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UNIVERSIDADE POSITIVO

PROGRAMA DE MESTRADO E DOUTORADO EM ADMINISTRAÇÃO


MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ORGANIZAÇÕES, GESTÃO E
SOCIEDADE

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

O DISCURSO DA SUSTENTABILIDADE NO PROCESSO DE


PLANEJAMENTO PÚBLICO PARTICIPATIVO: UM ESTUDO À
LUZ DA TEORIA HABERMASIANA

ALINE PIRES FLORES

CURITIBA
2015
ii

ALINE PIRES FLORES

O DISCURSO DA SUSTENTABILIDADE NO PROCESSO DE


PLANEJAMENTO PÚBLICO PARTICIPATIVO: UM ESTUDO À
LUZ DA TEORIA HABERMASIANA

Dissertação apresentada como requisito parcial


para a obtenção do grau de Mestre em
Administração, Curso de Mestrado em
Administração, Programa de Mestrado e
Doutorado em Administração, Universidade
Positivo.

Orientador: Prof. Dr. Fabio Vizeu Ferreira

CURITIBA
2015
iii

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Biblioteca da Universidade Positivo - Curitiba - PR

F634 Flores, Aline Pires.


Discurso da sustentabilidade no processo de planejamento
público participativo : um estudo à luz da teoria habermasiana /
Aline Pires Flores. - Curitiba : Universidade Positivo, 2015.
141 f. : il.

Dissertação (mestrado) – Universidade Positivo, 2015.


Orientação : Prof. Dr. Fabio Vizeu Ferreira.

1. Sustentabilidade - Discursos, alocuções, etc. 2. Comunicação.


3. Racionalismo. 4. Pragmática. I. Ferreira, Fabio Vizeu. II. Título.

CDU 658
iv

TERMO DE APROVAÇÃO

TÍTULO: “O DISCURSO DA SUSTENTABILIDADE NO PROCESSO DE PLANEJAMENTO


PÚBLICO PARTICIPATIVO: UM ESTUDO A LUZ DA TEORIA HABERMASIANA”

ESTA DISSERTAÇÃO FOI JULGADA E ADEQUADA COMO REQUISITO PARCIAL


PARA OBTENÇÃO DO TÍTULO DE MESTRE ACADÊMICO EM ADMINISTRAÇÃO (na
área de concentração em organizações, gestão e sociedade) PELO PROGRAMA DE
MESTRADO E DOUTORADO EM ADMINISTRAÇÃO. A DISSERTAÇÃO FOI APROVADA
EM SUA FORMA FINAL EM SESSÃO PÚBLICA DE DEFESA, NO DIA 09 DE DEZEMBRO
DE 2015, PELA BANCA EXAMINADORA COMPOSTA PELOS SEGUINTES
PROFESSORES:

1) Prof. Dr. Fabio Vizeu Ferreira, PMDA/UP (Orientador)


2) Prof. Dr. Rene Eugenio Seifert Junior, UTFPR (Examinador)
3) Prof. Dr. Samir Adamoglu de Oliveira, PMDA/UP (Examinador)

CURITIBA – PR, BRASIL

PROF. DR. JOÃO CARLOS DA CUNHA

COORDENADOR DO PROGRAMA DE MESTRADO E DOUTORADO EM


ADMINISTRAÇÃO DA UNIVERSIDADE POSITIVO
v

Ofereço esse trabalho ao sagrado em mim, que é divino em amor.


Ao meu filho, Pedro.
vi

Agradecimentos

Certamente as palavras escritas aqui sequer tocam a superfície do que eu


gostaria de expressar à todas as pessoas que foram importantes nesta caminhada, e
foram muitas. Cada qual ao seu modo deixou um pouco de si nas madrugadas de
leitura, na angustia da tentativa de compreender o novo, na ânsia por desistir, mas
principalmente em todos os momentos que escolhi continuar e dar o melhor de mim.

Começo por minha família. Pais, irmã, marido e filho, os quais me incentivam
em todos os projetos, e dessa vez não foi diferente. Obrigada por compreenderem
meus propósitos de vida e serem a razão maior de todas as minhas tentativas de
evolução. Saibam que a confiança no apoio incondicional de vocês, transcende todo
o medo e todo o cansaço. Ao Fábio, pesquisador competente e experiente, que
desde o início respeitou as limitações naturais de uma recém-chegada ao mundo
acadêmico, e que me introduziu e me guiou – com imensa habilidade e sabedoria -
no prazeroso percurso do estudo da teoria habermasiana, o qual tenho convicção de
estar ainda nos primeiros passos, o meu mais profundo reconhecimento. Aos meus
professores, os raros, que desde as primeiras aulas empenharam-se em mais que
transmitir, mas em proporcionar a inquietação necessária para que, ao procurar por
respostas, eu compreendesse que as descobertas que se faz no caminho são tão ou
mais importantes que as respostas finais, se é que elas existem. Especialmente aos
professores Rene e Samir, os quais além de brilhantes acadêmicos, são exemplos
de dedicação e generosidade. Todos terão para sempre um lugar especial nas
memórias que levarei do meu mestrado, deixo registrados a minha admiração e
agradecimento pelas significativas contribuições ao meu trabalho.

Aos membros do Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná, agradeço a


disponibilidade e a presteza no auxílio em tudo que solicitei durante o período em
que se deu o estudo. Agradeço, sobretudo, a amiga Ceres, que me ajudou no
primeiro contato com o fórum. Da mesma forma, demonstro minha gratidão aos
colegas do PMDA, nos quais encontrei força e respaldo nos momentos de
dificuldade, mas saúdo especialmente as risadas e alegrias que compartilhamos
com as nossas, nem tão pequenas assim, sucessivas vitórias. Em particular,
vii

obrigada Marcia e Eliane por conciliarem o seu (escasso) tempo e por


compartilharem sua experiência quando eu mais precisei.
O presente trabalho foi realizado com o apoio da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, por meio do Programa
CAPES/PROSUP.
viii

Na verdade, quem luta apenas na esperança de bens materiais não colhe nada que
valha a pena viver.

Antoine de Saint-Exupéry
ix

Resumo

O presente estudo aborda o processo de construção discursiva da


sustentabilidade em um espaço público político destinado ao planejamento e à
gestão da Agenda 21 Paranaense. A Agenda 21 Paranaense representa a
camada local do acordo global assinado por 179 nações na ocasião da Rio-92
para o estabelecimento de um padrão de desenvolvimento global para o século
XXI que considere, além da dimensão econômica, os limites ambientais e as
injustiças sociais. Baseado na teoria crítica de Habermas e partindo de uma visão
contra hegemônica àquela que é observada no mainstream da academia brasileira
de Administração, o argumento central é que o discurso da sustentabilidade é
susceptível aos mecanismos de coerção e dominação do mundo sistêmico, os
quais impedem o estabelecimento de acordos legítimos para o alcance de uma
sociedade emancipada. Neste sentido, nosso objetivo foi desvendar como estes
mecanismos se manifestam por meio de um espaço de fala destinado ao
planejamento público participativo da sustentabilidade, no contexto Paranaense, à
luz da teoria do agir comunicativo de Jürgen Habermas. De natureza qualitativa, o
componente empírico deste estudo está delineado por procedimentos
ideográficos, visando manter consistência epistemológica em relação ao
referencial teórico. As principais evidências encontradas demonstram que, apesar
do fórum representar algum avanço para o fortalecimento de um modelo
democrático participativo em busca do desenvolvimento sustentável, é inegável
que a orientação do fórum reflete interesses estratégicos de grupos dominantes.
Estes impedem que o espaço público de deliberação fomente o desempenhar da
ação comunicativa plena e autônoma. Assim sendo, pode-se aferir que o discurso
da sustentabilidade que está sendo construído no Fórum Permanente da Agenda
21 do Paraná não é expressivo de todos os grupos da sociedade. Neste sentido,
destaca-se a desconsideração dos interesses das comunidades tradicionais, as
quais historicamente estão mais vulneráveis às consequências do modelo
desenvolvimentista. A conclusão do estudo é que duas forças coercitivas se
sobressaem, a primeira é caracterizada pelos interesses da iniciativa privada,
onde a ausência das empresas e instituições que as representam no debate
fragiliza a pluralidade necessária a um processo democrático deliberativo de
políticas públicas sobre a sustentabilidade. A segunda se revela no papel do
Estado, o qual demonstra interesse pelo controle dos processos sociais de
participação através da autoridade formal, mantendo o fórum inclusive dentro dos
limites da sua estrutura física. Além disso, os representantes do Estado atuam de
forma a limitar a aplicação de recursos para que o fórum expanda sua penetração,
dificultando uma participação mais ampla da sociedade no processo da Agenda 21
Paranaense.

Palavras-chave

Sustentabilidade; Discurso; Ação Comunicativa; Racionalidade; Pragmática.


x

Abstract

This study discusses the discursive construction process in a political public sphere
intended for the planning and management of the Agenda 21 for Paraná. This
represents the local layer of the global agreement signed by 179 nations at the
time of Rio-92 for the establishment of common goals of global development for the
21st century, which considers, with the economic dimension, environmental limits
and social injustices. Based on the critical theory of Habermas and assuming a
counter-hegemonic posture from that observed in the mainstream of the Brazilian
Academy of Administration, the central argument is that the sustainability discourse
is subject to mechanisms of coercion and system domination, which hinder the
establishment of legitimate agreements that would bring about an emancipated
society. In this sense, the aim of the study was to uncover how the mechanisms in
this public sphere operate, in time for the public participatory planning of
sustainability in the context of Paraná, in the light of Habermas’ theory of
communicative action. Since a qualitative approach is taken to the present
research, its empirical component features ideographic procedures, aiming to keep
an epistemological consistency in relation to the theoretical framework. The
principal evidence demonstrates that, despite the strengthening of a participatory
democratic model in the direction of sustainable development that the forum
represents, the orientation in its communicative processes reflects the strategic
interests of dominant groups. Such interests prevent this sphere of public
deliberation from fostering integral and autonomous communicative action. This
being so, we might infer that the sustainability discourse produced by the forum
does not express the voices of all groups in society. In this sense, we highlight the
disregard of the interests of the traditional communities, which historically have
been more vulnerable to the consequences of developmental models. The
conclusion of the study is that two coercive forces stand out. The interests of
private initiatives characterize the first, where the absence from the debate of the
companies and institutions that represent them weakens the plurality required in a
deliberative democratic process of public policies on sustainability. The role of the
State shows up the second; this role demonstrates the interest by its control over
the social processes of participation by formal authority, even keeping the forum
within the physical limits of its structure. Besides, the representatives of the State
act to restrict the application of resources through which the forum would otherwise
expand its penetration, impeding a wider participation by the society of Paraná
state.

Keywords

Sustainability; Discourse; Communicative action; Rationality; Pragmatic.


xi

Sumário

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................... 17
1.1 FORMULAÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA ..................................... 24
1.2 OBJETIVOS DA PESQUISA ...................................................................... 24
1.3 JUSTIFICATIVA ......................................................................................... 25
1.4 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO ............................................................. 26

2 REVISÃO TEÓRICA .................................................................................. 28


2.1 QUESTÕES PRELIMINARES .................................................................... 28
2.1.1 Levantamento dos trabalhos sobre sustentabilidade apresentados
no EnANPAD ............................................................................................. 29
2.2 SUSTENTABILIDADE E O FÓRUM PERMANENTE DA AGENDA
21 DO PARANÁ: RESGATE HISTÓRICO ................................................. 39
2.2.1 A construção do discurso moderno sobre a sustentabilidade .................... 40
2.2.2 Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná: contexto histórico de
um instrumento de planejamento público participativo ............................... 44
2.3 A VIRADA LINGUÍSTICO-PRAGMÁTICA E O ENFOQUE
DISCURSIVO ............................................................................................. 53
2.4 TEORIA DO AGIR COMUNICATIVO ......................................................... 58
2.4.1 O conceito de racionalidade por Jürgen Habermas: a verdade que
depende da interação humana ................................................................... 59
2.4.2 O mundo da vida ........................................................................................ 63
2.4.3 Ação comunicativa ..................................................................................... 65
2.4.4 Ação estratégica e o cálculo utilitário de consequências ........................... 68
2.4.5 Manipulação e comunicação sistematicamente deturpada ou
distorcida .................................................................................................... 69
2.4.6 Reciprocidade ............................................................................................ 71
2.4.7 A pragmática universal e a definição de discurso segundo
Habermas................................................................................................... 74
2.4.8 Democracia deliberativa ............................................................................. 78
2.4.9 Espaço público ........................................................................................... 81
2.5 SÍNTESE DA REVISÃO TEÓRICA ............................................................ 84

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .................................................. 86


3.1 DELINEAMENTO EPISTEMOLÓGICO DO ESTUDO ............................... 86
3.2 ESPECIFICAÇÃO DO PROBLEMA ........................................................... 88
3.2.1 Perguntas de pesquisa............................................................................... 88
3.2.2 Definição das categorias analíticas ............................................................ 88
3.3 DELIMITAÇÃO E DESIGN DA PESQUISA................................................ 91
3.3.1 Objeto empírico de investigação ................................................................ 91
3.3.2 Delineamento e etapas da pesquisa .......................................................... 92
3.3.3 Procedimentos de coleta de dados ............................................................ 94
xii

3.3.4 Procedimentos de tratamento e análise dos dados ................................... 97


3.3.5 Facilidades e dificuldades na coleta e tratamento dos dados .................. 101
3.3.6 Limitações da pesquisa ............................................................................ 102
3.4 ASPECTOS ÉTICOS ENVOLVIDOS NA CONDUÇÃO DA
PESQUISA ............................................................................................... 102

4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS ............................. 103


4.1 CONSTITUIDORES DIALÓGICOS UNIVERSAIS ................................... 103
4.2 ORIENTAÇÃO DA AÇÃO E PRÉ-REQUISITOS AO DISCURSO ........... 107
4.3 FORMAS DE ARGUMENTAÇÃO E RACIONALIDADES ........................ 109
4.4 ESPAÇO PÚBLICO POLÍTICO ................................................................ 111

5 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES .................................................. 129

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 134

APÊNDICE A - Protocolo Habermasiano de Análise do Discurso .................... 140

APÊNDICE B - Roteiro de Entrevistas ................................................................. 141


xiii

Lista de figuras

Figura I: Trabalhos relacionados ao tema sustentabilidade, por ano no


EnANPAD............................................................................................. 32
Figura II: Trabalhos relacionados ao tema sustentabilidade, por divisão
acadêmica da ANPAD .......................................................................... 32
Figura III: Eixos dos trabalhos relacionados ao tema sustentabilidade nas
divisões APB e EOR ............................................................................ 35
Figura IV: Quantidade de trabalhos relacionados ao tema sustentabilidade
em APB e EOR, por edição do EnANPAD ........................................... 36
xiv

Lista de tabelas

Tabela I: Critérios de busca dos trabalhos relacionados ao tema


sustentabilidade no EnANPAD ............................................................. 30
Tabela II: Resultado da busca dos trabalhos relacionados ao tema
sustentabilidade nas divisões APB e EOR por tema ............................ 33
Tabela III: Ações da Agenda 21 do Paraná........................................................... 46
Tabela IV: Composição do Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná
na sua criação ...................................................................................... 48
Tabela V: Composição do Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná
em Agosto de 2014 .............................................................................. 49
Tabela VI: Temas norteadores da Agenda 21 do Paraná...................................... 52
Tabela VII: Teoria do agir comunicativo - Formas de argumentação,
conexão com pretensões de validade e racionalidade ......................... 77
Tabela VIII: Fontes primárias e secundárias de dados empíricos ........................... 95
Tabela IX: Busca por termos relacionados às iniciativas da ONU nas
memórias das reuniões do Fórum Permanente da Agenda 21
do Paraná........................................................................................... 122
xv

Abreviaturas e siglas

Abreviatura/ Significado
Sigla

3BL Profit, People, Planet


ANPAD Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração
APB Administração Pública
BRDE Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul
BRICS Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul
CEBDS Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável
COPEL Companhia Paranaense de Energia
CPDS Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e Agenda 21
CREA/PR Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Paraná
EMATER Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural
ENANPAD Encontro da Associação dos Programas de Pós-Graduação em Administração
EOR Estudos Organizacionais
ESO Estratégia em Organizações
FACIAP Federação das Associações Comerciais e Empresariais do Paraná
FAEP Federação da Agricultura do Estado do Paraná
FIEP Federação das Indústrias do Paraná
GCT Gestão de Ciência, Tecnologia e Inovação
GOL Gestão de Operações e Logística
GRI Global Report Initiative
GTT Grupo de trabalho temático
IES Instituição de Ensino Superior
ISE Índice de Sustentabilidade Empresarial
MKT Marketing
MG Minas Gerais
PDF Portable Document Format
OAB/PR Ordem dos Advogados do Brasil do Paraná
OCEPAR Organização das Cooperativas do Estado do Paraná
ODM Objetivos do Milênio
ODS Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
ONG Organização Não Governamental
ONU Organização das Nações Unidas
PLDS Plano Local de Desenvolvimento Sustentável
REBAL Rede Brasileira de Agendas 21 Locais
RIO-92 Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento
xvi

Abreviatura/ Significado
Sigla

SANEPAR Companhia de Saneamento do Paraná


SEMA Secretária de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos
SINDUSCON/PR Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado do Paraná
TAC Teoria do Agir Comunicativo
UEL Universidade Estadual de Londrina
UFPR Universidade Federal do Paraná
UNEP United Nations Environment Programme
17

1 INTRODUÇÃO

Sustentabilidade é um tema que tem sido amplamente discutido na sociedade


contemporânea. Segundo Lima (2003, p. 99), “em pouco tempo a sustentabilidade
tornou-se palavra mágica, pronunciada indistintamente por diferentes sujeitos, nos
mais diversos contextos sociais e assumindo múltiplos sentidos”. Seja pela
discussão do papel do Estado e das organizações ou sobre como a sociedade civil
se organiza em torno do assunto, a questão tornou-se imensamente debatida e o
conceito extensamente empregado por diferentes atores nos mais diversos cenários
e contextos.

Foi especialmente a partir da década de 1970 que o tema passou a ser


discutido no âmbito global, tanto na esfera pública quanto na privada, verificando-se
campo de amplo interesse nas agendas de governos, executivos, academia e da
sociedade civil organizada. Todavia, mesmo com tamanho interesse e após anos de
discussões, o termo ainda se constitui na sociedade de forma difusa, envolvendo
múltiplos significados e interesses. Estes são articulados em diferentes esferas de
discussão e atuação social, onde a tensão entre o público e o privado, o social e o
econômico, o coletivo e o particular, transparece como grande marca da disputa por
interpretações sobre o que é ser sustentável.

Em relação às organizações, a sustentabilidade também emerge como tema


de grande relevância. Porém, no discurso organizacional, este tema assume um uso
hegemônico particularmente bem definido: parecer sustentável passou a ser um
diferencial competitivo, um novo tipo de marketing corporativo e institucional
(KOTLER; KELLER; LANE, 2006). E, para ser efetivo, este discurso se concretiza
em comunicações oficiais das organizações aos seus diferentes públicos. Neste
sentido, exemplos de como as organizações vêm a público falar sobre
sustentabilidade são os relatórios de sustentabilidade que são publicados
periodicamente por organizações dos mais variados setores, ou por meio de
associações representativas, como por exemplo, o relatório Visão 2050, publicado
pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS).
18

Em exemplo recente, as ações da Vale do Rio Doce, empresa conjuntamente


responsável pelo maior desastre ambiental no Brasil que se tem conhecimento, que
foi o rompimento, em 5 de novembro de 2015, da barragem contendo rejeitos tóxicos
em Bento Rodrigues (MG), tinham o maior peso na composição do Índice de
Sustentabilidade Empresarial (ISE) da BM&F Bovespa (ESTADÃO, 2016), fato que
claramente demonstra a contradição presente no discurso empresarial sobre a
sustentabilidade.

Para que se tenha uma medida sobre a complexidade que envolve a


sustentabilidade, órgãos internacionais têm se dedicado a múltiplas metas e
objetivos em suas ações relacionadas ao tema. Sobre este ponto, uma breve análise
sobre as iniciativas da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o
desenvolvimento sustentável demonstra que, em se tratando de uma questão de
múltiplos aspectos, além da dimensão ambiental, outras questões estão sendo
debatidas, tais como os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), que em
número de dezessete traçam metas sociais e ambientais1.

Apesar de difusa, a questão da sustentabilidade está, desde o início de sua


mobilização em termos de articulação internacional, associada a expectativa de
mobilização e transformação. Neste sentido, inúmeras pesquisas e reflexões por
parte de estudiosos do tema apontam para situações que, se evitadas ou
melhoradas, poderiam colocar a humanidade nos trilhos de um modelo de vida
menos degradante tanto social quanto ambientalmente. Contudo, é intrigante
constatar que, após o imenso volume de discussões, evidências, e mesmo com o
envolvimento direto de estadistas importantes no cenário mundial, pouco se fez em
termos de ações concretas para dar fim ao problema da sustentabilidade.

Este último ponto transparece-nos como algo de extrema importância, sendo


o ponto central de nosso argumento. A despeito das diferentes perspectivas, o que
se supõe em todos os esforços no âmbito diplomático e na sociedade civil é a
constatação de problemas de dimensão global e a necessidade (em maior e menor

1
Algumas vezes, tais metas estão igualmente relacionadas às duas questões simultaneamente,
como é o caso do ODS 8 – Fome zero e agricultura sustentável.
19

urgência, a depender do ponto de vista) por soluções concretas e objetivas.


Entretanto, o acordo necessário para essa mobilização coletiva entre tantos
interessados permanece um enigma. Após quase meio século de discussões desde
o início do movimento global em torno da sustentabilidade, pouco se evoluiu em
termos das mudanças nos hábitos de produção e consumo necessárias a uma
sociedade diferente desta que foi modelada pela lógica capitalista moderna.

A constatação desta inércia está evidenciada no conteúdo do relatório The


Emissions Gap Report, publicado em novembro de 2014, pelo United Nations
Environment Programme (UNEP). Neste documento, cientistas apresentam suas
conclusões, as quais evidenciam o fato da humanidade ainda não estar no caminho
certo no que se refere ao refreamento do aquecimento global. Para os cientistas o
desafio relativo ao aquecimento do planeta é grande, pois, a fim de limitar o aumento
da temperatura global para abaixo de 2 °C, as emissões globais de gases do efeito
estufa devem diminuir em cerca de 10% ou mais até 2030 em comparação a 2010, e
serem pelo menos 49% menores em 2050 (UNEP, 2015).

Para investigar a raiz do problema da inércia quanto à ação concreta de


sustentabilidade, assumimos a perspectiva analítica teórico-crítica, inspirada na
postura crítica frankfurtiana. Nesta perspectiva, assumimos a visão da totalidade
histórica do fenômeno social, que se estabelece nas relações concretas de auto
reprodução, assim como a partir de sua dimensão contraditória. Esta última, por sua
vez, revela-se pela análise dialética de construções discursivas de cunho ideológico
(HORKHEIMER, 1991; FORESTER, 1994).

Assim, o ponto de vista histórico-hermenêutico em nossa postura crítica


revela a sustentabilidade enquanto fenômeno social, sendo esta uma construção
discursiva com múltiplos significados, mas que é constituída por forças históricas
bem definidas. Estas são as forças do sistema de capital, que se fazem presentes
como o grande mecanismo de exploração do nosso tempo histórico, e que também
se fazem presentes na história da questão da sustentabilidade (VIZEU;
MENEGHETTI; SEIFERT, 2012).
20

Desta forma, tendo em vista que a sustentabilidade enquanto matéria de


interesse público e coletivo envolve igualmente diferentes interesses particulares e
forças políticas, é pertinente compreender, partindo de uma perspectiva que busca
olhar para a questão de uma forma menos ingênua, como este processo discursivo
se constitui e influencia o quadro de estagnação que verificamos hoje. Uma palavra
que apresenta inúmeras definições e significados, pronunciada e debatida em
diversos níveis e segmentos sociais não é, somente por este caráter plural, isenta e
livre de vieses. Observada como um conceito politicamente negociado, são múltiplas
vozes que participam de uma discussão contraditória.

Partindo desta visão de sustentabilidade enquanto um discurso socialmente


construído a partir de processos políticos de dominação e relações de poder, pode-
se depreender que a análise deste fenômeno deva passar pela compreensão dos
conteúdos discursivos, presentes nos processos de articulação destes múltiplos
interesses. Nesta questão em particular, é importante lembrar que a história da
sustentabilidade passa pela realização de diversos fóruns mundiais e locais,
compostos por representantes de diferentes esferas da sociedade, onde o tema é
amplamente debatido e onde diretrizes são intencionalmente estabelecidas. É
sobretudo nestes fóruns que a sustentabilidade é edificada enquanto realidade
social, e onde são legitimados e inicialmente propagados os discursos dominantes
sobre a sustentabilidade.

Sendo muitos os fóruns diplomáticos realizados até hoje, nos dedicamos a um


esforço em particular, que vem sendo trilhado nos últimos 23 anos. A Conferência
das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de
Janeiro, em 1992 (Rio-92), consiste no fórum que aprovou o documento denominado
Agenda 21, o qual estabeleceu o acordo sobre o modelo de desenvolvimento para o
século 21. Neste documento, a ideia central é que o desenvolvimento econômico, a
conservação do meio ambiente e relações sociais justas são igualmente importantes
na consolidação de um futuro sustentável para a civilização humana.

Os esforços diplomáticos que derivaram da Rio-92 se articularam de tal forma


que induziram o debate da Agenda 21 para o âmbito do poder público local. Neste
21

sentido, a Agenda 21 brasileira é definida pelo Ministério do Meio Ambiente como


um processo e um instrumento de planejamento participativo para o
desenvolvimento sustentável e que tem como eixo central a sustentabilidade,
compatibilizando a conservação ambiental, a justiça social e o crescimento
econômico (AGENDA 21 BRASILEIRA, 2015a). O documento Agenda 21 brasileira
foi finalizado em 2002, após um processo de consultas à sociedade, o qual foi
coordenado pela Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e Agenda
21 (CPDS).

A CPDS tem como objetivo internalizar as propostas da Agenda 21 ao


processo de elaboração de políticas públicas nas diferentes esferas de governo no
território brasileiro (COMISSÃO DE POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL E AGENDA 21, 2015). As Agendas 21 locais, por sua vez,
consistem no processo de planejamento participativo para a construção do Plano
Local para o Desenvolvimento Sustentável (PLDS) de um determinado território e,
no Brasil, devem ser elaboradas seguindo o passo-a-passo provido pelo Ministério
do meio Ambiente, o qual consiste nas seguintes etapas: 1º passo: mobilizar para
sensibilizar governo e sociedade; 2º passo: criar o fórum da Agenda 21 local; 3º
passo: elaborar o diagnóstico participativo; 4º passo: elaborar o plano local de
desenvolvimento sustentável; 5º passo: implementar o plano local de
desenvolvimento sustentável e 6º passo: monitorar e avaliar o plano local de
desenvolvimento sustentável (PASSO A PASSO DA AGENDA 21 LOCAL, 2015).

Sobre esta estrutura de governança da Agenda 21 brasileira, cabe ressaltar


que os instrumentos de planejamento participativo criados pelo governo brasileiro
são reconhecidos como elementos de avanço a consolidação de mecanismos de
representação democrática (DE TONI, 2009). Deste modo, mesmo que com
limitações, a capilaridade da estrutura de elaboração da Agenda 21 brasileira torna
um pouco mais provável a participação direta do cidadão comum. O regime de
participação pública, no Brasil, tem sido viabilizado pelo sistema de conselhos
plurais (ou seja, por conselhos formados por representantes do poder público e da
sociedade civil).
22

Estes conselhos se expandem rapidamente após a constituição de 1988, a


qual propõe a participação da sociedade na formulação e gestão de políticas
públicas por meio de conselhos nacionais, estaduais e municipais. Tais conselhos
estão ligados principalmente às áreas da saúde, da criança e do adolescente e ao
setor de assistência social (DE TONI, 2009). Considerando a diversidade e estrutura
de funcionamento, estes espaços possuem um papel relevante para a democracia,
pois, apesar de atuarem primordialmente como órgãos consultivos, têm o papel de
escutar a sociedade em outras oportunidades e não apenas por ocasião do voto na
eleição de seus representantes (VIZEU; BIN, 2008).

Partindo destas constatações, o objetivo do presente estudo foi explorar a


construção do discurso da sustentabilidade no Fórum Permanente da Agenda 21 do
Paraná, um espaço de fala destinado ao processo público participativo de
elaboração e gestão da Agenda 21 no estado. Constituído legalmente sob a forma
de um fórum composto por representantes do governo e da sociedade Paranaense,
sejam aqueles formalmente inscritos como membros ou aqueles que desejam
participar, mas que não figuram como membros nos documentos legais de
constituição do fórum, o Fórum Permanente da Agenda 21 Paraná existe desde
2004 para servir de instrumento de planejamento e gestão do desenvolvimento
sustentável no estado. As atividades do fórum são coordenadas por um
representante da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos
(SEMA) e consistem no levantamento, revisão e formalização das propostas da
sociedade para a Agenda 21 Paranaense, bem como sua posterior gestão.

Pretende-se assim, a partir da exploração da dinâmica processual deste


espaço, compreender como o discurso da sustentabilidade está sendo construído
em um espaço destinado ao planejamento público participativo e revelar quais são e
como são articulados os diferentes interesses envolvidos, os quais conduzem o
fórum a desempenhar o papel de mais um mecanismo de dominação e coerção do
mundo sistêmico. Neste sentido, consequentemente será possível determinar a
extensão em que esse processo é de fato profícuo em atender a centralidade de
uma discussão entre governo e sociedade sobre a sustentabilidade.
23

Para dar conta de tal intento, a principal orientação teórica do estudo foi a
Teoria do Agir Comunicativo (TAC), de Jürgen Habermas. Nesta perspectiva teórica
é observado que a possibilidade de acordos reais e duradouros entre o governo e a
sociedade – que sejam livres de mecanismos de dominação – está depositada na
viabilidade das condições para que se atinja um processo argumentativo livre e
legítimo. Assim sendo, o discurso consensual e coletivamente criado, conforme
Habermas, é dependente de uma atitude de cooperação entre os sujeitos e está
fundamentado no emprego da racionalidade comunicativa.

Sob o ponto de vista epistemológico, Habermas recupera o projeto central da


escola de Frankfurt, especialmente no que tange o objetivo de Theodor Adorno e
Marx Horkheimer de crítica a racionalidade instrumental e o propósito de resolver o
problema da emancipação dos sujeitos quanto aos dogmas sociais vigentes
(ARAGÃO, 2006; FREITAG, 1986; VIZEU, 2005). Para tanto, Habermas propõe uma
teoria social fundamentada na filosofia da linguagem e na reflexão sobre os dilemas
enfrentados na modernidade, derivados da permanente tensão entre o mundo
sistêmico, representado pelo governo e mercado, e o mundo da vida, representado
pela ideia natural de mundo e onde se articulam as experiências vividas, os
imperativos morais da sociedade e a identidade de cada personalidade única. De
acordo com a crítica habermasiana sobre a sociedade moderna, a interação
comunicativa, que antes era percebida nas decisões cotidianas no âmbito da vida em
comunidade, cedeu espaço a racionalidade instrumental incorporada ao estilo de
vida moderno (SILVEIRA, 2008), graças, principalmente, a lógica de produção e
reprodução do capitalismo.

Portanto, inspirada na teoria crítica da primeira geração da escola de Frankfurt,


na pragmática da linguagem, na hermenêutica e na fenomenologia, a teoria
habermasiana está amparada em um vasto repertório epistemológico, oferecendo
domínio teórico que propiciará um olhar pretensamente contra hegemônico sobre o
discurso vigente da sustentabilidade.
24

1.1 FORMULAÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA

Posta a problematização na qual o trabalho se estabelece, temos condições


de apresentar o problema de pesquisa que nos orientou. Conforme já foi
mencionado, este estudo visou explorar a construção do discurso da
sustentabilidade em um espaço destinado ao planejamento público participativo da
Agenda 21 Paranaense, partindo do pressuposto que este espaço ou fórum
representa mais um instrumental de colonização do mundo pelo sistema capitalista.
Com isto, parte-se do seguinte problema de pesquisa:

Como o discurso da sustentabilidade está sendo construído no


processo de planejamento público participativo da Agenda 21 do Paraná?

1.2 OBJETIVOS DA PESQUISA

Considerando que o Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná é


constituído sob a forma de um espaço público, onde a sustentabilidade deveria ser
problematizada a partir de interesses plurais e visando o estabelecimento de
acordos entre governo e sociedade civil, partimos da hipótese de trabalho de que
este processo representa um mecanismo de coerção e dominação do mundo
sistêmico. O objetivo geral do presente estudo foi o de explorar como o discurso da
sustentabilidade está sendo construído neste espaço, a partir dos constructos
apresentados pela teoria habermasiana.

Por conta disso, os objetivos específicos foram:

a. Identificar quais são os mecanismos de coerção e dominação do


mundo sistêmico que exercem influência na dinâmica do fórum.

b. Analisar como os diferentes tipos de discurso e racionalidades


conduzem as atividades, processos e deliberações do fórum.

c. Identificar os elementos estruturais e do processo comunicacional do


fórum que impedem a reciprocidade e tornam a comunicação
sistematicamente deturpada.
25

d. Levantar e analisar os fatores que limitam o fórum de desempenhar a


função de espaço público destinado ao planejamento participativo da
sustentabilidade no estado do Paraná.

1.3 JUSTIFICATIVA

Conforme já indicamos, a sustentabilidade é uma construção discursiva que


vem se reproduzindo no cenário global e, de forma sintética, podemos identificar
duas vertentes que se polarizam no campo discursivo da sustentabilidade: i) a
hegemônica, a qual pretende conciliar o desenvolvimento econômico e as questões
ambientais e sociais; e ii) a contra hegemônica, que compreende a sustentabilidade
enquanto um discurso contraditório, construído ao longo do tempo com base em
diferentes interesses e por forças que disputam entre si o reconhecimento como o
discurso verdadeiro (LIMA, 2003).

Neste estudo em particular, se adotou a segunda perspectiva, assumindo que


esta necessita ter maior voz e impacto, tanto no meio acadêmico quanto na
sociedade em geral. Isto porque, diante da visão assumida pela perspectiva
hegemônica, a sociedade civil e seus representantes minimizam (ou mesmo
desconsideram) as evidências que revelam o não comprometimento das empresas
com o problema ambiental que deu ensejo ao debate sobre a sustentabilidade
(VIZEU; MENEGHETTI; SEIFERT, 2012). Por conta disto, pretendeu-se explorar o
processo de construção discursiva da sustentabilidade, evidenciando um contexto
de espaço público de fala que vem sendo reproduzido em diferentes instâncias
políticas e sociais.

No que diz respeito a adoção da teoria habermasiana, o presente estudo


visou contribuir para que se evidenciem as limitações em uma sociedade civil
dominada pelo interesse do dinheiro e das corporações (SANTOS, 2005) quanto ao
estabelecimento de acordos, mediados entre governo e sociedade acerca da
sustentabilidade. No espaço público criado com o Fórum Permanente da Agenda 21
do Paraná, partimos da crítica direta à retórica de que este espaço se constitui de
forma plural e garantindo a representação ampla da sociedade (como retratado nos
26

documentos oficiais de criação deste Fórum). Na verdade – e este ponto é central no


presente estudo – a Agenda 21 está inserida em um contexto de dominação pelos
elementos poder, representado pelo governo, e capital, representado pelos
interesses do mercado, se concretizando, em sua essência, como mais um
mecanismo de caráter ideológico.

A sustentabilidade vem representando objeto de interesse da academia


brasileira de Administração, o que pode ser comprovado pelo grande volume de
publicações sobre o tema. No entanto, o que se verifica nos trabalhos que se
inserem no mainstream da pesquisa em Administração no Brasil é um discurso
conciliatório entre desenvolvimento econômico e a preservação do meio ambiente e
o atingimento de relações sociais justas e igualitárias 2 . Neste sentido, uma
importante contribuição do presente estudo é fazer voz contrária a tal postura
conciliatória, revelando, no âmbito empírico, as inconsistências desta perspectiva.

1.4 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO

A presente dissertação está composta por cinco capítulos, incluindo esta


introdução. O capítulo dois é dedicado a revisão teórica, onde se procurou
fundamentar e articular as reflexões acadêmicas sobre os fenômenos que foram
estudados. Dividido em cinco sessões, a primeira apresenta questões preliminares
que amparam a escolha da teoria de base, bem como o caráter polissêmico, porém
hegemônico, da perspectiva da Academia Brasileira de Administração sobre o tema.
A segunda descreve o percurso histórico do discurso sobre a sustentabilidade e a
origem do Fórum Permanente da Agenda 21 como um instrumento de planejamento
público. A terceira seção apresenta as características da virada linguístico-
pragmática. A visão habermasiana sobre racionalidade e a teoria do agir
comunicativo são apresentadas na seção quatro e, finalizando o capítulo de revisão
teórica, é apresentada uma síntese sobre como se pode analisar o discurso da
sustentabilidade pelo olhar da TAC.

2
Este ponto será mais detalhado no capítulo seguinte, na subseção que trat a de um breve
levantamento sobre a produção acadêmica brasileira sobre sustentabilidade.
27

Os procedimentos metodológicos estão apresentados no terceiro capítulo,


onde estão descritos, dentre outros elementos, as categorias de análise relevantes,
o delineamento de pesquisa e a exposição dos motivos para a escolha do objeto
empírico. No quarto capítulo foi apresentada a análise dos resultados obtidos na
etapa de campo. As conclusões e recomendações sobre futuros estudos,
apresentadas no capítulo cinco, finalizam o presente relatório de dissertação.
28

2 REVISÃO TEÓRICA

2.1 QUESTÕES PRELIMINARES

Conforme já explicitado, a proposta deste trabalho é a de considerar a


sustentabilidade enquanto discurso social e historicamente construído. Neste sentido,
o quadro teórico e a literatura de sustentação de nossos argumentos foram
construídos a partir da articulação entre os fatos históricos e proposições do campo
acadêmico interessado no tema da sustentabilidade, por um lado, e, por outro, na
literatura crítica – e mais detidamente, naquela inspirada nos trabalhos de Habermas.
Este caminho foi trilhado visando sistematizar os constructos necessários para se
analisar o discurso da sustentabilidade em um espaço público de planejamento
participativo, à luz da teoria habermasiana.

Assim, guardando o compromisso com a perspectiva crítica em Administração


e sua intenção emancipatória (DAVEL e ALCADIPANI, 2003), nosso ponto de
partida é a premissa fundamental da tradição frankfurtiana e sua herança marxiana,
qual seja, a perspectiva de que a realidade social deve ser observada a partir do
pensamento dialético e enquanto construção histórica. Por isso, foi empreendida na
abertura desta sessão um breve levantamento não exaustivo sobre a perspectiva da
Academia Brasileira de Administração sobre a sustentabilidade, identificando
enfoques hegemônicos e a vinculação com a perspectiva de mercado; em adição,
empreendemos a contextualização histórica dos conceitos modernos sobre
sustentabilidade e também sobre como surgiu o processo de planejamento público
participativo da Agenda 21 no Brasil. O objetivo destas duas sessões iniciais é o de
caracterizar a concretude do fenômeno social de construção discursiva, identificando
seus aspectos contraditórios fundamentais e sua relação com as forças produtivas.

Portanto, em se tratando de proposta de pesquisa onde se explora o discurso


da sustentabilidade sob uma perspectiva crítica, o emprego da teoria da ação
comunicativa de Habermas é de grande proveito, uma vez que, constituída a partir
de um referencial epistemológico heterogêneo, a pragmática habermasiana nos
permitiu explorar as contradições presentes no discurso da sustentabilidade. Desta
29

maneira, as seções que se seguem têm por finalidade central situar e delimitar o
problema de pesquisa no domínio teórico no qual se pretende concomitantemente
fundamentar os argumentos da pesquisa e sustentar as conclusões alcançadas a
partir dos dados empíricos.

Uma última questão deve ser colocada sobre o levantamento apresentado a


seguir. É importante ressaltar que tal levantamento não é, e nem tampouco tem a
intenção de representar, uma conclusão sobre o estado da arte da pesquisa sobre
sustentabilidade em Administração no Brasil. Sua necessidade surge no sentido de
minimamente compreender a direção dominante, para a qual a academia tem se
movido nos anos mais recentes, e assim posicionar a relevância do presente estudo.

2.1.1 Levantamento dos trabalhos sobre sustentabilidade apresentados no


EnANPAD

Objetivando mapear a produção acadêmica sobre sustentabilidade na área de


Administração no Brasil, fizemos o levantamento de todos os trabalhos sobre
sustentabilidade, apresentados nas edições de 2010 a 2014, do Encontro da
Associação dos Programas de Pós-Graduação em Administração (EnANPAD). A
escolha do EnANPAD para tal intento se deve ao fato de que este encontro
representa o celeiro da produção strictu senso em Administração no Brasil (trabalhos
fruto da formação em nível de mestrado e doutorado). Promovido pela Associação
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração (ANPAD), é o segundo
maior evento de pesquisa em Administração no mundo e o maior do Brasil (ANPAD,
2015), para o qual basicamente a totalidade dos programas de pós-graduação strictu
senso submetem seus trabalhos. Portanto, o EnANPAD representa hoje o evento
mais relevante em termos de volume de pesquisas e de participação da comunidade
acadêmica, ou seja, retrata o mainstream da pesquisa brasileira em Administração.

Além disso, outro fato é de grande relevância para esta escolha. Nos últimos
anos, a ANPAD tem se organizado pela estrutura de divisões representando
subáreas de interesse dos programas associados e, estas, por sua vez, têm se
organizado a partir de temas propostos pelos associados individuais nas reuniões de
30

divisão. Esta estrutura temática, neste sentido, corresponde a uma interessante


referência que traduz a maneira como a Academia brasileira de Administração está
organizada por interesses e temas de pesquisa particulares, bem como reflete o
entendimento sobre as abordagens mais aceitas por esta comunidade.

O método de levantamento abrangeu os cinco anos entre 2010 a 2014, uma


vez que a ideia foi justamente apresentar a tendência atual da pesquisa sobre
sustentabilidade no cenário nacional. Foram incluídos no levantamento todos os
trabalhos classificados nos temas relacionados a sustentabilidade, das divisões
acadêmicas que abrangem a sustentabilidade em algum dos seus temas. Para tanto,
foram verificados todos os títulos e descritores de temas das onze divisões da
ANPAD. Para as divisões que não possuem temas específicos sobre
sustentabilidade, foram considerados os trabalhos em que no título aparecem as
palavras sustentabilidade, desenvolvimento sustentável ou responsabilidade social.
A tabela a seguir resume o critério de busca:

Tabela I: Critérios de busca dos trabalhos relacionados ao tema


sustentabilidade no EnANPAD
Divisão Tema
ADI Busca por palavras em todos os temas
APB Busca por palavras em todos os temas
CON 02 - Contabilidade e Responsabilidade Socioambiental
EOR Busca por palavras em todos os temas
EPQ * Busca por palavras em todos os temas
ESO 05 - Estratégia, Sustentabilidade Socioambiental e Ética Corporativa
FIN Busca por palavras em todos os temas
GCT 08 e 09 - Inovação e Sustentabilidade
GOL 05 - Operações Sustentáveis
GPR Busca por palavras em todos os temas
MKT 07 - Marketing e Sociedade

Fonte: própria autora

*Não havia trabalhos classificados no tema 11 - Educação para a Sustentabilidade na Administração


e Contabilidade em nenhum dos anos analisados.
31

A busca indicou um total de duzentos e sessenta e dois trabalhos, uma média


de cinquenta e dois trabalhos em cada uma das edições do evento. Verificou-se um
crescimento de 45% no volume de trabalhos entre o primeiro e o último ano
analisados (figura I). As divisões que apresentaram o maior número de trabalhos
foram ESO (Estratégia em Organizações), seguida por GCT (Gestão de Ciência,
Tecnologia e Inovação) e GOL (Gestão de Operações e Logística). Estas três
divisões são responsáveis por quase 70% dos trabalhos apresentados no período,
ou cento e oitenta trabalhos (figura II).

Em consulta sobre o processo de elaboração dos temas, realizada com um


coordenador de divisão acadêmica da ANPAD, obteve-se a informação de que a
inclusão ou exclusão de temas de interesse, bem como a revisão dos descritores,
consiste em um processo anual, o qual é conduzido pelos pesquisadores que
integram cada divisão. Desta forma, tanto as divisões como os temas de interesse
são estabelecidos como resultado das reflexões da comunidade acadêmica, e
consideram, entre outros aspectos, os posicionamentos epistemológicos de seus
participantes.

Assim, fazendo uma análise a partir deste contexto, a tendência das divisões
ESO, GCT e GOL é a de ancorar seus posicionamentos em abordagens mais
gerencialistas. As divisões Administração Pública (APB) e Estudos Organizacionais
(EOR) são as que, historicamente, apresentam trabalhos amparados em uma visão
mais crítica. Desta forma, os trabalhos apresentados nestas últimas duas divisões
foram detalhadamente analisados quanto a natureza dos temas, objetivando
conhecer em maior profundidade o que se têm refletido e pesquisado no Brasil
acerca da sustentabilidade, considerando o potencial de uma abordagem crítica
sobre o tema.
32

Figura I: Trabalhos relacionados ao tema sustentabilidade, por ano no


EnANPAD

Fonte: própria autora

Figura II: Trabalhos relacionados ao tema sustentabilidade, por divisão


acadêmica da ANPAD

Fonte: própria autora


33

As divisões ABP e EOR apresentaram vinte estudos sobre sustentabilidade


no período de 2010 a 2014, correspondendo a menos de 8% da totalidade dos
trabalhos sobre sustentabilidade apresentados o EnANPAD no período analisado. A
segregação dos trabalhos por temas em cada uma das duas divisões acadêmicas
está abaixo:

Tabela II: Resultado da busca dos trabalhos relacionados ao tema


sustentabilidade nas divisões APB e EOR por tema
Quantidade
Divisão Tema de
trabalhos
APB 01 - Estado, Sociedade, Governo e Administração Pública 1
APB 02 - Relações entre Estado e Sociedade/ Políticas Públicas e Sociais 8
APB 05 - Casos e Aplicações em Políticas Públicas 2
APB 07 - Organização e Gestão de Serviços Públicos 1
APB
Total 12
EOR 03 - Trabalho, Organização e Sociedade 1
EOR 02 - Comportamento e Aprendizagem 2
04 - Ontologia, Epistemologias, Teorias e Metodologias nos Estudos
EOR Organizacionais 4
10 - Prática de Gestão e Teorias de Administração em Estudos
EOR Organizacionais 1
EOR
Total 8
Total 20

Fonte: própria autora

Em APB o tema que mais apresentou trabalhos foi o de “Relações entre


Estado e Sociedade/ Políticas Públicas e Sociais”, para o qual, segundo o seu
descritor, são aceitos estudos relacionados a responsabilidade social, economia
solidária e capital social. Nesta divisão foram apresentados quatro estudos ligados a
implementação de polícias públicas, sete ligados a processos e tecnologias e um
estudo que abordou a percepção quanto ao papel do Estado na resolução de
conflitos associados as questões de sustentabilidade.

Em EOR o tema predominante na recepção de trabalhos de sustentabilidade


foi “Ontologia, Epistemologias, Teorias e Metodologias nos Estudos
Organizacionais”, com o total de quatro trabalhos apresentados no período. Dentre
34

os oito estudos em EOR, três abordaram o discurso da sustentabilidade e o


processo de construção de significados, um estudo preocupou-se com a criação de
uma escala para a avaliação do comportamento sustentável de estudantes
universitários, um estudo discutiu as bases epistemológicas da sustentabilidade, um
trabalho discutiu a gestão da sustentabilidade no contexto organizacional, um
trabalho teve como objetivo analisar o processo de aprendizagem organizacional e,
por fim, um trabalho buscou analisar os desafios do campo da teoria organizacional
perante o fenômeno da sustentabilidade.

Conforme apresentado na figura III, organizamos os trabalhos no campo de


APB e EOR em quatro principais eixos temáticos (com maior concentração de
trabalhos), e outros mais difusos. Os quatro eixos principais são: i) o do impacto de
novas tecnologias e processos ligados a sustentabilidade em corporações públicas e
privadas (oito trabalhos); ii) políticas públicas de/para a sustentabilidade (quatro
trabalhos), o que pretende compreender a sustentabilidade enquanto discurso (três
trabalhos), e o que explora percepções, aprendizagem e significados da
sustentabilidade (dois trabalhos). Os demais estudos discutiram sobre aspectos
teóricos e epistemológicos mais gerais.

Dentro do eixo novas tecnologias e processos foram exploradas questões


como a implementação do processo de gestão de compras públicas sustentáveis e a
gestão de resíduos sólidos, bem como a construção de indicadores de
sustentabilidade setoriais e regionais e a predisposição de estudantes universitários
ao comportamento sustentável. Os trabalhos classificados no eixo sustentabilidade
enquanto discurso exploraram as contradições internas do discurso identificadas na
comparação entre o conteúdo apresentado nos relatórios de sustentabilidade e a
realidade das organizações pesquisadas, além de compreender o processo de
conceituação e atribuição de significados da sustentabilidade pelas organizações.
No eixo percepções, aprendizagem e significados estão os trabalhos que
procuraram analisar questões como a percepção do papel do Estado na resolução
de conflitos e o processo de aprendizado de grandes organizações no decurso de
propiciar retorno a outros públicos que não apenas os seus acionistas.
35

Figura III: Eixos dos trabalhos relacionados ao tema sustentabilidade nas


divisões APB e EOR

Fonte: própria autora

A maior parte dos estudos em APB e EOR caracteriza-se por ensaios teórico-
empíricos, verificando-se a presença de quatro estudos quantitativos, incluindo um
estudo bibliométrico. Pode-se observar que o volume de trabalhos ligados a
sustentabilidade nestas duas divisões foi aumentando gradativamente ao longo do
período levantado (figura IV). A tendência constatada nos trabalhos apresentados
em 2014 é a de circunscrever a sustentabilidade dentro de um contexto social, suas
inter-relações e fundamentos epistemológicos. Esta mesma tendência não se
verifica nestas divisões acadêmicas nos anos anteriores, ao contrário, durante o
período de 2010 a 2013 observa-se que o esforço científico ocorreu no sentido de
formular e aplicar frameworks prescritivistas de gestão da sustentabilidade, além da
criação de modelos com indicadores setoriais e regionais para mensurar o impacto
de processos administrativos e operacionais implementados como consequência das
mudanças trazidas com a sustentabilidade.
36

Figura IV: Quantidade de trabalhos relacionados ao tema sustentabilidade


em APB e EOR, por edição do EnANPAD

Fonte: própria autora

Nosso entendimento é de que a área – mesmo nas divisões APB e EOR, que
são tradicionalmente mais críticas – é predominantemente voltada para uma visão
prescritivista e gerencial da sustentabilidade, centrada em modelagens tecnicistas e
retoricamente defendidas como soluções para o problema da sustentabilidade, e
revela a força de um mainstream hegemônico e voltado para os interesses de
mercado no campo acadêmico. E essa suposição é reforçada pelo estudo
bibliométrico realizado por De Luca, Cardoso, Vasconcelos e Pontes (2014), que
abrangeu além dos trabalhos apresentados no EnANPAD, artigos publicados em
periódicos com conceito Qualis/Capes B2 para o triênio 2010-2012. Este estudo, em
síntese, demonstra que a produção científica brasileira em Administração sobre o
tema sustentabilidade, no período entre 2003 e 2010, preocupou-se com a criação
de modelos propostos pelos próprios autores analisados, principalmente no que
tange a formulação de métricas de avaliação e dimensionamento de impacto
socioambiental de ações organizacionais. Isto confirma a tendência dominante até
2013 de construção de modelos e frameworks de gestão da sustentabilidade, que
suportam a pretensa conciliação entre o interesse gerencialista e as questões
37

sociais e ambientais que emergem do debate público sobre sustentabilidade. Neste


sentido, a modelagem gerencialista é tida como uma fórmula mágica que soluciona
todos os problemas, e a sua simples prescrição é entendida como a saída definitiva
a estes problemas sociais e ambientais (VIZEU; MENEGHETTI; SEIFERT, 2012).

Sob a perspectiva crítica, apesar da grande quantidade de trabalhos sobre


sustentabilidade nos últimos cinco anos, pouco foi abordado no sentido de revelar as
contradições e estratégias discursivas associadas ao tema, ou sobre a
impossibilidade de reconciliação entre o interesse capitalista expresso nos modelos
gerencialistas e as questões de cunho social-coletivista e ambiental demandadas
pela sociedade civil organizada. Conforme apontado por Vizeu, Meneghetti e Seifert
(2012), esta reconciliação é ideologicamente definida pelo conceito do triple-bottom-
line e reproduzida pela mídia de massa e publicações institucionais de grandes
organizações.

Dentro do nosso levantamento, os três trabalhos de crítica direta ao discurso


da sustentabilidade 3 representaram aproximadamente 1% do volume total de
trabalhos sobre o tema levantados nos anais do EnANPAD para o período
pesquisado. Estes três trabalhos estiveram dedicados a descrever as contradições
apresentadas no conteúdo divulgado pelas organizações em seus relatórios de
sustentabilidade. Mais especificamente, os estudos estiveram focados em analisar
como o discurso da sustentabilidade é traduzido e internalizado na organização, e
em apontar as controvérsias internas deste discurso institucional.

Um ponto em comum em tais análises diz respeito a natureza retórica destas


construções discursivas. Desta maneira, em relação aquilo que se verifica na mídia
sobre as atividades ditas de sustentabilidade das organizações, há um elevado grau
de abstração e falta de clareza sobre a prática organizacional perante questões
ambientais e sociais empregadas nos relatórios de sustentabilidade.
3
Trabalhos de crítica ao discurso da sustentabilidadade que foram identificados no
levantamento: 1) Malacarne e Brunstein. A Atuação dos Think Tanks como Tradutores do
Desenvolvimento Sustentável no Ambiente Empresarial: Uma Análise a Partir da Desconstrução
de Derrida, 2014; 2) Silva e Reis. Sustentabilidade nos Discursos Organizacionais: Uma Luz no
Fim do Túnel ou Perfumaria?, 2011 e 3) Coelho e Godoi. Coerência entre o Discurso
Institucional e o Discurso Midiático sobre a Sustentabilidade, 2010.
38

Por exemplo, o estudo de Coelho e Godoi (2010), publicado nos anais do


EnANPAD e posteriormente na Revista de Gestão Social e Ambiental, conclui que
os relatórios corporativos de sustentabilidade, quando comparados entre si,
apresentam repetição de jargões, constituindo uma retórica que dificulta o
reconhecimento de identidade da própria empresa. Ainda observam as autoras
Coelho e Godoi (2010, p. 83) que “os relatórios representam um conjunto de regras
e conselhos, porém são pobres de ideias, no sentido pejorativo da retórica”.

Ao concluir o nosso breve levantamento de contextualização do entendimento


do mainstream da academia brasileira de Administração sobre a sustentabilidade,
ficou evidente que a grande maioria dos trabalhos apresentados no EnANPAD entre
os anos de 2010 e 2014 centralizaram a discussão da sustentabilidade como mais
um elemento passível de gerenciamento pelas organizações. A própria ênfase que é
dada a sustentabilidade em divisões como e ESO, GCT, GOL e Marketing (MKT)
sucinta a tendência de posicionar a sustentabilidade enquanto mais uma variável a
ser gerenciada, condicionando de forma maniqueísta esta problemática enquanto
uma questão de sucesso ou fracasso gerencial. Desta forma, o entendimento
dominante da academia é o de que a sustentabilidade é uma questão
exclusivamente de gestão corporativa, a mesma que, como alertam Vizeu,
Meneghetti e Seifert (2012), foi historicamente responsável pela emergência dos
graves problemas sociais e ambientais que suscitaram o debate da comunidade
global; em adição, a força da visão acadêmica é seu compromisso com o interesse
capitalista, já que a sustentabilidade corporativamente gerenciada pode alavancar os
resultados financeiros e econômicos das organizações.

Em síntese, considerar que a Academia Brasileira de Administração promove


uma visão hegemônica articulada com os interesses de mercado, verificada no
evento que representa o mainstream da área, significa dizer que há uma tendência
dominante em compreender que é possível enfrentar os dilemas modernos de
degradação ambiental e desigualdade social, trazidos pelo modelo
desenvolvimentista, a partir de padrões gerencialistas, tecnicistas e de mercado,
modelo este traduzido ideologicamente pela ideia da gestão dos pilares do triple-
39

bottom-line, o qual desconsidera os limites (hoje já escancarados) do modelo


capitalista de produção e consumo.

Desta forma, o presente estudo se posiciona em concordância com a


perspectiva que olha para a sustentabilidade como algo inatingível se não
modificados certos hábitos contemporâneos de produção e consumo, e sem uma
concordância racional sobre como modificá-los no curto prazo. Justamente por este
posicionamento, o principal intento do trabalho foi explorar o processo de construção
discursiva em um espaço de planejamento público participativo, compreendendo em
sua dimensão histórica e dialética as forças estruturais, atores e diferentes
interesses que são trazidos para o debate público e político em um espaço de fala
legitimo da sociedade civil.

2.2 SUSTENTABILIDADE E O FÓRUM PERMANENTE DA AGENDA 21 DO


PARANÁ: RESGATE HISTÓRICO

Conforme sugerido por Lima (2003), ao longo do tempo, o conceito de


sustentabilidade vem sendo construído por múltiplos atores sociais, a partir de
diferentes interesses e motivações. Essas interpretações por vezes concorrem entre
si por maior reconhecimento e legitimação nos espaços sociais públicos, uma vez
que ter o entendimento socialmente aceito sobre o que é, define como se pretende
agir, e esta ação, por sua vez, pode favorecer a certos interesses em detrimento de
outros. Por este motivo, a diversidade semântica da ideia de sustentabilidade é,
antes de tudo, uma questão de ordem política, e o processo de construção
conceitual deve ser evidenciado desta maneira (MATITZ; VIZEU, 2012, VIZEU;
MATITZ, 2014). Neste ponto, é importante evidenciar que o conceito mais
disseminado e utilizado pelos diferentes sujeitos sobre o domínio do tema é o de
desenvolvimento sustentável. Assim, é sobre esta noção que elaboramos a presente
seção.

Outro ponto abordado nesta seção diz respeito à revisão histórica do fórum
objeto do presente estudo - Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná -
considerando sua particular natureza política, ou seja, enquanto modelo de
40

planejamento público participativo. Este é um modelo de tomada de decisão política


comumente adotado no debate público da sustentabilidade, especialmente em
países de regime democrático como é o caso do Brasil, o qual vem adotando a
participação popular como instrumento de gestão pública desde a constituição
federal de 1988 (DE TONI, 2009).

2.2.1 A construção do discurso moderno sobre a sustentabilidade

Pode-se dizer que a sociedade moderna passou a ocupar-se de forma central


com questões ecológicas, especialmente sobre o possível esgotamento dos
recursos naturais, algumas poucas décadas após a era de ouro do capitalismo,
expresso pelo modelo desenvolvimentista estadunidense, onde presenciou-se o
boom econômico do pós-guerra (SACHS, 2000). Foi mais especificamente a partir
da secunda metade do século XX que grupos de ambientalistas, preocupados com a
degradação da natureza pelo modelo industrial, procuraram alertar a sociedade civil
e governos acerca da problemática ambiental.

A conferência Internacional para o Meio Ambiente, idealizada pela ONU,


sediada em Estocolmo, em 1972, marca o início de uma série de eventos
internacionais onde governos de vários países se reúnem para discutir temas
ambientais e mais recentemente o desenvolvimento sustentável. Ainda no mesmo
ano foi lançada a polêmica publicação “Limits to Growth”, elaborada por uma equipe
de pesquisadores do Massachusetts Institute of Technology – MIT e encomendada
pelo Clube de Roma, associação formada por empresários, cientistas e economistas
criada para refletir sobre problemas globais. Nesta publicação os pesquisadores
alertam para a impossibilidade da manutenção de recursos finitos para uma
população em constante crescimento (VIZEU; MENEGUETTI; SEIFERT, 2012).

Em 1987 a Comissão Mundial para o Meio Ambiente e Desenvolvimento da


ONU, liderada pela então primeira-ministra da Noruega Grö Harlem Brundtland,
publica o relatório “Our common future”. É principalmente a partir dos trabalhos
desta comissão que o conceito conciliatório de desenvolvimento sustentável - o
desenvolvimento que atende às necessidades presentes sem comprometer a
41

habilidade das gerações futuras em atenderem às suas próprias necessidades - se


torna conhecido e passa a ser disseminado nas diversas esferas da sociedade,
principalmente entre governos, ambientalistas e empresas (BOFF, 2012). Entretanto,
a semente deste conceito, anteriormente batizado de ecodesenvolvimento, foi
formulada pelo professor Ignacy Sachs ao final da década de 1970. Conforme Lima
(1997, p. 13), tal noção estava pautada nos seguintes principais fundamentos:

a) a satisfação das necessidades básicas da população; b) a solidariedade


com as gerações futuras; c) a participação da população envolvida; d) a
preservação dos recursos naturais e do meio ambiente em geral; e) a
elaboração de um sistema social que garanta emprego, segurança social e
respeito a outras culturas e f) programas de educação.

Depois de 20 anos da conferência de Estocolmo o Brasil sedia a Rio-92, Eco-


92 ou Cúpula da Terra. Esta conferência, que foi convocada pela Assembleia Geral
da ONU, teve como um dos principais resultados a aprovação do documento
Agenda 21, o qual estabeleceu um pacto pela mudança do padrão de
desenvolvimento global para o próximo século (BEZERRA e FERNANDES, 2000). A
conferência de Kyoto, ou Conferência das Partes, sediada pelo Japão em 1997,
resultou na assinatura do protocolo de Kyoto, um dos mais importantes marcos para
a prevenção do meio ambiente, através da definição de compromissos para a
redução da emissão de gases do efeito estufa (ACORDOS GLOBAIS, 2015).

Alguns anos depois de Kyoto, em 2002, aconteceu em Johanesburgo a


Conferência Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável, também chamada de
Rio+10. Nesta conferência os objetivos da Rio-92 foram reavaliados. Em 2007 as
metas do protocolo de Kyoto foram revistas durante a Conferência de Bali, quando
ficou acordado que em 2009, na Conferência de Copenhague, um novo acordo seria
proposto. Porém, em 2009 o acordo não foi aprovado pelos Estados Unidos,
segundo país que mais emite dióxido de carbono no mundo. Além disto, a China,
maior emissor mundial não está obrigada a seguir as regras do protocolo, pois foi
acordado que os membros do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul)
não teriam metas obrigatórias. Dois anos depois, em Durban, África do Sul, cento e
noventa nações se reuniram para decidir sobre a renovação dos termos do protocolo
42

de Kyoto. Nesta conferência foi decidido que as bases do protocolo seriam revistas
até 2015 para entrarem em vigor apenas a partir de 2020.

A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável ou


Rio+20, realizada em 2012, é a mais recente de uma série de conferências globais
que tiveram como principal objetivo deliberar e estabelecer acordos sobre o
desenvolvimento sustentável. Na Rio+20, mais de 45 mil participantes, dentre eles
chefes de governo e representantes da sociedade civil (ACORDOS GLOBAIS, 2015)
se reuniram para aprovar o documento “O futuro que queremos”, o qual salienta o
combate à pobreza como o maior desafio mundial ao atingimento do
desenvolvimento sustentável.

Outro importante marco histórico na marcha do pensamento


desenvolvimentista da sustentabilidade emergiu de um esforço diretamente
vinculado ao setor privado. Nos anos 90 o consultor John Elkington criou o modelo
de sustentabilidade adotado atualmente por grandes corporações, o triple-bottom-
line ou 3BL (Profit, People, Planet). Este conceito defende que, para ser sustentável,
a atividade corporativa deve ao mesmo tempo produzir lucros, ser socialmente justa
e ambientalmente correta. Nos relatórios de sustentabilidade as organizações
relatam que suas atividades estão amparadas nas definições do 3BL, as quais são
chanceladas e difundidas por entidades mundiais ligadas ao UNEP, como é o caso
da Global Report Initiative (GRI).

Nestes documentos, percebe-se o discurso organizacional como instrumento


de legitimação de práticas organizacionais utilitaristas, amparadas nos fundamentos
do capitalismo contemporâneo. Conforme Lara (2015, p. 51):

As organizações buscam institucionalizar este discurso conciliatório, e o


reproduzem de forma a legitimar suas ações na sociedade, amenizando o
conflito entre os interesses contraditórios de justiça social, preservação
ambiental e do capital.

A despeito de todas as críticas empreendidas sobre a legitimidade e lógica do


conceito de desenvolvimento sustentável, atualmente proferidas em um momento
em que os malefícios ambientais e sociais já são sentidos pela população mundial, a
43

noção de desenvolvimento sustentável pode ser julgada principalmente na sua


pretensão conciliatória. A verdade sobre este conceito é disputada por dois grupos:
aqueles que defendem o ideal desenvolvimentista onde o crescimento econômico é
a fonte inesgotável e incontestável de saúde e vitalidade social e aqueles que
negam a possibilidade de o ideal desenvolvimentista servir simultaneamente ao
modelo capitalista de produção e a manutenção dos recursos ambientais e da
igualdade social. Conforme observado por Vizeu, Meneguetti e Seifert (2012, p. 579),
“na medida em que procura preservar a natureza sem reconhecer a prerrogativa de
limitar o consumo e a expansão econômica das organizações (...), a lógica
dominante do desenvolvimento sustentável torna-se uma impossibilidade”.

Neste sentido, uma das principais contradições inerentes ao conceito de


desenvolvimento sustentável é a de que, para haver desenvolvimento econômico, as
organizações devem crescer em tamanho e resultados. Esta orientação, identificada
pelos mesmos autores como a ideologia do crescimento, está fundamentada na
premissa de que ao crescer e progredir seria possível solucionar de forma
generalizada os problemas que afligem a sociedade (SEIFERT e VIZEU, 2015).

Neste sentido, o desenvolvimento econômico se apresenta como solução aos


problemas de ordem ambiental e social. Porém, conforme explica Leonard (2010),
uma forma direta de se contestar o crescimento econômico é refletir sobre a não
distinção das iniciativas que melhoram a vida (como um investimento em transportes
públicos) das que pioram (como a construção de um imenso incinerador). Esse
problema é tomado de tal maneira que, ao não se preocupar em ser seletivo e
colocando o crescimento econômico acima da consciência coletiva sobre uma forma
concretamente sustentável de vida, o discurso organizacional ignora limites
evidentes: uma vez que se todas as organizações almejarem crescer, por certo não
haverá recursos suficientes no planeta para tal feito (VIZEU; MENEGHETTI;
SEIFERT, 2012).
44

2.2.2 Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná: contexto histórico de um


instrumento de planejamento público participativo

A Agenda 21 tem sua origem na Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento ou Rio-92. Foi criada como um termo de
compromissos sobre o desenvolvimento de sociedades sustentáveis, supostamente,
expressando o desejo de mudança do atual modelo de civilização para outro que
predomine o equilíbrio ambiental e a justiça social (BEZERRA e FERNANDES,
2000). Os esforços desta conferência resultaram em um instrumento de
planejamento, por meio do qual as nações signatárias se comprometem em facilitar
os processos de construção das Agendas 21 nacionais e locais.

Assim sendo, para reconstruir a história da origem e consolidação do Fórum


Permanente da Agenda 21 do Paraná é preciso, além de contextualizá-lo no cenário
onde nasce o documento global, remontar a tentativa, por parte do governo
brasileiro, de efetivar um modelo participativo de gestão da Agenda 21 que
reconhecesse a importância dos vários setores da sociedade no processo de
planejamento e elaboração de políticas públicas relativas a sustentabilidade.

Em 1997, cinco anos após a Rio-92, foi instaurada no governo Fernando


Henrique Cardoso a Comissão de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável e
Agenda 21 Nacional – CPDS, entidade cujo principal objetivo é o de coordenar a
elaboração e a implementação da Agenda 21 brasileira 4 , bem como auxiliar a
elaboração das Agendas 21 estaduais.

Durante os cinco anos em que o documento brasileiro levou para ser


elaborado, período denominado de primeira fase da Agenda 21 brasileira, a
prerrogativa era que vários setores da sociedade fossem envolvidos em processos
de consulta pública, tanto para a aprovação das temáticas que deveriam compor o
teor do documento, como para sugerir as diretrizes e planos de ação que deveriam
ser implementados em busca do desenvolvimento sustentável no país.

4
Documento assinado em maio de 2002.
45

Em 2003, a Agenda 21 brasileira entra na fase de implementação, coincidindo


com a posse do presidente Luíz Inácio Lula da Silva. No governo Lula, a Agenda 21
passa a ser considerada um elemento integrante do plano plurianual do governo,
com o propósito de adquirir capilaridade e penetrar as esferas estaduais e
municipais. Conforme carta de apresentação ao documento de consolidação das
ações prioritárias da Agenda 21, redigida pela então ministra do meio ambiente,
Marina Silva (COMISSÃO DE POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL E DA AGENDA 21 NACIONAL, 2004):

Integração e participação são palavras-chave na Agenda 21 sem as quais


nos perdemos na retórica, nas intenções. No caso da Agenda 21 Brasileira
sabemos que implementá-la é um desafio que implica uma série de
mudanças nos padrões vigentes e nos hábitos culturais arraigados nos
diferentes setores de nossa sociedade.

Como pode ser observado no discurso do representante do governo brasileiro,


a Agenda 21 foi expressada como sendo uma questão que depende de soluções
integradas por parte das esferas federal, estadual e municipal, além de prescindir do
envolvimento do setor privado e da sociedade civil organizada.

Para cumprir com a finalidade de estabelecer as Agendas 21 locais, o


governo federal criou a Rede Brasileira de Agendas 21 locais (REBAL), cujo objetivo
é articular os processos locais de Agenda 21, envolvendo os diversos setores da
sociedade, do segmento empresarial e governos locais, em todas as cinco regiões
do país (AGENDA 21 PARANÁ LINKS RECOMENDADOS, 2015). Segundo o
Ministério do Meio Ambiente, a Agenda 21 é considerada concomitantemente um
processo e um instrumento de planejamento participativo para o desenvolvimento
sustentável em determinado território (AGENDA 21 BRASILEIRA, 2015).

No Estado do Paraná, a Agenda 21 começa a ser esboçada a partir de 2001,


quando no governo Requião acontecem os primeiros debates sobre o tema, e no
ano seguinte, em 2002, é instituída uma Comissão Governamental visando à
elaboração da Agenda 21 Paranaense, assim como as articulações necessárias
para a instalação de um fórum estadual para a Agenda 21. O Fórum Permanente da
Agenda 21 do Paraná é então criado pelo decreto 2.547, de 4 de fevereiro de 2004,
e ao longo dos onze anos de sua existência oficial e nos três anos que antecederam
46

sua criação, além das reuniões deliberativas e dos Grupos de Trabalho Temáticos
(GTT), as seguintes ações foram realizadas:

Tabela III: Ações da Agenda 21 do Paraná


Ano

Ação

 Foi organizado um debate entre representantes do governo e da sociedade


2001

civil organizada Paranaense, com a finalidade de se definir estratégias e


ações a serem priorizadas; ocasião em que o Governo do Estado, por meio
da SEMA, assume, oficialmente, o compromisso de coordenar e
implementar a Agenda 21 no Paraná.
 Instituiu-se a Comissão Governamental visando à elaboração da Agenda 21
Paranaense e as articulações necessárias para a instalação do Fórum
Estadual para a Agenda 21, tendo em vista a garantia da participação dos
diferentes segmentos da sociedade.

 Foram realizados quatro “Seminários Macrorregionais da Agenda 21


2002

Paraná” no mês de agosto, sendo dia 15 em Foz do Iguaçu, dia 20 em


Maringá, dia 22 em Londrina e dia 05 de setembro em Curitiba, nos quais
os participantes foram estimulados a apresentar propostas de ação. A partir
desses eventos foram definidos nove Temas Norteadores: Agricultura
Sustentável, Segurança Nutricional, Gestão Social e Terceiro Setor,
Biodiversidade, Gestão dos Recursos Hídricos, Diversidade Espacial e
Integração Regional, Direitos Humanos, Produção Científica e Tecnológica
e Padrões de Produção e Consumo.
 Por meio do Decreto Governamental 2547, de 04 de fevereiro de 2004, foi
2004

instituído o Fórum Permanente da Agenda 21 Paraná, sob a perspectiva da


construção de metas e estratégias do desenvolvimento sustentável para o
Paraná.
 Os temas norteadores passaram a ser os seguintes: Agricultura
Sustentável/Agroecologia, Segurança Alimentar e Nutricional, Gestão Social
2006

e Terceiro Setor, Biodiversidade, Gestão dos Recursos Hídricos,


Diversidade Espacial e Integração Regional, Direitos Humanos e de Todas
as Formas de Vida, Produção Científica e Tecnológica, Padrões de
Produção e Consumo e Educação.
 Assinatura do “Pacto 21 Universitário”, que estabeleceu um compromisso
2007

firmado entre Universidades e Instituições de Ensino Superior (IES) na


busca de alternativas sustentáveis, cuja viabilização se daria por meio do
ensino, da pesquisa, da extensão e de ações.
 Realização do Seminário Internacional “Experiências de Agendas 21: Os
Desafios do Nosso Tempo”, ocorrido em novembro de 2009, em Ponta
Grossa – PR, que reuniu 562 participantes, representativos de 06 países,
2009

15 estados do Brasil, 92 cidades brasileiras, que elaboraram metas


prioritárias de curto, médio e longo prazo, a serem viabilizadas nos anos de
2010, 2015 e 2021, respectivamente.
 Construiu-se o documento “Guia Agenda 21 Empresarial”.
2010

 Criado, em dezembro, o Grupo de Trabalho para a Rio+20.


47

Ano
Ação

 O Fórum Permanente da Agenda 21 Paraná, com base nos dez temas


2011

norteadores, organizou-se em dez Grupos Temáticos de Trabalho – GTT,


que passaram a se reunir sistematicamente durante todo o ano.

 Instalação, em março, do “Comitê Paranaense para a Conferência das


Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável – Rio+20”.

 Com o intuito de ampliar e democratizar esse processo participativo foram


2012

realizadas reuniões por segmento integrante do Comitê (ONGs,


Movimentos Sociais, Trabalhadores, Comunidade Acadêmica, Setor
Empresarial e Setor Governamental) e aberta uma consulta pública,
disponibilizada a todo (a) cidadão (ã), via Internet, que resultou em
inúmeras reflexões e propostas, as quais, após submetidas a plenárias de
aprovação, se encontram sistematizadas no documento “Paraná o Futuro
que Queremos”.
 Realização de seis encontros regionais “A Agenda 21 no Movimento
Social”, com a participação de 245 pessoas, através da demanda gerada
pelo GTT Gestão Social e Terceiro Setor.

 Criação da Comissão Organizadora Estadual – COE da Conferência


2013

Agenda 21 Paraná, formada por integrantes do Fórum.

 Realinhamento dos temas norteadores, que passam a ser os seguintes:


Direitos Humanos e de Todas as Formas de Vida; Padrões de Produção e
Consumo; Recursos Naturais e Biodiversidade; Infraestrutura e Integração;
Pesquisa, Inovação, Ciência e Tecnologia; Governança e Empoderamento.
 Realização de seis reuniões da COE – Comissão Organizadora da
Conferência Agenda 21 Paraná.

 Realização de nove Conferências livres por instituições membros do Fórum


(IHGPR – Instituto Histórico e Geográfico do Paraná, UFPR, UTFPR, UEL,
2014

CREA – PR, Cead Poty Lazarotto, SEIL, SVB – Sociedade Vegetariana


Brasileira).

 Lançamento, no site da SEMA, da Consulta Pública Agenda 21 Paraná, no


processo de realização da Conferência Agenda 21 Paraná, período de
25/04 a 31/05.
 Criação do Grupo de Trabalho ODS – Objetivos do Desenvolvimento
Sustentável.
2015

 Realização de seis oficinas temáticas de acordo com os temas norteadores


da Agenda 21 Paraná, para revisão do texto-base do documento Agenda 21
do Paraná.

Fonte: Adaptado de MEIO AMBIENTE (2015) e memória da 58º Reunião Ordinária do Fórum.

Conforme o documento que legalmente o constitui, o fórum foi concebido para


ser o espaço multisetorial responsável pela elaboração e gestão da Agenda 21
48

Paranaense, e é composto por representantes do governo, iniciativa privada,


universidades, sindicatos, ONGs e sociedade civil do Paraná. Desde sua criação,
este fórum é coordenado por um representante da SEMA. A gestão da primeira
coordenação ocorreu entre os anos de 2004 a 2010, e na troca do governo Requião
pelo governo Beto Richa, uma nova gestão assume e se mantém até o presente
momento. Com exceção da função de coordenador, as atividades dos demais
membros do fórum não são remuneradas. As tabelas III e IV demonstram a
composição do fórum quando da sua criação e a vigente em agosto de 2014.

Tabela IV: Composição do Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná na


sua criação
Casa Civil Companhia Paranaense de Energia – COPEL
Companhia de Saneamento do Paraná –
Procuradoria Geral do Estado
SANEPAR
Secretaria de Estado da Administração e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária –
Previdência EMBRAPA
Secretaria de Estado da Agricultura e do
Federação da Agricultura do Estado do Paraná
Abastecimento
Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Federação das Associações Comerciais Industriais
Superior e Agropecuárias do Paraná
Federação das Associações de Moradores do
Secretaria de Estado da Comunicação Social
Paraná
Secretaria de Estado da Cultura Federação Estadual dos Excepcionais
Secretaria de Estado do Desenvolvimento Urbano Federação das Indústrias do Estado do Paraná
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do
Secretaria de Estado da Educação
Estado do Paraná
Secretaria de Estado da Fazenda Fórum das Entidades Negras
Secretaria de Estado da Indústria, Comércio e Assuntos
Fundação Nacional do Índio – Paraná
do Mercosul
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania
Recursos Naturais Renováveis – IBAMA
Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos
Instituto de Engenharia do Paraná
Hídricos
Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e
Secretaria de Estado de Obras Públicas
Qualidade Industrial – INMETRO
Secretaria de Estado do Planejamento e Coordenação
Itaipú Binacional
Geral
Ministério Público -
Secretaria de Estado da Saúde Centro de Apoio Operacional às Promotorias
Movimentos Sociais
Secretaria de Estado da Segurança Pública Proteção ao Meio Ambiente
Secretaria de Estado dos Transportes OAB – Ordem dos Advogados do Brasil – Paraná
Secretaria de Estado do Trabalho Emprego e
ONGs Ambientais
Promoção Social
Secretaria de Estado do Turismo ONGs Sociais
Secretário Especial para Assuntos Estratégicos Organização das Cooperativas do Estado do
49

Paraná
Secretário Especial para Assuntos da Região
Pastoral da Criança
Metropolitana de Curitiba
Representação Sul do Conselho Nacional do
Secretário Especial de Corregedoria e Ouvidoria Geral
Meio Ambiente
Secretário Especial de Relações com a Comunidade Sindicatos
Assembleia Legislativa do Estado do Paraná União dos Estudantes Secundaristas
Associação Comercial do Paraná União Paranaense de Estudantes
Universidades Federais, Privadas e Institutos de
Associação dos Municípios do Paraná
Pesquisa
Associação Paranaense de Instituições de Ensino
Outros órgãos e instituições
Superior do Paraná
Centrais dos Trabalhadores

Fonte: Decreto 2.547, de 4 de fevereiro de 2004.

Tabela V: Composição do Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná em


Agosto de 2014
INSTITUIÇÕES GOVERNAMENTAIS – INSTITUIÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS -
ESTADUAIS continuação
Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do
– BRDE Paraná - CREA-PR
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária -
Casa Civil do Paraná
EMBRAPA Florestas
Companhia de Saneamento do Paraná - SANEPAR Evildia Consultoria Ambiental
Federação da Agricultura do Estado do Paraná –
Companhia Paranaense de Energia - COPEL
FAEP
Instituto de Pesos e Medidas do Estado do Paraná - Federação das APAEs do Estado do Paraná -
IPEM/PR FEAPAES/PR
Instituto Paranaense de Desenvolvimento Federação das Associações Comerciais e
Econômico e Social – IPARDES Empresariais do Paraná - FACIAP
Instituto das Águas Paraná Federação das Indústrias do Paraná - FIEP
Federação dos Trabalhadores nas Indústrias da
Procuradoria Geral do Estado – PGE Construção e do Mobiliário do Estado do Paraná -
FETRACONSPAR
Secretaria de Estado da Agricultura e do
Força Sindical do Paraná
Abastecimento – SEAB
Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e
Fórum Permanente da Agenda 21 de Araucária
Ensino Superior – SETI
Secretaria de Estado da Comunicação Social – Fundação João José Bigarella - FUNABI: Roberto
SECS Gava
Secretaria de Estado da Cultura - SEEC Fundação Nacional do Índio - FUNAI
Instituto de Arquitetos do Brasil - Departamento do
Secretaria de Desenvolvimento Urbano – SEDU
Paraná
Secretaria de Estado da Educação - SEED Instituto de Engenharia do Paraná - IEP
Secretaria de Estado do Esporte e do Turismo –
Instituto de Estudos Ambientais - Mater Natura
SETU
Secretaria de Estado da Fazenda - SEFA Instituto Histórico e Geográfico do Paraná - IHGPR
Secretaria de Estado da Indústria, do Comércio e
Itaipu Binacional
Assuntos do Mercosul – SEIM
50

INSTITUIÇÕES GOVERNAMENTAIS – INSTITUIÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS -


ESTADUAIS continuação
Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania –
Mandato Deputado Rasca
SEJU
Secretaria de Estado da Saúde - SESA Movimento Nós Podemos Paraná
Secretaria de Estado da Segurança Pública -
Movimento SOS Bicho
Departamento da Polícia Civil
Secretaria de Estado de Infraestrutura e Logística –
Nova Central dos Trabalhadores do Paraná
SEIL
Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Organização Ambiental Sócio Agro Arte Cultural
Hídricos – SEMA Brinque e Limpe
Secretaria Especial de Corregedoria e Ouvidoria
Organização das Cooperativas - OCEPAR
Geral
Serviço Social Autônomo Paranacidade Ordem dos Advogados do Brasil - OAB/PR
INSTITUIÇÕES GOVERNAMENTAIS –
Pastoral da Criança
MUNICIPAIS
Sindicato da Indústria da Construção Civil no
Prefeitura Municipal de Almirante Tamandaré
Estado do Paraná - SINDUSCON/PR
Sindicato Estadual dos Servidores Públicos da
Municipal de Castro Agricultura, Meio Ambiente, FUNDEPAR e Afins -
SINDI/SEAB
Sociedad Peatonal - Mobilidade Urbana
Prefeitura Municipal de Colombo
Sustentável
Prefeitura Municipal de Pontal do Paraná Sociedade Global
INSTITUIÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS Sociedade Vegetariana Brasileira - SVB
Assembleia Legislativa do Estado do Paraná - ALEP TIM Celular S.A.
Associação Ambientalista Ecoforça União Brasileira de Mulheres – Seção Curitiba
Associação de Ciclistas do Alto Iguaçu –
CICLOIGUAÇU INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR – IES
Associação dos Protetores de Áreas Verdes de
Faculdade Evangélica do Paraná - FEPAR
Curitiba e Região Metropolitana - APAVE
Pontifícia Universidade Católica do Paraná –
Associação Comercial do Paraná - ACP
PUCPR
Associação Paranaense das Instituições de Ensino
Universidade Estadual de Londrina - UEL
Superior Público – APIESP
CEAD Pólo Potty Lazarotto Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG
Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil Universidade Estadual do Centro Oeste do Paraná
- CTB/PR - UNICENTRO
Centro de Estudos, Defesa e Educação Ambiental –
Universidade Federal do Paraná - UFPR
CEDEA
Universidade Tecnológica Federal do Paraná –
Conselho Estadual de Saúde do Paraná - CES
UTFPR
Conselho Estadual do Meio Ambiente - CEMA Universidade Tuiuti do Paraná - UTP

Fonte: COMPOSIÇÃO DO FÓRUM PERMANENTE DA AGENDA 21 PARANÁ (2015).

De acordo com o decreto de criação e outros documentos oficiais, o objetivo


principal do fórum consiste em organizar encontros locais e regionais, seja na forma
de reuniões de GTT ou de plenárias deliberativas, workshops, oficinas e seminários,
promovendo debates por parte dos membros e da sociedade sobre ideias,
51

sugestões e propostas sobre o desenvolvimento sustentável do Estado. Seguindo a


lógica do passo-a-passo para a elaboração de uma Agenda 21 local, o fórum já
concluiu os passos de um a três e agora está na fase de elaboração do PLDS.

A elaboração do texto-base do plano consiste na revisão, seja por parte dos


membros ou da sociedade, através do processo de consulta pública, do conteúdo de
todos os documentos já produzidos pelo fórum desde 2004, a saber: “o que o
Paraná tem feito: ações propostas pelo estado do Paraná vinculadas aos princípios
da Agenda 21”, de 2009; “Pacto Paraná sustentável”, de 2010; e “Paraná: o futuro
que queremos”, de 2012. Cabe ressaltar que este último documento foi elaborado
para ser o posicionamento do estado do Paraná frente aos principais eixos da
Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável - Rio+20, e
teve a participação de vários segmentos da sociedade por meio das atividades do
Comitê Paranaense para a Rio+20, que consistiram em reuniões presenciais de um
grupo ativo de setenta e oito pessoas, as quais representavam sessenta e quatro
instituições, reuniões regionais e uma consulta pública virtual. Pelo processo de
consulta pública foram recebidas trinta e nove sugestões de Universidades, ONGs,
estudantes, prefeituras e cidadãos comuns, as quais foram submetidas à aprovação
do fórum e posteriormente incluídas no documento Paraná: o Futuro que Queremos.

A revisão do texto base do PLDS ou do documento Agenda 21 do Paraná, os


quais assumem o mesmo significado para fins desta pesquisa, é a principal atividade
vigente do fórum, a qual está sendo conduzida desde 2014, e tem por base uma
dinâmica que considera as avaliações e propostas segregadas por temas
norteadores. A metodologia empregada para a revisão do texto-base consiste em
descrever as premissas, o diagnóstico (situação atual), desafios, obstáculos e
propostas para cada problemática e eixo temático dos temas norteadores. Neste
processo, os GTT reúnem-se para sugerir tópicos a serem incluídos ou excluídos,
assim como para redigir novas propostas. Nas reuniões ordinárias, as alterações
propostas nos GTT são deliberadas para aprovação, é realizada a atualização sobre
eventuais outras atividades conduzidas no período, bem como são planejadas as
52

atividades futuras do fórum. Desde 2013 os temas norteadores estão organizados


conforme a seguir:

Tabela VI: Temas norteadores da Agenda 21 do Paraná

Tema Enfoque

1. Direitos Humanos e de Voltado ao cumprimento das necessidades dos seres humanos,


Todas as Formas de Vida tratando de temas como alimentação, moradia, saúde, educação,
segurança, cultura, lazer, redução da pobreza, combate a toda
forma de preconceito e discriminação, estendendo aos demais
seres os direitos fundamentais tais como liberdade, não exploração
e trato digno.

2. Padrões de Produção e Enfoque na atividade econômica em conformidade com os três


Consumo setores da economia: setor primário, setor secundário e setor
terciário, incluindo também o marketing, a publicidade e a
propaganda. Envolve também a defesa dos direitos do consumidor,
a informação e a educação para o consumo consciente e
responsável.

3. Recursos Naturais e Contempla a questão ambiental em si ao tratar do ar, água, solo,


Biodiversidade fauna, flora e dos ecossistemas, estabelecendo conservação,
preservação dos ambientes naturais, recuperação e melhoria dos
ambientes degradados, poluídos e contaminados.

4. Infraestrutura e Integração Trata de questões como energia, transporte, comunicações,


saneamento, mobilidade, planejamento urbano, ou seja, como
estruturar o desenvolvimento sustentável nas diversas bases
territoriais buscando a integração e a diminuição das
desigualdades regionais.

5. Pesquisa, Inovação, Contempla todas as iniciativas que tem por objetivo alavancar o
Ciência e Tecnologia desenvolvimento sustentável.

6. Governança e Abrange todas as tratativas da gestão pública, do planejamento, da


Empoderamento responsabilização de cada segmento da sociedade e da forma de
participação de cada grupo específico.

Fonte: Adaptado de TEMAS NORTEADORES (2015).


53

O processo de convocação das reuniões e outros encontros que é conduzido


pela coordenação e consiste no envio de e-mail aos representantes das entidades
que compõem o fórum, com base em seus instrumentos formais de constituição
(decreto) e atualizações posteriores (atas de reuniões ordinárias). Os encontros são
realizados na sede da SEMA, sendo que eventuais encontros regionais são
conduzidos em outros municípios do estado. A periodicidade das reuniões ordinárias
passou a ser trimestral a partir de 2015, conforme deliberações da 58º reunião
ordinária. Os GTT e outros formatos de encontros têm periodicidade variada,
conforme as demandas de suas atividades específicas. As reuniões ordinárias,
oficinas, seminários e demais encontros são conduzidos pela coordenadora
executiva do fórum e os GTT reúnem-se sob o comando de um coordenador
temático, o qual é o mesmo para todos os temas norteadores. As pautas das
reuniões são definidas pela coordenação e compartilhadas previamente por e-mail
com os convocados.

É na sua prerrogativa de servir de instrumento de planejamento público


participativo que se aventa a possibilidade do Fórum Permanente da Agenda 21 do
Paraná ser, à luz da teoria habermasiana, um espaço público onde o discurso da
sustentabilidade pode ser racionalmente construído com fundamentos na orientação
ao entendimento mútuo entre seus participantes, para posteriormente ser repassado
às instituições parlamentares formais. Segundo Habermas, o espaço público
representa uma camada de formação de opinião situada entre cidadãos e
organizações e as instituições legislativas, oferecendo a oportunidade do
atingimento acordos fundamentados no pressuposto do entendimento livre de
pressões dos sistemas mercado e Estado. Segundo observa Lubenow (2010, p.
236) “a esfera pública é uma “estrutura intermediária” que faz a mediação entre o
Estado e o sistema político e os setores privados do mundo da vida”. O elemento
teórico espaço público está descrito na seção 2.4.9.

2.3 A VIRADA LINGUÍSTICO-PRAGMÁTICA E O ENFOQUE DISCURSIVO

A ideia de virada linguístico-pragmática indica um movimento na filosofia e


ciências sociais que elenca como aspecto central de compreensão da vida humana
54

e da esfera social a questão da linguagem e do processo de comunicação. Com a


virada linguístico-pragmática, concepções como razão e existência são
compreendidas a partir da ideia de que a realidade é construída a partir da interação
dos sujeitos com o mundo, por meio da linguagem. Assim, pensar sobre a linguagem
é refletir sobre algo anterior aos pensamentos sobre razão e existência.

Segundo Bastos e Candiotto (2007, p. 16), “a linguagem é o modo de ser do


pensamento, é a sua realização no plano da expressão”, ou seja, o que
expressamos no mundo segue a ordem da linguagem e o que observamos do
mundo também. A lógica de que a linguagem é constitutiva da realidade pressupõe
que não há verdade absoluta, pois, a realidade é dinâmica e depende de elementos
como contexto, cultura e história. Conforme Habermas (2001, p. 190) “após a virada
linguística, o conceito mentalista de uma razão centrada no sujeito foi substituído
pelo conceito destranscendentalizado de razão situada (situierte vernunft) ”. Ou seja,
a razão não pode mais ser compreendida de forma alheia a linguagem e todos os
elementos que a constitui. Conforme Araújo (2004, p. 28), “não há uma mente ou
razão soberana, mas um esforço das ideias e da linguagem para chegar ao
conhecimento das coisas”. A filosofia da linguagem promove a possibilidade do
desatar de alguns nós que até então não eram compreendidos; apresenta função
terapêutica no sentido de que oferece outros meios de compreender a realidade e
oportuniza que as questões filosóficas sejam refletidas sobre o prisma da linguagem.

Virada linguística é uma expressão que foi usada pela primeira vez no início
do século XX pelo filósofo do círculo de Viena, Gustav Bergmann, e que foi
consagrada por Richard Rorty, na coletânea The Linguistic Turn, de 1967
(MARCONDES, 2009). A virada linguístico-pragmática tem dois momentos. No
primeiro, o da virada linguística, enfatiza-se o fato de que o ser humano pode
acessar a realidade pela linguagem, numa condição de paralelismo, onde a verdade
é espelhada e reflete a realidade, ou seja, não é acessada em si mesma. Nesta
concepção, aquilo que os seres linguísticos acessam é a verdade pela linguagem.
Ou seja, a linguagem é a verdade em si, pois não se conhece nada se não por meio
do emprego da linguagem.
55

Ora, se a linguagem representa a verdade sobre os objetos, fatos e sujeitos, o


esforço deste primeiro momento foi o de explorar a estrutura da linguagem e
desenvolver uma lógica que pudesse dar conta de expressar e explicar a realidade.
Na obra ‘Tratado Lógico Filosófico’, a qual resume o primeiro momento da virada
linguística, Wittgenstein, fiel a tradição ocidental da filosofia analítica, define um
campo lógico formal de fundamentos estruturais da linguagem como funções
sintáticas e morfológicas que seriam capazes de representar fidedignamente a
realidade. Conforme exposto por Oliveira (2006, p. 12) “na virada linguística a
linguagem passa de objeto de reflexão filosófica para a esfera de fundamentos”.
Percebe-se que, a partir desse momento, a linguagem passa a ocupar um lugar
central na filosofia moderna.

Um segundo momento da virada se refere a ideia de pragmática. Assim, a


virada pragmática acontece dentro da virada linguística, representando o momento
em que estudiosos passam a valorizar a linguagem enquanto ação, e, segundo
Marcondes (2009, p. 11), enquanto “constituidora do significado da experiência
humana”. O entendimento central desta corrente é que a ação no mundo se dá na e
pela linguagem, e o interesse passa a ser sobre a linguagem em ação. E é essa a
ideia geral do que significa a pragmática.

A premissa da fase da pragmática na virada linguística é o fato de que, para


compreender a vida humana em sua esfera social, é preciso entender a relação
entre linguagem e construção social. Neste sentido, em relação a fase anterior,
pensadores desta corrente observam que o esforço de transformar a linguagem em
códigos capazes de decifrar a realidade não apresentou grandes resultados, ou ao
menos não deu conta de explicar a linguagem em todos os seus domínios, pois
elementos como cultura, história e social escapam a uma análise fria e formal-
estrutural da linguagem. Para ilustrar esta questão, cabe refletir que por certo que a
linguagem somente arranha conceitos abstratos como morte e fé por exemplo, mas
não os explica plenamente.

Assim, em Investigações Filosóficas, obra póstuma de Wittgeinstein, a lógica


equacional da linguagem como solução a questão do entender a realidade é negada
56

e reflexões sobre a linguagem em uso e sua influência na própria construção da


realidade são sugeridas, oferecendo a semente para uma nova forma de
compreender a linguagem, agora em sua dimensão de ação social.

A virada pragmática iniciou com Austin e Searle, com a teoria dos atos de fala,
e Habermas dá sequência a esta perspectiva com sua teoria do agir comunicativo
(ARAÚJO, 2004). A questão primordial para estes filósofos é refletir como a
linguagem é usada, o que se intenciona fazer com a linguagem e seu efeito no
estado das coisas por meio dos atos de fala ou proferimentos. Para tanto, se faz
necessário compreender o uso da fala em eventos interacionais e quais são os
elementos que influenciam e constituem o uso da linguagem enquanto instrumento
do agir social.

Na virada pragmática o elemento da intersubjetividade é fundamental, pois


representa a conexão entre as noções de mundo dos sujeitos e constitui o elo que
possibilita a construção compartilhada de sentidos em um evento comunicacional.
Conforme Araújo (2004, p. 25), “é preciso supor que as marcas das nossas ideias
correspondem às marcas das ideias dos outros para haver compreensão”. Ainda,
conforme Aragão (2006), analisar a razão sem considerar a interação comunicativa é
um evento unilateral, pois a razão intersubjetiva é fundamental para uma completa
compreensão sobre temas filosóficos e sociais.

Ou seja, a virada linguístico-pragmática tem papel fundamental em conceber


um olhar mais abrangente, o qual considera não apenas as funções do emissor e
receptor, mas todo o curso da interação comunicativa, assim como a influência do
contexto social e histórico, bem como as intenções dos sujeitos envolvidos enquanto
seres comunicativos, que agem no mundo por meio da fala.

O discurso enquanto dimensão da linguagem acompanha a virada pragmática


e as teorias sociais que explicam a prática social. Segundo Araújo (2004, p. 10),
“compreendendo a efetivação do dizer, (o discurso) tem valor de força social, política
e do entendimento mútuo”; este representa a dimensão da linguagem que constrói
57

as relações e fatos sociais, e atravessando os sujeitos ao longo das suas vidas,


torna-se a norma social vigente em dada comunidade.

Conforme Araújo (2004), os estudos sobre discurso podem ser divididos em


três grandes momentos: i) como propósito imediato da comunicação (Mondala e
Dubois), ii) como prática social (Foucault) e iii) como forma privilegiada do agir social
(Habermas). O discurso contempla um contexto para além da instância comunicativa,
significando o agregado de mensagens e situações sociais que permeiam a vida em
sociedade e que fazem parte do conjunto de experiências individuais e
compartilhadas, que entram em cena toda vez que o sujeito age sobre algo no
mundo.

Habermas acompanha muitos dos elementos teóricos presentes nos


trabalhos precedentes da virada pragmática. Como sugerido por Aragão (2006, p.
25), “fiel à tradição filosófica ocidental, Habermas também vai ocupar-se com o tema
da razão, embora não mais através do conhecimento e da ação e sim através da
linguagem”. Desta forma, Habermas se apoia nos elementos da pragmática –
linguagem, mundo e os participantes de uma comunidade linguística (ARAGÃO,
2006) para sugerir uma possível saída para a volta ao humanismo por meio do
controle da ação estratégica pela ação comunicativa. Para Habermas, é na ação
comunicativa que se estabelece a possibilidade do alcance de entendimento dentro
do próprio sistema (ARAÚJO, 2004).

No que se refere a área de Administração, podemos dizer que estudos que


estão amparados na filosofia da linguagem tem sua origem no início dos anos 2000.
A base destes estudos está em compreender a comunicação enquanto constituinte
da realidade humana nas organizações (MARCHIORI, 2010). Assim sendo, e de
acordo com a filosofia da linguagem, a organização existe e é re-significada pela
linguagem, assim como todos os outros fatos sobre o mundo. Estudos sobre jogos
de linguagem e hierarquia organizacional são exemplos de que o foco desta corrente
teórica está em compreender como a linguagem dá condições para a produção de
sentido e para a condução de análises sobre questões valorativas e sociais nas
organizações.
58

Inicialmente, os estudos em Administração que adotavam a perspectiva


pragmático-linguística estavam amparados em epistemologias positivistas,
preconizando a linguagem e a comunicação como ferramentas, uma espécie de
instrumento que soluciona as questões organizacionais (MARCHIORI, 2010). Apesar
deste viés inicial, a linguagem e a comunicação passaram gradativamente a serem
tratadas como algo mais complexo e profundo, passando, assim, a ter um lugar
central nos estudos organizacionais, avançando para além dos trabalhos científicos
dentro do paradigma funcionalista há cerca de quinze anos. Ainda, segundo
Alvesson e Kärreman (2000, p. 147, tradução livre), “a virada linguística é de
interesse para análises organizacionais em dois níveis: o de campo de trabalho e o
de análise”, pois entende-se que a linguagem é empregada nos trabalhos científicos
tanto na constituição de fundamentos e lógica de compreensão sobre os objetos de
estudo, quanto na análise e interpretação dos dados.

2.4 TEORIA DO AGIR COMUNICATIVO

A TAC é a proposta habermasiana para o esclarecimento de como os


processos sociais podem ser conduzidos com a finalidade de alcançar acordos
racionais entre os sujeitos. Partindo do conceito de racionalidade intersubjetivamente
compartilhada e linguisticamente construída, a TAC descreve como os diferentes
tipos de ação social estão interligados com as dimensões de mundo experenciado
pelos sujeitos. Habermas oferece um tipo ideal de ação social, a ação comunicativa
que, segundo o autor, é a ação que se dá quando determinadas condições são
atendidas: o sujeito falante deve estar conectado com as experiências das três
dimensões de mundo - o concreto, o validado coletivamente e a sua subjetividade -
além de estar orientado para o entendimento.

A teoria do agir comunicativo é crítica no sentido de que argumenta acerca da


existência de duas camadas de mundo – o mundo da vida e o mundo sistêmico – e
sobre as permanentes tentativas de colonização do primeiro pelo segundo por meio
de inserções comunicacionais deturpadas ou manipuladas. A teoria social de
Habermas tem como pano de fundo a ideia de conectar a ação mediada
59

linguisticamente, ou seja, da construção da realidade a partir da interação humana,


com as respostas aos entraves da sociedade moderna.

Razão comunicativa e mundo da vida são os conceitos-chave da TAC.


Conforme Aragão (2006, p. 14), “a compreensão mútua de significados, validada
entre os sujeitos no contexto de mundo da vida, juntamente com o conceito de razão
comunicativa formam o pano de fundo da teoria habermasiana”. A partir destes
constructos, que funcionam como canais condutores da TAC, os demais conceitos e
ideias são deduzidos por meio de uma lógica onde a comunicação está no centro de
um processo onde os sujeitos interagem nas diversas instâncias da vida cotidiana,
social e política. Segundo a TAC, através da orientação para o entendimento mútuo,
os sujeitos são capazes de buscar o atingimento de acordos por força dos melhores
argumentos, assim uma sociedade livre de dominação e coerção por parte do
sistema capitalista moderno poderá ser experienciada.

2.4.1 O conceito de racionalidade por Jürgen Habermas: a verdade que depende


da interação humana

Apesar de ser um importante autor da virada pragmático-linguística,


Habermas constitui seu pensamento em decorrência da Escola de Frankfurt. Neste
sentido, ele recupera a proposta original de Adorno e Horkheimer, qual seja, a de
empreender uma crítica à racionalidade moderna (ARAGÃO, 2006; FREITAG, 1986;
VIZEU, 2005). Para tanto, Habermas recupera a crítica kantiana de razão prática, a
qual preconiza a autonomia do conhecimento, legitimado com base em normas
coletivamente validadas, criticando, assim, a concepção ocidental moderna de
racionalidade, a qual está fundamentada na separação entre o sujeito pensante e o
objeto pensado.

Para Habermas, a lógica de objetivação da realidade apresentada pela visão


cognosciente de racionalidade tem limitações, pois está pautada apenas na
orientação teleológica do pensamento voltado ao tipo de agir racional-finalista. Ou
seja, sob esta perspectiva, para ser racional, um sujeito não precisa recorrer a outra
60

perspectiva que não a sua própria; e, desconsiderando o outro, ignora sua


interpretação e sua devolutiva no processo interacional.

Habermas propõe então uma concepção mais ampla de racionalidade, na


qual considera central a relação intersubjetiva entre os sujeitos por meio do processo
interacional mediado pela linguagem. Ou seja, sugere que a concepção de razão
está diretamente interligada com as experiências de vida que são compartilhadas
entre os sujeitos por meio da comunicação. Habermas interconecta o conceito de
comunicação, este como sendo o ato de se expressar (emissor) e interpretar
(receptor), com o de razão, pois segundo o autor, em uma interação comunicacional
todos os sujeitos participantes são racionais.

A racionalidade é, de acordo com a teoria habermasiana, mediadora da


interação humana, não sendo, portanto, um atributo da verdade. Neste contexto, a
verdade depende da interação entre os sujeitos, o que ocorre por meio da
comunicação. Segundo Vizeu (2005, p. 12):

Nesse novo paradigma, o caráter emancipatório da razão é observado pela


relação intersubjetiva que assumem os participantes de uma mesma
comunidade, onde a comunicação assume papel central, entendida como
princípio ordenador da vida humana associada.

Neste sentido, o âmago da teoria habermasiana não é a verdade do sujeito só


no mundo, mas a verdade construída a partir da interação intersubjetiva, por meio da
comunicação entre sujeitos capazes de se entenderem sobre algo (HERRERO,
1986). A realidade passa a ser um produto da interação social, experenciada e não
um atributo do sujeito só no mundo. Além disto, para ser considerada válida –
portanto, racional, segundo a ótica habermasiana – uma exteriorização deve ser
passível de crítica, ou seja, depende da atitude do outro sujeito participante do ato
comunicacional, além de estar fundamentada, isto é, resguardada por bons
argumentos (HABERMAS, 2012).

Pode-se observar que o conceito de razão neste contexto, está atrelado e


depende da existência do outro; a razão não é considerada como uma faculdade
elementar do ser cognosciente. Seguindo a lógica presente no conjunto de
61

entendimentos apresentados na guinada linguística, onde o significado do real, do


mundo concreto e do subjetivo, é dado pela linguagem (VIZEU, 2010), para
Habermas a racionalidade é evocada nas ações linguisticamente mediadas, daí a
importância da comunicação livre de coerção para possibilitar aos sujeitos o
emprego da racionalidade comunicativa, tipo ideal de racionalidade apresentado
pela teoria habermasiana.

Outra consideração dentro do encadeamento de ideias apresentado pela


teoria habermasiana é que a verdade é sensível a ação do tempo, adquirindo
diferentes delimitações que por hora não se fazem legítimas, mas que em períodos
anteriores eram ratificadas com base em significados compartilhados naquele
momento. Essa mutação depende da ressignificação das coisas e dos valores morais
que mudam com o passar do tempo. Neste sentido, pode-se dizer que a nossa
percepção do que é verdadeiro e lícito está em constante transformação, e depende
de diversos elementos, como a normatização social e o tempo. Conforme Aragão
(2006, p. 49):
Em resumo, ao conceito transcendental de mundo-da-vida correspondem
três estruturas formadoras essenciais: cultura, personalidade e sociedade –
que são seus componentes invariantes, atemporais. Por outro lado, ao
conceito de mundo vital empírico correspondem os conteúdos particulares
específicos de uma forma de cultura, um tipo de sociedade e uma estrutura
de personalidade – variáveis temporal e historicamente.

A verdade neste contexto apresenta característica de transitoriedade, pois


está em constante processo de transformação a partir das experiências de mundo
concreto, da subjetividade e da interação social. Ainda, para Habermas, a verdade é
culturalmente definida, ou seja, algo apenas será verdadeiro se fizer sentido para
sujeitos que integram determinada comunidade linguística e partilham os mesmos
significados. Segundo Habermas (1990, p. 96), “cultura é o armazém do saber, do
qual os participantes da comunicação extraem interpretações no momento em que
se entendem mutualmente sobre algo”.

O compartilhar de significados e a vontade autônoma, livre e suficiente em si


mesma, também são importantes elementos que compõem o conceito de
racionalidade sustentado por Habermas. Novamente neste contexto, a verdade não
62

é absoluta, pura; ela é uma construção entre sujeitos dotados de autonomia, que
linguisticamente atingem um significado compartilhado sobre determinado fato. Para
Habermas (2012, p. 31) “a racionalidade é entendida como a maneira pela qual o
saber é adquirido e empregado”, ou seja, a racionalidade é um processo interacional
mediado linguisticamente do sujeito com os objetos e dele com outros sujeitos.
Neste ponto se faz necessária a compreensão de que o conceito habermasiano de
racionalidade pressupõe a presença de autonomia, de seres detentores de vontade
própria, e que agem por meio da linguagem para se expressar no mundo. Segundo
Aragão (2006, p. 51), “Habermas sugere que a linguagem é exatamente aquela
aptidão do ser humano que o distingue dos animais, sua verdadeira característica
antropológica”.

Segundo Vizeu (2011), para a ação ser considerada racional e fazer sentido
para os sujeitos participantes de um evento interacional comunicativo, e com
potencial para deliberar sobre assuntos cotidianos nas várias esferas da vida, três
dimensões ontológicas de mundo devem ser atendidas: objetiva (mundo concreto),
subjetiva (mundo subjetivo) e normativa (noção de legitimidade). Ou seja, uma ação
para ser racional não pode estar incompleta em nenhuma destas esferas ontológicas,
e uma ação em que ao menos uma destas esferas não esteja atendida, não será do
tipo racional. Na dimensão objetiva ou factual, os objetos, sujeitos ou eventos a que
fazemos referências têm concretude e são constatáveis. A dimensão subjetiva ou
expressiva diz respeito ao mundo interior ou ao mundo interior de outra subjetividade,
expressa sentimento ou impressão sobre algo. Na dimensão normativa ou social há
juízo de valor, o qual pode variar entre diferentes comunidades, culturas e época.
Segundo Habermas (2012, p. 45), “padrões de valor não têm a universalidade de
normas reconhecidas intersubjetivamente e tampouco são pura e simplesmente
particulares”.

Podemos observar que Jürgen Habermas oferece um novo olhar sobre o


conceito de racionalidade, e nesse sentido propõe que a verdade não é um atributo
da razão humana, tampouco apenas o é aquilo que se observa do mundo, nos
sujeitos e objetos. Para ele, a verdade emerge do processo de interação social,
63

mediado linguisticamente. A racionalidade é, para Habermas, mediadora das


interações entre sujeitos dotados de vontade própria, que constroem significados a
partir de verdades que podem variar de acordo com elementos culturais e temporais.
O que é racional em um país pode não ser em outro, da mesma forma o que é
considerado racional hoje pode ter sido considerado ilógico em momentos anteriores
da história. Desta maneira, sob a ótica habermasiana, ser racional é ter boas razões,
é apresentar argumentos que durante o processo interacional possam convencer o
outro e que estejam pautados em pretensões de validade, ou seja, que intencionem
verdade, veracidade, retidão e inteligibilidade. Este e demais construtos da teoria do
agir comunicativo serão analisados nas próximas seções.

2.4.2 O mundo da vida

Habermas se apropria do conceito fenomenológico mundo da vida ao


descortinar a ideia de racionalidade comunicativa. Para a teoria habermasiana, o
mundo da vida é pré-condição para a existência da ação comunicativa. Representa o
pressuposto sobre a totalidade do que é possível de se alcançar entendimento, ou
seja, é a dimensão onde os sujeitos podem chegar a um acordo racional, o que
conforme a teoria habermasiana, é um evento livre de coerção, em que os sujeitos se
percebem mutuamente capazes de debater de forma livre e inteligível sobre
determinado fato da vida cotidiana. O mundo da vida apresenta três dimensões: além
do mundo objetivo com o qual nos defrontamos, há um mundo social e um mundo
subjetivo. Segundo Aragão (2006, p. 31):

O mundo objetivo representa o estatuto ontológico referente a totalidade


das entidades, o mundo social a totalidade das relações interpessoais
legitimamente reguladas e o mundo subjetivo a totalidade das experiências
subjetivas de ego, às quais o indivíduo tem acesso privilegiado.

O mundo da vida é o estoque de entendimento compartilhado nas três


dimensões sobre a vida em seu estado natural. Representa a perspectiva acessada
pelos seres humanos em situações de prática comunicativa ideal. Conforme Oliveira
e Fernandes (2001, p. 125), “existe a vitalidade do mundo da vida que guarda as
tradições, cultura e linguagem”, os quais são empregados nas esferas privada e
64

associativa, e que propiciam o convencimento por meio de argumentos plausíveis, e


que fazem sentido para todos os participantes do ato comunicacional. O mundo da
vida é um conjunto de pressuposições que devem ser observadas para que o ato de
fala faça sentido em suas três dimensões: objetiva, normativa e subjetiva. Consiste,
portanto, no pano de fundo para a ação comunicativa, segundo Habermas (1990, p.
96):

Aquilo que brota das fontes do pano de fundo do mundo da vida e


desemboca no agir comunicativo, que corre através das comportas da
tematização e que torna possível o domínio de situações, constitui o
estoque de um saber comprovado na prática comunicativa.

O compartilhamento das três dimensões de mundo é insumo para o processo


comunicacional pleno, isto é, a partir desta condição, o mundo conquista objetividade
ao tornar-se válido enquanto mundo único para uma comunidade de sujeitos capazes
de agir e utilizar a linguagem (HABERMAS, 2012). Além disso, o mundo da vida é
culturalmente compartilhado, sendo que os membros de uma comunidade partilham
de um conhecimento prévio sobre seus mundos da vida, um estoque cultural
(ARAGÃO 2006) que torna possível a estes sujeitos interpretarem a realidade de
maneiras similares, pois a compreensão do mundo se torna objetiva, como se
tangível, baseada no comungar de significados. Deste modo, a verdade é, neste
contexto, relativa ao acordo linguístico vigente.

É no campo associativo que o mundo da vida se choca com o mundo


sistêmico, este último representado pelo Estado e mercado – e seus elementos
simbólicos: poder e dinheiro - e neste conflito permanente percebe-se vantagem de
sobreposição do mundo sistêmico. A este fenômeno Habermas denomina
colonização do mundo da vida. O mundo da vida é compreendido na teoria
habermasiana como o horizonte onde os sujeitos existem livres de coerção e
manipulação, onde é possível agir de maneira natural, com base em critérios
essenciais da vida privada e associativa. Conforme Oliveira e Fernandes (2011, p.
125), representando o estado natural da compreensão de realidade pelos sujeitos,
“guarda as tradições, a cultura e a linguagem, que tornam a vida humana possível
de ser compreendida como natural”. É neste contexto vital de mundo que surge a
orientação para o entendimento e a busca de acordos reais e duradouros, nesta
65

perspectiva há espaço para o exercício do direito de expressar múltiplas ideias e ao


processo argumentativo. Como observa Oliveira e Fernandes (2011, p. 127):

Há um espaço, engendrado no mundo da vida, para a emancipação dos


sujeitos, para o fortalecimento dos laços de solidariedade e das construções
das identidades plurais. A dimensão do mundo da vida resiste à intervenção
do Estado e do mercado.

No mundo da vida os sujeitos se encontram livres para agir de forma


essencial, isto significa que os sujeitos estão livres de pressões coercitivas e que há
a busca pelo consenso e atingimento de acordos que sejam coletivamente razoáveis
e não privilegiem uns perante os outros. É o horizonte de experiências individuais e
compartilhadas, da cultura e das tradições que se constitui no conjunto de premissas
naturais das três esferas ontológicas de mundo, onde se é possível chegar a um
ponto comum sobre aquilo que é naturalmente aceitável, pois é livre de
interferências do mundo sistêmico.

2.4.3 Ação comunicativa

Segundo Habermas, o ato de fala pleno - a ação comunicativa - objetiva o


alcance de entendimento entre os sujeitos, e o emprego da linguagem por vias
diferentes ao da ação comunicativa não são o seu modo original. Para Habermas, os
outros tipos de ação que não a comunicativa, são derivativas, pois a linguagem
pressupõe o “emprego dos meios linguísticos com orientação para alcançar
entendimento” (ARAGÃO, 2006 p. 29). Esse modo original é denominado por
Habermas de uso comunicativo da linguagem.

Habermas, empreendendo uma saída para os impasses verificados nas várias


instâncias da vida associativa sugere que o acordo entre sujeitos apenas é possível
quando há orientação para entendimento mútuo. Conforme Habermas (1997, p. 50):

Entendimento entre sujeitos que agem comunicativamente se mede por


pretensões de validade, as quais levam a uma tomada de posição em
termos de sim/não – perante o maciço pano de um fundo da vida
compartilhado intersubjetivamente.

A ação comunicativa depende que os sujeitos, enquanto no ato de fala,


estejam orientados ao entendimento mútuo e sejam capazes de se fazerem
66

compreendidos linguisticamente. Portanto, as condições universais para o


entendimento mútuo, situação em que os sentidos são explicados e reconhecidos
mutuamente pelos sujeitos participantes da interação, são para Habermas a estrutura
linguística do ato de fala e as pretensões de validade.

Os pilares do ato de fala pleno, que são as pretensões de validade, sustentam


que toda vez que estamos com outro sujeito em uma interação comunicativa, o
entendimento mútuo é um objetivo do ato comunicacional. Conforme evidenciado por
Vizeu (2010, p. 258), “a base da ação comunicativa plena é a orientação ao
entendimento”, por meio de argumentos que atendam as pretensões de validade do
ato de fala: i) verdade proposicional, denotando que o ato comunicacional refere-se
a algo verdadeiro no mundo, ii) sinceridade de que há intenção de veracidade no
argumento, ou seja, sem manipulação de significados, iii) retidão que abrange o
elemento normativo social e iv) inteligibilidade para que os sujeitos possam se
entender sobre aquilo que está sendo objeto do ato comunicacional. Este último
elemento pertence à esfera material, de estrutura da linguagem, os demais estão
conectados com as três dimensões ontológicas do ato de fala – factual, expressiva e
normativa, respectivamente.

Segundo a teoria habermasiana, os atos de fala podem ocorrer por diferentes


processos e intenções, segundo Habermas a ação pode ser teleológica, estratégica,
normativa, dramatúrgica ou comunicativa. Como observa Aragão (2006, p. 53):

Segundo a tipologia da ação de Habermas, se o modo de coordenação visa


ao entrelaçamento de cálculos egocêntricos de utilidade, temos a ação
teleológica; que pode tornar-se ação estratégica, quando nesse cálculo
entrar a antecipação de decisões por parte de, pelo menos um ator. Se visa
a um acordo socialmente integrante sobre valores e normas, instituído
através da tradição cultural e da socialização, temos a ação regulada
normativamente. Se visa a uma relação consensual entre atores e seu
público, temos a ação dramatúrgica. Por fim, se visa “alcançar
entendimento”, no sentido de um processo de interpretação cooperativo,
mas ao mesmo tempo, não se limita a apenas isso, pois deve permitir o
estabelecimento de relações com o mundo, temos a ação comunicativa.

O agir buscando a concordância sobre os fatos e interpretações somente é


possível, segundo a pragmática habermasiana, a partir da ação comunicativa. A
ação comunicativa é, segundo a pragmática habermasiana, um tipo ideal do agir
67

social por meio da comunicação, em que os sujeitos apreciam de liberdade para


argumentar sobre questões do cotidiano, justificando e criticando suas pretensões
de validade perante os outros. O objetivo único da ação comunicativa é promover o
acordo racional entre sujeitos. É, portanto, oposta à racionalidade teleológica-
estratégica, a qual se apresenta com base em aspectos unilaterais das vontades dos
sujeitos. Segundo Silveira (2008, p. 1126):

Habermas propõe, portanto, um modelo ideal de ação comunicativa em que


as pessoas interagem e, através da linguagem, criam sentidos sociais
compartilhados que passam a orientar sua racionalidade,
independentemente da racionalidade formal e técnica.

A ação comunicativa permite a busca por concordância, através do processo


interacional. Porém, Habermas faz uma diferenciação entre ato de fala orientado ao
entendimento mútuo e a ação consensual, já que no segundo caso os sujeitos
encontram-se normativamente orientados a um certo entendimento sobre algo, em
função de uma definição prévia sobre o estado das coisas (HABERMAS, 1998). A
ação comunicativa é, segundo Habermas, o único tipo de comunicação capaz de
possibilitar o expressar de ideias sinceras e válidas, atributos fundamentais a
constituição de uma sociedade emancipada, segundo Habermas (2012, p. 146):

(...) só resta a crítica aos desvirtuamentos que se acrescem duplamente às


formas de vida das sociedades que se modernizaram em moldes
capitalistas: por um lado através da desvalorização de sua substância
tradicional e, por outro, através de sua submissão a imperativos de uma
racionalidade parcializada e limitada ao que é cognitivo-instrumental”.

Assim, a ação comunicativa é profícua para o que faz sentido ao mundo da


vida dos sujeitos, não necessariamente seguindo a ordem imposta pelas regras do
mundo sistêmico, que são criadas a partir do esforço ilimitado por dinheiro e poder.
Conforme Araújo (2004), para a teoria habermasiana a ação comunicativa, modelo
de linguagem onde se presencia ação dialógica, é o único modo capaz de evitar a
penetração do mundo da vida pela rigidez do mundo sistêmico. Logo, ao trazer à
tona o conceito de ação comunicativa, Habermas propõe uma alternativa para que os
assuntos da vida em sociedade possam ser deliberados considerando todas as
vozes e todos os estoques de saberes acumulados, reconsiderando os aspectos
humanísticos das relações sociais. Deste modo, a racionalidade comunicativa abre
68

espaço para a emancipação dos sujeitos, que, orientados para o entendimento


mútuo, comunicam-se, debatem e deliberam; buscam acordos sobre as diversas
questões da vida cotidiana.

Desta maneira, o resgate que se propõe a partir das reflexões sobre a


racionalidade comunicativa, que segundo Habermas representa o emprego de meios
linguísticos visando a orientação ao entendimento, está calcado no reconhecimento
de que igualdade e liberdade, no sentido de estar livre da dominação e tensão
causadas pelos elementos constitutivos do mundo sistêmico, são necessárias ao
estabelecimento de um discurso racional, onde o que realmente deve ser
considerado é a força dos melhores argumentos (WHEALAN, 2012).

2.4.4 Ação estratégica e o cálculo utilitário de consequências

A ação estratégica tem como direcionador o êxito. Quando os sujeitos estão


orientados a obter êxito por meio de uma ação mediada linguisticamente as
pretensões de validade ligadas a ação comunicativa deixam de ser aspirações e a
eficácia da ação, o causar algo no mundo por meio de outro sujeito passa a ter lugar
central. Neste tipo de ação o ato de fala é instrumento estratégico, ou seja, existe
por parte de um sujeito a intenção de influenciar o outro para obter sucesso em
relação a determinado fato. Não há ponderações quanto as consequências no outro,
uma vez que o objetivo esteja traçado, a finalidade do agir estratégico é atingir o
êxito concreto e factual. Percebe-se então a via utilitarista da ação, pois não há outra
justificativa que não lograr de um bom resultado perante as expectativas do sujeito
emissor enquanto no processo comunicacional.

Habermas explica que ações comunicativas orientadas ao entendimento


mútuo e ações estratégicas com finalidade de sucesso são excludentes, segundo
Habermas (1990, p. 71):

Vistos na perspectiva dos participantes, os dois mecanismos, o do


entendimento motivador da convicção e o da influenciacão que induz o
comportamento, excluem-se mutuamente. Ações de fala não podem ser
realizadas com a dupla intenção de chegar a um acordo com um
69

destinatário sobre algo, e ao mesmo tempo, produzir algo nele, de modo


causal.

Segundo Habermas, o aspecto negativo da ação estratégica é quando a


relação se dá de forma teleológica, passando o outro sujeito a atuar como objeto.
Para Habermas, a ação estratégica como mediadora da relação entre sujeitos
assume caráter de dominação, castração. O cálculo utilitário de consequências é
empregado e o outro sujeito torna-se um meio para se atingir um fim, ocorrendo
assim a sua descaracterização enquanto um sujeito também capaz de argumentar
por meio da sua subjetividade, sua compreensão social, segundo seu próprio eixo
cultural e de tradições acumulados ao longo de sua vida. Portanto, com base na
pragmática habermasiana, a existência da ação estratégica-monológica não é um
fato socialmente ruim em si, o distúrbio ocorre quando os sujeitos percebem os
outros como meios, que apenas existem no mundo para cumprir o papel de
intermediação tática às suas finalidades.

Habermas distingue a ação estratégica em dois tipos: a manipulação e a


comunicação sistematicamente deturpada. Porém, percebe-se que em ambos os
casos a intenção de eficácia se sobressai em relação à orientação ao entendimento
mútuo e ao atingimento de acordos.

2.4.5 Manipulação e comunicação sistematicamente deturpada ou distorcida

Segundo Habermas, o agir estratégico pode ocorrer de forma aberta ou


velada, sendo ambas as formas compreendidas como meios para a colonização do
mundo da vida, ou seja, servem como inibidores ao estado natural de mundo, que é
constituído pela subjetividade e validado socialmente, o qual não guarda relação
com elementos do mundo sistêmico: Estado e mercado.

O agir veladamente estratégico é subdividido em comunicação


sistematicamente deturpada e manipulação. Segundo Habermas (2012, p. 572) a
primeira é compreendida como “um engano inconsciente, no sentido de que o sujeito
que age orientado ao êxito mantém as aparências, enganando a si mesmo de que
está agindo comunicativamente”. Por outro lado, quando o interlocutor age
70

intencionalmente, ofuscando o sentido do que está sendo dito, diz-se que a


comunicação é manipulada. Segundo Habermas, (2012, p. 572) na manipulação “ao
menos o comportamento de um dos participantes está orientado pelo êxito, e os
demais são levados a continuar acreditando que todos estão cumprindo os
pressupostos do agir comunicativo”.

A manipulação é um fenômeno que opera nos quatro critérios de validez do


ato de fala, pois em toda a interação comunicativa está implícito que as pretensões
de validade veracidade, sinceridade, legitimidade e inteligibilidade - são expectativas
mútuas dos sujeitos. Assim nas manipulações o interlocutor tem consciência que
está ofuscando, mentindo ou omitindo os fatos. O uso de informações falsas ou
incompletas, confusas ou normativamente ilegítimas são exemplos de inserções
linguísticas utilizadas com a finalidade de alterar o significado dos fatos, guiadas a
partir do emprego da racionalidade teleológica/estratégica e que visam o êxito
unilateral durante o processo comunicacional.

Como observado por Forester (1994), ambiguidade, jargões e falsas


promessas são exemplos de mecanismos empregados em interações
comunicacionais com a finalidade de manipular a compreensão, confiança,
consentimento e conhecimento, causando em cada um destes níveis de
manipulação, confusão, falsa segurança, ilegitimidade e falsidade, respectivamente.

O agir veladamente estratégico é um tipo de ação empregado no âmbito da


vida social, e sobretudo nas organizações, cunhando o atingimento de resultados
unilaterais, ou seja, do êxito por meio do emprego da racionalidade estratégica.
Conforme afirmado por Vizeu (2010), a comunicação sistematicamente distorcida se
manifesta no âmbito organizacional na medida em que as práticas gerenciais são
fortemente condicionadas ao êxito. Neste contexto, o emprego da manipulação
discursiva tornou-se instrumento de cunho estratégico organizacional, uma vez que
a manipulação do real sentido do que é dito se apresenta como um poderoso
artifício gerencial, visando o atingimento de metas e resultados.
71

Conforme Dejours (1999, p. 58), “a prática da distorção comunicativa permeia


todos os níveis hierárquicos, configurando um tipo de controle que se exerce sobre
todos os atores da empresa”, portanto trata-se de um fenômeno permanente e que
ocupa toda a organização. Disto pode-se depreender que, o discurso organizacional
é manipulador e/ou distorcido na medida em que impede os sujeitos de agirem
naturalmente com base nas suas experiências de mundo, ou seja, a organização
existe para atender às necessidades artificiais, criadas a partir de elementos que
constituem o mundo sistêmico.

Conforme pode-se observar, o agir veladamente estratégico é socialmente


patológico, pois coloca os sujeitos manipulados em posição de desvantagem e
impede o alcance de acordos prolíferos, sinceros e duradouros. Assim, a
concretização de acordos que façam sentido para ambos os sujeitos é enfraquecida
e abre espaço para a dominação de uns pelos outros. Em outras palavras, é um
mecanismo linguístico empregado com o intuito de falsear a essencialidade de
certas características do mundo sistêmico, o tornando imprescindível e idealizado.
Conforme Forester (1994, p. 144):

Mediada pela linguagem e pela comunicação, as distorções ideológicas


organizacionalmente estruturadas bloqueiam o recurso do cidadão ao
discurso e invalidam a ação política, pois elas distorcem as habilidades
básicas dos cidadãos de entender as situações que encaram.

Tanto a comunicação sistematicamente deturpada quanto a manipulação


representam no âmbito social um entrave ao agir comunicativo. A manipulação e a
deturpação discursiva conduzem os sujeitos a conviverem em uma dimensão
artificial de vida, onde prevalecem as superficialidades criadas pelo mundo sistêmico,
onde a racionalidade é dada por critérios teleológicos, e não construída a partir do
compartilhamento intersubjetivo das experiências dos sujeitos.

2.4.6 Reciprocidade

Na ação comunicativa, tipo que requer competência comunicativa dos sujeitos


segundo Habermas, as experiências individuais de mundo concreto, a subjetividade
e as noções de normas sociais são intercambiadas entre os participantes de uma
72

interação a fim de que se atinja um acordo sobre algo, ou seja, a ação comunicativa
depende de uma situação de compartilhamento intersubjetivo. As ações mediadas
pela fala, para serem naturalmente eficazes, ou seja, comunicativamente racionais,
devem emergir da essência do que é verdadeiro para os sujeitos e acontecem em
um cenário de confiança mútua e reciprocidade. Habermas explica que a situação
ideal de fala pode ser analisada em termos do que ele denomina de constituidores
universais do diálogo (HABERMAS, 1970).

Um desses constituidores universais é a troca de perspectivas entre os


participantes da interação no sentido de se reconhecerem como o outro sujeito toda
vez que se referem a si próprios como “eu”. Para Habermas, essa é a principal regra
válida para a intersubjetividade pura. Conforme Habermas (1970, p. 370, tradução
livre), o uso de pronomes pessoais, que descrevem os papéis dos sujeitos em um
diálogo, “possibilitam que os sujeitos compreendam e identifiquem o sentido a partir
de suas próprias posições e a partir da posição dos outros sujeitos ao mesmo
tempo”. Assim, a intersubjetividade pura é consequência de uma relação recíproca
de reconhecimento do sujeito falante (Eu) enquanto o outro (Você), assim também
entre o Nós e o Eles, enquanto participantes de um ato comunicacional. Segundo
Habermas, os sujeitos são conscientes desta relação pessoal, no sentido de
reconhecerem que todo sujeito é potencialmente seu próprio outro. Ainda, a relação
de confiança e reciprocidade entre os participantes de uma interação, depende dos
sujeitos estarem dispostos a uma atitude receptiva, a qual não pode ser imposta, ou
seja, segundo Habermas (2010, p. 35) “no diálogo, ambos os lados só assumem
essa relação se ela for mútua”.

Desta maneira, Habermas aventa um padrão comunicativo verbal que indica a


existência de reciprocidade, indicando características das expressões linguísticas
que denotam a presença ou ausência de reciprocidade. Deste modo, a aplicação de
certos pronomes pessoais em alguns contextos é um indicador de que a interação é
respaldada por reciprocidade (FELTS, 1992).

Uma relação de confiança mútua onde exista reciprocidade é condição para


a ação comunicativa. Reciprocidade pode ser definida neste contexto como sendo
73

uma condição de simetria entre os sujeitos, a qual permite identificar no outro a


mesma capacidade de argumentação e entendimento. A reciprocidade permite que
cada sujeito seja reconhecido como capaz de articular suas ideias e de interpretar os
fatos de acordo com seu estoque de experiências vividas, e esta condição é
percebida como inquestionável. Dado que a ação comunicativa se apresenta como o
único padrão comunicacional ligado ao atingimento de acordos reais e duradouros,
situações de interação entre sujeitos por meio da linguagem devem contar com um
elo intersubjetivo que seja capaz de criar empatia e confiança mútuas, direcionando
o desfecho para algo que faça sentido e que seja verdadeiro para todo os envolvidos.

Baseado principalmente em dois trabalhos de Habermas publicados em 1970


na revista Inquiry (On sistematically distorted communication e Toward a theory of
communicative competence) Arthur Felts propõe, em seu artigo publicado em 1992
“Organizational Communication: A critical perspective”, a hipótese de que uma maior
relação de reciprocidade entre gerentes e subordinados facilita a não distorção
comunicativa nas organizações. O autor conclui em seu ensaio que a configuração
hierárquica nas organizações é um exemplo de estrutura inibidora de reciprocidade.
Para Felts, reciprocidade pressupõe que não existe por nenhuma das partes poder
estrutural para forçar uma interpretação, mensagem ou entendimento por parte do
outro (FELTS, 1992). Vizeu (2011) também afirma que o fato da relação entre
gerentes e subordinados ser monológica, ou seja, onde o outro existe como meio
para o atingimento de objetivos, inibe a reciprocidade e facilita a comunicação
sistematicamente distorcida nas organizações. Estes estudos demonstram que a
estrutura das organizações, especialmente a configuração hierárquica, idealizada
para cumprir com os pressupostos do modo de produção capitalista, está desenhada
de tal maneira que dificulta os sujeitos comunicativamente. Confiança e
reciprocidade passam a ser no contexto do “management” elementos de pano de
fundo quase que impraticáveis (VIZEU, 2010).

A comunicação sistematicamente distorcida ou deturpada ocorre quando os


sujeitos não esperam no outro a capacidade de compreensão sobre o seu mundo da
vida, ou quando o sujeito não deseja explicitar o âmago daquilo que dirige sua ação
74

linguística, ou seja, percebe-se que a distorção é originada na desarmonia de


expectativas de um sujeito perante o outro, é, portanto, consequência de uma
interação assimétrica e da ausência de reciprocidade.

Desta forma, a reciprocidade é também uma pré-condição para a ação


comunicativa. Consequência da confiança mútua entre sujeitos participantes de uma
interação comunicacional, a reciprocidade é inibida quando outras forças entram em
cena, como o poder e o direcionamento teleológico da ação. A reciprocidade é o elo
que possibilita um sujeito acreditar na capacidade do outro enquanto sujeito dotado
de razão, a qual lhe confere condições para um diálogo construtivo e gerador de
acordos.

2.4.7 A pragmática universal e a definição de discurso segundo Habermas

A tarefa da pragmática universal é para Habermas (1998, p. 21, tradução


livre) “identificar e reconstruir condições universais que possibilitem o entendimento
mútuo”. Para se obter uma situação de entendimento mútuo, a linguagem atua como
o medium adotado no processo emancipatório, e o que ele denomina de
competência comunicativa como um requisito ao seu atingimento. De forma simples,
a pragmática universal versa sobre a linguagem enquanto estrutura e a comunicação
enquanto um processo gerador de entendimento entre os sujeitos, e tem por objeto
central a análise da linguagem em uso, isto é, enquanto na ação.

Sobre as funções pragmáticas da fala, Habermas (1998, p. 54, tradução livre)


afirma que “representar algo no mundo usando uma sentença, expressar uma
intenção do falante e estabelecer relações interpessoais legítimas são a três funções
gerais que um proferimento pode assumir em determinado contexto”. A função de
estabelecer relações interpessoais é de extrema importância em uma análise
partindo da pragmática universal. Em última instância ela está relacionada ao
contexto de normas e valores, sem o qual um proferimento performativo, ou seja, um
ato de fala que representa uma ação, tal como prometer, afirmar ou sugerir, não faria
sentido. Os proferimentos que apresentam sucesso em atender expectativas de
normas ou valores tornam-se capazes de estabelecer uma relação interpessoal
75

entre os sujeitos participantes do evento comunicacional. Habermas (1998, p. 47,


tradução livre) esclarece que, a “unidade de análise elementar da pragmática são os
proferimentos, como de maneira similar a análise linguística tematiza as sentenças”.
É importante evidenciar que, em assumindo o ato de fala explícito como a unidade
de análise da pragmática universal, Habermas desconsidera, para fins de sua
teorização, outras formas de comunicação como as não-verbais e as expressões
corporais.

Conforme Habermas (2012, p. 48), “a força de um argumento mede-se, em


dado contexto, pela acuidade das razões; esta se revela, entre outras coisas, pelo
fato de o argumento convencer ou não os participantes de um discurso”, de modo
que os argumentos são mais ou menos convincentes na medida em que são
capazes de direcionar os participantes a concordarem sobre as pretensões de
validade que os sujeitos reciprocamente criticam durante as interações
comunicativas. De acordo com a pragmática habermasiana, na fala argumentativa a
racionalidade de um sujeito falante é passível de julgamento pelos outros com base
na forma que aquele justifica suas pretensões de validade, ou seja, sua capacidade
de aceitar e lidar com as críticas dos outros sujeitos. Habermas, expandindo a teoria
dos atos de fala de Austin, propõe com sua pragmática universal que os
proferimentos devem ser analisados para além das estruturas linguísticas do ato de
fala, pois estão relacionados e fazem efeito no mundo por meio de suas três
dimensões: objetiva, subjetiva e normativa, ou seja, representam uma forma de
perceber a realidade factual, de expressar a subjetividade e de reconhecer as
normas sociais.

Para Habermas, o discurso é considerado uma forma privilegiada do agir


social, um tipo de negociação pela fala, pela qual se torna possível o atingimento de
acordos reais, já que se trata de argumentos que fazem sentido para todos os
participantes, os quais estão engajados em uma atitude de cooperação e não estão
compelidos a aceitar as pretensões de validade, por razões quaisquer que não o
convencimento pela força dos melhores argumentos. Segundo Habermas (1998, p.
93, tradução livre) o discurso é um evento comunicacional onde as pretensões de
76

validade estão suportadas e são tematicamente analisadas em que, assim como na


ação comunicativa, “os participantes retêm uma atitude de cooperação”. Em outras
palavras, o processo pelo qual um sujeito sustenta e o outro critica as pretensões de
validade em uma discussão ou debate, é apresentado por Habermas (2001, p. 94,
tradução livre) como discurso – “um evento que objetiva justificar proferimentos
cognitivos tais como interpretações, assertivas, explicações e justificativas presentes
na prática diária”. Assim, Habermas (2001, p. 93, tradução livre) afirma que “o
consenso racional pode ser obtido via discurso”, pois ele é a consequência de um
nível de argumentação no qual a competência comunicativa se faz presente. Assim,
Habermas (2001, p. 98, tradução livre) deposita na existência da ação comunicativa,
tipo ideal de ação segundo a teoria habermasiana, a condição para “libertar o
discurso de estruturas coercivas”. Neste sentido, a pragmática universal é a resposta
de Habermas acerca de como acordos podem ser atingidos por meio da interação
entre sujeitos racionalmente comunicativos. Portanto para Habermas, o discurso é
um nível da argumentação onde a concordância sobre questões sociais é possível de
ser atingida, uma vez que os seguintes pré-requisitos devem ser observados: i) os
participantes estão orientados ao entendimento mútuo e estão em uma atitude
recíproca de cooperação, justificando e fundamentando seus pontos de vista com
elementos que tocam o mundo da vida de todos; e ii) os participantes fundamentam e
justificam as críticas com base nas pretensões de validade do ato de fala.

Habermas (2012, p. 48) afirma que “um argumento contém razões que se
ligam sistematicamente às pretensões de validade de uma exteriorização
problemática”. Ou seja, quando um sujeito não concorda com o que foi exposto por
outro ele levanta indagações e faz questionamentos que estão interligados com as
pretensões de validade: veracidade, sinceridade, compreensibilidade e correção
normativa. Desta forma, partindo da conexão com as pretensões de validade,
Habermas aponta para cinco formas de argumentação: discurso teórico, discurso
prático, discurso explicativo, crítica estética e crítica terapêutica.
77

Tabela VII: Teoria do agir comunicativo - Formas de argumentação, conexão


com pretensões de validade e racionalidade
Forma de
argumentação Pretensão de validade Racionalidade
Verdade dos fatos ou eficiência Racional é aquele que profere opiniões
Discurso Teórico das ações teleológicas fundamentadas e age com eficiência.
Racional é aquele que justifica suas
Discurso Prático Correção normativa ações e julga com imparcialidade.
Racional é aquele que forma
adequadamente suas exteriorizações
simbólicas e se dispõe a explicar o
Discurso Explicativo Compreensibilidade significado de suas expressões.
Racional é aquele que está disposto a
se libertar das ilusões acerca de suas
Crítica terapêutica Veracidade das expressões próprias vivências.
Racional é aquele que assume uma
postura reflexiva diante dos próprios
Crítica estética - padrões valorativos.

Fonte: Adaptado de Alves (2009, p. 190).

Conforme Habermas (2012, p. 50), no discurso teórico os sujeitos estão


engajados em superar os conflitos de forma consensual, “não seguindo
simplesmente seus afetos ou interesses imediatos”, eles intencionam tocar o mundo
subjetivo, o interior do outro sujeito. Quando os sujeitos estão interessados em
defender seus argumentos a partir de padrões normativos, ou o que Habermas
denomina de ponto de vista moral, que são aceitos a partir das interpretações que
cada sujeito realiza dos eventos sociais, tem-se o discurso prático. O discurso
explicativo por sua vez, consiste na explicação dos significados exteriorizados, que
por sua vez está ancorada em regras de linguagem bem aplicadas, ou seja, a
compreensibilidade ou inteligibilidade passa a ter lugar central.

A crítica terapêutica e a estética não são propriamente tipos de discurso, pois


não podem ser julgadas quanto ou não fazem referência às pretensões de validade
de um proferimento. Habermas (2012, p. 55) denomina crítica terapêutica a
argumentação existente quando o sujeito parte da vontade de se libertar dos
equívocos que faz sobre si mesmo, “comportando-se de maneira reflexiva diante da
própria subjetividade”, em um processo argumentativo que visa esclarecer a sua
leitura a respeito da sua própria história de vida. A crítica estética constitui-se como
78

uma forma de questionar e refletir sobre seus próprios padrões valorativos, e isso se
torna possível a partir do reconhecimento de que valores não são universais, eles se
tornam a norma para determinado grupo social em função de vários aspectos e
interesses comuns e compartilhados, porém são da mesma maneira eleitos ou
destituídos.

Verifica-se racionalidade em todos os tipos de argumentação elencados por


Habermas, mas cada uma das formas argumentativas parte de problematizações
diferentes, dependendo do contexto em que se dá a ação. Segundo Habermas
(2012, p. 72) “as argumentações distinguem-se de acordo com o tipo das pretensões
que o proponente tenciona defender. E as pretensões variam de acordo com os
contextos de ação”. O significado de contexto ou campo argumentativo proposto
aqui está intimamente relacionado ao conceito wittgensteiniano de jogos de
linguagem. Assim, Habermas sugere a distinção entre pretensões de validade
universais e convencionais, sendo estas últimas dependentes das diferentes
situações e contextos em que os proferimentos se dão. Desta maneira, as
pretensões de validade universais são aquelas que são universalmente verdadeiras,
isto é, são validas e requisitadas independentemente do campo argumentativo em
que a ação ocorre, e são: verdade das preposições, correção das normas morais e
compreensibilidade ou inteligibilidade.

Participar de argumentações sempre que necessário e se expor a críticas é,


para Habermas, uma característica do sujeito que age racionalmente. Deste modo,
por meio do discurso os sujeitos são capazes de se entender sobre fatos e coisas. O
processo argumentativo, ou seja, a negociação via discurso é a oferta de Habermas
para que se alcance o ideal emancipatório de uma teoria que se dispõe a refletir e
oferecer respostas aos problemas sociais.

2.4.8 Democracia deliberativa

Segundo Habermas, (1997, p. 42) o arquétipo democrático segundo Dahl “(...)


passa pelos elementos: inclusão de todos, chances de participação no processo
político, igual direito a voto, direto à escolha dos temas da agenda, informações
79

suficientes e bons argumentos (...) ” são amplamente buscados e idealizados na


sociedade moderna. No entanto, o que se percebe nas sociedades ditas
democráticas são modelos políticos distantes deste ideal, orientados a salvaguarda
da economia, em que os cidadãos comuns têm pouca ou quase nenhuma
participação nas deliberações e decisões políticas. Conforme Vizeu e Bin (2008, p.
85), “a democracia é um modelo moderno de deliberação e devido ao tipo de
racionalização percebido na modernidade, o indivíduo saiu de cena fazendo do
Estado um ente superior”.

A vertente da deliberação argumentativa passa a ser vista a partir dos anos


70 justamente como o termo que entrelaça a compreensão de que o processo
democrático deve ser capaz de permitir a todos a mesma possibilidade de participar
das discussões e deliberações sobre os aspectos que concernem a sociedade
(AVRITZER, 2000). A democracia deliberativa pressupõe a igualdade de poder entre
todos não apenas por meio da representatividade, mas sobretudo através da
contribuição de todos os cidadãos para a agenda política, ou seja, na escolha dos
assuntos e questões que serão priorizados (WHEATLEY, 2003).

Para Habermas (1997, p. 18), a democracia deliberativa, ou política


deliberativa pois o autor usa os dois termos de forma intercalada, “constitui o âmago
do processo democrático”. Segundo o autor, o modelo democrático tradicional, em
suas tipificações mais conhecidas - liberal e republicana - apresenta fraquezas e
desvantagens. A concepção liberal por dar ao Estado status de protetor da
economia e a expressão republicana por depositar na moral e na ética a presunção
ideológica de resolver questões de cunho político. Para Habermas, o processo ideal
de tomada de decisões públicas - aquele que considera ambos os lados - é uma
interação comunicativa que está fundamentada no agir orientado ao entendimento
mútuo e na intersubjetividade. Assim, o modelo de democracia sugerido por
Habermas é um processo em que a comunicação se apresenta como a base que
cria as condições ao modelo deliberativo, ou seja, ao atingimento de acordos livres
de pressões do mundo sistêmico, conectando intersubjetivamente os sujeitos com as
dimensões constitutivas do mundo da vida.
80

Habermas busca na teoria do discurso o respaldo para o seu modelo


democrático. Segundo suas reflexões, a intersubjetividade do discurso abre espaço
para processos de entendimento mútuo tanto no nível das entidades parlamentares
quanto em arenas nas quais ele denomina de “rede de comunicação formada pela
opinião pública de cunho político”. Segundo Habermas (2002, p. 281):

Essas comunicações sem sujeito, internas e externas às corporações


políticas programadas para tomar decisões, formam arenas nas quais pode
ocorrer a formação mais ou menos racional da opinião e da vontade acerca
de temas relevantes para o todo social e sobre matérias carentes de
regulamentação.

Como observa-se, a proposta de Habermas está atrelada a ideia de legitimar


a participação dos cidadãos comuns, ou seja, dos não parlamentares, no processo
democrático deliberativo. E para o autor esta possibilidade é possível quando a força
do processo comunicacional entra em cena, pois segundo a visão habermasiana de
deliberação, esta deve ser descentralizada das corporações políticas formais e
praticada também por cidadãos comuns, capazes de interagir comunicativamente
acerca dos assuntos e problemas que concernem toda a sociedade. Reforçando
este entendimento, Faria (2000) pontua que a teoria democrática deliberativa
sugerida por Habermas afirma que o processo decisório relativo às questões
públicas deve estar sustentado pela deliberação dos indivíduos em fóruns amplos de
debate e negociação. A negociação elucidada neste ponto é compreendida segundo
a teoria habermasiana como o processo que busca acordos que consideram os
melhores argumentos, e não aquele acordo viciado por interesses do mundo
sistêmico, que coloca o Estado como guardião da economia. O processo
democrático deliberativo, neste contexto, pressupõe tolerância a diversidade de
pensamentos, onde não há cerceamento de opiniões e as decisões são tomadas
considerando a força dos melhores argumentos.

Portanto, Habermas deposita a força de sua tese sobre democracia


deliberativa na coexistência das esferas públicas de argumentação e das estruturas
formal-parlamentares. As esferas ou fóruns públicos representam o lócus onde o
processo democrático deliberativo é capaz de se materializar nas vozes de cidadãos
comuns, ou seja, onde os sujeitos que estão fora dos espaços políticos formais
81

podem interagir uns com os outros, expressar suas opiniões e articular maneiras
pelas quais as leis sejam elaboradas considerando também os seus argumentos.
Segundo Faria (2000, p. 50), “para Habermas é a partir da inter-relação entre os
espaços institucionais e a construção de opinião informal em espaços extra
institucionais que se encontra a possibilidade de um governo legítimo”. Assim,
Habermas sugere um modelo de democracia descentralizado, onde as decisões
tomadas nas esferas parlamentares são avaliadas e criticadas em espaços públicos
e esta massa de propostas e ideias possa retornar à esfera parlamentar sob a forma
de input ao processo decisório de cunho político, tornando o processo de elaboração
de políticas públicas representativo de toda a sociedade.

2.4.9 Espaço público

Esfera ou espaço público é, sob o domínio da teoria habermasiana, um


conceito abstrato que representa uma complexa rede com várias ramificações e
sobreposições onde são engendrados os debates e deliberações acerca dos
assuntos de ordem pública, por meio do compartilhamento intersubjetivo dos
mundos da vida de seus participantes. Para Habermas (1997, p. 50):

As interações particulares que os sujeitos fazem em seus círculos de vida


privada e associativa guardam a essência onde prevalece a orientação ao
entendimento que não é perdida quando o fluxo de temas é transmitido das
esferas mais cotidianas para as esferas mais complexas e ramificadas.

Os espaços públicos políticos, os quais representam um nível mais complexo


e especializado, guardam relação com temas, conteúdos e até mesmo com o teor
argumentativo dos debates travados no âmbito da vida cotidiana. O espaço público
político pode ser caracterizado como uma formação representativa em formato de
fóruns ou arenas onde estão representados diversos segmentos da sociedade civil.
Conforme Habermas (1997, p. 93) existem “metáforas arquitetônicas para
caracterizar a infraestrutura de tais reuniões (...) empregam-se geralmente os termos
foros, palcos, arenas”.

Estes fóruns representam uma entidade plural que apresenta diversidade de


interesses, constituindo a situação mais favorável para que a agenda de prioridades
82

se construa a partir de múltiplos elementos e reproduza a vontade de toda a


sociedade. Segundo Lubenow (2010, p. 236), “a esfera pública faz a mediação entre
Estado e sistema político e os setores privados do mundo da vida”.

Em outras palavras, na visão habermasiana, o espaço público político tem


potencial para ser o universo onde as dimensões formadoras do mundo da vida,
resguardadas em seu estado natural, constituam o cenário onde os sujeitos podem
deliberar e alcançar consensos, ou seja, onde os cidadãos comuns estão
predispostos ao mútuo entendimento sobre as questões públicas. Segundo
Habermas (1997, p. 91), “a esfera pública é um sistema de alarme dotado de
sensores não especializados, porém sensível no âmbito de toda a sociedade”.
Funcionam como canais de transmissão das problemáticas cotidianas vividas pela
sociedade para as instituições parlamentares. Assim, demonstra-se como a estrutura
social capaz de reunir os argumentos da maior diversidade de representações e
permite o ecoar de forma legitima dos problemas enfrentados no âmago da vida em
sociedade para as instituições que possam formalmente tomar decisões sobre as
políticas públicas.

O espaço público pode também ser situado enquanto espaço de discussão,


como colocado por Dejours (1999, p. 61), o espaço público deve ser entendido como
“o espaço específico onde se enunciam e se confrontam as opiniões”, ou seja, é
uma estrutura que propicia atos de fala livres de coerção. Sob tais condições, o
processo deliberativo permite a elaboração de argumentos válidos, que façam
sentido para todos os participantes do debate. Conforme Oliveira e Fernandes,
(2011) a esfera pública é a arena discursiva, o espaço onde os sujeitos,
possibilitados pela comunicação, vão colocar seus pontos de vista e tentar
convencer os outros. O conceito de espaços públicos também é examinado pelos
estudos em psicodinâmica do trabalho, e estas análises evidenciam sua importância,
pois é nesse modelo de espaço de fala que, conforme Bruno e Macedo (2012, p.
310), a “palavra pode ter autonomia e liberdade de expressão, a fala livre”.

Para ser legitimo enquanto no seu papel de propiciar o debate livre de


pressões de caráter sistêmico, o espaço público político deve promover a
83

possibilidade de argumentação de todos os participantes, sem exclusões,


oportunizando o convencimento pela argumentação e não por forças coercitivas.
Uma vez compreendido como uma estrutura comunicacional fundamentada no agir
orientado ao entendimento, a comunicação tem valor central na conceituação do
espaço público (HABERMAS, 1997). A prioridade do espaço público é a construção
coletiva de propostas que influenciem as instituições político-parlamentares para que
os problemas cotidianos façam parte da agenda do poder público, não sendo
cabíveis, portanto, o calar de ideias ou a censura por parte de um sujeito ou de outro.

Conforme Habermas (1997, p. 96), “a esfera pública política deve ser


autônoma”, portanto blindada quanto aos fins estratégicos de alguns grupos de
interesse, mesmo que sejam representados por atores influentes. Para o autor este
isolamento ocorre de forma espontânea, uma vez que o caráter público de sua
constituição a distancia de padrões organizacionais formais, como é o caso da
hierarquia. Apesar de haver uma diferenciação natural entre atores que influenciam
e aqueles que são plateia, a essência pública que constitui o espaço limita os
grandes interesses a agirem sem o uso de coerções ou dominações, mas por meio
do consenso. Neste contexto, Habermas atribui status constitutivo à esfera ou
espaço público, uma vez que seu papel é garantir a autonomia do mundo da vida
(LUBENOW, 2010).

Percebe-se uma autoproteção, que representa o elemento fundamental para


que o espaço público atenda a sua função primordial de trazer para a pauta política
assuntos relevantes a toda sociedade. Segundo Lubenow (2007, p. 44) a esfera
pública que surgiu no século XVIII europeu como um espaço público de discussão e
exercício da crítica, “cujo resultado aparece articulado na forma de opinião pública”,
cede lugar no século XX a uma reorientação onde a opinião pública “uso público da
razão” passa a ter função de controle da verdade e é trabalhada para fins
manipulativos com o auxílio dos meios de comunicação de massa. Neste contexto a
esfera púbica não é mais plenamente independente da lógica de mercado e do
Estado e serve aos interesses utilitaristas (privados) e não mais ao interesse público
84

coletivo. No entanto, ainda que a esfera pública perca sua função crítica, ainda
preserva a função de influenciar as instituições públicas formais.

Desta forma, segundo a teoria habermasiana, o processo de tomada de


decisões públicas deve considerar a construção coletiva de propostas. Para Avritzer
(2000, p. 43), “o local da democracia deliberativa deve ser os fóruns entre o Estado e
a sociedade que tem surgido em países tão diferentes como o Brasil, Índia e
Estados Unidos”. Dessa forma, é condição crucial para o processo democrático
deliberativo, segundo Habermas, que o debate e as argumentações ocorram fora
dos limites das instituições estatais, resguardando assim as condições para a
diversidade de opiniões, neutralidade e autonomia.

2.5 SÍNTESE DA REVISÃO TEÓRICA

Leal a proposta original da Escola de Frankfurt, porém influenciado pela


pragmática linguística, Habermas elabora uma teoria social crítica apresentando um
conceito de racionalidade que depende de um processo interacional entre sujeitos,
mediado pela linguagem. A verdade no contexto habermasiano é um conceito
provisório e construído a partir das relações livres entre os seres dotados de
capacidade linguística, em um processo de construção e ajuste intersubjetivo de
sentidos e interpretações. Tradição, cultura e época são os campos acessados pelos
sujeitos no processo de crítica às pretensões de validade do ato de fala. Além da
esfera normativa, a subjetividade e o mundo factual compõem o mundo da vida, um
lugar experiencial que conecta os seres linguísticos ao seu modo natural de vida.

Considerada por Habermas como uma tendência natural da interação


humana, a condição comunicativa é estranha aos meios acessados pelo mundo
sistêmico, ou seja, está ética e moralmente conectada com valores conflitantes aos
interesses capitalistas, tais como a acumulação, a mais valia, o crescimento, a
concentração econômica e a depersonificação da condição humana. Neste sentido,
podemos considerar a ação comunicativa também como uma referência para a
crítica da sociedade moderna, apontando um novo conduzir das práticas sociais.
85

Assim, Habermas apresenta os pressupostos de uma situação ideal de fala, que são
a orientação para o entendimento e a reciprocidade.

A TAC sugere que os problemas sociais podem ser deliberados por todos os
cidadãos em espaços públicos de forma racional e livre de dominação e exploração
ideológica. A partir disto, a tomada de decisão política pode ser conduzida de forma
a considerar as propostas de todas as camadas da sociedade, e passam a
influenciar as instâncias políticas parlamentares, distanciando a pauta política dos
interesses dominantes, representados especialmente pelo Estado burocrático e
pelas organizações capitalistas.

A sustentabilidade é um discurso construído principalmente em conferências


plurais. O tema vem desde 1972 sendo debatido em fóruns compostos por
representantes de governos, entidades privadas, além da sociedade civil em geral.
Assim, a articulação de interesses particulares, assim como a negação acerca dos
limites do planeta para com a civilização humana, são elementos que podem
mascarar e ofuscar as discussões e acordos sobre a sustentabilidade que são
negociados nestes espaços. Neste sentido, o olhar da TAC na dinâmica processual
destes espaços ligados a sustentabilidade pode desvendar os mecanismos que
auxiliam e aqueles que prejudicam o alcance primordial do reunir sujeitos acerca
deste assunto, qual seja, o de promover condições para que indivíduos,
organizações e toda a sociedade discutam e deliberem sobre outras formas de viver,
encarando assim os limites inegáveis a perpetuação da civilização humana no
planeta terra, caso as principais ideologias modernas permaneçam vigentes e
incontestáveis.
86

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

3.1 DELINEAMENTO EPISTEMOLÓGICO DO ESTUDO

Com o intuito de demonstrar a aderência entre a base teórica com os


procedimentos e métodos de pesquisa empregados ao presente estudo, faz-se
necessário discutir previamente algumas considerações de cunho epistemológico
que demarcam as posturas metodológicas adotadas, as quais conduziram a
raciocínios e ênfases ao longo da pesquisa. Conforme Denzin e Lincoln (2006, p.
195), “prática e teoria estão ligadas a um processo contínuo de reflexão crítica e de
transformação”, de tal forma que a tarefa de circunscrever epistemologicamente o
estudo se faz relevante no sentido de que a prática do método não deve estar
desassociada de um conjunto de inquietações teóricas sobre aquilo que constitui o
conhecimento.

A teoria social de Habermas, como já colocado em outras partes do presente


estudo, tem sua gênese a partir dos ideais frankfurtianos, e é exatamente por este
motivo que guarda em seu âmago o compromisso com a emancipação humana,
naquilo que se refere a possibilidade de cada ser social resistir a mecânica do
mundo sistêmico, que coloniza o estado natural de mundo. Conforme Honneth (1999,
p. 538) “uma teoria foi aos poucos emergindo das obras de Habermas, tão
claramente motivada pelos objetivos originais da teoria crítica que pode ser aceita
como a única abordagem nova e séria dentro da atual tradição”. Habermas, ao
orientar seu trabalho intelectual pela hermenêutica, pragmatismo e análise linguística
(HONNETH, 1999), resgata a tarefa inicial da teoria crítica, sugerindo uma resposta
teórica por meio da interação comunicacional. Dito de outra forma, a TAC é uma
abordagem que busca refletir sobre questões em comum a teoria crítica, porém pela
via da filosofia da linguagem e do pragmatismo.

A teoria de Habermas apresenta preocupação em torno de transcender as


limitações do arranjo social vigente. Ou seja, é importante destacar que, além de
refletir sobre a prática social por meio da comunicação, a TAC apresenta essência
transformadora enquanto premissa, sendo esta sua força motriz. Ambas as tarefas,
87

fornecer meios para a uma interpretação da realidade e transformá-la, são


empreendidas a partir dos fundamentos da filosofia da linguagem.

Portanto, epistemologicamente situado como um estudo hermenêutico-crítico,


que enfatizará a necessidade de se compreender os significados que constituem a
ação (SCHWANDT, 2006), o arcabouço metodológico deverá oferecer meios de
entender o fenômeno em questão seguindo a premissa de que a compreensão não
é uma tarefa, mas sim uma condição do ser humano (SCHWANDT, 2006). E, neste
sentido, os pré-julgamentos adquiridos ao longo da história de vida do pesquisador
não devem ser objeto de controle. Ao contrário, são justamente eles que sustentam
a possibilidade de abrir o caminho para a explicação dos contextos sócio históricos
em que a realidade pode ser explicada.

O resgate histórico dos fatos é também um aspecto importante para os


estudos críticos. Conforme Davel e Alcadipani (2003), a entidade não pode ser
compreendida como dada, algo que existe em essência sem levar em consideração
o contexto histórico de sua origem e perpetuação. Ainda, segundo os mesmos
autores, os estudos críticos em Administração devem ter intenções desvinculadas a
performance das organizações, e também devem resguardar o ideal de
emancipação, oferecendo meios para a o desenvolvimento da autonomia e da
responsabilidade dos indivíduos (DAVEL e ALCADIPANI, 2003). Sendo assim, o
presente estudo, atendendo a estas principais premissas, caracteriza-se como uma
crítica ao discurso da sustentabilidade, construído historicamente e situado em um
fórum que atende a definição de espaço público político, conforme a teoria
habermasiana.

Nestes termos, tanto o delineamento de pesquisa, bem como os instrumentos


de coleta e análise de dados foram desenhados de forma a sustentar as ideias
desenvolvidas na revisão teórica. Ou seja, a metodologia foi escolhida para permitir
explorar a realidade concreta (sob o ponto de vista da totalidade histórica de
construção da vida social) e intersubjetivamente significada que circunscreve o
discurso da sustentabilidade. Neste sentido, esta tarefa foi empreendida por meio de
procedimentos ideográficos, que são informais por essência e se preocupam em
88

desvendar a história de vida dos sujeitos, permitindo que o conhecimento sobre o


fenômeno se construa a partir da descrição subjetiva retratada pelos indivíduos
(BURRELL e MORGAN, 1980).

3.2 ESPECIFICAÇÃO DO PROBLEMA

3.2.1 Perguntas de pesquisa

Com o intuito de melhor orientar o percurso metodológico, as seguintes


perguntas de pesquisa são apresentadas:

a. Quais são os mecanismos reconhecidos no Fórum Permanente da


Agenda 21 do Paraná que denotam a coerção e a dominação do
mundo sistêmico?

b. Segundo a pragmática habermasiana, quais são os tipos de discurso


empregados no processo argumentativo e qual a orientação da ação
nas atividades, processos e deliberações do fórum?

c. Como os elementos estruturais e comunicacionais revelam a


assimetria de poder e, consequentemente, a ausência de reciprocidade
e a comunicação sistematicamente deturpada no fórum?

d. Como os limites e as dificuldades que impossibilitam o fórum de


desempenhar sua função de instrumento de participação popular
dificultam a construção de acordos racionais sobre a sustentabilidade,
nos termos da perspectiva habermasiana?

3.2.2 Definição das categorias analíticas

Com a finalidade de se verificar o processo de construção discursiva sobre a


sustentabilidade à luz dos constructos da teoria habermasiana no Fórum
Permanente da Agenda 21 do Paraná, o quadro de análise do presente estudo foi
constituído a partir das seguintes categorias analíticas: i) reciprocidade e
constrangimentos de simetria; ii) orientação da ação, a qual pode se dar sob a forma
89

de orientação ao entendimento ou orientação ao êxito e iii) espaço público político,


que representa uma camada intermediária de debates sobre questões públicas onde
o governo e a sociedade civil podem, na forma de consenso, sugerir para as esferas
formais legislativas a criação ou alteração de políticas públicas. Como foi observado
na revisão teórica, tais elementos figuram como centrais para um estado de
democracia deliberativa, o tipo de relação política que, segundo Habermas, reflete a
situação ideal para a tomada de decisões de caráter público, que sejam racionais e
emancipatórias (FARIA, 2000).

Para permitir maior inteligibilidade ao processo de análise, destacamos abaixo


cinco conceitos da TAC que constituíram o eixo analítico central da etapa empírica
do estudo. Como estes já foram tratados mais pormenorizadamente no capítulo
anterior, a seguir apresentamos sínteses de definições destes conceitos.

a. Discurso da sustentabilidade

Segundo Habermas, o discurso é um tipo de negociação pela fala, pelo


qual se torna possível o atingimento de acordos, o qual representa o
nível mais avançado do processo argumentativo (HABERMAS, 1998).
Extrapolando esse conceito para o campo argumentativo da
sustentabilidade, pode-se inferir que o discurso da sustentabilidade
pressupõe complexa articulação de interesses (LIMA, 2003), uma vez
que na construção discursiva da sustentabilidade forças antagônicas
disputam entre si o reconhecimento sobre o discurso verdadeiro,
estando o processo de formação discursiva, portanto, suscetível a
pontos de vista conflitantes onde há a dominação por parte dos
elementos simbólicos do mundo sistêmico – dinheiro e poder, na figura
do mercado e do Estado.

b. Reciprocidade e constrangimentos de simetria

Reciprocidade é a base da ação comunicativa plena, que para


Habermas é um processo puramente intersubjetivo e simétrico.
Representa uma condição de confiança mútua entre os sujeitos, a qual
90

permite identificar no outro a mesma capacidade de argumentação e


entendimento (FELTS, 1992). Quando há reciprocidade nenhum dos
lados tem o poder de forçar um entendimento ou interpretação por
parte do outro. Relações assimétricas entre sujeitos que participam de
um ato comunicacional inibem a reciprocidade e são catalizadoras da
manipulação e distorção discursiva.

c. Orientação ao entendimento

Segundo Habermas (2012, p. 47), “os participantes de um ato


comunicacional estão orientados para o entendimento quando buscam
consenso baseado no reconhecimento intersubjetivo de pretensões de
validade criticáveis”. A orientação para o entendimento é a base da
ação comunicativa, a qual exige o emprego da racionalidade
comunicativa. A comunicação racional depende de uma competência
comunicativa que tem como fundamento o fato de estar resguardada
por bons argumentos e respaldada pela possibilidade de crítica das
quatro pretensões de validade: verdade, sinceridade, retidão e
inteligibilidade.

d. Orientação ao êxito

De acordo com Habermas, (2012, p. 168), orientação ao êxito pode ser


definida como “quando nas externações o sujeito pratica intervenções
voltadas a um fim que podem ter êxito ou fracassar, isto é, que
desejam alcançar no mundo o efeito desejado”. A orientação para o
êxito é balizadora da ação estratégica, que segundo a tipologia da
ação de Habermas, é a ação que visa ao entrelaçamento de cálculos
egocêntricos de utilidade, onde ocorre a antecipação de decisões por
parte de pelo menos um ator.
91

e. Espaço público político

Conforme Habermas (1997, p. 92), a esfera ou espaço público pode


ser descrita como uma rede adequada para a comunicação de
conteúdo, tomadas de posição e opiniões. Aquilo que é debatido no
espaço público pode ser condensado em opinião púbica, e no caso do
espaço público político, estes debates acontecem acerca de problemas
a serem considerados pelo sistema político. Não tem caráter normativo,
não é uma organização, nem tampouco um sistema. Não consiste em
estrutura para a tomada de decisões, mas sim para o acomodar de um
fluxo comunicativo de posicionamentos que acaba por representar,
após a captura e tematização de interesses da sociedade como um
todo, a opinião pública. De acordo com Habermas (1997, p. 92),
quando o espaço aborda questões politicamente relevantes, deixa a
cargo do poder político a elaboração especializada das
regulamentações e das leis.

3.3 DELIMITAÇÃO E DESIGN DA PESQUISA

Esta seção é dedicada a apresentação, em detalhes, do desenho da pesquisa,


considerando a especificação do objeto empírico de investigação, das etapas de
pesquisa, da perspectiva temporal, do nível e da unidade de análise, dos
procedimentos de coleta e análise dos dados e, por fim, das dificuldades e limitações
da pesquisa.

3.3.1 Objeto empírico de investigação

O Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná é o principal espaço no


estado para o debate das problemáticas socioambientais elencadas no documento
Agenda 21, assinado na Rio-92 por inúmeras nações. Foi instituído para concatenar
a opinião de diversos setores da sociedade, como o privado, ONGs, governos,
associações e cidadãos comuns, e existe para zelar pelos interesses acerca do
conteúdo que figurará como a Agenda 21 do estado do Paraná. Assim, o fórum
92

representa um espaço público na concepção habermasiana de rede de comunicação


formada pela opinião pública de cunho político. Evidência disto é que uma das
atribuições formais do fórum é a instituição de instâncias regionais de debates e de
mobilização pública, além de proceder com articulações que enalteçam os princípios
de precaução, de responsabilidade e de participação pública (SECRETARIA DO
MEIO AMBIENTE E RECURSOS HÍDRICOS, 2015).

Desta maneira, o fórum representa uma situação ímpar para a análise do


como se dá na essência um processo de planejamento público participativo sobre a
sustentabilidade, além de ser um recorte fidedigno do modelo de conferências
plurais que são destinadas ao debate sobre o tema. Ou seja, partindo das
motivações sobre o que se deseja explorar e compreender, o estudo do Fórum
Permanente da Agenda 21 do Paraná apresenta grande potencial de aprendizado
(STAKE, 2000), de onde poderão aflorar elementos que auxiliarão na compreensão
de um entendimento sobre como o discurso da sustentabilidade é construído e
reproduzido socialmente, além de possibilitar a análise da TAC num contexto prático
de planejamento público participativo.

3.3.2 Delineamento e etapas da pesquisa

A presente pesquisa é de natureza exploratória, uma vez que o discurso da


sustentabilidade, no contexto dos fóruns de planejamento público participativo,
representa tema não pesquisado no campo da Administração. Considerando o
objetivo central, qual seja, o de formular uma compreensão sobre como o discurso
da sustentabilidade é construído em um espaço destinado ao planejamento público
participativo da Agenda 21, sob à luz da teoria habermasiana, entende-se que, para
dar conta de apreender o fenômeno em sua integralidade e minúcias, buscamos
estruturar a estratégia de investigação de forma a tornar a construção do corpus
textual ampla e flexível.

Assim sendo, a presente pesquisa cobriu um período de dez meses de


atividades do Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná, compreendendo desde
a última reunião ordinária de 2014, realizada em dezembro daquele ano, até a
93

reunião ordinária de setembro de 2015, passando pela observação de quatro


reuniões de GTT, duas oficinas temáticas, e outra reunião ordinária realizada neste
interim. Foram também analisadas as memórias das reuniões ordinárias ocorridas
entre o período de 29 de março de 2009 e 21 de setembro de 2015, promovendo um
resgate temporal que ampliou a janela longitudinal. Este resgate retrospectivo foi
necessário para auxiliar a reconstrução da história do fórum e a viabilizar a
compreensão dos elementos macro contextuais que serviram de base para a análise
dos dados. As memórias das reuniões que aconteceram entre a data de criação do
fórum e março de 2009 não estavam disponíveis para análise. Este fato está
relatado como uma dificuldade de coleta, na seção 3.3.5 a seguir.

Neste sentido, a principal categoria para análise empírica desta pesquisa é o


discurso da sustentabilidade, o nível de análise é o organizacional e a unidade de
análise é o discurso construído no Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná. As
etapas para a condução do presente estudo foram definidas conforme a seguir:

A primeira etapa, de natureza exploratória, consistiu em estabelecer os


primeiros contatos com a coordenação do Fórum Permanente da Agenda 21 do
Paraná, a fim de acordar o escopo da pesquisa e o período de sua realização, e
desta forma, obter as autorizações necessárias à condução do presente estudo.

A segunda etapa, de natureza descritiva, consistiu em levantar a história do


Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná, procurando conectá-la com os
aspectos atuais do fórum, como a sua composição, seu modus operandi e suas
perspectivas atuais e futuras enquanto um instrumento de participação popular nas
decisões de caráter público sobre a sustentabilidade.

A terceira etapa, de natureza descritiva e analítica, compreendeu em


identificar nas fontes primárias e secundárias os elementos da dinâmica processual
e do campo argumentativo, aqui compreendido como o macro contexto do fórum,
que facilitam e aqueles que impedem que as negociações sobre a sustentabilidade
ocorram por meio do nível mais privilegiado do processo argumentativo, que é
concebido na teoria habermasiana como sendo o discurso. Nesta etapa considerou-
94

se principalmente a possibilidade ensejada pela constituição formal do fórum, qual


seja, a de ser um espaço plural para o debate e estabelecimento do plano para o
desenvolvimento sustentável do Estado do Paraná.

Finalizando, a quarta etapa consistiu em analisar o discurso da


sustentabilidade construído no fórum e suas consequências para o estabelecimento
de um planejamento sobre o desenvolvimento sustentável que seja consequência da
participação plural da sociedade Paranaense, mas que seja, sobretudo, de viável
implementação, duradouro e livre de pressões e coerções do mundo sistêmico.

3.3.3 Procedimentos de coleta de dados

As fontes primárias e secundárias e os procedimentos adotados para a coleta


de dados estão descritos a seguir.

As técnicas de coleta de dados empregadas no presente estudo são as que


atendem aos pressupostos ideográficos de pesquisa qualitativa, e foram:
observação, entrevistas semiestruturadas e análise documental. Assim, o corpus de
pesquisa é composto pelo o áudio das reuniões observadas e das entrevistas e
pelas memórias das reuniões ordinárias e extraordinárias realizadas entre o período
de março de 2009 e setembro de 2015, as quais, em conjunto, somam um total de
duzentas e cinquenta e nove páginas. O critério de seleção para a observação das
reuniões dos GTT e das oficinas temáticas considerou a necessidade de se obter
uma cobertura relevante das discussões por cada um dos temas norteadores.

Assim, dois de seis temas norteadores foram selecionados aleatoriamente


para serem acompanhados: i) Direitos Humanos e de Todas as Formas de Vida; e ii)
Padrões de Produção e Consumo. Para as reuniões ordinárias, foram observadas
todas as realizadas durante os dez meses de acompanhamento das atividades do
fórum.

Os entrevistados foram selecionados com base em sua relevância na


participação em discussões e deliberações, bem como na sua importância para a
recomposição da história do fórum. Desta maneira, dois dos membros mais antigos
95

e com participação mais ativa, além da coordenadora executiva, coordenador


temático e estagiário foram entrevistados. As fontes primárias e secundárias estão
sumarizadas na tabela abaixo:

Tabela VIII: Fontes primárias e secundárias de dados empíricos


# TIPO FONTE DATA
Observações
1 Observação 58ª Reunião Ordinária 16 de dezembro de 2014
2 Observação 59ª Reunião Ordinária 22 de junho de 2015
3 Observação 60ª Reunião Ordinária 21 de setembro de 2015
Reunião GTT Direitos Humanos e de Todas as
4 Observação 4 de abril de 2015
Formas de Vida
Reunião GTT Padrões de Produção e
5 Observação 18 de maio de 2015
Consumo
Reunião GTT Direitos Humanos e de Todas as
6 Observação 13 de julho de 2015
Formas de Vida
Reunião GTT Padrões de Produção e
7 Observação 17 de julho de 2015
Consumo
Oficina Temática de Padrões de Produção e
8 Observação 21 de agosto de 2015
Consumo
Oficina Temática de Direitos Humanos e de
9 Observação 25 de agosto de 2015
Todas as Formas de Vida
Entrevistas
Membro A do Fórum Permanente da Agenda
1 Entrevista 10 de setembro de 2015
21 do Paraná
Coordenadora executiva do Fórum Permanente
2 Entrevista 14 de setembro de 2015
da Agenda 21 do Paraná
Coordenador temático do Fórum Permanente
3 Entrevista 14 de setembro de 2015
da Agenda 21 do Paraná
Membro B do Fórum Permanente da Agenda
4 Entrevista 16 de setembro de 2015
21 do Paraná
Estagiário do Fórum Permanente da Agenda 21
5 Entrevista 22 de outubro de 2015
do Paraná
Memórias de reuniões
1 Documento 29ª Reunião Ordinária 20 de março de 2009
2 Documento 30ª Reunião Ordinária 21 de maio de 2009
3 Documento 31ª Reunião Ordinária 21 de julho de 2009
4 Documento 32ª Reunião Ordinária 21 de setembro de 2009
5 Documento 33ª Reunião Ordinária 09 de fevereiro de 2010
6 Documento 34ª Reunião Ordinária 21 de junho de 2010
7 Documento 35ª Reunião Ordinária 20 de agosto de 2010
8 Documento 36ª Reunião Ordinária 21 de outubro de 2010
9 Documento 37ª Reunião Ordinária 21 de fevereiro de 2011
10 Documento 38ª Reunião Ordinária 20 de abril de 2011
11 Documento 39ª Reunião Ordinária 21 de junho de 2011
12 Documento 40ª Reunião Ordinária 22 de agosto de 2011
13 Documento 41ª Reunião Ordinária 21 de outubro de 2011
96

# TIPO FONTE DATA


14 Documento 42ª Reunião Ordinária 16 de dezembro de 2011
15 Documento 43ª Reunião Ordinária 27 de fevereiro de 2012
16 Documento 44ª Reunião Ordinária 21 de agosto de 2012
17 Documento 45ª Reunião Ordinária 22 de outubro de 2012
18 Documento 46ª Reunião Ordinária 14 de dezembro de 2012
19 Documento 48ª Reunião Ordinária 21 de abril de 2013
20 Documento 49ª Reunião Ordinária 21 de junho de 2013
21 Documento 50ª Reunião Ordinária 21 de agosto de 2013
22 Documento 51ª Reunião Ordinária 22 de outubro de 2013
23 Documento 52ª Reunião Ordinária 20 de dezembro de 2013
24 Documento 53ª Reunião Ordinária 21 de fevereiro de 2014
25 Documento 54ª Reunião Ordinária 29 de abril de 2014
26 Documento 55ª Reunião Ordinária 27 de junho de 2014
27 Documento 57ª Reunião Ordinária 21 de outubro de 2014
28 Documento 58ª Reunião Ordinária 16 de dezembro de 2014
29 Documento 59ª Reunião Ordinária 22 de junho de 2015
30 Documento 60ª Reunião Ordinária 22 de setembro de 2015
31 Documento 2ª Reunião Extraordinária 18 de junho de 2009
32 Documento 3ª Reunião Extraordinária 31 de março de 2011
33 Documento 5ª Reunião Extraordinária 28 de maio de 2012
34 Documento 6ª Reunião Extraordinária 25 de setembro de 2012
35 Documento 7ª Reunião Extraordinária 21 de janeiro de 2013
36 Documento 8ª Reunião Extraordinária 19 de março de 2013
37 Documento 9ª Reunião Extraordinária 22 de julho de 2013

Fonte: própria autora

O objetivo da participação nas reuniões foi presenciar a dinâmica processual


do fórum, de forma a identificar as condições estruturantes que influenciam a
orientação da ação e os tipos de discurso, bem como as condições de simetria e
reciprocidade entre os participantes. Conforme salientado pela literatura, as técnicas
de observação sempre compreendem o pesquisador enquanto participante, seja
participando ativamente das atividades ou meramente observando os eventos, assim
a observação sempre envolve algum grau de interação social entre o pesquisador e
o fenômeno e pessoas pesquisadas (WADDINGTON, 2004). Foram observadas
nove reuniões, totalizando quatorze horas e cinquenta e seis minutos de áudio.

Considerando os pressupostos ligados ao corpo teórico do presente estudo,


as entrevistas estiveram orientadas pelas premissas da história oral, permitindo que
97

os sujeitos construíssem uma narrativa contextualizada acerca do seu papel


enquanto membros do fórum, além de permitir que compreendêssemos o ponto de
vista particular dos entrevistados sobre os tópicos da pesquisa (CASSEL, 2009).

Sobretudo, as entrevistas não seguiram regras fixas, possibilitando a


construção de sentidos por parte do pesquisador e entrevistados (GODOI e
MATTOS, 2006), por meio de um processo dialógico, que teve por definição o foco
na intepretação dos dados de forma contextualizada. As entrevistas não seguiram
um roteiro rígido, neste sentido foram elaboradas três perguntas de caráter genérico,
as quais serviram para orientar e organizar a condução das entrevistas (Apêndice B).
Foi conduzida uma entrevista com cada entrevistado, as quais resultaram no total de
quatro horas e trinta e um minutos de áudio.

Conforme Bauer e Gaskell (2002, p. 189) a análise documental, ou seja, o


material escrito, “do mesmo modo que as falas, referem-se aos pensamentos,
sentimentos, memórias, planos e discussões das pessoas”. Assim sendo, as
memórias das reuniões do fórum foram analisadas com o propósito de
complementação ou ratificação das informações levantadas nas entrevistas. Ao todo
foram analisadas as memórias de trinta e sete reuniões do fórum. Cabe ressaltar
que não estão disponíveis no site da SEMA as memórias anteriores a março de
2009, bem como as memórias da 47º e 56º reuniões ordinárias e da 4º reunião
extraordinária. A coordenadora informou que também não tem acesso os
documentos.

3.3.4 Procedimentos de tratamento e análise dos dados

Os procedimentos, métodos, ferramentas e softwares utilizados na análise


dos dados estão descritos a seguir.

Considerando o conceito de discurso segundo a teoria habermasiana, um


protocolo próprio de análise discursiva (Apêndice A) foi elaborado, visando
compreender como se dá a formação do discurso da sustentabilidade no processo
de planejamento público participativo da Agenda 21 do Paraná. O protocolo foi
98

construído com base na pragmática universal de Habermas e teve o intuito de


explorar os tipos de discurso – teórico, prático ou explicativo - empregados pelos
membros do fórum, as condições para a existência de reciprocidade, bem como as
pré-condições do campo argumentativo que influenciam o fórum enquanto um
espaço público político. Estes elementos foram submetidos a uma análise que
considerou: linguagem (materialidade do texto), ideologia (dos sujeitos enquanto
filiados a determinados discursos) e história (contexto sócio-histórico)
(COREGNATO e MUTTI, 2006). O protocolo foi aplicado na análise do corpus
formado pelas observações das reuniões e entrevistas.

O procedural da análise dos dados empíricos consistiu nas seguintes etapas:


1) elaboração do protocolo habermasiano de análise do discurso; 2) organização
dos dados; 3) análise dos dados por meio do protocolo; 4) análise do conteúdo das
memórias das reuniões e 5) interpretação dos dados. As etapas estão descritas a
seguir:

1. Elaboração do protocolo habermasiano de análise do discurso – Com


a finalidade de considerar todos os elementos necessários a uma análise
contextualizada do material empírico segundo a pragmática habermasiana, três
níveis da dimensão do fato social foram avaliados: nível do ato de fala, nível da ação
social e nível contextual. Para cada um dos níveis foram examinados elementos
capazes de interpretar a dinâmica de formação do discurso da sustentabilidade no
fórum segundo a pragmática habermasiana, bem como os parâmetros sócio-
históricos ligados ao processo de planejamento público participativo da Agenda 21
do Paraná. Tais elementos, quando tomados em conjunto, formam o esteio da TAC
enquanto uma teoria social que se preocupa com a emancipação dos sujeitos e a
descolonização do mundo da vida por meio do processo comunicativo pleno em
espaços públicos políticos.

Foram objetivos do protocolo, por meio do dimensionamento dos atos


comunicacionais e das pré-condições ao campo argumentativo, analisar o processo
de formação discursiva da sustentabilidade no Fórum Permanente da Agenda 21 do
99

Paraná e demonstrar quais são os mecanismos de coerção e dominação que estão


presentes neste processo.

No nível do ato de fala, foram dimensionados como relevantes para as


finalidades do presente estudo os constituidores-dialógicos universais, os quais
constituem as formas de intersubjetividade que tornam possível o entendimento
mútuo e que funcionam na pragmática universal como a base para uma situação
ideal de fala HABERMAS (1970). Mais especificamente, foram analisados dois tipos
de constituidores-dialógicos universais: a troca de perspectivas entre os
participantes da interação (por exemplo, a consideração do ponto de vista do outro e
a existência de relações interpessoais) e a e ausência de constrangimentos de
simetria (por exemplo: configuração hierárquica), objetivando avaliar o intercâmbio
de posições no diálogo e a ausência de constrangimentos estruturais da fala, os
quais em conjunto são os elementos necessários ao que Habermas denomina de
condição de intersubjetividade pura.

No nível da ação social, procurou-se capturar a presença dos pré-requisitos


a existência do discurso – atitude de cooperação e fundamentação baseada na
crítica às pretensões de validade - enquanto uma forma privilegiada do agir social e
catalisador do atingimento de consensos, livres de coerção pelo mundo sistêmico.

A análise dos tipos de discurso foi considerada relevante para a compreensão


das racionalidades empregadas pelos membros do fórum nos debates e
deliberações.

No nível contextual preocupou-se em capturar a existência das pré-


condições do campo argumentativo, caracterizado para fins desta pesquisa, como
sendo um fórum de interesses plurais onde a sociedade reúne-se para debater
sobre sustentabilidade. Principalmente buscou-se compreender os elementos que
caracterizam o fórum enquanto um espaço público político, isto é, um espaço plural
para a troca de opiniões de cunho político e formação de consenso sobre as ações
para o desenvolvimento sustentável no estado do Paraná.
100

2. Organização dos dados – A transcrição do áudio das nove reuniões


observadas e das cinco entrevistas conduzidas na etapa de levantamento de dados,
bem como as trinta e sete memórias de reunião foram organizadas por ordem
cronológica. Os áudios foram transcritos para documentos eletrônicos de texto,
usando o software Word. As atas disponibilizadas pelo governo estavam em formato
eletrônico PDF (Portable Document Format) e Doc (documentos do Microsoft Word).

3. Análise dos dados por meio do protocolo – Um protocolo individual de


análise habermasiana do discurso foi aplicado às transcrições das reuniões
ordinárias, oficinas temáticas e entrevistas realizadas. Não foram aplicados
protocolos às reuniões de GTT, pois nenhuma gerou uma quantidade de debates
que justificasse tal exame. Assim, dez protocolos foram preparados adotando-se o
seguinte método: cada quadrante do protocolo formado pelos três níveis de análise
(ato de fala, ação social e contextual) e elementos da TAC (reciprocidade, orientação
da ação, racionalidades e contexto político, social e histórico) foi analisado à luz do
conteúdo de cada transcrição, visando interpretar se e como os conceitos apareciam
ao longo dos eventos comunicacionais reuniões e relatos das entrevistas. As notas e
apontamentos da pesquisadora, pertinentes a este esforço inicial de análise e
interpretação, foram descritas em cada um dos protocolos, formando a massa de
dados que posteriormente serviu para embasar as conclusões que foram descritas
na seção quatro.

4. Análise do conteúdo das memórias das reuniões – Os principais


mecanismos de deturpação comunicativa, coerção e dominação que emergiram a
partir da aplicação dos protocolos de análise do discurso no corpus formado pelas
reuniões observadas e das entrevistas foram investigados nas memórias das
reuniões com a finalidade de reforçar e de contextualizar historicamente a existência
de tais inibidores à ação comunicativa e ao processo de participação pública no
fórum. Assim, os elementos pesquisados nas memórias de reunião foram: 1.
Ausência da participação do setor privado do fórum; 2. Mudança do foco para outras
iniciativas da ONU relacionadas ao desenvolvimento sustentável que não a Agenda
21; 3. Interesse estratégico dos membros em estabelecer algum grau de relação
101

com o governo estadual; 4. Participação da sociedade apenas no período em que


está ocorrendo algum evento relevante da ONU em contexto global e 5. Utilização
do fórum como instrumento de marketing político e institucional.

Neste sentido, a pesquisa eletrônica nos documentos procurou pelas


seguintes palavras: Federação das Indústrias do Estado do Paraná (FIEP),
Companhia Paranaense de Energia (COPEL), Companhia de Saneamento do
Paraná (SANEPAR), EMBRAPA, Federação da Agricultura do Estado do Paraná
(FAEP), Federação das Associações Comerciais Industriais e Agropecuárias do
Paraná, Organização das Cooperativas do Estado do Paraná (OCEPAR), Banco
Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE), Evildia Consultoria Ambiental,
Federação das Associações Comerciais e Empresariais do Paraná (FACIAP),
Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado do Paraná (SINDUSCON/ PR),
TIM Celular S.A. Organização das Nações Unidas (ONU), Objetivos do Milênio
(ODM), Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), Rio+20, Secretário,
eleição, eleitoral, governo.

5. Interpretação dos dados – Após a aplicação dos protocolos e da análise


das memórias das reuniões, os dados foram interpretados, possibilitando que as
conclusões assinaladas ao presente estudo, descritas no capítulo cinco, pudessem
ser alcançadas.

3.3.5 Facilidades e dificuldades na coleta e tratamento dos dados

A aproximação com a coordenação do fórum não foi um problema. Desde o


primeiro contato, os e-mails com as convocações das reuniões, pautas e convites
para eventos do fórum passaram a ser enviados para a pesquisadora. Não houve
restrições quanto a gravação do áudio das reuniões e entrevistas.

Como dificuldade de coleta pode-se considerar a impossibilidade de acesso


às memórias das reuniões do fórum entre a data da sua constituição e março de
2009.
102

3.3.6 Limitações da pesquisa

É importante reconhecer as restrições do protocolo habermasiano de análise


do discurso em termos da sua limitação cultural. Eventualmente não seria válido o
emprego de pronomes pessoais como um constituidor dialógico universal em
culturas de origem diversa à germânica, da qual Habermas é originário. Como
mitigador a essa limitação, além do emprego dos pronomes pessoais foram
considerados outros elementos para fins da análise sobre reciprocidade e de
constrangimentos de simetria, como a função ocupada formal ou informalmente
pelos membros, tempo de participação como membro efetivo do fórum e interesses
os quais os membros estavam representando.

3.4 ASPECTOS ÉTICOS ENVOLVIDOS NA CONDUÇÃO DA PESQUISA

Os entrevistados foram abordados a respeito do seu interesse em fornecer as


entrevistas, sendo que previamente ao início dos diálogos, todos os entrevistados
foram contextualizados acerca dos objetivos do presente estudo. Foi solicitada
autorização prévia da coordenadora do fórum para a gravação das reuniões do
fórum e de cada entrevistado para a gravação das entrevistas. A identidade dos
membros que foram entrevistados foi preservada, uma vez que os dados levantados
serviram ao cunho específico de embasar as reflexões e interpretações cabíveis ao
presente estudo.
103

4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Nesta seção estão apresentados os resultados obtidos a partir da análise dos


dados empíricos. Com o intuito de organizar a exposição da análise, organizamos a
apresentação por categorias analíticas relativas ao presente estudo.

4.1 CONSTITUIDORES DIALÓGICOS UNIVERSAIS

Durante as reuniões os membros do fórum referem-se uns aos outros por


meio de um tratamento pessoal, fator que representa um dos constituidores
dialógicos universais, os quais possibilitam condições para o que Habermas
denomina de intersubjetividade pura, e que abre espaço para o estabelecimento
de relações de confiança mútua e reciprocidade. A coordenadora e o coordenador
temático comumente referiram-se ao fórum como “nós”, o que pode demonstrar que
eles consideram o fórum como um ente coletivo que interage com outros atores
sociais, indicando que ambos reconhecem a existência de um “eles”, que neste caso
é representado pelas organizações, governo e sociedade civil organizada, e que
estes atores sociais têm expectativas bem definidas perante ao fórum, indica do a
troca de perspectivas. Demonstrações deste reconhecimento intersubjetivo de
papéis estão nos seguintes proferimentos: “pactuar o que de nós, se nós não
elaboramos o documento? “a gente precisa ter esse documento de referência para
orientar as ações do governo”. Por outro lado, em algumas situações mesmo com o
emprego de pronomes pessoais não houve a possibilidade de troca de perspectivas,
e a intersubjetividade pura não se verificou, como quando no debate sobre a
poluição sonora e visual, entre um membro de origem suíça e um membro que
representa uma ONG brasileira:

- Representante da ONG: “lá em Estocolmo tudo bem, mas olha o sol que
está fazendo hoje aqui”.

- Membro de origem suíça: “você está enganado, por que os faróis diminuem
em 30% os acidentes”.
104

Em relação aos constrangimentos de simetria, algumas questões se


destacam. Os debates nas reuniões limitam-se a poucos participantes, sendo
que durante as reuniões ordinárias, ocasião em que normalmente presencia-se o
maior número de membros, é comum os membros mais participativos 5 sentarem-se
nas cadeiras ao redor da mesa, junto com a coordenadora e com o coordenador
temático, e os demais ficarem sentados em cadeiras dispostas atrás da mesa. Por
exemplo, na 58º reunião ordinária, dos dezoito participantes, apenas sete proferiram
alguma sugestão, proposta ou comentário, permanecendo os demais apenas como
ouvintes.

Este fato sugere que a maior parte dos membros não se sente à vontade para
participar das discussões, muitas vezes sentindo-se constrangidos pelo fato de
não pertencerem ao grupo mais participativo, o qual é formado em sua maioria
por membros mais antigos. Além disso, a coordenadora por várias vezes
apresentou uma postura inflexível sobre as propostas que não estavam
refletindo a sua vontade, e por diversas ocasiões prevaleceu a sua determinação
como definitiva, revelando a assimetria de poder nas relações da coordenação
perante aos demais membros do fórum.

Evidência desta condição foi quando o fórum estava deliberando sobre a


proposta de minimizar os impactos das espécies exóticas invasoras, e mesmo após
vários argumentos técnicos como a urgência e o custo o financeiro tendo sido
apresentados por alguns dos membros presentes, a coordenadora, de maneira
bastante contundente e seguindo sua visão pessoal sobre o assunto,
desconsiderou a opinião dos demais e inseriu no texto que deverá haver a
observância de que o abate não deve ser a prática para se eliminar a invasão de
espécies não desejadas em determinada biodiversidade.

5
Os membros mais participativos, que são também os membros com mais tempo de fórum, além
dos coordenadores e do estagiário, são representantes das seguintes instituições: Instituto
GT3, Instituto Histórico e Geográfico do Paraná, CREA/PR, Secretaria de Ciência, Tecnologia e
Ensino Superior do Paraná, CEAD Poty Lazzarotto, Organização Ambiental Sócio Agro Arte
Cultural Brinque e Limpe e um participante ativo, não vinculado a nenhuma instituição/
organização/ entidade.
105

Em outra reunião, um membro informa sobre a existência do grupo de


estudos sobre mobilidade urbana da SEMA e sugere que se criem as articulações
entre o fórum e este grupo para uma melhor sustentação das propostas relacionadas
à mobilidade. A coordenadora contesta que no passado frequentou algumas
reuniões deste grupo e profere: “lá eles só sabiam falar de bicicleta”, descartando a
sugestão do membro em estabelecer um diálogo com este grupo, o qual poderia
gerar inputs ao conteúdo do documento Agenda 21 do Paraná.

Um indicador da existência de manipulação discursiva foi quando a


coordenadora repete para a mesma audiência em diferentes reuniões que o “papel
do fórum neste momento é “passar um pente fino nos documentos (...) identificar
lacunas, para construirmos esse documento da forma mais precisa possível”. Desta
maneira, suscita uma postura de reafirmação, em clara tentativa de convencer os
membros que estes devem investir seu tempo na revisão de um texto que já foi
escrutinado pelo fórum e pela sociedade em diversas ocasiões anteriores, e
que se precisa de algum ajuste, está no nível dos pormenores e não caberia o
tempo de mais um ano para uma nova revisão. Assim, a coordenadora parece
demonstrar que não reconhece nos demais participantes a mesma capacidade
de discernir, refletir e até mesmo agir acerca dos reais motivos que levam o fórum
a não ter entrado ainda na fase das pactuações das propostas com os atores
responsáveis – governo, iniciativa privada e cidadãos.

Outra forma de constrangimento que ficou evidente foi quando a


coordenadora fez uso da estrutura de poder, dizendo que iria tomar providências
sobre determinado pedido de um membro e não o fez, desta forma limitando as
ações do fórum aquilo que ela, na função formal de coordenadora, delimita
como prioridades. Exemplo desta situação foi quando um membro chamou atenção
para o fato da semana do dia 21 de setembro, período do ano em que
tradicionalmente as instituições membros do fórum realizam a Semana da Agenda
21 em suas instituições, estar se aproximando e até aquele momento o fórum não
ter se organizado a respeito, e a coordenadora comprometer-se em pensar sobre o
assunto e passar uma devolutiva ao fórum nos próximos dias, e não concretizar sua
106

promessa. Por outro lado, nos dias que se sucederam a essa reunião, a
coordenadora contatou os membros por e-mail para que se organizassem a respeito
de outro assunto e não mencionou a questão da Semana da Agenda 21. Assim,
percebe-se que a existência da coordenação formal, nesta situação, impediu que a
proposta de um participante tenha sido levada a diante, pois a condução ou
não da iniciativa havia ficado a cargo da coordenadora, demonstrando a
assimetria de papéis entre a coordenação e os demais membros do fórum.

Uma das práticas do processo de revisão do texto base do documento


Agenda 21 do Paraná é manter em realce amarelo as propostas para as quais um
consenso ainda não tiver sido obtido. O coordenador temático também lançou mão
do uso do seu poder não considerando como finalizadas as propostas que não
estavam de acordo com o que ele acreditava ser o mais correto. Por exemplo, ele
manteve o realce amarelo na proposta de capacitar gestores e conselheiros de
órgãos públicos para serem propagadores da Agenda 21 em suas instituições. Em
determinado momento o coordenador temático: “isso a gente pode melhorar ainda,
não estamos fechando o documento hoje”, mesmo após outros membros tendo
manifestado que, na opinião deles, a proposta estava concluída e deveria ser
mantida da maneira como estava.

A elaboração da pauta, bem como a convocação para as reuniões e outros


eventos e o processo de condução das reuniões consideram um modelo onde a
centralidade do poder formal que está na figura da coordenadora, função exercida
por um servidor público da SEMA, é o fator predominante para, por exemplo, a
fixação de prioridades e o estabelecimento do modus operandi. Neste sentido, a
configuração da estrutura é um elemento inibidor ao alcance de um discurso
representativo e livre de pressões sistêmicas, como o poder organizacional. A
coordenação direcionou as deliberações, fixou prioridades e tomou decisões
enviesadas pelos seus interesses pessoais e também amparada nas limitações
impostas pela SEMA, o que prejudicou o estabelecimento de relações de confiança
mútua e reciprocidade, necessárias ao atingimento de consensos segundo a teoria
habermasiana.
107

4.2 ORIENTAÇÃO DA AÇÃO E PRÉ-REQUISITOS AO DISCURSO

Não houve uma tendência geral, os membros agiram em algumas


ocasiões dispostos a ouvir e considerar o posicionamento dos demais sobre
os temas que mais geraram polêmica, mas em outras mantiveram-se
inflexíveis e sustentaram suas posições em critérios pessoais. Debates sobre
propostas controversas como o chemtrail, que é a poluição química de aeronaves, a
preservação de árvores nativas, alimentação de origem animal e o foco das
atividades econômicas na igualdade social geraram longos períodos de discussão,
onde os participantes baseavam-se em fundamentos ecológicos (preservação da
biodiversidade), econômicos (lucro das organizações como meta capitalista) e
sociais (resgate histórico dos hábitos alimentares de cada comunidade). Em muitos
casos, os argumentos não faziam sentido aos demais, ou por não cumprirem a sua
validez em alguma das dimensões do ato de fala, mas principalmente por serem
muitas vezes utopias que serão inatingíveis no momento em que o processo da
Agenda 21 Paranaense estiver na fase das pactuações de reponsabilidades, seja
com o governo, com a iniciativa privada ou com a sociedade civil organizada. Nestas
situações, os participantes atuaram de forma a advogarem a favor de seus pontos
de vista ou causas pessoais, não considerando os demais argumentos, ao contrário
de cooperarem para o entendimento comum. Percebeu-se que nestes casos, não
houve a possibilidade de se alcançar um nível de argumentação que
possibilitasse o consenso e as propostas permaneceram inconclusivas, para
serem deliberadas em próximas reuniões futuras.

Em contrapartida, na 59º reunião ordinária, principalmente na questão que


suscitou a maior controvérsia que foi a dos hábitos de consumo, houve espaço
para críticas bem fundamentadas e para o atingimento de consensos. Nesta
ocasião, uma proposta foi debatida por um longo período entre quatro membros com
argumentos muitas vezes diversificados, mas a partir dos quais os membros
procuravam convencer os demais com fatos e a partir de reflexões sobre a
sociedade moderna que, na maioria dos casos, acabaram por convencer a maioria.
Evidenciando essa situação, pode-se citar quando um membro aguardou por vários
108

minutos o debate entre outros três participantes e por fim apresentou seus motivos,
usando inclusive argumentos já colocados pelos outros e complementando-os com
outras considerações, mas de forma a fortalecer e apoiar, apesar de explicitar que
não necessariamente concordou com todos os termos colocados anteriormente
pelos demais membros. Demonstrou-se naquele momento que os membros
estavam engajados em uma atitude de cooperação para o entendimento,
situação que é um pré-requisito ao discurso, pois estavam dispostos a convencer
e serem convencidos a partir de bons argumentos sobre os hábitos de consumo
da sociedade capitalista moderna e seus impactos para a sustentabilidade.

O mesmo não ocorreu quando entrou em cena a figura da coordenação. Na


ocasião da 58º reunião ordinária, por exemplo, houve um longo debate sobre a
questão de como o fórum deveria considerar os impactos dos ODS no PLDS do
Paraná. Em determinado momento da reunião, um membro se posiciona a favor de
incluir os ODS como prioridade, uma vez que os mesmos, conforme exposto por ele,
representam a nova plataforma de acompanhamento do desenvolvimento
sustentável pela ONU. Nesta oportunidade, o membro fundamentou seus
argumentos com fatos concretos e proferiu suas colocações de maneira
compreensível, com exemplos técnicos e de forma clara. Porém, demonstrando
exasperação e incomodada com a fala do membro, a coordenadora rebateu que os
ODS não serão centrais para o fórum e que deverão ser considerados como um
assunto transversal às demais questões. Na sequência, o membro continuou
apresentando argumentos a favor da priorização dos ODS enquanto uma atividade
necessária ao processo de Agenda 21, porém a coordenadora não desenvolveu as
críticas recebidas com outros argumentos, dando a questão como encerrada. Este
exemplo reflete como o poder organizacional, como um dos mecanismos do mundo
sistêmico, afeta as relações comunicacionais, retirando do indivíduo a autonomia
para definir sobre as questões que ele próprio entende como importantes de serem
debatidas e trazidas para o centro das discussões.

A mesma situação se repete na 59º reunião, no debate sobre a proposta do


Estado incentivar uma dieta sem o consumo de alimentos de origem animal. Alguns
109

membros se posicionam contra, argumentado que o Estado não deve interferir na


opção de dieta da população. Especialmente, quando um membro claramente
declara que a opção de dieta não é um assunto que cabe a Agenda 21, a
coordenadora rebate com o seguinte proferimento: “é sim um tema de Agenda 21,
pois uma dieta que não tenha alimentos de origem animal é indispensável a
manutenção da capacidade do planeta de manter a vida das espécies que nele
habitam”. Mesmo após esta fala da coordenadora, outros membros se manifestaram
contra, proferindo argumentos de ordem histórica e biológica, porém a coordenadora
decide manter a proposta em aberto, para futuras considerações. Demonstra-se com
estas evidências que o discurso, enquanto o nível do processo argumentativo
que cria condições para o atingimento de consensos, e que tem como
resultado o acordo sem coerção, não se realiza uma vez que a coordenadora não
fundamenta as críticas recebidas com argumentos que convençam os demais
membros, ao contrário, ela encerra as discussões sem obter a concordância do
fórum, amparada no poder que a estrutura lhe confere.

4.3 FORMAS DE ARGUMENTAÇÃO E RACIONALIDADES

A racionalidade predominante que se observou nas reuniões do fórum


foi a teleológica, cuja pretensão de validade que se almeja justificar ou criticar
é a da verdade dos fatos ou eficiência das ações. Na maioria das reuniões
observadas os membros fundamentavam suas opiniões com exemplos e
empenhavam-se em comprovar seus argumentos por meio de justificativas,
exemplos e alegações, ou seja, fatos do mundo objetivo.

Sobre este aspecto, identificamos alguns momentos que ilustram esta


orientação. Na 58º reunião ordinária, a pauta principal era avaliar os resultados do
fórum no período da coordenação vigente e também elaborar o plano de trabalho
para o ano de 2015. Os proferimentos e os debates se deram em torno do propósito
de confirmar que a atual gestão realizou ações efetivas e importantes no contexto do
avanço da Agenda 21 Paranaense, justificando, de certa maneira, a existência
daquele espaço ao demonstrar uma lista de atividades realizadas no período, bem
110

como traçando o plano de atividades do fórum para 2015, a partir das demandas e
objetivos que principalmente são caros à própria coordenação.

Como fica evidente em sua fala, a coordenadora acredita que ter um


documento que represente o PLDS do estado do Paraná, neste estágio de
existência do fórum, é um requisito indispensável a continuidade do processo de
Agenda 21 do Paraná, assim as atividades para o ano de 2015 foram basicamente
definidas para que esse fim pudesse ser atingido. Ela defende esse argumento
baseada naquilo que ela própria julga ser necessário e verdadeiro, e não em algum
documento ou estatuto normativo. Além disso ela não explica suas razões de forma
que os demais membros compreendam toda a conjuntura, apenas profere que ter o
documento concluído para apresentar à sociedade é um imperativo. Ainda, na
Oficina Temática de Direitos Humanos e de Todas as Formas de Vida, quando
questionada sobre a não realização da Semana da Agenda 21 naquele ano, a
coordenadora justifica que aquele tem sido um ano difícil em função do seu estado
de saúde. Assim, naquele momento ela tenta sensibilizar o mundo interior de outras
subjetividades, especificamente a do membro que levantou a questão e também das
subjetividades dos demais membros presentes, e pôde ser julgada quanto a
veracidade dos fatos. Nesse momento presenciou-se o discurso teórico, sob a
perspectiva de a coordenadora estar fundamentando sua opinião em fatos que
ocorreram no mundo objetivo, uma vez que era de conhecimento geral o seu
afastamento por quatro meses devido a problemas de saúde.

Demonstrando que a forma de argumentação preponderantemente


empregada pelos demais membros também é pela via do discurso teórico, ou seja, a
argumentação baseada na eficácia, em vários debates travados na 59º reunião
ordinária os membros não modificaram suas ideias iniciais a partir dos argumentos
dos demais, ao contrário eles rebatiam às críticas com mais exemplos factuais
para que, amparados na orientação à eficácia das suas ações, pudessem
conduzir a manutenção do texto da proposta da maneira que eles compreenderiam
ser a mais adequada.
111

Em uma ocasião presenciou-se o discurso explicativo, tipo de


argumentação amparada na pretensão de compreensibilidade, que foi a
discussão sobre hábitos de consumo, a qual durou aproximadamente uma hora, ou
seja, um terço do tempo programado para a reunião. Os membros expuseram
argumentos tais como a ganância do modelo capitalista de produção e a
necessidade de uma maior consciência individual, explicando de maneira bastante
detalhada e minuciosa os significados dos motivos que os fizeram defender seus
argumentos.

O tipo de argumentação baseado na correção normativa, o discurso


prático, foi presenciado em uma oportunidade, quando dois membros debateram
sobre a proposta de que toda atividade econômica deve objetivar principalmente a
igualdade social. Neste caso, um membro argumentou que o objetivo das
organizações modernas é o lucro, conforme o modelo de reprodução do capitalismo,
e o contra-argumento do outro membro foi que o documento Agenda 21 global tem
por diretriz planejar ações para o século, e que a obtenção de lucro poderá, com o
passar do tempo, ser uma norma social suplantada. Neste caso, ambos ampararam
seus argumentos e puderam ser criticados quanto a pretensão de validade da
correção normativa contida nestes exemplares de regras e convenções (Agenda
21 global e as regras do modelo de produção capitalista).

4.4 ESPAÇO PÚBLICO POLÍTICO

Sob a ótica da teoria habermasiana, um espaço público político destinado ao


debate da sustentabilidade deve exercer a função de canal de transmissão e
influenciação do discurso da sustentabilidade que é produzido nas esferas
cotidianas para as esferas parlamentares, estando a tomada de decisão a cargo
destas últimas. Neste sentido, a seguir serão apresentados os resultados relativos a
análise do campo argumentativo, ou seja, das condições pré-linguísticas em que o
fórum está inserido, as quais assumem o lugar de contexto para a dinâmica
processual e deliberativa do fórum.
112

Desempenhar o papel de rede onde são engendrados debates e


deliberações sobre assuntos de ordem pública – A partir da observação das
reuniões ficou evidente que os assuntos estavam relacionados com o planejamento
do desenvolvimento sustentável do estado do Paraná. Não foram presenciados
debates que fugiram deste eixo principal, ou que estivessem ligados diretamente a
algum assunto privado ou de interesse de uma instituição em particular.
Especificamente foram tratados os seguintes temas: a) balanço das atividades e
planejamento das ações futuras do fórum, b) sugestões sobre adições, exclusões ou
melhorias no texto do documento Agenda 21 do Paraná e c) deliberações sobre o
conteúdo do documento Agenda 21 do Paraná.

Neste aspecto especificamente, o fórum acomoda uma situação em que os


pontos de vista dos cidadãos sobre o desenvolvimento sustentável, tema
essencialmente de ordem pública, podem ser recepcionados e debatidos em um
processo que garante a essência daquilo que é trazido do âmago do cotidiano e do
mundo da vida dos seus membros, para posteriormente serem transmitidos para as
instâncias formais de tomada de decisão política, na fase das pactuações de
responsabilidades. Neste ponto é pertinente ressaltar que o pano de fundo em que
os debates ocorrem está pautado na visão conciliatória entre interesses econômicos,
ambientais e sociais. A Agenda 21, os ODM e ODS são claramente a forma
encontrada pelo sistema para manter o desenvolvimento econômico como o grande
epicentro da sociedade moderna. A ideia conciliatória de desenvolvimento
sustentável, a qual permeia e embasa muitos dos argumentos empregados pelos
membros e, principalmente, em sendo a direção escolhida pela ONU, se tornou o
norte que está sendo perseguido na construção e consolidação da Agenda 21
Paranaense.

A ideia de desenvolvimento sustentável em si se mostra como uma forma de


coerção ideológica do mundo sistêmico, pois traz consigo a falsa promessa de que o
aprimoramento do modelo desenvolvimentista para contemplar questões ambientais
e sociais, mesmo de maneira adiáfora, é a resposta para se alcançar a
sustentabilidade. O membro do fórum, representante do CREA/PR possui a visão de
113

que as iniciativas da ONU são enviesadas para acomodar os interesses dos países
mais ricos e, portanto, a Agenda 21 do Paraná não deve necessariamente seguir as
disposições e princípios dos documentos oferecidos pela ONU, conforme trecho
abaixo:

Tenho sérias divergências sobre o fato dos países ricos decidirem para os
países pobres o que eles devem fazer. Essa Agenda 21 é para nós
cumprirmos e eles cumprem? Veja o clima. Por que eles não precisam
cumprir, está certo? Os dominantes? Isso vai ser sempre assim... Isso
interfere aqui no processo de intervenção da nossa soberania. Acho que
não precisamos seguir o roteiro da ONU, porque a ONU não conhece o
Brasil, nem o pessoal que está em Brasília conhece o Brasil. Precisamos
ver o que nós precisamos e queremos fazer para nós.

Outro membro, que representa o departamento de geografia da UFPR, na


discussão sobre a proposta de adquirir apenas produtos que são produzidos por
empresas que se preocupam com a sustentabilidade comenta:

Eu acho que a questão é mais complexa, o consumo é o que faz a moeda


girar. O modelo econômico atual, que só olha para o PIB e isso é o que
precisa mudar, o modelo precisa mudar. Quando a gente olha para essa
premissa de não ter consumismo, a gente está só pensando naquilo que
está fazendo essa roda girar e o ideal seria atacar em duas frentes. O ideal
é ter esse tipo de força para trocar a roda. Só que são duas frentes, uma de
cima e outra de baixo. A nossa forma aqui de atuar é a vinda de baixo, da
população, por isso que concordo com os colegas que falaram em mudança
de cultura, na educação. Mas de nada vai adiantar se não tiver gente
brigando lá em cima, grandes corporações, governos, etc e tal, para mudar
esse modelo. Pois o câncer é o modelo, essa ânsia, essa ganância de
querer crescer 10% todo ano. Crescimento chinês todo ano. Estávamos
discutindo esses dias atrás sobre o termo desmaterialização, é isso.

Apesar de haver isoladamente demonstrações de alguns membros contra o


modelo de desenvolvimento sustentável, as premissas e o contexto geral do fórum
funcionam sob a perspectiva principal de atrelar as propostas do PLDS do Paraná às
propostas e documentos sugeridos pela ONU, os quais estão predominantemente
respaldados na ideia conciliatória e ideológica de desenvolvimento sustentável.

Na visão do estagiário do fórum Agenda 21 do Paraná, o qual é estudante do


curso de Engenharia Ambiental, as propostas que estão sendo colocadas no
documento o torna "fraco e ineficiente", pois sugerem rupturas muito bruscas, para
as quais a sociedade não está preparada. Neste sentido ele diz que as pessoas que
ainda permanecem no fórum são muito "cabeça-dura". A reflexão que se faz sobre
114

esta afirmativa é a possibilidade de as pessoas que permaneceram após todos


esses anos pensarem a longo prazo, em mudanças grandes, porém necessárias.
Mas de fato a inércia, o borbulhar de intenções e propostas sem nenhuma ação
implementável no curto e médio prazo acabam dispersando o foco e enfraquecendo
a motivação da sociedade em vislumbrar a eficácia do fórum enquanto uma rede de
discussão das propostas para o desenvolvimento sustentável no estado.

Um ponto a ser destacado é que todos os entrevistados admitem que sua


história no fórum teve início a partir de suas buscas e engajamento pessoal em
causas ambientais ou sociais. Eles relatam que foram à procura de um assento no
fórum e não o contrário, alguns motivados pelo evento Rio+20 em 2012, outros
ainda antes, no período que deu início aos primeiros movimentos de constituição do
fórum, em 2002. Como cita um membro: “na verdade, você vai descobrindo esses
espaços, eu (...) ser político. Você vai descobrindo os espaços que cabem a você”.
Neste trecho o membro fez uma explanação sobre que ele próprio sugeriu à
instituição que hoje representa a sua participação no fórum e conta que
imediatamente teve o apoio do presidente e direção. Situação semelhante foi
narrada pelo coordenador temático, o qual mencionou que “desde que se conhece
por gente é ambientalista” e que partiu dele o pedido para participar do fórum
representando a instituição que trabalhava na época, a qual arcava com suas
despesas de locomoção e hospedagem, patrocinando sua participação naquele
período. Desta forma, o fórum acomoda o papel de estrutura encontrada por esses
cidadãos para expor suas perspectivas e sugerir propostas inerentes às suas causas
pessoais, que de todo o modo estão conectadas com as premissas do
desenvolvimento sustentável em um espectro maior.

Fazer a mediação entre as instituições parlamentares e os setores


privados do mundo da vida - O fórum tem como slogan “Sociedade e governo
estabelecendo limites e atitudes para assegurar a vida” (MEIO AMBIENTE, 2015), o
que representa nítida tentativa de aproximar a sociedade das instituições
governamentais formais na discussão sobre a sustentabilidade. Conforme o
documento formal que o institui, uma das atribuições do fórum é estabelecer formas
115

de implementação da Agenda 21 pelo governo e pela sociedade. Assim, o papel de


canal de transferência e influenciação é, ao menos formalmente, um objetivo do
fórum.

Por duas vezes durante as reuniões observou-se nas falas introdutórias da


coordenadora e do coordenador temático, que ambos compreendem e divulgam
essa função de mediação: “A gente não tem ainda o documento que irá nortear as
ações governamentais e empresariais”. “A gente precisa ter esse documento de
referência para orientar as ações do governo”. Os membros também esperam do
fórum o papel de influenciar o governo para assumir sua responsabilidade no
contexto do desenvolvimento sustentável, conforme fala um membro: “precisamos
usar o poder da caneta (do fórum) ” quando o fórum debatia sobre o desafio
relacionado ao que eles denominaram de “inoperância dos órgãos públicos”.

No entendimento da coordenação do fórum, há a perspectiva de que a


implementação das ações da Agenda 21 depende mais do engajamento da
sociedade do que da criação de políticas públicas, pois entende que o resultado do
processo de Agenda 21 para o estado do Paraná é o de criar as diretrizes gerais
sobre como o desenvolvimento sustentável deve ser conduzido no estado, e desta
forma orientar os municípios e instituições sobre seus processo locais de Agenda 21
e nesse sentido expõe: "a gente elabora as diretrizes para aí passar para os
municípios criarem as agendas locais, e começar de baixo para cima o movimento
de Agenda 21". Nesse ponto, apesar da contradição presente na fala da
coordenadora, pois se é um movimento que deve brotar das camadas mais
ramificadas, o processo local, ou seja, o municipal, não deveria ser dependente das
diretrizes do fórum estadual, que ela reconhece a necessidade do engajamento das
pessoas e não acredita que a criação de políticas públicas ou o comprometimento
da iniciativa privada sejam os fatores determinantes para o alcance da
sustentabilidade. Ela entende que os estados que já estão na fase das pactuações
das responsabilidades dos seus PLDS conduziram um processo equivocado,
objetivando mostrar algum resultado prático para a sociedade, e neste sentido cita:
116

"para limpar o rio (...) então podou as árvores, fez a pracinha não sei aonde (...)
mudou a vida da cidade?!".

Por conta deste e de outros depoimentos, parece que, na visão da


coordenadora, a Agenda 21 é um processo que deve iniciar com a mudança de
hábitos e valores da sociedade, pois salienta que os recursos para as ações que
foram feitas em outros estados podem ter origem duvidosa "uma coisa que vem de
cima para baixo, com um dinheiro que a gente não sabe da onde veio, hoje está
estourando aí e a gente sabe da onde veio". Ela usa outro exemplo para demonstrar
que o processo de Agenda 21 depende principalmente de as pessoas estarem
conscientes e engajadas, mencionando o fato de uma representante da casa civil ter
começado a participar das reuniões fórum, e que por não se tratar de representante
indicado pelo órgão estatal, esta pessoa não teria a obrigatoriedade de participar e
comenta: "então depende de pessoas, não é um projeto, não é um programa. É um
processo e um conteúdo. (...). É para o século, então se começarmos a mudar agora,
fixar outros valores, uma outra moral, a gente já consegue mudar muita coisa"
conclui.

Representar os diversos interesses da sociedade – O fórum é composto


por aproximadamente setenta e sete instituições, tais como, sindicatos, órgãos
públicos, universidades, associações, federações, além de cidadãos não ligados a
nenhuma instituição, os quais são denominados de participantes ativos. Porém, é
um número muito menor de instituições que são representadas nas reuniões, e
ainda mais reduzido é o das participações realmente ativas. Nas reuniões ordinárias
observadas, a média de participantes foi de vinte membros, sendo mais da metade
composta por representantes de instituições do governo, e em nenhuma havia
qualquer representante de instituição ligada a iniciativa privada ou de comunidades
tradicionais. As universidades também não participam ativamente, sendo que das
nove reuniões observadas em apenas uma havia um representante do
departamento de geografia da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Na ocasião
da 60º reunião ordinária, a representante da Universidade Estadual de Londrina
(UEL) solicitou à coordenação que proferisse verbalmente que a justificativa formal
117

de sua ausência era a falta de verbas, consequência do momento financeiro


desfavorável pelo qual a universidade estava atravessando naquele momento.

Adicionalmente, o único participante ativo, cidadão não ligado a nenhuma


instituição e que é de origem suíça, o qual profere ativamente sugestões e críticas,
por diversas vezes teve seus argumentos ignorados pela coordenação e pelos
outros membros do fórum. Exemplo foi quando ao sugerir a inserção de uma
proposta relacionada ao incentivo da agricultura urbana recebeu como resposta de
um membro da SEMA: “isso já é feito, todo apartamento já pode ter a sua hortinha
se quiser”, entretanto, é sabido que a existência do direito não significa que o fórum
não deva influenciar o governo a criar mecanismos de incentivo para que tal prática
se desenvolva em maior escala.

Assim, fica evidente que apesar de formalmente o fórum ter sido criado para
atender aos diversos interesses e contar com a pluralidade necessária ao processo
de articulação de propostas e planos de ação sobre o desenvolvimento sustentável
no estado do Paraná, o processo não é suprido pela argumentação de todos os
participantes e nem tampouco a maioria dos segmentos da sociedade está
efetivamente representada. Principalmente a iniciativa privada, a qual é diretamente
responsável e igualmente impactada pelas propostas que estão sendo sugeridas, e
que não tem participado da elaboração do PLDS do Paraná, fator que
invariavelmente prejudicará o sucesso da etapa de pactuação de responsabilidades.

A análise das memórias das reuniões revela que a participação das


instituições que representam os interesses da iniciativa privada é insignificante. Das
trinta e sete memórias de reunião analisadas, relativas aos encontros ocorridos entre
2009 e 2015, a Federação das Indústrias do Paraná - FIEP esteve presente em
quatro, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - EMBRAPA em oito, a
COPEL em seis, a Sanepar em quatro, a TIM S.A em uma, a Federação da
Agricultura do Estado do Paraná em duas e a Federação das Associações
Comerciais e Empresariais do Paraná em uma. Em geral, o setor privado se
manifestou nas reuniões pedindo objetivos e metas claras, conforme trecho da
memória da 34º reunião ordinária: “Neste contexto, Rafael Gava – FIEP comentou
118

que fosse aproveitada a oportunidade do momento, em termos dois Secretários de


Estado envolvidos com as temáticas de Agenda 21, (...), para definir metas e
objetivos claros (...)”. Na mesma lógica, o relato sobre a participação da TIM S.A, na
única reunião em que esteve representada, enuncia:

“Cleber Affanio se apresenta, dizendo ser sua primeira participação no


Fórum. Diz trabalhar há 14 anos na área de engenharia da empresa TIM,
mais focada na tecnologia de celulares. Diz ser uma pessoa prática e gosta
de trabalhar com objetivos e metas. (...), representando a empresa em
Fóruns e afins, governamentais e não-governamentais. Comenta que seu
objetivo maior é desmistificar alguns mitos da área ambiental”.

Conforme evidenciado pelo coordenador temático “praticamente 100% dos


processos de Agenda 21 esbarram no PLDS”, uma vez que é praticamente
improvável que as ações sejam implementadas sem que a iniciativa privada seja
envolvida do início ao fim, em um ciclo que inicia com a consciência individual dos
cidadãos e se completa na aplicação de sanções às organizações que não
cumprirem com a legislação, ou seja, um processo dependente de diversos atores,
em todos os níveis e segmentos da sociedade.

Ainda considerando a questão da pluralidade, um fato interessante é a visão


de um membro quanto a origem da Agenda 21 global. A entrevistada ressaltou que,
na sua concepção, a Agenda 21 foi idealizada por pessoas muito especiais. Teve-se
o envolvimento de chefes de estado em todo um contexto e ganhou-se amplidão,
mas quem a pensou e teve coragem de “pôr o dedo na ferida” foram pessoas cujo
interesse é o desenvolvimento sustentável per se e não outros motivos como o
poder ou vantagens financeiras. Comentou ainda que na Rio+20 o stand do fórum
ficou na cúpula dos povos, pois "o entendimento foi que o nosso lugar era junto do
povo, como um movimento legítimo da sociedade".

No relato de outro membro, a dispersão após a Rio+20 ocorreu devido à alta


concentração de atividades no fórum naquela época, e assim, depois de finalizada a
força tarefa, os membros tiveram que voltar para suas atividades de rotina. O
estagiário comenta que atualmente há casos de reuniões dos GTT em que nenhum
membro comparece. A baixa participação nas reuniões dos GTT pôde também ser
evidenciada durante as observações. Nos quatro GTT observados, a média de
119

participantes, além dos próprios coordenadores do fórum, foi de um ou dois


representantes de órgãos públicos, o que as tornou bastante improdutivas.

Outra questão colocada pela coordenadora, a qual esbarra na capacidade do


fórum de ser plural e participativo, é a impossibilidade de se agregar as opiniões e
propostas dos municípios mais afastados ou até mesmo de outras instituições fora
de Curitiba. Neste sentido, ela coloca que a coordenação anterior promovia eventos
com recursos que vinham de fora do governo, mas sempre a instituição que
patrocinava tinha algum interesse individual oculto, e comenta "eu prefiro deixar de
fazer um evento do que fazer uma parceira que eu tenho que ficar devendo alguma
coisa". Em outra passagem da entrevista, ela comenta que quando o fórum iniciou o
processo de elaboração do documento Agenda 21 do Paraná, em 2014, ela gostaria
de ter feito encontros regionais nos mesmos moldes que fez na época em que o
fórum elaborou o documento que foi enviado para a Rio + 20, chamado de Paraná: o
futuro que queremos, porém em função do corte de verbas precisou criar outras
formas de manter o processo o mais participativo possível.

Um exemplo da possibilidade de estender a participação da sociedade foi a


consulta pública realizada em maio de 2014, por meio da qual foram recebidas
muitas contribuições de municípios do norte pioneiro e de universidades. Neste
sentido, o processo de consulta pública se provou como uma forma de possibilitar a
participação mais ampla da sociedade, então a falta de verba para viagens não
deveria ser encarada como um bloqueio total a pluralidade. Uma contradição em sua
fala é o fato da coordenação manter um simples mailing list desatualizado como a
única ferramenta de divulgação do fórum, sendo que dentro da própria SEMA há
uma coordenação de comunicação que se dispôs, conforme termos da memória da
50º reunião extraordinária, a divulgar as ações da Agenda 21, o que certamente
demonstraria ao menos uma tentativa de ampliar a participação da sociedade nas
atividades do fórum. A coordenadora conta que queria ter atualizado esta listagem
de e-mails no início de 2015, mas o secretário não autorizou a emissão de ofícios
aos dirigentes das instituições que compõe o fórum. A coordenadora comenta: "a
gente sabe que tem gente que nem está recebendo mais o e-mail, já mudou, já saiu
120

da instituição". Ou seja, o Estado não apoia, mas mantém a Agenda 21 dentro de


seu raio de governança para impossibilitar que as ações sejam implementadas. Esta
é uma evidência de que o governo com o seu desinteresse em uma maior adesão
ao fórum protege os interesses do setor produtivo, o qual certamente será o mais
prejudicado se as ações forem implementadas. Neste sentido, a coordenadora
comenta: "Têm pessoas que entenderam muito bem a Agenda 21 e não a deixam
caminhar".

Ser autônomo e blindado quanto aos interesses particulares de grupos


dominantes – Alguns membros são mais participativos e colocam de forma mais
categórica e com maior frequência seus pontos de vista, os quais acabam
preponderando no contexto das propostas que permanecem como válidas e que
seguem adiante para serem incluídas no documento final. Neste sentido, esse grupo
acaba direcionando o conteúdo do documento, bem como a dinâmica do fórum, o
que ocorre de forma espontânea e sem contestação, seja por parte dos demais
membros ou da coordenação. Habermas evidencia que essa é uma condição natural
destes espaços, uma vez que muitos participantes assumem o papel de plateia,
porém esta condição isolada não afeta a autonomia dessas instâncias, uma vez que
o caráter público de sua constituição confere aos espaços a autonomia necessária
para resguardá-lo de interesses particulares.

Tanto o coordenador temático quanto a coordenadora, seguem uma dieta


estritamente vegana e são ativistas na causa do direito dos animais. Percebe-se que
esse direcionamento é muitas vezes colocado em primeiro plano tanto no julgamento
de ações dos processos de Agenda 21 conduzidos por outros estados ou
instituições, quanto durante a tomada de decisões no processo deliberativo do fórum.
Um exemplo desta postura foi comentado pelo coordenador temático durante a
entrevista, quando explicou sobre um processo participativo de planejamento para o
desenvolvimento sustentável conduzido pelo Instituto Paranaense de Assistência
Técnica e Extensão Rural (EMATER) no munícipio de Jaguapitã-PR, que ele avalia
como "muito interessante", mas que, porém, estava dentro de uma "visão
antropocêntrica, reativa e pontual", por não conceber a necessidade de uma
121

mudança na dieta da população. Neste sentido, a autonomia do fórum é prejudicada,


uma vez que os coordenadores são exemplo da não neutralidade de interesses, ao
contrário, na maioria das vezes suas visões acabam sendo a diretriz que é levada
em consideração nas análises e deliberações.

Nota-se a tendência dos membros em não contestar a postura inflexível da


coordenação. Em grande parte, uma das razões para essa postura pode ser a
predominância dos interesses do Estado, uma vez que, conforme relatado pela
própria coordenadora, as verbas para atividades como seminários regionais, ou para
custear o espaço físico dos eventos e outros gastos são diretamente custeadas pelo
governo. Neste sentido, problematizando sobre a falta de recursos para o ano de
2015, ela comenta “temos que ser criativos para atender o processo participativo
sem sair de casa”. Assim, a dependência de recurso financeiros do Estado, pode
estar impactando a dinâmica do fórum com a direta redução da sua autonomia.

A autonomia do fórum é igualmente prejudicada perante a postura


egocêntrica que assumem alguns membros, os quais participam apenas
argumentando a favor das suas próprias causas e desconsideram a defesa dos
interesses coletivos. Ainda, constata-se que o número de membros presentes é
maior nas fases em que o fórum discute novos temas introduzidos pela ONU.
Conforme comentado pela coordenadora, na 59º reunião ordinária, quando novos
programas ou diretrizes da ONU sobre o desenvolvimento sustentável tornam-se
populares, seja por sua importância em si ou pelo destaque que recebem da mídia,
o número de participantes aumenta consideravelmente.

Este relato evidencia que o entendimento sobre questões públicas, a partir da


orientação de cidadãos ao atingimento de consensos, passa a ser secundária, uma
vez que os membros utilizam o fórum como porta de entrada à uma estrutura
intermediária que possibilitará sua atuação no assunto do momento. Conforme o
relato de um membro: “O fato da ONU criar outros marcos, outras definições e metas
ao longo do tempo implica na mudança de foco por parte da sociedade, devido ao
ego humano que precisa agir naquilo que é o assunto da vez”. Porém, verifica-se a
contradição na sua fala, pois este mesmo membro mencionou, ao recompor sua
122

trajetória no fórum, que procurou a coordenação no início de 2012, época da


estruturação do Comitê Paranaense para a Rio+20, pois entendia que a sua
participação como membro do fórum seria “uma oportunidade para construir um
documento que traduzisse os anseios e as expectativas da população Paranaense
para a Rio+20”. Fica evidente, portanto, que o fórum é muitas vezes visto apenas
como uma estrutura capaz de conectar as pessoas e instituições mais facilmente ao
contexto das iniciativas da ONU, e que esta condição por vezes ultrapassa a
motivação em fazer parte de um espaço cujo objetivo essencial é de servir de
instrumento de planejamento do desenvolvimento sustentável para o estado do
Paraná.

A coordenadora também menciona que uma das questões que influenciam a


autonomia do fórum é a sucessão de novos projetos da ONU. Neste sentido ela
relata: “quando a ONU lançou os ODM ela praticamente pisou na Agenda 21". Em
sua opinião, ODM, ODS, pacto cidade sustentável e outras iniciativas da ONU, nada
mais são do que ações de Agenda 21. Desta maneira, a própria ONU colabora com
o enfraquecimento do instrumento Agenda 21. A grande ênfase que é dada às
iniciativas da ONU, em clara inclinação do fórum em alinhar suas atividades com as
mudanças ou novos itens incluídos na agenda daquela entidade ficou evidente
também na análise documental. A tabela abaixo resume a quantidade de repetições
dos termos ligados a estas iniciativas nas memórias das reuniões do fórum:

Tabela IX: Busca por termos relacionados às iniciativas da ONU nas


memórias das reuniões do Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná
Quantidade de
Termo
repetições
ONU 8
Objetivos do Milênio - ODM 4
Objetivos do Desenvolvimento Sustentável - ODS 3
Rio+20 16

Os termos ODM e ODS apareceram em deliberações sobre a necessidade de


o fórum estabelecer grupos de trabalho visando alinhar as propostas da Agenda 21
do Paraná com os objetivos da ONU. O termo Rio+20 esteve em evidência
123

principalmente durante os anos de 2011 e 2012, época em que o fórum esteve


dedicado praticamente em tempo integral a elaborar o documento que objetivou
apresentar o Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná na Rio+20. Dentre outras
motivações para a criação desta frente de trabalho estava a preocupação de que a
Rio+20, desconsideraria a Agenda 21 de suas prioridades, conforme memória da
41º reunião ordinária: “a tendência, ou pelo menos é o que parece, é que a Rio+20
não aborde o tema Agenda 21, ou seja, desconsideraria 40 anos de trabalho, desde
a primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente em 1972”.

Fica evidente com base no relato dos membros e da coordenação, e também


pelo volume de tempo dedicado pelo fórum às atividades relacionadas as novas
iniciativas da ONU, que a criação de novos programas, plataformas e agendas para
o desenvolvimento sustentável em escala mundial provoca retrabalho, desvio de
foco e o desgaste do processo de criação da Agenda 21 pelo fórum permanente do
Paraná.

A coordenadora revela que seu trabalho inclui prestar contas das atividades
do fórum para a SEMA e outros órgãos do estado, como as Secretarias de Estado
do Desenvolvimento Urbano e do Planejamento. Neste sentido, o fórum está
subordinado em grande parte aos interesses do governo, já que este entende que
por injetar algum recurso por menor que seja pode esperar retorno imediato para sua
gestão, por meio da publicidade das ações e resultados obtidos pelo fórum. A
coordenadora comenta sobre o período em que assumiu a função: "Entendi que eu
teria que fazer a coordenação do fórum e a coordenação da Agenda 21 na SEMA”.
O estagiário relata que o fórum é periodicamente cobrado pelos funcionários da
SEMA e cita: “o secretário vivia pedindo relatórios do que tinha sido feito e tudo mais
porque precisava levar para frente". Em sua opinião, o fórum acaba sendo uma
possível fonte de resultados para a gestão dos secretários e governador.

O fórum foi formalmente constituído, bem como é uma expectativa e


pressuposto das ações conduzidas que uma das suas funções essenciais é
justamente aproximar as propostas que nascem no cotidiano da vida em sociedade
da pauta de decisões de cunho político. Porém, os membros entrevistados, bem
124

como os coordenadores admitem que a principal dificuldade para a efetivação de


uma mediação concreta é a inexistência de uma cultura política de Estado. Eles
explicam que os assuntos públicos são encarados como programas de governo e
em muitos casos a Agenda 21 funciona como instrumento de publicidade para
determinada gestão. Neste sentido um membro relata:

“Não trabalhamos com políticas públicas pensadas enquanto políticas


públicas de Estado, mas sim com programas de governo que têm início e
fim, e que a próxima gestão, aquele grupo que assume o poder em
determinado momento com interesses distintos, acaba simplesmente
desconsiderando que existe uma história que deveria ser considerada a
partir dali."

A coordenadora expõe que mesmo sem uma adequada destinação de verbas,


o governo entende a Agenda 21 enquanto um projeto de governo que pode gerar
benefícios estratégicos e cita: "então eles querem criar um projeto que em um ano
tenha começo, meio e fim. Ou que tenha quatro anos, mas que fique na gestão, que
sejam projetos de governo, e a Agenda 21 não é do governo." Ela menciona que
cada secretário de estado do meio ambiente tem uma visão sobre a Agenda 21, há
aqueles que visualizam a sua totalidade e apoiam a condução de um processo
participativo de planejamento e gestão do desenvolvimento sustentável para o
estado, há os que reduzem a Agenda 21 a um projeto de curto prazo e de meio
ambiente, tentado extrair algum benefício direto para a sua gestão, e há ainda
aqueles que não apresentam interesse algum:

"Nesses primeiros quatro anos do governo Richa nós tivemos três


secretários do meio ambiente, cada um com uma visão de Agenda 21. Um
dava todo o apoio e queria a Agenda 21 em todos os municípios, o outro
falou para eu esquecer a Agenda 21 e elaborar uma coisa para os bichos,
que era mais prático, o terceiro ia ficar só nove meses e estava interessado
em outras coisas, o que eu fizesse estava bem feito. Inclusive, amigo
pessoal, mas nós aqui não interessávamos para ele, porque a Agenda 21
não rende investimentos. "

O coordenador temático comentou que na gestão anterior, a Agenda 21


funcionava como propaganda para o governo Requião. Ele cita que a coordenadora
à época incentivava que cada instituição elaborasse sua própria Agenda 21, e
viajava pelo estado disseminando esse desejo nas empresas, universidades e
outras instituições. No período de 2009 a 2010 o fórum se dedicou a criação de um
guia chamado Agenda 21 Empresarial, atividade bastante citada nas memórias das
125

30º, 32º, 33º reuniões ordinárias e 5º e 6º reuniões extraordinárias. Por ocasião da


45º reunião ordinária verificou-se a presença de uma consultora, a qual apresentou
uma proposta de planejamento para o acompanhamento do Guia Agenda 21
Empresarial. No mesmo período cogitou-se criar uma espécie de selo, do qual
seriam merecedoras as instituições que tivessem implementado suas Agendas 21,
conforme relatado pelo coordenador temático, a ideia não foi implementada devido à
dificuldade no estabelecimento de critérios para a contemplação do selo.
Organizações como o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Paraná
(CREA/PR) e a Ordem dos Advogados do Brasil/PR (OAB/PR) escreveram seus
próprios documentos de Agenda 21, feito que foi reconhecido pela gestão anterior
como uma importante conquista, mas pela atual gestão como uma possível forma de
greenwash ou de marketing verde, postergando ou delegando a segundo plano os
desenvolvimentos mais fundamentais da Agenda 21 no estado. Ele ainda cita o
Pacto 21 Universitário como um instrumento de promoção das ações
governamentais.

Este documento, que representou um acordo entre universidades públicas e


privadas e o governo do Paraná para a implementação das Agendas 21 no âmbito
das Instituições de Ensino Superior (IES), foi assinado em 2007 durante uma
cerimônia solene em que estavam presentes a então ministra do meio ambiente,
Marina Silva, e o ex-governador Roberto Requião. E contextualizando estas ações
da gestão anterior enquanto instrumentos estratégicos de governo comenta: “a
coordenadora da gestão anterior era quase uma garota propaganda da Agenda 21.
Ela era do grupo político do Requião e divulgava a Agenda 21 em eventos locais e
fora de Curitiba”.

O uso das ações do fórum como elemento de divulgação de resultados da


gestão pública também fica evidente nas memórias das reuniões. Em duas reuniões
ordinárias do fórum, a 34º e a 35º, ambas no ano de 2010, foi registrado o
estabelecimento de um grupo de trabalho destinado a discutir como conectar os
programas e projetos de governo aos temas norteadores da Agenda 21 por meio da
construção, em parceria com a Secretaria de Planejamento, de uma cartilha
126

denominada “O que o Paraná tem feito”. A iniciativa teve como propósito dar
visibilidade as ações governamentais de referências ao século XXI”, conforme os
termos da memória da 35º reunião ordinária.

Assim, existem importantes obstáculos para a transferência de ideias e


saberes sobre o desenvolvimento sustentável para as instâncias de tomada de
decisão política, pois apesar do fórum formalmente existir para atuar como este
canal, tal condição é sensível ao perfil de cada gestor público, e em um contexto
maior ainda, é diretamente impactada por uma cultura política de curto e médio
prazo. Além do mais, a Agenda 21 em muitas ocasiões foi usada como instrumento
de marketing político e institucional, denotando o interesse distante, por parte do
poder público, em perceber o fórum como um canal de entrada das ideias e
propostas originadas pela sociedade a respeito do desenvolvimento sustentável do
estado do Paraná.

A autonomia dos reais interesses do fórum foi também prejudicada no período


em que houve a troca de coordenação. O entendimento, o processo e o foco
passaram a ser diferentes. Neste sentido, muitos membros acabaram por não
participar mais, além disso houve um período de tempo gasto com a reorganização
dos temas norteadores e outras diretrizes de trabalho. Questionado sobre o motivo
que levou o fórum somente após nove anos de sua existência e da obrigatoriedade
por parte do decreto que o cria, iniciar a elaboração de um documento de Agenda 21
para o Paraná, o coordenador temático responde que o entendimento da gestão
anterior era outro. Neste ponto fica evidente que o governo federal ao não
estabelecer diretrizes para os Estados contribui para a ineficiência do processo de
Agenda 21. Desta forma, é evidente a pressão que o Estado exerce, seja através do
empoderamento sobre as atividades do fórum ou de um duvidoso desinteresse,
sobre um espaço público que deveria existir livre de coerções e pressões sistêmicas.
Além disso, outra condição que deve ser atendida por um espaço público, que é a
de estar fora dos limites das instituições estatais, também é comprometida, pois
tanto o espaço físico, quanto a coordenação das ações do fórum estão sob o
domínio do governo do estado do Paraná.
127

Os interesses de alguns segmentos de mercado também é um fator que


impede a autonomia do fórum, e neste sentido a coordenadora relata inclusive que
“trabalha quieta”, isto é, sem dar entrevistas sobre o fórum, pois sabe que se fizer
muita divulgação irá alertar forças contrárias que terão o poder de enfraquecer mais
ainda a autonomia do fórum. Neste sentido comenta: "por isso que eu trabalho
quietinha, (...). É uma estratégia, não tenho problema nenhum em dar entrevistas, de
toda semana sair em uma matéria (...), mas não tenho dúvidas que isso prejudicaria
mais que ajudaria”.

Novamente revela-se a dificuldade que deverá ser encontrada na fase das


pactuações, pois para influenciar as mudanças, a Agenda 21 deverá manter um
relacionamento estreito com esses segmentos e instituições do mercado. Quando
questionada porque esses segmentos (setor privado) não participam do fórum, ela
responde: “Eles ficam na espreita e se a Agenda 21 começar a aparecer muito, eles
dão um jeito de abafar." O coordenador temático comenta que em toda sua
experiência como ativista ambiental e agora na Agenda 21 também, percebe que
alguns grupos usam o conhecimento para não deixar que a causa dos problemas
seja eliminada, pois lucram com ações paliativas e comenta: "porque quem vive de
limpar a praia, na hora que não tiver mais sujeira na praia, vai fazer o que para
ganhar a vida? Outra evidência da pressão do mercado, com impacto imediato na
autonomia do fórum é o relato feito pelo coordenador temático de que no início do
fórum eles conheceram professores da UFPR e consultores que saíram “vendendo”
Agenda 21 nos municípios. Neste sentido, o estagiário do fórum ainda relata que
presenciou a participação de pessoas com interesses estritamente estratégicos no
fórum e comenta:

“Muitas pessoas enxergam o fórum como uma porta de entrada para o


poder público e acabam indo participar das reuniões muitas vezes sem ter
nenhuma contribuição efetiva, mas para simplesmente fazer contatos, pedir
favores, apresentar projetos, e no final das contas, obter algum benefício
estratégico naquela relação com o fórum, que de fato está dentro de uma
secretaria de governo”.

Em se tratando ainda de interesses alheios aos anseios da sociedade por


iniciativas concretas que visem o desenvolvimento sustentável, os relatos dos
membros e coordenadores ensejam a conveniência encontrada por alguns grupos
128

em usar fóruns globais e locais para retardar a implementação de ações efetivas que
possam ser contrárias aos seus próprios interesses. Neste sentido, um membro
expõe que a criação de novas iniciativas pela ONU é um indicativo das vantagens
que são aproveitadas por pessoas ou grupos ou até mesmo por instituições, com
essas mudanças, e comenta:

“Há interesses por trás destas iniciativas, de alguns grupos. Assim quando
passa a não ser mais vantajoso, mudam o foco. (...) porque isso contempla
interesses de outros, em determinados seguimentos alguém ganha com
isso. A Agenda 21, enquanto instrumento de implementação de ações, vai
contra o interesse de grandes setores produtivos, como é o caso do
agrobusiness, que perderia bilhões caso por exemplo uma dieta menos
restrita a proteína animal fosse incentivada. A agenda 21 vai contra o
interesse de grandes organizações (...). Temos uma grande indústria da
carne, a palavra de ordem é o agronegócio em termos de Paraná e de Brasil.
É a indústria frigorífica que mobiliza bilhões nesse país. Então são grandes
interesses em jogo e nós acabamos sendo cidadãos sonhadores, que
pensamos nesse futuro comum, em que todos se reconhecem como seres
de direitos e deveres".

Os exemplos anteriores, os quais revelam forças muitas vezes ocultas do


governo e do mercado, são situações que demonstram a existência concreta e direta
de pressão por parte dos elementos poder e dinheiro no processo de democracia
deliberativa, forçando uma relação equivocada da sociedade com o processo
participativo da Agenda 21. Isto evidencia a colonização do mundo da vida, ao qual
Habermas atribui como a principal causa para o bloqueio da racionalidade
comunicativa, indispensável aos avanços na direção de uma realidade social
emancipatória.
129

5 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

Centralizado em avançar na compreensão da dinâmica de um modelo de


participação popular para a elaboração do plano de desenvolvimento sustentável do
estado do Paraná, o presente estudo revelou as contradições inerentes ao processo,
bem como indicou elementos sob os quais o discurso da sustentabilidade está
sendo construído no fórum, um espaço de participação popular que na prática se
mostrou como mais um espaço colonizado por pressões do mundo sistêmico.

Apesar das contradições, evidentes em muitos aspectos estruturais,


processuais e contextuais do fórum, a existência do fórum representa um avanço a
consolidação de um modelo de vida menos degradante ao meio ambiente e às
condições sociais, pois estando o fórum acessível a qualquer cidadão, os assuntos
inerentes à sustentabilidade podem ser criticados e planejados por vário setores e
níveis da sociedade. Portanto, o fórum é um acontecimento positivo, pois ele se
apresenta como a possibilidade para que o discurso da sustentabilidade não seja
construído apenas dentro dos limites das fronteiras dos altos-escalões políticos e
corporativos.

O Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná nasce a partir da necessidade,


instituída pelo compromisso assumido pelo governo Brasileiro na Rio-92, de
estabelecer os meios para que se consolidassem em território nacional as Agendas
21 locais, partindo da lógica de que a sustentabilidade é um objetivo que deve ser
pensado de forma global, porém realizado localmente. Desta maneira, o fórum foi,
naquele momento, a resposta do governo estadual às demandas da esfera federal,
que por sua vez assinara a Agenda 21 Global, juntamente com outras 179 nações.

Porém, talvez a principal inquietação que persistiu desde as fases iniciais do


presente estudo é por que, mesmo após os onze anos de existência formal do fórum,
o discurso da sustentabilidade que nasce no processo de Agenda 21 do Estado do
Paraná ainda não ultrapassou as fronteiras dos debates travados por um grupo
devotado à certas causas sociais e ambientais, para a condição de um plano de
médio e longo prazo, elaborado e acordado entre os segmentos da sociedade que
130

são igualmente impactados e responsáveis por sua implementação? Foram diversos


os exemplos das situações que respondem a essa questão, os quais brotaram tanto
da observação da dinâmica do fórum, como do seu resgate histórico.

A macro figura que representa os mecanismos de coerção e dominação que


impedem o fórum de servir como um a arena autônoma e plural destinada a alcançar
uma proposta emancipada sobre a sustentabilidade é composta por duas dimensões.
A primeira corresponde a vigilância do governo, seja por meio da imposição de uma
configuração burocrática, a qual está estruturada estrategicamente por uma situação
de controle velado, ou de descaso explícito, que se revela principalmente na
ausência de recursos destinados a propagação e a efetivação de uma pauta de
governo dedicada ao planejamento e a gestão das propostas contidas na Agenda 21.
A segunda reproduz as artimanhas do mercado, que ora se manifesta por meio do
silêncio da iniciativa privada, o que faz protelar as ações que invariavelmente
reduziriam o potencial de crescimento indeterminado das organizações, outras vezes
pela oportunidade que o fórum representa de empresas ou profissionais autônomos
iniciarem algum tipo de relacionamento utilitarista com o governo. O que, na
perspectiva do discurso da sustentabilidade, segundo a teoria habermasiana, denota
que o mesmo é construído por sujeitos que agem pautados na racionalidade
estratégica, onde o cálculo utilitário de consequências aparece como elemento
central e decisivo.

Apresentando as conclusões que puderam ser alcançadas, a seguir estão


sintetizados os tópicos que procuram responder as questões levantadas no presente
estudo:

Mecanismos de coerção e dominação – Representam as formas


encontradas pelo mundo sistêmico para oprimir, protelar e esvaziar o conteúdo de
uma agenda composta de propostas concretas de curto, médio e longo prazo
voltadas ao reestabelecimento de uma forma de vida menos degradante, tanto social
quanto ambientalmente. Os principais mecanismos que emergiram da pesquisa
foram: a) Amparo nas premissas e direcionamentos da ONU, os quais são guiados
pela noção conciliatória de desenvolvimento sustentável, a qual representa m sim
131

mesma um instrumento de dominação ideológica; b) organização burocrática e o


estabelecimento de uma coordenação formal ligada ao governo estadual (que atua
de maneira deliberadamente inflexível, ignorando ou contrariando as sugestões e
pontos de vista dos membros do fórum); c) a ausência de diretrizes e
enfraquecimento do assunto Agenda 21 por parte do governo federal, deixando a
cargo dos estados e municípios a elaboração, implementação e gestão dos seus
PLDS; d) quando favorável, a gestão pública usa a Agenda 21 como forma de
marketing governamental e as organizações como uma espécie de selo da
sustentabilidade; e) absentismo da iniciativa privada nas atividades da Agenda 21
do Paraná, revelando clara tentativa de pormenorizar a importância do assunto e
com isso diminuir o potencial de implementação do PLDS; f) interesses estratégicos
dos membros do fórum; g) redução da importância da Agenda 21 em nível global,
como uma consequência das novas iniciativas e projetos lançados pela ONU.

Diferentes tipos de discurso e a comunicação sistematicamente


deturpada – Claramente os atos de fala, as argumentações e por fim, a
impossibilidade da existência do discurso, caracterizado por Habermas como uma
forma privilegiada do agir social, estão pautados predominantemente na
racionalidade teleológica. A reciprocidade, como consequência da mútua confiança
que poderia se estabelecer entre os membros do fórum e do fórum para com seus
interlocutores é perdida quando entram em cena elementos estruturais, mais
precisamente a hierarquia que, mesmo de forma disfarçada, é latente nas relações
da coordenação com os membros e dos membros mais participativos com os demais,
ou daqueles que representam instituições do governo, com aqueles chegados mais
recentemente ou que não pertencem a nenhuma instituição.

Na maior parte das situações observadas, os membros proferiram suas falas


objetivando o êxito de suas ações e sem qualquer demonstração de estarem
orientados ao mútuo entendimento. Quando houve situações em que o fórum
poderia ou deveria se inter-relacionar com atores externos, não se evidenciou uma
postura de cooperação, que considerasse as razões dos outros sujeitos para depois
concluir sobre a melhor decisão para o bem coletivo, ao contrário, as decisões foram
132

baseadas na visão individual da coordenação. A ação estratégica presente nas


interações do fórum conduz a cenários propícios para a comunicação
sistematicamente deturpada. Apesar de tanto a coordenação quanto os membros
acreditarem que a base para o consenso existe, mesmo quando há vários elementos
que claramente demonstram o contrário, fica evidente que os membros enganam a
si próprios, encobrindo o fato de que o fórum não está atuando em um contexto
plenamente livre, plural e de ações efetivas em busca da transferência do discurso
que é construído no âmago da sociedade para as instâncias parlamentares.

Motivos que impedem o fórum de desempenhar seu papel de


instrumento de participação pública participativa – Há que se reconhecer que a
existência do espaço é uma condição que por si própria representa algum avanço,
pois representa uma tentativa de reunir cidadãos comuns para manifestarem suas
ideias e posteriormente transmiti-las para a agenda público-parlamentar. Um avanço
tímido e certamente sensível a coerções e dominações, mas que revela, dentre
outras coisas, que o governo brasileiro, mesmo que em função da pressão de um
movimento de proporções históricas que foi a Rio-92, algumas instituições e
cidadãos comuns, engajados em certas causas ambientais ou sociais, estão
dispostos a conversar e estabelecer uma agenda de ações em benefício da
sustentabilidade. A proposta tem genuinamente a concepção do que o Habermas
acredita ser uma possível saída à colonização do mundo da vida, uma reunião de
pessoas que representam interesses diversos em prol do debate de um assunto de
caráter público. Mais precisamente no âmbito desta pesquisa, da discussão de
questões que claramente representam uma força contrária a lógica propagada às
custas da ideologia capitalista, pois entendemos que a implementação de um estilo
de vida menos consumista, citando apenas um dos exemplos das propostas que
estão sendo discutidas no PLDS do Paraná, prejudicaria as organizações
burocráticas, as quais representam um dos principais escudos da lógica de
perpetuação do capitalismo moderno.

Contudo, o que se evidencia é que, em um contexto maior, o sentido de


espaço público político se perde em meio as inúmeras formas encontradas pelo
133

sistema de paralisar as iniciativas que podem impactar negativamente a sua


perpetuação. Entretanto, não se pode desconsiderar que o fórum nasce de um
desejo legítimo da sociedade, que consiste em dar voz aos vários interesses e,
desta forma, estabelecer uma agenda de obrigações e direitos, por meio de
propostas concretas rumo a um padrão de sociedade menos agressivo para o meio
ambiente e para as relações entre os seres que habitam o planeta.

Percebe-se que a pluralidade e a neutralidade de interesses são condições,


neste momento do fórum, inatingíveis. Evidência disto é que os interesses das
comunidades tradicionais, como os indígenas, caiçaras, ribeirinhos, faxinais, dentre
outras, que historicamente se mostram como as mais susceptíveis às consequências
da colonização pelo mundo sistêmico, não estão representados no fórum.

Além disso, o bloqueio operado pelos interesses do mercado, seja por meio
da não colaboração para a elaboração e implementação da Agenda 21, ou em um
contexto maior ainda, na condução, mesmo que indireta, da pauta política, conduz o
fórum a permanecer em um estágio incipiente de ideias, mas que muito
provavelmente não serão objeto de avaliação pelos atores mais influentes –
organizações e governo. Em outras palavras, o plano local de desenvolvimento
sustentável para o Paraná deveria estar sendo concebido por meio de um processo
deliberativo que considera os melhores argumentos, e que não se enfraquece com a
artimanha retórica de grupos dominantes, que estrategicamente devotam seus
interesses às estruturas simbólicas do sistema capitalista: Estado e Mercado. Mas,
na prática, o Fórum Permanente da Agenda 21 do Paraná verifica-se como um
espaço incapaz de transcender as dificuldades de se agir comunicativamente, ou
como Habermas sugere, de agir para evitar a penetração do mundo da vida pela
rigidez do mundo sistêmico.

Cabe ressaltar que um esforço adicional, porém fora do escopo que se propôs
cobrir com esta pesquisa, seria necessário no sentido de avaliar o papel que os
espaços de fala ligados a sustentabilidade, porém não vinculados formalmente ao
governo, teriam na construção, fortalecimento e propagação de um discurso menos
enviesado pela estrutura forma burocrática e mais socialmente representativo.
134

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APÊNDICE A - Protocolo Habermasiano de Análise do Discurso

Fonte: própria autora


141

APÊNDICE B - Roteiro de Entrevistas

Entrevistado:

Instituição:

Data:

Local:

1. Como iniciou a sua participação no fórum?

2. A estrutura, processo e dinâmica de trabalho são compatíveis com o que se


busca do fórum, em termos de servir como um instrumento de planejamento
participativo para o desenvolvimento sustentável no estado?

3. Como você vê a Agenda 21 no contexto atual sobre a busca pelo


desenvolvimento sustentável?

Fonte: Própria autora

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