Os fungos apodrecedores são responsáveis pela perda de resistência
mecânica da madeira e podem ser divididos em três diferentes categorias de acordo com os danos causados à madeira.
4.1.1 Podridão parda
Este grupo de fungos se alimenta predominantemente de celulose e
polioses, transformando-as em substâncias solúveis, facilmente assimiladas e digeridas. A lignina permanece praticamente intacta (Figura 1). Devido a uma contínua degradação da celulose e polioses, a madeira atacada adquire coloração parda, em função da lignina, que fica intacta, ser de coloração escura. A madeira atacada apresenta o aspecto de estar levemente queimada. A nível microscópico, não ocorre degradação da célula, pois a lignina residual mantém a estrutura da mesma. A destruição dos elementos estruturais que se encontram nas paredes celulares, provoca uma rápida perda da resistência mecânica da madeira. Os fungos de podridão parda ocorrem em profundidade na madeira. ✵ Características da madeira atacada:
✵ Quando seca, a madeira tem o aspecto de estar levemente
queimada, adquirindo coloração parda. ✵ Ao secar, a madeira atacada sofre colapso com facilidade, desenvolvendo-se inúmeras fissuras paralelas e perpendiculares à grã. ✵ Mudança do aspecto da madeira, em função da deterioração da celulose e polioses. ✵ Perda de peso e diminuição das propriedades mecânicas.
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FIGURA 1. MADEIRA ATACADA POR FUNGO DA PODRIDÃO PARDA.
4.1.2 Podridão branca
Como os fungos da podridão parda, os fungos da podridão branca
atuam na superfície da parede celular. A ação restrita do sistema enzimático proporciona a formação de fendas ou orifícios, onde os fungos se assentam. Durante o ataque, estas fendas vão aumentando, provocando uma lenta erosão da parede celular a partir do lúmem em direção à lamela média. Os fungos da podridão branca decompõem celulose, polioses e lignina, sendo esta atacada mais facilmente. A lignina é removida da parede celular e utilizada na nutrição do fungo junto com os hidratos de carbono.
✵ Características da madeira atacada:
✵ Devido à maior porcentagem de holocelulose na madeira atacada,
esta adquire uma coloração esbranquiçada. ✵ A madeira perde o aspecto lustroso. ✵ As áreas apodrecidas podem estar delimitadas por linhas escuras (Figura 2). ✵ Quando fricciona-se a madeira, ocorre a sua desfibrilação com facilidade. ✵ Ocorre perda de peso e das propriedades físicas e de resistência da madeira, em função do consumo de celulose, polioses e lignina.
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FIGURA 2. EXEMPLOS DE ATAQUE POR FUNGOS DA PODRIDÃO BRANCA.
4.1.3 Podridão mole
Os fungos da podridão mole correspondem ao grupo de fungos
xilófagos chamados de fungos imperfeitos. Têm a capacidade de desenvolverem-se em condições inibitórias para outros fungos, como a elevada umidade. Ao contrário dos fungos da podridão parda e branca, os fungos da podridão mole não penetram profundamente na madeira. Penetram na parede secundária da célula perfurando longas cadeias de forma helicoidal, que correm paralelamente às cadeias de celulose. Dentro da parede celular, atravessam a lamela média penetrando na célula vizinha, continuando o ataque sucessivamente. As hifas colonizam as células da madeira através do lúmem, passando de uma célula a outra pelas pontuações. Da hifa mãe presente no lúmem, parte uma hifa de diâmetro diminuto, a qual penetra até a camada S2 da parede secundária, formando um “T”. Um braço deste “T”, cresce em sentido oposto ao do outro, sendo que ambos penetram na camada S2, acompanhando a direção das microfibrilas, formando cavidades rombóides. Algumas vezes a hifa inicia a degradação da parede celular pelo lúmem, onde hifas de tamanho diminuto nascem lateralmente na hifa mãe e atravessam a parede celular, produzindo uma degradação em forma de “V”. Os fungos de podridão mole utilizam substâncias de reserva da madeira como fonte de alimento. O ataque se restringe à superfície da madeira, não mais profundo que 2 cm (Figura 3).
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FIGURA 3. MADEIRA ATACADA POR FUNGO DA PODRIDÃO MOLE.
✵ Características da madeira atacada:
✵ O ataque se restringe à superfície. Porém a parte atacada é
facilmente removida por ação mecânica e a parte da madeira logo abaixo é exposta e reinfestada. ✵ Quando úmida, a madeira atacada apresenta a superfície amolecida. Ao secar, adquire coloração escurecida com várias fissuras no sentido das fibras. ✵ O ataque em estágio avançado provoca a destruição total das paredes secundária e primária.
4.2 FUNGOS MANCHADORES
Os fungos manchadores são providos de hifas pigmentadas. Habitam
as células parenquimáticas principalmente as de parênquima radial. Não se alimentam dos constituintes da madeira e sim, de nutrientes existentes nas células, como amido e açúcares. Porém, em fase avançada podem eventualmente afetar a parede celular. A colonização da madeira se dá através do lúmem, onde as hifas passam de uma célula à outra através das pontuações. Algumas vezes podem atravessar as células horizontalmente, produzindo pequenos orifícios nas paredes celulares. Por utilizarem substâncias de reserva, o ataque é restrito ao alburno.
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Quando as manchas provocadas pelos fungos manchadores são
observadas, trata-se do resultado da reflexão da luz incidente sobre as hifas pigmentadas ou de pigmentos liberados pelo fungo (Figura 4). A penetração das hifas ocorre logo após a germinação dos esporos em contato com a madeira e penetram profundamente na madeira. Esta grande velocidade de penetração faz com que a aplicação de produtos preservantes após 48 horas de exposição da madeira torne-se ineficaz. Porém, o manchamento pode ser evitado através da aplicação de alguns produtos químicos, os quais difundem-se profundamente nas regiões já afetadas pelo fungo, antes que ocorra a pigmentação das hifas. Alguns fungos manchadores em estágio avançado de ataque podem provocar podridão mole, afetando a parede das células da madeira. Existem várias espécies de fungos manchadores, as quais causam diferentes colorações na madeira. Os mais importantes economicamente são os fungos causadores da mancha azul.
FIGURA 4. MADEIRA ATACADA POR FUNGO MANCHADOR.
✵ Características da madeira atacada:
✵ A madeira adquire coloração que a desvaloriza comercialmente.
✵ Não há perda significativa de peso e redução de propriedades mecânicas, sendo portanto, considerada uma deterioração secundária. ✵ O ataque ocorre somente em madeira de alburno, sendo o cerne imune. ✵ A penetração na madeira se dá em até 48 horas de exposição ao ambiente.
4.3 FUNGOS EMBOLORADORES
Estes fungos desenvolvem-se na superfície da madeira, alimentando-
se de substâncias existentes nas células recém cortadas ou resíduos nutritivos
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depositados na superfície, como açúcares, amido, etc., principalmente nas células
parenquimáticas que dispõem de um conteúdo muito rico. A madeira embolorada apresenta a superfície pulverulenta ou algodoada, com coloração variada e facilmente raspável. O aspecto algodoado é devido à produção de uma massa de hifas na superfície da madeira. Os bolores não são capazes de atacar madeira com umidade abaixo do PSF. Portanto o ataque por estes fungos é comum em toras recém cortadas, peças de madeira serrada durante o período de secagem, madeiras mantidas com alto teor de umidade e madeiras secas, expostas em ambientes com umidade acima de 90%. Os fungos emboloradores não chegam a afetar as paredes das células. Portanto, não comprometem a resistência mecânica da madeira. De modo geral, são muito tolerantes à maioria dos princípios existentes em formulações de preservantes, sendo assim, de difícil controle.
✵ Características da madeira atacada
✵ O ataque é aparentemente superficial, porém as hifas penetram
profundamente no alburno. Este aparente ataque superficial é devido à presença do fungo esporulado. As hifas no interior da madeira não são pigmentadas. ✵ Sobre a superfície da madeira observa-se uma camada algodoada de diferentes colorações. ✵ O ataque não danifica a parede celular significativamente. ✵ O ataque predomina no tecido radial e vizinhança. ✵ As hifas causam a perfuração dos raios, tornando a madeira mais higroscópica.
4.4 MANCHA QUÍMICA
A mancha química não é um agente biológico, e sim, o resultado de
uma reação química entre os produtos da madeira (extrativos) e o oxigênio da atmosfera. Com a adição de energia dos raios de sol ou secagem artificial, ocorre uma aceleração desta reação, pronunciando o efeito da descoloração da madeira. Em coníferas, a mancha química ocorre com coloração amarela ou puxando para o marrom e em folhosas apresenta coloração acinzentada.
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4.5 RECONHECIMENTO DO ATAQUE DE FUNGOS
Os sintomas de um ataque na madeira provocado por fungos
dependem da espécie de fungo, da madeira atacada e do grau de evolução da infestação. Geralmente os primeiros sintomas de ataque de qualquer fungo são diferentes dos sintomas observados em estágios mais avançados, onde a detecção é mais fácil. Dependendo do fungo, observa-se alguma modificação como mudança de coloração, amolecimento da madeira, mudança na densidade e mudança no cheiro. Podem ocorrer todas estas modificações ou algumas delas.
4.5.1 Mudança de coloração
Os estágios iniciais de um ataque por fungos provocam uma mudança
na coloração da madeira afetada. O primeiro sintoma visível, antes da desintegração das substâncias da madeira é listras marrom escuras ou marrom arroxeadas. Na madeira serrada, dependendo da espécie de fungo, no início do ataque pode-se observar pontos marrom escuros ou regiões com coloração mais clara que na madeira sã.
4.5.2 Amolecimento da madeira
Uma peça de madeira com princípio de apodrecimento apresenta
textura quebradiça, sendo impossível retirar com faca pedaços inteiros de madeira. As fibras se partem nas proximidades do aço da faca, dando a impressão de que a madeira já foi macerada anteriormente.
4.5.3 Mudança na densidade
Uma perda de peso acompanhada de descoloração é característica de
um estágio avançado do apodrecimento. Porém, tais características nem sempre são verdadeiras. Em função do crescimento da árvore, a madeira pode apresentar descoloração e densidade fora do padrão para a espécie. Isto, algumas vezes é
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comum em coníferas de rápido crescimento. O conteúdo de umidade também pode
afetar a densidade aparente da madeira.
4.5.4 Mudança no cheiro
A madeira atacada por fungos apodrecedores apresenta um odor
desagradável, semelhante ao de lugares abafados e úmidos. Vários fungos apresentam cheiros característicos, como a espécie Lentinus lepideus, que tem um cheiro peculiar, sendo uma característica utilizada para seu reconhecimento.
4.5.5 Alteração das propriedades físicas e mecânicas
Madeiras com apodrecimento apresentam constituintes estruturais das
células degradados, resultando em alteração das propriedades físicas e mecânicas. Ensaios físicos e mecânicos da madeira supostamente atacada comparados com madeira sã podem ser indicativos do grau de ataque.
4.5.6 Análise microscópica da madeira
O exame microscópico de uma seção de madeira corada é um dos
meios mais efetivos para a detecção de ataque por fungos. A coloração das células da madeira e hifas do fungo permite uma visualização dos danos causados na madeira. Também auxilia na identificação ou caracterização do fungo presente.
4.5.7 Isolamento dos fungos da madeira em meio de cultura
Esta técnica consiste na retirada de pedaços de madeira supostamente
infestada em condições assépticas para introdução em meio de cultura. Tem grande eficácia na detecção de fungos.
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4.6 MÉTODOS PARA IMPEDIR A DETERIORAÇÃO DA MADEIRA
POR FUNGOS
Algumas essências são naturalmente mais resistentes à ação de
organismos xilófagos, em função da presença de extrativos tóxicos aos mesmos. Espécies que contêm extrativos tóxicos são raras e geralmente necessitam de muitos anos para fornecer madeira economicamente aproveitável. Desta forma, foram desenvolvidos métodos que visam a proteção da madeira, pois madeiras pouco resistentes à deterioração são de mais fácil obtenção.
4.6.1 Alteração ou remoção de substâncias presentes na madeira
A tiamina é uma substância presente na madeira em pouquíssimas
quantidades. Porém, é essencial ao desenvolvimento de fungos apodrecedores. Esta substância pode ser removida através do aquecimento da madeira a 100 oC por uma ou duas horas, sendo alcalinizada, o que impede o ataque de fungos. Outra alternativa é a adição de substâncias específicas que reagem com moléculas de celulose ou lignina e impedem a degradação pelas enzimas dos fungos que não conseguem reagir com o substrato por este ter sido alterado.
4.6.2 Controle da umidade da madeira
Uma mínima quantidade de umidade na madeira (20% com base no
peso seco) é suficiente para um fungo se desenvolver. Abaixo desta umidade não há desenvolvimento de fungos. A umidade máxima varia com o tipo de madeira, densidade e tamanho. Porém, nunca ultrapassa a sua umidade de saturação. Portanto, madeira com umidade abaixo de 20% ou saturado é imune a fungos. Uma prática comum consiste no armazenamento da madeira em lagos, rios, açudes, piscinas, etc. Desta forma, a madeira fica saturada de água, com baixo teor de oxigênio. Outra prática é o armazenamento da madeira em pátios com aspersão de água nas toras. Para a redução do teor de umidade, a prática mais comum é a secagem artificial.
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4.6.3 Controle biológico
O controle biológico se dá através do desenvolvimento de alguns
microorganismos na madeira, os quais inibem a ação de determinados fungos. Esta inibição se dá de três maneiras: através do desenvolvimento mais rápido que o próprio fungo; competição com fungos apodrecedores por substâncias presentes nos lúmens das células e produção de antibióticos que inibem o desenvolvimento de fungos apodrecedores. As três alternativas têm sido estudadas. Porém, somente organismos antibióticos têm mostrado resultados satisfatórios. Os fungos Scytalidium sp e Trichoderma spp, inibem o desenvolvimento de alguns fungos apodrecedores. Estes, inoculados em postes com podridão incipiente, desenvolvem-se e produzem antibióticos que inibem os fungos.
4.6.4 Uso de biocidas
Os métodos anteriores são pouco utilizados comercialmente em função
do altos custos operacionais. A alternativa mais viável é a introdução de substâncias químicas que inibem o desenvolvimento de organismos xilófagos. Os biocidas são conhecidos como preservantes de madeira. São classificados em três categorias: oleosos, oleossolúveis e hidrossolúveis. Tal classificação é em função do solvente utilizado para introdução na madeira. O produto oleoso mais conhecido é o creosoto. Como oleossolúveis mais conhecidos tem-se o pentaclorofenol, TBTO, naftenato de cobre, quinolinolato de cobre-8, etc. Os hidrossolúveis mais utilizados são compostos de arsênico, cromo, cobre, zinco e fluoretos, como arseniato de cobre amoniacal, cromato de cobre ácido, arseniato de cobre cromatado, cloreto de zinco cromatado, sulfato de cobre, etc. A aplicação dos biocidas é feita por vários métodos, os quais são classificados em métodos sem pressão ou caseiros e métodos com pressão ou industriais. A aplicação destes produtos preservantes prolonga por várias vezes o tempo de uso da madeira.
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