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LÍNGUAlFALA, NORMA

o estudo da linguagem comporta duas partes:


uma, essencial, tem por objeto a língua, que é social em sua essência;
outra, secundária, tem por objeto a parte individual da linguagem,
vale dizer, a fala (CLG, 27).

As dicotomias saussurianas
A doutrina de Saussure baseia-se numa série de pares de distinções,
atribuídas por Georges Mounin (1973: 54) à sua "mania dicotômica".
Citando o próprio Saussure ("A linguagem é redutível a cinco ou seis
dualidades ou pares de coisas."), Mounin nos revela que o mestre de
Genebra estava bem consciente de sua perspectiva dicotômica, o que,
aliás, é confirmado logo nas primeiras páginas do Curso de linguistica
geral. Afirma Saussure (CLG, 15): "[ ...] o fenômeno linguístico apre-
senta perpetuamente duas faces que se correspondem e das quais uma
não vale senão pela outra".
Comecemos pela oposição fundamental: língua/fala.

LÍNGUA/FALA

Esta é sua dicotomia básica e, juntamente com o par sincronia/dia-


cronia, constitui uma das mais fecundas. Fundamentada na oposição
social/individual, revelou-se com o tempo extremamente proficua. O
que é fato da língua (Zangue) está no campo social; o que é fato da fala
ou discurso (paro/e) situa-se na esfera do individual. Repousando sua
dicotomia na Sociologia, ciência nascente e já de grande prestígio en-
tão, Saussure (p. 16) afirma e adverte ao mesmo tempo: "A linguagem
tem um lado individual e um lado social, sendo impossível conceber um
sem o outro". Vale lembrar que, para Saussure, a linguagem é a faculda-
de natural de usar uma língua, "ao passo que a língua constitui algo
adquirido e convencional" (CI,C;, 17).
A língua exterior ao indivíduo, que, por si só, não pode nem criá-la nem modifi-
cá-Ia; ela não existe senão em virtude de uma espécie de contrato esta-
Do exame exaustivo do Curso, depreendemos três concepções para
belecido entre os membros da comunidade" (p. 22).
língua: acervo linguístico, instituição social e realidade sistemática e
funcional. Analisemo-Ias à luz do CLG. Trata-se da mais coercitiva de todas as instituições sociais. A socie-
dade pode abolir qualquer uma de suas instituições, exceto a língua.
Lembremos o exemplo da Revolução Francesa (1789), que conseguiu
A língua como acervo linguístico
derrubar a monarquia (o ancien régime), mas a língua francesa perma-
A língua é uma realidade psíquica formada de significados e ima- neceu, mais forte e mais rica do que antes.
gens acústicas; "constitui-se num sistema de signos, onde, de essencial,
só existe a união do sentido e da imagem acústica, onde as duas partes A língua como realidade sistemática e funcional
do signo são igualmente psíquicas" (p. 23); é "um tesouro depositado
pela prática da fala em todos os indivíduos pertencentes à mesma comu- Este é o conteúdo mais importante do conceito saussuriano a res-
nidade, um sistema gramatical que existe virtualmente em cada cérebro peito da língua. Para o mestre de Genebra, a língua é, antes de tudo, "um
ou, mais exatamente, nos cérebros dum conjunto de indivíduos" (p. 21); sistema de signos distintos correspondentes a ideias distintas" (p. 18); é
a língua é "uma soma de sinais depositados em cada cérebro, mais ou um código, um sistema onde, "de essencial, só existe a união do sentido
menos como um dicionário cujos exemplares, todos idênticos, fossem e da imagem acústica" (p. 23). Saussure vê a língua como um objeto de
repartidos entre os indivíduos" (p. 27). E, com todo o respeito a Saussu- "natureza homogênea" (p. 23) e que, portanto, se enquadra perfeita-
re, acrescentaríamos: um dicionário e uma gramática, cuja extensão mente na sua definição basilar: "a língua é um sistema de signos que ex-
será proporcional ao conhecimento e à percepção linguística do falante. primem ideias" (p. 24).

A língua, como acervo linguístico, é "o conjunto dos hábitos lin- A fala, ao contrário da língua, Saussure a apresenta multifacetada e
guísticos que permitem a uma pessoa compreender e fazer-se compre- heterogênea. Diz o mestre que "a fala é um ato individual de vontade e in-
ender" (p. 92) e "as associações ratificadas pelo consentimento coletivo teligência, no qual convém distinguir: 1°) as combinações pelas quais o
e cujo conjunto constitui a língua são realidades que têm sua sede no cé- falante realiza o código da língua no propósito de exprimir seu pensa-
rebro" (p. 23). mento pessoal; 2°) o mecanismo psicofisico que lhe permite exteriorizar
essas combinações" (p. 22). Saussure classifica a fala como o "lado exe-
A língua, enquanto acervo, guarda consigo toda a experiência histó- cutivo" da linguagem, cuja "execução jamais é feita pela massa; é sempre
rica acumulada por um povo durante a sua existência. Disso nos dá tes- individual e dela o indivíduo é sempre senhor; nós a chamaremos fala"
temunho o latim, símbolo permanente da cultura e das instituições do (p. 21). E complementaríamos: fala em oposição a língua. A fala é a pró-
povo romano. Também o português, nos seus oito séculos de existên- pria língua em ação, enérgeia (atividade) e não érgon (produto).
cia, acumulou um rico e notável acervo linguístico e literário. Impor-
tante língua de cultura, constitui tesouro comum dos povos irmanados Aprofundando a base teórica dessa dicotomia fundamental para a
pela lusofonia. compreensão da obra de Saussure, somos levados a reconhecer a influên-
cia incontestável e decisiva que o debate entre os dois expoentes da So-
ciologia de então, Durkheim e Tarde, exerceu sobre ele. Sua dicotomia
A língua como instituição social
parece ter sido uma tentativa de conciliação entre as duas posições socio-
Saussure considera (da mesma forma que Whitney) que a língua lógicas vigentes. Da ideia defail sacia! (fato social), de Durkheim, pro-
"não está completa em nenhum [indivíduo], e só na massa ela existe de cede a postulação da língua, segundo Lepschy (1971: 30):
modo completo" (p. 21), por isso, ela é, simultaneamente, realidade psí- Porque ambas [tanto a ideia de língua, como a de
quica e instituição social. Para Saussure, a língua "é, ao mesmo tempo, fato social] se referem a fatos psicossociais, externos
um produto social da faculdade da linguagem e um conjunto de conven- ao indivíduo, sobre o qual exercem uma contraint,
ções necessárias, adotadas pelo corpo social para permitir o exercício (coerção), e cx istcntcs na consciência coletiva do
dessa faculdade nos indivíduos" (p, 17); é "a parte social dn IIIIglIllgl'lll, 'I"IIPOsocial.
Por outro lado, o reconhecimento do elemento individual, a fala, es- mento criado e fornecido pela coletividade; não é,
taria em consonância com as ideias de Gabriel Tarde. É oportuno lem- então, ilusório dizer que é a língua que faz a unidade
brar também a concepção durkheimiana, segundo a qual a sociedade da linguagem.
prima sobre o indivíduo, pois, como afirma Giani (s/d: 57), "o controle
social existe em função da manutenção da organização social". O ho- E, sustentando a autonomia dos estudos da língua, afirma à p. 22:
mem não passa de uma parcela do pensamento coletivo, ainda segundo "a língua é uma coisa de tal modo distinta que um homem privado do
Giani (p. 44): "o indivíduo é, em grande parte, aquilo que a sociedade uso da fala conserva a língua, contanto que compreenda os signos vo-
espera que ele seja. Cada grupo social incute em seus membros um con- cais que ouve". É o que acontece, por exemplo, em certos tipos de aci-
junto de maneiras de pensar, sentir e agir". Diante disso, compreen- dente cerebral, em que o indivíduo pode ter a fala afetada, mas conser-
de-se por que razão Saussure atribuiu papel destacado ao estudo da lín- var a língua.
gua e minimizou a fala. Não obstante, Saussure (p. 27) insiste sempre na interdependên-
Para Saussure (CLG, 25), sendo a língua uma instituição social, so- cia dos dois constituintes da linguagem:
cialmente é que devem ser estudados os seus signos, uma vez que "o [...] esses dois objetos estão estreitamente ligados e
signo é social por natureza". Considera ele que a língua, como represen- se implicam mutuamente: a lingua é necessária para
tação coletiva, se impõe ao indivíduo inapelavelmente. Nenhum indiví- que a fala seja inteligível e produza todos os seus
duo tem a faculdade de criar a língua, nem de modificá-Ia consciente- efeitos; mas esta é necessária para que a língua se es-
mente. Ela é como uma armadura dentro da qual nos movimentamos no tabeleça.
dia a dia da interação humana. Como qualquer outra instituição social, a
língua se impõe ao indivíduo coercitivamente. Por isso, ela constitui um E adverte (p. 27): "historicamente o fato da fala vem sempre antes".
elemento de coesão e organização social. É importante, a propósito, registrar a concessão feita por Saussure (p. 27)
ao elemento individual, com toda a certeza inspirada em Gabriel Tar-
A fala de: "é a fala que faz evoluir a língua: são impressões recebidas ao ou-
vir os outros que modificam nossos hábitos linguísticos".
A fala, ao contrário da língua, por se constituir de atos individuais,
É tal a interdependência entre a língua e a fala que Saussure consi-
torna-se múltipla, imprevisível, irredutivel a uma pauta sistemática.
dera a Língua, ao mesmo tempo, instrumento e produto da fala. O pró-
Os atos linguísticos individuais são ilimitados, não formam um siste-
prio mecanismo de funcionamento da linguagem repousa nessa interde-
ma. Os fatos linguísticos sociais, bem diferentemente, formam um sis-
pendência, como ressalta Saussure (p. 27):
tema, pela sua própria natureza homogênea. Ora, a Linguística como
ciência só pode estudar aquilo que é recorrente, constante, sistemáti- Como se imaginaria associar uma ideia a uma ima-
co. Os elementos da Língua podem ser, quando muito, variáveis, mas gem verbal, se não se surpreendesse de início esta
jamais apresentam a inconstância, a irreverência, a heterogeneidade associação num ato de fala? Por outro lado, é ouvin-
características da fala, a qual, por isso mesmo, não se presta a um estu- do os outros que aprendemos a língua materna; ela se
do sistemático. deposita em nosso cérebro somente após inúmeras
experiências.
Diz-nos o mestre suíço à p. 18 do CLG:
Para atribuir à língua o primeiro lugar no estudo da Depreende-se do arrazoado saussuriano que tanto o funcionamento
linguagem, pode-se, enfim, fazer valer o argumento quanto a exploração da faculdade da linguagem estão intimamente liga-
de que a faculdade - natural ou não - [e, para Saussu- dos às implicações mútuas existentes entre os elementos língua (virtua-
re, o ser natural ou não é irrelevante: preocupa-se lidade) e fala (realidade). A respeito da interdependência língua-fala ad-
unicamente com a língua em si mesma I de- articular verte R. Barthes (1972: 19): "Não há língua sem fala e não há fala fora
palavras não se exerce senão com a ajlld.t dl' rustru da língua".
A feliz dicotomia língua/fala é o ponto de partida para Saussure Forma, para Saussure, é usada no sentido filosófico, isto é, como
postular uma Linguística da língua e uma Linguística da fala (embora essência, e não no sentido estético, como aparência. A teia de relações
Mounin (1973: 69) levante dúvida a respeito da autenticidade dessa entre os elementos linguísticos é que constitui a forma. Os elementos da
postulação por parte do mestre. Mounin prefere atribuí-Ia a Bally e Se- rede constituem a substância. Voltando ao exemplo do jogo de xadrez,
chehaye), mas, na verdade, para o mestre genebrino, a Linguística pro- diríamos que as regras do jogo (a teia de relações entre as peças) estão
priamente dita é aquela cujo único objeto é a língua: "Unicamente desta para forma, assim como as peças do jogo estão para substância. Uma
última é que cuidaremos" (CLG, 28), ressalva Saussure. frase como "V comprá dois pão" apresenta alteração apenas na subs-
ô

Desse modo, vemos que Saussure realmente tinha plena consciên- tância. Sua estrutura, apesar do fator extralinguístico "erro" (desvio em
cia da natureza opositiva dos fenômenos linguísticos. Eis suas próprias relação à norma culta), continua a ser a de uma frase da língua portu-
palavras (p. 28): "Essa é a primeira bifurcação que se encontra quando guesa. Ela conserva toda a gramatical idade sintática do sistema linguís-
se procura estabelecer a teoria da linguagem". tico português e toda a coerência interna inerente aos elementos desse
sistema: (sujeito) + verbo auxiliar + verbo principal + objeto (determi-
nante + determinado). Portanto, sua forma, o que é de fato relevante
Sistema/não sistema
para o funcionamento do sistema, não sofreu em nada com a mudan-
A razão de Saussure ter preferido tomar o caminho da língua quando ça acidental das propriedades fisicas de sua substância. Dito de outro
se viu diante de sua famosa bifurcação encontra-se em outra oposição con- modo: forma : língua :: substância : fala.
sequente: sistema/não sistema, isto é, sistema: língua:: não-sistema: fala.
Mesmo tendo dado tanta ênfase ao estudo da língua, Saussure não
Sendo o sistema superior ao indivíduo (supraindividual), todo ele- deixou de tratar também da substância (fala), reconhecendo que a sua
mento linguístico deve ser estudado a partir de suas relações com os ou- função é fazer a ligação com a forma, que é, em última análise, para ele,
tros elementos do sistema e segundo sua função ("a língua é um sistema a verdade total. Reportando-nos ao pensamento linguístico da Grécia
do qual todas as partes podem e devem ser consideradas em sua solida- Antiga, diríamos que Saussure admitiu tacitamente que a língua não é
riedade sincrônica". CLG, 102), e não por suas características extralin- só analogia, ela tem também as suas sólidas e saudáveis anomalias.
guísticas: fisicas, psicológicas, etc. O conhecido exemplo do jogo de xa-
drez esclarece cabalmente o pensamento saussuriano nesse particular. Cabe-nos, entretanto, chamar a atenção para o fato de que, a nosso
ver, o conceito de forma (estrutura) não exclui o componente semânti-
As peças de um jogo de xadrez são definidas unicamente segundo
co. Ao contrário, o componente semântico é que dá sentido à noção de
suas funções e de acordo com as regras do jogo. A forma, a dimensão e
forma, sem o quê, forma corre o risco de tomar-se letra morta, concep-
a matéria de cada peça constituem propriedades puramente fisicas e aci-
ção sem serventia para a ciência linguística, principalmente para a Lin-
dentais, que podem variar extremamente sem comprometer a identida-
guística dita estrutural. Como adverte o Prof. Sílvio Elia (1978: 120),
de da peça. Essas características fisicas são irrelevantes para o funcio-
namento do sistema (= o jogo de xadrez). Uma peça até pode ser substi- "linguagem é significação".
tuída por outra, desde que a substituta venha a ser utilizada conforme as Desse modo, concebemos forma como coerência sintática + coe-
regras do jogo. Levando para o sistema linguístico o exemplo de Saus- rência semântica. Coerência sintática (espécie de sintaxe mental ou es-
sure, temos que todo elemento linguístico - uma vogal, uma consoante, truturação do pensamento) existe, por exemplo, tanto em "O menino
um acento, um fonema, um morfema, etc. - deve ser definido linguisti- chutou a bola" como em "A bola chutou o menino". Em ambas as ora-
camente apenas de acordo com suas relações (sintagmáticas e paradig- ções, é inegável a realização sintaticamente coerente de um dos padrões
máticas) com os outros elementos ou por sua função no sistema, e não frasais básicos da língua portuguesa, isto é, sujeito + verbo + objeto di-
levando-se em conta suas acidentais propriedades: modo de formação,
reto. Só a primeira frase, entretanto, encontra correspondência concei-
estrutura acústica, variantes morfofonêmicas, etc. Aqui toma-se perti-
tual (feedback) ou repercussão linguística no espírito do falante,justa-
nente introduzir outra postulação saussuriana, segundo a qual
mente por ser a única que contém lima verdade semântica confiável,
lima coerência significativa, que constitui, juntamente com a coerência
A lingua é uma forma e não uma substância (eLG, 14/).
sintática da frase, um todo individualizador e pertinente do ponto de Francisco da Silva Borba (1998: 49) define a norma como
vista da intercomunicação linguística.
um conjunto de real izações constantes e repetidas,
É oportuno reiterar a importância dessa concepção da língua como de caráter sociocultural e dependente de vários fato-
sistema funcional, cujos elementos e relações devem ser estudados res operantes na comunidade idiomática.
sincronicamente. Essa visão é a base da Linguística estruturalista
pós-saussuriana, embora o próprio Saussure jamais tenha usado o ter- Em outras palavras, há realizações consagradas pelo uso e que,
mo estrutura, e sim sistema (consta que o termo sistema aparece 138 portanto, são normais em determinadas circunstâncias linguísticas,
vezes no eLG). circunstâncias estas previstas pelo sistema funcional. É à norma que
nos prendemos de forma imediata, conforme o grupo social de que fa-
zemos parte e a região onde vivemos. A norma seria assim um primei-
A norma: uma crítica à língua/fala
ro grau de abstração da fala. Considerando-se a língua (o sistema) um
Não se pense que a dicotomia saussuriana tenha ficado ao abrigo de conjunto de possibilidades abstratas, a norma seria então um conjunto
críticas nesse seu mais de meio século de existência. A principal delas de realizações concretas e de caráter coletivo da língua. Segundo Co-
partiu do linguista romeno Eugenio Coseriu (1973: 70), que propôs seriu (1973: 90), a norma é o "como se diz", e não o "como se deve di-
uma divisão tripartida segundo o modelo abaixo, por achar insuficiente zer", por isso, "los conceptos que, con respecto a ella, se oponen son
a bipartição saussuriana: normal y anormal, y no correcto e incorrecto". Em resumo, em termos
coserianos, a fala é o real individual, a norma é o real coletivo, e a lín-
gua é o virtual coletivo, nem sempre usual, embora possível e disponí-
fala nonna língua vel. Vejamos alguns exemplos da oposição norma/sistema no portu-
guês do Brasil.
(uso individual (uso coletivo (sistema
O conhecido [s], chiante pós-vocálica, variante de [s], é norma no
da norma) da língua) funcional)
Rio de Janeiro em todas as classes sociais: gás [gas], mês [rnes], basta
[basta]. Já no Sul, a pronúncia sancionada pelo uso (ou norma) é mar-
cadamente alveolar: [basta], [mês], [gás]. No campo da Morfologia, o
sistema dispõe dos sufixos -ada e -edo, ambos com o sentido de cole-
A divisão de Coseriu (1973: 97) vai do mais concreto (fala) ao mais ção. Enquanto, para designar grande quantidade de bichos, a norma
abstrato (língua), passando por um grau intermediário: a norma. Segun- culta prefere o primeiro (bicharada), a norma geral no falar gaúcho
do ele, o sistema funcional (língua) consagrou o segundo: bicharedo, O mesmo acontece com os sufixos
es un conjunto de oposiciones funcionales; Ia norma diminutivos -inho e -ito, ambos disponíveis no sistema funcional: a
es Ia realización "colectiva" del sistema, que contie- norma fora do Rio Grande do Sul é dizer-se salaminho; já em terras
ne el sistema mismo y, además, los elementos fun- gaúchas o uso sancionou salamito, No plano sintático, a língua (siste-
cionalmente "no-pertinentes", pero normales en el ma) portuguesa dispõe dos advérbios já e mais que, quando usados
hablar de una comunidad. numa frase negativa, indicam a cessação de um fato ou de uma ação. A
norma brasileira preferiu o segundo: "Eu não vou mais"; "Não chove
A fala, por sua vez, na concepção coseriana (1973: 98),
mais". A portuguesa optou pelo primeiro: "Eujá não vou"; "Já não
es Ia realización individual-concreta de Ia norma, chove". O português do Brasil prefere descrever um fato em progres-
que contiene Ia norma misma y además, Ia originali- são dizendo: "Estou estudando" (aux. + gerúndio); já em Portugal, a
dad expresiva de los individuos hablantes. norma é usar-se aux. + infinitivo: "Estou a estudar". Ainda com re-
lação à norma brasileira, não podemos deixar de mencionar o uso já

64 65
consagradíssimo do verbo ter no lugar de haver, com o sentido de AI ,8

"existir", uso inclusive já referendado por vários autores brasileiros fala


de peso, como Carlos Drummond de Andrade ("No meio do caminho a I 'b
tinha uma pedra") e Manuel Bandeira ("Em Pasárgada tem tudo"), norma
a' I I b'
dentre outros.
Como diz Santos (1979: 19), norma é "o conjunto das realizações
linguísticas constantes do sistema. Ê ela que revela como o sistema
funciona numa coletividade". Por exemplo, a língua portuguesa dis- língua
põe de dois prefixos com valor negativo: in- e des-. Ambos fazem par-
te (além de outros) do nosso sistema linguístico e se encontram à dis-
posição dos falantes de língua portuguesa, isto é, existem em poten-
cial. O uso de um ou de outro vai depender da comunidade linguística, c" 'd'
esta é quem estabelece o que é normal (o que se diz) ou anormal (o que
c! ld
se poderia dizer). Assim sendo, a tradição da norma coletiva consa-
grou infeliz, e não *desfeliz (asterisco à esquerda = forma inaceitável
! I
ou agramatical). Inversamente, preferiu descontente e rejeitou "in- C D
contente. Ao falante, como parcela do pensamento coletivo, só cabe
aceitar inapelavelmente o que o seu grupo linguístico consagrou (v., a
ABCD = fala (realização individual do subcódigo)
propósito, a arbitrariedade do signo linguístico), pois na língua não
existe propriedade privada, tudo é socializado. abcd = norma (subcódigo)
Nesse sentido, cabe ressaltar que certos deslocamentos da norma, a'b'c'd' = língua (código)
constantes e repetidos, podem, com o tempo, fazer evoluir (mudar) a
língua. Ê o que vem ocorrendo, por exemplo, com a pronúncia do ad- Tipos de norma
jetivo "ruim". A norma gramatical em vigor recomenda pronunciá-Io
como hiato: ruímo Entretanto, a norma geral no português do Brasil é a As variantes coletivas (ou subcódigos) dentro de um mesmo domí-
nio linguístico dividem-se em dois tipos principais:
sua realização como ditongo: rúim, malgrado os esforços da escola. É
possível que no futuro seja esta a única pronúncia em vigor, tanto no diatópicas - variantes regionais ou normas regionais
sistema (língua) quanto na norma (uso). diastráticas - variantes culturais ou registros
Do exposto, concluímos que a norma é a realização da língua, e a
fala, por sua vez, a realização da norma, como o demonstra figurada- As variantes diatópicas caracterizam as diversas normas regionais
mente o modelo coseriano (1973: 95) a seguir: existentes dentro de um mesmo país e até dentro de um mesmo estado,
como o falar gaúcho, o falar mineiro, etc. Por exemplo, "cair um tom-
bo", no RS; "levar um tombo", no RJ.
As variantes diastráticas, intimamente ligadas à estratificação so-
cial, evidenciam a variedade de diferenças culturais dentro de uma co-
munidade e podem subdividir-se em norma culta padrão (ou nacional),
norma coloquial (tensa ou distensa) e norma popular (também chamada
de vulgar).
A norma culta é a modalidade escrita empregada na escola, nos tex- ção saussuriana de língua como instituição social se aproxima, de certo
tos oficiais, científicos e literários. Baseada na tradição gramatical, é a modo, da teoria da norma de Cose riu.
variante de maior prestígio socioculturaL. Ex.: Há muito tempo não o
vejo. Vendem-se carros. Havia dez alunos em sala. Invertendo o ponto de vista de Saussure, que prioriza uma Linguís-
tica da língua (produto, érgon), Coseriu (1973: 285), por sua vez, privi-
A norma coloquial é aquela empregada oralmente pelas classes mé- legia uma Linguística da fala ou discurso (produção, atividade, enér-
dias escolarizadas. Viva e espontânea, seu grau de desvio em relação à geia). Ao priorizar a atividade linguística Chablar), o linguista rome-
norma culta pode variar conforme as circunstâncias de uso. Ex.: Tem no lança os fundamentos da Linguística Textual, o que o aproxima das
muito tempo que não lhe vejo/não vejo ele. Vende-se carros. Tinha dez concepções humboldtiana e vossleriana da linguagem, com suas ine-
alunos em sala. rentes implicações de ordem estilística. Ouçamos os argumentos de Co-
A norma popular caracteriza a fala das classes populares semiesco- seriu (p. 287):
larizadas ou não escolarizadas. Nessa modalidade, o desvio em relação En primer término, parece necesario un cambio radi-
à norma gramatical é maior, caracterizando o chamado "erro". Ex.: A cal de punto de vista: no hay que explicar el hablar
gente fomos na praia. Dois cachorro-quente custa três real. desde el punto de vista de Ia lengua, sino viceversa.
Há também as variantes diafásicas, que dizem respeito aos diversos ElIo porque ellenguaje es concretamente hablar, ac-
tipos de modalidade expressiva (familiar, estilística, de faixa etária, etc.). tividad, y porque el hablar es más amplio que Ia Ien-
gua: mientras que Ia lengua se halla toda contenida
No plano estilístico, esse tipo de variante implica os conceitos de en el hablar, el hablar no se halla todo contenido en
desvio e escolha. Por exemplo, Machado de Assis preferiu o desvio Ia lengua.
em relação à norma culta, para poder reproduzir com fidelidade a
fala do escravo Prudêncio em Memórias póstumas de Brás Cubas Por conceber o exercício da linguagem como a integração de três
(LXVIII): "É um vadio e um bêbado muito grande. Ainda hoje deixei aspectos - o universal, o histórico e o individual -, ressalta Coseriu (p.
ele (e não deixei-o) na quitanda, enquanto eu ia lá embaixo na (e não à) 285) que "ellenguaje se da concretamente como actividad, o sea, como
cidade". Outro exemplo de desvio e escolha estilística pode ser visto hablar". Em coerência com seu ponto de vista, o linguista romeno pro-
neste passo, em que Vieira, com o intuito de valorizar cada núcleo do põe um lugar de destaque para a Linguística do discurso ou do texto, ar-
sujeito composto, preferiu deixar o verbo no singular: "Mas nem a li- gumentando o seguinte (p. 289):
sonja, nem a razão, nem o exemplo, nem a esperança, bastava a lhe
Existe, asimismo, una lingüística deI texto, o sea, deI
moderar as ânsias".
hablar en el nivel particular (que es también estudio
Além das variantes citadas, existem ainda as chamadas línguas es- deI "discurso" y dei respectivo "saber"). La Ilamada
peciais. É o caso das gírias, dos jargões profissionais, das línguas téc- "estilística del habla" es, justamente, una lingüística
nicas, das línguas religiosas e da língua literária. Esta, pela sua especi- del texto.
ficidade de discurso eminentemente estético, admite e revaloriza to-
das as demais variantes do sistema, realizando-se assim como uma es- De qualquer forma, é reconhecidamente incontestável o valor da fa-
pécie de supranorma. mosa distinção saussuriana entre língua e fala para a Linguística con-
temporânea. Sua primeira dicotomia, investida de verdadeiro valor epis-
Constatamos assim a pertinência da divisão tripartida de Coseriu. temo lógico, é e será sempre um fundamento da ciência linguística.
Todos os exemplos acima, quer caracterizando o falar de uma região,
oncluindo o exame da dicotomia língua/fala, apresentamos abai-
quer identificando o próprio português do Brasil, mostram a proprieda-
xo um quadro comparativo, o mais exaustivo possível, de suas caracte-
de e a conveniência do fator intermediário norma entre a fala (indivi- rísticas principais:
dual) e a língua (social), fator este que tem por princípio realizar e dina-
mizar o sistema funcional (língua). Ressalve-se, contudo, que a conccp
LÍNGUA / FALA NORMAS

social individual
homogênea heterogênea
sistemática assistemática diatópicas ~ falares regionais
abstrata concreta
constante variável
duradoura momentânea culta padrão
conservadora inovadora

I
Normas ou tensa
virtual real
variantes diastráticas coloquial
permanente ocasional
supraindividual individual distensa
essencial acidental popular
psíquica psicofisica
diafásicas ~ modalidades expressivas
instituição práxis (ação)
essência existência
potencial idade realidade
fato social ato individual
unidade diversidade
forma substância LINGUÍSTICAS
produto produção
indivíduo subordinado indivíduo "senhor"
instrumento e produto da fala língua em ação a) da língua ~ funcional
sistema não sistema b) da fala ~ textual
adotada pela comunidade surge no indivíduo
potencialidade ativa de produzir a fala faz funcionar a língua
necessária para a inteligibilidade necessária para que a lín-
e execução da fala gua se estabeleçae evolua
1+1'+1" ... =1 1+1'+1"+ .
competência desempenho

FORMA / SUBSTÂNCIA

essência aparência
psíquica psicofisica
estrutura conjuntura
constante circunstancial
língua fala

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