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41º ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS

GT 11- Entre as Ruas e os Gabinetes: institucionalização e


contestação nos movimentos sociais

“MANIFESTAÇÕES DO FEMINISMO: EXPRESSÕES DA LUTA


FEMINISTA NO 8 DE MARÇO, RIO DE JANEIRO”

VERONICA TOSTE DAFLON, FELIPE BORBA E DÉBORA THOMÉ COSTA

23 A 27 DE OUTUBRO DE 2017
CAXAMBU, MINAS GERAIS

1
Veronica Toste Daflon. Bolsista de Pós-Doutorado no Programa de Pós-Graduação e
Sociologia da UFRJ (PPGSA/UFRJ). Contato: veronicatoste@gmail.com
Felipe Borba. Professor Adjunto da Escola de Ciência Política da UNIRIO. Contato:
felipe.borba10@gmail.com

Débora Thomé Costa. Doutoranda em Ciência Política no Programa de Pós-Graduação em


Ciência Política da UFF (PPGCP/UFF). Contato: debora.thome@gmail.com

Resumo: O trabalho aborda os perfis emergentes da militância feminista no Brasil a partir


de dados quantitativos de um survey aplicado em uma grande manifestação na cidade do
Rio de Janeiro: o 8 de Março. Para tal, emprega-se a metodologia de survey de protesto,
uma técnica amostral que permite obter aleatoriedade na seleção de respondentes, e realiza-
se análise dos perfis sociodemográficos e opiniões das manifestantes. Como objetivo geral,
o trabalho realiza uma investigação sociológica acerca do novo feminismo que tem
despontado no Brasil nos últimos três anos e dialoga com a literatura sobre o feminismo
de terceira onda. Como objetivo específico, a pesquisa procura estabelecer as diferenças
entre perfis de militantes no que toca questões como corpo, subjetividade, sexualidade,
cultura e representatividade e aspectos materiais das desigualdades de gênero1.

1
Gostaríamos de registrar nosso agradecimento às pesquisadoras Barbara Ferreira Magalhães, Barbara
Grillo, Bia Lima de Macedo, Clara Thome, Gisele Settervall, Julia Alves, Julia Thome, Marta Antunes, Maria
Victória de Andrade, Thaiza Santos e Tais Baia que participaram da aplicação dos questionários que
serviram de base para esse paper.

2
Há menos de uma década, feministas brasileiras se esforçavam para refutar a afirmação de
que o feminismo no país havia perdido sua vitalidade e acabado. Para tal, ofereciam provas
da sua forte influência institucional, descreviam as diferentes e vigorosas formas de
atividade feminista em âmbito estatal, na sociedade civil e em fóruns e organizações
internacionais e vinculavam a atuação das militantes nessas diferentes esferas às conquistas
obtidas pelas e para as mulheres brasileiras2. Em texto publicado em 2005, Ana Alice Costa
se referia ao movimento feminista no Brasil como uma forma de intervenção política que
se “raramente faz[ia] passeata e panfletagem, (...) [isso] não significa dizer que tenha
perdido a sua radicalidade, abandonado as suas lutas, se acomodado com as conquistas
obtidas ou mesmo se institucionalizado” (Costa, 2005., 51).

Entre aquele momento e o presente, o diagnóstico mudou dramaticamente. Desde pelo


menos meados de 2013, além da retomada das ruas pelas militantes feministas em
manifestações como a Marcha das Margaridas, a Marcha das Vadias, a Primeira Marcha
das Mulheres Negras, Mulheres Contra Cunha, entre outras, o feminismo brasileiro parece
ter entrado em uma nova fase. A apropriação das plataformas de comunicação
proporcionadas pela internet, a formação de coletivos em universidades públicas e
privadas, escolas de nível médio e redes sociais, a valorização da horizontalidade e um
aparente rechaço a formas institucionalizadas de atuação política, assim como mudanças
sensíveis no perfil etário da militância são alguns dos traços mais recorrentemente
registrados por pesquisadoras (Sorj, 2016).

Diante de um cenário de rápida mudança, procura-se entender a direção tomada pelo


feminismo no Brasil em anos recentes. As feministas brasileiras atuantes entre as décadas
de 1970 e meados de 2010 foram descritas de modo geral como militantes de esquerda,
comprometidas com projetos mais amplos de reforma social, tendo nessa característica um
fator que as distinguia das feministas europeias e norte-americanas. Além disso, cultivaram
concomitantemente formas de organização autônoma e institucional, atuando em esferas
de decisão e planejamento dos governos, em centrais sindicais, criando organizações não-
governamentais, articulações em bairros e constituindo redes transnacionais de
mobilização (Costa, 2005).

2
Utilizamos gênero aqui como construção social e discursiva e, para tal, buscaremos na produção do
paper empregá-lo como categoria analítica e não descritiva (Scott, 1995).

3
Mas quais seriam os traços da nova geração, que ocupa ruidosamente os espaços públicos
e virtuais? Estaria ela próxima daquilo que se convencionou chamar de “terceira onda
feminista”, caracterizada pela diversidade, fragmentação e conflitos internos (Budgeon,
2011)? Teria a juventude feminista brasileira mais afinidade com o “feminismo liberal” ou
o “pós-feminismo”, afastando-se das discussões estruturais sobre a desigualdade e
sobrevalorizando as questões do corpo e da sexualidade (Dutra e Nunes, 2015)? Estaria
essa nova geração, em virtude do espaço virtual que tipicamente ocupa, demasiadamente
preocupada com a elaboração individual das suas experiências e identidades, constituindo
assim uma espécie de “comunidade confessional” com capacidade reflexiva, deliberativa
e de auto-organização reduzidas (Budgeon, 2011.; Sorj, 2016)?

O presente paper é parte de um projeto de pesquisa cujo objetivo é procurar pistas para
tais questões por meio da aplicação de questionários entre as participantes de
manifestações feministas de rua. O emprego do método de survey de protesto no local das
manifestações permite identificar características sociodemográficas, fontes de informação
e mobilização utilizadas, filiações político-partidárias, formas de atividade política, e
opiniões a respeito de algumas questões-chave para o feminismo atual entre as
participantes que são atraídas para as ruas.

A fim de entender as diferentes expressões do feminismo atual, os surveys são sempre


complementados com pesquisas in loco junto aos coletivos e movimentos nas plenárias de
organização das manifestações. Ambas as estratégias são importantes e complementares.
Isso porque o caráter aparentemente espontâneo das manifestações de rua, divulgadas e
convocadas pelas redes sociais, esconde a aglutinação de formas de ativismo feminista
virtual e não-virtual, institucional e não-institucional e os encontros geracionais que
oportunizam mobilizações mais amplas (Sorj, 2016). Desse modo, a pesquisa junto à
organização dos eventos permite repertoriar as formas de mobilização, as redes, a
construção das pautas, as estratégias de protesto e as formas de comunicação das
organizadoras das manifestações. Procura-se, assim, além de registrar perfis e opiniões,
tentar compreender a formação do espaço público do feminismo na atualidade.

A principal contribuição do trabalho, no entanto, está sobretudo relacionada à coleta de


dados. Há hoje na literatura uma lacuna com respeito à pesquisa do perfil e opiniões das
feministas, sendo ainda mais rara a aplicação de metodologias quantitativas, tais como os
surveys. O tema costuma ser tratado a partir de uma leitura observativa-participativa do(a)

4
pesquisador(a), em grupos restritos de observação. Este trabalho procura abrir espaço para
reflexões a partir de um número maior de observações do grupo específico, podendo
colaborar para a literatura sobre o movimento recente de fortalecimento do feminismo.

Metodologia

A fim de conhecer as atitudes e as opiniões das participantes nas manifestações


analisaremos o resultado de um survey feito durante o Dia Internacional da Mulher, em 8
de março de 2017 (8M), no Rio de Janeiro. Originalmente, propusemos para o presente
paper apresentar e contrastar os dados do 8M com os dados de um segundo survey, que
seria realizado na Macha das Vadias. Tradicionalmente, essa manifestação ocorre todos os
anos entre os meses de junho e julho. No entanto, até a produção desse artigo a Marcha
das Vadias não havia ainda acontecido e no dia 23 de agosto ainda era realizada uma
reunião de organização da marcha. Por esse motivo, nos contentaremos em apresentar e
analisar os dados do 8M.

As entrevistas seguem a metodologia proposta por Borba (2017), que desenvolveu método
de seleção de entrevistados que busca dar a todos os participantes uma chance de ser
incluído na amostra. Esse procedimento amostral consiste em distribuir a equipe de
pesquisadores por toda a extensão da passeata desde o início ao encerramento. As equipes
são, portanto, divididas em horários e áreas de atuação. No caso da pesquisa concluída no
8 de Março, a primeira equipe chegou ao local às 16h e as demais sucessivamente às 17h,
18h e 19h, acompanhando o seu trajeto da Candelária até a Praça XV. Em todos esses
horários, as entrevistadoras dividiram-se ao longo da marcha: uma equipe cobriu a parte
da frente, outra a parte intermediária e a última a parte de trás. Esse procedimento foi
desenvolvido para evitar que a decisão de escolher o entrevistado seja totalmente do
entrevistador. Walgrave e Verhust (2011) mostram que existem diferenças significativas
no perfil dos ativistas entrevistados em manifestações quando o método escolhido não é
randômico. Quando a decisão cabe exclusivamente ao entrevistador, a amostra tende a
incluir pessoas com escolaridade e interesse por política acima da média.

As entrevistadoras, todas do gênero feminino, foram orientadas a não buscar ativamente


entrevistadas na multidão. Após o encerramento de uma entrevista ou após a recusa de uma
manifestante, a entrevistadora deveria abordar a primeira pessoa que passasse na sua frente

5
no intervalo de um a dois minutos. Como as passeatas não são estáticas e caminham
homogeneamente na mesma direção, esse intervalo de tempo é adequado por alterar a
composição das pessoas próximas da entrevistadora, aproximando o método a um processo
de escolha aleatória. Na passeata, a orientação foi a de se entrevistar apenas mulheres e
ignorar a possível presença de homens. No survey do 8 de março, foram coletadas o total
de 153 entrevistas.

Perfil sociodemográfico das manifestantes

O 8 de março no Rio de Janeiro teve a participação estimada em 15 mil pessoas e sua


organização em forma de ato unificado resultou da coalizão de diversos movimentos
populares e feministas, ONGs, partidos, sindicatos etc. O Dia Internacional da Mulher de
2017 apresentou uma novidade com relação aos anos anteriores: além do usual ato do 8 de
março, convocaram-se as mulheres para uma paralização como parte da Greve
Internacional de Mulheres. A convocatória ganhou força graças a ações anteriores como a
grande marcha Ni Una a Menos na Argentina e a Women’s March nos Estados Unidos.
Organizado em torno das pautas internacionais do repúdio à violência contra as mulheres
e à violência econômica da desvalorização do trabalho feminino, o ato e a paralização no
Brasil voltaram-se também contra as reformas trabalhista e da previdência, sob a alegação
de que ambas atingem mais diretamente as mulheres.

As ativistas envolvidas com a organização do 8 de março no Rio de Janeiro (8MRJ) se


confessaram surpresas com o grande número de pessoas que compareceram ao ato3. Em
plenária convocada para um balanço geral da manifestação, elas relataram o êxito da
manifestação, o qual atribuíram à capacidade de formar uma grande coalizão entre diversos
movimentos, à aptidão para a construção de pautas comuns, ao chamado internacional e à
grande divulgação nas redes. As organizadoras surpreenderam-se com a grande presença
de mulheres jovens e sem filiação a movimentos ou partidos. No que toca a ideia de
paralização, avaliada como bem-sucedida em países vizinhos como a Argentina, as
ativistas reconheceram que houve muitas dificuldades de concretiza-la, particularmente em
razão da falta de adesão das centrais sindicais e do caráter demasiadamente informalizado
da economia brasileira, que tende a dificultar a greve como recurso de protesto.

3
A fim de conhecer a dinâmica das mobilizações, realizou-se trabalho de pesquisa nos grupos Marcha
Mundial das Mulheres, partidA e 8MRJ.

6
Os resultados do survey apontam que o público presente na manifestação feminista do 8
de março apresentou um perfil sociodemográfico geral facilmente identificável: as
mulheres presentes eram majoritariamente jovens, solteiras, sem filhos, heterossexuais, de
alta escolaridade e com renda média. A despeito disso, houve grau significativo de
heterogeneidade. Tomemos a idade, por exemplo: a maior parte (41,2%) das participantes
se concentrou na faixa dos 25 aos 34 anos. Houve também presença expressiva das muito
jovens, de 15 a 24 anos (20,3%). Contudo, verificamos também participação não
desprezível de mulheres mais velhas: aquelas com mais de 45 anos somam 23,5% das
presentes.

7
Gráfico 1: Faixa etária das participantes

45
41,2
40

35

30

25
20,3
20
15 15,7
15

10 7,8

0
15 a 24 anos 25 a 34 anos 35 a 44 anos 45 a 60 anos Acima de 60 anos

Fonte: elaboração própria. N = 153

Cabe ainda notar o padrão de alta escolaridade das participantes do 8M: 49,7% delas
possuem o Ensino Superior completo ou incompleto e 34,6% detém título de mestrado ou
doutorado. Os percentuais diminuem consideravelmente nos demais níveis de
escolaridade: apenas 1,3% tinham o ensino fundamental e os 15,7% restantes o ensino
médio completo ou incompleto – em especial as muito jovens. A despeito da alta
escolaridade, a renda média das participantes é relativamente baixa e mais da metade das
entrevistadas (51%) declarou ter renda individual mensal de até 5 salários mínimos.

8
Gráfico 2: Faixas de renda das participantes

30
26,1
24,8
25

19,6
20
17,6

15

10 9,2

5
2,6

0
Até 2 SM 2 a 5 SM 5 a 10 SM 10 a 20 SM Acima de 20 SM Sem renda/não
opinou

Fonte: elaboração própria. N = 153

A juventude repercute no estado civil e no número de filhos das manifestantes. Entre as


entrevistadas, 67,3% eram solteiras, 17% viviam com um cônjuge (independentemente do
sexo), 7,8% declararam ser divorciadas e 5,9% eram viúvas. A ampla maioria das
manifestantes - 69,3% - afirmou não ter filhos, 17,6% possuíam apenas um e 13% tinham
dois ou mais filhos. Tais percentuais não acompanham a média da população brasileira. Já
o perfil autodeclarado de cor das manifestantes é aproximado dos percentuais da população
do Rio de Janeiro, com sobrerrepresentação das autodeclaradas pretas e sub-representação
das pardas: 44% declararam-se brancas, 18,3% pardas e 24,8% pretas – indígenas (4,0%),
amarelas (2,0%) e outras 7,8% completam a lista.

Os dados de cor apresentam dois aspectos interessantes: primeiro, apontam que o 8M foi
uma manifestação diversa em termos de cor; segundo, a sobrerrepresentação das
autodeclaradas pretas com relação às pardas parece estar relacionada a identidades raciais
mais politizadas, que costumam levar à recusa da denominação “parda” em favor da
identificação com a negritude. Quanto à orientação sexual, a maioria das entrevistadas
(66%) se declarou heterossexual. No entanto, houve diversidade de orientações sexuais: o
segundo maior percentual foi das que se declararam bissexuais (19,6%) e o terceiro das

9
que se declararam homossexuais (8,5%). Outras orientações sexuais, como pansexual
somaram 5,9%.

Em pergunta aberta sobre a identidade de gênero das respondentes, houve grande


diversidade de respostas. Dentre as respondentes, 4,6% delas aludiram à sua orientação
sexual (“bi”, “hetero” ou “heterossexual”). Uma parte bastante expressiva (36,2%)
recorreu ao prefixo “cis” (“mulher cis”, “cisgênero”, “cis feminino”, “cis”, “cis mulher”)
para qualificar sua identidade, mobilizando assim o léxico contemporâneo sobre gênero
que admite uma leitura não biológica de identidades. E, por fim, outra fração muito
significativa (57,2%) afirmou-se simplesmente “mulher” ou “gênero feminino”. Apenas
duas entrevistadas declararam-se “mulher trans” (0,7%) - 1,3% das entrevistadas não soube
responder à pergunta.

Perfil Político

O perfil político das participantes foi bastante homogêneo: entre as 153 respondentes,
apenas uma se definiu como de direita (0,7%). A ampla maioria se posicionou na esquerda
(85,6%) ou centro-esquerda (4,6%) e 9,1% disseram não ter preferência ideológica ou não
sabiam opinar. Esse perfil é semelhante, em grande medida, ao perfil observado entre
militantes na passeata LGBT ocorrida em Copacabana em dezembro de 2016. Na ocasião,
a maioria também se declarou de esquerda (52%), enquanto 9% eram de direita e 4% de
centro (Borba, 2017).

A identificação partidária também apresentou números elevados, principalmente se


comparado com a realidade brasileira, na qual historicamente a maior parte da população
afirma não ter preferência por nenhum partido (Braga e Pimentel, 2011; Carreirão, 2007).
As medições recentes apontam para um cenário ainda mais crítico. Em levantamento feito
em maio para medir as intenções de voto para presidente em 2018, o instituto Datafolha
registrou que 66,6% dos eleitores brasileiros declaram não ter preferência por nenhum
partido. Nessa pesquisa, o PT ainda aparece como o partido preferido do brasileiro, com
15,2% da preferência, bem abaixo dos 30% que chegou a ter durante o governo do
presidente Lula.

No M8, portanto, os números destoam da média nacional. Cerca de 63% das manifestantes
tinha preferência por algum partido político e, dentre os citados, destacam-se PSOL
(38,6%) e, em escala menor, o PT (12,4%). Interessante notar que, na comparação com os

10
vereadores e as vereadoras eleitos para o município do Rio de Janeiro, em 2016, tanto
PSOL quanto PT estavam sobrerrepresentados na marcha. O primeiro tem 11,7% das
cadeiras na câmara de vereadores e o segundo, 3,9%. Entretanto, a razão de presença entre
os dois se repete (PSOL tem o triplo de presença do PT em ambos os casos). Na
manifestação, também cabe destacar, algumas mulheres declararam ter preferência por
mais de um partido simultaneamente, como pode ser visto no gráfico 3 abaixo.

Gráfico 3: Preferência Partidária das manifestantes

45,0

40,0 38,6
37,3

35,0

30,0

25,0

20,0

15,0 12,4

10,0
4,6
5,0 3,3
2,0 2,0

0,0
PSOL PT PCB PSOL/PT PSOL/PCB Outros Nenhum
partido

Fonte: elaboração própria. N = 153

A Dinâmica do 8 de Março

Em outro módulo de perguntas, inquirimos as respondentes em pergunta de resposta


múltipla a respeito de como elas tomaram conhecimento da passeata. A maior parte das
manifestantes (53,9%) afirmou ter sabido pelas redes sociais. Muitas (18,3%)
mencionaram colegas e amigas, enquanto algumas se referiram a movimentos sociais
(6,8%), sindical (4,1%) e feminista (5%). Suportes de comunicação tradicionais como TV,
rádio, jornal tiveram pouca expressão (1,8%), assim como formas tradicionais de
divulgação como panfletos tiveram pouca importância na mobilização (0,5%). Nota-se a
baixa relevância dos partidos como agentes mobilizadores do ato.
11
Gráfico 4: Fontes de Informação sobre a Manifestação

Redes sociais 79,7


Colegas e/ou amigas 27,0
Movimento social 10,1
Movimento feminista 7,4
Movimento Sindical 6,1
Membro da organização 3,4
Data 8 de março 2,7
Mídia tradicional 2,7
Universidade 2,7
Partido 2,0
Escola 2,0
Outros 1,4
Panfleto 0,7

Fonte: elaboração própria. N = 153

É interessante notar que, a despeito de não participarem diretamente da organização


(apenas 2,3% das entrevistadas afirmaram fazê-lo), quando estimuladas a responder
espontaneamente o motivo para a sua participação no protesto, 29,4% das manifestantes
do 8 de março apontaram, entre outras razões, a necessidade de protestar contra a reforma
trabalhista e/ou a reforma da previdência naquele momento em discussão no Congresso
Nacional. Esse dado mostra bastante poder de coordenação das redes, que elegeram de fato
como uma das principais pautas do 8 de março desse ano de 2017 tais mudanças
legislativas quanto aos regimes de trabalho e previdência. Além do protesto contra as
reformas, 24,8% das participantes apontaram como razão para estar no 8M a necessidade
de dar visibilidade pública à luta das mulheres.

12
Tabela 1: Motivo da Participação na Manifestação (Espontânea e múltipla)

INCIDÊNCIA
MOTIVO APONTADO ENTRE AS
RESPONDENTES
Reforma trabalhista, da previdência, medidas neoliberais e retrocessos
29,4%
sociais
Visibilidade pública da luta de mulheres 24,8%
Igualdade de direitos 20,9%
Fortalecimento do movimento de mulheres, solidariedade entre
19,6%
mulheres
Feminicídio, violência contra a mulher e/ou violência doméstica 19,0%
Machismo e patriarcado 11,1%
Equiparação salarial, de oportunidades e igualdade de gênero no
8,5%
trabalho
Descriminalização do aborto e direitos reprodutivos 7,2%
Internacionalismo feminista 5,2%
Contra o golpe 5,2%
Assédio e estupro 4,6%
Conhecendo o 8 de maio 3,3%
Partido, sindicato, movimento social 3,3%
Racismo 2,6%
Liberdade sexual 2,6%
Homofobia e lesbofobia 2,6%
Representação política e em espaços de poder 2,0%
Maternidade, direitos das mães, divisão sexual do trabalho, tripla
2,0%
jornada, creche
Segurança da mulher nos espaços públicos da cidade 2,0%
Violência obstétrica 1,3%
Luta anticapitalista 1,3%
Fonte: elaboração própria. N = 153

Em uma outra questão, perguntamos às mulheres quais são as suas principais


reivindicações no movimento feminista. De modo geral, as manifestantes entrevistadas do
8 de março apresentaram demandas pouco “pós-modernas” ou “identitárias”. Os motivos
mais frequentemente alegados para estarem ali foram aqueles que se atribui tipicamente à
“segunda onda” feminista: protestar contra o feminicídio e a violência contra a mulher,
exigir a igualdade de direitos, dar visibilidade pública e fortalecer o feminismo, protestar
contra as reformas trabalhista e da previdência, demandar a equiparação salarial, de
oportunidades e igualdade de gênero no trabalho e pleitear a descriminalização do aborto

13
e direitos reprodutivos. Cabe notar que temas que ganham grande visibilidade nas
campanhas e militância em redes sociais entendidas como demandas “culturais” ou
“identitárias” tiveram pouca incidência entre as respostas: liberdade sexual,
representatividade na mídia, autoaceitação do corpo foram motivos para protestar pouco
mencionados pelas participantes. É possível alegar que essa seja uma idiossincrasia do 8M,
organizado em torno de um conjunto de pautas específicas, mas ainda assim os dados
contrariam a visão de um jovem feminismo puramente identitário e cultural.

Tabela 2: Principais Reivindicações no Feminismo (Espontânea e múltipla)

INCIDÊNCIA
MOTIVO APONTADO ENTRE AS
RESPONDENTES
Feminicídio, violência contra a mulher e/ou violência doméstica 34,0%
Equiparação salarial, de oportunidades e igualdade de gênero no trabalho 28,1%
Descriminalização do aborto e direitos reprodutivos 26,8%
Igualdade de direitos 20,9%
Reforma trabalhista, da previdência, medidas neoliberais e retrocessos sociais 12,4%
Segurança da mulher nos espaços públicos da cidade 10,5%
Maternidade, direitos das mães, divisão sexual do trabalho, tripla jornada, creche 8,5%
Machismo e patriarcado 7,8%
Racismo 7,2%
Assédio e estupro 7,2%
Liberdade sexual 7,2%
Representação política e em espaços de poder 5,9%
Transfobia e/ou lgbtfobia 3,9%
Fortalecimento do movimento de mulheres, solidariedade entre mulheres 2,6%
Luta anticapitalista 2,6%
Igualdade de gênero na escola 1,3%
Representatividade na mídia 1,3%
Violência obstétrica 1,3%
Visibilidade pública da luta de mulheres 1,3%
Auto-aceitação do corpo 0,7%
Homofobia e lesbofobia 0,7%
Abolição da prostituição 0,7%
Moradia 0,7%
Encarceramento de mulheres 0,7%
Fonte: elaboração própria. N = 153

Cabe ponderar que o questionário (ver anexo) contemplava duas perguntas semelhantes:
os motivos para a participação especificamente na manifestação e quais eram as principais
pautas feministas na opinião da entrevistada. No primeiro caso, como já relatamos, a

14
questão do combate às reformas da previdência e trabalhista foi a mais mencionada,
seguida por visibilidade pública da luta das mulheres, igualdade de direitos e
fortalecimento interno do movimento de mulheres/solidariedade. No caso da segunda
pergunta, que deveria contemplar pautas mais perenes do feminismo, a questão da
violência foi a mais destacada, seguida por oportunidades no mercado de trabalho,
descriminalização do aborto e direitos sexuais e reprodutivos e igualdade de direitos.

A pesquisa também visou aferir quais são as atividades relacionadas ao feminismo mais
praticados pelas manifestantes. As manifestações de rua destacam-se, com forte ênfase
também para a participação em palestras e rodas de conversa e o engajamento online. Nota-
se, mais uma vez, baixa participação em partidos políticos. Apesar de haver um percentual
elevado de manifestantes com preferência pelo PSOL e pelo PT, poucas declaram que
participam ativamente desses canais tradicionais de ação política.

Gráfico 5: Principais Atividades Relacionadas ao Feminismo (Estimulada/


Múltiplas Respostas)

Manifestações e ações de rua 80,4

Palestras e rodas de conversa 64,7

Ativismo on-line 56,2

Atividades artístico-culturais 41,8

Voluntariado e ações sociais 22,9

Político-partidária 16,3

Outras 5,2

Fonte: elaboração própria. N = 153

As fontes de informações também variam, mas há novamente forte influência do mundo


digital seja por meio das redes sociais ou por blogs especializados e canais do youtube. As

15
palestras, coletivos e movimentos sociais e os livros também aparecem como fontes de
informação relevante. Há, novamente, certo descrédito com relação à mídia tradicional. Os
jornais e as revistas são citados como os veículos de informação de menor relevância, com
30,7% das menções.

Gráfico 6: Principais fontes de informação sobre o feminismo (Estimulada/


Múltiplas respostas)

Redes sociais 73,9

Palestras, coletivos e movimentos sociais 62,7

Livros 57,5

Blogs e canais do youtube 49

Feministas de outras gerações 45,8

Jornais e revistas 30,7

Outras 5,2

Fonte: elaboração própria. N = 153

Opiniões e Atitudes

Em outro segmento do questionário, sondamos a opinião das manifestantes a respeito de


temas diversos, em um conjunto de oito perguntas, elaboradas na escala de concordância
de Lickert (com as opções “Concorda”, “Concorda em parte”, “Não concorda nem
discorda”, “Discorda em parte” e “Discorda” apresentadas em um disco para que as
entrevistadas escolhessem). A lista de perguntas procurou aferir como elas se posicionam
a respeito de temas considerados sensíveis dentro dos movimentos feministas, como a
participação masculina, a questão da prostituição, a representação política de mulheres, a
relação entre feminismo e antirracismo, as formas legítimas de protesto, a profundidade

16
das transformações sociais necessárias à realização da igualdade de gênero, a relação entre
feminismo e abolicionismo penal e a visão sobre gênero e diferença (Tabela 3).

A despeito da grande polêmica nas redes sociais em torno da participação masculina nas
lutas das mulheres, a maioria (89,6%) das respondentes concorda ou concorda em parte
com a afirmação “Os homens devem participar das lutas feministas”. Ao concordar
parcialmente, é provável que um número expressivo (24,2%) das mulheres sinalize que
essa participação deve ser feita com ressalvas, possivelmente no lugar de apoiadores e não
de protagonistas do feminismo. Ainda assim, é surpreendente a visão inclusiva e um
rechaço ao feminismo essencialista4 entre as manifestantes.

Tabela 3: Nível de concordância sobre temas feministas


Concorda em Não concorda Discorda
Concorda Discorda NS/NR
parte nem discorda em parte
Aumentar as penas
contra homens
agressores
32,0 25,5 1,3 15,0 25,5 0,7
diminuiria a
violência contra a
mulher
A causa das
mulheres negras
75,2 17,6 2,0 2,0 2,6 0,7
deve ser prioridade
na luta feminista
Mulheres tendem a
ser mais intuitivas
27,5 22,9 5,2 5,9 36,6 2,0
e generosas do que
os homens
Mostrar o corpo nu
é uma forma de
38,6 32,7 7,8 5,9 14,4 0,7
empoderamento da
mulher
A exploração das
mulheres só
acabará com uma
59,5 22,2 3,9 3,9 9,2 1,3
mudança radical
no sistema
capitalista
É importante haver
mais mulheres 62,7 15,0 2,6 7,2 11,8 0,7
eleitas

4
De modo simplificado, chamamos aqui de “feminismo essencialista” vertentes do feminismo que
salientam uma dicotomia entre os sexos, tal como descrito por Carla Cristina Garcia: “[O feminismo
essencialista] Engloba as distintas correntes que igualam a liberação das mulheres com o desenvolvimento
e a preservação de uma contracultura feminina: viver em um mundo de mulheres para mulheres. Esta
contracultura exalta o princípio feminino e seus valores e repudia o masculino”. (Garcia, 2015: 101)

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independentemente
do partido

Os homens devem
participar das lutas 65,4 24,2 2,0 3,3 3,9 1,3
feministas
A profissão de
prostituta deve ser
58,2 17,0 6,5 2,0 7,8 8,5
regulamentada no
Brasil
Fonte: elaboração própria. N = 153

Procuramos aferir o quanto as manifestantes apresentam visões essencializadas de gênero.


No entanto, admitimos que a afirmação “Mulheres tendem a ser mais intuitivas e generosas
do que os homens” é suficientemente ambígua para acomodar leituras bastante distintas.
Ainda assim, vemos que as respostas oferecidas ficaram mais ou menos polarizadas entre
a concordância e a discordância, embora a visão predominante seja a de que as mulheres
tendem sim a ser mais intuitivas do que os homens, se somarmos as opções concorda e
concorda em parte (50,3%). Observou-se também certa polarização quando as
manifestantes foram indagadas se penas mais duras deixariam as mulheres mais protegidas
dos homens: 40% das mulheres discordaram ou discordaram em parte com essa ideia.

Um bloco específico de perguntas procurou tocar em questões que têm ganhado grande
visibilidade nas redes sociais e no ativismo feminista virtual: a relação entre gênero e raça,
a questão da prostituição, a relação entre gênero e classe, assim como opinião sobre a nudez
como repertório de protesto. O que vemos, por exemplo, é que a questão das mulheres
negras no 8 de Março ao mesmo tempo que não mobilizou muitas manifestações
espontâneas (entre as causas feministas apontadas na Tabela 2 a luta contra o racismo foi
apontada por apenas 7,2% das respondentes), tampouco dividiu as respondentes: 75,2%
afirmaram que concordam que a causa seja prioridade no feminismo. Isso nos leva a inferir
que o tema carrega em si um constrangimento: é considerado como digno de manifestação
e apoio das feministas, mas ainda não está solidificado dentro das pautas prioritárias. O
fenômeno da concordância elevada se repete com relação à prostituição: embora o discurso
“abolicionista” tenha grande visibilidade nas redes, na manifestação do 8M 75% das
mulheres concordaram ou concordaram em parte com a necessidade de regulamentação da
profissão.

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Afinadas com a visão de esquerda manifestada em outras perguntas, 81,4% das
participantes concordaram ou concordaram em parte com a necessidade de uma “mudança
radical no sistema capitalista” para emancipar as mulheres. Ao mesmo tempo, foi
interessante constatar que tamanha é a percepção de sub-representação política das
mulheres uma vez que 78% delas concordaram com a assertiva “É importante haver mais
mulheres eleitas independentemente do partido”.

Considerações finais

Os dados obtidos nesse estudo precisam ser lidos com certa cautela. Eles expressam as
opiniões e as atitudes das mulheres presentes ao ato feminista de 8 de Março de 2017 no
Rio de Janeiro e não podem ser confundidas com as opiniões e atitudes de todas as
mulheres envolvidas na luta pela emancipação das mulheres. Mas servem como pistas
importantes para entendermos como o movimento feminista vem se estruturando e se
desenvolvendo no Brasil contemporâneo.

Bibliografia de referência

BORBA, Felipe. (2017) “Parada do Orgulho LGBT: a voz e o voto”. Insight Inteligência,
jan/fev/mar: 80-88
BRAGA, M.S.S.; PIMENTEL, J. “Os partidos políticos brasileiros realmente não
importam?”. Opinião Pública, v. 17, n. 2, p. 271-303, 2011
BUDGEON, Shelley. (2011) Third Wave Feminism and the Politics of Gender in Late
Modernity. New York: Palgrave McMillan
CARREIRÃO, Y.S. “Identificação ideológica, partidos e voto na eleição presidencial de
2006”. Opinião Pública, v. 13, n. 2, p.307-339, 2007.
COSTA, Ana Alice. (2005) “O Movimento Feminista no Brasil: dinâmica de uma
intervenção política”. Revista Gênero, vol. 5, n. 2.
DUTRA, Mariana Passos e NUNES, Tiago (2015) “Marcha das Vadias como redes de
movimentos e significados”. Revista Prolegómenos Derechos y Valores, 18, 36, 153-168.
GARCIA, Carla Cristina. (2015) Breve história do feminismo. 3ª ed. São Paulo: Editora
Claridade
SCOTT, Joan. (1995). “Gênero: uma categoria útil de análise histórica”. Educação &
Realidade. Porto Alegre, vol. 20, nº 2.
SORJ, Bila. (2016) “Do ‘pessoal é político’ para o ‘político é pessoal’? Novas tendências
no feminismo no Brasil”. Paper apresentado na XXXIV International Congress of the Latin
American Studies Association.

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WALGRAVE, S.; VERHULST, J. “Selection and response bias in protest surveys”. Mobilization:
An International Journal, v. 16, n. 2, p. 203-222, 2011.

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