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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

INTRODUÇÃO AOS PROFETAS

A - DEFINIÇÃO E SURGIMENTO DA PROFECIA

QUEM ERAM OS PROFETAS? “Havendo Deus, outrora, falado, muitas vezes e de muitas
maneiras, aos pais, pelos profetas, nestes últimos dias nos falou pelo Filho.” Hb 1.1-2. Para
muitos, os profetas são personagens desconhecidos, negligenciados. O mundo dos profetas não
é tão diferente do nosso. No AT, um profeta era alguém chamado por Deus para cumprir uma
tarefa ou várias tarefas, especialmente a de entregar uma mensagem Dele. A grande
característica da mensagem profética eram as palavras: “Assim diz o Senhor” 1. Homem piedoso
– relacionamento íntimo com Deus. 2. Homem de Deus – Dt. 33.1; II Rs 4.9. 3. Um orador a quem
foi confiada uma missão. Ex. 7.1. 4. Instrumento da comunicação divina. Hb. 1.1-2. 5. Vidente e
profeta se tornam termos sinônimos. I Sm 9.9
São considerados proféticos não somente os textos assim chamados pela divisão cristã
das Escrituras, mas também aqueles considerados pelo cânon judaico, que divide em duas partes
a seção dos profetas: Profetas Anteriores, que compreendem os livros de Josué, Juízes, I e II
Samuel e I e II Reis e Profetas Posteriores, que compreendem os livros posteriores aos Livros
Sapienciais na divisão cristã das Escrituras – Isaías, Jeremias (Lamentações de Baruc), Ezequiel,
Daniel, Oséias, Joel, Amós, Abdias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuque, Sofonias, Ageu, Zacarias
e Malaquias.
A melhor indicação para uma compreensão adequada do termo provém, no entanto, da
análise da palavra em sua etimologia hebraica, qual seja, nâbhî, que significa ‘aquele que anuncia
ou aquele que proclama a mensagem de outrem’, ou ainda ‘chamado, encarregado’,
implicando a situação oficial da pessoa que traz o título de porta-voz escolhido por Deus para
apresentar sua vontade em Seu nome. Sendo assim, o profeta seria um ‘mensageiro de Javé’.
Essa definição pode ser ratificada a partir do testemunho vocacional de Isaías, de
Jeremias e ainda de Ezequiel. Vejamos:

“Depois disto ouvi a voz do Senhor, que dizia: A quem enviarei, e quem irá por nós? Então disse eu:
Eis-me aqui, envia-me a mim. Disse, pois, ele: Vai, e dizes a este povo...” Isaías 6:8-9a
“Mas o Senhor me respondeu: Não digas: Eu sou um menino; porque a todos a quem eu te enviar,
irás; e tudo quanto te mandar, dirás”. Jeremias 1:7
“E disse-me ele: Filho do homem, eu te envio aos filhos de Israel (...). Eu te envio a eles, e lhes dirás:
Assim diz o Senhor Deus (...). Mas tu lhes dirás as minhas palavras, quer ouçam quer deixem de ouvir
(...)”. Ezequiel 2.3a, 4b, 7a.

VARIEDADE E UNIDADE DOS PROFETAS. O AT mostra que a maneira como os profetas


trabalharam foi diversificada. 1. Alguns profetas trabalharam como indivíduos. Independentes,
isolados. I Rs 19.10,14. 2. Outros profetas se reuniram em “escolas de profetas” II Rs 2.3-5.
3. Às vezes o profeta se fundamentava em sonhos ou visões. Jr 23.28-32
4. Profetas da corte. (relação profeta/rei) Atitudes, experiências de acordo com as circunstâncias.
5. Profetas do Templo. (Ex. Hb; Na; Joel) Apesar dessa variedade, os profetas eram cônscios que
faziam parte de uma longa tradição. Às vezes a música era usada pra ajudar no seu trabalho. I
Sm 10.5-6; II Rs 3.15

AS CARACTERÍSTICAS DOS PROFETAS. A iniciativa da chamada para o ofício de profeta vinha de


Deus. O objetivo da chamada era levá-lo à presença de Deus. Em outras palavras, o profeta

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apresentava-se perante os homens na qualidade de um homem que se apresentara perante


Deus. (I Rs 17.1;18.15)
1. O profeta recebia uma chamada específica.
a. Moisés – Ex 3.1-4. b. Isaías – Is 6.1-10. c. Jeremias – Jr 1.4-19. d. Ezequiel – Ez 1-3.
e. Oséias – Os 1.2. f. Amós – Am 7.14-15
2. O profeta tinha perfeita consciência da história. Os profetas concordam que Deus é o Deus da
história e está presente nos acontecimentos do dia a dia.
3. O profeta tinha uma preocupação ética e social. (Dt. 24.19-22; Am 2.6-8;5.11. Denunciavam as
injustiças e violências cometidas contra o povo.
4. O profeta tinha que aconselhar e, muitas vezes, confrontar reis. (Natã, II Sm 7.1-7; Isaías II Rs
19-1-7; Eliseu II Rs 5.11-14)
5. O profeta combinava na pregação tanto proclamação como predição. Falavam por meio de
advertências e encorajamentos concernentes ao presente e do futuro. Is 2.5; 30.6-9
6. O profeta, às vezes, usava símbolos na entrega da sua mensagem. Jeremias e a botija de
oleiro (Jr 19.1); Ezequiel e o cerco (Ez 4.1-8)
7. O profeta representava o povo perante Deus. (Ex 18.19; I Rs 13.6) às vezes era instruído a não
exercer essa função. (Jr 7.16; 11.14)
8. O profeta era primariamente um homem da Palavra de Deus. (Is 40.8)

FUNÇÃO DOS PROFETAS:

PERÍODO FUNÇÃO PÚBLICO MENSAGEM EXEMPLOS


Direção nacional; Moisés e
PRÉ- Líder - porta voz Povo manutenção de justiça; Débora
MONÁRQUICO superintendente espiritual. TRANSIÇÃO
Samuel

Rei e Conselho militar; Natã, Elias,


PRÉ-CLÁSSICO Líder - porta-voz corte Pronunciamento Eliseu, Micaías
de benção e castigo.

TRANSIÇÃO:
Norte – Jonas
Porta-voz – Repreensão quanto às condições Sul - Isaías
CLÁSSICO comentarista Povo sociais; advertência sobre o cativeiro,
social/espiritual destruição, exílio e promessa de Profetas
eventual restauração. Apelo à justiça escritores; um
e ao arrependimento. exemplo é
Jeremias

B - PERSPECTIVAS E DESAFIOS NA LEITURA DOS PROFETAS

Um dos maiores desafios na leitura e aplicação da voz profética para os dias de hoje
consiste em uma transposição/contextualização de suas mensagens. Aquele que lê o texto de
forma simples nem sempre se apercebe que isso não é possível através de uma aplicação direta
da palavra dos profetas, e cai, não raras vezes, em interpretações contrárias ao sentido original,
alcançado pela análise da conjuntura religiosa, social, política e econômica em que se encontrava
o mesmo.
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Será mesmo que o conhecimento de tais esferas da realidade (religião, sociedade, política
e economia) nos ajuda a compreender melhor o significado da mensagem profética? Em que
aspectos exercem influência? É o que queremos destacar.

B.1 - Contexto Religioso

O contexto religioso no qual estão inseridos os profetas pode ser dividido em duas partes:
o Politeísmo das nações vizinhas e o Monoteísmo Javista amparado na Lei.

B.1.1 - Relação com o Politeísmo Pagão


Israel sempre esteve em contato com a cultura dos povos vizinhos, e em momentos de
imperialismo, também, teve contato com a cultura religiosa de povos mais distantes, como
assírica, babilônica e persa. Destacamos três aspectos da religiosidade estrangeira que servirá
para aclarar nossa leitura dos profetas, a saber, a dimensão mágica, a explicação para o
problema do mal e a dimensão política do paganismo.
Enquanto a Lei havia estabelecido que a relação de Israel para com Deus deveria se dar
através da obediência à Lei (Aliança no Sinai), sobretudo àquelas normas de fraternidade,
cuidado com os oprimidos, fracos, pobres, estrangeiros, viúvas, desamparados da terra – em
outras palavras, a vida ética, justa e solidária -, para as religiões estrangeiras, a relação com suas
divindades se dava simplesmente pelos sacrifícios e rituais. Não havia a necessidade da
solidariedade e do exercício da justiça. Em sendo assim, os fracos da terra não possuíam amparo
na religiosidade estrangeira. Essa não lhes servia senão para alienar suas consciências da
necessidade da justiça nas relações sociais. É o de que nos assegura o profeta Jeremias quando
denuncia o culto a Aserá: acreditavam que as divindades Aserá e Baal abençoariam a Terra se tão
somente executassem os ritos e fórmulas exigidas pela religiosidade pagã (Jr 44:18ss).
Em segundo lugar, importa destacar as respostas produzidas por boa parte da
religiosidade mesopotâmica, quanto ao problema do mal, do sofrimento e da dor. É uma das
questões centrais da religião – Por que sofremos? Por que existe a dor? O que fazer para ser
salvo do sofrimento? Tais questões, no Javismo, receberam como resposta uma idéia que precisa
ser bem entendida. Quando Javé afirma que o sofrimento é resultado do descumprimento de
sua Lei, não significa puramente que Ele pune arbitrariamente os transgressores. Significa antes
que a felicidade só pode ser alcançada por uma sociedade justa e solidária que, por sua vez, só
pode ser alcançada pelo cumprimento da Lei de Javé. A consequência do descumprimento dessa
Lei seria a repetição dos regimes mesopotâmicos, de opressão, injustiça social e abandono dos
necessitados da Terra.
Por outro lado, a resposta desenvolvida pela religiosidade estrangeira para explicar o
problema do mal estava em que suas divindades viviam em inimizade com o povo, em
detrimento de transgressões rituais. A fome, nos profetas, era o resultado da má divisão dos
frutos da Terra, e sua superação deveria se dar, não com sacrifícios, mas com o arrependimento
dos opressores e a organização social do povo contra as injustiças. Já no paganismo, pensava se
resolver simplesmente com rituais.
Em terceiro lugar, havia o problema da relação entre religião e política. Enquanto no
Javismo os líderes deveriam ser servos de Javé e de sua Lei, devendo promover a justiça e a
solidariedade social, no paganismo, os governantes eram vistos como se fossem ‘deuses’ ou
‘representantes divinos’, devendo ser obedecidos de forma absoluta, sob pena de morte. Essa
estrutura dava ao rei, uma posição extremamente cômoda, permitindo-lhe expressar seu
absolutismo, tirania ou caprichos, com o apoio da religião, como nos assegura John Bright, em
sua análise acerca da monarquia mesopotâmica: “O rei era considerado como um

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ser divino ou semidivino”, responsável pela ordem na Terra. 1


Por essa razão, reis como Salomão, Acabe e Manassés incentivaram tanto o paganismo.
Essa é também uma das razões pelas quais sempre houve uma forte tensão entre os profetas de
Javé e os sacerdotes do paganismo, como os de Baal, Astarote e outros. O Javismo sempre
representou uma ameaça à liberdade tirânica do rei de fazer o que bem entendesse!

B.1.2 - Relação com o Javismo Falso


O problema enfrentado pelos profetas, no que toca à religião, não se limitava aos cultos
pagãos das nações vizinhas. Como a estrutura religiosa era uma das maiores fontes de
justificação e domínio por parte da monarquia, foi freqüente a manipulação que os reis
exerceram sobre a própria religião javista, ensinada no Templo. É o que nos asseguram os
profetas Isaías e Jeremias, que denunciam a religiosidade praticada como sendo falsa, mesmo
sob a estrutura javistas. Jeremias afirma que o Templo acabara por se transformar em uma ‘casa
de salteadores’ (7:17), isto é, o lugar onde se organizavam e praticavam os crimes dentro de
Jerusalém. Isso equivaleria a dizer que os ‘criminosos’ se valiam da própria estrutura ideológica
da religião para praticar a injustiça. Como isso era feito? Através de duas formas: elaboração de
uma teologia oficial e controle real sobre a religião.

O culto oficial era o servo da teologia nacional. Sua função era, mediante sacrifícios e oferendas e
pela reafirmação ritual das promessas, assegurar o bem-estar da nação. Certa paganização
interna era inevitável, embora se mantivesse um javismo normativo: o culto do Estado tornou-se,
como nas religiões pagãs em geral, o sustentáculo espiritual e a defesa da ordem existente 2

Quanto ao controle real sobre a religião, verifica-se na arbitrariedade em instituir e


destituir os que ministravam no templo, tendo lugar ali apenas quem se comprometia com os
interesses do rei. Isso fica muito claro na atitude de Jeroboão em criar uma nova religiosidade,
sob a roupagem javista, a fim de impedir que as dez tribos do norte voltassem à Jerusalém: ele
‘cria deuses’, institui sacerdotes e elabora doutrinas (I Reis 12:28-33). Em outras palavras, não
somente Jeroboão como também diversos reis em Israel criaram e recriaram a religião, sob
moldes que atendessem a seus interesses. A conseqüência é um javismo dócil, que não se
preocupa mais com a Lei. Absolutiza a estrutura religiosa e se esquece dos princípios libertadores
de Javé.
OS FALSOS PROFETAS. Deuteronômio 18:15-22 é um trecho importante para nosso
estudo de profecia em Israel. 1. Nem todos que afirmavam falar em nome de Deus eram
reconhecidos no AT como profetas legítimos. Jr 23.9-40; Mq 2.6-11. 2. profecia verdadeira era
distinguida de más práticas como adivinhação, feitiçaria, etc. Dt 18.10-12
3. Quando um profeta “falar em nome do Senhor, e a palavra dele se não cumprir nem suceder,
como profetizou, esta é a palavra que o Senhor não disse” (Dt 18.22; Jr 28.9)
4. A prova de um verdadeiro profeta não são seus milagres, mas sim a sua vida de santidade e a
sua palavra que está de acordo com a revelação das Escrituras Sagradas (Mt 7.21-23)

C – CONTEXTO ECONÔMICO, SOCIAL E POLÍTICO.

O Contexto Econômico, Social e Político Israelita nos fornece uma importante imagem
para melhor interpretação dos profetas. Israel, a princípio, nasceu como uma sociedade tribal,

1
Brigth, John. História de Israel. Pg. 277.
2
Bright, John. História de Israel. Pg. 350.

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que passou a possuir a terra. A pretensão da Lei era a de que houvesse uma sociedade
igualitária, sem concentração extrema de rendas ou de terras, onde todos pudessem viver sem
humilhação ou exploração. Cada família deveria possuir um pedaço de terra, não podendo
vender para outra família, senão pelo espaço de uma geração. As dívidas deveriam ser
perdoadas a cada 7 anos ou a cada 50 anos, por ocasião do Ano do Jubileu. A organização social
deveria obedecer às orientações da Lei. Não existiria um líder central, com poderes absolutos.
No início havia juizes que julgavam as causas e conflitos presentes entre o povo, a partir da Lei.
A nova sociedade que se criou fundamentava-se na solidariedade das relações de
parentesco: a família ampliada, de estrutura patriarcal, a chamada ‘casa do pai’ era a unidade
fundamental. Compreendendo até cinco gerações, era essa família economicamente autônoma,
governada pelo patriarca, líder masculino mais velho do grupo.
Esse projeto foi substituído assim que a Monarquia entrou em cena. Mesmo advertidos
pelo profeta Samuel (I Samuel 10), o povo elegeu um rei. Seguindo as tradições mesopotâmicas,
os reis de Israel, de Judá, exerceram domínio absoluto sobre o povo, desrespeitando a Lei,
manipulando a religião e oprimindo o povo. A Coroa mantinha um bom relacionamento com as
famílias ricas da Terra e com o exército, que a defendia militarmente, a custo das contribuições
do povo da Terra.
Sendo assim, a desigualdade social era crescente, aliada à opressão e violência que se
fazia aos mais fracos da Terra, seja através da imposição de trabalhos forçados, de impostos
elevados ou do confisco das terras. Veja o que nos diz Isaías:

“Ai dos que ajuntam casa a casa, e herdade a herdade, até se tornarem os únicos
moradores no meio dela”. (Isaías 5.8).

Nesse texto, o profeta está condenando a prática do latifundismo, uma vez que essa, para
se estabelecer, desterrava sob diversos métodos os verdadeiros donos da terra, tornando-os
apenas trabalhadores diaristas para o dono da terra que um dia lhes pertenceu. Essa prática era
exercida tanto pelo rei quanto pelos poderosos de Israel, uma vez que a própria monarquia havia
relativizado o valor da Lei.
Temos, portanto, uma sociedade extremamente desigual, criada e gestada pela
Monarquia, com o apoio do exército e da religião. O monarca e sua família de um lado, junto
com os ricos da terra, o exército, os sacerdotes e profetas falsos, que apoiavam suas condutas, e
por outro lado, o povo oprimido da Terra, a maioria absoluta, que não possuía recursos para se
defender do rei. Só lhes cabia obedecer e sofrer.
Uma leitura atenta dos profetas nos mostrará que a grande tensão presente na literatura
profética não estará entre os pagãos e os javistas, mas entre os opressores e os oprimidos, os
sacerdotes falsos, sejam javistas ou pagãos, e os profetas verdadeiros que cobravam não a
prática de sacrifícios, mas a vivência da justiça e da solidariedade, o cuidado dos oprimidos,
dos fracos, dos pobres, dos órfãos, das viúvas, etc. A infidelidade a Deus, mais do que a troca de
religião, está em não cumprir o projeto de Javé, que é o da criação de uma sociedade
justa e libertadora.

D - O CATIVEIRO BABILÔNICO

Terceiro contexto temático importantíssimo para compreensão da mensagem profética é


o que trata acerca dos cativeiros ou exílios. O exílio, sobretudo o babilônico, traz consigo diversos
problemas de ordens físicas, econômica, política e religiosa. Desenvolvem-se grandes
transformações teológicas, a partir das crises geradas pelo exílio. Os profetas bíblicos estão

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divididos, a partir desse grande acontecimento na história de Israel: há os que profetizaram


antes do exílio, os que profetizaram durante o exílio e os que o fizeram depois.
Cada mensagem foi influenciada por seu contexto e trazem em si semelhanças e
diversidades. Uma das obras mais representativas que temos em língua portuguesa acerca do
exílio é a de Ralph W. Klein, ‘Israel no Exílio – uma interpretação teológica’ 3, da qual se derivam
essas anotações acerca do tema.
Pode-se dizer que o exílio sofrido por Judá, na Babilônia, tenha se estendido desde o
início do século VI a.C., quando os exércitos babilônicos conquistaram Judá, até o ano de 539,
quando se deu a queda da Babilônia e os judeus puderam voltar para suas casas. Tudo isso
desencadeou diversos conflitos teológicos, de grande estatura. O primeiro deles se refere a
problemas teológicos: como pode o Templo de Javé ser destruído, se era o lugar de sua morada
(Ez. 43:7, I Re 8:13)? Será que existiria uma divindade maior do que Javé, capaz de lhe derrotar e
arruinar a sua casa? Em segundo lugar estava o problema ocasionado pelo fim da dinastia
davídica. Em 2 Samuel 7, os judeus tinham de Javé uma promessa de reinado eterno à família de
Davi. Qual o significado dessa situação em relação à fidelidade de Deus? Em terceiro lugar,
estava a questão da terra. Como pode estar nas mãos de estrangeiros a terra que Deus deu a
Israel como herança? Por fim, como entender a dizimação dos sacerdotes de Javé? Quem iria
promover os sacrifícios, mediadores da relação humana com Deus?
Resumindo, restara a Israel apenas ruínas de todos os seus símbolos mediadores da sua
relação com Javé. O que esperar, a partir de agora, dessa relação? Haverá esperança para Judá
de que Deus volte a reatar a relação com seu povo? Ou teria Javé abandonado para sempre a
Israel? Merece atenção o destaque dado por Ralph W. Klein a alguns grupos especiais: um grupo
foi levado a considerar se não haviam errado na história de Israel, em perseguir tão ferozmente
as religiões não judaicas. Em Jeremias 44:18, temos um exemplo disso, quando o povo aventa a
idéia de que o sofrimento estava se dando exatamente por terem abandonado as divindades
mesopotâmicas. Próximo a esse comportamento, configurando um desvio mais profundo, estava
a atitude daqueles que adotaram novas divindades, imaginando serem mais poderosas do que
Javé. Encontra-se, ainda, como reação ao exílio, grupos que passaram a acusar a Javé de injustiça
e inimizade: “Javé comporta-se como inimigo, mobilizando suas armas de guerra contra o seu
próprio povo” (Lamentações 2:4-5). Por fim, ainda estavam aqueles que consideravam Javé como
injusto, por lhes atribuir culpa de pecados cometidos por gerações anteriores. Ora, a maior parte
dos pecados que levou Judá ao exílio foram pecados cometidos por aqueles que já morreram, e
não por quem está no exílio. Para os exiliados, era como se por causa das uvas verdes que os pais
comiam, os dentes dos filhos apodreciam. Asseverou-se, portanto, a falta de sentido em punir os
filhos pelas culpas dos pais. Ezequiel desenvolve brilhantemente esse tema em 18:2ss.
Das respostas produzidas nesse período, merecem destaque as seguintes: a) houve grupo
que defendeu a idéia de que a solução estava em um avivamento do culto (ritualismo); b) outros
enxergaram nas súplicas a Javé, para que esse cumpra ainda as suas promessas, a solução; c)
outro grupo defendeu a idéia de que a solução para o exílio estava na admissão, confissão e
arrependimento de suas culpas; d) grupo com especial destaque ainda pode ser visto naqueles
que procuraram interpretar a função do sofrimento imposto a Judá. Uns , também, defenderam
que o caminho para influenciar Javé a agir em prol de seu povo era exteriorizar sinais de tristezas
profundas diante de Deus. Outros defenderam o poder remissor do sofrimento e, por isso
mesmo, procuravam na dor sua redenção. Ainda houve quem acreditasse que o sofrimento do
exílio imposto aos judeus só revelava ainda mais a grandeza de Deus.

3
São Paulo: Edições Paulinas, 1990. Págs. 11-18.

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Era necessária uma resposta acerca de como resolver o problema do exílio. Os profetas
desenvolveram suas análises e respostas que nem sempre foram satisfatórias ao povo. Eram
constantemente barrados ou perseguidos devido ao teor de suas mensagens. Alguns profetas
manifestam pouca esperança para o futuro de Israel (Lamentações, Jeremias, História
Deuteronomística), enquanto outros, apregoaram visões acerca de como Deus haveria de trazer
um novo mundo a essa realidade (Ezequiel, Dêutero-isaias e Documento Sacerdotal). 4 No
entanto, suas vozes continuam ecoando em nossos dias, com extrema atualidade.

CRONOLOGIA DOS PROFETAS:

PARA ISRAEL PARA JUDÁ PARA NAÇÕES


ESTRANGEIRAS
ERA ASSÍRIA Amós c. 760; Isaías c. 740-700; Jonas c. 770
Oséias c. 760-730 Miquéias c. 737-690
ERA BABILÔNICA Habacuque c. 630;
Sofonias c. 627;
Jeremias c. 627-580; Naum c. 650
Daniel c. 605-530;
Ezequiel c. 593-570
ERA PERSA Ageu c.520;
Zacarias c. 520-518; Obadias c. 500
Joel c. 500;
Malaquias c. 433

E - OS EFEITOS DA PREGAÇÃO PROFÉTICA

A pregação profética antes, durante e depois do exílio cumpriu muitas funções e teve
diversos efeitos. O biblista e historiador John Bright, no entanto, elenca três efeitos que não
devem ser desprezados.

Os efeitos da pregação profética, embora em sua maior parte intangíveis e difíceis de avaliar,
foram profundos. Particularmente, a pregação profética forneceu uma explicação para a
humilhação da nação pelos assírios que permitia à teologia nacional ajustar-se à crise. Deu um
impulso ao movimento de reforma em Judá, que produziu frutos algumas gerações mais
tarde. Deu à esperança futura de Israel uma forma clássica e durável, afetando desse modo a
história, tanto de Israel como do mundo, através dos séculos futuros. 5

E.1 - Os profetas e a teologia oficial

Com o exílio assírio e babilônico, a teologia oficial, que defendia que as promessas que
Deus havia feito a Israel e à dinastia davídica, eram eternas e incondicionadas, sofreram uma
grande crise. Como explicar o exílio? Deus havia abandonado Israel? Por que um descendente de
Davi não estava no trono, como rezava a profecia? Existia uma fé cega na idéia de que Deus se
relacionava com Israel de forma mecânica, simplesmente cultual.

4
Klein, Ralph W. ‘Israel no Exílio – uma interpretação teológica’. Pg. 17.
5
Bright, John. História de Israel. Pg. 356.

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Bastava o culto. A vida ética não era necessária. Sendo assim, estranharam o exílio, que
trouxe consigo a destruição das tribos do Norte e o exílio para o Sul. O templo fora destruído e a
terra abandonada. A teologia oficial entrou, pois, em crise, pois não possuía conteúdo para
explicar tais tragédias.
Nesse sentido, os profetas colaboraram para que a fé de Israel não perecesse, e fizeram
isso, reinterpretando as promessas e reconfigurando a teologia. Defenderam que Deus não havia
abandonado a Israel, antes o contrário. Estavam no exílio por não terem sido fiéis à Aliança, mas
poderiam gozar novamente dos favores de Deus a partir do arrependimento e da mudança de
comportamento. O exílio não era definitivo e o povo iria voltar para a terra, em um contexto
mais rico e promissor. Elaboraram uma teologia que permitiu a continuidade da fé em Javé.

E.2 - Movimentos de reforma

Ezequias iniciou uma reforma religiosa em Judá, com certeza, amparado pela teologia
elaborada e anunciada pelos profetas. Jeremias e Miquéias insistiram em que a reforma não
abrangesse apenas os aspectos cúlticos da fé, mas, sobretudo, a dimensão ética, que envolvia
novas relações socioeconômicas. Era necessária a prática da justiça, da misericórdia e da
solidariedade, mais do que os sacrifícios.

E.3 - Os profetas e a esperança nacional

O exílio fragilizou a fé de Israel em Deus. Parecia que Deus os havia abandonado. Os


profetas, ao identificarem as causas do exílio, e, ao redimensionarem as promessas de Deus
(unindo as promessas à necessidade de obediência), apontaram uma nova realidade a ser criada
por Deus, de um Israel novo e obediente, em que o exílio ocupava o lugar de intervalo. Nasceu,
portanto, a esperança nova de que, a partir da conversão, uma nova realidade se instauraria.

Embora notados por poucos durante a sua vida, estes profetas talvez tenham feito mais do que
todos os outros para salvar Israel da extinção. Demolindo impiedosamente a falsa esperança,
anunciando a calamidade que caía sobre a nação como o julgamento justo de Javé soberano,
eles deram uma explicação à tragédia antecipadamente, em termos de religião, evitando assim
que ela destruísse sua religião 6

F - CONSIDERAÇÕES

Os profetas viveram época de profundas tensões políticas, sociais e, sobretudo, religiosas.


Partiram de um ideal de sociedade justa para a denúncia da sociedade existente em seus dias,
apregoando o convite a que a nação voltasse aos valores do javismo e à aliança original,
embasada, sobretudo, na solidariedade. Através de suas pregações, escritos e tradições,
perenizaram, nas mais diversas situações, a mensagem da fidelidade a Deus, expressa não em
cultos vazios e ritos artificiais, mas na luta do ser humano contra a exploração daqueles a quem
Javé anunciou serem seu povo: os pobres. Quando não conseguiram alcançar a conversão de
todo o povo, quando foram perseguidos pelo teor de suas mensagens, ou quando sofreram
juntos os eventos catastróficos que se sucederam a Israel e a Jerusalém, ainda assim,
mantiveram a fé em que Deus era Senhor da História e traria a inauguração de

6
Bright, John. História de Israel. Pg. 406.

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um novo mundo, onde o Príncipe da Paz reinaria. São alguns dos temas que estudaremos nas
próximas lições.

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AMÓS E OSÉIAS

A - O PROFETA AMÓS – O DIA DO LEÃO

Amós é profeta do Século VIII A.C., e é considerado o primeiro profeta escritor. Já nesse
período a profecia israelita está sedimentada com grandes nomes, como Samuel, Aias, Nata,
Elias, Eliseu, entre outros. 7 Provavelmente, o que marcará esta nova característica dos profetas
seja a difusão e o desenvolvimento da escrita. Alguns intérpretes entendem que, mais que isto,
foi o fato desse profeta ter provocado um impacto mais profundo, através de sua mensagem, de
tal forma que ela se conservou escrita, dando lugar à prática de registrar a mensagem de futuros
profetas.
Schökel & Diaz entendem que esse impacto se deu diante de uma nova postura adotada
pelos profetas que sucedem Amós: até então, os profetas acreditavam que era possível reformar
o sistema monárquico, mas a partir de agora, surge a idéia de que a corrupção está
generalizada e só uma nova ordem de coisas poderia por as coisas no lugar. 8
De fato, essa é uma das mensagens de Amós, quando diz que tendo a presa ouvido o rugir do
leão, sabe que é tarde demais para escapar. Segundo o título, Amós era natural de Tecoa, um
povoado próximo 20 km ao Sul de Jerusalém. Am 1.1 nos informa que estava entre pastores, e
em 7.14b-15a, temos sua profissão mais explicita: “Eu sou vaqueiro e um cultivador de
sicômoros. (...) Mas Javé tirou-me de junto do rebanho”. Não há precisão se era um pequeno
proprietário ou um simples assalariado.
Atuou na época de Jeroboão II (782/753 a.C.), que reinou em Israel, e de Ozias (767-739
a.C.), rei de Judá. Anthony Ceresko defende que em Tecoa as tradições e as práticas da época da
confederação tribal ainda estavam vívidas e eram praticadas na medida em que a monarquia não
tinha conseguido apagá-las. Fato que deu a Amós uma vida cheia da força dos princípios ali
vividos, fortalecendo-o na sua pregação contra o desgaste verificado nas práticas de muitos
nobres e comerciantes ricos de Israel.
Conforme Schökel & Diaz, o cultivo de sicômoros não poderia se dar em Tecoa, mas
apenas próximo do Mar Morto, o que nos revela que Amos estava em constantes viagens, dando
a ele um conhecimento sobre os acontecimentos envolvendo os países circunvizinhos e acerca
do contexto social, político e religioso de Israel. Sua profecia revela um homem inteligente,
preciso e perspicaz.

7
Cf. Schökel & Diaz . Profetas II. Pg. 981.
8
Schökel & Diaz. Profetas II. Pg. 981.

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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

O texto não nos revela quanto tempo profetizou em Israel, mas nos demonstra uma dura
profecia. Por essa razão, o sacerdote Amasias, estupefato com o ataque de Amós ao rei Jeroboão
e com o anúncio do exílio em sua profecia, trabalha para que Amós deixe de profetizar e provoca
sua expulsão de Israel (7.10-13). Após esse evento, não temos mais dados acerca de Amós,
dando lugar a alguns comentadores acreditar em que possa ter concluído sua atividade profética,
enquanto outros acreditam que deu continuidade a ela no
Reino do Sul.

A.1 - MENSAGEM DE AMÓS

Contexto Econômico, Social, Político e Religioso Como nos adverte Anthony R. Ceresko, o
contexto socioeconômico em que Amós profetizava é uma chave de leitura indispensável para o
entendimento de sua profecia. O livro nos revela um autor profundamente indignado com o
sofrimento e opressão que via ao seu redor, e mais ainda, por perceber que a injustiça
provocadora desse sofrimento já havia condenado a sociedade israelita à ruína.
Há uma situação de injustiça social provocada por dois fatores: o conforto nas relações
internacionais (a Assíria não representa ameaça neste instante) e o ritmo do comércio, que está
a pleno vapor, criando expansão e prosperidade semelhantes aos desfrutados nos tempos do rei
Salomão.
No entanto, a forma pela qual a prosperidade se acumula é usurpadora e opressora.
Seguindo o modelo da Assíria, que usurpava do povo as riquezas para aquisição de seus luxos e
esbanjos, os nobres e ricos comerciantes de Israel se esqueceram da Aliança, que previa o direito
a todos das condições básicas de vida, através de diversas leis igualitárias.
Agora, o valor a ser considerado era o do lucro, do luxo e da avareza. Um dos fundamentos da
sociedade israelita nos tempos da confederação tribal era a posse de terra por parte de cada
grande família, capaz de prover as necessidades básicas de vida de seus membros.

Assim falou Javé: Pelos três crimes de Israel, pelos quatro não o revogarei! Porque vendem o justo
por prata, e o indigente por um par de sandálias. Eles esmagam sobre o pó da terra a cabeça dos
fracos e tornam torto o caminho dos pobres. Amós 2:6-7

Nesse oráculo, nota-se a atitude dos ricos opressores de Israel. Como é comum em terras
que dependem da chuva, mas essa nem sempre venha, uma colheita poderia ir mal. Os
pequenos proprietários ficam devendo, acumulam dívidas a partir de empréstimos. O que a
confederação tribal visualizava, na Lei, era que os empréstimos fossem feitos a juros baixos,
possibilitando a reorganização da vida dos que estão em dificuldades. Ao invés disto, nesse
contexto, vemos usurpadores, cobrando juros exorbitantes, que, de acordo com Ceresko,
chegavam a 50% ou mais. “Quando os devedores não podiam pagar, tomavam sua terra ou
desalojavam os ocupantes ou reduzia-os a estado próximo ao de escravidão como meeiros”.
Não bastasse isso, ferindo as tradições da Lei, ainda extorquiam os pobres da terra. É o
que nos diz o oráculo em Amós 8.4-6:

Ouvi isto, vós que esmagais o indigente e quereis eliminar os pobres da terra. Vós que dizeis:
‘Quando passará a lua nova, para que possamos vender o grão, e o sábado, para que possamos
vender o trigo, para diminuirmos o efá, aumentarmos o siclo e falsificarmos as balanças
enganadoras, para comprarmos o fraco com prata e o indigente por um par de sandálias e para
vendermos o resto do trigo?

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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

O texto denuncia a expectativa dos ricos nas possibilidades de extorsão dos fracos da
terra, em aumentar desmedidamente os preços dos produtos e adquirir lucros exorbitantes em
uma situação de necessidades. A especulação é a palavra de ordem.
Outra prática denunciada por Amós é a inversão da prioridade dos itens que deveriam ser
produzidos em Israel. Uma vez que, cada vez mais, as terras estavam trocando de donos,
configurando grandes latifúndios, o que era para produzir os itens necessários à existência do
povo, estava agora se convertendo em lugar de produção de artigos de luxo, que por sua vez
eram exportados e trocados em outros artigos mais luxuosos, produzidos no exterior. É o que
nos revela Amós 6:4-7, 3:15 e 4:1):
Eles estão deitados em leitos de marfim, estendidos em seus divãs, comem cordeiros do
rebanho e novilhos do curral. Improvisam ao som da harpa. Como Davi, inventam para si
instrumentos de música. Bebem crateras de vinho e se ungem com o melhor óleo. (...) Por isso,
agora eles serão exilados à frente dos deportados, e terminará a orgia daqueles que estão
estendidos.
Crescendo na denúncia contra essa sociedade corrupta, está ainda a denúncia de que
todo o sistema jurídico está corrompido, e o que deveria ser lugar de decidir a justiça está sendo
um lugar de extorsão, injustiça e corrupção. Juízes vendem sentenças, silenciam os justos e
colaboram com a opressão:

Vocês estão transformando o direito em amargura e atirando a justiça ao chão (...). Vocês odeiam
aquele que defende a justiça no tribunal e detestam aquele que fala a verdade. Vocês oprimem o
pobre e o forçam a dar-lhes o trigo. (...) vocês oprimem o justo, recebem suborno e impedem
que se faça justiça ao pobre nos tribunais. Amós 5:7, 10-11, 12b.

Em ordem crescente, Amós observa ainda um dos elementos mais trágicos que está
atraindo o julgamento de Deus: a falsa religião. J. A. Motyer assim assinala o estado dessa:

Quando Amós volveu os olhos para a religião, viu que ela tinha muita religiosidade, que adorava
o que era tradicional, mas que tinha se livrado da revelação divina. Os centros religiosos viviam
aparentemente lotados (4:4; 5:5, 21-23; 8:3, 10), os sacrifícios eram escrupulosamente
oferecidos, as partes musicais do culto eram entusiasticamente apresentadas. Mas não havia
nenhuma base além da mente humana. Permanecia ainda o falso culto de Jeroboão que, quase
dois séculos antes, resolveu estabelecer uma alternativa ao de Jerusalém (I Re 22:25ss).

A mensagem de Amós, no que toca a essas relações é clara: a profissão e a prática


religiosa são inúteis se não forem seguidas de marcas claras:

Eu odeio e desprezo as suas festas religiosas; não suporto as suas assembléias solenes e ofertas
de cereal, isso não me agradará. Mesmo que me tragam as melhores ofertas de comunhão, não
darei a menor atenção a elas. Afastem de mim o som das suas canções e a música das suas liras.
Em vez disso, corra a retidão como um rio, a justiça como um ribeiro perene! Amós 5:21-24

Digno de nota está o conflito enfrentado por Amós com o Sacerdote Amazias. Esse
denuncia Amós à corte real e o acusa de conspiração dizendo que o povo não suportará as
palavras de Amós (7:10-17). Enquanto Amós profetiza a ruína de Israel, devido às suas
transgressões, Amasias está confiado de que nenhuma das desgraças preditas por Amós
aconteceria, por ser a cidade de Betel o lugar onde estava estabelecido o santuário do rei e o
templo do reino. Destaca-se, nesse embate, um dos temas dos profetas que irá se repetir em
diversos outros livros: os falsos profetas incentivam o povo a continuar nas transgressões,
através da mensagem de que nada poderia acontecer às cidades do povo escolhido.

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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

Amós tem conhecimento da tradição sacerdotal, sabe que a função do sacerdote era de
oficio cultual. O sacerdote tem um contato estreito com Deus, e pelo trato constante com o
Santo. Tem a obrigação de velar pela pureza e santidade de Deus, dos objetos sagrados e decidir
segundo a sua consciência o que é puro ou impuro, sagrado ou profano. É neste contexto que a
palavra de Juízo é endereçada ao povo.

Um exemplo de palavra de juízo:


Subdivisão Amós 4.1-3
I. Introdução...................................................... Verso 1 – “Escutai esta palavra ó vacas gordas da
montanha de Samaria”....

Acusação...................................................... “Vós que fraudais os indigentes e esmagais os


pobres”...
II. Motivação: Desenvolvimento da acusação.... Vós, que dizeis aos vossos senhores “traze-me de
beber”
III. Fórmula da mensagem................................ Verso 2. “Jura o Senhor Deus por sua santidade”
IV. Anuncio Intervenção de Deus................. Verso 2. “Eis que vem dias sobre vós.....”
Do
Juízo e suas consequências ................. Verso 2. “Em que vos levarão”.....

Von Rad assim explicita essa dimensão da mensagem de Amós: “Em suas visões, Amós
somente compreendeu que Javé não queria mais perdoar” 9. Da mesma forma, Airton José da
Silva finaliza sua análise da mensagem de Amós:

Podemos terminar este roteiro lembrando que o tema central de Amós é o fim de
Israel, porque os ricos oprimem os pobres, os poderosos deturpam a justiça e o
direito, subornam os juízes nos tribunais e cometem muitas outras barbaridades.
E, ainda por cima, vão aos santuários e ali oferecem custosos sacrifícios e
participam de grandes celebrações, ocultando a opressão que se comete
sistematicamente. 10

A imagem do leão que tem na boca a sua presa (Amós 3.4-5) revela o teor
desesperançador de Amós. Quando o leão ruge, já não pode mais a presa escapar. Quando o
pássaro cai na armadilha, não há mais escape. Israel cometeu pecados tão graves que já não
pode mais escapar do mal que está a chegar, que seria o cativeiro assírio. Não há relatos acerca
da morte de Amós. No entanto, suas palavras continuaram ecoando durante séculos, com vigor.

B - O PROFETA OSÉIAS

O profeta Oséias, mais novo que Amós, foi seu contemporâneo. No entanto, a situação
política havia se transformado. Já agora a Assíria representava um perigo iminente para Israel.
Fora isto, há uma instabilidade no País, marcada pelas constantes sucessões de reis (em um
período de 23 anos, seis diferentes reis estiveram sobre o trono, sendo que quatro deles foram
assassinados). O texto do profeta Oséias parece demonstrar que ele profetizou nos últimos dias
da ruína do Reino do Norte, e que talvez tenha sobrevivido à sua queda, em 722 A.C. 11

9
Von Rad, Gerard. Teologia do Antigo Testamento. Pg. 128.
10
Silva, Airton José da. A Voz Necessária. Pg. 62.
11
Cf. Ceresko, Anthony R. Introdução ao Antigo Testamento numa Perspectiva Libertadora. Pg. 196.

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B.1 - Mensagem de Oséias

Semelhantemente a Amós, Oséias pregou contra as injustiças, embora traga em sua


mensagem um tom de esperança que está ausente de Amós. Oséias apregoa em sua mensagem
a destruição da ordem vigente, mas prevê uma nova ordem a surgir, abrindo, assim, espaço em
sua mensagem para o apelo ao arrependimento e conversão.
Em primeiro lugar, Oséias condena gravemente a idolatria, que se manifesta em sua
visão, sob duas formas, a saber: a cultual e a política. A idolatria cultual se expressava no culto a
Baal, divindade mesopotâmica, caracterizado a partir dos ritos da fertilidade.

Eles pedem conselhos a um ídolo de madeira, e de um pedaço de pau recebem


resposta. Um espírito de prostituição os leva a desviar-se; eles são infiéis ao seu
Deus. Sacrificam no alto dos montes e queimam incenso nas colinas, debaixo de
um carvalho, de um estoraque ou de um terebinto, onde a sombra é agradável.
Por isso suas filhas se prostituem e as suas noras adulteram. Oséias 4:12-13

Outra expressão de idolatria se dava ainda na adoração do bezerro de ouro, que Jeroboão
I instalou a fim de que o povo do Reino do Norte não fosse a Jerusalém adorar no Templo,
trazendo o perigo da união das tribos novamente.
Em continuidade, Oséias afirma serem os sacerdotes e profetas bases dos eixos responsáveis
pelo mal que se estende na sociedade: “... recusam-se eles a ser mediadores do autêntico
conhecimento de Javé, tornando-se meros executores de ritos vazios, e mais: ritos dos cultos da
fertilidade. Cúmplices seus são também os profetas...”. Por causa deles, o culto se torna falso,
que acaba por legitimar religiosamente as injustiças. Com a estrutura teológica que prevê nos
sacrifícios o lugar para resolver ‘os problemas com Deus’, a religião acaba por se transformar em
ritual vazio, quando esvazia o significado do culto, transformando-o em mero meio de se
alcançar objetivos.

“Sim, que ninguém abra um processo e que ninguém julgue! Pois, na realidade, o
meu processo é contra ti, ó sacerdote! Tropeçarás de dia, e contigo tropeçará, de
noite, também o profeta; farei perecer a tua mãe. Meu povo será destruído por
falta de conhecimento. Porque tu rejeitaste o conhecimento, eu te rejeitarei do
meu sacerdócio; por que esqueceste o ensinamento de teu Deus, eu também me
esquecerei de teus filhos” Oséias 4:4-6

Essa também é a denúncia de Isaías (1:10-20): a de que o culto estava servindo para
aliviar mentes, mas não para transformá-las. Era necessário ir além: para uma religião que
acolhesse, como Deus acolhe, os necessitados do reino, e desse a eles o refrigério gerado pela
prática da justiça. Assim, Oséias pontua a precedência da vida em relação ao culto, da justiça e
retidão, em relação aos holocaustos e sacrifícios:

Pois eu quero misericórdia, e não o sacrifício, e o conhecimento de Deus, mais do


que os holocaustos. Oséias 6:6
Converte-te a teu Deus; guarda o amor e a justiça, e em teu Deus espera sempre.
Oséias 12:6

Com isso converge a análise de J. L. Sicre, que afirma: “Deus e o próximo estão
estreitamente ligados nas exigências da aliança, um dos temas chave da pregação de Oséias.

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‘Semear a justiça’ e ‘procurar o Senhor’ (10:12) são questões simultâneas e ambas


imprescindíveis”. 12 Essa tônica se repetirá nos profetas. São os ideais comunitários que
alimentaram a federação tribal, do cuidado ao outro, sobretudo dos mais necessitados, como
verdadeira expressão de fidelidade a Javé. A idolatria política se manifestava, por sua vez, na
confiança que Israel depositava no poder de outras nações, para lhes salvar das constantes
ameaças que atravessavam. Buscam cavalos, carros e cavalos, do Egito, da Assíria, e nessas põe
sua confiança. Em Oséias, vemos a denúncia da referida confiança.
Em segundo lugar, Oséias estabelece visão crítica do pecado manifesto em outras
disposições que não a idolatria. Há no texto denúncia da sucessão de pecados, pelos quais contra
Israel se faz a denúncia:

Ouvi a palavra do SENHOR, vós, filhos de Israel, porque o SENHOR tem uma
contenda com os habitantes da terra, porque nela não há verdade, nem amor,
nem conhecimento de Deus. O que só prevalece é perjurar, mentir, matar, furtar
e adulterar, e há arrombamentos e homicídios sobre homicídios. Oséias 4:1-2

Destaca-se, nesse aspecto, a revelação de que a própria estruturação da Monarquia em


Israel foi, em resultado, manifestação da ira de Deus contra Israel.
Você foi destruído, ó Israel, porque está contra mim, contra o seu ajudador. E
agora? Onde está o seu rei que havia de salvá-lo em todas as suas cidades? E os
oficiais que você pediu, dizendo: Dá-me um rei e líderes? Dei-lhe um rei na minha
ira, e o tirei na minha indignação. Oséias 13:9-11

Em 9:15, vemos novamente como Oséias via a instituição da monarquia em Israel:

“Toda a sua malícia se acha em Gilgal, pois ali os aborreci. Por causa da maldade
das suas obras os lançarei fora de minha casa. Não os amarei mais; todos os seus
príncipes são rebeldes”.

O texto está fazendo referência ao episódio em que Israel pede que o profeta Samuel lhe
dê um rei para ir à frente das batalhas. Oséias, nessa perícope, interpreta aquele evento tal qual
o próprio profeta Samuel (I Samuel 8-10) já interpretara: a monarquia não correspondia
aos planos de Javé. A denúncia dos profetas todas se assemelham, tendo em vista as constantes
tensões que existiam entre a manifestação verdadeira do culto a Javé e os projetos da
monarquia, de usurpação, opressão e domínio injusto. “O rei não respeita as leis de Javé, não
respeita os direitos do povo, não respeita as regras do culto. O rei estabelece novas regras, novos
cultos e faz desviar todo o povo para longe de Deus”.
Continuando no desenvolvimento da mensagem de Oséias, merece destaque ainda a
analogia que se constitui a própria história do profeta, em relação à sua esposa, com a história
de Israel e Javé. Os três primeiros capítulos narram o chamado de Deus a Oséias, para que estse
se case com uma prostituta, revelando, também, a conseqüência desse matrimônio. O resultado
é que a relação entre Oséias e sua esposa - que sempre lhe trai, o abandona, acaba como escrava
na feira, é recuperada por Oséias para repetir os mesmos gestos -, acaba por ser usada como
exemplo vivo da relação entre Israel e Javé. Schökel & Diaz apontam as três possibilidades da
ação de Deus perante esse comportamento, proclamada por Oséias (cap. 2):

a) colocar diante dela uma série de obstáculos a fim de que não possa ir-se com
seus amantes e acabe voltando para o marido; b) castigá-la publicamente e com

12
Sicre, J. L. A Justiça Social nos Profetas. Pg. 252.

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dureza; c) perdoá-la por puro amor, fazer nova viagem de recém-casados, novo
presente de casamento, que restaure a intimidade e seja como matrimônio. 13

O resultado, na verdade, das iniciativas divinas, expostas nos primeiros capítulos de


Oséias, são eclipsados pela volta de Israel ao pecado:

Quando mudava a sorte do meu povo, quando eu queria curar a Israel, então
aparecia a culpa de Efraim e as maldades de Samaria. Pois praticam o engano,
ladrões entram nas casas, bandidos roubam nas ruas. Oséias 7:1ss

A continuidade de Israel no pecado é denunciada por Oséias, mas seguida de mensagem


de castigo inevitável – a invasão, ruína, morte e o exílio.

Eles não permanecerão na terra do Senhor; Efraim voltará para o Egito, e na


Assíria comerá comida impura. Oséias 9:3

No entanto, Oséias não silencia com a mensagem do castigo. Inicia nova analogia entre
Israel e Deus para ilustrar quais as razões pela insistência de Deus em relação ao seu povo: a
relação entre ambos, Deus e Israel, é relação fraternal, entre pai e filho. O capítulo 11 nos dará
essas imagens. Deus como pai, ama, chama, ensina a andar, cura, atrai, inclina-se para dar de
comer ao filho. No entanto, o filho Israel afasta-se, não compreende esse amor, age
rebeldemente, busca a Baal, inutilmente. Como desenvolver o restante dessa dinâmica? Vêm o
exílio, e Deus está diante do conflito: volto a perdoar Israel, diante de tantas insistências no erro,
traição e desprezo? Schökel & Diaz sintetizam em uma frase: “E quando a situação é totalmente
desesperada, Deus luta consigo mesmo e é a misericórdia que vence a cólera”.

“Como posso desistir de você, Efraim? Como posso entregá-lo nas mãos de
outros, Israel? Como posso tratá-lo como tratei Adma? Como posso fazer com
você o que fiz com Zeboim? O meu coração está enternecido, despertou-se toda
a minha compaixão. Não executarei a minha ira impetuosa, não o tornarei a
destruir Efraim. Pois sou Deus, e não homem, o Santo no meio de vocês. Não virei
com ira.” Oséias 11:8-9

Junto com esta imagem, vale comparar com a analogia entre Deus e Israel como esposo e
esposa, na insistência divina em conquistar novamente sua amada:

Por isso, cercarei o seu caminho com espinhos e o fecharei com uma barreira,
para que não encontre suas sendas. Perseguirá seus amantes, sem os alcançar,
procurá-los-á, mas não os encontrará. Dirá então: Quero voltar ao meu primeiro
marido, pois eu era outrora mais feliz do que agora. (...) Por isso, eis que vou, eu
mesmo, seduzi-la, conduzi-la ao deserto e falar-lhe ao coração (...) Eu te
desposarei a mim para sempre, eu te desposarei a mim na justiça e no direito, no
amor e na ternura. Eu te desposarei a mim na fidelidade e conhecerás a Javé.
Oséias 2.8,9,16,21-22

Duas observações importantes se fazem a essas imagens da relação entre Deus e Israel. A
primeira, apontada por Schökel & Diaz, e a segunda, por Ceresko.

“A mensagem de Oséias tem algo de desconcertante. A nossa lógica religiosa segue os


seguintes passos: pecado-conversão-perdão. A grande novidade de Oséias, o que o situa em

13
Schökel & Diaz. Profetas II. Pg. 891.

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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

plano diferente e o converte em precursor do NT é o fato de ela inverter a ordem: o perdão


antecede à conversão. Deus perdoa antes de o povo se converter, ainda que ele não se tenha
convertido. (...) Isto não significa que a conversão seja desnecessária. Esta, porém, se produz
como resposta ao amor de Deus, não como condição prévia para o perdão”.

Já Ceresko, intui para o seguinte significado dessas imagens fraternais entre Deus e Israel:

A insistência nas imagens e linguagem que envolvem relações humanas para


expressar a relação de Deus com Israel pode ser um gesto implícito do profeta
para contrabalançar a atitude frenética e egoística de muitos em Israel durante a
confusão e a desorientação daqueles últimos anos da monarquia. 14

Tais imagens fornecem, portanto, um resgate das relações na sociedade israelita, tais
quais propostas pelo período da confederação tribal, onde o que predominava era o cuidado de
um para com o outro, sobretudo dos mais necessitados.

14
Ceresko, Anthony R. Introdução ao Antigo Testamento numa Perspectiva Libertadora. Pg. 197.

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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

O PROFETA ISAÍAS

A - INTRODUÇÃO GERAL

O livro de Isaías é dividido, por razões especiais, em três partes: Proto-Isaías ou Isaías I
(1-39); Dêutero-Isaías ou Isaías II (40-55); Trito-Isaías ou Isaías III (56-66). Trata-se de um livro
denso, que dificilmente seja lido de uma só vez. Existem mudanças, tanto temáticas quanto de
estilo literário. Isso porque o livro foi escrito, não a um só fôlego e tempo, mas em pelo menos
dois momentos distintos, sofrendo ainda acréscimos de autores diferentes.
Schökel & Diaz testemunham que durante muitos séculos pensou-se que Isaías fosse obra
de um só autor, capaz de mudar de estilo literário com domínio completo e ainda prever o futuro
como se nele estivesse. Ainda mais, manifestar evolução teológica na medida em que seu
ministério fosse se desenvolvendo.
No entanto, hoje é opinião majoritária o fato de que na verdade, temos livros distintos, a
partir da divisão estabelecida anteriormente.

Uma leitura dinâmica de Isaías oferece ao leitor o seguinte desenvolvimento:

O livro começa com o profeta Isaías (de Jerusalém), que ministra durante 45 anos. Exerce
seu ministério durante os reinados de Ozias, Joatão, Acaz e Ezequias (767-698). É vocacionado no
ano da morte de Ozias. Durante os 39 primeiros capítulos, faz referência a Ozias, Acaz e Ezequias,
Pecá da Samaria, Resin de Damasco, Sargão da Assíria. Faz referência
aos conflitos entre Judá e Israel como reinos independentes, e ainda fala sobre a queda de Israel.
A Assíria é apresentada como nação imperial. Bruscamente, a partir do capítulo 40, temos
menção de Ciro, rei da Pérsia no século VI. O povo é exortado a sair da Babilônia e a voltar para
Jerusalém, configurando ser contemporâneo do exílio. Isso gera um conflito enorme, dado ao
fato de que Isaías de Jerusalém morreu antes do exílio babilônico ter ocorrido e, ainda, pelo fato
de a extensão profética cobrir um espaço de aproximadamente 200 anos 15. Por fim, a partir do
capítulo 56, voltamos às referências aos problemas gerados no pós-exílio. Por outro lado, a
teologia dessas partes de Isaías denuncia diferenças. Imagens
teológicas apresentam-se de forma autônoma e estancadas nas três partes, de modo que, essa
separação de temas a partir de espaço visível no texto sugere a idéia de que, na verdade, o livro
traz a composição de autores diferentes, de épocas diferentes: Proto-Isaías ou Isaías I (1-39);
Dêutero-Isaías ou Isaías II (40-55); Trito-Isaías ou Isaías III (56-66).
A primeira parte, como assinalada, deve-se ao Isaías de Jerusalém, que iniciou seu
ministério no ano da morte do rei Ozias. Prossegue durante o reinado de Joatão, Acaz e Ezequias,
e deixa uma influência histórica em continuidade, através de um círculo de discípulos ou escola
profética, que preservou seus escritos, fez-lhes acréscimos e ainda reelaborou seus escritos até o
tempo posterior ao exílio. O primeiro Isaías, portanto, é responsável pelos 39 primeiros
capítulos.
Já os capítulos 40-55 são atribuídos a profeta anônimo, que compartilhava da tradição do
Isaías histórico. Vive, no entanto, nos dias do exílio babilônico e endereça aos exilados sua
mensagem de esperança e de libertação, entre os anos de 551-539 A.C. É chamado de Dêutero-
Isaías ou Segundo Isaías.

15
Cf. Ceresko, Anthony. Introdução ao Antigo Testamento numa Perspectiva Libertária. Pg. 200.

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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

Ao Terceiro Isaías é atribuído os onze últimos capítulos do livro (56-66) e não há precisão
se é obra de um só autor ou vários. Sua mensagem caracteriza-se por tratar dos temas tangentes
ao início do período pós-exílico (539 A.C., em diante). É também chamado de Trito-Isaías.

B - ISAÍAS I

Semelhantemente à biografia dos outros profetas, não existem muitos dados acerca de
Isaías. Temos o nome de seu pai, Amós, mas nenhum vestígio de que tenha sido o profeta de
Tecoa. A partir do domínio das tradições de Jerusalém, parece lá ter nascido. Fohrer vê em
alguns dados do livro evidências de que Isaías pertencia à nobreza e que recebeu educação
nobre. 16
Com isso concorda o historiador John Bright: “A julgar pela facilidade com que se
aproximava do rei, ele era de boa família, se é que não era um membro da própria corte”. Foi
vocacionado ainda novo (cap. 6), de onde reflete sua consciência da santidade de Deus, dos
pecados do povo, da necessidade de castigo e a esperança de salvação. Depois de sua vocação,
ocorre seu matrimônio, também com uma profetisa (8:3). Tem desse matrimônio dois filhos, aos
quais dá nomes simbólicos: Sear Jasub (um resto voltará) e Maher Salal Hás Baz (pronto ao
saque, rápido aos despojos).
De seu caráter, ressalta-se sua firmeza contra os poderosos de Jerusalém. Ataca
veemente o poder, desde autoridades, juízes, latifundiários e políticos. Defende
apaixonadamente os oprimidos, os órfãos, as viúvas e o povo explorado pelos governantes e
poderosos. Temos exemplo de sua coragem e espírito destemido em 1:10-20, onde chama os
governantes de Judá de ‘príncipes de Sodoma e de Gomorra’. Declara inválidos os sacrifícios
oferecidos a Deus, quando desacompanhados da vida de justiça, defende os necessitados e
associa a esse comportamento a verdadeira santidade devida a Deus.

Lavem-se! Limpem-se! Removam suas más obras para longe da minha vista!
Parem de fazer o mal, aprendam a fazer o bem! Busquem a justiça, acabem com
a opressão. Lutem pelos direitos do órfão, defendam a causa da viúva. Isaías
1:16-17

Fohrer relembra uma antiga lenda apócrifa, que afirma Isaías ter morrido como mártir,
sob o rei seguinte, Manassés.

B.1 - Mensagem de Isaías I

Schökel & Diaz assinalam a dificuldade de sintetizar brevemente a mensagem de Isaías.


No entanto, sugerem dois eixos principais a partir dos quais o profeta pode ser estudado: o
problema social, durante os primeiros anos de sua atividade e a política a partir do ano de 734.
No que toca às denúncias que faz de cunho social, existe um estreito nexo entre Isaías e Amós: a
crítica à classe dominante pelo luxo e orgulho, pela sua cobiça desmedida e
pelas suas injustiças. Assevera o profeta que não há como relacionar uma vida religiosa com
uma vida de práticas injustas.
Vejam como a cidade fiel se tornou prostituta! Antes, cheia de justiça e habitada pela retidão,
agora está cheia de assassinos! Sua prata tornou-se escória, seu licor ficou aguado. Seus líderes
são rebeldes, amigos de ladrões; todos eles amam o suborno e andam atrás de presentes. Eles
não defendem os direitos do órfão, e não tomam conhecimento da causa da viúva. Isaías 1:21-23

16
Fohrer, Georg. História da Religião de Israel. Pg. 308.

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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

J. L. Sicre testemunha que, de fato, muitos dos denunciados na profecia de Isaías eram
israelitas ricos que, na busca de assegurar o futuro, passaram a acumular campos e casas,
originando um novo fenômeno para a época: o latifundismo. Essa denúncia está explicitada pelo
profeta, em 5:8-9, bem como em Miquéias 2:1-4:

Ai dos que adquirem casas e mais casas, propriedades e mais propriedades, até não haver mais lugar
para ninguém e vocês se tornarem os senhores absolutos da terra! O Senhor dos Exércitos me disse:
“Sem dúvida muitas casas ficarão abandonadas, as casas belas e grandes ficarão sem moradores”.

Já no que toca à sua mensagem política, Isaías dá continuidade às tradições a respeito da


eleição de Davi e de Jerusalém como reinos perpétuos. Não assevera, no entanto, que a dinastia
davídica ou que a cidade de Jerusalém gozam de paz com Deus, de forma incondicional. É
necessário sempre uma vida condizente com o chamado divino a serem reflexos da vontade de
Javé.

Um ramo surgirá do tronco de Jessé, e das suas raízes brotará um renovo. O Espírito do Senhor
repousará sobre ele, o Espírito que dá sabedoria e entendimento, o Espírito que traz conselho e
poder, o Espírito que dá conhecimento e temor do Senhor. E ele inspirará no temor do Senhor.
Não julgará pela aparência, nem decidirá com base no que ouviu; mas com retidão julgará os
necessitados, com justiça tomará decisões em favor dos pobres. Com suas palavras, como se
fossem um cajado, ferirá a terra; com o sopro de sua boca matará os ímpios. A retidão será a
faixa de seu peito, e a fidelidade o seu cinturão. O lobo viverá com o cordeiro, o leopardo se
deitará com o bode, o bezerro, o leão e o novilho gordo pastarão juntos; e uma criança os guiará.
Isaías 11:1-6

Esse texto, com conteúdo utópico, lança esperança de um novo rei que trará justiça e paz
a toda a terra, sobretudo aos oprimidos, pobres e esquecidos da terra. Atribui à descendência de
Davi o nascimento desse novo rei. Isaías se mantém fiel a essa expectativa.

Ceresko, por sua vez, apresenta os seguintes temas para a mensagem de Isaías: 17

Juízo de Deus sobre Israel e Judá – pregações no tocante ao juízo já estabelecido por
Deus, em causa das injustiças sociais, motivadas pela ganância dos que estavam no poder. A
ruína – o cativeiro Assírio e Babilônico já estava decretado.
A s Tradições acerca de Davi e Jerusalém – discursos que retomam as promessas feitas em Davi,
de reino de paz e de prosperidade para o povo de Deus. Exemplos dessas profecias podem ser
encontrados em Isaías 2 e 11, que declaram tanto os deveres de um rei justo, como também
prenunciam um momento em que tal reino utópico se estabeleceria.
O ‘Santo de Israel’ – esse é um dos termos preferidos de Isaías, ao se referir a Deus. Em
sua experiência vocacional (cap. 6), vemos esse termo repetido três vezes, dando mostra de sua
elevação. Isaías ressalta essa santidade e sua implicação imediata: a vida de seus fiéis deve
refletir essa santidade, através da luta por construir uma comunidade embasada na justiça e na
solidariedade.

C - ISAÍAS II

C.1 - O Profeta, Época e Lugar

17
Cf. Ceresko, Anthony. Introdução ao Antigo Testamento numa Perspectiva Libertária. Pg. 202-212.

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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

Acerca da pessoa do escritor desta segunda parte de Isaías, Schökel & Diaz assevera que
quase nada pode ser dito acerca, senão que é extraordinário teólogo e inspirado poeta que
atuou entre os exilados de Babilônia, no final do exílio. Sellin & Fohrer adotam a opinião de que
não existe um autor único para essa parte de Isaías, sendo que a grande porção se trata de
oráculos de diversas fontes, de profetas mais recentes que mantêm um núcleo escatológico
fundamental, com o qual o Segundo Isaías concorda.
Já Anthony Ceresko faz notar que se trata dos discípulos e colaboradores de Isaías, que
formam tradição e escola, e que continuam a propagar a mensagem do profeta muito tempo
depois de sua morte. Adota a teoria de que essa parte de Isaías foi elaborada 150 anos após a
morte do profeta histórico.
Independente de autoria, o contexto é o final do exílio, quando a Babilônia estava prestes
a ruir e Ciro, rei da Pérsia, é aclamado pela profecia como o salvador dos povos oprimidos, de
onde virá a libertação dos judeus deportados e o repatriamento de Jerusalém, acompanhada
pela reconstrução do templo.

C.2 - A Estrutura de Isaías 40-55

Schökel & Diaz alertam para o fato de que não há unanimidade entre os estudiosos de
Isaías II acerca de alguns tópicos: se essa seção é constituída de oráculos independentes, sem
relação entre si, ou se foram organizadas premeditadamente; se o autor é escritor ou é profeta,
no sentido literal, como o foi o Isaías da primeira parte; ainda, se foi ele mesmo quem recopilou
esses oráculos ou foi um grupo de discípulos de Isaías. No entanto, concordam os comentadores
em que Isaías II está dividido em um prólogo (40:1-11); dois blocos centrais (40-48 e 49-55) e um
epílogo (55:6-13).
O primeiro bloco do corpo intermediário trata acerca da libertação da Babilônia e o
retorno à terra prometida. Nessa parte, Ciro é apresentado como libertador de Judá, bem como
são presenciados conflitos contra a idolatria, uma vez que para o profeta, só Javé é o Senhor da
História. No segundo bloco do corpo intermediário está o tema da restauração e glorificação
de Jerusalém, que ora é apresentada como cidade, ora como esposa. Figura também nessa seção
a imagem do ‘Servo do Senhor’.

C.3 - A Mensagem de Isaías II

Anthony Ceresko aponta para três temas centrais na mensagem do Isaías II: consolação e
encorajamento; a redenção criadora e o Servo de Javé.

C.3.1 - Consolação e Encorajamento

A comunidade judaica vive no exílio a situação de desconforto e sofrimento, a mercê de


governantes estrangeiros. Agora, no cenário internacional, com os conflitos entre a Babilônia e a
Pérsia, se vislumbram mudanças que na verdade não evidenciam claramente segurança ou
desproteção maior a essa comunidade. O que esperar dessas mudanças? Como reagir a elas?
Apoiar a Babilônia contra os persas ou vice-versa? Deveriam permanecer neutros?
Nesse clima de instabilidade é que é proclamada a profecia do Segundo Isaías, trazendo
expectativas de libertação e salvação, mensagem de consolo e encorajamento, e não de temor:

Consolem, consolem o meu povo, diz o Deus de vocês. Encorajem a Jerusalém e


anunciem que ela já cumpriu o trabalho que lhe foi imposto, pagou por sua

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iniquidade, e recebeu da mão do Senhor em dobro por todos os seus pecados.


Isaías 40:1-2

Surge aqui a esperança de volta à pátria, de reconstrução de tudo o que se perdera, de


restauração das comunidades em Judá. Isaías Segundo se vale das imagens do êxodo para fazer
crescer a esperança de um segundo êxodo, a proporcionar a libertação paralela à primeira que
ocorrera do Egito a Canaã:

Assim diz o Senhor, aquele que fez um caminho pelo mar, uma vereda pelas
águas violentas, que fez saírem juntos os carros e os cavalos, o exército e seus
reforços, e eles jazem ali, para nunca mais se levantarem, exterminados,
apagados como um pavio. Esqueçam o que se foi; não vivam no passado. Vejam,
estou fazendo uma coisa nova ela já está surgindo! Vocês não a reconhecem? Até
no deserto vou abrir um caminho e riachos no ermo. Isaías 43:16-19

Em outras passagens, continuará o profeta a fazer uso das imagens do primeiro êxodo,
para fazer crescer essa esperança de volta à pátria (veja Isaías 41, 42 e 49).

C.3.2 - Redenção Criadora

Ceresko assinala a importância, em Isaías Segundo, da relação que faz entre a redenção e
a criação. Deus é mais do que o Senhor da história. É o criador do mundo. Nesse sentido, o novo
êxodo é comparado, na verdade, a uma Nova Criação. A libertação dos judeus, do exílio
babilônico é apresentada como o resultado de um embate entre Deus e as forças cósmicas do
caos. Na mitologia babilônica, havia uma grande serpente aquática que ameaçava a criação.
Aqui, Deus é aquele que vence a grande serpente do mar, provocadora da desordem, e
que,
nessa vitória, dá origem à uma nova realidade: a da libertação do povo de Deus.

Desperta! Desperta! Veste de força, o teu braço, ó Senhor; acorda, como em dias
passados, como em gerações de outrora. Não foste tu que despedaçaste o
Monstro dos Mares, que traspassaste aquela serpente aquática? Não foste tu que
secaste o mar, as águas do grande abismo, que fizeste uma estrada nas
profundezas do mar para que os redimidos pudessem atravessar? Os resgatados
do Senhor voltarão. Entrarão em Sião com cânticos; alegria eterna coroará sua
cabeça. Júbilo e alegria se apossarão deles, tristeza e suspiro deles fugirão. Isaías
51:9-11

C.3.3 - O Servo de Javé

Um dos temas mais debatidos no Segundo Isaías é acerca do Servo do Senhor. Sua
referência se encontra em 42:1-4; 49:1-6; 50:4-9 e 52:13 a 53:12. Possivelmente a mais famosa
referência seja a do Servo Sofredor, retomada pelo NT em relação a Jesus e seu sofrimento
vicário.
O tema do Servo do Senhor sofreu e sofre amplas discussões, sendo que a mais
importante seja acerca da literalidade e historicidade de sua identidade: trata-se de
personalidade histórica ou figura representativa de Israel como um todo? Se foi personalidade
histórica, a quem se refere?
Ceresko identifica, nos estudos recentes, tendência a identificar no Servo do Senhor uma
figura histórica concreta, associada à experiência histórica real dos judeus. Em 45:1-4, por

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exemplo, temos apresentada a figura clara de Ciro, eleito, mesmo sem o saber, como libertador
de Israel.

Que diz acerca de Ciro: Ele é meu pastor, e realizará tudo o que me agrada; ele dirá acerca de
Jerusalém: ‘Seja reconstruída’, e do templo: ‘Sejam lançados os seus alicerces’. ‘Assim diz o Senhor
ao seu ungido: a Ciro, cuja mão direita eu seguro com firmeza para subjugar as nações diante dele
e arrancar a armadura de seus reis, para abrir portas diante dele, de modo que as portas não
estejam trancadas: Eu irei adiante de você e aplainarei montes; derrubarei portas de bronze e
romperei trancas de ferro. Darei a vocês os tesouros das trevas, riquezas armazenadas em locais
secretos, para que você saiba que eu sou o Senhor, o Deus de Israel, que o convoca pelo nome. Por
amor de meu servo Jacó, de meu escolhido Israel, eu o convoco pelo nome e lhe concedo um título
de honra, embora você não me reconheça. Isaías 44:28 a 45:4

No entanto, fica claro que essa relação só pode ser feita a essa referência (a de libertador
de Judá). Outras teorias associam o Servo do Senhor ao próprio autor de Isaías II (sobretudo a
imagem do Servo Sofredor, de 52 e 53), e ainda outras, a todo o Israel sofredor.
Sellin & Fohrer vê na teoria que associa o Servo ao próprio Segundo Isaías a mais correta,
embora quando interpreta 52 a 53, entendem que se trata de texto posterior, acerca das
atividades já encerradas desse profeta. A imagem do Servo Sofredor, que trará remissão
dos pecados em sofrendo no lugar dos pecadores, será retomada no NT, vinculada a Jesus,
como aquele que ‘levou o pecado de todos’.
Certamente ele tomou sobre si as nossas enfermidades e sobre si levou as nossas doenças;
contudo nós o consideramos castigado por Deus, por Deus atingido e afligido. Mas ele foi
transpassado por causa das nossas transgressões, foi esmagado por causa de nossas iniqüidades; o
castigo que nos trouxe a paz estava sobre ele, e pelas suas feridas fomos curados. Todos nós, tal
qual ovelhas, nos desviamos, cada um de nós se voltou para o seu próprio caminho; e o Senhor fez
cair sobre ele a iniqüidade de todos nós. Isaías 53:4-6

C.4 - ESCATOLOGIA DA SALVAÇÃO E A UNICIDADE TEOLÓGICA DE DEUS

Sellin & Fohrer, por sua vez, apontam dois destaques teológicos para essa parte de Isaías: a
escatologia da salvação e a unicidade teológica de Deus. 18

C.4.1 - Escatologia da Salvação

Outrora ouviu-se a mensagem que atribuía ao exílio o significado de castigo pelos


pecados de Judá. Mas, já os antigos profetas pronunciaram a redenção do povo eleito, do castigo
e do exílio. Isaías II aponta agora para os detalhes de uma nova criação, a transformação de
circunstâncias históricas até então desfavoráveis ao povo de Deus. Faz uso, para tanto, de
termos como ‘outrora’, ‘o passado’, por um lado, e por outro, ‘o novo’, ‘tempo da complacência’
e ‘dia da salvação’. (veja Isaías 43).
A exemplo de Oséias, faz uso de ricas imagens para descrever as relações entre Deus e
Israel: Jerusalém é vista como mulher e mãe (caps. 49 e 54); os israelitas são vistos como ‘filhos
de Javé’ (45) que Deus resgata para reintegrar à família.

C.4.2 - A Unicidade Teológica de Deus

Sellin & Fohrer ainda destacam da mensagem do Segundo Isaías a compreensão de um


Monoteísmo teórico, além do prático. Até então os judeus se relacionaram com Deus,

18
Introdução ao Antigo Testamento II. Pg. 574.

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unicamente, mas ao lado da crença na existência em outros deuses. Trata-se de um monoteísmo


prático. A partir de agora, desenvolve-se a idéia do monoteísmo teológico, teórico, que nega
claramente a existência de outros deuses. Isso embasará ainda mais a esperança escatológica.

Assim se expressam Sellin & Fohrer:

Todos os acontecimentos e fenômenos da natureza estão ligados,


consequentemente, a um único Deus, por toda a eternidade. Desse modo, o
Dêutero-Isaías liga, de um só lance, a história com os últimos tempos e com Deus.
A garantia do futuro reside no fato de que Deus está agindo em tudo isso.
Precisamente porque ele criou o mundo e a humanidade, e desde então dirige
sua história, é que continuará a fazê-lo no momento em que tiver início o período
final da história. 19
D - ISAÍAS III

D.1 – Autoria

Tradicionalmente, acreditava-se, como já dito, que todo o Isaías fosse obra de um só


autor. Posteriormente, houve divisão entre o Primeiro Isaías (1-39) e o Segundo Isaías (40-66). A
partir de 1892, estabelece-se a teoria de que os capítulos 56 a 66 de Isaías representam obra de
autor independente dos dois primeiros, constituindo, assim, a teoria do Terceiro Isaías.
Atualmente, existem quatro teorias acerca da autoria desses últimos capítulos. A
primeira, defendendo que provém do mesmo autor do Segundo Isaías. A segunda teoria atribui-
os aos discípulos do Segundo Isaías. A terceira teoria apresenta o texto como obra de um profeta
do século V A.C., distante do Segundo Isaías. Por fim, cresce o número de estudiosos que negam
que esses últimos capítulos estejam unidos por um mesmo autor, podendo ser de várias penas.

D.2 - Temas do Terceiro Isaías

Sellin & Fohrer identificam no Terceiro Isaías dois grupos de temas, característicos de
Jerusalém e arredores, após o exílio:

Primeiramente trata-se de todos os tipos de questões controvertidas na


regulamentação da vida de comunidade, em decorrência das condições
lamentáveis de vida e do confronto com os maus chefes do povo, com as
tendências sincretistas e com a idolatria. Em segundo lugar, aparece a
problemática criada pela expectativa da realização iminente da era escatológica,
considerado como o juízo outrora anunciado, a era da salvação já devia ter
começado ou pelo menos devia estar próxima. 20

Como as expectativas escatológicas não se cumpriram, não somente o Isaías III terá que lidar
com elas, como também diversos outros profetas.

D.3 - Tema de destaque

No capítulo 58, dando continuidade à linha profética que denunciava o ritualismo vazio, o
Isaías III quer recuperar o sentido original do jejum. Praticado como uma atividade desprovida de

19
Introdução ao Antigo Testamento II. Pg. 575.
20
Sellin & Fohrer. Introdução ao Antigo Testamento II. Pg. 583.

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obediência aos preceitos de Javé, sobretudo quanto ao cuidado dos necessitados, não possui
valor algum. No entanto, fica estabelecida a espiritualidade desejada por Deus ao seu povo.

‘Por que jejuamos’, dizem, ‘e não o viste? Por que nos humilhamos, e não
reparaste?’ Contudo, no dia do seu jejum vocês fazem o que é do agrado de
vocês, e exploram os seus empregados. Seu jejum termina em discussão e rixa, e
em brigas de socos brutais. Vocês não podem jejuar como fazem hoje e esperar
que a sua voz seja ouvida no alto. Será esse o jejum que escolhi, que apenas um
dia o homem se humilhe, incline a cabeça como o junco e se deite sobre pano de
saco e cinzas? É isso que vocês chamam de jejum, um dia aceitável ao Senhor? O
jejum que desejo não é este: soltar as correntes da injustiça, desatar as cordas do
jugo, pôr em liberdade os oprimidos e romper todo o jugo? Não é partilhar sua
comida com o faminto, abrigar o pobre desamparado, vestir o nu que você
encontrou, e não recusar ajuda ao próximo? Aí sim, a sua luz irromperá como a
alvorada, e prontamente surgirá a sua cura; a sua retidão irá adiante de você, e a
glória do Senhor estará na sua retaguarda. 58:3-8

Há denúncias teológicas de que a espiritualidade profética tem desaparecido de nossos


dias. No entanto, não há alternativa com relação a isso, levando em conta que o chamado de
Deus aos seres humanos não é o de simplesmente o cultuarem com ritos, mas com a obediência
de preceitos humanizantes, solidários e transformadores da realidade social que nos cerca.

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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

MIQUÉIAS, SOFONIAS E NAUM

A - O LIVRO DE MIQUÉIAS

A.1 - O Profeta

Para o biblista Airton José da Silva, o profeta Miquéias é contemporâneo de Isaías. Seu
ministério profético se deu durante o período que sucedeu à guerra entre a Síria e Efraim,
durante o governo de Acaz, e, ainda, durante o período de reforma de Ezequias, até a vitória
da Assíria sobre Judá. 21
Já Schökel & Diaz atestam que a maioria dos estudiosos entende que Miquéias é livro de
diversos autores anônimos, mas se supõe pelo menos, dois autores principais: um, que nasceu
em Morasti Gat, aldeia de Judá, possivelmente um camponês, por volta dos anos 740-698 A.C e o
outro, de origem do Norte, que profetizou em Israel por volta dos anos 730-320 A.C.
Acerca desse profeta e do seu contemporâneo Isaías, John Bright assevera que “... foram
certamente de maior significação histórica do que alguns reis de Judá – ou da Assíria”.
De Miquéias somente, Sellin & Fohrer testemunham que a impressão obtida pela leitura e
análise desta obra, com certeza foi sentida muito intensamente pelos seus contemporâneos
egerações posteriores:

[...] ele aparece como uma figura cheia de força e dotada de fisionomia própria e
marcante. Do fato de ter visto pessoalmente os abusos sociais contra os quais ele
se volta, particularmente a subversão do antigo direito do solo, praticada a
começar por Jerusalém, em favor dos grandes proprietários de terra, é que se
explica o tom severo de suas acusações e a acrimônia de suas ameaças,
incomuns no seio da profecia, e que brotam da sua compaixão pelo sofrimento
dos pequenos camponeses, como também do seu desprezo pelos profetas
cultuais que falavam sempre ao gosto dos grandes, com o que garantiam o seu
sustento. 22

Já para o biblista Jorge Pixley, Miquéias é um profeta semelhante a um revolucionário


típico do século XIX:

Miquéias é o mais radicalmente popular de todos os profetas da Bíblia. Ele


entende que Javé não poderá efetuar a libertação do povo sem uma ação
organizada do mesmo povo. O povo deverá entender que o templo de Jerusalém,
os reis davídicos e os senhores das cidades provinciais são seus opressores 23

Com certeza, Miquéias foi profeta com grande repercussão. Tanto que quanto à sua
influência, atesta-nos o biblista Milton Schwantes, que “cem anos depois da vida e profecia de
Miquéias as pessoas ainda se lembravam dele de viva voz”. Afirma isso tendo em conta
a defesa dada a Jeremias, quando esse estava sob ameaça por profetizar contra o templo e
Jerusalém, tendo o exemplo de Miquéias como sustentáculo da mesma profecia (Jeremias 26:17-
19).

21
Cf. Silva, Airton José da. A Voz Necessária. Pg. 108.
22
Sellin & Fohrer. Introdução ao Antigo Testamento. Pg. 675.
23
Pixley, Jorge. A História de Israel a partir dos Pobres. Pg. 61.

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A.2 - Contexto e Conteúdo

O contexto que envolve Miquéias, independente da autoria judaica ou israelita, é o


mesmo. Existem mudanças acontecendo no cenário internacional tanto no Norte quanto no Sul.
Em Israel, temos a influência da Assíria, na pessoa de Teglat-Falasar III, que impõe pesados
tributos. Esses serão pagos até 743, quando o rei Oséias deixará de pagá-los, trazendo, como
consequência, a queda de Samaria, em 722, a deportação do povo, em 720, ocasionando o
desaparecimento do Reino do Norte, Israel. Já no Sul, em Judá, o conflito se iniciou com uma
aliança entre Judá e Teglat-Falasar III, que lhe acarretará a obrigação de pagar impostos. Em 705,
o rei Ezequias, motivado pela reforma religiosa que promoveu, iniciará uma revolta contra a
Assíria, que renderá a Judá uma grande derrota e sua invasão pela Assíria, em 701.
Acrescidos desses dados políticos do contexto de Miquéias, pode ser vista, ainda, a
injustiça social estabelecida difusamente. No capítulo 1, vemos a profecia dirigida tanto ao Norte
quanto ao Sul. De ambas é que se diz que ‘sua chaga é incurável’ (1:9).
No capítulo 2, temos um ‘ai’ (ameaça e denúncia de que o mal, com certeza, virá) contra
os ricos que estão se apoderando dos bens dos pobres e oprimindo-os!

Ai daqueles que planejam maldade, dos que tramam o mal em suas camas!
Quando alvorece, eles o executam, porque isso eles podem fazer. Cobiçam
terrenos e se apoderam deles; cobiçam casas e as tomam. Fazem violência ao
homem e à sua família; a ele e a seus herdeiros. (...) Mas ultimamente, como
inimigos vocês atacam o meu povo. Além da túnica, arrancam a capa daqueles
que passam confiantes, como quem volta da guerra. Vocês tiram as mulheres do
meu povo de seus lares agradáveis. De seus filhos vocês removem a minha
dignidade para sempre. Miquéias 2:1-2, 8-9

O capítulo 3 revela a extensão da corrupção: tudo está corrompido. A opressão, a


maldade e as injustiças estão sendo justificadas por aqueles que deveriam lutar contra o mal – as
autoridades civis, jurídicas e até religiosas.
Os governantes agem de forma corrupta e arrancam do povo tudo o que podem. Os
juízes julgam desonestamente e em favor dos que podem pagar. A justiça acaba por ser
pervertida e a riqueza de Jerusalém é construída a partir do sangue das vítimas entre o povo. A
religião age justificando as maldades dos ricos. Os sacerdotes deturpam o ensino e os profetas
trazem segurança de que a injustiça dos ricos não lhes ocasionará mal algum, porque Jerusalém é
a cidade onde Deus mora, não importando o que os seus habitantes fazem. Contra eles o
profeta também proferirá suas sentenças:
“Ouçam, vocês que são chefes de Jacó, governantes da nação de Israel. Vocês deveriam
conhecer a justiça! Mas odeiam o bem e amam o mal; arrancam a pele do meu povo e a carne
dos seus ossos. Aqueles que comem a carne do meu povo arrancam a sua pele, despedaçam os
seus ossos e os cortam como se fosse carne para a panela, um dia clamarão ao Senhor, mas ele
não lhes responderá.” Naquele tempo ele esconderá deles o rosto por causa do mal que eles têm
feito. Miquéias 3:1-4

Ouçam isto, vocês que são chefes da descendência de Jacó, governantes da nação
de Israel, que detestam a justiça e pervertem o que é justo; que constroem Sião
com derramamento de sangue, e Jerusalém com impiedade. Seus líderes julgam
sob suborno, seus sacerdotes ensinam visando lucro, e seus profetas advinham
em troca de prata. E ainda se apóiam no Senhor, dizendo: “O Senhor está no
meio de nós. Nenhuma desgraça nos acontecerá”. Miquéias 3:9-11

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O retrato total das maldades referidas ainda se repetirão em 6:10-12 e 7:2-4. A


consequência de toda essa maldade será o que foi impensável para os falsos profetas: a
destruição de Jerusalém: “Por isso, por causa de vocês, Sião será arada como um campo,
Jerusalém se tornará um monte de entulho”. 3:12

A.3 - Teologia da Opressão

J. L. Sicre atenta nos textos sobre à denúncia da ‘Teologia da Opressão’. Todas as mazelas
cometidas pela elite de Judá e Israel vêm sendo amparadas pela religião, sacerdotes e profetas,
fato esse que não é incomum na história humana.

Em todas as épocas e culturas procurou o homem argumentos religiosos para


roubar, saquear, escravizar e matar. Se não para justificá-lo expressamente, ao
menos para tranquilizar a consciência. É indiferente que se baseie numa ordem
do deus Marduc ou na tese de que os escravos não têm nada. Geralmente, atrás
de todo ato de opressão há ideologia que a apoia. E, nos povos ou grupos
religiosos, teologia da opressão. Israel não escapou desse perigo. As autoridades
e os ricos necessitavam de base de ordem moral que justificasse sua conduta e
acalmasse os escrúpulos. Isso os falsos profetas proporcionaram, não com
argumentos teóricos, mas aduzindo oráculos divinos e visões. 24

A.4 - Culto versus Vida Autêntica

Contrariamente à mensagem dos falsos profetas, Miquéias insistirá em que o caminho


para se chegar a Deus não é do mero ritualismo cúltico, mas o da vida devotada à prática da
justiça e da solidariedade, estendida, sobretudo aos mais necessitados:

Com que eu deveria comparecer diante do Senhor e curvar-me perante o Deus


exaltado? Deveria oferecer holocaustos e bezerros de um ano? Ficaria o Senhor
satisfeito com milhares de carneiros, com dez mil ribeiros de azeite? Devo oferecer
o meu filho mais velho por causa da minha transgressão, o fruto do meu corpo por
causa do pecado que eu cometi? Ele mostrou a você, ó homem, o que é bom e o
que o Senhor exige: pratique a justiça, ame a fidelidade e ande humildemente com
o seu Deus. Miquéias 6:6-8

Essa é uma das tônicas dos profetas: o culto, com seus sacrifícios e ofertas ao Senhor, por
si só, não garante a relação com Javé. Somente a vida prática, expressa principalmente através
da justiça, da misericórdia e compaixão pelos seres humanos é que poderá sustentar a referida
relação.
Por isso mesmo, o profeta termina seu livro com oráculos de salvação e certeza de
perdão, quando o caminho for restaurado, quando a justiça for praticada, quando o povo se
voltar para a vivência da vontade de Javé.

Quem é comparável a ti, ó Deus, que perdoas a transgressão do remanescente da


sua herança? Tu, que não permaneces irado para sempre, mas tens prazer em
mostrar amor, de novo terás compaixão de nós; pisarás as nossas maldades e
atirarás todos os nossos pecados nas profundezas do mar. Mostrarás fidelidade a
Jacó, e bondade a Abraão, conforme prometeste sob juramento aos nossos
antepassados, na antiguidade. Miquéias7:18-20

24
Sicre, J. L. A Justiça Social nos Profetas. Pg. 386.

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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

B - O Livro de Sofonias

De Sofonias temos já em sua introdução (1:1) uma genealogia que remonta ao seu
tataravô: “Palavra do Senhor que veio a Sofonias, filho de Cusi, filho de Gedalias, filho de
Amarias, filho de Ezequias, nos dias de Josias, filho de Amom, rei de Judá”.
Os críticos especulam acerca da razão para tantos nomes, alegando alguns que pode ser
demonstração de que Sofonias seja de ascendência real (do rei Ezequias, no caso). É a opinião de
Robert Wilson, por exemplo, que defende que a genealogia apresentada por Sofonias só poderia
querer fundar no passado pretensões de indivíduos a poder, propriedade ou posição.
No entanto, tal acúmulo de nomes pode se dar, também, como defendem Sicre & Diaz,
por uma tentativa de livrá-lo de suspeita de ascendência estrangeira, uma vez que o nome de
seu pai sugeria isso. Mais certo parece ser o fato de Sofonias ser judaíta e de ter profetizado
durante o reinado do rei Josias (639-598).
A análise do contexto do reinado de Josias contribui para melhor apreensão da profecia
de Sofonias. Desde a submissão de Israel à Assíria, no ano de 734, o povo vinha sofrendo a
invasão dos costumes e práticas estrangeiras e pagãs. Ezequias tentou extirpar tal influência, mas
não conseguiu ao todo. O longo período de governo de Manasses fizera perder as conquistas de
Ezequias nesse sentido e, ainda, deturpou muito mais as práticas religiosas de Israel. Manassés,
que reinou durante 55 anos, reconstruiu os lugares para os cultos idólatras, estabeleceu altares a
Baal, cultuou as divindades do céu, praticou adivinhação e magia, derramou ‘muitíssimo sangue
inocente’ e ainda fez passar o próprio filho pelo fogo, como sacrifício (Cf. II Rs 21). Elenca-se,
como visto, as práticas de idolatria, assassinato, violência e injustiça.
O contexto judaico que envolve o rei Josias está repleto de necessidades de reforma,
tanto políticas quanto sociais e religiosas. Josias irá promover tais reformas. Estudiosos do
período e do texto, no entanto, apontam Sofonias como o incentivador dessas mudanças nos
primeiros anos do reinado de Josias. Provavelmente, morre antes do final desse reinado, uma
vez que é a profetisa Hulda a ser consultada, quando o Livro da Lei é encontrado (cf. II Re 22).

B.1 - A Mensagem de Sofonias

De acordo com Schökel & Diaz, Sofonias não é um texto de debates teológicos, mas
prático e aplicável a situações concretas de seu contexto. Entre suas notas, denuncia as várias
transgressões pelas quais viria o castigo: a idolatria cultual, as injustiças, o materialismo, a
indiferença religiosa, os abusos das autoridades e as ofensas cometidas pelos estrangeiros contra
o povo de Deus.

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Essas transgressões, nota Sofonias, esgotaram a paciência divina pelo que o castigo já é
certo. No entanto, a exemplo de Isaías que prevê o recomeço a partir dos remanescentes (Isa
6.13). No capítulo 3.12-13, Sofonias declara:

Mas deixarei no meio de ti um povo humilde e pobre, que confia no nome do


Senhor. O remanescente de Israel não cometerá injustiças; Eles não mentirão,
nem se achará engano em suas bocas. Eles se alimentarão e descansarão, sem
que ninguém os amedronte.

B.2 – Comentários

Em 1:4-5, Sofonias anuncia a ira divina contra a idolatria e o paganismo que subsiste em
Judá. Temos na expressão ‘... e exterminarei deste lugar o resto de Baal...’ a possibilidade de que
a reforma de Josias não tenha sido completa, se Sofonias tenha profetizado durante a reforma
de Josias.
Em 1.12, vemos a denúncia, tal qual nos outros profetas que pleitearam contra as
injustiças sociais, contra o conforto dos que agem mal e ainda negam a ação de Deus: ‘... dizem
no seu coração: O Senhor não faz bem nem faz mal’.
Em 3.1-2 e 3:3-5, temos uma severa denúncia, já proclamada por outros profetas, do
caráter de Jerusalém: essa cidade é chamada de ‘cidade opressora’, rebelde e manchada de
sangue, que não aceita o castigo. As manchas a que se refere o profeta são em relação ao
‘sangue inocente’ ao custo do qual a cidade foi construída. Trata-se das injustiças cometidas
contra o povo pobre, pelos príncipes, nobres e ricos comerciantes. Isso fica claro nos próximos
versos (3:3-4), em que novamente há a denúncia do caráter dos líderes políticos, jurídicos e
religiosos, que concorrem conjuntamente para o mal. Os mesmos são comparados a leões e
lobos carniceiros, que usam a religião e o poder político para corromperem a nação e para
extorquirem o povo.
Em 3:12-13, há uma identificação entre os remanescentes a quem é feita a promessa de
salvação aos pobres e humildes da terra. Essa identificação é comum nos textos proféticos, onde
há a manifestação de um cuidado especial de Javé pelos necessitados e oprimidos em Israel.

C - O LIVRO DE NAUM

De Naum, pouca informação existe. Em sua introdução, apresenta-se como elcosita (de
Elcós), cidade não mencionada em nenhum outro lugar no Antigo Testamento, embora alguns
autores a situem próximo a Nínive e outros na Galiléia.
No entanto, as imagens utilizadas pelo profeta para descrever o assalto e a conquista de
Jerusalém, com imagens de pânico, agitação e lamentações, o identificam como profeta judaíta.

C.1 - Data do Livro

De acordo com estudiosos, o livro se situaria entre a queda de Tebas (661 A.C.),
mencionada em 3:8 e a queda de Nínive, ocorrida em 612 A.C. O texto oferece imagens para se
defender da existência, ainda, do jugo assírio, o que localizaria o profeta durante o reinado do rei
Manassés.

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Independente da data, fica claro o caráter da mensagem de Naum, em sua condenação a


Nínive, diferentemente do texto do profeta Jonas e ainda a crítica velada à política da Assíria,
adotada por Manassés.

C.2 - Conteúdo de Naum

O primeiro capítulo exalta a soberania e o poder de Deus, sobretudo em favor dos justos
e juízo sobre os ímpios (1:7-8). Embora possa parecer, dado a paciência divina, que Deus não vela
sobre os seus, contra a nação opressora, tal não é verdade, e o juízo já está a caminho se
estabelecendo como consolo aos oprimidos (1:15).
No segundo capítulo, Naum descreve a destruição de Nínive, a despeito das tentativas de
defender a cidade (2:1-3). A destruição é comparada às águas de um rio, para os quais não
existem comportas para detê-lo (2.6). Haverá cativeiro para os opressores de outrora, e saque
dos bens daqueles que saquearam os tesouros da terra (2:6-13).
No terceiro capítulo, ocorre a justificação do juízo de Deus perante Nínive: a descrição de
sua condição opressora: “Ai da cidade ensangüentada! Ela está toda cheia de mentiras e de
rapina! Da presa não há fim!” (Naum3:1).
Enfatiza-se sua condição desumana quando vendiam povos inteiros, a partir de um
comércio que não respeitava os seres humanos, tampouco suas necessidades básicas:

Tudo isso por causa da multidão dos pecados da bela e encantadora meretriz, da
mestra de feitiçarias, que vende povos por seus deleites, e famílias por suas
feitiçarias. (...) Multiplicastes os teus negociantes mais do que as estrelas do céu
(...). Naum3.4 e 16

Em 3:19, termina o oráculo ressaltando o caráter irreversível do juízo, bem como a


imagem de sua crueldade de outrora, capaz de provocar ânimos naqueles que um dia sofreram
suas violências:

Não há cura para a tua ferida; a tua chaga é fatal. Todos os que ouvem a notícia a
teu respeito batem palmas sobre ti, pois quem não sentiu a crueldade sem fim?

C.3 - Mensagem de Naum

Sicre & Diaz testemunham que o livro de Naum é o livro que mais sofre dificuldades de
aceitação entre os estudiosos dos textos proféticos, isso se dá pela forma com que trata a
relação de Deus com Nínive. Há nele uma ira sanguinária, bem como uma alegria cruel, pelas
desgraças que acometerão essa grande cidade. Além do fato de que não registra em seu texto os
pecados do seu povo, Judá.

O Senhor é bom, uma fortaleza no dia da angústia. Ele conhece os que nEle
confiam, mas com uma inundação transbordante acabará duma vez com o lugar
de Nínive; para dentro das trevas perseguirá os seus inimigos. Naum1:7-8

A diferença com o profeta Jonas é explícita. Enquanto Jonas proclama a misericórdia de


Deus a Nínive e relata o seu arrependimento e conversão a Deus, Naum é implacável em sua
condenação a essa cidade. Como entender tal diferença?
Esse conflito pode ser melhor compreendido sob a ótica da indiferença e desprezo de
Nínive às necessidades de mudanças. A ira divina cai sobre Nínive, dado à irreversibilidade dos
atos dessa grande cidade, ela é assemelhada a um covil de leões que devora constantemente

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mais vítimas. É acusada de perpetuação de suas maldades, de tal forma que, mesmo após sua
ruína, aqueles que um dia foram vítimas suas não sentirão compaixão (3.19), tamanha era a sua
violência contra os povos da terra.
Para Sicre & Diaz, a tônica desse livro compõe mais uma peça para uma adequada
‘Teologia da História’, para a qual o realismo da maldade sofrida pelo próprio opressor, a seu
tempo, é um duro mas certeiro elemento.

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HABACUC E JEREMIAS

A - O Livro de Habacuc

O livro de Habacuc é considerado um dos mais profundos do Antigo Testamento. Isso


porque nele se dá algo especial na literatura profética, que é o diálogoinquiridor do profeta com
Deus. A profecia se transforma em diálogo, como aponta Sicre & Diaz, quando o profeta
externaliza suas crises de fé, ante uma realidade que não corresponde à sua teologia.

Já se foram os anos em que o profeta se limitava a ouvir a palavra de Deus e a


transmiti-la. Do mesmo modo que o seu contemporâneo Jeremias, ele toma a
iniciativa, interroga a Deus, exige resposta, espera. A profecia transforma-se em
diálogo. Diálogo entre o profeta e Deus, do qual há de sair o ensinamento para os
contemporâneos como também para as gerações futuras. 25

Para Sicre & Diaz, não há dados sobressalentes acerca de Habacuc, como temos de
diversos outros profetas. Não se sabe o seu lugar de origem ou o nome de seu pai. A única coisa
que se pode dizer é que é homem realista, inserido nos problemas concretos de sua época.
Neste sentido, mais profundamente, se transforma em símbolo que expressa as dúvidas,
inquietações, revoltas, indignação e expectativa de todos aqueles que se encontram em situação
semelhante à sua. Já para Robert Wilson, Habacuc deve ser entendido como profeta pertencente
aos círculos cultuais de Jerusalém. A evidência seria que o texto possui formato de liturgia
cúltica, preparada possivelmente para ser usada em cultos de intercessão
a Deus, buscando ajuda em tempos de tribulação.
Em sendo assim, Habacuc pertenceria a um grupo central em Jerusalém, que tinha como
função manter as instituições religiosas e articular a fé de seu povo, através de seus oráculos. Há
uma lenda no livro de Daniel 14:33-39 que mostra o profeta Habacuc transportado por um anjo
até a cova dos leões em Babilônia, servindo comida a Daniel. Não se sabe das origens dessa
lenda, mas a imagem que deixa é a da respeitabilidade que goza Habacuc.
Gerard von Rad situa a profecia de Habacuc entre os anos 605 e 597, sob a vassalagem
babilônica, quando Joaquim, sucessor de Josias, estava à frente de Judá.

A.1 - Interpretação e Conteúdo de Habacuc

Há um grande problema a ser trabalhado no livro de Habacuc. Logo no início de seu texto,
o profeta apresenta comportamentos contrapostos em seu livro, entre inocentes e culpados
(1:4,13 e 2:4). No entanto, não há referência acerca de quem sejam os inocentes e os culpados a
que se refere. Acerca desse conflito, Sicre & Diaz apresentam três teorias:

a) Alguns autores localizam inocentes e culpados entre o próprio povo de Habacuc,


configurando, assim, problemas internos entre judaítas honestos e judaítas perversos e
exploradores.

b) Outros autores defendem a idéia de que se trata de relações internacionais, onde Judá é a
oprimida e os opressores são povos estrangeiros, variando as opiniões em apresentar que
nações seriam (Assíria, Babilônia, Grécia, Pérsia, etc.).

25
Schökel & Diaz.. Profetas II. Pg. 1123.

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c) Uma terceira perspectiva vê em uma síntese dessas duas teorias destacadas a solução para o
conflito. O profeta fala acerca de problemas de justiça/injustiça internos e recebe a resposta de
Deus de que tais problemas serão tratados a partir da ação de uma outra nação, Babilônia, que
ao ver do profeta, é mais perversa do que seu próprio povo, gerando assim outro grande conflito
na mente do profeta: como pode Deus usar uma nação pagã para corrigir os pecados de um
povo? (1:12-17).

A teoria mais aceita tem sido essa última, que determinará a interpretação da profecia de
Habacuc.

A.2 - Mensagem de Habacuc

O problema central em Habacuc é a compatibilidade da ação corretora de Deus, movida


contra os judaítas perversos, a partir de um instrumento paradoxal, a saber, a nação babilônica
que superava em tudo a perversidade do povo de Israel.
O dilema iniciara-se com Habacuc questionando a Deus acerca do por que a justiça não se
cumpre, os malvados se mantêm no poder, oprimindo os fracos e desprezando a lei.

Até quando Senhor, clamarei eu, e tu não escutarás? ou gritarei a ti: Violência! e
não salvarás? Por que razão me fazes ver a iniqüidade, e a opressão? Pois a
destruição e a violência estão diante de mim; há também contendas, e o litígio é
suscitado. Por esta causa a lei se afrouxa, e a justiça nunca se manifesta; porque o
ímpio cerca o justo, de sorte que a justiça é pervertida. Habacuc 1:2-4

A resposta divina ressalta que Deus não está desatento às injustiças que estão a
acontecer e revela ainda seu plano para resolver essa situação: levantar os caudeus (Babilônia)
para operar a disciplina e correção! (1.5-6). Aqui inicia outra crise de Habacuc: Como pode um
Deus tão puro de olhos, que não pode ver o mal, agir através de povo tão impiedoso e
traiçoeiro? Habacuc 1:13
Não há solução prática ou teórica fácil para a inquietação de Habacuc. No entanto, o
profeta assume a perspectiva da fé, o que lhe dá satisfação em saber que a ação de Deus visa
punir aos autores da opressão, onde eles se encontrarem. Mesmo a Babilônia, que será usada
como instrumento divino para corrigir Judá, não passará incólume à ação de Deus.
Para Sicre & Diaz, o livro se resolve não teologicamente (discurso racional sobre a ação de
Deus narradas na profecia), mas na atitude adotada pelo profeta ante situação enigmática: a do
diálogo com Deus, atitude de fé, esperança contra a esperança, são os caminhos para interpretar
o curso da História e dos problemas por ela suscitados.
Com isso concorda Gerard von Rad, em sua obra ‘Teologia do Antigo Testamento’, Vol. II:

Que resposta recebeu Habacuc, à sua queixa? Uma resposta que não tem nada
de consolador, à primeira vista. (...) Javé tem a intenção de fazer a história tomar
um rumo ainda mais inquietante (...) Mas aqueles que ficam fortemente
apegados a Javé serão salvos. 26

Sellin & Fohrer já destacam, não apenas o uso divino que se faz das nações pagãs, mas a
indignação de Deus frente às injustiças das outras nações:

26
Von Rad, Gerard. Teologia do Antigo Testamento, Vol. II. Pg. 181-182.

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Entretanto, ao contrário do que se verifica em Naum, não é o elemento nacionalista que


constitui a base, mas a consternação perante a injustiça da grande potência e o problema a
respeito da retidão do agir de Deus no seio da história universal. (Habacuc) ... comunica o
verdadeiro conhecimento profético sobre a majestade de Deus, o qual toma a defesa daqueles
que são violentados em seu direito de viver, é aquele que possui poder sobre todas as nações,
que as exalta ou as abate, utilizando-se delas como instrumentos de sua vontade.
Temos, portanto, introduzido muito honestamente em Habacuc, o tema da crise humana
desencadeada frente às injustiças presentes tanto no cotidiano próximo quanto nos assuntos de
agenda internacional, que retratam o problema da injustiça. É da expectativa do fiel uma
resposta que equacione absolutamente e harmonicamente essa questão. No entanto, o realismo
de Habacuc não o deixa desenvolver uma resposta simplista: embora Deus seja o Senhor da
História, não age conforme as expectativas humanas imediatas e particulares. As Ações divinas
estão organizadas desde planos gerais e complexos, como os rumos das nações mais poderosas
do planeta, como também em prol das pequeninas nações ou grupos, e até mesmo indivíduos.
Trata-se de realismo profundo. O que importa é que ao final, todas as coisas serão
transformadas. Deus já age na história. O fiel pode somar à voz do profeta o cântico da
esperança:

Ouvindo-o eu, o meu ventre se comove, ao seu ruído tremem os meus lábios;
entra a podridão nos meus ossos, vacilam os meus passos; em silêncio, pois,
aguardarei o dia da angústia que há de vir sobre o povo que nos invade. Ainda
que a figueira não floresça, nem haja fruto nas vides; ainda que falhe o produto
da oliveira, e os campos não produzam mantimento; ainda que o rebanho seja
exterminado da malhada e nos currais não haja gado. Todavia eu me alegrarei no
Senhor, exultarei no Deus da minha salvação. O Senhor Deus é minha força, ele
fará os meus pés como os da corça, e me fará andar sobre os meus lugares altos.
Habacuc 3:16-19

B - O PROFETA JEREMIAS

B.1 - Vida do Profeta

O profeta Jeremias nasceu em uma aldeia benjamita, próxima de Jerusalém, Anatot, por
volta do ano 650. É filho do sacerdote Helcias, embora nunca tenha exercido o sacerdócio.
Recebeu muito jovem sua vocação (por volta de 626-27 A.C.).
Quando a recebe, expressa sua consciência de despreparo e incapacidade. No entanto,
Deus o comissiona a apregoar sua mensagem ao povo nos últimos anos da história de Judá, antes
do exílio.

A palavra do Senhor veio a mim, dizendo: ‘Antes de formá-lo no ventre eu o


escolhi, antes de você nascer, eu o separei e o designei profeta às nações’. Mas
eu disse: Ah, Soberano Senhor! Eu não sei falar, pois ainda sou muito jovem. O
Senhor, porém, me disse: ‘Não diga que é muito jovem. A todos a quem eu o
enviar, você irá e dirá tudo o que eu lhe ordenar. Não tenha medo deles, pois eu
estou com você para protegê-lo’, diz o Senhor. O senhor estendeu a mão, tocou a
minha boca e disse-me: ‘Agora ponho em sua boca as minhas palavras. Veja! Eu
hoje dou a você autoridade sobre as nações e reinos, para arrancar, despedaçar,
arruinar e destruir, para edificar e plantar’. Jeremias 1:4-10

Já neste episódio vocacional, revela-se algo que perpassará todo o livro: um volume
razoável de informações acerca da vida do profeta, que o revelam como profeta corajoso diante

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de Deus, que não tem problemas em manifestar suas dúvidas, medos e ansiedades. É uma das
personalidades mais interessantes do Antigo Testamento.

B.2 - Vida, Ministério e Mensagem de Jeremias

Na perspectiva de Anthony R. Ceresko, a mensagem de Jeremias pode ser mais bem


compreendida se analisada a partir de seu contexto econômico. Judá estava debaixo do domínio
babilônico nessa época. No entanto, várias vozes continuavam a dizer que os judeus não
precisavam temer qualquer coisa, pelo simples fato de serem o povo eleito e Jerusalém ser a
cidade de Deus. A classe dirigente de Judá pôs em prática uma política de defesa da cidade ‘a
qualquer custo’. Iniciaram a organização e sustentação de exércitos para defenderem suas
posses e para manterem esse exército, se serviam da injustiça e da opressão.

Ai daquele que constrói a sua casa sem justiça e seus aposentos sem direito, que
faz o seu próximo trabalhar de graça e não lhe dá o seu salário, que diz:
‘Construirei para mim uma casa espaçosa com vastos aposentos’, e lhe abre
janelas, recobre-as com cedro e pinta-a de vermelho. Pensas reinar só porque
competes com o cedro? (Jeremias 22:13-15ª).

Schökel & Diaz, no entanto, preferem dividir o estudo de Jeremias a partir do aspecto
cronológico. Defende que, a partir de sua vocação, sua vida e ministério podem ser divididos em
quatro grandes períodos: durante o reinado de Josias, Joaquim e Sedecias e durante os anos que
se seguiram à queda de Jerusalém.

B.2.1 - Durante o reinado de Josias (627-609)

Schökel & Diaz testemunham que a experiência vocacional de Jeremias se deu no período
em que Josias estava a promover reforma religiosa e política em Judá. Nesse período, Jeremias
tanto colabora com a reforma de Josias, como também desenvolve seu ministério pregando às
tribos do norte.
O contexto que envolve a ministração de Jeremias no norte é conhecido. Após a divisão
do Reino Unido, Israel sempre foi caracterizado pelos cultos aos ídolos levantados por Jeroboão.
Após 720, com a sua queda, a nação vencedora – Assíria, envia para lá povos de diversas culturas
e religiões, configurando um sincretismo maior ainda (II Reis 17:24-41).
A isso, somava-se a desestruturação social, gerada pela economia precária e falta de
coesão política. Sendo assim, a pregação de Jeremias nesse período, no norte, esteve marcada
por mensagens de conversão e perdão (caps. 2-3 e 30-31).
Já no Sul, a pregação de Jeremias destaca-se pela preocupação de que a reforma iniciada
por Josias seja levada até o fim. Condena o ritualismo vazio, as injustiças sociais, a ganância
desmedida e a frieza religiosa (5:1-9; 6:13-21; 7:21-28; 8:4-12).

Desde o menor até o maior, todos são gananciosos; profetas e sacerdotes igualmente, todos
praticam o engano. Eles tratam a ferida do meu povo como se não fosse grave. ‘Paz, paz’, dizem,
quando não há paz alguma. Jeremias 6:13-14
Até a cegonha no céu conhece as estações que lhe estão determinadas, e a pomba, a andorinha e
o tordo observam a época de sua migração. Mas o meu povo não conhece as exigências do
Senhor. ‘Como vocês podem dizer: ‘Somos sábios, pois temos a lei do Senhor’, quando na
verdade a pena mentirosa dos escribas a transformou em mentira? (Jeremias 8:7-8)

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B.2.2 - Durante o reinado de Joaquim (609-598)

O famoso discurso de Jeremias contra o templo é proferido no período de 609-598.


Ocorre que o templo estava a se transmudar de lugar sagrado para centro de extorsão, opressão,
roubos e maldades.

Vocês pensam que podem roubar e matar, cometer adultério e jurar falsamente, queimar
incenso a Baal e seguir outros deuses que vocês não conheceram, e depois vir e permanecer
perante mim neste templo, que leva o meu nome, e dizer: ‘Estamos seguros!’, seguros para
continuar com todas essas práticas repugnantes? Este templo, que leva o meu nome,
tornou-se para vocês um covil de ladrões? Jeremias 7:9-11a.

Como denunciado por outros profetas, o templo, centro religioso, servia não somente
para justificar as injustiças cometidas pela classe poderosa, como também estava se convertendo
em um lugar de exploração direta. O resultado é que, por denunciar o que se fazia da religião,
fora prometido de morte:

E assim que Jeremias acabou de dizer ao povo tudo o que o Senhor lhe tinha
ordenado, os sacerdotes, os profetas e todo o povo o prenderam e disseram:
‘Você certamente morrerá! Por que você profetiza em nome do Senhor e afirma
que este templo será como Silo e que esta cidade ficará arrasada e abandonada?’
E todo o povo se ajuntou em volta de Jeremias no templo do Senhor. Jeremias
26:8-9
Como já trabalhado, o povo havia sido cativado pela teologia oficial, que apregoava que o
templo do Senhor era inviolável e que Jerusalém jamais cairia, independente do comportamento
de seus moradores. Jeremias passou a ser considerado, portanto, como rebelado.
Durante esse período, Jeremias denuncia ainda as injustiças cometidas pelo rei Joaquim,
contra o povo, arrancando desses os fundos para construir seu palácio novo (Jr 22:13-19). Faz
parte de seu protocolo ainda a denúncia feita aos profetas que haviam rejeitado a Deus (5:12-
13); o falso culto (6:20 e 7:20-21); a falsa segurança religiosa (7:1-15); a idolatria (7:16-20) e as
injustiças sociais (5:26-28 e 12:1-5).

Há ímpios no meio do meu povo: homens que ficam à espreita como num esconderijo de
caçadores de pássaros; preparam armadilhas para capturar gente. Suas casas estão cheias de
engano, como gaiolas cheias de pássaros. E assim eles se tornaram poderosos e ricos, estão
gordos e bem alimentados. Não há limites para as suas obras más. Não se empenham pela
causa do órfão, nem defendem os direitos do pobre. Jeremias 5:26-28

Importa destacar que Jeremias vê nas figuras importantes de Judá os maiores


responsáveis pelas desgraças ocorridas na nação. Começa a denúncia pelo rei (22:13-19),
prosseguindo para os profetas (5:5) e para os sacerdotes (6:13; 23:21), deixando claro como a
estrutura religiosa havia se convertido em máquina ideológica de opressão e injustiças, sendo
estes os principais responsáveis pela ruína de todo o povo.

“Tanto o profeta como o sacerdote são profanos; até no meu templo encontro as suas
iniqüidades’, declara o Senhor”. Jeremias 23:11

B.2.3 - Durante o reinado de Sedecias (597-586)

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Em 597, ocorre uma deportação de judeus, saindo de Jerusalém rumo à Babilônia. A


partir de então, a mensagem dos profetas anteriores, que profetizaram o exílio, torna-se mais
clara, mas não completamente. Há um pequeno grupo que fica em Jerusalém e que agora tenta
interpretar a deportação. Em primeiro lugar, fica claro para todos que Deus não os defende,
como predito, de forma incondicional. No entanto, como explicar que alguns foram exilados e
outros não. A resposta desenvolvida pelos que continuaram a habitar em Jerusalém foi
extremamente simplista: Deus enviou ao exílio aqueles que eram realmente culpados, enquanto,
por outro lado, os que ficaram em Jerusalém são pessoas boas, que não mereciam o castigo.
Jeremias dirige duas palavras quanto a essa interpretação: 1) aos que ficaram na terra,
vemos nos capítulos 24 e 29:16-20, afirmam que a sorte de ir ou não ir ao exílio não está
amparada em bondade ou maldade dos grupos; 2) por outro lado, Jeremias, dirigindo-se aos
exilados, exorta-os a não cederem à mensagem dos falsos profetas, que apregoam que o exílio
não continuará. O profeta insiste que os judeus busquem se adaptar ao exílio, pois esse será
longo (cap. 29).

Entreguei a mesma mensagem a Zedequias, rei de Judá, dizendo-lhe: Coloquem o pescoço sob
o jugo do rei da Babilônia, sujeitem-se a ele e ao seu povo, e vocês viverão. (...) Assim diz o
Senhor: Quando se completarem os setenta anos da Babilônia, eu cumprirei a minha promessa
em favor de vocês, de trazê-los de volta para este lugar. (Jeremias 27:12)

Contrariando esses prenúncios, no capítulo 27, vemos Edom, Amon, Tiro e Sidon
tentando incitar Jerusalém a uma revolta contra a Babilônia. Jeremias irá insistir em sua
mensagem: é inútil e suicida opor-se à Babilônia, pois o cativeiro passou pela direção de Deus
sobre a história.
Para tornar ainda mais vivaz sua mensagem, vemos no capítulo 32 Jeremias comprando
campos, terra de plantio e morada em Judá. Pareceria contradição enorme um homem investir
dinheiro em uma terra que está sob domínio e vigilância do império. Tudo se torna relativo e o
risco de que o investimento nada valha é imenso. No entanto, Jeremias quer ilustrar com isso sua
mensagem de esperança, de que Deus mudará a sorte dos exilados.

B.2.4 - Após a queda de Jerusalém (586-?)

Os muros de Jerusalém começam a cair em 586. O Exército de Nabucodonosor domina a


cidade, e divide o povo em três grupos: os que continuarão livres, os que serão deportados e os
que irão a juízo perante Nabucodonosor. Como Jeremias se manifestou sempre partidário da
rendição, não é feito prisioneiro babilônico (38-39).
Nesse contexto, por causa de um incidente, Jeremias é feito prisioneiro e conduzido a
Ramá junto com os exilados. Nabuzardã chega com a ordem de incendiar o templo, o palácio e as
casas e ainda arrasar as muralhas de Jerusalém (52). Chega também com a ordem de libertar
Jeremias, ao que lhe dá também três opções: seguir com os deportados, ficar com o novo
governador, apresentado por Babilônia, Godolias ou morar onde preferir (40). Jeremias opta por
ficar com o novo governador e, a partir de então, inicia nova vida.
Seu sossego dura pouco, pois em 586 rebeldes assassinam Godolias e temendo
retaliações de Babilônia, fogem para Belém e, posteriormente, para o Egito. Obrigam Jeremias a
segui-lo. Mesmo contrariado, obrigado a estar ali no Egito com o grupo rebelde, Jeremias
denuncia o que é chamado de ‘idolatria política’: confiar mais no Egito do que em Deus, nas
palavras expressas da profecia.
É diante deste contexto que, o profeta, provavelmente tenha escrito o Livro das Lamentações.
Presume-se ter sido escrito no período de três meses entre a destruição de Jerusalém e a

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expedição ao Egito. Tem como pensamento chave a destruição e a desolação. 1.1. Tem como
tema principal uma série de hinos fúnebres compostos pelo profeta choroso, em seguida à brutal
destruição que ele havia testemunhado. Estava tomado de grande tristeza, embora estivesse a
predizer este julgamento durante vários anos.
O livro ocupa-se de 5 capítulos. Os três primeiros são compostos de 22 versos na forma
de acróstico. O capítulo seguinte possui 66 versículos ou 22 trios, cada trio com a mesma letra
inicial. O último capítulo tem 22 versos na forma de acróstico, mas não na ordem alfabética.
Ensinamentos: a) Na mais profunda dor a confiança e penitência são dirigidas a Deus. Quando
desfalecido, pela destruição da cidade e a extensão do julgamento da parte de Deus, (3.22)
rogou o retorno da misericórdia de Deus. (3.32,33); b) A tristeza não era só do profeta, mas
também de Deus.
A partir de então, não há mais relatos de Jeremias. Jeremias denuncia ainda que também
o Egito irá cair e que a fuga para lá de nada adiantará (40, 42 e 43 ). Sua mensagem, no entanto,
continuou sendo transmitida, crescendo e desenvolvendo-se, até formar o livro que ora temos.

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EZEQUIEL E DANIEL

A - O PROFETA EZEQUIEL

“Até poucos anos atrás Ezequiel continuava na moda por motivos muito diferentes:
psiquiatras e psicanalistas consideravam-no personalidade doentia, digna de estudo. Quando os
médicos deixaram em paz Ezequiel, os afeiçoados aos discos voadores puseram-se a considerá-lo
como um dos poucos seres privilegiados que conseguiram contemplá-lo na antiguidade”.
Assim iniciam Schökel & Diaz a análise da obra do profeta Miquéias. Por sua vez, John
Bright, biblista e historiador de Israel, assim considera o profeta Ezequiel:

Não se pode encontrar figura mais estranha em toda a comunidade dos profetas
do que Ezequiel. Ele era uma personalidade severa e não muito atraente, cheio
de contradições, possuindo uma maneira de ser áspera que ocultava emoções
apaixonadas e, podemos suspeitá-lo, profundamente reprimidas. 27

A data do ministério profético de Ezequiel se compreende no período entre os anos 592 e


571 A.C. Nesse quesito, a partir de dados, há uma certeza apresentada da mesma forma tão
somente nos livros de Ageu e Zacarias.

A.1 - O Profeta

O conhecimento que Ezequiel tinha da legislação sagrada, seu interesse pelo templo, bem
como sua linhagem nos dão indícios de que tenha sido sacerdote. O texto bíblico também nos
informa de que era casado e que ficou viúvo tempo antes da queda de Jerusalém.
Não se sabe se tinha filhos. Sobre sua personalidade, Schökel & Diaz tecem o seguinte
comentário:

Perante esta escassez de dados biográficos causa estranheza a abundância de


informações sobre a personalidade do profeta. Tem freqüentes visões, nas quais
atua e participa. Mais do que nenhum outro profeta realiza ações simbólicas e
mímicas (bater palmas, dançar com freqüência). É propenso ao desânimo, se bem
que outras vezes se mostre quase insensível. Durante período relativamente
longo perde a fala. 28

A.2 - Atividade Profética de Ezequiel

O exercício das atividades ministeriais de Ezequiel pode ser didaticamente dividido em


antes e depois da queda de Jerusalém (586). Vejamos:
A.2.1 - A partir do exílio até a queda de Jerusalém (597-586)
Importante observar, como nos atentam Schökel & Diaz, que por volta do ano 595,
quando os judeus estavam no exílio na Babilônia, essa sofre uma revolta interna, que ocasiona
mortes de muitos do seu próprio povo. Essa revolta interna gera um sentimento otimista nos
exilados. Imaginam que se trata de uma ação divina contra os babilônios, que marca a libertação
do povo judeu e, conseqüentemente, sua volta para Jerusalém. Encorajados ainda

27
Bright, John. História de Israel. Pg. 404.
28
Schökel & Diaz. Profetas II. Pg. 691.

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pelos falsos profetas, o povo não admite mensagem diversa e é justamente essa a mensagem de
Ezequiel: a de que Jerusalém cairá (a cidade ainda não tinha sido destruída) e que deveriam
administrar sua permanência no exílio, ao invés de confiar em falsas esperanças, anunciando que
nada poderá salvar Jerusalém.
À nação que se recusa acreditar em Ezequiel é dado o nome de ‘povo rebelde’. Insistem
em não ouvir a palavra de Deus, argumentando que as visões proféticas não se cumprem
(12:22,27). Os falsos profetas anunciavam que haveria paz e não mais o exílio, incentivando a
dureza de coração (todo o capítulo 13).

Filho do homem, a nação de Israel está dizendo: A visão que ele vê é para daqui a
muitos anos, e ele profetiza sobre o futuro distante. Pois diga a eles: Assim diz o
soberano, o Senhor: Nenhuma de minhas palavras sofrerá mais demora; tudo o
que eu disser se cumprirá. Palavra do Soberano, o Senhor. Ezequiel 12:26-28
Porque (os falsos profetas) fazem o meu povo desviar-se dizendo lhe ‘Paz’
quando não há paz.... Ezequiel 13:10

Vocês (os falsos profetas), mentindo, desencorajam o justo contra a minha


vontade, e encorajaram os ímpios a não se desviarem dos seus maus caminhos
para salvarem a sua vida. Ezequiel 13:22

O profeta denuncia ainda que o pecado desse povo excedeu até mesmo ao pecado de
Sodoma, que havia sido destruída pelo fogo.

Ora, este foi o pecado de sua irmã Sodoma: ela e suas filhas eram arrogantes,
tinham fartura de comida e viviam despreocupadas; não ajudavam os pobres e os
necessitados. Eram altivas e cometeram práticas repugnantes diante de mim. Por
isso eu me desfiz delas, conforme você viu. Samaria não cometeu metade dos
pecados que você cometeu. (...) Agüente a sua vergonha (ó Judá), pois você
proporcionou alguma justificativa às suas irmãs (Sodoma e Gomorra). Visto que
os seus pecados são mais detestáveis que os delas, elas parecem mais justas que
você. Envergonhe-se, pois, e suporte a sua humilhação, porque você fez as suas
irmãs (Sodoma e Gomorra) parecerem justas. Ezequiel 16:49-50, 52

O citado texto lança luz nova sobre a natureza dos pecados de Sodoma e Gomorra. Por
muito tempo, imaginou-se que eram pecados de natureza sexual. No entanto, os profetas,
retomando o tema, denunciam que se trata mais de injustiças sociais, opressão e violência
contra os pobres e necessitados, do que qualquer outro pecado de ordem sexual. A leitura do
capítulo 22 (1-22) deixará isso bem claro, quando elenca diversos dos pecados cometidos por
Judá, dando destaque especial aos de ordem social: usam o poder para derramar sangue,
desprezam a família, oprimem os estrangeiros migrantes pobres que estão no país, maltratam os
órfãos e as viúvas, aceitam suborno para derramarem sangue, emprestam com juros
exorbitantes, obtêm juros por extorsão e injustiças.
A conseqüência de todos esses atos é a de que, não obstante às palavras enganosas dos
falsos profetas, que anunciavam a paz (afirmando que tudo estava bem e que não havia com o
que se preocuparem), Deus já havia pronunciado seu juramento:

Esta palavra do Senhor veio a mim: Filho do homem, se uma nação pecar contra
mim por infidelidade, estenderei contra ela o meu braço para cortar o seu
sustento, enviar fome sobre ela e exterminar seus homens e seus animais.
Mesmo que estes três homens – Noé, Daniel e Jó – estivessem nela, por sua
retidão eles só poderiam livrar a si mesmos. Palavra do Soberano, o Senhor.
Ezequiel 14:13-12

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Por fim, no primeiro período, palavra profética de Ezequiel é exemplificada de forma


extremamente trágica: sua esposa morre e ele é proibido de pranteá-la. Isso para exemplificar
que também os judeus perderão o Templo e sofrerão os horrores do exílio, e terão que sofrer em
silêncio em conseqüência de seus pecados (Ezequiel 24:15-24).

A.2.2 - Depois da queda de Jerusalém (585-?)

A.2.2.1 – A Irresponsabilidade de Judá

Ezequiel ficara mudo no dia da queda de Jerusalém (3:25-26). Só recupera sua fala no dia
em que ouve a notícia de que a destruição fora cabal (33:21-22). Inicia-se, assim, nova etapa de
seu ministério profético. O contexto agora é o de lamentação e justificação da parte do povo.
Arrogam para si inocência, afirmando discretamente que se há um erro nos eventos todos, esse
é de Deus, que pune injustamente uma geração, por causa do pecado de outra, conforme vemos
em 18:29 e 33:20:

Contudo, a nação de Israel diz: ‘O caminho do Senhor não é justo’.

No entanto, ó nação de Israel, você diz: ‘O caminho do Senhor não é justo...’.

Com esse provérbio, Judá tentava transferir teoricamente suas responsabilidades tanto
pelo exílio quanto pela queda de Jerusalém. Acusavam a Deus de injustiça. A resposta de Deus,
manifesta em Ezequiel, contrapõe frontalmente esse argumento.

Esta palavra do Senhor veio a mim: O que vocês querem dizer quando citam este
provérbio sobre Israel: ‘Os pais comeram uvas verdes, e os dentes dos filhos se
embotam?’ Juro pela minha vida, palavra do Soberano, o Senhor, que vocês não
citarão mais esse provérbio em Israel. Pois todos me pertencem. Tanto o pai
como o filho me pertencem. Aquele que pecar é que morrerá. Ezequiel 18:1-4

O restante do capítulo 18 nos dá mostras da grande construção teológica de Ezequiel, que


desmantelará esse argumento. Não raro ainda hoje se ouve vozes teológicas que procuram
transferir a responsabilidade humana atual, seja social ou individual, às gerações anteriores,
impedindo o processo de amadurecimento, reconhecimento e transformação. Àquela época e à
nossa, a resposta de Ezequiel ecoa claramente: a responsabilidade é individual! As
conseqüências dos pecados são colhidas por aqueles que o praticam. Deus não transfere culpas a
pessoas que não as tenham cometido, nem tampouco os juízos cabíveis a quem tenha cometido
o mal a quem não o tenha praticado. Judá e os exilados puderam discernir claramente essa
mensagem, também a partir do capítulo 33 de Ezequiel (33:12-20). É necessário assumir as
responsabilidades pela existência, venham elas de forma positiva ou negativa, para que o
processo de restauração, cura, transformação e crescimento possa dar continuidade.

Se um justo se afastar de sua justiça e fizer o mal, morrerá. E, se um ímpio se desviar de sua
maldade e fizer o que é justo e certo, viverá por assim proceder. Ezequiel 33:18-19

A.2.2.2 - Denúncia localizada dos transgressores de Israel

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Por outro lado, Ezequiel localiza de forma especial a quem pertence a maior parcela da
responsabilidade pelo mal (social, pois todos estavam pagando). Schökel & Diaz destacam os
cinco grupos sobre quem pesa maior culpa, a partir do capítulo 22 (22:25-30): os príncipes,
os sacerdotes, os nobres, os profetas (falsos) e os latifundiários.

Há nela uma conspiração de seus príncipes como um leão que ruge ao despedaçar sua presa;
devoram pessoas, apanham tesouros e objetos preciosos e fazem muitas viúvas. Seus
sacerdotes cometem violência contra a minha lei e profanam minhas ofertas sagradas; não
fazem distinção entre o sagrado e o comum; ensinam que não existe nenhuma diferença entre
o puro e o impuro; e fecham os olhos quanto à guarda dos meus sábados, de maneira que sou
desonrado no meio deles. Seus oficiais são como lobos que despedaçam suas presas;
derramam sangue e matam gente para obter ganhos injustos. Seus profetas disfarçam esses
feitos enganando o povo com visões falsas e adivinhações mentirosas. Dizem: ‘Assim diz o
Soberano, o senhor’, quando o Senhor não falou. O povo da terra (latifundiários) pratica
extorsão e comete roubos; oprime os pobres e os necessitados e maltrata os estrangeiros
(migrantes pobres), negando-lhes justiça. Procurei entre eles (entre a elite dirigente de Judá)
um homem que erguesse o muro e se pusesse na brecha diante de mim e em favor desta terra,
para que eu não a destruísse, mas não encontrei nenhum.

Prosseguindo em identificar os maiores responsáveis pela tragédia de Israel, Ezequiel


ainda localiza culpa entre os reis (chamados de pastores) e os poderosos (capítulo 34):

Ai dos pastores de Israel que só cuidam de si mesmos! Acaso os pastores não deveriam cuidar
do rebanho? Vocês comem a coalhada, vestem-se de lã e abatem os melhores animais, mas
não tomam conta do rebanho. Vocês não fortaleceram a fraca nem curaram a doente nem
enfaixaram a ferida. Vocês não trouxeram de volta as desviadas nem procuraram as perdidas.
Vocês têm dominado sobre elas com dureza e brutalidade. Por isso elas estão dispersas, porque
não há pastor algum e, quando foram dispersas, elas se tornaram comida de todos os animais
selvagens. Ezequiel 34:2b-4

A.2.2.3 – As Injustiças Sociais denunciadas por Ezequiel

Como Jeremias, Ezequiel observa as injustiças sociais causadas pela elite dominante
contra o povo pobre e fraco da terra. Aqui também vemos a expressão ‘derramar sangue
inocente’, que significa tanto os assassinatos que se faziam para roubar as terras de um pequeno
camponês, como também a exploração que se fazia contra o trabalhador, através de saldos
mínimos, insuficientes para sobrevivência adequada.

Veio a mim esta palavra do Senhor: ‘Filho do homem, você a julgará? Você julgará essa cidade
sanguinária? (...) Assim diz o Soberano, o Senhor: Ó cidade, que traz condenação sobre si mesma
por derramar sangue em seu meio e por se contaminar fazendo ídolos! (...) Veja como cada um dos
príncipes de Israel que aí está usa o seu poder para derramar sangue. Em seu meio eles têm
desprezado pai e mãe, oprimido o estrangeiro e maltratado o órfão e a viúva (...) Em seu meio há
homens que aceitam suborno para derramar sangue; você empresta a juros, visando lucro, e
obtém ganhos injustos, extorquindo o próximo. Ezequiel 22:1-4, 6-7, 12
A.2.2.3 – O Novo Mundo Porvir

Por fim, Ezequiel anuncia a transformação completa da realidade. Essa transformação


afetará toda a realidade: começará pela própria natureza (36); as cidades serão repovoadas e
reconstruídas; Norte e Sul, Israel e Judá voltarão a ser uma só nação novamente (37:15-24); o
templo será restaurado (40-42) e a Glória de Deus voltará a estar nele (43:1-5). Deus estará com
os seres humanos, a partir de uma nova aliança (37:26-27) e, mais ainda, o ser humano será
caracterizado por um novo coração (36:25-28):

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Aspergirei água pura sobre vocês e ficarão puros; eu os purificarei de todas as


suas impurezas e de todos os seus ídolos. Darei a vocês um coração novo e porei
um coração de carne. Porei o meu espírito em vocês e os levarei a agirem
segundo os meus decretos e a obedecerem fielmente às minhas leis.

O livro termina, portanto, com palavras de restauração, esperança e graça. Acerca disso,
Schökel & Diaz concluem:

“A passagem da condenação para a salvação encontra-se em todos os profetas.


Mas em Ezequiel ressalta de maneira especial. A partir de agora, a profecia
adotará matiz mais consolador, como o provam os exemplos do Dêutero-Isaías e
dos profetas pós-exílicos. Continuarão a denunciar os pecados e a ameaçar com
punições. Mas, em linhas gerais, a profecia toma rumo novo a partir da queda de
Jerusalém”. 29

B - O LIVRO DE DANIEL

O que sabemos de Daniel? Um israelita de ascendência nobre. Foi deportado com alguns
companheiros para a Babilônia por Nabucodonosor, com o fim de prestar serviço real (1.1). Viveu
90 anos, 72 dos quais como oficial graduado do governo. Recebeu o nome babilônico de
Beltessazar. Tornou-se interprete de sonhos e profetizou o triunfo futuro do Messias. (7-12)
O livro de Daniel no Antigo Testamento caracteriza um novo estilo literário profético: o da
apocalíptica. A apocalíptica é um gênero literário caracterizado pelo seu interesse pela história,
sua atenção ao destino dos impérios e ainda por sua função de predizer.
Tradicionalmente o livro foi datado na época do exílio (6º século a.C). Uma série de profecias
sobre a sucessão dos impérios desde o babilônico até o romano, de autoria de Daniel. (Mt.
24.15).
O Livro pode ser dividido em: Capítulos 1 a 6 – Histórico: a) Relato da educação de Daniel
e seus companheiros; b) Relato da interpretação do sonho do rei; c) História da fornalha ardente;
d) A escritura na parede – 5.24-31; e) Daniel na cova dos leões. Capítulos 7 a 12 – Profético. Os
capítulos 2.4-7.28, escrito em aramaico –“todos os gentios” e o restante do livro em hebraico,
uma possível alusão à “orientação de Deus ao seu povo”. Daniel revela a soberania de Deus
sobre a história dos reis e das nações.
Nos capítulos 2e7 a história humana esta submetida à soberania divina: No capítulo 2 a pedra
que vem do céu põe fim ao esplendor da estátua, símbolo dos grandes impérios humanos. No
capítulo 7 é o filho do homem que vem do céu e destrói os animais ferozes que afligiam a
humanidade com seus intentos imperialistas. “Os quatro animais” (7.3) subiam do mar – indica a
origem dos reinos deste mundo; eles vêm de baixo – sobem, mas como ondas também descem.
Nenhum reino consegue manter-se sempre acima dos outros; diferente do reino de Deus – não
vem de baixo, mas do alto. Não de homens, mas de Deus. Por isso Ele é eterno e não temporal.
Quem lê o livro de Daniel, se verá transposto de uma visão local para uma visão universal,
da História, em suas diversas etapas. Vários impérios são contemplados, ao longo dos séculos.
Daniel faz isso, estabelecendo um esquema da sucessão dos impérios mundiais e revelando a
Soberania de Deus em cada desenvolvimento. Sellin & Fohrer acrescentam que o propósito de
Daniel é o de revelar o surgir e o decorrer das idades do mundo e comunicar os mistérios do final
dos tempos.

29
Schökel & Diaz. Profetas II. Pg. 697.

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Um exemplo de como o livro fez esta descrição está no relato da estátua feita de vários
tipos de metais e que uma pedra despedaça. Diz a interpretação de Sellin & Fohrer que se trata
da representação da história universal contemplada como um todo, mas dividida, ao mesmo
tempo, em diversas épocas. “Até o final dos tempos ela será o único terreno em que o homem
há de viver, carregado da herança do passado, rico em decisões em relação ao presente e pleno
de responsabilidade a respeito do futuro”, acrescentam os autores.

A representação da estátua: a) Feita de vários tipos de metais e que uma pedra


despedaçará; b) Trata-se da representação da história universal das nações e dos homens; c)
Uma história divida ao mesmo tempo e diversas épocas.

B.1 – Autor

Schökel & Diaz esclarecem que, apesar de que no passado, imaginava-se que o autor do
livro fosse o mesmo protagonista do livro, Daniel, que fora exilado para a Babilônia nos dias do
rei Joaquim, hoje, a moderna pesquisa bíblica não mais atribui a autoria deste livro a uma pessoa
só. A tendência é ter em Daniel um livro que foi elaborado por diversas tradições e compilado
mais tarde por um organizador principal.

B.2 – Mensagem

Sellin & Fohrer destacam que, partindo da apocalíptica – visão universalista da história, o
objetivo da profecia de Daniel é o de “fortalecer a paciência e o ânimo dos bons que sofrem sob
a perseguição, incutindo-lhes esperança e exortando-os a permanecerem firmes na fé, como
Daniel”. Destacam ainda que o livro “pretende também dar-lhes a certeza de que o tempo do

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sofrimento haverá logo de passar, porque se aproxima o dia em que Deus porá um termo aos
poderes deste mundo e dará início à sua eterna dominação”.
Em linha convergente, Ceresko oferece-nos o seguinte destaque, acerca de Daniel:

As narrativas sobre Daniel e outros judeus piedosos nos caps. 1-6 e a revisão feita
por Daniel da história posterior ao Exílio nos caps. 7-12 afirmam em termos
inequívocos o poder absoluto de Deus sobre os acontecimentos da história
mundial e a determinação e a direção providenciais dessa história por Deus. 30

30
Ceresko, Anthony R. Introdução ao Antigo Testamento numa Perspectiva Libertadora. Pg. 309.

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AGEU, ZACARIAS E MALAQUIAS

A - O LIVRO DE AGEU

Ageu é profeta da Reconstrução. Seu ministério profético se situa no pós-exílio, mais


especificamente em meados do sexto mês até o nono, do segundo ano de Dario (ano 520 A.C.).
Pode ser que tenha se estendido a um período maior também.
As informações acerca desse profeta são escassas, variando entre algumas especulações:
Sellin & Fohrer encontram indícios de que Ageu faça parte do grupo de repatriados do cativeiro
babilônico, sobretudo nas pretensões desse profeta. Já Schökel & Diaz negam evidências que
possam estabelecer “se ele nasceu na Palestina ou se regressou de Babilônia com os exilados”
A dinâmica da ação de Ageu, no entanto, pode ser precisada mais claramente. Ele fala aos
judeus que voltaram para sua terra, a partir do edito de libertação de Ciro, no ano 538. Em
voltando, tais judeus carregavam a esperança, mas quando chegaram a Judá, encontraram as
cidades em ruínas, com campos abandonados, muralhas destruídas e o Templo incendiado.
Iniciam, portanto, a reconstrução. Mas com um detalhe: privilegiam as reformas
de suas casas e campos e se esquecem completamente do Templo, lugar centralizador da Fé
em Javé. Robert R. Wilson afirma que “o tom dos oráculos sugere polêmica contra outras idéias
correntes na época” , dando a entender que havia uma apologia para esta inversão de
prioridades destacadas acima.
Schökel & Diaz ainda acrescentam outro elemento ao contexto profético de Ageu: os anos
turbulentos que representaram a sucessão de Ciro, entre 529 a 520 A.C, marcado por guerras,
assassinatos, rebeliões e repressões no cenário internacional. Isso foi interpretado por Ageu
como fonte de esperanças de que Deus estivesse agindo nesse plano, no intuito de
destruir o poder dos reinos gentios e a promoção da libertação completa de Judá.

‘Farei tremer todas as nações, as quais trarão para cá os seus tesouros, e


enchereis este templo de glória’, diz o Senhor dos Exércitos. Ageu 2.7
Diga a Zorobabel, governador de Judá, que eu farei tremer o céu e a terra.
Derrubarei tronos e destruirei o poder dos reinos estrangeiros. Virarei os carros e
os seus condutores; os cavalos e os seus cavaleiros cairão, cada um pela espada
do seu companheiro. Ageu 2.21-22

A.1 - Conteúdo do Livro

A estrutura do livro de Ageu tem sido distribuída em cinco oráculos por alguns estudiosos,
e, por outros, em quatro, estando entre estes últimos; Sicre & Diaz.

1) De 1:1 a 1:15 – Trata-se da intervenção do profeta em prol do templo, a Zorobabel,


governador de Judá, e a Josué, sumo sacerdote. Ageu denuncia que é um contra-senso que o
templo esteja em ruínas, enquanto todos se preocupam com suas casas. Sobretudo, porque
enquanto o templo estiver em ruínas, não haverá a restauração na terra.

2) De 2:1 a 2:9 – Novamente Ageu se dirige a Zorobabel e a Josué para justificar que, embora o
novo templo não possua a glória do primeiro templo, Deus está para intervir sobre a Terra e
fazer com que dela venha riquezas de todas as nações para garantir glória maior ainda ao novo
templo.

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3) De 2:10 a 2:19 – O profeta, a partir de analogia com uma pergunta aos sacerdotes, denuncia
as obras e sacrifícios que estão sendo oferecidos a Deus como impuros e promete que, no
futuro, a benção tomará conta da terra.

4) De 2:20 a 2:23 – Novamente o profeta Ageu se volta para Zorobabel, anuncia que Deus está
fazendo algo sobre a Terra e dará a Zorobabel uma posição real messiânica:

‘Naquele dia’, declara o Senhor dos Exércitos, ‘eu o tomarei, meu servo
Zorobabel, filho de Sealtiel’, declara o Senhor, ‘e farei de você um anel de selar,
porque tenho escolhido’, declara o Senhor dos Exércitos. Ageu 2:23

A.2 - Mensagem de Ageu

Schökel & Diaz destacam dois temas principais na mensagem de Ageu: a reconstrução do
templo e a irrupção da era escatológica.
No que toca ao templo, destaca-se que de sua reconstrução depende a intervenção de
Deus sobre o mundo. Gerard von Rad o atesta, quando reconhece que “... o templo, apesar de
tudo, era onde Javé falava a Israel, onde perdoava, onde estava presente”. Mais ainda:

Da atitude que se adotava pró ou contra Javé. Ora, as pessoas se interessavam


muito pouco por este lugar, considerando suas condições econômicas miseráveis,
transferiam para mais tarde a reconstrução do templo 31

O argumento utilizado era o de que ‘ainda não chegara o tempo de reconstruir a casa do
Senhor’ (Ageu 1.2). É contra essa idéia que Ageu se volta, na primeira seção (1:1-11), deixando
claro que ‘Israel não é mais Israel se não busca em primeiro lugar o reino de Deus’. E ainda:
‘Somente quando o fizer, terá o resto, isto é, a benção de Javé lhe será concedida’.
O outro tema focado em Ageu, o escatológico, versa acerca da restauração do reino
davídico na pessoa de Zorobabel. Von Rad destaca que essa escatologia é uma conseqüência da
impressão acerca da glória a ser adquirida pelo templo em construção, que excederá em glória
comparado a qualquer coisa na terra. Quando Deus abalar os reinos sobre a Terra, este será o dia
de Javé, que trará sobre Zorobabel uma função messiânica (selo de Javé = executor de suas
decisões 32).

B - O LIVRO DE ZACARIAS

Como atesta von Rad, existe uma semelhança muito grande entre a mensagem de Ageu e
Zacarias. “Sua pregação está também em ligação estreita com o templo reconstruído e com
Zorobabel, o descendente de Davi, a quem Zacarias atribui igualmente um ofício messiânico na
perspectiva do acontecimento salutar escatológico”.
Acerca de Zacarias, atestam Schökel & Diaz, pouco se sabe a respeito. Em 1:7, temos que
era filho de Baraquias, filho de Ado, embora não exista unanimidade em descrever a importância
dessa informação (em Neemias há menção de um Zacarias, filho de Ado. No entanto, não há
formas de associar seguramente de que se trata do profeta escritor Zacarias).

31
Von Rad, Gerard. Teologia do Antigo Testamento. Vol. II. Pg. 272.
32
Von Rad, Gerard. Teologia do Antigo Testamento. Vol. II. Pg. 274.

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Robert R. Wilson afirma que, independente da opinião que se tenha acerca de quem
tenha sido Ado, o título do livro sugere que o autor seja um profeta na estrutura central, bem
como o associa estreitamente às tradições de Jerusalém.
Quanto ao período da profecia de Zacarias, vale o que se diz de Ageu. É um tempo
posterior ao exílio, em que é necessário reconstruir tudo em Judá, sobretudo o templo, centro
irradiador da fé em Javé.

B.1 - Conteúdo de Zacarias

O livro pode ser dividido em três seções. De 1:1 a 1:6, a primeira; a segunda, de 1:7 a 6:15
e os capítulos 7 e 8, a terceira seção.
Na primeira, compreendendo 1:1-6, temos a apresentação do profeta, junto com uma
exortação à mudança, a fim de que não lhes suceda as conseqüências advindas aos seus
antepassados, devido a seus pecados.
Na segunda seção, compreendida de 1:7 a 6:15, temos a descrição de sete visões do
profeta, assim distribuídas: Em 1:8-16, os cavalos de cores, relacionada à punição das nações e
bênçãos de Jerusalém; em 2:1-4, os quatro chifres e os quatro ferreiros, relacionada à punição
dos gentios; em 2:5-9, o homem com o cordel, relacionada à glória de Jerusalém; em 4:6-14, o
candelabro de ouro, as sete lâmpadas e as duas oliveiras, relacionadas à exaltação de Zorobabel
e de Josué, governador e sumo sacerdote; em 5:1-4, o rolo voando, relacionada à punição dos
ímpios; em 5:5-11, a mulher no recipiente, relacionada à iniqüidade de babilônia; em 6:1-8, os
quatro carros, relacionada à punição do norte.
Destacando as relações entre essas visões, Schökel e Diaz fazem as seguintes
observações:
As duas primeiras e as duas últimas têm por objeto os países estrangeiros que
maltrataram Judá. As três centrais preocupam-se pela restauração judaica. E tudo isso conflui na
quarta visão, a qual fala dos dois grandes dirigentes, político e religioso, do novo povo de Deus.
Todas as ilusões que os judeus alimentaram desde que partiram para o exílio encontram-se aqui
plasmadas: Deus torna-se benigno para com o seu povo, castiga seus adversários, enche de
glória Jerusalém, suprime os ímpios e concede a Jerusalém governantes dignos da nova situação.
33

Na terceira seção (caps. 7-8), destaca-se o conteúdo ético de Zacarias, em maior


tonalidade (7). Por outro lado, reitera as promessas de prosperidade para Jerusalém, ressaltando
a peregrinação dos gentios, no futuro, a Jerusalém, para glorificarem a Javé (8).
Quarta seção (caps. 8-14) trata de assuntos escatológicos: 1) A promessa de Jerusalém
restaurada. (8.1-23); 2). O reino emergente: (Zc 9.1-14.21) onde: O Messias triunfará (9.1-8); o
Rei chegará à cidade de Jerusalém (9.9-7 e 14.1-21); A promessa da pedra angular (10.1-12)
Um curto poema lírico (11.1-3); A parábola do bom pastor (11.4-14); A parábola do pastor
insensato (11.15-l7) A eliminação de todo mal no seio da cidade (13.1-9) e a vitória final.

B.2 - Mensagem de Zacarias

Como já mencionado, duas mensagens recebem destaque em Zacarias: a reconstrução do


templo, que abre caminho para um novo tempo de bênçãos para Judá (8:9-13) e ainda o novo
mundo, transformado por Javé, caracterizado pela punição dos inimigos de Judá e pela
restauração de Jerusalém.

33
Cf. Schökel & Diaz. Profetas II. Pg. 1177.

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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

O templo é o centro irradiador da fé em Javé e não pode ser desprezado na sua


importância. Sua reconstrução sinaliza o comprometimento e a volta do povo a Javé e as suas
Leis. Como esperado pelos antepassados, agora a ansiedade de que Judá seja constituída como
nação gloriosa, lugar da manifestação de Deus, recebe forma na mensagem escatológica, que
aponta para próximo estes dias. Nesse sentido, Gerar von Rad destaca a eloqüência de Zacarias:
“A hora da história da salvação a partir da qual falam Ageu e Zacarias é marcada por outro sinal:
a noite está avançada, vai despontar o dia. Com a construção do templo, começa o tempo da
salvação; o tempo privado da benção chegou ao fim, a benção – entendida no sentido muito
material da prosperidade agrícola – vai se manifestar logo (Ag 2:15-19), já começou mesmo a se
manifestar (Zc 8:10-12).

B.3 - A Justiça Social no Profeta Zacarias

Zacarias se inscreve na linha dos profetas antigos que denunciavam o culto vazio de vida
ética, a vida ausente da solidariedade e da misericórdia. Para esses profetas há uma contradição
entre a vida religiosa expressa nos cultos, com sacrifícios e ofertas, e um comportamento
indiferente ao próximo, injusto ou opressor sobre os mais fracos, sobre os quais os poderosos
constroem suas riquezas. A escatologia, ou seja, a mensagem acerca da restauração de
Jerusalém reclama também uma nova visão da organização da cidade que virá. É necessário,
desde já, que ela se paute nos valores do reino de Deus, entre eles, a justiça social.
Acerca do papel da justiça social em Zacarias, na quinta visão (5:1-4), José Luís Sicre
destaca o seguinte motivo do texto:
Em a nova Jerusalém não há lugar para ladrões e perjuros. A independência política é
importante. A distribuição e organização do poder, também. Mas não o é menos a instauração
da sociedade justa. “E dessa tarefa encarrega-se pessoalmente o próprio Deus, embora
imediatamente antes se tenha falado de dois poderes, religioso e político, na nova Juda”. 34
Ainda no capítulo 7, o profeta pontua o sentido de sua visão do futuro (da nova
Jerusalém): a conversão à justiça há que ser prioridade. O culto, por si só, não basta para
caracterizar a fidelidade a Javé. Veja:

Então, o Senhor dos Exércitos me falou: ‘Pergunte a todo o povo e aos


sacerdotes: Quando vocês jejuaram no quinto e no sétimo meses durante os
últimos setenta anos, foi de fato para mim que jejuaram? E quando comiam e
bebiam, não era para vocês mesmos que o faziam? Zacarias 7:4-6

Nessa fala, o profeta estava denunciando o caráter vazio dos cultos (jejuns e sacrifícios)
oferecidos por Judá. Quando o jejum não é acompanhado da vida autêntica, declarará o profeta
nos versos posteriores, é expressão de egoísmo, vazio e falso.

E a palavra do Senhor veio novamente a Zacarias: ‘Assim diz o Senhor dos


Exércitos: Administrem a verdadeira justiça, mostrem misericórdia e compaixão
uns para com os outros. Não oprimam a viúva e o órfão, nem o estrangeiro e o
necessitado. Nem tramem maldades uns contra os outros’. Zacarias 7:8-10

Como sempre, visto também nos outros profetas, há uma preocupação especial de Javé
para com os fracos da terra, alvos da opressão e da violência dos poderosos. Anunciando a nova
Jerusalém, Zacarias não pode deixar de sinalizar as características éticas predominantes naquele
lugar, que já hoje evidenciam como marcas da verdadeira vida de adoração a Deus.

34
Sicre, José Luís. A Justiça Social nos Profetas. Pg. 578.

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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

C - O LIVRO DE MALAQUIAS

Robert R. Wilson, acerca de Malaquias, testemunha que nem mesmo o nome do autor de
Malaquias nos é conhecido, sendo que o livro também não lança nenhuma luz sobre a natureza
das atividades proféticas desse autor.
Embora o livro receba nome que pareça próprio, trata-se de texto de autor anônimo.
‘Malaquias’, termo hebraico, significa, não nome próprio, mas palavra composta: de mal’aky,
‘meu mensageiro’. Esse termo aparece originalmente apenas em 3:1: “Vejam, eu enviarei o meu
mensageiro, que preparará o caminho diante de mim” Ml 3.1b. Posteriormente, o termo
apareceu em 1:1. naSeptuaginta, o termo surge realmente, e somente, como título.
Estudiosos do texto associaram o livro a Esdras, opinião que não vigorou, devido à falta
de bases mais sólidas. Schökel & Diaz argumentam que, na verdade, é preferível admitir que não
existem evidências claras acerca do autor do livro.
O mesmo não se pode dizer sobre de sua data. Para Schökel & Diaz, tudo indica que se
trata de texto escrito por volta do século V A.C., antes da reforma de Esdras e Neemias. Trata-se
de uma situação em que o povo se encontrava desesperançado, ao ver que as antigas promessas
(de restauração da glória de Israel) não se cumpriram. O resultado é uma apatia religiosa, uma
indiferença e falta de fé em Deus. Gerard von Rad sugere que se trata do período que se sucedeu
à mensagem de Ageu e Zacarias.

C.1 - Estrutura do Livro

O livro está dividido em seis seções:

1) De 1:2-5, o autor se vale do exemplo de Edom, invadido pelos árabes, para demonstrar o
amor de Deus por Israel. “‘Eu sempre vos amei’, diz o Senhor. ‘Mas vocês me perguntam’:
‘De que maneira nos amaste?’ ‘Não era Esaú irmão de Jacó?’, declara o Senhor. ‘Todavia
eu amei Jacó, mas rejeitei Esaú’”. 1:2-3b

2) Em 1:6 a 2:9, o profeta dirige sua denúncia aos sacerdotes pelo fato de que oferecem
sacrifícios relaxados diante do Senhor. O povo traz aos sacerdotes sacrifícios inadequados
que, por sua vez, aceitam tais sacrifícios como legítimos. A orientação da Lei era a de que
esses tipos de ofertas não fossem aceitas nos sacrifícios. Trata-se de um desleixo para
com o culto a Javé.
3) Em 2:10-16, temos os problemas dos casamentos mistos e o dos divórcios. No verso 11,
lemos acerca da infidelidade manifesta em casamentos com mulheres idólatras, que
estava ocasionando o enfraquecimento da fé judaica. Por outro lado, temos no verso 14 a
16 uma condenação ao divórcio, apresentando-o como infidelidade à Aliança: “‘Eu odeio
o divórcio’, diz o Senhor, o Deus de Israel”. O profeta apresenta a contrariedade de Deus
nas infidelidades à aliança estabelecida um dia entre um homem e uma mulher. Por
vezes, ‘o simples cansaço, o fastio, a paixão por outra mulher fazem com que o marido se
esqueça da primeira’ . Uma injustiça, portanto, tende a se estabelecer nessa relação, uma
vez que a iniciativa do divórcio era apenas do homem. Malaquias apresenta Deus como
defensor da parte mais fraca, isto é, da mulher.
4) Em 2:17 a 3:5, lemos acerca da resposta de Malaquias aos que duvidam da retribuição
divina. Destaca-se neste texto o cuidado de Deus acerca dos pobres e necessitados da
Terra: ‘Eu virei a vocês trazendo juízo. Sem demora testemunharei contra os feiticeiros,

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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

contra os adúlteros, contra os que juram falsamente e contra aqueles que exploram os
trabalhadores em seus salários, que oprimem os órfãos e as viúvas e privam os
estrangeiros de seus direitos, e não têm respeito por mim’, diz o Senhor dos Exércitos”.
Malaquias 3:5. Cumpre observar como os comportamentos contra os órfãos, as viúvas, os
estrangeiros pobres, os trabalhadores explorados, são colocados em paralelo ao
comportamento dos feiticeiros, adúlteros e contra os perjurários. Faz parte do desafio da
Teologia Bíblica atual recuperar a correta relação que existe entre o pecado e as atitudes
‘desumanizadoras do outro’. Destaque especial nota J. L. Sicre, acerca da defraudação
que se operava quanto aos salários retidos dos trabalhadores, questão já prevista no
Levítico 19:13: “Não reterás o salário do operário até o dia seguinte”. Em Malaquias, essa
atitude é transformada em injustiça grave, devendo ser questionada em qualquer
cidadão que a sustente.
5) Em 3:6-12, temos a justificação das más colheitas e da praga de gafanhotos,
relacionando-as com a displicência no tocante aos dízimos e ofertas requeridos. A
orientação do profeta é a de que as más colheitas e as pragas sejam suprimidas assim que
se regularizar-se o comportamento do povo nesse assunto.
6) Por fim, em 3:13 a 4:2, a profecia se dirige contra os que duvidam e caçoam da ação
divina em retribuir o bem com o bem e o mal com o mal. A profecia alerta para o ‘dia do
juízo’, em que se estabelecerá a divisão radical entre ímpios e justos. Vocês dizem: ‘É
inútil servir a Deus. O que ganhamos quando obedecemos aos seus preceitos e ficamos
nos lamentando diante do Senhor dos Exércitos? Por isso, agora consideramos felizes os
arrogantes, pois tanto prosperam os que praticam o mal como escapam ilesos os que
desafiam a Deus!’ Depois , aqueles que temiam o Senhor, conversaram uns com os
outros, e o Senhor os ouviu com atenção. Foi escrito um livro com memorial na sua
presença acera dos que temiam o senhor e honravam o seu nome. ‘No dia em que eu
agir’, diz o Senhor dos Exércitos, ‘eles serão o meu tesouro pessoal. Eu terei compaixão
deles como um pai tem compaixão do filho que lhe obedece. Então vocês verão
novamente a diferença entre o justo e o ímpio, entre os que servem a Deus e os que não
o servem’. Malaquias 3:14-18

Em 4:1-2, estabelece-se a escatologia da justiça, que reinaria sobre toda a terra. Após
denunciar os incrédulos que se valem da desesperança, dos que duvidam da retribuição divina
contra o mal, os opressores, os que agem perversamente contra os necessitados, os pobres e
fracos da terra, Malaquias anuncia o dia em que brilhará o ‘Sol da Justiça’, onde a escuridão da
opressão, da violência, da desigualdade e da humilhação será apenas passado, em um presente
em que Deus mesmo garantirá a qualidade das relações sociais, a partir da justiça.

O livro se encerra com um apêndice acerca da obediência da lei e da vinda de Elias, que na
verdade repete 3:1.

C.2 - Mensagem de Malaquias

Sellin & Fohrer, reiterando o contexto já enunciado acima, situam e esclarecem ainda
mais a mensagem de Malaquias no seu contexto:
A pregação é dirigida à comunidade, cuja expectativa do próximo advento da escatologia,
intensificada por Ageu e Zacarias, não se havia realizado e cuja profunda desilusão a esse
respeito se traduzia na indiferença e no desleixo em relação ao culto.

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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

Nesse sentido, a mensagem de Malaquias encontra destaque em anunciar ‘o juízo


como uma possibilidade que poderá tornar-se realidade a cada momento. O que
importa é preparar-se para este evento, cumprindo fielmente os deveres cultuais
e éticos, e manter a comunidade em estado de pureza. 35

Marcelo Moura da Silva, acrescenta:

O livro de Malaquias anseia pela justiça na vida do povo. Sua mensagem é confrontadora
das realidades sociais que fomentam os sistemas de injustiças. Reconhece que os problemas são
mais de ordem interna do que externa. Reconhece que o templo tem um papel fundamental no
estabelecimento da justiça e que os sacerdotes não devem estar comprometidos com outros
valores a não ser os da lei da aliança. 36
Temos, portanto, em Malaquias, um profeta ‘da linha dos antigos profetas’. Trata dos
problemas de seu tempo, tanto teológicos (como o tema do amor de Deus, da justiça divina e da
teologia da retribuição) como também os de ordem prática (como os elementos do culto, as
oferendas, os casamentos mistos, o divórcio e os dízimos).

35
Introdução ao Antigo Testamento. Vol 2. Pg. 711.
36
Silva, Marcelo Moura da. Malaquias, mensageiro da justiça. Dissertação de Mestrado. Universidade Metodista de São Paulo – Curso
de Pós-Graduação em Ciências da Religião. São Bernardo do Campo, 2004

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Introdução ao AT III – OS PROFETAS CEBESP

JOEL, OBADIAS E JONAS

A - O LIVRO DE JOEL

Da contemplação de uma praga de gafanhoto se origina a profecia de Joel, carregada de


diversas outras imagens da natureza: um cesto de figos, uma seca, um ramo de amendoeira. A
composição desse livro, no entanto, não traz as imagens tranquilas do campo, mas anúncios de
uma terrível realidade que virá.
Robert R. Wilson nos atesta de que ‘nada Se sabe da localização de Joel, sobre o seu
comportamento característico ou suas funções sociais.37
Pouco se sabe sobre o profeta. Seu nome significa “O Senhor é Deus”. Era judeu, possuía amplo
conhecimento da vida camponesa e propagou sua mensagem profética em Jerusalém. Um profeta de
qualidades poéticas, estilo claro e de vigor descritivo e conhecedor da cultura dos profetas anteriores.
como pano de fundo profético uma catástrofe sem precedentes que, em dias recentes, havia
assolado as imediações de Jerusalém – uma “praga de gafanhotos”. Tais acontecimentos
serviram como advertência de uma nova e maior castigo que afetaria a todos: O Dia do Senhor.
A Maioria dos críticos datam ser escrito no período pós-exílico, como sugere o texto de 4.2,3.
Teria sido escrito por volta dos séculos V a IV a.C.
A obra de Joel, por outro lado, deixa claro que ‘ele era judeu, que pregou em Jerusalém e
que possuía conhecimento bastante profundo da vida camponesa’.
Schökel & Diaz destacam que o autor possui grandes qualidades poéticas e uma grande
cultura acerca dos profetas que o precederam. Afirmam, ainda, que apesar de alguns estudiosos
atribuírem quatro autores ao livro de Joel, não há empecilhos para se considerar o livro como
uma unidade, elaborada por Joel em diversas etapas ou com vários retoques.

A.1 - Data de Composição

A data de composição de Joel não é unanimidade entre os estudiosos do texto. Schökel &
Diaz apresentam duas teorias consistentes, sendo que uma situa a composição do livro no
período final da monarquia e a outra teoria no período pós-exílico. Vejamos a fundamentação:
Em prol da teoria pós-exílica de composição, está o fato de que em Joel a) nunca se
menciona o rei; b) o sacerdócio goza de grande importância; c) em 4:2 há a idéia de que o exílio
já aconteceu; e) em 4:6 há menção dos gregos; f) a linguagem está carregada de aramaísmos; g)
o reino do norte nunca é citado (no pós-exílio, Israel é apresentado como sinônimo de Judá); h)
embora exista a menção de diversos países estrangeiros, os assírios e babilônios, grandes
inimigos no período pré-exílio não são mais mencionados; i) existem ao menos 27 textos
paralelos a outros autores do AT, o que indica que Joel é quem tenha copiado de seus
predecessores.
Em prol da teoria pré-exílica de composição, Schökel & Diaz apresentam os seguintes
argumentos: a) a linguagem de Joel é característica do último período da monarquia mais do que
do período pós-exílio; b) existe uma relação com Sofonias e Jeremias tão profunda que dá a
entender que são contemporâneos; c) há a falta de menção de figuras centrais do período pós-
exílio, que são os levitas e sacerdotes.

Os precitados autores tendem a situar a composição do livro no período pós-exílico,


alegando ser essa uma sugestão do livro (4:2-3). Teria sido escrito por volta dos séculos V a IV
A.C.

37
Wilson, Robert R. Profecia e Sociedade no Antigo Israel. Pg. 262.

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A.2 - Conteúdo e Estrutura do Livro

O ponto de partida de Joel é a terrível praga de gafanhotos que assola a nação (1:2-13). O
profeta descreve as imagens fielmente, distinguindo, inclusive, os tipos de gafanhotos (ele cita o
gafanhoto cortador, o gafanhoto migrador, o gafanhoto devorador e o destruidor), como se
sucediam as nuvens invasoras e ainda os efeitos destruidores sobre as plantas.

Ouvi isto, vós, anciãos, e escutai, todos os moradores da terra: aconteceu isto em vossos dias, ou
também nos dias de vossos pais? (...) O que ficou do gafanhoto cortador, comeu-o o gafanhoto
migrador; o que ficou do gafanhoto migrador, comeu-o o gafanhoto devorador; o que ficou do
gafanhoto devorador, comeu-o o gafanhoto destruidor. (...) os seus dentes são dentes de leão, e têm
presas de leoa. Fez da vide uma assolação, e tirou uma casca da minha figueira. Despiu-a toda, e a
lançou por terra (...) a colheita do campo pereceu. A vide se secou, a figueira murchou; a romeira
também, e a palmeira e a macieira – todas as árvores do campo – se secaram. A alegria se secou entre
os filhos dos homens” (1:2, 4, 6b, 7, 11.b, 12).

Em uma cultura que depende da agricultura, significa uma catástrofe nacional, fome e
miséria chegando. A descrição é a de destruição completa das culturas de alimentação de Israel!
Somando-se a isso, o profeta ainda descreve outra tragédia terrível – a seca: “Também
todos os animais do campo suspiram a ti; os rios se secaram, e o fogo consumiu os pastos do
deserto” (1:20). Essas imagens são usadas por Joel, como prenúncio de algo pior ainda – o Dia do
Senhor: “Ai do Dia! Pois o dia do Senhor está perto, e virá como assolação da parte do Todo
Poderoso” (1:15).
A descrição seguinte apresenta uma confusão acerca do que seria nuvens de gafanhotos
ou exércitos estrangeiros: “Como o estrondo de carros sobre os cumes dos montes vão eles
saltando, como o ruído da chama de foto que consome o restolho, como um povo poderoso,
posto em ordem de combate” (2:5).
Prosseguindo na lógica da visão, Joel insiste na interpretação das catástrofes à direção da
nação: conclama todos ao arrependimento, conversão profunda, busca da misericórdia divina.

Ainda assim, agora mesmo diz o Senhor: Voltai para mim de todo o vosso coração, com jejuns, com
choro e com pranto. Rasgai o vosso coração, e não as vossas vestes. Voltai para o Senhor vosso Deus,
porque ele é misericordioso, e compassivo, e tardio em irar-se, e grande em amor, e se arrependerá
do mal. Joel 2:12-13.

A resposta apregoada pelo profeta é o cume do livro. Deus promete libertar o povo da
praga, da seca e dispõe novamente as bênçãos sobre a terra. Então o Senhor teve zelo de sua
terra e se compadeceu do seu povo. O Senhor responderá ao seu povo: Eu vos envio o trigo, o
vinho novo e o azeite, deles sereis fartos, e não vos entregarei mais ao opróbrio entre as nações.
Joel 2:18-19.
No capítulo 3 (ou 3 e 4, segundo as versões católicas), Joel desenvolve ainda três temas:

1) Os sinais no céu e na terra.


2) A salvação de Judá (3:5; 4:16b), manifestada na dimensão política, na libertação dos
estrangeiros (4:17) e na dimensão econômica, na prosperidade e bem-estar do país (4:18).
3) A condenação das nações estrangeiras que dispersaram e oprimiram o povo. Serão julgadas
no Vale de Josafá (ou Vale da Decisão).

A.3 - A mensagem de Joel

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A mensagem acerca do ‘Dia do Senhor’ recebe matizes diferentes entre os profetas. Era
evocada, principalmente, diante de catástrofes enfrentadas por Judá. Como interpretar as
guerras em que houve derrotas, ou as calamidades na natureza (como a seca, que destruía a
economia como um todo, vitimando, sobretudo, os mais pobres), ou ainda o exílio que
escravizou a maior parte da nação? A resposta dada pelos profetas, em sua maioria, foi de que
tais catástrofes eram, geralmente, conseqüência do desapego do povo a Javé, do
descumprimento da lei, dos pecados da monarquia e das injustiças cometidas contra as pessoas
mais fracas dentre o povo. É nesse sentido que se insere a profecia de Joel: uma interpretação do
que julgou ser o ‘Dia do Senhor’.
Acerca de sua mensagem principal, Schökel & Diaz destacam que sua apreensão depende
da opção de data de autoria que se faz. De qualquer forma, apontam para duas possibilidades
relacionadas às opções de datas escolhidas:
No caso do profeta Joel ter profetizado nas últimas décadas da monarquia, Joel participa
dos que prenunciam o ‘Dia de Javé’, junto com Sofonias e Jeremias. Enquanto para Jeremias, as
calamidades presenciadas em seu contexto sinalizam o ‘Dia do Senhor’ (Jr 14:1-15, 9), para o
qual não há mais solução (pois Deus se recusara a perdoar, e o castigo representado pelo exílio
babilônico é certo e irreversível) e enquanto para Sofonias, esse dia representa julgamento e
destruição, embora caiba buscar o arrependimento, a justiça e a humildade (Sf 2:3), para Joel,
esse dia é também terrível, mas não sinalizador de que a compaixão e a benevolência de Javé
acabaram. Em 2:13, o profeta exorta a busca profunda e sincera de Deus, amparado na confiança
de sua misericórdia e compaixão. Em outras palavras, as catástrofes apontadas no livro não são,
necessariamente, sinais de catástrofes maiores que viriam. No fim, seria a benção e a
prosperidade de seu povo que se sobressairia!
Em outra perspectiva, de que o período de escrita de Joel se encontra no século V,
quando já ocorreu a queda de Jerusalém, a desaparição da monarquia e o exílio, quando as
esperanças de que as palavras dos profetas da antiguidade tivessem caído no vazio, a profecia de
Joel cumpre o papel de resgatar as esperanças em Javé. É profeta realista, pois, descreve as
catástrofes como cumprimento profético, mas acompanhada, de esperanças de que toda a
situação sofreria reversão. Nesse sentido, termina o livro com descrição escatológica da bênção
que virá:

Então vocês saberão que eu sou o Senhor, o seu Deus, que habito em Sião, o meu
santo monte. (...) Naquele dia os montes gotejarão vinho novo; das colinas
manará leite; todos os ribeiros de Judá terão água corrente. Uma fonte fluirá do
templo do Senhor e regará o vale das Acácias. Joel 3:17-18

B - O LIVRO DE OBADIAS

O livro de Obadias, constando de apenas 21 versos, pertence ao grupo de textos que


proferem sentenças negativas contra nações estrangeiras. De forma mais específica, Obadias
se concentra em denunciar e prever o castigo que recairá sobre Edom.

Um mensageiro foi enviado às nações para dizer: Levantem-se! “Vamos atacar Edom”. Veja! Eu tornarei
você pequeno entre as nações. Será completamente desprezado! (...) Naquele dia, declara o Senhor,
destruirei os sábios de Edom, e os mestres dos montes de Esaú. Então os seus guerreiros, ó Tema,
ficarão apavorados, e serão eliminados todos os homens dos montes de Esaú. Obadias 1.b-2, 8-9

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As visões de Obadias contra Edom ainda descrevem os mais terríveis sofrimentos que lhes
seriam impostos: saques, pilhagens, destruição, queda, vergonha, esquecimento, fogo, desterro,
eliminação completa! Obadias está inspirado por uma visão de ruína para Edom. Pergunta-se:
Por que motivo? Como explicar esta singularidade?
A resposta está dentro do próprio livro: há uma mágoa histórica, gerada pela participação
de Edom no dia, pelo fato de que Edom, nos dias em que a Babilônia conquistava e exilava Judá,
Edom não somente se alegrou e comemorou por esse fato, como também participou dos saques
feitos a Judá. Obadias 10-14

Por causa da violenta matança que você fez contra o seu irmão Jacó, você será coberto de vergonha e
eliminado para sempre. No dia em que você ficou por perto, quando estrangeiros roubaram os bens
dele, e estranhos entraram por suas portas e lançaram sortes sobre Jerusalém, você fez exatamente
como eles. Você não devia ter olhado com satisfação o dia da desgraça de seu irmão; nem ter se
alegrado com a destruição do povo de Judá; não devia ter falado com arrogância no dia da sua aflição.
Não devia ter entrado pelas portas do meu povo no dia da sua calamidade; nem devia ter ficado alegre
com o sofrimento dele no dia da sua ruína; nem ter roubado a riqueza dele no dia da sua desgraça. Não
devia ter esperado nas encruzilhadas, para matar os que conseguiram escapar; nem ter entregado os
sobreviventes no dia da sua aflição.

As relações entre Judá e Edom, na verdade, são explicadas historicamente. Já a relação


entre Jacó e Esaú (de quem originar-se-ia Edom) foram expressas sob a forma de conflito, desde
os patriarcas (Gn 27). Mais proximamente, parece que como causa central do conflito destaca-se
a conquista e sujeição, por Davi, dos territórios edomitas (II Samuel 8.13ss). O profeta Ezequiel
(35:5) fala, em sua profecia contra Edom, de uma mágoa antiga que não fora perdoada por
Edom, que pode bem ser esta, a do domínio davídico de seus territórios. Amós, nessa mesma
direção, destaca que Edom ‘... guardou para sempre a sua ira, sufocando a sua misericórdia...’
(1:11), expressão que sugere a dificuldade gerada pela mesma experiência de sujeição.
Esses motivos explicariam as atitudes de Edom, por ocasião da conquista babilônica de
judá: Edom voltou as coisas contra Israel, comemorou seu exílio e ainda participou dos saques.

B.1 - Data de Composição

Schökel & Diaz fazem preferência em situar a composição do livro de Obadias durante o
período do exílio ou nos primeiros anos do pós-exílio. Opta-se pela data pelas referências à
queda de Jerusalém e pela punição a Edom. A essa opinião, soma-se da de Robert Wilson,
situando-o possivelmente depois da queda de Jerusalém, embora também afirme o fato de a
questão acerca da data ainda estar aberta. Mas há ainda outros teóricos que situam o texto no
século V A.C. Na verdade, o número de teorias acerca da data expandem a possibilidade de
composição estar situada desde o século IX até o século III A.C.

B.2 - Mensagem do Livro

Schökel & Diaz ressaltam o grande mal-estar sentido provocado pelo livro de Obadias, no
que toca a seu desejo de vingança contra Edom, pautado na lei do Talião ‘Olho por olho, dente
por dente’, sobretudo quando considerada a violência usada por Davi contra esse povo, que
ocasionou grande mágoa histórica (Davi... ‘matou todos os varões de Edom’ I Reis 11.15). No
entanto, destaca o fato de que, mais que uma mensagem de vingança, Obadias aponta para a
realidade de que a incapacidade de esquecer erros antigos acaba por gerar uma aspiral de
violência que volta contra si mesmo. Para complementar ainda essa mensagem, sugerida por

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Obadias, os autores destacam as promessas expressas de restauração contidas no livro, que


demonstrariam a fidelidade de Deus.
Já o biblista Milton Schwantes 38 não se contenta em extrair de Obadias apenas a imagem
das conseqüências geradas pela violência amalgamada na memória ou a esperança repetida no
livro. Em sua ‘Introdução a Obadias’, Schwantes aponta para as seguintes possibilidades de
leitura do livro:
Construtor da auto-estima perdida durante a sujeição tanto à Assíria, em 722 A.C, bem
como à Babilônia, em 587 A.C. Tais experiências exerceram uma gigantesca pressão psicológica
sobre a identidade de Judá, pelo que era necessária a voz profética a afirmar que mesmo Edom
seria castigada por ter se alegrado com a ruína de Judá. Trata-se, portanto, de uma expressão de
quem se levanta do pó para a continuidade da existência, através da capacidade de olhar para o
inimigo e afirmar que a situação não significa derrota ou destruição, mas parêntesis histórico que
será superado a seu tempo.
Em segundo lugar, Schwantes destaca o fato de que o livro aponta como motivos da
destruição de Edom, não somente o fato de que se alegraram na ruína de Judá, mas por estarem
repetindo os mesmos comportamentos que fez Judá cair.

E, de fato, se a gente verifica por que Edom cairá em ruínas, então se vê que as razões de seu fracasso
são idênticas às que os profetas mencionam para explicar por que os poderosos de Israel e Judá cairão
aos pedaços. Edom sucumbirá, porque desrespeita sua ‘pequenez’ (v. 2). Vai à guerra contra as
“nações” (v. 1). E nisso atesta sua falta de sabedoria (v. 7-8). Confia em seus “tesouros escondidos” (v.
6), na soberba de seu “coração”, isto é, concretamente confia em sua estratégia de defesa militar, pois
está escondida entre os montes (v. 3). Entende-se como “águia” inatingível (v. 4), segura e bem
protegida por seus sistemas de alianças militares (v. 7).

Em terceiro lugar, Schwantes destaca para o fato de que a Edom está se dizendo que não
fugirá da ação divina. Edom é fugitiva, e é nessa relação que se deve ler o texto: “Estas
afirmações radicais sobre Edom são conseqüência de uma ação anterior. O v. 15, no centro do
livro, afirma: “como tu fizeste, assim se fará contigo”. O que vai, volta”. Em outras palavras, não
há fuga do mal, quando Deus é Aquele que estabeleceu a vingança contra ele.

Por fim, Schwantes destaca a esperança de restauração, já trabalhada por Schökel & Diaz:

Nestes tempos posteriores, não só era decisivo acolher fugitivos e deportados no


Sião (v. 17), mas principalmente retomar a herança da terra. O assunto principal
nos v. 17-21 é a posse da terra. O exílio a havia feito cair em mãos de povos
vizinhos, inclusive e talvez em especial na mão de edomitas. A profecia celebra,
pois, a retomada desta terra. 39

Mas o aspecto mais iluminador na fala de Milton Schwantes se deve à sua percepção de
que, à semelhança das profecias bíblicas contrárias ao próprio Israel e Judá, condenava-se na
maior parte das vezes, não o povo como um todo, mas aos malignos opressores da Terra. Nesse

38
Schwantes, Milton. Sobrevivências – Introdução a Obadias. In: CROATTO, J. S. et al. Os Livros Proféticos: A Voz dos Profetas e suas
Releituras, RIBLA n. 35/36.. Pg. 191.ss. Veja ainda in: Schwantes, Milton - Sobrevivências - Introdução a Obadias. In: Instituto

39
Schwantes, Milton. Sobrevivências – Introdução a Obadias. In: RIBLA Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americano. OS
LIVROS PROFÉTICOS: A V O Z D O S P R O F ETAS E SUAS RELEITURAS. Nº: 35-36. Pg. 191ss.

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sentido, “... Obadias não tem em mente o Edom como uma quantia de pessoas, mas antes se
refere ao Edom conquanto impiedosos valentões e matadores”.

C - O LIVRO DO PROFETA JONAS

Poucos livros bíblicos são objeto de polêmica quanto o livro do profeta Jonas. No entanto,
a mensagem teológica dessa obra é profunda e atual, merecendo uma atenção especial de nossa
parte.

C.1 - Data de Composição

No cânom hebraico, Jonas está localizado entre o livro de Obadias e o de Miquéias,


situando, portanto, o livro em meados do século VIII A.C., bem como identificando-o como o
personagem narrado em 2 Rs 14:25.

Foi ele que restabeleceu as fronteiras de Israel desde Lebo-Hamate até o mar da
Arabá, conforme a palavra do Senhor, Deus de Israel, anunciada pelo seu servo
Jonas, filho de Amitai, profeta de Gate-Héfer.
Apesar disso, o entendimento moderno acerca da confiabilidade da organização
cronológica do canom hebraico é a de que não pode ser tomada como histórica. A data mais
provável, tendo em conta a mensagem do livro, é a de que seja um texto pós-exílio. Tem sido
apontada temática semelhante à de Joel e de Jeremias. Há também quem aponte uma relação
entre Esdras e Neemias, situando o texto no século V A.C. e, ainda, alguns que situem o livro no
século VI A.C. Claro, no entanto, é que a redação final de Jonas se processou antes do II século
A.C. , uma vez que já nesse período, a lista dos doze profetas já estava pronta.

C.2 - Interpretações de Jonas

O livro trata do chamado de Jonas, por Deus, a pregar o arrependimento e a conversão a


Nínive, uma nação reconhecida por suas crueldades. Jonas se nega a atender o apelo de Deus, e
foge para Tarsis, embarcando em um navio. Dentro do navio, nota o mar revoltoso, bem como
toda uma tripulação inquieta por ver a proximidade de um naufrágio.
Religiosos, os marinheiros consultam seus oráculos e entendem que Jonas é o culpado,
diante da divindade, por aquela perturbação marítima. Jonas concorda e se dispõe a ser atirado
do navio. É engolido por um grande peixe e sobrevive durante três dias em seu interior. Se
arrepende, dispondo-se a pregar a Nínive. Lá chegando, anuncia a mensagem e espera, ao final,
que o povo não atenda seu apelo. No entanto, Nínive atende. Jonas, frustrado, questiona a Deus,
tendo dele sua resposta, que vem a constituir a mensagem central do texto.

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Como já assinalado, este livro não goza de unanimidade em sua interpretação. São
apresentadas pelos estudiosos diversas possibilidades. No elenco dessas, figuram três teorias
principais, que recebem maior destaque, a saber, a alegórica, a histórica e a que vê no texto uma
parábola teológica. Vejamos:

C.2.1 – Histórica

Trata-se da interpretação que toma o livro como descrição de fato histórico concreto. É a
opinião que é sugerida dentro do próprio texto, quando identifica o profeta como personagem
concreto (Jonas, filho de Amiti, Jn 1:1), bem como parece ser a visão de Jesus em Mt 12:38ss e Lc
11:29ss. Observa-se tal opinião no biblista Robert R. Wilson, usado como referência na
construção deste texto.
No entanto, essa posição enfrenta dificuldades sérias de aceitação. O livro de Jonas
parece ter recebido forte influência de Joel e de Obadias, que são textos posteriores ao século
VIII. Portanto, o Jonas de II Rs 14:25 não tem nada a ver com o Jonas desse livro, visto que
durante o Reinado de Jeroboão II, Nínive não era a capital da Assíria. Por outro lado, existem
dificuldades no que toca a arqueologia: a dimensão de Nínive ultrapassa os limites
historiografados; não há nenhum relato histórico de conversão de Nínive à religião israelita; o
‘grande peixe’ descrito no livro não pode ser identificado pelas pesquisas atuais.
Ainda que tenham existido uma série de tentativas para contornar esses problemas,
continuam não resolvendo adequadamente sua historicidade. Além disso, como ressalta Gerard
von Rad, a preocupação em se provar a historicidade do livro de Jonas acabou por ofuscar a sua
mensagem principal:

Em todo caso, desde que se começou a duvidar de que um homem pudesse ter
realmente habitado num peixe, procurou-se explicar a realidade do
acontecimento; este acontecimento secundário passou a figurar em primeiro
plano e a afirmação mais simples deste livro perdeu toda sua força.40

C.2.2 – Alegórica

A interpretação alegórica é outra que fez tentativa de ler inteligivelmente o texto de


Jonas. A estratégia desta leitura é uma alegorização de cada elemento do livro. Vejamos:
Nínive é entendida como um símbolo do mundo gentio; Jonas é entendido como sendo
Israel, recusando-se a cumprir sua tarefa missionária; o grande peixe é interpretado como o
exílio, resposta à desobediência; a segunda chance de Jonas é interpretada como a nova
oportunidade dada por Deus, após o exílio; o mal-estar de Jonas é interpretado como sendo a
indisposição de Israel em aceitar o perdão gratuito de Deus oferecido aos gentios.
Apesar dos esforços em ligar cada detalhe da narrativa à uma interpretação alegórica,
percebe-se a arbitrariedade dessa corrente interpretativa. Ficam como desafios de interpretação
as imagens da mamoneira (A planta (qîqāyôn) pode ter sido uma planta de mamona
(Ricinuscommunis), que cresce rapidamente em climas quentes a uma altura de 12 pés (*quase 3 metros)
e tem grandes folhas. Ela facilmente se murcha se o seu caule está ferido. Por isso, algumas traduções
usam ABOBOREIRA e outras MAMONEIRAS), a espontaneidade de Jonas em que lhe atirem no mar
(Israel não quis ir, espontaneamente, ao exílio) e, ainda, o significado dos marinheiros no texto.
São imagens cujas interpretações não alcançam razoabilidade.

40
In: Teologia do Antigo Testamento. Pg. 280.

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C.2.3 – Parábola

Gerard von Rad destaca o fato de que, para uma compreensão adequada do livro de
Jonas, há que se examinar seu estilo literário e a forma de sua mensagem.
Para o autor, a possibilidade de análise adequada e identificação do estilo literário de
Jonas, é fato recente: Somente a ciência bíblica recente, que restituiu as muitas passagens do
Antigo Testamento as forma que tinham quando não eram ainda textos bíblicos, fez desaparecer
toda espécie de crispação e nos ensinou a ver esse livro tal como deve ser visto, isto é, conforme
à sua natureza: como um relato de caráter didático fortemente acentuado, que precisa ser lido
de forma diferente de uma narração histórica.
Nessa trilha caminham Sshökel & Diaz, afirmando ser a interpretação mais consistente
atualmente para o texto de Jonas a que vê no relato uma narração parabólica, uma narrativa
com fins didáticos. Nessa interpretação, o importante a ser considerado é a mensagem a que o
livro pretende anunciar. Necessário se torna, no entanto, reconhecer, que mesmo essa não é
unânime entre os estudiosos. Alguns apresentam como tema principal a relação entre eleição e
universalismo. Outros, a atitude israelita frente aos povos gentios (sob a forma de condenação
desse comportamento). Ainda outros, acreditam que o texto é uma explicação de por que Deus
não destruiu Nínive após ter prometido que o faria. Por fim, existem aqueles que vêem no livro
um texto teológico acerca da atividade missionária. Fora de dúvida estão as relações
apresentadas no livro acerca do universalismo, a crítica ao nacionalismo e à xenofobia do
período pós-exílico. Deus exerce sua misericórdia a todas as nações e povos, não discriminando
entre israelita e gentio!

C.3 - Mensagem de Jonas

A relação entre Israel e as outras nações descritas no Antigo Testamento não são
unívocas. Encontramos proibições ao estabelecimento de alianças entre Israel e as nações
estrangeiras; proibições à troca de cultura com essas nações, bem como condenações severas a
várias delas (como descritas em Joel, Obadias, Naum e Habacuc). O livro de Esdras e Neemias
reflete uma tensão muito grande entre Israel e os estrangeiros. Por outro lado, na Torá observa-
se também a recomendação a que se pratique a misericórdia em relação aos migrantes
estrangeiros que habitam em Israel (pessoas pobres, que ali procuram proteção). Nessa direção,
o livro de Rute pode ser interpretado como uma apologia contrária ao preconceito nacionalista e
religioso, em suas descrições ternas e heróicas de Rute, mulher de Moabe, de quem descendeu o
rei Davi. O texto constitui elogio não somente à Rute, mas também à sua irmã Orfa, embora o
apego dessa última à Noemi não tenha sido o mesmo que o de Rute.
O livro de Jonas caminha nesta direção teológica: trata da relação entre Israel e as nações
estrangeiras e, mais particularmente, a relação entre Deus e a grande Nínive. A escolha de Nínive
para ilustrar a relação não é arbitrária. Nínive é a capital do império assírio desde o rei
Senaqueribe, representando, portanto, não apenas para Israel, mas para os que viviam sob o
império, o imperialismo arbitrário, desumano e cruel para com os povos (Veja Isaías 10:5-15,
Sofonias 2:13-15 e Naum). Nínive, portanto, representa muito mais do que os povos
estrangeiros: simboliza os opressores de todos os tempos.
E é a esses que Jonas é endereçado para pregar a conversão e o perdão de Deus! A
implicação da mensagem é clara: o amor de Deus dirige-se até mesmo aos opressores, desejando
sua conversão, arrependimento e transformação. Destaque importante no livro é o de que o
arrependimento apregoado por Jonas, mesmo que contra sua vontade, foi alcançado. E que o
chamado ao arrependimento visava não a uma troca de religião, mas a uma mudança no que

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toca à ‘sua má vida e às suas ações violentas’. Os males a que se refere o texto, segundo Sshökel
& Diaz, referem-se às mais diversas práticas de injustiças sociais (da palavra hamas). Trata-se de
uma nação opressora.

Cubram-se de pano de saco, homens e animais. E todos clamem a Deus com


todas as suas forças. Deixem os maus caminhos e a violência. Talvez Deus se
arrependa e abandone a sua ira, e não sejamos destruídos. Tendo em vista o que
eles fizeram e como abandonaram os seus maus caminhos, Deus se arrependeu e
não os destruiu como tinha ameaçado. Jonas 3:8-10

Essa é uma imagem paradoxal no texto. Não há referência a uma mudança de religião,
mas de comportamento. Isso converge, na verdade, com a mensagem profética, ao longo da
tradição bíblica, que insistia, mais que em uma reforma cultual, mística, na transformação do
comportamento do ser humano para com os outros. O abandono da maldade e da indiferença,
para a prática da justiça e da misericórdia. (Vd. Isaías 1:10-20).
Temos, portanto, no texto, duas imagens apelativas: uma a que Nínive, bem como todos
os opressores deste mundo, se converta a Deus, de suas práticas desumanas.
A segunda imagem refere-se a Israel, bem como a todos os oprimidos e os que lutam por
libertação neste mundo: há que se aceitar que o amor de Deus seja estendido a todos, inclusive
aos mais cruéis opressores deste século.
Parte da história de Israel, segundo a narrativa bíblica, esteve envolvida em tensões
contra nações opressoras: o Egito, a Assíria, a Babilônia, a Grécia e Roma. Trata-se de uma nação
que vivera sempre na expectativa da ameaça estrangeira, das grandes potências, com suas
crueldades e desumanidades. O sentimento natural advindo desse tipo de história é,
obviamente, o medo, o ódio e a indiferença. E é isto que vemos em Jonas: ele confessa, ao final
do texto, que se nega a ir anunciar o arrependimento a Nínive, não porque temia ser retaliado
pelos ninivitas, mas porque desejava profundamente que Deus os destruísse. O temor de Jonas
era o de que Deus os perdoasse e que ele tivesse que colaborar com isto.
Como conciliar o livro, sobretudo quando comparado com textos que denunciam a
opressão e ainda clamam pela vingança divina contra o opressor? Eis a grande contribuição do
texto de Jonas: apesar dos pecados dessa nação, os que nela habitam ‘são mais de cento e vinte
mil homens, que não sabem distinguir entre a direita e a esquerda’ (4:11). Não se nega o pecado
nem a opressão, mas faz-se relevante aqui a responsabilidade da estrutura geradora
do pecado, que torna até mesmo o opressor em uma vítima não completamente consciente do
mal que pratica! Nesse texto, o mal não é uma escolha livre do ser humano, mas o resultado de
uma estrutura vitimadora. Mesmo como opressores, não se pode negar a sensibilidade de que
nem sempre o opressor o é por decisão sua, mas, muitas vezes, devido à estrutura performadora
que o circunda. No caso de Nínive, e não menos no caso da organização social, política,
econômica e religiosa de nossos dias, importa reconhecer que, muitos dos que agem mal, e que
estão dentro de uma ‘Nínive’, não sabem discernir entre ‘o bem e o mal, a direita e a esquerda’!
Jonas fala a todos os envolvidos nos processos de mudanças da realidade, a todos os que
sonham com um mundo melhor: cuidado para não cair no dualismo, que vê o opressor apenas
como opressor e o oprimido apenas como inocente. Nesse livro, os opressores são vistos em
suas incapacidades de discernir corretamente o mundo, e, Jonas, representante de
Israel, povo oprimido pelas nações, é visto como alguém que se fechou de tal maneira em seu
ódio e mágoa, que não consegue mais admitir que Deus deseje muito mais a restauração
e salvação do que a vingança contra os opressores!

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao final deste curso, cumpre fazer uma revista sobre tudo o que foi dito. Antes, porém,
importa fazer menção às formas pelas quais os profetas podem ser lidos, bem como acerca das
implicações que cada forma acabará por gerar. Para tanto, faremos uso da análise do biblista
Airton José da Silva, que em sua obra ‘Nascido Profeta’, distingue diversas formas de leitura.

a) Há os que vêem nos profetas pessoas videntes, que conheciam o futuro. Desta forma,
procuram nos profetas tão somente predições acerca de nosso presente ou para o futuro.
No entanto, vemos que os profetas, ainda que falassem acerca do futuro, estavam muito
mais engajados com suas realidades temporais, procurando as mudanças para seus
contextos, do que propriamente com o futuro.
b) Há os que viram nos profetas mananciais de doutrinas. Buscam, portanto, na profecia,
material para elaboração de idéias teóricas acerca da realidade, sem tocarem em seus
aspectos materiais e práticos. No entanto, vemos que os profetas não são teóricos de
gabinetes, enfurnados em bibliotecas. São homens extremamente práticos, preocupados
com estratégias de vencer o mal que sejam eficazes e aplicáveis.
c) Há também os que vêem nos profetas pregadores da moral. Os que assim interpretam
procuram em suas palavras fontes para continuar a estabelecer moralidade, guias de
conduta, regras de comportamento, no sentido de certo ou errado, bom ou mal. No
entanto, vemos que os profetas espiritualizam toda a existência, não apenas parte dela, e
afirmam que, mais importante do que uma vida estreitamente moral, é uma vida de
serviço, compaixão e misericórdia.
d) Outra forma de interpretar esses textos se dá no dualismo ou espiritualismo. Trata-se da
divisão do mundo em sagrado ou profano, espiritual ou carnal, divino ou diabólico. Nesta
forma de ver, a maior contribuição que os profetas poderiam nos dar é a de nos ensinar a
reproduzir o ritualismo, ou a nos fazer concentrar tão somente nos cultos de ‘louvor e
adoração’. No entanto, os profetas nos revelam que a espiritualidade só é verdadeira
quando ela se exterioriza em ações concretas em prol dos seres humanos. ‘Misericórdia
quero, e não holocaustos’, afirma Javé.
e) Outra forma de ler os profetas é a romântica/teológica, que defende que só o texto
bíblico pode nos orientar em soluções para o presente contexto. No entanto, observamos
hoje que, mais importante do que aplicar as soluções concretas que o texto bíblico deu
aquele contexto, importa nos apegarmos à essência de suas mensagens, traduzindo e
adaptando ao nosso contexto, de acordo com nossas dificuldades, desafios e
possibilidades.

Ressaltadas essas possibilidades interpretativas, cumpre destacar os tópicos principais


explorados em nosso curso: Os profetas bíblicos surgem por volta do século VIII A.C, quando a
Assíria estava se estabelecendo como império sobre toda a mesopotâmia. Os poderosos de Israel
e Judá assumem, nesse contexto, ora por um comércio crescente, cheio das tentações do lucro,
ora por opressão da potência estrangeira, uma posição de opressão e violência ao povo da terra.
Aliançados entre si, reis, nobres, ricos latifundiários, juízes, profetas e sacerdotes, se armam para
tirar dos pobres da terra suas propriedades e seus patrimônios. Os profetas se levantarão,
afirmando que, mais do que a um culto regular e rigoroso, Deus se importa com a espiritualidade
prática, com a justiça e a misericórdia, com o cuidado dispensado aos mais fracos, como viúvas,
órfãos, pobres e estrangeiros pobres.

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Os textos proféticos acentuam claramente a ação dos reis em destruir as tradições de


solidariedade, em prol do lucro, do novo comércio emergente, do uso que se faz do poder para a
opressão.
Os profetas se levantam contra esse tipo de existência, que tem no sofrimento do outro
apenas uma escada para alcançarem seus próprios objetivos. Desigualdade social, opressão,
desemprego, pobreza são temas teológicos, que os profetas souberam explorar muito bem.
Os profetas denunciam a absoluta distância entre uma religião nominal, que servia
apenas para acalmar mentes e consciências, sem ministrar transformação social alguma.
Denunciam, ainda, a idolatria cultual, política e materialística: os poderosos da terra estão vendo
no dinheiro – conquistado violentamente – uma dimensão humana à qual vale a pena se dedicar
inteiramente. Esquece-se de Javé, exatamente porque Javé é Deus libertador e exige que todos
os seus assim sejam também.
O resultado desse tipo de vida foi o exílio, que acabou por criar novas crises espirituais e
teológicas, inclusive para os profetas. Foram experiências de profundo sofrimento que agora
acabaram por gerar dúvidas maiores, capazes de fazer desfalecer a fé em Javé, mas Deus oferece
sua palavra a fim de que fossem restaurados da sorte do exílio.
A partir da leitura dos profetas destacamos que a profecia vai muito além do mero
espiritualismo, moralismo, idealismo ou romantismo. Os profetas são pessoas que estão
profundamente engajadas com a existência concreta, anunciando sempre a necessidade de
conversão e o exercício de atitudes concretas para que o e a esperança de que o mundo possa
ser diferente.
Para os profetas, o mal existe, mas não como ser fantasmagórico, que não pode ser
tocado ou alterado. O mal, na profecia, tem nome: idolatria e injustiça, que consiste no
abandono de Javé e de suas ordenanças humanizadoras, bem como na prática da opressão,
frieza e indiferença social.
Em geral, a profecia termina com palavras de esperança. Para os profetas sempre
existirão pessoas que resistirão ao mal, sendo capazes de operar mudanças sociais gigantescas. A
esperança é a marca do fim da profecia. Javé construirá uma nova Jerusalém, uma nova
realidade, um novo mundo. Isto tudo nos revela a essência de seu significado: a realidade não é
do jeito que é porque Deus quer assim. Está assim, ou por indiferença dos bons em relação ao
poder dos maus, ou porque ainda não acreditamos que ela possa ser diferente.
Mas, o mundo pode ser melhor. Deus mesmo é seu construtor, através da fé e esperança de
todos os Oséias, Miquéias, Amós, Isaías e Jeremias de nosso tempo.

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DADOS DOS VÍDEOS INSERIDOS NO CDRON

https://www.youtube.com/watch?v=8QvQok1m2Kw
AULA 76 - LIVRO DE ISAÍAS (38:28 MIN.)

https://www.youtube.com/watch?v=LFKekhyGnXI
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AULA 68 - OSÉIAS, AMÓS E MIQUÉIAS (29:17 MIN.)

https://www.youtube.com/watch?v=ZRvKX7g4er4
EVIDÊNCIAS - A Mensagem de Habacuque (22:18 Min)

https://www.youtube.com/watch?v=hbvYtNR78Aw
EVIDÊNCIAS - O Cativeiro da Babilônia (21:11 Min.)

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