O Mestre artesão
trabalhava junto com o aprendiz, em vez de simplesmente indicar-lhe
o que fazer. Em seguida, a hierarquia era linear e não piramidal: um
dia o aprendiz seria companheiro, quase certamente um mestre [...]
enfim, e talvez seja isso o mais importante, o artesão [...] controlava,
ao mesmo tempo, o produto e o processo de trabalho (Marglin, 1980,
p.43).

Até que ponto é possível, em uma sociedade complexa e organizada segundo o


modo de produção capitalista, como a que hoje vivenciamos, recuperarmos a divisão do
trabalho do tipo corporativista, no sentido lato do termo? Como sustentarmos, no espaço
social da escola, a qualidade master das oficinas: trabalho (com)junto? E mais, como
estabelecer relações entre o conceito do artesão, compreendido como aquele que produz
uma arte e tem o controle do produto e do processo de produção, com o conceito de
professor?
Embora se reconheça os limites que tais comparações impõem, acredita-se que a
organização coletiva do trabalho configura-se como um diferenciador da qualidade das
próprias relações de trabalho, apresentando-se como uma possibilidade de gerar e gerir,
no espaço educativo, uma unidade produtiva na qual o coletivo supere a alienação, que,
segundo Leontiev (197-, p.130), "tem por conseqüência a discordância entre o resultado
objetivo da atividade humana e o seu motivo". Isto se aplica para o professor em relação
ao processo de elaboração, criação e organização de conhecimento.
Desse modo, pensar os modos de aprendizagem docente implica,
necessariamente, pensar que o movimento de fazer atividade de ensino é ao mesmo
tempo movimento de se fazer professor e torna-se indicador de sua competência
profissional. Desse modo, o desenvolvimento profissional dos professores vincula-se
com as escolas e seus projetos e é nesse contexto que o conceito de mediação necessita
ser compreendido. A análise coletiva das práticas apresenta-se como uma das
possibilidades que contribuí para a reconfiguração dos modos de organização do
trabalho educativo.
O professor (ou o estudante), ao comunicar verbalmente sua atividade, além de
revelar suas representações mentais acerca das ações realizadas atividade necessária e
integrante do processo de formação de conceitos, possibilita que o grupo envolvido
também realize uma ordenação teórica e prática da atividade em questão. Com isso,
compartilham significados que, segundo Arendt, tornam-se possíveis pelo discurso: "os
homens que vivem e se movem e agem neste mundo, só podem experimentar o
significado das coisas por poderem falar e ser inteligíveis entre si e consigo mesmos"
(Arendt,1999, p.12).
Trata-se de compreender a linguagem como elemento regulador. Ao pensar na
perspectiva da linguagem como instrumento do pensar, Leontiev acrescenta:
Sucede que estabelecer um plano não significa somente pensar,
reflectir. Pressupõe ainda uma determinada organização do
comportamento, da actividade, de tal forma que ao estabelecer-se um
plano ou projecto a linguagem actua, também, de maneira bastante
peculiar, como instrumento de que o homem se serve para regular os
seus próprios actos, o que constitui, diga-se de passagem, a principal
função da linguagem interior. Segundo parece, é devido a essa função
que em nós, seres humanos, existe a auto-consciência que temos de
nós mesmos enquanto pessoas, e que podemos organizar
conscientemente a nossa conducta (LEONTIEV, s/d, p.57-58).

É nesse sentido que se utiliza o entendimento atribuído a Vygotski, já


anteriormente citado, de que "o verdadeiro curso do desenvolvimento do pensamento
não vai do individual para o socializado, mas do social para o individual
(Vygotsky,1991, p.18).
O social, no caso, é representado prioritariamente pelo movimento dos projetos.
Dito de outro modo, os projetos configurados institucionalmente como atividade, no
sentido leontieviano, não apenas legitimam a participação coletiva como instauram uma
nova ordem teórico-metodológica na organização do trabalho pedagógico, marcada
pelas mediações. Isto implica uma lógica de trabalho na qual se considera a sua natureza
coletiva e a necessidade de criação e utilização de instrumentos voltados para as ações
concretas. Com isso, rompe-se com uma cultura de organização e produção do trabalho
escolar baseado na lógica taylorista, cunhada pela divisão social do trabalho, na qual se
separa claramente, no fabrico do instrumento, o objeto de seu motivo, atendendo ao
princípio da separação entre o trabalho de concepção e o de execução.
Não se trata de voltarmos a uma lógica produtiva pré-capitalista, do tipo das
corporações de ofícios, mas, sim, da defesa de uma lógica representada pela figura do
artesão, na qual se privilegia o domínio dos processos, o objeto e o seu motivo e,
sobretudo, a possibilidade de aprender com o parceiro mais experiente. Isto se traduz
para nós na possibilidade do professor, coletivamente, lidar analítica e sinteticamente
com seu objeto de trabalho por meio do fabrico e compreensão dos instrumentos, "as
atividades de ensino", que possibilitam não apenas criar novas operações, mas também
satisfazer as necessidades que se apresentam. Trata-se de sairmos de uma lógica de
manufatura fundamentada na produção em série dos atos pedagógicos, para
compreendermos que toda ação pedagógica é única.
Nesse sentido, consideramos que as propostas de formação, quaisquer que sejam
os vínculos e parcerias, necessitam evidenciar aos professores, para que realmente eles
possam compreender, a complexidade de sua prática profissional como constituinte e
constituída de cultura e, como um movimento da atividade principal do homem adulto,
o trabalho, constituinte do seu próprio desenvolvimento psíquico (Leontiev, 197-).
Razão pela qual, como Vygotski, consideramos necessário que os estudos sobre
aprendizagem docente valham-se de uma análise sobre o fenômeno como processo, ou
seja, no contexto das inter-relações entre situações e sujeitos, corroborando a idéia de
Vygotsky (1998, p. 85- 86) de que "estudar alguma coisa historicamente significa
estudá-la no processo de mudança". Perceber a aprendizagem docente no movimento
histórico pressupõe assumir uma perspectiva heurística, bem como considerar a
totalidade como princípio metodológico. Isto significa assumir metodologicamente que
"em qualquer fase do conhecimento o investigador se vê precisado a recorrer ao
endurecimento do objeto que estuda, a 'solidificá-lo’, a considerá-lo temporalmente
como algo quieto, imutável. Só assim se pode desentranhar sua essência e conhecê-lo no
movimento"(Andréiev, 1984, p.158)
Nesse sentido, nós considerarmos que a atividade docente se configura em
unidade de análise do processo de aprendizagem docente, como Vygotski a definiu ao
tratar da questão do método::
Com o termo unidade queremos nos referir a um produto de análise
que, ao contrário dos elementos, conserva todas as propriedades
básicas do todo, não podendo ser dividido sem que as perca. A chave
para a compreensão das propriedades da água são as moléculas e seu
comportamento, e não seus elementos químicos. A verdadeira
unidade da análise biológica é a célula viva, que possui as
propriedades básicas do organismo vivo (VYGOTSKY, 1991, p.4) .

Finalmente, trata-se de estabelecer um “novo” contexto formativo marcado pela


qualidade das relações de trabalho, apresentando-se como uma possibilidade de gerar e
gerir, assim, uma unidade produtiva na qual o coletivo docente (em formação inicial
e/ou em serviço), supere a alienação configurada pela separação entre o resultado
objetivo da atividade humana e o seu motivo, ou seja, trata-se de afirmar que o trabalho
docente como “uma atividade adequada a um fim” (MARX, 2003, p.64). No caso esse
fim relaciona-se com a finalidade social da Educação, que é a de colocar cada sujeito no
movimento de criação do humano.

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