Tradução de Dante
Moreira Leite. São Paulo: Editora Perspectiva, 2007.
O asilo
O livro Asylums: essays on the social situation of mental patients and other inmates,
originalmente publicado em 1961, foi traduzido para o português como Manicômios, prisões e
conventos, em 1974.Entre 1954 e 1957, enquanto era professor do Departamento de Sociologia da
Universidade da Califórnia em Berkeley (EUA), Goffman foi membro visitante do Laboratório de
Estudos Socioambientais do Instituto Nacional de Saúde, em Bethesda, Maryland.
Foram três anos como observador participante nos setores de pesquisas farmacológicas e
de esquizofrenia do National Institutes of Health Clinical Center (Kunze, 2009, p. 278). No
período de 1955 a 1956, efetuou um trabalho de campo nas enfermarias do hospital psiquiátrico
Saint Elizabeth, em Washington, D.C, instituição federal com cerca de 7.000 pacientes, com o
intuito de entender o mundo social dos internos de um hospital psiquiátrico, “na medida em que
esse mundo é subjetivamente vivido por ele” (Goffman, 2007, p. 8).
O resultado desse estudo foi desdobrado em quatro artigos, sendo que os dois primeiros
foram publicados separadamente, e compilados, em 1961, sob o título Asylums(Silva, 2013, p. 8).
O livro está dividido em quatro partes, respectivamente:
As características das instituições totais: introdução; o mundo do internado; o mundo da
equipe dirigente; cerimônias institucionais; restrições e conclusões.
A carreira moral do doente mental: a fase do pré-paciente; a fase de internado.
A vida íntima de uma instituição pública[parte I]: introdução; agir e ser; ajustamentos
primários e secundários [parte II]: a vida íntima do hospital: fontes; locais; recursos; estrutura
social; conclusões.
O modelo médico e a hospitalização de doentes mentais: notas sobre as vicissitudes das
tarefas de reparação; conclusão.
No prefácio do livro, o autor argumenta que qualquer grupo de pessoas – prisioneiros,
primitivos, pilotos ou pacientes – desenvolve uma vida própria que se torna significativa, razoável
e normal, desde que você se aproxime dela e submeta-se à companhia de seus participantes.
Sobre as limitações do método desenvolvido na pesquisa, Goffman deixa claro que não
ficou nominalmente internado junto aos pacientes e que a interpretação dada sobre eles é parcial,
embora justificável, pois quase toda a literatura especializada sobre os doentes mentais é escrita a
partir do ponto de vista daqueles que estão, socialmente, do outro lado, isto é, pelos psiquiatras (p.
8).
Na nota introdutória, Goffman define uma “instituição total” como um local de residência
e trabalho onde um número grande de indivíduos, em situação semelhante, encontra-se separado
da sociedade mais ampla por considerável tempo, com uma vida fechada e formalmente
administrada. Tomando as instituições totais de modo geral e, especificamente, os hospitais para
doentes mentais, o trabalho refere-se fundamentalmente ao mundo do internado, muito pouco ao
mundo da equipe dirigente.
O interesse central do autor, portanto, é chegar a uma versão sociológica da estrutura
do self,a partir da situação do internado (p. 11). Para isso, Goffman estabelecerá uma interlocução
com sociólogos e outros pesquisadores que dissertaram sobre prisões, campos de concentração,
escolas militares e conventos, dentre eles, autores como Émile Durkheim, Eugen Kogon, Elie
Cohen, Bruno Bettelheim, Kirson Weinberg (Silva, 2013, p. 8).
Para fins heurísticos, os quatro artigos serão apresentados individualmente, seguindo a estrutura
argumentativa do autor.
O conceito de “carreira”, em um sentido mais amplo, é definido pelo autor como “qualquer
trajetória percorrida por uma pessoa durante sua vida” (p. 111). O termo admite a perspectiva da
“história natural”: os resultados singulares são esquecidos, considerando-se somente as mudanças
temporais que são básicas e comuns aos participantes de uma determinada categoria social.
O conceito de carreira, além de não ser valorativo, refere-se aos aspectos subjetivos e
objetivos, pois está ligado tanto aos assuntos íntimos, como a imagem do self, quanto à posição
oficial, relações jurídicas e estilo de vida, e é parte de um complexo institucional acessível ao
público. Sendo assim, o termo permite que andemos do público para o privado, e vice-versa, entre
o selfe sua sociedade significativa.
Este artigo, segundo Goffman, é um exercício no estudo institucional do self, cujo principal
interesse relaciona-se aos aspectos “morais” da carreira do “doente mental” (p. 112). E, em vista
disso, [quais seriam] as mudanças que essa carreira [moral] provoca no selfda pessoa e em seu
esquema de imagens para julgar a si mesma e aos outros (p. 112). O autor tomará a categoria
“doente mental” somente a partir do processo se hospitalização, não no sentido psicopatológico do
termo. O “comportamento doentio” e a “loucura” atribuída ao doente mental é, em grande parte,
resultado da distância social entre os “doentes” e aqueles que lhes atribui isso, e assim, a situação
em que o paciente foi colocado, fundamentalmente, não é um produto da doença mental (p. 113).
Quaisquer que sejam os refinamentos dos diagnósticos psiquiátricos, o hospital
psiquiátrico não é significativamente diferente de qualquer outra comunidade (p. 113). Em
seguida, Goffman analisará as etapas da carreira moral do doente mental: o período anterior à
admissão, a fase de pré-paciente, e o período de internamento no hospital psiquiátrico, a fase de
internado (p. 114).
A carreira moral do doente mental inicia-se com a denúncia de “transgressão” que
acarretará na hospitalização. Na fase de pré-paciente, o individuo ingressa na instituição,
voluntariamente ou involuntariamente, e a partir disso, ele é expropriado de suas relações e
direitos com o mundo externo, tornando-se um paciente, não mais um civil. Portanto, os primeiros
aspectos morais dessa carreira são os sentimentos de abandono, deslealdade e amargura.
Comumente, o pré-paciente sente-se “perturbado” por “estar perdendo a cabeça” e isso o
leva a uma interpretação desintegradora de si mesmo, ainda que essa autoimagem se baseie em
estereótipos culturais e sociais mais amplos. Em seguida, já na instituição, um circuito de agentes
– tutor, denunciante e mediadores – engendra uma “coalização alienadora” sobre o self do pré-
paciente, que, por sua vez, se sente apenas como uma terceira pessoa do processo, traído e
enganado em relação à pessoa mais próxima e ao denunciante (p. 119).
Como a “transgressão” se tornou um fato social público, a traição testemunhada é seguida
de uma “cerimônia de degradação”, uma extensa ação reparadora diante da testemunha, a fim de
que possa restaurar sua honra e seu valor social (p. 120). Também, antes da hospitalização, os
médicos da equipe dirigente constroem a “história de caso” que é atribuída ao passado do
paciente. O último passo na carreira do pré-paciente pode incluir a compreensão, justificada ou
não, de que foi abandonado pela sociedade e perdeu as relações sociais com o mundo externo.
Inicialmente, na fase de internado, o paciente adota a estratégia do “silêncio”, “ausência” e
“anonimato”, o que sugere certo apego ao “resto do seu passado”.
O recém-internado percebe que está despojado de suas defesas, satisfações e afirmações
usais, e está sujeito a um conjunto relativamente completo de “experiências de mortificação”,
como restrição de movimento livre, vida comunitária, autoridade difusa. Depois, com a
“aceitação”, apresenta-se para a interação convencional na comunidade hospitalar e, sobretudo,
aprende a orientar-se no “sistema de enfermarias”.
O sistema de enfermaria funciona como um “sistema de socialização” da instituição: se
obedecer às normas, o internado é “recompensado” com pequenas satisfações secundárias, caso
contrário, perde o acesso a esses “privilégios”. Com o tempo, o internado desenvolve um esquema
de reorganização da autoimagem do selfa partir de “histórias tristes”, com o reforço de ficção,
sobre o seu passado. Com isso, Goffman chama a atenção para o fenômeno de “negação da
racionalidade do paciente” que ocorre quando a equipe dirigente desmente as histórias tristes dos
pacientes com as informações contidas no seu dossiê.
No hospital psiquiátrico, a equipe dirigente tem o “mandato burocrático oficial” para
modelar a concepção que o indivíduo tem de si mesmo (p. 128). Consequentemente, o internado
aceita ou finge que aceita a interpretação do hospital. Quando o paciente aprende a sobreviver às
condições iminentes de exposição, mesmo agindo de uma forma que a sociedade considera como
destrutiva, os vínculos associativos com essa mesma sociedade se enfraquecem e transforma-se
em “fadiga moral” (p. 140).
O “doente mental”, ao ser internado, entra em um ciclo de socialização marcado pela
alienação e mortificação. O cotidiano, como modo de empregar o tempo, é sistemicamente
configurado pela equipe dirigente de modo burocrático e “racional”, embora a “razão” lhe seja
negada. Os “sistemas de enfermarias” são espaços de sociabilidade, de mobilidade institucional, e,
sobretudo, de reorganização mínima da autoimagem.
A carreira moral inclui uma sequência padronizada de mudanças no self, que se estende
dentro dos limites de um sistema institucional. Desse modo, o selfnão é uma propriedade da
pessoa a que é atribuído, mas reside no padrão de controle social que é exercido pela pessoa e por
aqueles que a cercam (p. 142). Se essa disposição social constitui o self, constitui também como o
indivíduo vive e vê o/s “mundo/s”.
Parte I: Introdução
Os vínculos que ligam o indivíduo aos diferentes tipos de instituições sociais têm certas
propriedades gerais e comuns, como compromisso e adesão às regras. Na sociedade ocidental, o
acordo formal ou o contrato é um símbolo clássico dessa forma de associação. Com uma
assinatura, “celebra-se os vínculos que liga e os limites reconhecidos daquilo que liga” (p. 148).
Por trás de cada contrato existem suposições não contratuais a respeito do caráter dos participantes
(p. 148). Cientes do que “devem” e “não devem”, os participantes concordam quanto à validade
geral dos direitos e obrigações contratuais e quanto à legitimidade dos tipos de sansão para o
rompimento do contrato.
Quem aceita um contrato supõe que seja uma pessoa de determinado caráter e forma de
ser. Se todo vínculo supõe uma concepção ampla da pessoa ligada a ele, “devemos ir adiante e
perguntar como o indivíduo enfrenta essa definição de si mesmo” (p. 149). Para isso, Goffman
perscrutará os padrões de comportamento (modos de “agir” e “ser”) segundo um tipo particular de
instituição social, as “organizações formais instrumentais”, localizadas nos limites de um único
edifício ou complexo de edifícios (p. 149).
Como ponto de partida, uma “organização formal instrumental” pode ser definida como
um sistema de atividades intencionalmente coordenadas e destinadas a provocar alguns objetivos
explícitos e globais. Essas organizações, principalmente as “muradas”, têm uma característica
singular: parte das obrigações do indivíduo é participar visivelmenteda atividade da organização, o
que exige uma mobilização da atenção, com esforço muscular e certa submissão do selfà atividade
como símbolo de compromisso e adesão do indivíduo (p. 150).
Uma organização formal instrumental só sobrevive por ser capaz de apresentar
contribuições úteis da atividade de seus participantes. Entretanto, esse tipo de estabelecimento
social não se limita apenas a usar a atividade de seus participantes – a organização formal
instrumental também determina quais são os padrões oficialmente adequados de bem-estar,
valores comuns, prêmios e castigos. Portanto, nas disposições sociais de tais organizações, existe
não só uma concepção completa de participante, mas uma concepção dele como ser humano (p.
153). A organização estipulará “o que fazer” e “por que fazer” e, consequentemente, tudo “o que
se pode ser”. Participar de determinada atividade com o espírito esperado (“fitting in”) é aceitar
que se é um determinado tipo de pessoa que vive em um tipo determinado de mundo, enfim, toda
organização inclui também uma “disciplina do ser”, uma obrigação de ser de um determinado
mundo.
Quando um indivíduo contribui, cooperativamente, com as atividades exigidas por cada
instituição social, e sob as condições exigidas pela sociedade, se transforma em um colaborador,
tornando-se um participante “normal”, “programado” e “interiorizado”. Oficialmente deve ser não
mais e não menos do que aquilo para o qual foi preparado, e é obrigado a viver em um mundo,
cuja realidade lhe é afim. Essa adequação regular à instituição refere-se aos ajustamentos
primários.
Em seguida, Goffman estabelece outro termo – os ajustamentos secundários– que define
qualquer disposição pelo qual o participante de uma organização emprega meios ilícitos ou com
fins não autorizados, ou os dois, como modo de “escapar” daquilo que a organização supõe que
deve fazer e daquilo que deve ser, e assim, o indivíduo se isola do papel e do selfque a instituição
admite para ele (p. 160). Se tomarmos o espaço físico onde são praticados os ajustamentos
secundários e a região de origem dos “praticantes”, o centro da atenção se estende do indivíduo
para os indivíduos.
Considerando-se uma organização formal instrumental como um estabelecimento social, o
ajustamento secundário do indivíduo se integraria ao conjunto total de tais ajustamentos que todos
os participantes da organização mantêm coletivamente. Tais práticas, em conjunto, abrangem o
que pode ser chamado de vida íntima da instituição, o que corresponderia ao “submundo” da
instituição (p. 167). Os ajustamentos secundários, fundamentalmente contidos, assim como os
ajustamentos primários, categorizam-se pelo encaixe (“fitting in”) nas estruturas institucionais
existentes, sem pressões radicais. Seguindo o ponto de vista estrutural, contrário à sociopsicologia,
Goffman questiona “qual o caráter das relações sociais exigidas para manutenção da prática dos
ajustamentos secundários” (p. 168).
De acordo com a localização do praticante na hierarquia da organização, os ajustamentos
secundários – práticas presentes na vida íntima da organização formal instrumental – se
diferenciam. Os participantes com posição inferior têm menos compromisso e ligação emocional
com a organização e, por conseguinte, menos adesão às práticas de ajustamentos secundários. Já
os participantes com posição mais elevada no sistema de enfermarias usam de maneira mais ampla
tais ajustamentos. Em tese, as camadas médias da organização são as que menos adotam os
ajustamentos secundários, porque elas exemplificariam os valores “edificantes” e “inspiradores”
da organização.
No mais, o componente hierárquico do sistema de enfermarias funciona também como um
sistema de diferenciação das características morais dos próprios pacientes (p. 169). Todas as
condições que tendem a desenvolver uma vida íntima ativa dentro de qualquer instituição também
estão presentes no hospital para doentes mentais. Instituições como os hospitais psiquiátricos são
“totais”, pois o internado vive todos os aspectos de sua vida no edifício do hospital, na companhia
de outros indivíduos igualmente separados do mundo mais amplo.
Tais estabelecimentos contêm duas categorias de participantes – os internados e a equipe
dirigente. Fundamentalmente, os hospitais públicos para doentes mentais não funcionam de acordo
com a doutrina psiquiátrica, mas segundo o “sistema de enfermarias”. Esse esquema de disciplina
delimita um conjunto relativamente completo de meios e fins que orientam os pacientes. Dentro
do sistema de enfermarias, muitas atividades dos pacientes tornam-se efetivamente ilícitas.
Goffman, a partir daqui, se deterá nas fontes, locais, recursose estrutura social que os
pacientes empregam em seus ajustamentos secundários (pp. 173-245). Na vida íntima do hospital
psiquiátrico, as fontes predominantes são: as “substituições” (utilização de artefatos disponíveis
para um fim não oficial); e a “exploração do sistema” (exploração da rotina completa das
atividades oficiais da instituição para fins particulares).
Tais práticas transcorrem em locais como: os “espaços fora de alcance” (proibidos); os
“locais livres” (com vigilância e restrições reduzidas); os “territórios de grupos” (locais sob o
comando de um grupo específico); e o “território pessoal” (espaço íntimo criado no interior de um
local livre da instituição). Os ajustamentos secundários integram recursos como: os “esconderijos”
portáteis ou fixos (usados para esconder bens adquiridos legitimamente nos ajustamentos
primários); o “sistema de transportes” (transporte dos bens para o esconderijo); e o “sistema de
comunicação” (circulação de mensagens e expressões faciais a partir das interações face a face e
via sistema oficial de informação).
O sistema de ajustamentos secundários configura-se por meio de uma “estrutura social” da
instituição. Regularmente, a condição social pela qual um indivíduo incorpora o esforço do
“outro” para aumentar a amplitude de seus ajustamentos secundários baseia-se: na força não
racionalizada de “coerção particular” (o coagido obedece involuntariamente); por meio de
“intercâmbio social” (o outro contribui em troca de bens materiais e afetivos); ou pelo “gesto
cerimonial” (através de relações particulares extraoficiais e de relações de proteção oficiais).
Em todo estabelecimento social existem expectativas quanto à adequação do participante.
Segundo o autor, entretanto, verifica-se que os participantes se recusam, de alguma forma, a
aceitar a interpretação oficial quanto ao tipo de selfe de mundo que eles têm de si mesmo.
“Sempre que se impõem mundos, se criam submundos” (p. 246). O estudo da vida íntima em
instituições totais restritivas tem uma característica específica. Quando a existência é reduzida a
um mínimo, compreende-se o que os indivíduos fazem com os aspectos mais importantes de sua
vida.
Esconderijos, meios de transporte, locais livres, territórios, bens para intercâmbio social e
econômico – essas são algumas das exigências mínimas para a construção de uma vida.
Comumente, tais coisas são aceitas sem discussão como parte do ajustamento primário de
qualquer indivíduo, mas, se essas mesmas coisas são retiradas da vida oficial, consequentemente,
surgirá tentativas para ressignificá-las. O estudo das instituições totais também sugere que as
organizações formais instrumentais dispõem de locais padronizados de vulnerabilidade, por
exemplo, depósitos, cozinhas, enfermarias, ou seja, os cenários onde surgem os ajustamentos
secundários.
O hospital psiquiátrico constitui um caso específico de estabelecimentos em que a vida
íntima prolifera-se. Os doentes mentais são indivíduos que, no mundo externo, transgrediram a
ordem cerimonial e por isso foram submetidas à ação psiquiátrica. Muitas vezes, o pré-paciente
“transgrediu” as propriedades situacionais de um ambiente, e essa má-conduta se traduz em uma
rejeição moral da sociedade mais ampla. Tanto a estigmatização do doente mental quanto a
hospitalização involuntária são os meios pelos quais a sociedade moderna responde a essas
ofensas contra a adequação “regular” do comportamento. Do ponto de vista do paciente, ao
recusar-se a seguir as regras da instituição, o internado, consequentemente, discorda da
interpretação que a instituição dá de quem ele é.
Mas, de acordo com a equipe dirigente, isso é expressão de alienação, um tipo de
sintomatologia que a instituição deve tratar como “psicose”. Em resumo, a hospitalização cerceia
todas as manobras do paciente de expressar sua recusa à adequação institucional (p. 247). Entre os
diferentes tipos de ajustamento secundário, destacam-se as “atividades de evasão”, pois permite ao
indivíduo esquecer-se de si mesmo, desligar-se da “realidade” hospitalar, e assim “fugir” para
outro mundo (p. 250). Grosso modo, a vida íntima de um hospital público apresenta-se como um
“submundo” do mundo oficial da instituição – “mundos” com múltiplas realidades paralelas. Esse
submundo tem sua própria estrutura social, seus artefatos, cenários e regras.
É do sistema de enfermarias que vem o substrato fulcral não apenas do “mundo”, mas do
“submundo” ilícito da instituição. E assim, um dia depois do outro, estratégia seguida de
estratégia, o internado aprende a se orientar entre os dois mundos.
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NOTAS
[1]Doutorando em Sociologia pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH)
da Universidade de São Paulo (USP).
[2]Goffman, Erving. (1949), “Some characteristics of response to depicted experience”.
Unpublished master’s thesis. Department of Sociology, University of Chicago.
[3]Goffman, Erving. (1953), “Communication conduct in an island community”. Unpublished
PhD dissertation. Department of Sociology, University of Chicago.