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I I l i l . ' .iiln I ' l . i l n o argumentava que a matemática tinha existência indepen-


1

"7**^. Capítulo 6
i. nil . -i i. i . 111 ;i\.1 u x b H O M O raciocínio por meio dos números e das relações. M e s -
il)i •nlr.i.e, mais ortodoxos tendem a favor da visão platónica de que os concei-
• (11 i i > - i i i . i t ii os iiiio possuem conteúdo empírico, o que equivale a dizer que não
h . i n i . i ' . verdades matemáticas como círculos e triângulos perfeitos espalhados
i H sl sso imperfeito mundo. A matemática, portanto, é descoberta, não Aspectos éticos e profissionais da informação
iu • r.i *. I.i ! ininlc decorre uma bela charadinha epistemológica. Isso acontece devi-
il'i • nu * éicbios serem organizados da forma que são? Se nossos cérebros fos-
< in i ' i | ; . i u i . M i | i i ' . de modo diferente haveria outros universos, outras respostas, ou- 6.1 Introdução aos conceitos éticos
ii ' l "MUI , ilc ciência da informação?
1 I I D1IN, Thomas. The structure of scientific revolutions. Chicago: Chicago É relativamente fácil falar de modo genérico sobre os problemas
1' i-ilv I ' i r s s , l%2. [Ed. brasileira: A estrutura das revoluções científicas. São éticos que surgem no dia-a-dia do profissional da informação. Pode-
i 'i I' i |" i liva, 1975.j Suas opiniões foram criticadas por Margaret Masterman, mos sempre elogiar ou condenar ações sobre as quais aceitamos uma
H i . m l nu • .il a paradigm', in LAKATOS, I . , MUSGRAVE, A. Criticism and the growth
posição moral; muitas vezes desaprovamos algo mas não explicamos
in /' tlgt ( Cambridge: Cambridge University Press, 1970. [Ed! brasileira: A crlti-
. . i - .' .t,:riiv(ilviuicnto do conhecimento. São Paulo: Cultrix, 1979.] por quê. É difícil analisar nossas posições morais de modo criterioso
II A l l i e d Wegener (1880-1930). Explorador egeofísico alemão. Sua teoria so- e sistemático. Ainda assim, temos certeza de que sabemos qual a coi-
l'i. i deriva dos continentes, exposta na obra Die Entslehung der Konlinenta und sa certa a ser feita. Os princípios que fundamentam o discurso ético
' • ' d ' |A origem dos continentes e oceanos] (1915), não foi-ceita pelos geógrafos são abstratos, mas as decisões éticas são concretas e práticas, com
id Ine. .Li década de 1950.
resultados visíveis para todos. Se o que conta são os resultados, apa-
Ifi r.l.i : I I K K , Tony. Academic tribes and territories: intellectual enouiry and the
i nihil,• nj disciplines. Milton Keynes: Open University Press, 1991, p. 77. rentemente não haveria motivo obrigatório para examinarmos a fun-
11 ' / I MAN, John. Public knowledge: the social dimensions of science. Cambridge: damentação lógica de nossos atos na vida cotidiana. Poderíamos ale-
i l i ill.11< lee University Press, 1969. [Ed. brasileira: Conhecimento público. Belo H o - gar que a ciência da informação preocupa-se com o projeto e imple-
i i otite Itatiaia; São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 1979.]
mentação de sistemas eficientes e eficazes de armazenamento e dis-
Ifi BECI IKK, Tony, op. cit., capítulo 5.
seminação de informações. As consequências disso não nos atingem,
19 Ver: IUH.ICK, Stephen. Structure and subject interaction: towards a sociology
.'/ knowledge in the social sciences. New York: Dekker, 1982. e o que os usuários resolvam fazer com o que aprenderam com nossa
20 Leitura fundamental sobre este tema é 'Collection evaluation: theory and ajuda não é da nossa conta. Nossa função é sermos eficientes. Não
I In M .neli for structure', Library Trends, v. 33, n. 3, p. 241-265, 1985. somos moralmente imputáveis pelo que os usuários fazem.
' I Ver: C R O N I N , Blaise. Citations: theory and practice. London: Taylor Graham,
O que é a ética, então? Em resumo, é um ramo da investigação
I')»(»,
2 I lARTER, P. Information science and scientists. Journal of the American Society filosófica às vezes conhecido como filosofia moral. Parece-seum pouco
/m Information Science, v. 43, n. 9, p. 583-593, 1990. com nossa velha amiga, a epistemologia, no sentido de que sai por aí
' I Para uma obra de leitura agradável sobre a epistemologia social d a ciência fazendo perguntas. A diferença é que a ética faz perguntas morais ao
• I M i H I R Q , Bruno. Laboratory life: the social construction of scientific fact. L o n d o n :
invés de estudar fatos descritivos. Entre essas perguntas estão:
:>.i/.,e Publications, 1974.
'I Ver: M A C N E I L L , Patrick. Research methods. London: Routledge, 1992. Intro- • Quando uma ação é moralmente correta?
dução muito útil. Ver também: SLATER, Margaret (ed.). Research methods in librarian-
ahip and information science. L o n d o n : Library Association, 1990. Seebohm Rowntree
• Há certas situações em que determinada ação seria correta?
(1871 1954). Industrial e filantropo inglês, Conhecido por seu rigoroso estudo dos • Devemos executar determinada ação mesmo sabendo que as conse-
l.iln:. sociais e físicos da pobreza. Desenvolveu os conceitos d e pobreza 'primária' e quências podem ser erradas?
'secundária'.
• Devemos executar determinada ação correta se tivermos bons moti-
25 HlíRCER, P, LUCKMANN, T. The social construction of reality. Harmondsworth:
Penguin, 1967. [Ed. brasileira: A construção social da realidade. Petrópolis: Vozes, vos para acreditar que os resultados serão prejudiciais?
I974.J

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• Devenios executar uma ação aparentemente incorreta se acredi- Examinemos rapidamente as teorias antagónicas:
1
tarmos que possa ter consequências desejáveis? Teoria do direito natural
A ética é um campo muito complexo da filosofia, que imbrica com a Este é o mais antigo princípio de conduta e é bem provável que te-
religião, política, antropologia e psicologia. Permeia o pensamento nha surgido no Oriente. Há no sánscrito antigo a palavra ritam, que
em quase todas as áreas da atividade humana. Quando examinamos significa, em inglês, right [certo, correto]. E altamente psicológico e
o tema, todos os empreendimentos suscitam algum tipo de questão metafísico na sua insistência de que existe uma lei 'escrita no cora-
moral. O problema apresentado pelo raciocínio ético situa-se princi- ção'. Alega ser uma teoria universal, que transcende as culturas, luga-
palmente no domínio da linguagem. Ao usar palavras como 'dever' res e épocas. Na teologia e jurisprudência ocidental encontra sua afir-
ou 'obrigação' estamos lidando com um universo de valores ao invés mação clássica no decálogo judaico ou Dez Mandamentos. O direito
de um universo de /eitos. Isso logo nos situa no lado oposto do pensa- natural t a m b é m encontra paralelo na filosofia grega, principalmente
mento científico, que lida principalmente com fatos. E difícil fazer nas ideias dos estóicos. Os mandamentos hebreus concentravam-se
uma afirmação ética e uma afirmação científica, e ser lógico e coe- no dever; os gregos eram mais propensos a buscar as consequências.
rente. E, para piorar, não há muito consenso no pensamento ético, Em todas as ações eles procuravam uma manifestação de propósito.
mesmo que todos tenhamos a certeza de saber o que é correto. Este telos ou propósito fazia parte de todas as coisas. Revelava-se no
Existem dois pontos de vista importantes que podem ser adotados crescimento natural em relação ao desígnio preestabelecido, assim
na ética. O primeiro denomina-se ética do 'dever' ou, mais tecnica- como a bolota nasce do carvalho. Um critério garantido da correção
mente, a visão deontológica, palavra que vem do grego deon, que sig- de uma ação era observar se era útil ao desenvolvimento do indiví-
nifica dever. Esta posição pode ser resumida como: 'faça o certo quais- duo. Utilizamos um argumento semelhante quando falamos de opor-
quer que sejam as consequências'. A outra posição começa com as tunidade educacional e desenvolvimento intelectual. Tudo tem um
consequências e avalia o valor moral de uma ação pelas consequên- fim ou propósito e as ações corretas são as que conduzem a essa fina-
cias que pode causar a outras pessoas. Esta posição é tecnicamente lidade natural. As palavras-chave eram cerro e razão, que permitem
conhecida como posição teleológica, da palavra grega telos, que sig- que o potencial de todos os seres humanos seja realizado.
nifica 'fim' ou 'propósito'. A esta altura o leitor já terá ultrapassado a Os romano.- pensavam bastante sobre o direito natural, não por-
narrativa e estará fazendo perguntas do tipo: que fossem mais corretos do que os outros, mas porque enfrentavam
problemas jurídicos que envolviam os sistemas de valores das diver-
• O que fazer, se sentir que meu dever para com meu empregador sas nações sob seu controle. Eram hábeis legisladores e utilizavam o
não está 'certo'? direito natural como apoio para o que chamavam 'direito positivo'.
• O que é superior, meu dever para com meu empregador ou meu
Emotivismo
dever para com minha consciência?
Doutrina segundo a qual todos os julgamentos de valor são expres-
• Devo cumprir meu dever para com meu empregador mesmo sa-
sões de preferências ou sentimentos. Como tais, não se pode afirmar
bendo que terá consequências ruins?
que esses julgamentos sejam logicamente verdadeiros ou falsos. Esta
• Onde está a autoridade máxima de meu dever para com meu em-
posição ética está frequentemente contida na declaração: sei que es-
empregador, para comigo e para com a sociedade?
tou errado, mas sinto que estou certo. Ela defende a primazia das
• Se existe uma autoridade máxima de meus atos, estará ela apenas emoções como o amor, compaixão, empatia e solidariedade como
nas normas da minha cultura, ou será um imperativo universal? indicadores de aprovação moral. Sentimos repugnância diante de
• Aí jaz o problema da análise ética. Ou se faz o que é apropriado e cenas de crueldade com outros seres humanos ou criaturas da natu-
para detenninado momento e local, ou há um princípio fundamen- reza porque podemos imaginar o que deve ser o sofrimento para eles.
tal que é válido para todos os momentos e lugares.

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Á imaginação é vista como o grande 'termómetro' moral, que avalia o explicara maneira como nos comportamos e atuarcomo uma norma
valor moral de uma ação. que tios guie no processo de decisões éticas. Em tempos primitivos,
Utilitarismo segundo a teoria, o indivíduo nascia num estado anárquico da natu-
reza. Finalmente, ao exercer a razão natural, os indivíduos formaram
Era sua forma mais geral a norma utilitária determina que devemos
uma sociedade mediante uni contrato com outros indivíduos de mes-
sempre agir do modo que traga os maiores benefícios para o maior
ma opinião. Esse contrato significava uma redução drástica da liber-
número de pessoas. Tem sido o princípio mais invocado na política e
dade individual, mas em compensação o homem conquistava maior
planejamento social inglês. Os utilitaristas dividem-se em dois cam-
segurança coletiva. O preço desta segurança coletiva era ficar preso a
pos. Há o utilitarismo da atuaçâo, que manda que em todas as oca-
uma rede de regras e obrigações que todos deveriam cumprir para
s i õ e s cm que temos de fazer uma escolha moral devemos escolher a
que o sistema funcionasse. Alguns filósofos românticos e anarquistas
. K . H O que produzirá mais benefícios. A este campo contrapõe-se o
políticos argumentaram que isso foi um mau negócio: "o homem nasce
utilitarismo da regra que diz que devemos seguir as regras que tra-
livre mas em toda a parte vive acorrentado" disse notável visionário
i iam a maior felicidade se fossem seguidas em geral; ou, na sua forma
romântico [Jean-Jacques Rousseau (1712-1778)]. Posição diferente
negativa, os atos que causarão menos danos ao maior número de pes-
assumiu Thomas Hobbes, filósofo político inglês, em sua obra clássi-
soas. O utilitarismo negativo afirma que devemos agir apenas para
ca, Leviatã. O homem vivia em estado natural onde não havia critéri-
afastar o mal, não para produzir o bem. O utilitarismo é essencial-
os obrigatórios de certo e errado. Cada pessoa pegava para si tudo o
mente uma teoria teleológica, ou seja, concentra-se no desígnio e no
que podia e a vida do homem era "solitária, terrível, violenta e curta".
I i i o p ó s i t o como critério da ação correta. Uma dificuldade do utilita-
O Leviatã é o Estado absoluto com o qual o homem se compromete
lisnio c que jamais conheceremos todas as consequências de qual-
e faz um contrato de obediência às regras e cumprimento dos deve-
Cjuei ato, e as consequências desejadas podem depender em grande
res. Em troca dessa submissão ele é protegido de seu medo primordi-
p u l e do que os outros fazem.
al de danos físicos e morte violenta. O teste ético de uma ação é o
I lá ainda o problema de definir o 'bem'; é provável que os bene-
grau com que este contrato social é rompido ou ameaçado.'
ficiários presumidos das políticas utilitaristas não compartilhem do
Como o leitor deduzirá prontamente, há pouco ou nenhum con-
mesmo conceito sobre o que é 'bom' para eles. Vimos como o pensa-
senso entre os filósofos morais e até as escolas de pensamento se fun-
mento utilitarista era uma força impulsora por trás de grande parte
dem ou se superpõem. O principal propósito das escolas de pensa-
da legislação na época vitoriana. Nem todos concordavam que as bi-
mento, como o utilitarismo e a teoria do contrato social, era encon-
bliolccas públicas fossem 'uma boa coisa'; e as reformas na área da
trar bases para ações éticas fora do terreno religioso. Cada uma, à sua
saúde encontraram forte resistência da parte de alguns que afirma-
própria maneira, possui algum valor explicativo para a análise de nos-
vam que seus direitos pessoais estavam sendo reduzidos. Em muitos
sa condição atual. A teoria do direito natural continua influente no
i i . o s o utilitarismo precisa de um tipo de cálculo para medir a quan-
pensamento judaico-cristão e se refiere em alguns dos princípios mais
I idade de bem produzido e para avaliar sua distribuição justa entre 'o
importantes da jurisprudência ou da filosofia do direito.
i i i . i i o i número'. Uma interessante questão recente diz respeito à polí-

Hi ,i populacional. Normalmente os utilitaristas têm-se preocupado O emotivismo reflete nossos sentimentos de benevolência e com-
i IH ii os problemas relativos à criação de bens e sua distribuição entre paixão diante do sofrimento alheio; mas sem a ação racional é insufi-
determinada população, mas novas questões surgem quando pode- ciente para realizar seus objetivos. Podemos, infelizmente, ter emo-
I I I I I , (ou não) decidir qual será o tamanho desta população.
2 ções destrutivas também, e sermos engenhosos ao criar motivos para
'más' ações. O intuicionismo ético também é insatisfatório, já que é
'1'nitid do contrato social preciso haver um padrão objetivo de algum tipo se minhas intuições
Iv.la (• essencialmente uma ficção, um constructo mental que tenta sobre o que é certo diferirem da sua. Argumenta-se que se aplicarmos

176 177
exclusivamente princípios utilitaristas, as ações resultantes poderão Kant é um filósofo bastante difícil, e, nem é preciso acrescentar,
acarretar violações da justiça natural. Há o velho exemplo citado em nem sempre popular. Em termos práticos, é possível imaginar con-
sala de aula das 13 pessoas numa ilha deserta, 12 das quais são sádi- textos onde seja preciso dizer uma mentira para evitar alguma tragé-
cas. Se a maior felicidade para o maior número de pessoas consiste dia. Suas ideias sobre livre arbítrio são controversas, no entanto, o
em torturar a décima terceira, precisamos de u m princípio moral princípio do livre arbítrio é fundamental para o crime e sua punição.
extrínseco para impedi-las de fazê-lo. A menos, é claro, que a décima Ele argumentaria que se fôssemos inteiramente produtos de nossa
terceira pessoa seja masoquista. Ou, suponhamos que eu ignore um herança genética e experiência ambiental então nossas ações futuras
sinal de trânsito e por um acaso evite um acidente que poderia ter estariam totalmente determinadas. Os maus não merecem ser con-
ocorrido. Eu certamente violei minhas obrigações segundo a teoria denados, assim como maçãs estragadas também não podem ser con-
do contrato social. De acordo com o utilitarismo de ação agi certo; denadas. Os seres humanos são racionais; ou seja, podem fazer esco-
4
mas para o utilitarismo de regra agi errado. O utilitarismo de regra lhas com base em consequências previsíveis. Obviamente, esta é uma
funciona segundo o pressuposto de que a obediência às leis de trânsi- consideração essencial quando examinamos a ética da inteligência
to produz melhores resultados para a sociedade. Neste ponto ela i m - artificial. Proporciono à minha empresa um eficiente sistema de i n -
brica com a teoria do contrato social. Se ninguém obedece às leis de formação baseado no princípio utilitarista de que ela trabalha para o
trânsito então não há sentido sequer em tê-las, e um 'bem social' é bem máximo do maior número de pessoas. Ela está agindo de acordo
posto em risco. Eu deveria ter seguido a lei férrea do dever e agido com pressupostos cientificamente comprovados de que o flúor pre-
corretamente, quaisquer que fossem as consequências. Esta máxima venirá a cárie dentária na maioria da população. Está agindo também
teria agradado a Immanuel Kant, o famoso filósofo alemão cujas ideias de acordo com a teoria do contrato social, cumprindo escrupulosa-
são muito importantes para o pensamento ético. Era um rígido de- mente a rede de obrigações implícitas em sua função social como
fensor do dever. Seu imperativo categórico mandava que sempre se empresa. Caso venha à tona que a validade científica dos pressupos-
agisse de maneira que pudéssemos citar o ato particular como um tos de conhecimento que ela adota não resulta de um consenso uni-
princípio universal. Isso é completamente o oposto da ética situacional versal entre os especialistas competentes, meus deveres talvez neces-
em que se pode argumentar no mesmo género: "bem, agi daquela sitem de uma reavaliação. Esta é uma área difícil onde decisões éticas
maneira devido àquela situação particular; não a recomendaria como possuem uma base empírica; neste caso, a validade do flúor como
um princípio universal". Argumentava que os animais e todas as coi- agente que serviria sempre para a finalidade que se supõe que ele
sas da natureza, exceto o ser humano, comportam-se segundo as leis sirva. O outro problema na análise ética é o emprego da linguagem,
da natureza, não segundo princípios racionais. Só um ser racional particularmente no sentido referencial de que estivemos falando nos
tem o poder de agir de acordo com sua noção de leis — ou seja, de outros capítulos. Se dizemos 'o bem máximo para o maior número
acordo com princípios racionais — e somente então ele possui arbí- de pessoas', a quem cabe dizer o que é o 'bem'? Em qualquer popula-
trio. Portanto apenas ao ser humano se aplicam as noções de dever e ção o maior número não quer dizer todos. O que acontece com o res-
obrigação, e apenas o ser humano é afetado por aquilo que Kant cha- tante? Se digo que X é um 'bem', estou querendo dizer que seu de-
ma 'imperativos', que são de dois tipos: hipotéticos ou condicionais, sempenho está conforme um padrão aceito para o que as bases de
e categóricos e incondicionais. Se você quiser ter uma velhice prós- dados devem fazer. Podemos indagar ainda: 'bem para qual finalida-
pera deve trabalhar duro durante a juventude, é um imperativo hipo- de?' Não é um fim em si mesmo, mas é instrumental para outros fins.
tético, a ação é instrumental para a realização de outra coisa. Mas Suponhamos que fosse o caso de ser para o avanço das técnicas de
'você jamais deve contar mentiras' é um imperativo categórico; não há vivissecção ou da guerra bacteriológica, eu teria que considerar se
maneira de se escapar da ordem assim expressada. E absoluto; deve deveria adotar uma postura moral ou ética. Esta linha de raciocínio
ser obedecido, independentemente das consequências. 5
nos leva ao problema do 'casuísmo' ou a aplicação de princípios mo-

178 179
ruis a casos específicos. Os principios casuísticos assemelham-se na nhuma obrigação de me revelar falhas na estrutura, embora deva res-
SUB aplicação ao uso e função dos códigos de catalogação que apli- ponder do modo mais honesto possível às perguntas que lhe fizer.
c a m princípios gerais a documentos específicos. Ao contrário da éti- Aqui temos um delicado equilíbrio jurídico e ético na revelação de
ca sihiacionista que rejeita a aplicação de princípios gerais, o casuísmo informação e seus efeitos nas decisões tomadas. Agora vem a diferen-
caiu em descrédito porque é suspeito de aplicação desonesta. Passou ça de modo: confiamos no profissional. No sentido ideal da relação
a se identificar com a exploração de características su tis de uma situ- cliente-profissional, o lema é credat emptor; que o comprador acredi-
a r ã o pnra se atingir uma conclusão moral desejada quando diante de te ou confie no que está sendo apresentado ou recomendado. Neste
hilos inconvenientes. Suponhamos que eu justificasse minha partici- sentido é uma relação muito especial de pessoa a pessoa, centrada
pação no desenvolvimento de serviços de informação para a guerra em torno da comunicação da informação.
bacteriológica alegando que era para o 'bem' de meu país. Estamos
6

Aceito o que o meu médico recomenda. Aceito suas recomenda-


tomando essa atitude apenas para evitar um mal maior. Que é às ções na suposição dupla de que ele sabe mais do que eu sobre o pro-
vezes necessário agir de modo errado se estivermos razoavelmente blema, e que agirá para a minha melhora. Suponho que garantirá
seguros de que disso resultarão coisas muito boas. Ou, poderia alegar para que eu esteja completamente informado; daí o critério-chave:
que meu dever perante minha empresa era um imperativo categóri- consentimento com conhecimento de causa. Como essa relação especi-
co, incondicional e irrestrito. Chegaria ao extremo de afirmar que al veio a acontecer? Está se modificando? Observamos antes que a
desempenho um papel diferente como empregado e que as normas eficiência na sociedade depende da divisão do trabalho, que se relaci-
d ¡cas que vigoram na minha vida privada não se aplicam neste caso. ona com o aumento do conhecimento e a especialização a serviço das
necessidades humanas. Esta tendência da sociedade tem aumenta-
6.2 A ética e as relações profissionais do, e, até onde se pode ver, continuará a crescer. Sociedades tecnologi-
Na última frase do parágrafo anterior abordamos os diferentes pa- camente complexas requerem maior aplicação do conhecimento es-
péis que as pessoas desempenham na vida, e como o tipo de papel pecializado do que as sociedades mais simples do passado. Isso pode
pode influenciar as decisões éticas. Tomamos decisões éticas em nos-
ser uma boa coisa para a sociedade, mas acarreta um problema na
so cotidiano e frequentemente essas decisões têm consequências para distribuição social do poder. Os especialistas podem tomar-se tão
outras pessoas que estão relacionadas conosco de várias maneiras. especializados que passarão a tratar suas especialidades como bases
Essas pessoas podem ser amigos, colegas, até mesmo estranhos de de poder, a não ser que se auto-regulem ou estejam sob um controle
passagem; quem quer que sejam, estamos numa relação ética com mais amplo. Sempre foi difícil controlar o poder adquirido pela posse
elas, mesmo que sejam um tanto temporárias e efémeras. exclusiva de conhecimento e informação. Os sociólogos t ê m consci-
ência desse perigo há muito tempo, principalmente na sociologia das
Se tomamos decisões éticas como profissionais nós o fazemos sob
profissões.
o mesmo sistema de regras, mas com variações importantes. Agimos
no papel de cliente e profissional. Se vendo alguma coisa a alguém, Há três contribuições muito importantes cujo estudo ainda é com-
liá uma relação de vendedor-comprador. Isso não me dá licença de pensador. Max Weber (1864-1920) via a evolução das profissões e
agir desonestamente, mesmo que esteja vendendo um carro de se- sua importância social como a transição de uma ordem social onde o
gunda mão. A lei propicia ao comprador algumas deixas genéricas, sfíiíus de cada um depende das tarefas que executa para o bem co-
como, por exemplo, caveat emptor: que o comprador se acautele; ou a mum, e onde elas são atribuídas segundo critérios racionais de capa-
pessoa age correndo seu próprio risco. O teor geral dessas máximas é cidade e especialização. Daí, a aura semi-religiosa atribuída a uma
que quando travamos negociações com outras pessoas iniciamos uma profissão. Não se herda, como a posição social que é atribuída; é esco-
atividade de risco e seria prudente que nos infonnássemos tanto quan- lhida e assumida como uma missão. Ademais, é escolhida de modo
lo possível. Se estou comprando uma casa, o vendedor não tem ne- altruísta.

180 181
Emile Durkheim (1858-1917) dedicou-se a buscar uma autorida- As caracíerísíicds estruturais em sua forma ideal seriam: autónomas,
de legítima que harmonizasse o conflito de interesses que surge em coletivas e meritocráticas. Confeririam a autoridade necessária para
qualquer sociedade industrial— as sociedades industriais são com- regulamentar seus procedimentos, impor disciplina e proporcionar o
petitivas por natureza. É preciso haver então um mínimo de coesão desenvolvimento intelectual de seus membros. A realização desses
entre seus membros. Para Durkheim, o antigo conflito entre interes- objetivos seria por si só um 'bem social' para a comunidade maior.
se próprio e bem comum seria atenuado ou eliminado por associa-
As características filosóficas compreendem o 'por que' da existência
ções de pessoas que empregassem suas habilidades para o bem-estar
da profissão — sua orientação para a comunidade, ideais de serviço
da sociedade. Cada um desses grupos seria governado por conjuntos
prestados à sociedade mais ampla e suas relações com profissões afins.
de regras internas que desenvolveriam uma disciplina positiva entre
seus membros e os afastaria das demandas do egoísmo individual tão Todas essas três características acham-se incorporadas no código
característico do empresário e do industrial. Talcott Parsons (1902— de ética da profissão. Ali encontramos a base dc conhecimentos, o
1979) ampliou e sistematizou as análises de Weber e Durkheim. Es- mecanismo para a organização das aptidões profissionais, junto com
colheu para modelo a relação médico-paciente, que ainda influencia a fundamentação lógica subjacente que permeia o todo.
as discussões sobre ética profissional. A habilidade do médico baseia- Essas são, é claro, considerações ideais, como o leitor terá percebi-
se numa especialidade dupla: possui certo conhecimento da doença do. Com o passar do tempo novas profissões surgem c lutam para
e suas causas, e também experiência em certo número de técnicas de exercer hegemonia sobre áreas específicas do conhecimento huma-
intervenção. Esta dualidade de aptidões expressa-se na afirmação de no. Monopólios e relações de poder dc algumas entrain em declínio
que a medicina é uma ciência aplicada. Há, pois, uma relação de po- enquanto outras se fortalecem. Vejamos a observação perspicaz de
der entre médico e paciente, e o risco de a parte dependente ser ex- lorde Acton: "Todo poder tende a corromper, c o poder absoluto cor-
plorada. A proteção ao paciente está institucionalizada no cuidado rompe absolutamente. Os grandes homens são quase sempre homens
8
desinteressado do médico, que não deve explorar seus pacientes, nem maus."
escolhê-los segundo seu poder aquisitivo. Se tal relação ficar sujeita Deve haver poucas dúvidas sobre o poder da informação; certa-
às forças do mercado, então outra autoridade coativa deverá cuidar mente não havia nenhuma no passado remoto. Há tuna relação bas-
dos interesses dos pacientes. "Entro em qualquer que seja a casa; ali tante delicada entre o tipo de informação que temos sobre uma pes-
estou para o bem do enfermo" e "acima de tudo não prejudicar" eram soa e a condição dessa pessoa como ser social autónomo. Uma gran-
as advertências clássicas do fundador da prática médica. Ainda exer- de parcela de nossa autonomia social depende da maneira como os
cem influência nos códigos de ética criados por outras profissões. 7
outros nos vêem. Sabemos que a lei assume uma posição rigorosa em
As profissões, em sentido ideal, surgiram com certas característi- face de informações que possam abalar o respeito que pessoas ínte-
cas definíveis que podemos, por razões de conveniência, chamar subs- gras têm por nós. "Não prestarás falso testemunho contra o próximo"
tantivas, estruturais e filosóficas. é o mandamento teológico comum. Numa sociedade oral, a vida de
uma pessoa pode depender do testemunho oral de outra. E hoje dis-
As substantiveis compõem o corpo específico de aptidões que a pro- pomos do poder adicional dos meios de comunicação impressos e
fissão alega possuir. São características próprias da profissão em ques- eletrônicos. As profissões que lidam com esses meios possuem,
tão; o que se pode chamar sua competência exclusiva. Este corpo de analogamente, maior poder e maiores responsabilidades.''
conhecimentos está aberto a constante avaliação e adaptação às ne-
cessidades sociais em mudança; constitui também o currículo para a
6.3 Questões éticas e serviço de informação
formação de futuros profissionais. Currículo que deve ser incisivo
tanto ao inculcar valores quanto ao capacitar no uso de técnicas e Há quatro grandes áreas de interesse atual: privacidade, exatidão,
informação. propriedade e c/cesso.

182 183
Definirei privacidade como a situação em que se está protegido do acesso inde- • Em quais condições?
sejável por parte de outrem, seja acesso psicológico ou físico, a informações pes- • Que informação deve ficar restrita exclusivamente para si próprio?
soais ou observação indesejável."
A primeira questão leva a outra. É a privacidade um direito absoluto?
A privacidade é um conceito difícil e, para tornar as coisas ainda
Sabemos que a privacidade é uma variável cultural, que a privacida-
mais difíceis, possui unia relação incómoda com o acesso, que tende-
de numa aldeia da Nova Guiné não é a mesma de um bairro de classe
mos a considerar algo bom. A definição acima salienta que esse aces-
média. E provável que se trate de um conceito do Ocidente industri-
so não é buscado ou desejado e que qualquer informação sobre uma
alizado e principalmente de classe média; para o pobre, seria algo
pessoa deve recair soba mesma rubrica. Existem algumas caracterís-
assim como um luxo, ao invés de uma norma aceita. Há situações em
ticas que, se não são exatamente definidoras, são pelo menos indi-
que a privacidade pode ser justificavelmente quebrada. A privacida-
cativas:
de de um criminoso pode ser quebrada para o bem maior, se ficar
• A privacidade é uma forma de autonomia ou controle sobre ques- provado que os resultados disso beneficiam a comunidade. A privaci-
tões pessoais importantes. dade pode ser quebrada para o próprio bem do indivíduo, se as cir-
• A privacidade inclui a liberdade de não sofrer intromissão indesejá- cunstâncias assim justificarem. Suponhamos que inventamos uma
vel, e a liberdade de tomar decisões racionais sem coerção ou impe- máquina capaz de ler nossos pensamentos, queiramos ou não. Isso
dimento. poria em risco nosso santuário interno, aquilo que torna o indivíduo
único. O escritor russo Alexandre Soljenitsin considera toda institui-
• A privacidade é um conceito territorial tanto no sentido psicológi-
ção que coleta informação pessoal como se estivesse a tecer um fio
co quanto no sentido físico de controle espacial.
invisível que liga o indivíduo a um arquivo central.
• A privacidade é uma área de negociações com o outro, que desen-
volvemos para nosso próprio crescimento pessoal. Se esses fios fossem visíveis o céu estaria tomado por uma teia deles e se tives-

• A privacidade é essencial para a preservação de nossa identidade sem substância ou elasticidade os ônibus, bondes e as próprias pessoas não con-
11
seguiriam mais se mover.
pessoal.
Os fios que levam a cada um de nós são inúmeros: prontuários
Embora privacidade não signifique necessariamente solidão, te-
médicos e de trabalho, cadastros de pensões, bancos, crédito, seguro,
mos que analisar o conceito no cenário de nossas civilizações urbanas
instituições educacionais, os meios de comunicação; se todos esses
industriais superpovoadas e superlotadas. A coleta de impostos, a dis-
fios forem tecidos, isso conferirá enormes poderes a qualquer um que
tribuição de benefícios sociais, segurança pública, planejamento so-
queira controlar nosso destino. Se conhecemos quem sabe o que a
cial e políticas governamentais, tudo isso exige a apresentação orga-
nosso respeito, temos uma chance remota de reparação; se desconhe-
nizada de enorme quantidade de informações, em grande parte de
cemos quem sabe o que a nosso respeito, então ficamos realmente
natureza pessoal e potencialmente embaraçosas se reveladas. O Esta-
muito vulneráveis. A informação pode nem ser verdadeira. Esses pro-
do tem o apoio da ética utilitarista quando usa estas informações
blemas não foram criados pela tecnologia da informação, mas são
para o bem maior; caso contrário, entrará em choque com os ditames
certamente agravados pela sua capacidade ampliada de vigilância,
básicos do direito natural.
comunicação, computação, armazenamento e recuperação. O con-
Méd icos, advogados e sacerdotes têm reconhecido tradicionalmen-
ceito de informação como mercadoria é até mais perigoso e insidioso;
te o dever do sigilo profissional, e o Estado tem o poder, que lhe é
faz com que organizações empresariais o cobicem, mesmo às custas
concedido por lei, de ter seus próprios segredos quando isso lhe pare-
da privacidade alheia.
cer necessário. Surgem duas questões essenciais: que informação deve-
O problema da exatidão afeta todas as profissões e ocupações, mas
sc exigir que uma pessoa divulgue para outros sobre si mesma?"
nenhuma é afetada de modo tão sério quanto as que lidam com in-

184 185
formação. A inexatidão pode ser analisada ao longo de uni amplo es- Smith," os resultados de seus esforços redundarão no bem de todos.
pectro moral, que vai do acidental e incompetente ao enganador e Se uma ou duas não seguirem esse padrão, sairão do negócio rapida-
deturpado. Nossa expectativa é de que haja alto grau de exatidão nas mente e todo o sistema acabará desestabilizado. Imagine-se na posi-
profissões científicas, cujo êxito depende da absoluta fidelidade à ver- ção de quem foi recentemente contratado como 'gerente de informa-
dade científica. As vezes, porém, pode ser conveniente ocultar o re- ção' para (a título de exemplo) uma empresa internacional de segu-
trato fiel de uma situação. Uma vantagem competitiva muitas vezes ros. Como diz a descrição de cargo: "função-chave como fornecedor
depende da supressão de informação. Consideremos o sistema de opo- de informações que permitam otimizar o desempenho da adminis-
sição no direito criminal. Talvez seja tentador para um advogado su- tração em benefício dos acionistas".
primir a verdade.
• O cargo. Gerenciar uma equipe que reúne e analisa informações
Tentação parecida pode afetar um profissional da informação que
de mais de X milhões de pedidos de pagamento de seguros por
esteja compilando dados que ele sabe serem imprecisos, e onde a
ano utilizando complexas bases de dados.
revelação desse fato seria prejudicial a seu empregador. Sempre que
estivermos competindo com outros seres humanos estarão em risco • Identificar e estabelecer indicadores-chave de desempenho, a
os padrões éticos. Os traços de caráter exigidos de um profissional fim de alcançar conclusões pertinentes e significativas para utili-
bem-sucedido podem estimular uma moderação da verdade, ou mes- zação na previsão, contratação, desenvolvimento de novos produ-
mo deturpações deliberadas com o intuito de ganhar vantagem sobre tos e melhoria da qualidade de serviço para menlbros e investido-
os competidores. Por outro lado, os empregadores têm o direito de res.
negociar o sigilo, principalmente quando certos atos podem ser to- • Colaborar com a equipe superior de administração, e trabalhar
mados como quebra de confiança. de perto com os departamentos afins e instituições pertinentes,
A cara-de-pau é um rosto inexpressivo, característico do bom jo- como departamentos nacionais de seguridade social e organiza-
gador de póquer: a intenção de ocultar dos adversários qualquer ideia ções estrangeiras visando a ampliar a base de coleta de dados.
sobre as cartas que tem nas mãos. O jogador pratica o blefe, o engodo As seguintes qualificações exigidas foram preenchidas por você:
e a tapeação. Pode-se argumentar que ele não faz nada de errado, pois
• Pessoa altamente inteligente formada em ciência da informação-
não se espera que seja um respeitador da verdade. Ele está jogando
de acordo com as regras do jogo. Até onde então a teoria dos jogos se gestão da informação.
aplica ao comportamento ético? O blefe nos negócios é ético? Embo- • Elevado grau de consciência e conhecimento dc assuntos securitá-
ra o fundamento da moral privada seja o respeito pela verdade e o rios e dos meios públicos de comunicação. Excelente competên-
cumprimento da palavra, pode-se encarar a moral pública de empre- cia em metodologias estatísticas e gerência de dados.
sas simplesmente como um jogo? De tempos em tempos os executi- • Discernimento, imaginação e criatividade na interpretação de da-
vos de empresas são forçados pelos objetivos de sua organização a dos para atender às necessidades de informações estratégicas da
enganar; ou, se não precisarem 'mentir abertamente', que pelo me- indústria de seguros.
nos sejam parcimoniosos com a actualité, com a situação como ela • Capacidade de gerência e comunicação para liderar a equipe e es-
realmente é. Por meio de distorções intencionais e ocultação de fatos tabelecer relações com contatos internos e externos.
relevantes, o jogo do blefe é jogado por todos, do mais de cima ao
Pode estar implícito, mas não abertamente explícito, que outras ca-
mais de baixo. O dever prioritário do administrador de unia empresa
racterísticas, como honestidade, integridade, e consciência ética, são
é com os acionistas, isto é, maximizar os lucros. Se todas as empresas
também necessárias. Há muitas coisas que podem dar errado. Você
fizerem o mesmo, o resultado será igual ao de indivíduos que defen-
está num negócio sabidamente penoso. Quanto mais você analisa a
dem seus interesses de maneira racional, e, como nos ensinou Adam
situação, mais conflitos éticos potenciais virão à sua mente. Atente

186 187
serem muito maiores do que as das cidades-estados gregas, temos
bem para a palavra 'conflito', porque ela sempre torna as decisões
que experimentar e resolver a questão por meio da democracia repre-
ericas e profissionais mais difíceis. Você pode ser um profissional còm
sentativa e do governo representativo. Teoricamente os meios de co-
um código ético. Os compromissos no estrangeiro tornam mais fá-
14 municação de massa deveriam ser capazes de compensaras deficiên-
ceis e tentadoras a exploração de culturas do 'terceiro mundo'. A
cias no fluxo da informação, mas eles também estão sob controle do
privacidade pode ser quebrada para se obter informação genética so-
Estado ou são vulneráveis à coerção estatal. O consenso geral entre
bre os clientes. À medida que essa ciência se desenvolve, tornar-se-á
os teóricos da política é que os Estados Unidos conseguiram produzir
mais tentador mergulhar na previsão genética para prevenir riscos.
uma 'cultura da informação' e abertura enquanto a Grã-Bretanha
I .embre-se da sua lealdade para com a organização; seus compromis-
aproxima-se perigosamente de parecer uma 'cultura de sigilos'. Tal-
sos em relação a possíveis quebras de sigilo. Quando e sob quais con-
vez isso seja um reflexo da antiga estrutura da classe dominante, quan-
dições você iria 'botar a boca no trombone'? Qual ou quais escolas de
do as classes inferiores não deveriam merecer confiança."
pensamento ético você citaria para justificar sua atitude?
Uma das questões mais complexas com que nos defrontamos na
Já afirmamos que o principal dever do administrador de uma em-
sociedade moderna é a dos direitos de propriedade intelectual. Trata-
presa é com os acionistas, e para maximizar os lucros. Podemos adap-
se de questão que reflete em suas origens a autonomia do indivíduo e
tar o argumento utilitarista para demonstrar o bem máximo pára o
o conceito de propriedade da informação. Existem substanciais inte-
maior número de pessoas, ao menos em nossa própria sociedade. A
resses económicos éticos envolvendo esses direitos, )unto com a ques-
questfio é ainda mais vital para os administradores da sociedade mais
tão subsidiária das transformações na transferência e armazenamento
ampla. Podem os governos enganar? De fato, pode o governo contar
de informações. Em primeiro lugar talvez seja caro produzir determi-
uma mentira? Essa pergunta tem estado presente há pelo menos dois
nada informação; mas, uma vez produzida, fica relativamente fácil
milénios e meio, e provavelmente já antes disso. Platão argumentou
reproduzi-la e compartilhá-la com outros. Tem-se desenvolvido, ao
que o governo podia mentir em benefício do Estado. Para apoiar seu
longo dos anos, um campo especializado que denominamos direito
argumento introduziu o que os teólogos iriam chamar mais tarde de
de propriedade intelectual. É a área especializada do direito que se
argumento de 'efeito duplo'. Os cidadãos do Estado eram seus acio- 16
preocupa com a expressão de ideias e com a criatividade humana.
nistas, e no caso de condições tão extremas em que, se o Estado não
Trata também da reputação comercial. Inclui em seu território a lei
mentisse eles seriam prejudicados, o Estado deveria mentir. Esta 'men-
de direito autoral, a lei de patentes, quebra de sigilo, lei de desenho
tira nobre' poderia ser usada para aplacar os cidadãos e, portanto,
industrial, lei de marcas e a lei de contratações. Do ponto de vista de
garantir a estabilidade social.
nossos interesses profissionais as modificações e ampliações frequen-
Mencionamos antes que o Estado moderno é, frequentemente, o
tes desta especialidade do direito refletem as mudanças na tecnologia
maior fornecedor de informações. Os Estados podem variar desde o
da informação de forma particularmente esclarecedora. Não menos
I otalitário, passando pelo despótico benevolente até o declaradamente
interessante é o desafio que a tecnologia da informação coloca para o
democrático. As empresas muitas vezes refletem as mesmas caracte-
direito.
rísticas em seus estilos de administração. A distinção crucial está en-
tre informação diretiva e informação consultiva, sendo que esta últi- A legislação do direito autoral foi originalmente concebida para
ma implica que o governo confia no povo. A democracia pura é uma dar aos autores um meio de proteger suas obras literárias. Embora a
condição característica da antiga Atenas; mesmo então, as decisões primeira legislação inglesa date de 1709, a ideia de que copiar é uma
excluíam as mulheres e os estrangeiros. Aos cidadãos era permitido forma de furto é antiga. A ideia de que a propriedade intelectual de-
reunir-se e decidir seu próprio destino e, como corolário, comparti- corre de um ato de criação é tão forte que há uma relação especial
lhar informação de forma aberta. Não existia nenhuma lei sobre se- entre o criador e os frutos de seu cérebro. Originalmente a lei de d i -
gredos oficiais. Devido ao fato de nossas populações participativas reito autoral era usada para controlar a imprensa, como forma de cen-

189
188
17
sura. Esses objetivos conseguiram criar um confortável monopólio trial e patentes estabelece os direitos morais dos autores. Esses di-
para quem ocupava posições de poder. Na Inglaterra um livro só po- reitos pertencem ao autor da obra independentemente de quem seja
deria ser publicado se fosse registrado tia Stationer's Company, e a lei o proprietário do direito autoral. Esses direitos reconhecem que o
de direito autoral era feita cumprir pela infame Star Chamber. Os autor possui um 'vínculo criativo' com a obra que lhe dá o direito de
infelizes autores dos séculos seguintes tinham que aturar a cópia por um certo grau de controle em relação ao uso subsequente da obra.
atacado de suas obras e finalmente buscaram consolo e alívio na lei Esses direitos morais refletem fortemente o raciocínio mais metafísico
de 1709, a primeira lei de direito autoral do mundo. Desde então o da teoria do direito natural, embora sejam aplicáveis somente a obras
direito autoral tem se espalhado pelo mundo, gradualmente ampli- literárias, teatrais, musicais, artísticas e filmes, e são:
ando seu alcance à medida que o livro vem sendo complementado
• 'direito de paternidade'. O direito de ser identificado como autor
com meios rivais de comunicação.
de uma obra ou diretor de um filme.
Na Inglaterra, a lei de 1911 reconheceu a existência do filme em
• 'direito de integridade'. O direito de não ter uma obra submetida
suas cláusulas. A lei de direito autoral de 1956, que substituiu a de
a tratamento depreciativo, isto é, tratamento que seja prejudicial
1911, levou em consideração a televisão, o rádio e a televisão a cabo
à honra e reputação do autor ou diretor.
ao conceder direito autoral às organizações responsáveis pela sua cri-
• Adicionalmente, toda pessoa tem o direito de exigir que não lhe
ação. Em 1984 a lei de difusão por cabo e rádio estabeleceu direito
autoral para os sinais enviados a satélites para serem retransmitidos seja imputada incorretaniente a autoria de uma obra.
para a Terra. No ano seguinte os programas de computadores foram Infelizmente para os profissionais da informática, nem o direito
reconhecidos pelo legislativo como sujeitos ao direito autoral, con- de paternidade nem o de integridade se aplicam em relação aos pro-
forme emenda à lei de direito autoral (programas de computador). A gramas de computadores, ainda que sejam classificados como obras
legislação atual está contida na lei de direito autoral de desenho in- literárias. Isso parece ser um raciocínio moral estranho, pois a pessoa
dustrial e patentes de 1988, cujos dispositivos relativos ao direito au- que criou um programa de computador (como qualquer outro tipo
toral entraram em vigor em 1." de agosto de 1989.0 objeto do direito de trabalho criativo) possui uma ligação conceituai com esse progra-
autoral, a coisa protegida, denomina-se 'obra'. São objeto do direito 18
ma; afinal, f.ssa pessoa foi que lhe deu existência.
autoral: Há certa perversidade nos resultados das inovações humanas, in-
dependentemente dos benefícios que nos possam trazer. Os avanços
• Obras originais literárias, teatrais, musicais e artísticas.
da tecnologia que viabilizaram os novos meios dc comunicação am-
• Fonogramas, filmes, programas de rádio e televisão, inclusive trans-
pliaram o acesso ao conhecimento. Também facilitaram e baratea-
mitidos por cabo.
ram sua cópia. A fotocópia e a gravação em fita são os primeiros exem-
• A diagramação de obras editadas. plos óbvios. A fita de gravação foi particularmente importante por-
A pessoa que cria uma obra objeto de direito autoral é conhecida que a função mais significativa desse novo meio estava na indústria
como autor, que é o ponto de acesso identificador num catálogo, como de entretenimento. A gravação caseira tomou-se o primeiro desafio
vimos em nossa entrada bibliográfica no capítulo anterior. Como o sério a ser enfrentado pelos detentores de direitos autorais na indús-
direito autoral é uma forma de propriedade ela deve ter um proprie- tria fonográfica. Embora uma fotocopiadora não seja ainda um item
tário. A regra básica é que o autor é o detentor primeiro do direito do mobiliário doméstico, seu uso comercial e educacional cresceu a
autoral intrínseco à obra, a não ser que seja um empregado e a obra tal ponto que hoje ela apresenta sérias ameaças a autores e editoras.
haja sido criada como exigência do emprego, caso em que o emprega- E por certo não é um recurso de pouca importância nas bibliotecas
dor é o proprietário primeiro do direito autoral. Em consonância com universitárias! Mais recentemente, o surgimento de vídeos e compu-
os requisitos da Convenção de Berna, a lei inglesa de desenho indus- tadores pessoais como itens de consumo corrente criou novas dificul-

190 191
dades. Cada tecnologia nova traz u m exemplo do vetusto paradoxo Privacidade. Quais as informações pessoais ou sobre suas relações que
da liberdade. Com o direito autoral os primeiros legisladores tinham uma pessoa deve revelar a outrem, em que circunstâncias e com quais
de se precaver para não definir os direitos individuais de forma tão garantias? Que coisas pode uma pessoa guardar para si e não revelar
absoluta que o resultado fosse um monopólio de ideias, ou então aos outros?
conceder ao autor direito algum, caso em que ninguém jamais publi-
Exatidão. Quem é responsável pela autenticidade, fidelidade ou exa-
caria nada.
tidão da informação? Igualmente, quem responderá por erros na in-
O acesso é um ideal que à sua maneira cristaliza os problemas
formação e como a parte prejudicada será indenizada?
inerentes à privacidade, exatidão e propriedade. Como vimos antes,
nosso principal meio de acesso ao conhecimento e à informação é a Propriedade. Quem é o proprietário da informação? Qual é o preço
instrução, e isso inclui instrução em informática. Frequentemente só exato e justo para sua troca? Quem possui os canais, principalmente
se consegue ter acesso a bases de dados tendo-se acesso a um termi- as ondas aéreas pelas quais a informação é transmitida? Como deve
nal ou computador pessoal, ou então pagar à biblioteca local. A trans- este recurso escasso ser alocado?
ferência do armazenamento impresso para o eletrônico trouxe difi-
Acessibilidade. Quais informações uma pessoa ou organização tem o
culdades para alguns usuários, principalmente os economicamente
direito ou privilégio de obter?"
carentes. A questão do acesso possui várias facetas, e cada uma mere-
ce um estudo separado. Qual grupo ou grupos de profissionais garantirá que essas pergun-
tas obtenham, pelo menos, respostas provisórias? O debate público a
• Acesso educacional. Inclui o 'direito de aprender' e o direito aos respeito da privacidade tem estado centrado nas amplas possibilida-
materiais eletrônicos e impressos que permitam que esse proces- des que existem de ela ser quebrada e invadida, inclusive intrusões
so realize seus objetivos. no domicílio da pessoa por correspondência não solicitada; questões
• Acesso económico. Muito relacionado com o anterior. O direito às relativas ao sigilo do censo, perseguição pelos meios de comunicação,
informações que contribuam para o bem-estar económico do indi- publicidade indesejável e o potencial dos computadores de armaze-
víduo, direito que estaria disponível se o indivíduo tivesse o di- nar e disseminar dados. O resultado legislativo desta preocupação
nheiro necessário. pública tomou forma na lei de proteção de dados de 1984. Como a
• Acesso político. O direito de ter informações relativas às decisões maior parte da legislação britânica no campo das comunicações, foi
tomadas por outros em seu nome, de modo que possam agir como uma resposta à inquietação pública. E assim que deve ser nas socie-
membros informados da sociedade. dades democráticas. No entanto, como vários atos do legislativo, não
• Acesso físico. Pode incluir todos os tipos de barreiras à informação, chegou a formular uma definição operacional aceitável daquilo que
da falta de rampas para cadeiras de rodas no exterior da bibliote- pretendia regulamentar. Seus críticos acusaram essa lei de adotar uma
ca local à falta de uma máquina de Kurzweil para auxiliar os leito- visão muito estreita da privacidade e tratar o computador como o
res que sofram de deficiência total ou parcial da visão. vilão da história. Isso se reflete na sua mais óbvia limitação que está
4
Acesso cultural. Muito relacionado com o acesso político e econó- no fato de referir-se apenas a dados processados por computador.
mico, compreende o acesso a materiais na língua, cultura ou cre- Isso corresponde a tratar o computador como um Frankenstein
do religioso do interessado. temporão e esquecer a lição fundamental de Mary Shelley: que não
foi a criação do monstro que constituiu a enormidade da ofensa, mas
2
6.4 Temas e questões a fuga do criador à responsabilidade. "
O computador é (por enquanto) um instrumento pelo qual uni
A fim de reunir algumas das questões mais importantes, resumire-
ser humano intencional e racional implementa uma decisão. O pro-
mos brevemente o que foi apresentado:

192 193
blenia mais fundamental é um dilema filosófico: onde começam os Manter a palavra empenhada é a base do contrato social. O co-
direitos absolutos e onde acabam os direitos prescritos? Ou, colocan- mércio depende para sua eficiência de que as pessoas cumpram com
do o problema de maneira mais coloquial: 'minha liberdade acaba o prometido; ao firmar uma relação comercial, devem manter-se fiéis
onde começa seu nariz'. Teria eu um direito absoluto de acesso, se- às suas promessas de manter sigilo. A este respeito, o profissional da
gundo a lei comum, ao meu prontuário médico? A legislação inglesa informação tem um dever a cumprir c, a propósito, encontra-se um
atual dá ao indivíduo o direito de acesso a informações a seu respeito parágrafo pertinente no código de ética da Library Association:
mantidas em formato computadorizado, desde que isso não cause Os sócios não devem divulgar a terceiros nem permitir que sejam divulgados
sérios danos à saúde física ou mental do indivíduo objeto dos dados, quaisquer materiais ou arquivos administrativos (em forma manual ou eletrôni-
ou revele a identidade de outro indivíduo. Parece que sempre há uma ca) que lhes tenham sido confiados em sigilo, nem utilizar tal informação sem o
cláusula que restringe a reivindicação de um direito, um sólido argu- consentimento prévio do cliente para qualquer finalidade que nâo seja aquela
para a qual foi obtida de início. Este dever para com o cliente permanece mesmo
mento a favor da teoria do contrato social sobre o delicado equilíbrio
após cessada a relação entre bibliotecário e cliente.
entre direitos e deveres que constituem a sociedade civilizada. A pes-
quisa social é outra área contenciosa onde a informação pessoal é um Encontra-se alento no apoio de um código profissional, mas nem
bom exemplo do delicado equilíbrio que acabamos de mencionar. todos os grupos de pessoas que lidam com informação são membros
Num contexto cada vez mais litigioso o pesquisador social corre seu de uma profissão. Sejam os indivíduos membros ou não de uma pro-
próprio risco. No geral, parece não haver nenhuma proteção inexpug- fissão, haverá problemas que precisarão de uma resposta coordenada.
nável para o indivíduo. O estado industrial moderno baseia-se na co- A legislação do direito autoral foi originalmente concebida para
leta de informações e dados pessoais a respeito de seus cidadãos. Não proporcionar aos autores um meio de proteger as obras literárias. A
temos outra escolha a não ser preencher nossos formulários do censo, medida que modos mais novos de expressão intelectual e estética
e as perguntas tornam-se mais invasoras de nossa privacidade a cada tomaram-se disponíveis, a legislação do direito autoral teve de ser
21
censo. No entanto, sem esses dados seria impossível a existência de ampliada para acomodá-los. A lei de 1988 concede a proteção do di-
pesquisa para fundamentar uma política social ou planejamento so- reito autoral a criações fixadas em qualquer meio material de expres-
cial. Para o assistente social há o problema da informação pessoal a são, mas o problema é que o direito autoral depende da fixidez de
ser obtida durante a pesquisa. E preciso o consentimento com conhe- expressão. O livro feito para um determinado cliente apresenta um
cimento de causa do sujeito, que deve ser capaz de entender a infor- problema tanto para a unidade bibliográfica quanto para a identida-
mação e fazer considerações racionais sem coerção ou trapaça. de do autor. Os programas de computador ocupam um lugar polémi-
co na terminologia do direito autoral. A expressão 'programas de com-
O equilíbrio entre os direitos da propriedade intelectual e o bem
putador' é empregada para descrever programas e materiais de supor-
comum foi sempre imposto à atenção de quem legislava sobre direito
te, mas não possui significado exato e nunca foi definida na legisla-
autoral e patentes. A proteção assegurada pelo direito autoral cuida
ção do Reino Unido, o que tanto faz, devido à rápida velocidade das
dos interesses do indivíduo, mas limita o intercâmbio de ideias, que
mudanças. No entanto, cria um problema na falta de uma diferenci-
são um bem comum. A lei do sigilo comercial garante o sigilo e tam-
ação entre programas e equipamentos de informática. Apesar de os
bém ajuda a fortalecer a natureza inarredável da palavra empenhada.
programas de computador poderem ser lidos e compreendidos por
Por estranho que pareça, a finalidade da lei de sigilo comercial é manter
seres humanos, sua principal função não é inspirar o pensamento
padrões aceitáveis de ética comercial ao invés de favorecer os objetos
humano; são escritos para dirigir as operações de componentes digi-
de sigilo como tais. As partes que se envolvem numa relação comerci-
tais cletrônicos. Desse modo, muitos os consideram como estranhos
al elevem permanecer fiéis às suas promessas de manter sigilo. Toda a
ao espírito de um sistema destinado a proteger criações artísticas.
estruturo da ética comercial baseia-se no fato de que as pessoas hon-
rarão a palavra, Um princípio fundamental da lei de direito autoral é que a prote-

194 195
ção limita-sc à expressão do autor; ela não se estende à ideia subja- momento específico do tempo? Qual a diferença entre uma ideia e
cente. Este princípio é adequado para tipos de obras cujo conteúdo sua expressão? ' Isso pode soar como um enigma para filósofos ama-
2

apreciado encontra-se totalmente em fornia de expressão. Para obras dores, mas fez disparar os neurónios nas cabeças de juízes de tribu-
de literatura ou cinema, a proteção das palavras escolhidas pelo au- nais que têm que decidir sobre questões de infração do direito auto-
tor, formato ou estilo é suficiente para proteger contra furtos do es- ral. Tem também exercitado as mentes dos bibliotecários, principal-
forço criativo. É difícil aplicar o mesmo princípio aos programas de mente dos catalogadores, à medida que acompanham a sequência de
computador porque é possível haver vários caminhos de códigos para edições, feitas sem piedade, de uma obra original até que sua subs-
implementar um conjunto idêntico de operações simbólicas ou ma- tância original parece haver desaparecido por completo. Obras como
temáticas. A pergunta fundamental é: o que torna um programa de a Anatomia, de Gray, foram revistas tantas vezes que o catalogador
computador único? A originalidade de um romance não depende to- tem que decidir sobre em que momento o texto mais recente passou
talmente das palavras ou da gramática que o autor escolhe; a nature- a ser substancialmente uma nova obra. O vínculo criativo, os direitos
za da obra estende-se ao jogo de relações entre personagens, enredo, de paternidade e integridade referem-se a um cérebro diferente. Não
diálogo e tema. O autor não possui o monopólio das ideias; elas são é como se nossa anatomia houvesse mudado na estrutura, mas o qua-
parte da herança social. Se Shakespeare fosse vivo hoje, não poderia dro da percepção em que o assunto é visto mudou radicalmente. O
entrar com uma ação judicial acusando Amor, sublime amor (West mesmo se aplica com igual força à atualização de manuais de direito,
Side story) de plagiar sua peça Romeu e Julieta. E difícil saber onde máxime quando as bases conceituais dos dados jurídicos tenham se
22
termina a expressão e começam as ideias passíveis de proteção. A l e i alterado. Edições críticas nos Campos das artes e humanidades apre-
de direito autoral destina-se a proteger a expressão de uma ideia, não sentam os mesmos problemas de continuidade e identidade crítica.
a ideia em si. O livre fluxo de ideias encontra-se na legislação de pa- O aprendizado ulterior é inevitavelmente moldado de alguma forma
tentes. O caráter da proteção concedida por uma patente e os meios pelo que foi aprendido antes, às vezes o aprendizado anterior interfe-
de obtê-la diferem da simples operação de registro de direito autoral. re com o aprendizado posterior e prejudica a capacidade de o estu-
O prazo de validade da proteção da patente é muito mais curto: em dante executar uma tarefa dada. O livro foi a primeira base de da-
26

21
geral de 17 anos. O direito autoral cobre mais de 50 anos, além de dos; pode ser revisto, receber nova redação, ser ilustrado e resumido.
todo o tempo de vida do autor. No entanto, o alcance da proteção é Seu descendente eletrônico é flexível além de limites que mal pode-
formidável. O proprietário de uma patente possui o direito de excluir mos imaginar. Mas quem é de fato o proprietário do conhecimento
outros de produzirem e venderem a invenção; a legislação de paten- médico em MICINA, ou do conhecimento geológico em PROSPECTOR?
tes não protege as ideias em si. Um motivo para esta importante l i m i - Onde reside a realidade ontológica — no hardware ou no software? A
tação está incorporado na ideia de utilidade - um bom princípio posição radical da inteligência artificial é que há uma identidade
utilitarista. A lei concederá monopólio virtual da criação de um i n - ontológica entre a consciência e os padrões elétricos de pensamento
ventor apenas se o público tiver a receber algum benefício correspon- no cérebro. São uma unidade e a mesma coisa e (cai fora Descartes)
dente da utilidade da invenção. A ideia de um objeto ou processo não há espírito algum dentro da máquina. Mas o discurso dos especi-
potencialmente útil não possui utilidade por si própria. A legislação alistas em sistemas especialistas está repleto de frases do tipo 'garim-
não reconhece utilidade até que este precursor seja reduzido a uma pando as jóias do conhecimento' e 'polindo o conteúdo informacional',
fornia de real utilidade. A vaga nuvem de uma ideia ou uma fantasia além de outras frases de igual diapasão. O mesmo tema é adotado
da imaginação não servem, o conceito deve ter uma identidade, do por um autor bastante acessível, Douglas Hofstadter:
contrário não estará mais garantido na lei das patentes do que na lei
24
É essencial ao esforço da pesquisa sobre inteligência artificiai a noção de que os
de direito autoral. Aqui encontramos o que os filósofos chamam de níveis simbólicos da mente podem ser separados de seu substrato neural e imple-
'problema ontológico', ou onde reside a qüididade de uma coisa num mentados em outros meios."

196 197
À medida que essas formas algorítmicas de conhecimento passam entre a palavra e a coisa toma-se complicada devido a um princípio
a clonar outras formas, podemos então indagar quem possui o quê? maligno de distância crescente, geralmente mediada por outros sinó-
Talvez tenhamos até que perguntar se um sistema de inteligência nimos e outros eufemismos.
artificial possui direitos morais. Poderíamos por meio de um exercí- Vejamos o exemplo surrado, citado em salas de aula, do dinheiro
cio de raciocínio supor que a humanidade possui a capacidade de como um signo representativo. Na cobiça de ouro tradicional o signo
transferir todo nosso sistema de registros impressos para formato ele- denotava os metais raros e preciosos que eram explorados pelo Esta-
tronico. As pesquisas atuais parecem indicar que isso é tecnicamente do e usados como moeda corrente. O ouro era valioso por si próprio e
viável. Consequentemente, não existiriam mais arquivos impressos funcionava como meio de troca. A 'coisa em si' proporcionava uma
ou quirográficos como os conhecemos. O mundo da imagem estática base sólida para o uso inequívoco da palavra. O dinheiro passou en-
t a m b é m estaria ameaçado. Teríamos o universo do conhecimento l i - tão a representar papel-moeda que representava metais preciosos guar-
teralmente na ponta de nossos dedos, na melhor tradição da retórica dados em caixas-fortes. A correspondência entre palavra e coisa trans-
da tecnologia da informação. Como vimos em capítulos anteriores, formou-se numa linguagem de representação. Mais tarde vieram os
cada novo modo de comunicação nos levou a pensar em termos dife- cheques a representar depósitos de papel-moeda, a seguir os cartões
rentes, ou, falando tecnicamente, modificou as estruturas cognitivas. bancários magnéticos, num processo aparente dc realidade minguan-
O conceito do livro está profundamente enraizado na psique oci- te que teria deixado chocados os filósofos empíricos dos velhos tem-
dental e por isso decidimos arquivar o livro e manter um universo pos. Tanto quanto o autor pode verificar, seu dinheiro (ou o que resta
impresso e um universo eletrônico funcionando (por assim dizer) em dele) refere-se a uma configuração de óxidos numa fita no departa-
paralelo. Como o conhecimento é um organismo em crescimento pre- mento de informática de um banco alhures. Já que estivemos nos
cisamos ser seletivos. Prever futuras demandas é um tanto impossí- orgulhando de como a eletrônica tornou a distância física irrelevante,
vel, como qualquer bibliotecário da velha guarda, desses de descartar ela parece afastar do usuário o uso referencial da linguagem, ou eli-
peças do acervo, poderá lhe dizer. Alguns produtos culturais padece- minar qualquer referência que pudesse ter. Afirmamos que a lingua-
rão inevitavelmente com os caprichos da moda dominante. Em que gem é 'auto-referencial' quando ela nada tem a ver com algo externo
ponto se pára uma imagem em movimento para gravá-la para a pos- a si própria, e consequentemente perde sua vantagem como instru-
teridade? Há um problema ainda maior: o da linguagem e da trans- mento de ação. Perdemos as vantagens gémeas dc lucidez e direção;
formação linguística. A imprensa, a televisão e o computador estão e, independentemente da quantidade de dados que tenhamos à nos-
entre os principais meios de comunicação que influenciaram nossa sa disposição, acabamos processando mais e mais dados, o que não
linguagem — se para melhor ou para pior continuará sendo tema de passa de um mero corpo-a-corpo com nossa própria incoerência. E
contínuo debate. A linguagem é vital para a recuperação de informa- assim lamenta o crítico cultural F Jameson:
ções, máxime quando não se pode compulsar uma fonte potencial. Infelizmente nenhuma sociedade jamais foi tão mistificada de lautas maneiras
Para ser eficiente a relação entre a palavra e a coisa deve ser a mais quanto a nossa, saturada como é com mensagens e informações: os próprios
próxima e coerente possível. O signo deve referirse a um referente. veículos de nossa mistificação."
Foi isso que dissemos no capítulo I , mas o poder de significação e "O perigo de se perder de vista o significante numa confusão de
representação da linguagem é frágil e problemático. Lembre-se do dados demonstra uma necessária fusão entre as ciências da informa-
que afirmamos sobre o poder do visionário e do bardo na tradição ção e as ciências culturais. É somente através de um prisma de análi-
oral: na sua função como 'enciclopédia tribal', quando contava histó- se cultural que se pode discernir o qualitativo do quantitativo. Infor-
rias sobre a montanha sagrada tanto o signo quanto o referente esta- mação que tenha algum mérito não pode ser 'isenta de valor'. Será
vam presentes e visíveis. Sua audiência levantava os olhos para ela uma época de desafios para o futuro profissional da informação. Há
enquanto ele falava. Em sucessivas esferas da vida moderna a relação

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dois princípios éticos do código de conduta da British Computer 11 Ver uma útil análise c m : D E | 0 ! E , Roy el at. (ed.) Ethical issues in information
Society que serão sempre pertinentes: systems. Boston: Boyd Fraser, 1991.
12 SOLZHENITSYN, Alexander. Cancer ward. New York: Dial Press, 1968, p. 42.
Competência técnica. A competência técnica baseia-se cm conheci-
[Edição portuguesa: O pavilhão dos cancerosas. Lisboa: Dom Quixote, 1972.]
mento e experiência: cada membro tem o dever, em seu campo de 13 Adam Smith (1723-1790). Sua obra clássica Wealth of nations (1350) [Edi-
opção, de manter e desenvolver sua competência técnica durante toda ção portuguesa: A riqueza das nações. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1987-
sua vida profissional, e de se manter a par dos progressos pertinentes 1989]. Ainda muito influente. O livre mercado das mercadorias leva ao livre merca-
tanto na tecnologia quanto na utilização da informática. do das ideias. Ver também: ARROW, K.J. Information and economic behaviour. Jn
Collected papers of Kj. Arrow, v. 4. Cambridge, Mass.: Harvard University Press,
Interesse público. Deve estar atento ao efeito dos sistemas computa- 1984.
dorizados, na medida em que os conhece, sobre os direitos humanos 14 Termo usado com a mesma equivalência de 'países menos desenvolvidos'

básicos das pessoas, seja numa organização, seus clientes ou fornece- que surgiram do colonialismo com economias dependentes, altos níveis d e analfa-
betismo, baixa renda per capita. Ver: M c P H A l L , T L . Electronic colonialism. London:.
dores, seja entre o público em geral.
Sage Publications, 1987.
15 Ver: ALLAN, Alastair. The myth of government information. London: Library
Esses são princípios sobre os quais se deve ponderar e refletir.
Association, 1990. Comparar: UNITED STATES O F F I C E OF T E C H N O L O G Y ASSESSMENT.
Informing the nation: federal information dissemination in an electronic age. Washing-
Notas e referências
ton: Government Printing Office, 1988.
1 Para uma visão geral desse problema ver: W A R N O C K , Mary. Ethics since 1900. 16 Ver: M C Q U E E N , Hector. Copyright, competition and design. Aberdeen: Aber-
London: Home University Library, 1962. deen University Press, 1991. Ver também: BAINBRIDCE, David. Software copyright
2 U m texto de leitura fluente sobre essas escolas de pensamento é: M C l N T Y R E , law. London: Pitman, 1992. Ver também: FRANK, Stephen J. What AI practitioners
A.C. A short liistory of ethics. London: Macmillan, 1962.
should know about the law. AI magazine, v. 9, n. 2, p. 109-114, 1988.
3 Para u m estudo sobre as teorias de Hobbes ver: RAWLS, John. Theory of justice. 17 O princípio fundamental da Convenção de Berna (1886) era de que os auto-
Harvard: Harvard University Press, 1972. [Ed. brasileira: U n i a teoria da justiça. São
res de um país-membro deveriam em todos os demais países usufruir dos direitos
Paulo: Martins Fontes, 1997.]
que esses outros país»s concedessem a seus respectivos autores. E esses direitos seri-
4 Para uma crítica sucinta e razoável do utilitarismo ver: L A C E Y , A R . Dictionary
am usufruídos sem quaisquer outras formalidades a não ser aquelas definidas pela
of philosophy. L o n d o n : Routledge, 1976.
lei d o país onde se deu a primeira publicação. O Reino Unido é signatário da con-
5 Ver: KEMP, John. The philosophy of Kant. London: Oxford University Press,
venção.
1958, p. 69-85. Ver também: PATON, H.J. The categorical imperative. London, Oxford,
New York: Harper and Row, 1965. 18 BAINBRIDCE, David, op. cit. T i m b é m do mesmo: Intellectual property. Lon-

6 O princípio do casuísmo pode ser visto na evolução do conceito ocidental de don: P i t m a n , 1990.
'guerra justa'. Por sua natureza e propósito, esse tipo de ação envolveria tirar a vida 19 Sobre o modelo PAPA ver: MASON, Richard. F o u r ethical issues of the
a alguém, zombando do imperativo moral 'não matarás'. As regras básicas eram: information age. MIS quarterly, v. 10, n. 1, p. 22-35, 1986.
deverá depender da autoridade do soberano; a causa deve ser justa; deve haver uma 20 S H E L L E Y , Mrry. Frankenstein. New York: Scholastic Books, ou qualquer ou-
chance razoável de êxito; os meios devem ser proporcionais aos fins; os beligerantes tra edição. [Edição brasileira: Porto Alegre: L&PM, 1985.] Uma antevisão penetrante
devem ter uma 'intenção correta'. Desenvolvimentos tecnológicos recentes e o con- dos dilemas morais ca inteligência artificial. Observe-se a lamentação do monstro e
ceito de 'guerra total' são exemplos clássicos sobre como a tecnologia pode provocar a acusação de nascimento equivocado. Ele teria tido pouca dificuldade de passar
um repensar das normas éticas. pelo teste de Turing. Ver um ensaio muito sério: L E C H A T , Michael. Artificial
7 Hipócrates. Célebre médico da Antiguidade grega. Famoso por causa do Ju- intelligence and ethics: an exercise in the moral imagination. A) magazine, v. 7, n. 2,
ramento Hipocrático.
p. 70-79, 1986.
8 Lorde Acton (1834-1902). Essays and studies (1887). Planejou e editou os 21 O censo de 1981 há pouco tornou-se disponível para os historiadores sociais
volumes iniciais da Cambridge modem history.
e os sociólogos. Constitui a maior coleta de dados feita pelo governo do Reino Uni-
9 Ver, por exemplo: CURRAN, J., SMEATON, J. Power without responsibility: press
do e apresenta problemas de acesso e controle. Ver: O F F I C E O F POPULATION
and broadcasting in Britain. 4th ed. L o n d o n : Routledge, 1991.
CENSUSES AND SURVEYS. 1981 census: confidentiality and computing. London: HMSO,
10 BOK, Sisela. Private lying; public morality. New York: Pantheon Books, 1987,
p. 32. 1989.
22 Ver: POSTER, Mark. The mode of information. L o n d o n : Polity Press, 1990.

200 Principalmente o capítulo 3: 'Foucault and databases'.


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