Introdução
Com a prática da infração penal surge para o Estado o poder-dever de aplicar o
direito punitivo, através da chamada persecutio criminis. Irá perseguir o crime, investi-
gando em busca de indícios de autoria e materialidade – a prova da ocorrência do crime
– e, depois, através da ação penal, vai agir para aplicar uma pena ao criminoso, se houver
justificativa para tanto.
Causas de extinção
da punibilidade do artigo 107 do CP
Art. 107. Extingue-se a punibilidade:
I - pela morte do agente;
II - pela anistia, graça ou indulto;
III - pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso;
IV - pela prescrição, decadência ou perempção;
V - pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada;
VI - pela retratação do agente, nos casos em que a lei a admite;
[...]
IX - pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei.
Morte do agente
No caso de morte do acusado, o juiz, somente à vista da certidão de óbito e depois
de ouvido o Ministério Público, declarará extinta a punibilidade (CPP, art. 62).
Anistia normalmente incide aos crimes políticos, mediante lei emanada do Con-
gresso Nacional, operando-se erga omnes, indistintamente e impessoalmente a todos os
agentes que cometeram esses delitos, durante o período determinado em lei. Poderá
surtir efeitos antes ou depois do trânsito em julgado e leva à abolição de todos os efeitos
penais da sentença.
Indulto é uma graça coletiva, pela qual o decreto presidencial descreve algumas
situações jurídicas nas quais todos os apenados que se adequarem receberão o benefício
do não cumprimento, de forma condicional ou não, do restante da pena ou parte, o que
se chama de comutação. No Brasil, foi institucionalizado através do Presidente Fernando
Henrique Cardoso que, todos os anos, editava o indulto de Natal.
O CPP, em alguns dispositivos dispõe sobre a anistia, a graça e o indulto nos arti-
gos 734 a 742, enquanto a Lei de Execução Penal, entre os artigos 187 e 193.
Prescrição
Os fundamentos da prescrição são o decurso do tempo e a inércia estatal.
Crimes imprescritíveis
Os crimes imprescritíveis são o racismo, previsto na Lei 7.716/89, e os prati-
cados por grupos armados civis ou militares contra o Estado Democrático de Direito
e a ordem constitucional (Lei 7.170/83) conforme prevê o artigo 5.º, XLII, da Cons-
tituição Federal (CF).
Espécies de prescrição
■■ Prescrição da pretensão punitiva: ocorre antes do trânsito em julgado (CP,
art. 109 e 110), divide-se em:
■■ prescrição pela pena máxima em abstrato (art. 109);
■■ prescrição retroativa (art. 110, §1.º);
■■ prescrição superveniente ou intercorrente (art. 110, §1.º).
■■ Estas duas últimas hipóteses levam em consideração a pena em concreto.
■■ Prescrição da pretensão executória: dá-se após o trânsito em julgado da
sentença condenatória.
Prazo prescricional
Para a prescrição pela pena em abstrato, leva-se em consideração a pena máxima
abstratamente prevista para o crime, enquanto para as demais, a pena concretizada, apli-
cada pelo juiz na sentença. Quanto à prescrição executória, a pena definitiva confronta-se
com o artigo 109 do CP.
Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto
no §1.º do artigo 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade
cominada ao crime, verificando-se:
I - em 20 (vinte) anos, se o máximo da pena é superior a 12 (doze);
II - em 16 (dezesseis) anos, se o máximo da pena é superior a 8 (oito) anos e não excede
a 12 (doze);
III - em 12 (doze) anos, se o máximo da pena é superior a 4 (quatro) anos e não excede a
8 (oito);
IV - em 8 (oito) anos, se o máximo da pena é superior a 2 (dois) anos e não excede a 4
(quatro);
V - em 4 (quatro) anos, se o máximo da pena é igual a 1 (um) ano ou, sendo superior, não
excede a 2 (dois);
VI - em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.
Contagem do prazo
Conta-se a prescrição entre os marcos iniciais previstos no artigo 111 do CP e
as causas interruptivas do artigo 117. Termo inicial da prescrição antes de transitar em
julgado a sentença final:
Art. 111. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr:
I - do dia em que o crime se consumou;
II - no caso de tentativa, do dia em que cessou a atividade criminosa;
III - nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência;
IV - nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil, da
data em que o fato se tornou conhecido.
■■ Causas suspensivas:
Art. 116. Antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição não corre:
Art. 112. No caso do artigo 110 deste Código, a prescrição começa a correr:
■■ Prescrição da multa:
Se a única pena imposta foi a de multa que, como se sabe (art. 114, I, CP), prescreve em
dois anos, tendo o fato ocorrido em 18 de junho de 1997 e a denúncia recebida em 27
de novembro daquele ano, com a respectiva sentença editada em 8 de junho de 2000,
portanto mais de dois anos após o despacho liminar positivo, verificou-se a presença
do lapso temporal extintivo da punibilidade, causa que deve ser proclamada. (TJRJ,
A.Crim. 3.604/2000, 7.ª C.Crim.)
Se a pena aplicada ao delito não é superior a dois anos e se da data da publicação da sen-
tença condenatória transita em julgado, para a acusação transcorreu lapso temporal acima
de quatro anos. É de se decretar a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão
punitiva. Não se justifica a fixação da pena-base acima do mínimo legal quando se tra-
tar de réu primário sem antecedentes desabonadores e forem pequenas as consequências
do crime máxime quando a aplicação da reprimenda se der anos após o fato criminoso,
devendo o juiz, ao aplicar a pena, buscar o equilíbrio necessário entre o máximo inte-
resse social e o mínimo de expiação do réu. Tratando-se de crime continuado a prescrição
regula-se pela pena imposta na sentença não sendo computado o acréscimo decorrente da
continuidade delitiva. (TJMG, A. Crim. 140.999/4, 1.ª C. Crim.)
Decadência
Nos casos de ação penal privada, o ofendido terá um prazo determinado na lei
para apresentar sua acusação, para oferecer a queixa-crime, sob pena de ser declarada
extinta a punibilidade pela decadência. O CPP, no artigo 31, ensina que no caso de morte
do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer
queixa ou prosseguir na ação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.
Prazo decadencial
Salvo disposição expressa em contrário, o ofendido decai do direito de queixa ou
de representação se não o exerce dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que
veio a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do parágrafo 3.º do artigo 100 do CP,
do dia em que se esgota o prazo para oferecimento da denúncia.
Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no
direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de 6 (seis) meses,
contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do artigo 29, do
dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia.
Parágrafo único. Verificar-se-á a decadência do direito de queixa ou representação, dentro
do mesmo prazo, nos casos dos artigos 24, parágrafo único, e 31.
Perempção
Reza o artigo 60 do CPP que:
Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á perempta
a ação penal:
I - quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo
durante 30 (trinta) dias seguidos;
II - quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em
juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 (sessenta) dias, qualquer das
pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36;
III - quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato
do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de condenação nas
alegações finais;
IV - quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor.
Não se aplica à ação pública, mesmo condicionada, a hipótese de perempção instituída
no artigo 60, I, do Código de Processo Penal. [...]. (STF, HC 74.710/SP, 1.ª T., Rel. Min.
Octavio Galloti, DJU 25/04/1997)
A renúncia expressa constará de declaração assinada pelo ofendido, por seu repre-
sentante legal ou procurador com poderes especiais. A renúncia do representante legal
do menor que houver completado 18 anos não privará este do direito de queixa, nem a
renúncia do último excluirá o direito do primeiro (CPP, art. 50).
É importante frisar que a queixa contra qualquer dos autores do crime obrigará ao
processo de todos, e o Ministério Público velará pela sua indivisibilidade (CPP, art. 48),
porque a renúncia ao exercício do direito de queixa em relação a um dos autores do crime
se estenderá a todos (CPP, art. 49).
[...] A não inclusão na queixa, dentro do prazo decadencial de todos os corréus – embora
possível – importa em renúncia tácita do direito de ação quanto aos excluídos. Por força
do princípio da indivisibilidade da ação penal (art. 49 do CPP), deve tal renúncia produzir
efeitos em relação aos demais possíveis autores do crime (Precedentes). [...] Habeas conce-
dido. (STJ, HC 12.815/SP, 5.ª T. – Rel. Min. Félix Fischer – DJU 19/11/2001)
Art. 58. Concedido o perdão, mediante declaração expressa nos autos, o querelado será
intimado a dizer, dentro de 3 (três) dias, se o aceita, devendo, ao mesmo tempo, ser cien-
tificado de que o seu silêncio importará aceitação.
Art. 59. A aceitação do perdão fora do processo constará de declaração assinada pelo que-
relado, por seu representante legal ou procurador com poderes especiais.
Por outro lado, percebe-se que poderá ser concedido em qualquer momento
enquanto não transitar em julgado a sentença condenatória.
Corroborando com o artigo 107, IX, do CP, o artigo 58, no parágrafo único do CPP
prevê que, aceito o perdão, o juiz julgará extinta a punibilidade.
Caso especial:
Art. 143. O querelado que, antes da sentença, se retrata cabalmente da calúnia ou da difa-
mação, fica isento de pena.
Art. 342. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito,
contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito poli-
cial, ou em juízo arbitral:
[...]
§2.º O fato deixa de ser punível se, antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito,
o agente se retrata ou declara a verdade.
Perdão judicial
O perdão judicial é uma causa de extinção da possibilidade de o Estado punir o
infrator, conforme dispõe o artigo 107, IX, do CP, desde que expressamente previsto em
lei. As razões são decorrentes da finalidade e funcionalidade das sanções a serem impos-
tas para o autor do delito. A partir do momento em que a pena passa a ser totalmente
desnecessária, não poderá ser aplicada sob pena de arbitrariedade estatal no direito
repressivo. Precisa haver proporcionalidade entre a conduta do agente e a sua punição.
Por isso, quando, por exemplo, o médico, por erro, vem a causar a morte da esposa, do
filho, do melhor amigo ou de uma pessoa a quem nutre reais sentimentos e vínculos
afetivos, não há qualquer necessidade da imposição penal. O mesmo ocorre quando o
motorista de um avião ou de uma embarcação ou de um veículo automotor terrestre, ao
causar culposamente o sinistro, mata o irmão ou este fica tetraplégico ou com grande
disfunção motora e mental.
como assevera o artigo 120 do CP, nem ser aplicada qualquer punição, como
prescreve a Súmula 18 do Superior Tribunal de Justiça, “a sentença conces-
siva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsis-
tindo qualquer efeito condenatório”. Esse é o entendimento que parece mais se
adequar ao Direito Penal e Processual Penal Constitucional moderno e que o
juiz deve analisar no caso concreto, e declarar extinta a punibilidade quando o
fato delituoso se amoldar ao disposto no artigo 121, parágrafo 5.º (posiciona-
mento que ratifica o que dispõe o artigo 120 do Código Penal): “a sentença que
conceder perdão judicial não será considerada para efeitos de reincidência”.
O artigo 108 do CP
A extinção da punibilidade de crime que é pressuposto, elemento constitutivo ou
circunstância agravante de outro, não se estende a este. Nos crimes conexos, a extinção
da punibilidade de um deles não impede quanto aos outros a agravação da pena resul-
tante da conexão.
Como exemplo, pode-se citar que o fato de ser declarada extinta a punibilidade
do crime de furto do veículo não impossibilitará a responsabilização penal do receptador
de veículo furtado.