Nay Araújo1
Cena 1 – Interior/tarde. Plano aberto: É alguma hora entre às 14h e 17h, meio
da tarde em Fortaleza. Aquele período morno é um convite irresistível para o
sono após o almoço. Vemos ao longe uma sala de aula.
1
Nay Araújo (Helyenay Araújo) é doutoranda em Arte e Cultura Contemporânea pelo PPGARTES do
Instituto de Artes da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, na linha de pesquisa Processos Artísticos
Contemporâneos (2014), desenvolvendo pesquisa em parceria com a Universidade do Algarve – Portugal.
Mestre e graduada em comunicação, atua nas grandes áreas do audiovisual, da curadoria, da pesquisa e
produção.
Cena 3 – interior/tarde. Plano close-up: Já não sinto mais o sono. Minhas
pupilas se dilatam com o anúncio da vaga de estágio.
Como explica Costa (1995), os ‘filmes’ eram feitos em sua grande maioria em
tomada única, com ausência de uma eventual cadeia narrativa, sendo, portanto, fáceis de
serem encaixados nas mais diferentes programações, cujo objetivo era, sobretudo,
capturar a atenção dos observadores para um tipo particular de espetáculo de
variedades. Parente e Carvalho (2008) argumentam que, se por um lado o cinema de
atrações (1896-1908) era caracterizado pelo foco na tentativa de chamar a atenção do
público para um tipo particular de espetáculo de variedades, por outro, ele pode ser
compreendido como resultado de uma série de experimentações com o dispositivo
cinematográfico. Em um momento de cinema a-narrativo, o dispositivo articulava dois
elementos: a arquitetura da sala e a tecnologia de captação/projeção. O cinema
convencional, que só surgiria cerca de duas décadas depois, para além desses elementos,
incluiria, como é óbvio por já citado, a forma narrativa (o filme narrativo).
2
FALAR SOBRE CINEMA EXPANDIDO
eventos de exibição itinerantes de cinema nem sempre há as condições ideais para a
exibição de uma obra, como preconizado pelo cinema convencional; a sala pode não ser
totalmente escura, o projetor nem sempre estará escondido, os ruídos externos talvez
possam causar perturbações na forma de ver o filme, nem sempre a tela poderá ter as
dimensões convencionais de uma sala de cinema, nem sempre o filme será o principal
elemento artístico da sessão3. Nas exibições fílmicas itinerantes há um caráter de
sociabilidade, que é maior que o ato de ver o filme em si. Essa caraterística pode ser
associada diretamente ao cinema de atrações. O evento serve para reunir pessoas, para
proporcionar uma experiência de ver o filme em coletivo e não pela televisão da sala,
para conversar sobre a narrativa fílmica e sobre outros assuntos também, e por aí segue
o espetáculo.
Há sem dúvidas, certo grau performático nas sessões de cinema itinerantes, que
se dissolve após a sua apresentação. O espaço exterior é muitas vezes o palco
privilegiado dos acontecimentos e as mudanças nesse elemento do suporte dispositivo
podem implicar mudanças no restante das relações entre exibidor/filme/espectador. O
grau de improviso e a circunstância de imprevisibilidade (Cohen, 2007) estão presentes
nas exibições itinerantes e não é possível ter uma impressão de regularidade neste tipo
de evento. No meu caso, cada sessão era realizada em uma universidade diferente,
nunca se repetindo o mesmo filme no mesmo local com as mesmas pessoas.
3
Machado (1997) apud Mauerhofer (1983) comenta o conceito de ‘situação cinema’: trata-se do
completo isolamento do mundo exterior e de todas as fontes de perturbação visuais e auditivas. A sala de
cinema ideal deveria ser vedada impedindo a entrada de outros focos de luz e ruído. Além disso, no
momento da projeção, os espectadores deveriam comportar-se com o silêncio e gravidade de uma
cerimonia religiosa. Essa situação é completamente oposta a da exibição itinerante de filmes.
ela costumava ir ao cinema aos domingos depois da igreja. Foi lá que ela
conheceu o marido de uma vida inteira4.
4
Atualmente, segundo o anuário recente da ANCINE, com dados atualizados até 2016, apenas 6,9% dos
municípios brasileiros tem sala de cinema. Dados disponíveis: em: https://oca.ancine.gov.br/. Acesso em:
01 de março de 2018.
5
Este termo é utilizado com aspas porque existe muita controvérsia em relação a sua definição e carga
ideológica. Neste caso, quero apenas referir-me a formação de um público conhecedor de um cinema
brasileiro que não circularia pelas pequenas cidades, periferias ou outros espaços onde não existe cinema
ou só existe cinema comercial.
6
Quando falo de esfera institucional, refiro-me a dois projetos desenvolvidos pela Secretaria do
Audiovisual do Ministério da Cultura do Brasil, nomeadamente a Programadora Brasil (2008-2010) e o
Cinema Mais Cultura (2010), aos quais tive oportunidade de colaborar durante os anos citados ao lado
dos nomes de cada projeto.
A PRODUÇÃO AUDIOVISUAL QUE FALA PORTUGUÊS
WEBGRAFIA:
CPLP – www.cplp.org
IBERMEDIA – www.programaibermedia.com
OCA/ANCINE – www.oca.ancine.gov.br
SAV/MINC - http://www.cultura.gov.br/secretaria-do-audiovisual-sav