RELATÓRIO
Pois bem.
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo
PRELIMINAR (1) - ALEGADA PRECLUSÃO PARA O PROCESSAMENTO
DESTA AÇÃO
Os recorrentes sustentaram a ocorrência de preclusão para o ajuizamento da ação
de reclamação por captação ilícita de sufrágio, sob o fundamento de que a presente ação foi
ajuizada em momento muito posterior ao quinquídio legal.
Todavia, tal alegação não merece prosperar, pois os recorrentes confundem
institutos e ritos procedimentais, fugindo completamente da lógica processual.
Da simples análise processual, nota-se que, a despeito do direito material discutido
guardar relação direta com a competência em matéria eleitoral, a presente demanda é
eminentemente de cunho penal.
Ou seja, apesar das figuras de “captação ilícita de sufrágio”, que ensejariam
demanda a ser ajuizada no prazo de cinco dias mencionada pelos recorrentes, e a “corrupção
eleitoral”, prevista no art. 299 do Código Eleitoral, guardarem certa similitude, em nada se
parecem no tocante ao procedimento adotado para seu processamento e aplicação de eventuais
sanções.
O caso dos autos é o de acusação penal formal, de crime previsto no art. 299 da
Lei 4.737/65, que é processada seguindo o rito de ação penal pública, com competência da
Justiça Eleitoral para seu julgamento.
Portanto, não há falar em preclusão da presente ação, pois não se trata de uma
representação eleitoral, mas sim de ação penal, cuja persecução estatal só seria afastada na
hipótese de prescrição da pretensão punitiva, prevista no art. 109 do Código Penal, o que não se
verifica no caso, pois o prazo prescricional em questão é de oito anos (CP, art. 109, IV), tendo
como último marco interruptivo da prescrição o proferimento da sentença condenatória em
07/03/2017 (CP, art.117, IV), não havendo a incidência de nenhuma causa de redução do prazo
prescricional (CP, Art. 115) e nem a ocorrência de prescrição intercorrente ou retroativa.
Ante o exposto, REJEITO essa preliminar, declarando regular o trâmite da ação
penal.
VOTO
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo
(Preliminar 2 - Alegada ilicitude do auto de prisão em flagrante)
VOTO
VOTO
*
O Sr. JURISTA RODRIGO MARQUES DE ABREU JÚDICE (REVISOR):-
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo
Senhor Presidente: Acompanho o eminente Relator.
VOTO
(Mérito)
O delito do art. 299 do Código Eleitoral constitui crime comum, tendo como
sujeito ativo qualquer pessoa que pratique as condutas descritas no tipo penal, desde que a
vantagem, a promessa ou o benefício vise à obtenção de voto ou sua abstenção.
Conforme nos ensina a doutrina de FÁVILA RIBEIRO:
Feitas tais considerações gerais acerca da norma estatuída no art. 299, do Código
Eleitoral, passo a apreciar o conjunto probatório colacionado aos presentes autos, bem como as
ponderações da Acusação recorrida e da Defesa recorrente.
A denúncia narra que no dia 03 de outubro de 2012, no Posto de Gasolina Recanto
Verde, conhecido como 'Posto ALE', na cidade de Conceição do Castelo os acusados teriam
fornecido combustível em troca de votos em favor do candidato Dalton Henrique Pinão.
Segundo a denúncia, a participação do acusado MARCUS no delito se deu em
razão de ele, na qualidade de proprietário e administrador do posto de gasolina, ser o responsável
pela emissão dos vales combustível', enquanto que a participação dos acusados JAILSON e
MARCELO se daria porque recebiam os vales e realizavam os abastecimentos.
Em relação ao acusado FLÁVIO, por ser coordenador de campanha, sua
participação seria a de fornecer, recolher e realizar o pagamento dos mencionados vales. Já
quanto ao acusado DALTON, na figura de candidato, seria aquele beneficiado com o apoio
político comprado com a distribuição dos vales combustível.
Da leitura das peças informativas do inquérito policial que embasou a ação penal,
destacam-se os depoimentos dos condutores do flagrante, o da policial civil Maria Nivalda
Simões Barbosa (fls. 09/10) e do Delegado de Polícia Juarez Serafim Leite Junior (fls. 11/12),
ratificados na fase processual, narrando de forma semelhante que, diante de uma denúncia
encaminhada pela douta Promotora de Justiça Eleitoral, foram apurar supostos crimes eleitorais
no posto de gasolina em questão.
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E, segundo os condutores, quando lá chegaram, já de posse de um 'vale
combustível” perguntaram ao frentista “se era verdade que estavam abastecendo com vale do
candidato Dalton Henrique Pinão, mostrando referido vale, e ele respondeu que sim”.
Ou seja, nota-se que quando da abordagem policial, os agentes não solicitaram a
nenhum dos acusados o fornecimento de um vale combustível e nem os acusados chegaram a
oferecer-lhes tal vale, tendo em vista que já o possuíam, oriundo de uma 'denúncia anônima”,
conforme depoimento da testemunha de acusação Maria Nivalda em sede de instrução
processual.
Dessa forma, o que foi perguntado ao frentista e acusado MARCELO, era se o
posto de gasolina estava abastecendo através daquele vale apresentado pelo policial à paisana,
pelo que foi dito que sim.
Então, a abordagem policial, por si só, não revela o fim de captação ilícita de
votos, mas tão-somente comprova que aquele posto de gasolina era utilizado pela campanha
eleitoral do acusado DALTON para o fornecimento de combustível, ainda que o contexto
desse abastecimento seja suspeito, mas não ficou demonstrado de forma segura a intenção
eleitoreira, pois os policiais nem mesmo chegaram a anunciar apoio ao candidato, somente
perguntando acerca do vale.
Inclusive, o acusado MARCUS, dono do posto de gasolina sustentou a tese de que
eleitores não abasteciam com o uso desses vales mas somente os candidatos da coligação do
acusado DALTON teriam acesso a seu estabelecimento comercial através dos vales combustível
que ele emitia. Diz, ainda, que o candidato da coligação pagava antecipadamente pelo
combustível e a quantidade de litros de gasolina era preenchida previamente.
Da leitura dos denominados “vales”, que se encontram acondicionados dentro de
um envelope plástico branco acostado na contracapa do inquérito policial, nota-se tratar de notas
com timbre do “Auto Posto Recanto Verde”, em que somente consta a quantidade de
combustível, variando de notas com cinco litros e outras com dez litros, constando o dizer
“VALE” e o carimbo com as iniciais e sobrenome do acusado MARCUS, 'M.A.S.SANTIAGO' e
a assinatura do vendedor.
Não consta nos mencionados vales data de abastecimento ou preenchimento do
documento, nem a placa do veículo autorizado ou o nome do candidato.
Foram apreendidos, além daqueles que estavam na posse dos frentistas, outros em
uma cabine do posto de gasolina, tendo, ainda, sido apreendido computador utilizado para o
lançamento dos abastecimentos.
Pelo confrontamento dos documentos apreendidos e os dados coletados, bem como
as informações prestadas pela Justiça Eleitoral quanto às prestações de contas dos candidatos da
coligação política que contratou o posto de gasolina, em especial a do acusado DALTON, nota-se
a ocorrência de irregularidades quanto aos registros dos abastecimentos, das placas dos veículos,
dos candidatos e os lançamentos dessas distribuições quando das prestações de contas.
A despeito dessas irregularidades, não restou cabalmente demonstrado que os
vales combustível foram fornecidos a eleitores para fins de aliciar seus votos, de modo que, com
relação à conduta do acusado MARCUS, entendo que não há indícios seguros de que ele
tenha sido agenciado para executar atividades além daquelas de cunho comercial com a
coligação política “Por Amor e Respeito a essa terra” e com o acusado DALTON.
Cumpre consignar que em nenhum momento o acusado MARCUS negou a
emissão ou distribuição desses vales, se negando, porém, a declarar que suas atividades
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extrapolavam os limites legais da prestação de serviços e o fornecimento de produtos,
chegando a dizer em seu interrogatório (fl.303) que não sabia qual o destino que os candidatos
davam aos vales.
Com isso, tenho que o acusado MARCUS não ofereceu ou distribuiu
combustível em troca de votos, se limitando a vender/fornecer combustível à Coligação “Por
Amor e Respeito a essa terra” que por sua vez repassava os vales aos candidatos, a quem
competia a distribuição.
No que diz respeito aos acusados JAILSON e MARCELO, a denúncia narra que
eles eram frentistas do posto de gasolina do acusado MARCUS e que estariam envolvidos nos
fatos, pois eram eles que procediam o abastecimento através dos vales combustível.
O Ministério Público sustenta que eles teriam participação no esquema, contudo,
da análise das provas colhidas, tanto na esfera policial, quanto na fase processual, não
demonstraram qualquer vínculo político deles com o acusado DALTON.
Ao que consta nos autos, eles não possuíam qualquer gerência sobre os
atendimentos e abastecimentos, não competindo a eles a administração do estabelecimento
comercial e que teriam recebido ordem do proprietário para proceder o abastecimento de
gasolina através dos vales combustível a carros da coligação política.
Conforme relato de um outro funcionário do referido posto de gasolina, a
testemunha Elton Luis Graciano Ferreira (fls. 60/69 e fl.303), os abastecimentos só eram
realizados a carros de candidatos políticos e que a orientação dada pelo acusado MARCUS era
justamente no sentido de que os candidatos que estivessem com os vales deveriam ser atendidos.
Dessa forma, quando os policiais civis chegaram no posto de gasolina no dia dos
fatos e perguntaram aos frentistas sobre o abastecimento dos vales referentes à campanha do
candidato Dalton Pinão, a resposta de fato seria positiva, eis que foi a orientação recebida por
eles.
O acusado FLÁVIO defende a tese de que só era fornecido combustível a veículos
cadastrados de candidatos da coligação “Por Amor e Respeito a essa terra”, cujas placas eram
devidamente registradas. Além disso, diz em seu interrogatório que somente realizou a
distribuição dos vales a candidatos a vereador e negou desconhecer a quantidade de vales
emitidos.
O acusado DALTON também nega categoricamente a distribuição de combustível
para fins de corrupção, afirmando que somente eram distribuídos os vales a candidatos a vereador
pertencente à coligação.
Há de se pontuar que a prática de distribuição de combustível realizada dentro de
um contexto político, em período de campanha eleitoral é questão tormentosa diante das inúmeras
arestas que ela pode gerar.
O cotejo entre os documentos trazidos aos autos, aqueles que constam nos três
volumes anexos e os depoimentos das testemunhas e acusados, tanto na fase policial quanto na
fase processual, revela a existência de diversas inconsistências relacionadas aos abastecimentos
ante a falta do controle e registros dos veículos e pessoas autorizadas, a prestação de contas do
candidato e a declaração fiscal tributária do posto de gasolina acerca desses abastecimentos.
*
VOTO
PEDIDO DE VISTA
DECISÃO: Adiada em virtude de pedido de vista formulado pelo Dr. Helimar Pinto.
VOTO-VISTA
Da análise do dispositivo supra, tem-se que nas três primeiras hipóteses (dar,
oferecer e prometer) ocorre o crime de corrupção ativa, ou seja, aquela praticada por candidato
(ou de alguém por ele) para com o eleitor, enquanto nas duas últimas (solicitar ou receber),
verifica-se a corrupção passiva, cometida pelo eleitor para com o candidato ou seus cabos
eleitorais.
De qualquer modo, trata-se de tipo penal eleitoral misto alternativo, de forma que a
ocorrência de crime de corrupção será verificada quando da prática de qualquer um dos verbos
que compõem o dispositivo supratranscrito. Além disso, dado a sua natureza formal, para que
ocorra sua consumação, basta a oferta (independente de aceitação), a promessa (independente de
cumprimento), ou a solicitação (ainda que não seja atendido), de modo que a entrega concreta,
efetiva, e real da coisa, bem ou produto, ou mesmo a transferência de sua propriedade, posse ou
detenção, configura mero esgotamento da ação delituosa.
Além disso, para a configuração do crime previsto no art. 299, do Código
Eleitoral, exige-se a comprovação de dolo específico, ou seja, exige-se que reste comprovada a
intenção do agente em obter o voto ou, ainda, em conseguir ou prometer abstenção, como
propósito único da ação.
Nesse sentido é a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral:
1
GOMES. Jairo José. Crimes e Processo Penal Eleitorais. São Paulo: Atlas. 2015. Pg. 3.
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caracteriza o tipo do art. 299 em relação a cada um dos eleitores
identificados. 5. Há concurso formal impróprio, ou imperfeito, quando
o candidato, em conduta única, promete bem ou vantagem em troca do
voto de dois ou mais eleitores determinados, agindo com desígnios
autônomos (Cód. Penal, art. 70, segunda parte). Recurso especial
desprovido. (TSE - REspe: 1226697 MG, Relator: Min. HENRIQUE
NEVES DA SILVA, Data de Julgamento: 03/09/2014, Data de
Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 183, Data
30/09/2014, Página 487/488)”
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ACOMPANHARAM O VOTO DO EMINENTE RELATOR:-
O Sr. Juiz de Direito Aldary Nunes Júnior e
O Sr. Juiz Federal Marcus Vinícius Figueiredo de Oliveira Costa.
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DECISÃO: À unanimidade de votos, em REJEITAR AS PRELIMINARES SUSCITADAS, para
ainda, quanto ao mérito, por igual votação, DAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do
voto do eminente Relator.