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Artigo Original – Original Article

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ÀS IMAGENS, AS SOMBRAS DO PORVIR: 30 anos da Reforma
Psiquiátrica brasileira

TO PICTURES, THE SHADOWS OF THE FUTURE: 30 years Brazilian


Psychiatric Reform

Laércio Melo Martins


Mestre em Direito Constitucional pela Universidade Federal Fluminense (UFF), RJ, Brasil
Professor de Direito da Universidade do Cerrado (UNICERRADO-GO), Brasil
lalorj@hotmail.com

RESUMO
O presente artigo tem por finalidade apresentar o panorama da trajetória histórica da Reforma
Psiquiátrica brasileira, dando destaque para a Carta de Bauru (1987), considerada o marco
inaugural do processo de emancipação e cidadania da pessoa em sofrimento psíquico na luta
por uma sociedade sem manicômios. Contudo, em face das últimas propostas apresentadas no
final de 2017 pela Coordenação Nacional de Saúde Mental, a Carta de Bauru (2017), editada
dias antes da publicação e vigência da Resolução nº 32/2017, apresenta-se como um
instrumento de resistência e luta pela consolidação da cidadania da pessoa em sofrimento
psíquico.

Palavras-chave: Reforma Psiquiátrica. Luta Antimanicomial. Direito à Saúde Mental.

ABSTRACT
This article is to present the panorama of the historical trajectory of the Brazilian Psychiatric
Reform, highlighting the Charter of Bauru (1987), considered the inaugural landmark of the
process of emancipation and citizenship of the person in psychic suffering in the struggle for a
society without asylums. However, in view of the latest proposals presented at the end of 2017
by the National Coordination of Mental Health, the Bauru Charter (2017), published days
before the publication and validity of Resolution 32/2017, is presented as an instrument of
resistance and struggle for the consolidation of the citizenship of the person in psychic
suffering.

Keywords: Psychiatric Reform. Antimanicomial fight. Right to Mental Health.

Revista Diorito, v. 2. n. 1. Jan./Jun.2018. ISSN 2527-1784


Laércio Melo Martins
ISSN 2527-1784

INTRODUÇÃO

O artigo propõe-se a apresentar o panorama da trajetória histórica da Reforma


Psiquiátrica brasileira, a partir do final dos anos 1970, com ênfase no âmbito jurídico-social e
nos debates da Reforma Sanitária ocorridos durante o processo de reabertura democrática e
transição política no cenário nacional, em razão da promulgação da Carta Magna de 1988.
Nesse sentido, destacou-se a contribuição, durante a construção do direito à saúde,
inclusive mental, do Movimento Nacional da Luta Antimanicomial (MNLA), bem como da
Carta de Bauru (1987), considerada o marco inaugural do processo de emancipação e
cidadania da pessoa em sofrimento psíquico na luta por uma sociedade sem manicômios.
Ao longo dos debates legislativos sobre o Projeto de Lei nº 3.657/89 aconteceram
diversas alterações nos serviços e ações na assistência psiquiátrica e profundas modificações
legislativas associadas à implementação do Sistema Único de Saúde (SUS). Dentre elas, a Lei
nº 8.080/90; Lei nº 8.142/90 e as Portarias do Ministério da Saúde criadas a fim de consolidar
a Política Nacional de Saúde Mental, inaugurada com a Lei da Reforma Psiquiátrica (Lei nº
10.216/01), em âmbito federal.
Em face das últimas propostas apresentadas no final de 2017 pela Coordenação
Nacional de Saúde Mental, a Carta de Bauru (2017), editada dias antes da publicação e
vigência da Resolução nº 32 de 14 de dezembro de 2017, mostra-se, nesse processo de
compreensão, um importante instrumento de resistência política, demarcador das sombras do
porvir em nome da defesa e garantia dos direitos fundamentais das pessoas em sofrimento
psíquico.

1. OS PRESSUPOSTOS DA REFORMA SANITÁRIA E A CONSTRUÇÃO DO


DIREITO À SAÚDE, INCLUSIVE MENTAL

O movimento da Reforma Sanitária buscou desenvolver políticas públicas de saúde


alinhadas à luta institucional pela reabertura democrática do cenário brasileiro1. “A saúde tem

1
“Nos anos 1980, o movimento da Reforma Sanitária criticava a mercantilização da medicina sob o comando da
Previdência Social e buscava a universalização do direito à saúde, ampliando esse debate no Brasil. A partir
disso, medidas de reformulação do sistema de saúde foram encaminhadas ao Estado, com base em um
diagnóstico do modelo de saúde vigente que revelou uma rede de saúde ineficiente, desintegrada e complexa
(RIBEIRO et al,2010, p.45)”.

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determinantes sociais, o que implica pensá-la como resultante da complexidade de fatores


sociais, econômicos, culturais e políticos. Transformar a saúde é transformar a sociedade que
a produz enquanto processo social (YASUI, 2010, p. 30)”.
Com o processo de redemocratização e abertura política brasileira, iniciou-se a luta
pelas mudanças no sistema de saúde2. Nesse cenário, com críticas de vários segmentos do
setor público ao modelo de assistência médica, surgiram, concomitantemente, no Brasil, o
movimento pela Reforma Sanitária e o Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental, de
acordo com SCHECHTMAN e ALVES (2014).
A greve dos médicos da Divisão Nacional de Saúde Mental (DINSAM)3, de 1978,
marca o início do Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental4 e ganha visibilidade a
partir do V Congresso Brasileiro de Psiquiatria, em 27 de outubro de 1978, em Camburiú -
Santa Catarina (denominado também de Congresso de Abertura)5, que tinha como principais
reivindicações a humanização da assistência, a denúncia da baixa qualidade do atendimento,
dos custos elevados e das condições de trabalho:
Pela primeira vez, os movimentos em saúde mental participam de um encontro dos
setores considerados conservadores, organizados em torno da Associação Brasileira
de Psiquiatria, estabelecendo uma frente ampla a favor das mudanças, dando ao
congresso um caráter de discussão e organização político-ideológica, não apenas das
questões relativas à política de saúde mental, mas voltadas ainda para a crítica ao
regime político nacional (AMARANTE et al, 1995 [2015], p.54).

2
“A Reforma Sanitária se colocava, assim, fundamentalmente como um processo político, entendido como
possibilidade emancipatória na construção da pólis, da esfera pública, dos bens comuns. Era um processo que
levava à produção intelectual crítica, práticas e ações alternativas ao modelo hegemônico, militância cotidiana,
ocupação de espaços institucionais, articulações com outros setores da sociedade, ocupação de espaços no
interior do aparato estatal, avanços e recuos. Um processo político, colocando em cena e em pauta a relação entre
Estado e sociedade civil. A Reforma Sanitária se constituiu tensionando, criticamente, os termos dessa relação
(YASUI, 2010, p. 30-31)”.
3
“A crise é deflagrada a partir da denúncia realizada por três médicos bolsistas do CPPII, ao registrarem no livro
de ocorrências do plantão de pronto-socorro as irregularidades da unidade hospitalar, trazendo a público a trágica
situação existente naquele hospital [...] O Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental denunciou a falta de
recursos das unidades, à consequente precariedade das condições de trabalho refletida na assistência dispensada
à população e seu atrelamento às políticas de saúde mental e trabalhista nacional. As amarras de caráter
trabalhista e humanitário dão grande repercussão ao movimento, que consegue manter-se por cerca de oito meses
em destaque na grande imprensa (AMARANTE et al, 1995 [2015], p. 52)”.
4
“O primeiro gesto da Reforma Psiquiátrica. Naquele ano, médicos denunciaram as precárias condições às quais
eram submetidos os pacientes nos hospitais psiquiátricos da DINSAM, órgão ligado ao Ministério da Saúde. Em
abril, profissionais das quatro unidades do Rio de Janeiro deflagraram a primeira greve no setor público, após o
regime militar, que logo recebeu o apoio de várias entidades (YASUI, 2010, p. 37).”
5
“O Congresso de Camburiú cumpriu função semelhante à do Movimento Democrático Brasileiro (MDB), no
plano da política. Apesar de conservadora, a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) acolheu e abriu espaço
para o movimento da Reforma Psiquiátrica (YASUI, 2010, p. 37)”.

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De acordo com AMARANTE et al (1995, [2015] ), desde 1956/57 não se realizava


concurso público para a ocupação dos quadros profissionais. Então, a partir de 1974, iniciou-
se a contração de bolsistas (médicos, psicólogos, enfermeiros e assistentes sociais), muito dos
quais com alocação em cargo de chefia e direção. “Trabalhavam em condições precárias, em
clima de ameaças e violências a eles próprios e aos pacientes destas instituições. Eram
frequentes as denúncias de agressão, estupro, trabalho escravo e mortes não esclarecidas
(AMARANTE et al, 1995 [2015], p. 52)”.
O conjunto de reivindicações trabalhistas do MTSM6 estava acompanhado pelo anseio
de promover serviços em saúde mental de modo mais humanitário, sem a utilização inclusive
do eletrochoque. Destacaram-se as denúncias relativas aos salários, à formação de recursos
humanos, à relação entre instituição, clientela e profissionais, ao modelo médico-assistencial e
às condições de atendimento.
Além das denúncias da psiquiatrização, buscava-se melhores técnicas de tratamento e
serviços em saúde mental com duras críticas à política privatizante da gestão da saúde 7. Como
a Reforma Sanitária, a Reforma Psiquiátrica se configura como um processo político de
transformação social (YASUI, 2010)8.
AMARANTE et al ( 1995 [2015] ) destaca a realização do I Congresso Brasileiro de
Psicanálise de Grupos e Instituições, ocorrido entre os dias 19 a 22 de outubro de 1978, no
Rio de Janeiro como estratégia para uma nova sociedade psicanalítica, de orientação analítico-
institucional, o Instituto Brasileiro de Psicanálise de Grupos e Instituições (IBRAPSI):

A realização deste Congresso possibilita a vinda ao Brasil dos principais mentores


da Rede de Alternativas à Psiquiatria, do movimento Psiquiatria Democrática
Italiana, da Antipsiquiatria, enfim das correntes de pensamento crítico em saúde

6
A Reforma Psiquiátrica brasileira decorrente do cotidiano das experiências profissionais de práticas
institucionais e universitárias, buscou politizar a questão da saúde mental, especialmente, contra as instituições
psiquiátricas e produziu reflexões críticas que provocaram uma ruptura epistemológica, criou experiências e
estratégias de cuidado contra-hegemônicas, conquistou mudanças no aparato jurídico e buscou produzir efeitos
no campo sociocultural (YASUI, 2010).
7
Na década de 1970, a Organização das Nações Unidas (ONU) editou dois documentos importantes em relação
à proteção da pessoa com deficiência entendida como vulnerável: Declaração de Direitos da Pessoa com
Deficiência Mental (1971) e Declaração de Direitos da Pessoa com Deficiência (1975).
8
“O campo da saúde mental é um lugar de conflitos e disputas. Lugar do encontro do singular e do social, do eu
e do outro. É também, o lugar de confronto: das ideias de liberdade, autonomia e solidariedade contra o controle
e a segregação, da inclusão e da exclusão, da afirmação da cidadania e de sua negação. Portanto, campo de lutas
políticas e ideológicas que envolvem militância, protagonismo, negociações, articulações, pactuações. Assim, a
Reforma Psiquiátrica é um movimento político, impregnado ética e ideologicamente, e o processo de sua
construção não pode ser desvinculado da luta pela transformação da sociedade (YASUI, 2010, p. 32)”.

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mental, dentre eles Franco Basaglia, Felix Guattari, Robert Castel, Erwing Goffman,
dentre outros (AMARANTE et al, 1995 [2015], p. 55).

Em janeiro de 1979, no Instituto Sedes Sapientiae em São Paulo, ocorreu o I


Congresso Nacional dos Trabalhadores em Saúde Mental com o entendimento de que a luta
pela transformação do sistema de atenção à saúde encontrava-se vinculada à luta dos demais
setores sociais em busca da democracia plena e de uma organização mais justa da sociedade, a
partir das liberdades democráticas. Além disso, reforçou-se a crítica ao modelo asilar dos
hospitais psiquiátricos públicos brasileiros (AMARANTE et al, 1995 [2015] ).
Já em novembro de 1979, aconteceu em Minas Gerais, o III Congresso Mineiro de
Psiquiatria que contou com a presença de Franco Basaglia, Antonio Slavich e Robert Castel
que abordou temas como psicofarmacologia, terapia de crise, esquizofrenia e identidade
profissional, debatidos ao lado do enfoque social (AMARANTE et al, 1995 [2015] ).
Já nos anos 1980, o sistema previdenciário brasileiro se encontrava em uma profunda
crise decorrente do cenário econômico brasileiro9 que foi, fortemente, influenciado pela
recessão mundial e alta da taxa de juros, causando o aumento da dívida externa brasileira,
decorrente dos empréstimos internacionais, dos juros internos e da aceleração do processo
inflacionário.
De acordo com AMARANTE et al (1995 [2015] ), essa crise institucional da
Previdência Social, apesar de ser apresentada como de origem exclusivamente financeira,
pautada na relação quantitativa custos-benefícios, é, na verdade, fundamentalmente
qualitativa:
Ou seja, os investimentos realizados não produzem benefícios minimamente
satisfatórios, provocando uma visível insatisfação em alguns segmentos sociais,
gerando críticas de usuários-contribuintes, parlamentares, lideranças comunitárias e
religiosas, dentre outros setores da sociedade civil e dos próprios trabalhadores da
área da saúde. A ineficiência da aplicação dos recursos é devida, em primeiro lugar,
à própria natureza do modelo curativista e assistencialista e, em segundo, ao modelo
de compra de serviços privados para a prestação de serviço “público”, o que termina
por apontar para a necessidade da racionalização dos gastos previdenciários
(AMARANTE et al 1995[2015], p .60).

9
“A crise da previdência dos anos 1970 e início dos 1980 é decorrente de um lado, da queda na arrecadação em
razão da crise financeira mundial e consequente aumento do desemprego e, de outro, da crescente compra de
serviços privados, com pagamento baseado em modelo caraterizado por agregação de procedimentos, sem
regulação eficaz, tornando os custos crescentes e imprevisíveis (SCHECHTMAN; ALVES, 2014, p. 46)”.

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Com a cogestão, criou-se a possibilidade de implantação de uma política de saúde10


com base no sistema público de prestação de serviços, a cooperação interinstitucional, a
descentralização e a regionalização, propostas defendidas pelos movimentos das Reformas
Sanitária e Psiquiátrica (AMARANTE et al 1995 [2015] ).
De acordo com YASUI (2010), a partir desse quadro, institui-se uma agenda
reformista do setor de saúde, formulada e consolidada ao longo dos anos 70, sob a liderança
das forças políticas democráticas. Destacando a atuação, nesse processo, do CEBES (Centro
Brasileiro de Estudos da Saúde) que, em outubro de 1979, apresentou o documento intitulado
“A Questão Democrática na Área da Saúde” no 1º Simpósio sobre Política Nacional de Saúde
na Câmara dos Deputados11.
Ao apresentar o documento “A Questão Democrática na Área da Saúde”, o CEBES
formulou, pela primeira vez, a proposta do Sistema Único de Saúde (SUS), justificando um
conjunto de princípios e diretrizes para a sua criação. “Desse modo, tanto a Reforma Sanitária
brasileira quanto o SUS nasceram da sociedade, e não de governos ou partidos (PAIM, 2009,
p.40)”.
Em 1980, ocorreu o I Encontro Regional dos Trabalhadores em Saúde Mental, no Rio
de Janeiro, onde se discutiu problemas sociais relacionados à doença mental, à política
nacional de saúde mental, às condições de trabalho, à privatização da medicina, à realidade
político-social da população brasileira e às denúncias das violências ocorridas nas instituições
psiquiátricas (AMARANTE et al 1995 [2015] ).
Concomitante à realização do VI Congresso Brasileiro de Psiquiatria realizado em
agosto de 1980, realizou-se, em Salvador – Bahia, o II Encontro Nacional dos Trabalhadores
em Saúde Mental12 com objetivo de revisar a legislação no âmbito civil e penal relativa às

10
“Com a criação do Sistema Nacional de Saúde, em 1975, através da Lei nº 6.229, estabeleceu-se competências
do INAMPS (assistência curativa e individualizada) e do Ministério da Saúde (medicina preventiva e coletiva).
Dessa maneira, por intermédio da portaria nº 5, de 11 de maio de 1980, institui-se a Comissão Interministerial de
Planejamento e Coordenação entre os Ministérios, a fim de planejar e coordenar as ações na área da saúde
(AMARANTE et al 1995[2015], p. 61)”.
11
“Para enfrentar a grave crise financeira, o governo militar buscou formular alternativas, como o Plano Prev-
Saúde, que incorporou teses e propostas do Movimento Sanitário que já haviam sido apresentadas na Declaração
de Alma-Ata, tais como descentralização, hierarquização, regionalização e ênfase aos serviços básicos de saúde
(YASUI, 2010, p. 39)”.
12
“O Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM) e a Associação Brasileira de Psiquiatria que
haviam se aproximado por ocasião do Congresso de Abertura experimentaram um distanciamento, a partir deste
momento, decorrente da postura considerada politizada, radical e crítica que o MTSM vinha assumindo em sua
trajetória [...] As moções aprovadas em assembleia passam pelo apoio à luta pela democratização da Associação
Brasileira de Psiquiatria e de suas federadas, pela crítica à privatização da saúde por meio de denúncias

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pessoas em sofrimento psíquico, além de discutir a luta pelo direito à saúde como
democratização da ordem econômico-social.
No final de 1981, foi criado o Conselho Nacional de Administração da Saúde
Previdenciária (CONASP)13. Assim, como parte do órgão, criou-se o projeto de Ações
Integradas de Saúde (AIS), um importante instrumento de descentralização e de articulação
institucional, possibilitando o repasse de recursos financeiros da União para outros entes
políticos14.
Denominado de “cogestão”, o convênio entre os Ministérios da Previdência e
Assistência Social e o da Saúde assinalaram um marco na trajetória das políticas públicas de
saúde, prevendo a colaboração do Ministério da Previdência no custeio, planejamento e
avaliação das unidades hospitalares do Ministério da Saúde15.
Os proprietários de hospitais psiquiátricos se posicionavam com resistência a essa
nova configuração política, em razão da ameaça dos seus lucros e da perda do poder político.
Sob novo estatuto, em 1973, a Federação Brasileira de Hospitais (FBH) tornava-se o órgão
organizador e centralizador da maior parte dos recursos destinados à saúde (AMARANTE et
al 1995 [2015] ).
Nesse sentido, em 1986, realizou-se a 8º Conferência Nacional de Saúde16, presidida
por Sérgio Arouca, que no relatório final apresentou as diretrizes e princípios do Sistema

envolvendo a Federação Brasileira de Hospitais (FBH), a Associação Brasileira de Medicina de Grupo


(ABRANGE) e outras multinacionais do setor empresarial da saúde com ingerência direta nas instâncias
decisórias do poder público (AMARANTE et al, 1995 [2015], p. 56)”.
13
Na década de 1980, o órgão contratante dos leitos psiquiátricos hospitalares, o Instituto Nacional de
Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), publicou a Portaria nº 3.108/1982 que estabelece o
Programa de Reorientação da Assistência Psiquiátrica, conhecido como Plano do Conselho Consultivo de
Administração de Saúde Previdenciária (CONASP), com vistas a inverter a tendência de aumento de leitos e
repassar os recursos para os serviços públicos para que eles assumissem a maior parte da assistência psiquiátrica,
racionalizando custos e substituindo por outras formas esse atendimento (SCHECHTMAN; ALVES, 2014, p.
46).
14
“Em agosto de 1982, o trabalho do CONASP se consubstanciou no Plano de Reorientação da Assistência
Médica da Previdência, que propunha, oficialmente, modificações, as quais objetivavam a racionalização do
sistema, a melhoria da qualidade dos serviços e a reversão do modelo assistencial privatizante, com a
descentralização e a utilização prioritária dos serviços públicos federais, estaduais e municipais, na cobertura
assistencial da população (YASUI, 2010, p. 40).”
15
“Neste espírito, o Ministério da Previdência e Assistência Social deixa de comprar serviços do Ministério da
Saúde, nos mesmos moldes realizados com as clínicas privadas, e passa a participar da administração global do
projeto institucional da unidade cogerida (AMARANTE et al 1995 [2015], p. 58)”.
16
A oitava edição do evento – a célebre 8ª Conferência Nacional de Saúde – foi convocada pela Presidência da
República, por solicitação do ministro da Saúde, em julho de 1985, e deveria ser realizada na primeira semana de
dezembro de 1985. Em decorrência de reivindicações e solicitações de diferentes segmentos, de que haveria
pouco tempo para preparar e discutir propostas na sociedade civil e nas instituições, o evento foi adiado para

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Único de Saúde (SUS)17. Decorrente desse encontro, organizou-se a Comissão Nacional de


Reforma Sanitária (CNRS), composta pelo governo e sociedade civil e a Plenária Nacional de
Entidades da Saúde, constituídas pelas forças organizadas da sociedade civil (YASUI, 2010).
Em 1986, realizou-se o II Congresso de Trabalhadores de Saúde Mental do Estado de
São Paulo com os seguintes eixos temáticos: (a) saúde mental e trabalho, (b) saúde mental e
movimentos sociais e (c) saúde mental e constituinte. “Buscava-se imprimir uma dinâmica
mais democrática e com maior participação na formulação da política de saúde mental
(YASUI, 2010, p. 42)”.
Em março de 1987, foi inaugurado em São Paulo, o Centro de Atenção Psicossocial
(CAPS) Professor Luiz da Rocha Cerqueira, referência e inspiração para mudanças na
assistência psiquiátrica no cenário brasileiro. No mesmo ano ocorreu a criação do Sistema
Único Descentralizado de Saúde (SUDS)18.
Em julho de 1987, decorrente da 8ª CNS, realizou-se no Rio de Janeiro, a I
Conferência Nacional de Saúde Mental (I CSNM), com os temas: (a) Economia, Sociedade e
Estado (impactos sobre a saúde e doença mental), (b) Reforma Sanitária e Reorganização da
Assistência à Saúde Mental, (c) Cidadania e Doença Mental (direitos e deveres e legislação do
doente mental). Tal encontro foi marcado pela evidenciação de fortes questões políticas e
ideológicas que estavam em disputa no campo da saúde mental.
Em dezembro de 1987, foi realizado o II Congresso Nacional de Trabalhadores em
Saúde Mental, na cidade de Bauru – São Paulo19, onde se instituiu o lema “Por uma sociedade
sem manicômios” que contou com a presença de lideranças institucionais, técnicos,
familiares, usuários e estudantes. De acordo com YASUI (2010), adotado nacionalmente, a

março do ano seguinte. Realizado entre os dias 17 e 21 de março de 1986, em Brasília, reuniria diferentes setores
da sociedade para discussão de todas as propostas de mudanças (SOPHIA, 2012, p. 555-6).
17
“No total participaram mais de cinco mil pessoas, sendo mil delegados. Significativamente, um único setor
recusou-se a participar daquela conferência: os prestadores de serviços privados de saúde (YASUI, 2010, p. 40).”
18
“Enquanto se debatia a legislação do SUS no Congresso Nacional, foram adotadas medidas visando à
integração das ações e à unificação dos serviços de saúde, mediante convênios entre os governos federal,
estadual e municipal, com a implantação dos programas como se fossem pontes capazes de facilitar a travessia
para a outra margem do rio, ou seja, o SUS. Entre essas iniciativas, podem ser mencionadas as Ações Integradas
de Saúde (AIS) e os Sistemas Unificados e Descentralizados de Saúde (SUDS), reconhecidos como uma
estratégia-ponte para o SUS (PAIM, 2009, p. 40-1)”.
19
“A escolha da cidade paulista deveu-se ao fato de estar sob uma administração progressista à época, o que
favoreceu o apoio para a organização e para a realização do evento. Além disso, havia várias lideranças
expressivas da Reforma Sanitária, como David Capistrano, secretário municipal de saúde, e da Reforma
Psiquiátrica, como Roberto Tykanori, que lá tinham implantado o primeiro Núcleo de Atenção Psicossocial –
NAPS (YASUI, 2010, p. 45)”.

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partir desse evento, o lema colocava em destaque a questão da loucura no âmbito


sociocultural20.
Institui-se, dentre as deliberações, o dia 18 de maio21 como o Dia Nacional da Luta
Antimanicomial. Por ocasião do encerramento do evento, realizou uma passeata em Bauru
com mais de trezentas pessoas solicitando a extinção dos manicômios22. “O Manifesto de
Bauru, aprovado na plenária e distribuído no dia da passeata, marcou o nascimento de um
novo movimento: o Movimento Nacional da Luta Antimanicomial (YASUI, 2010, p. 46)”.
Esse novo ator social enfatizou as denúncias de violências institucionais praticadas nos
manicômios, bem como a exclusão e a produção social da loucura, além da ausência do
respeito à cidadania da pessoa em sofrimento psíquico. A luta pelo direito à saúde mental
transformava-se no anseio de transformação da sociedade e do reposicionamento do lugar
social da loucura, a partir da efetividade dos direitos civis, sociais e políticos da pessoa em
sofrimento psíquico.

2. O MOVIMENTO NACIONAL DA LUTA ANTIMANICOMIAL E A REGULAÇÃO


JURÍDICA DO SOFRIMENTO PSÍQUICO

Nesse sentido, o Movimento da Luta Antimanicomial (MLA) buscou-se articular,


enquanto movimento social, no âmbito nacional, com uma singularidade: existência como
movimento, sem tornar-se instituição23. De fato, a Carta de Bauru (1987) marcou a primeira

20
“Tratava-se de: produzir uma utopia norteadora das propostas assistenciais; resgatar a discussão sobre
segregação e a violência institucional; repensar as práticas e inventar possibilidades para ampliar o campo de
atuação. Tratava-se, também, de uma profunda e radical ruptura com o modelo hegemônico médico-centrado de
produção de um saber técnico, de uma razão instrumental, sobre a loucura (YASUI, 2010, p. 45)”.
21
De acordo com YASUI (2010), após algumas discussões, uma das primeiras datas sugeridas foi 13 de maio,
data da aprovação da Lei n. 180 da Itália e da libertação da escravatura, porém a escolha recaiu no dia 18 de
maio, sem nenhum motivo mais relevante.
22
Por fim, na Carta de Bauru (1987) havia a crítica à indústria da loucura e à mercantilização da doença, bem
como à reforma sanitária privatizante e autoritária, tal como o desejo por uma reforma sanitária democrática e
popular, pela reforma agrária e urbana, pela organização livre e independente dos trabalhadores e pelo direito à
sindicalização dos serviços públicos e pelo Dia Nacional da Luta Antimanicomial em 1988.
23
“Não há uma sede, fichas de inscrição ou rituais de filiação. Existe como uma utopia ativa, prenha de desejos e
ideias de transformação, e como materialidade na prática cotidiana de profissionais, familiares, usuários e tantos
outros que se identificam com seu ideário. É, fundamentalmente, um dispositivo social que congrega e articula
pessoas, trabalhos e lugares (YASUI, 2010, p. 46)”.

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manifestação pública, no Brasil, organizada a fim de extinguir os manicômios, ao assinalar a


luta contra a exclusão e discriminação no âmbito social.
Tratou-se de um documento de ruptura, no qual os trabalhadores em saúde mental
recursaram-se o papel de agente da exclusão e da violência institucionalizadas que
desrespeitavam os direitos da pessoa humana. Nascia, então, um novo compromisso, para
além da racionalização e modernização dos serviços em saúde mental.
Uma vez reconhecida a violência institucional dos manicômios demarcada pela sua
estrutura e funcionamento, apontou-se, o Estado, em virtude da gestão, como o responsável
por impor e sustentar os mecanismos de exploração e de produção social da loucura e
violência (CARTA DE BAURU, 1987). O manicômio foi compreendido como expressão da
estrutura presente nos mecanismos de opressão social, a exemplo das fábricas, instituições de
adolescentes, cárceres, discriminação contra negros, homossexuais, índios e mulheres
(CARTA DE BAURU, 1987).
Com presença em vários estados, o Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental
(MTSM) caminhava, a partir de então, para uma articulação nacional aliado ao movimento
popular e sindical. Assim, ficava claro e estabelecido o compromisso da Luta Antimanicomial
com a classe trabalhadora e o movimento popular. Dessa maneira, a luta pela cidadania dos
doentes mentais apresentou-se incorporada à demanda dos trabalhadores por seus direitos
mínimos à saúde, à justiça e às melhores condições de vida (CARTA DE BAURU, 1987).
É importante observar que a construção das transformações nos serviços em saúde
mental compreendia o anseio de alteração profunda da estrutura social e a preservação do
compromisso com a classe trabalhadora. Nota-se que o Movimento da Nacional da Luta
Antimanicomial (MNLA) nasce do movimento popular.
Dizer isso não implica desqualificá-lo alegando “ser uma mobilização apenas de
caráter político, sem saber médico psiquiátrico”. Ao contrário, em sua composição havia
ilustres pesquisadores e profissionais do campo mental, bem como de outras áreas de saber.
Ou seja, para além da importância do estudo do modelo biomédico do homem, havia a
preocupação com as questões econômicas, políticas e sociais destacadas pelos profissionais de
saúde.

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Em maio de 1989, a Casa de Saúde Anchieta, hospital psiquiátrico privado, sofreu


uma intervenção da Secretaria Municipal de Saúde24. Segundo YASUI (2010), essa foi a
experiência de maior repercussão tanto nacional, quanto internacionalmente com uma
proposta concreta de organização de serviços e ações de saúde mental, efetivamente,
substitutiva à internação psiquiátrica.
Em 1989, organizou-se na cidade de São Paulo, a Plenária dos Trabalhadores em
Saúde Mental, formando um agente social coletivo25 que realizou profundas críticas à
Coordenadoria de Saúde Mental de São Paulo. Outro ator social no processo da Reforma
Psiquiátrica brasileira surge no final dos anos 1980: as associações de usuários e familiares 26.
“As associações atuaram na construção de novas possibilidades de atenção e cuidados e na
luta pela transformação da assistência em saúde mental (YASUI, 2010, p. 50)”. Todavia, é na
década de 1980 que iniciativas pioneiras e relevantes indicariam as mudanças de rumo do
modelo de assistência psiquiátrica no cenário brasileiro, conforme o entendimento de
SCHECHTMAN e ALVES (2014).
Em resumo, nos anos de 1980, ocorreram os seguintes eventos: a implantação do
primeiro Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) no Brasil, o da rua Itapeva, denominado
CAPS Luiz da Rocha Cerqueira (1987), a I Conferência Nacional de Saúde Mental, no Rio
de Janeiro (1987), o II Encontro do Movimento de Trabalhadores em Saúde Mental, em
Bauru, São Paulo, onde foi anunciada a bandeira “ Por uma sociedade sem manicômios”
(1987), a intervenção da Prefeitura de Santos na Casa de Saúde Anchieta (1989) e por fim a
apresentação do Projeto de Lei n.3.657 pelo deputado federal Paulo Delgado na Câmara dos
Deputados (1989)27.

24
“Em função das atrocidades, incluindo-se mortes, cometidas com os pacientes lá internados. Iniciou-se, a
partir da desmontagem do manicômio, um processo de transformação exemplar, com a implantação de uma rede
de atenção em saúde mental substitutiva (YASUI, 2010, p. 47)”.
25
Quanto à composição das entidades que atuaram ver YASUI (2010).
26
“Além da pioneira Sociedade de Serviços Gerais para a Integração (SOSINTRA) do Rio de Janeiro (criada em
1978) e do Grupo Loucos pela Vida de Juqueri, nasceram a Associação Franco Basaglia (São Paulo), a
Associação Franco Rotelli (Santos), o SOS Saúde Mental, entre outras (YASUI, 2010, p. 50)”.
27
“As principais transformações no campo jurídico-político tiveram início a partir deste Projeto de Lei que
provocou enorme polêmica na mídia nacional, ao mesmo tempo que algumas associações de usuários e
familiares foram constituídas em função dele. Umas contrárias, outras a favor, o resultado importante deste
contexto foi que, de forma muito importante, os temas da loucura, da assistência psiquiátrica e dos manicômios,
invadiram boa parte do interesse nacional (AMARANTE et al, 1995[2015], p.84)”.

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É oportuno recordar, em paralelo, que em 1 de fevereiro de 1987, a Assembleia


Nacional Constituinte, em Brasília, estava instalada para a definição de novos rumos na
história do direito constitucional brasileiro na formulação da Carta Política de 1988.
Na década de 1990, outros eventos foram marcantes para as transformações jurídicas
no âmbito da assistência psiquiátrica como a incorporação do Instituto Nacional de
Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS) à estrutura do Ministério da Saúde
(MS). “O órgão da União que detinha a maior parcela dos recursos financeiros e assistenciais,
agora se submetia às diretrizes do Ministério da Saúde (SCHECHTMAN; ALVES, 2014, p.
49)”.
Além disso, ocorreu a aprovação da Lei Orgânica da Saúde, composta pela Lei n.
8.080/90 que regulamentou o Sistema Único de Saúde (SUS) a partir da Carta Política de
1988, bem como a vigência da Lei nº 8.142/90 que tratou sobre o controle social e
participação popular no controle das políticas públicas28. Este último dispositivo jurídico,
passou a regular as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da
saúde entre a União, Estados e Municípios, bem como a participação da comunidade na
gestão do SUS29.
Estabeleceu-se também o Fundo Nacional de Saúde (FNS), com recursos para custeio
e investimentos com a imposição do repasse regular e automático para a existência das
seguintes estruturas nos Estados, Distrito Federal e Municípios: Fundo de Saúde (Estadual e
Municipal); Conselho de Saúde30, com composição paritária, ou seja, metade de
representantes de prestadores e trabalhadores do SUS; plano de saúde, relatórios de gestão;
contrapartida de recursos para a saúde no respectivo orçamento; e comissão para a elaboração
do plano de carreira, cargos e salários (PAIM, 2009).

28
É importante ressaltar que a aprovação da Lei Orgânica da Saúde (Lei nº. 8.080/90), foi obtida graças a uma
intensa mobilização e articulação das forças políticas em favor da reforma, agrupadas na Plenária das Entidades
de Saúde. Contudo, todos os artigos referentes à participação social foram vetados, obrigando a uma nova
mobilização e à aprovação da Lei nº 8.142/90, que dispõe sobre a realização de Conferências e sobre os
Conselhos de Saúde, tornando-os obrigatórios (YASUI, 2010).
29
“A Conferência de Saúde deve ser convocada a cada quatro anos para avaliar a situação de saúde e propor as
diretrizes para a formulação da política de saúde nos níveis correspondentes. Portanto, não cabe a essa instância
formular políticas, mas sim propor diretrizes para tal formulação, tendo em conta a análise da situação de saúde.
Compete aos governos democraticamente eleitos formular as políticas de saúde (PAIM, 2009, p. 64)”.
30
“O Conselho de Saúde tem caráter permanente e deliberativo, atuando na formulação de estratégias e no
controle da execução da política de saúde, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros. Entretanto, suas
decisões devem ser homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído, em cada esfera de governo (PAIM,
2009, p. 64)”.

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Também nessa década, em 14 de novembro, realizou-se a Conferência Regional para a


Reestruturação da Assistência Psiquiátrica no Continente, realizada em Caracas- Venezuela,
convocada pela Organização Pan-Americana da Saúde.
Durante a ocasião, verificou-se demandas em saúde mental, que foram discutidas por
organizações, associações, autoridades de saúde, profissionais de saúde mental, legisladores e
juristas, dentre elas: (a) que a assistência psiquiátrica convencional não permitia alcançar
objetivos compatíveis com um atendimento comunitário, descentralizado, participativo,
integral, contínuo e preventivo e (b) que o hospital psiquiátrico, como única modalidade
assistencial, impedia o alcance dos objetivos humanitários31.
Nesse sentido, destacou-se que o Atendimento Primário de Saúde é a estratégia
adotada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e pela Organização Pan- Americana de
Saúde (OPAS) e referendada pelos países membros para alcançar a meta de Saúde Para
Todos, no ano 2000.
Além disso, que os Sistemas Locais de Saúde (SILOS) foram estabelecidos pelos
países da região para facilitar o alcance dessa meta, pois ofereciam melhores condições para
desenvolver programas baseados nas necessidades da população de forma descentralizada,
participativa e preventiva e, por fim, que os Programas de Saúde Mental e Psiquiatria
deveriam adaptar-se aos princípios e orientações que fundamentavam essas estratégias e os
modelos de organização da assistência à saúde.
A Conferência de Caracas (1990) conclamou aos Ministérios da Saúde e da Justiça,
aos parlamentos, aos Sistemas de Seguridade Social, bem como aos prestadores de serviços,
organizações profissionais, associações de usuários, Universidades e outros centros de
capacitação e aos meios de comunicação para que apoiassem a Reestruturação da Assistência
Psiquiátrica, a fim de assegurar o êxito no seu desenvolvimento..
Como signatário do compromisso assumido internacionalmente, o Brasil, à época,
declarou que a reestruturação da assistência psiquiátrica ligada ao Atendimento Primário da

31
Que o hospital psiquiátrico, como única modalidade assistencial, impede alcançar os objetivos já mencionados
ao: a) isolar o doente do seu meio, gerando, dessa forma, maior incapacidade social; b) criar condições
desfavoráveis que põem em perigo os direitos humanos e civis do enfermo; c) requerer a maior parte dos
recursos humanos e financeiros destinados pelos países aos serviços de saúde mental; e d) fornecer ensino
insuficientemente vinculado com as necessidades de saúde mental das populações, dos serviços de saúde e
outros setores (DECLARAÇÃO DE CARACAS, 1990).

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Saúde, no quadro dos Sistemas Locais de Saúde, permitia a promoção de modelos


alternativos, centrados na comunidade e dentro de suas redes sociais.
Ademais, que a reestruturação da assistência psiquiátrica na região implicava em
revisão crítica do papel hegemônico e centralizador do hospital psiquiátrico na prestação de
serviços. Nesse sentido, que os recursos, cuidados e tratamentos dados deveriam: (a)
salvaguardar, invariavelmente, a dignidade pessoal e os direitos humanos e civis; (b) estar
baseados em critérios racionais e tecnicamente adequados; (c) propiciar a permanência do
enfermo em seu meio comunitário.
Desse modo, as legislações dos países signatários deveriam se ajustar de modo que: (a)
assegurassem o respeito aos direitos humanos e civis dos doentes mentais e (b) promovessem
a organização de serviços comunitários de saúde mental que garantissem o seu cumprimento.
No que se refere à formação profissional no campo da saúde mental, a capacitação dos
recursos humanos em Saúde Mental e Psiquiatria deveria ocorrer apontando para um modelo,
cujo eixo passasse pelo serviço de saúde comunitária e propiciasse a internação psiquiátrica
nos hospitais gerais, de acordo com os princípios que regem e fundamentam essa
reestruturação.
Em esforço conjunto dos países participantes, a Declaração de Caracas (1990) buscou
a sinalização internacional para o comprometimento na reestruturação da assistência
psiquiátrica e na vigilância e defesa dos direitos humanos das pessoas em sofrimento
psíquico, ao propor, inclusive, alterações jurídicas nas legislações nacionais e nos
compromissos internacionais. Dessa forma, é possível pensar e compreender o processo da
Reforma Psiquiátrica brasileira como projeto piloto do Sistema Único de Saúde (SUS).
De acordo com o entendimento de PAIM (2009), desde o início do século XX, é
possível observar a presença no sistema de saúde brasileiro de três vias assistenciais: saúde
pública, medicina previdenciária e medicina do trabalho32.
No caso da saúde pública33, as críticas dirigidas às campanhas sanitárias e as
resistências da população às intervenções autoritárias possibilitaram o aparecimento de

32
“Desde as suas origens, tais subsistemas percorreram caminhos paralelos, de forma relativamente autônoma e
respondendo a pressões distintas. Ao lado deles, pode-se identificar, também, a medicina liberal, as instituições
filantrópicas e a chamada medicina popular (PAIM, 2009, p. 30)”.
33
“Esse tipo de saúde pública não tinha qualquer integração com a medicina previdenciária implantada nos
Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs), nem com a saúde do trabalhador. Separava, artificialmente, a

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propostas de educação sanitária e de criação de centros de saúde, alterando o eixo das


políticas de caráter coercitivo para medidas de natureza persuasiva (PAIM, 2009):

A organização dos serviços de saúde no Brasil antes do Sistema Único de Saúde


vivia em mundos separados: de um lado, as ações voltadas para a prevenção, o
ambiente, a coletividade, conhecidas como saúde pública, de outro, a saúde do
trabalhador, inserida no Ministério do Trabalho e ainda, as ações curativas e
individuais, integrando a medicina previdenciária e as modalidades de assistência
médica liberal, filantrópica e, progressivamente, empresarial (PAIM, 2009, p. 31).

Com o objetivo de democratizar a saúde e por entendê-la como instrumento de


transformação da sociedade, para além de facilitar o acesso às ações e serviços públicos de
saúde, o movimento da Reforma Sanitária buscou apresentar soluções para o cenário político
brasileiro de abertura democrática, elevando o direito à saúde à categoria de direito social.
Após a VIII Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1986, editou-se o relatório
final do evento que inspirou o capítulo Saúde (arts. 196 a 200 da CRFB/88) da Constituição
de 1988, desdobrando-se, posteriormente, nas Leis Orgânicas da Saúde (8.080/90 e 8.142/90),
que permitiram a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS). “Na medida em que essas
propostas nasceram da sociedade e alcançaram o Poder Público, mediante a ação de
movimentos sociais e a criação de dispositivos legais, é possível afirmar que o SUS
representa uma conquista do povo brasileiro (PAIM, 2009, p. 40)”.
Com o advento da Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 199034, houve a previsão da
regulação jurídica da saúde em todo o território brasileiro, incluindo as ações e serviços
exercidos por pessoas físicas ou jurídicas de direito público ou privado (art.1º da Lei nº
8.080/90)35. Em linhas gerais, a retomada dos direitos e garantias fundamentais previstas na
Carta Magna de 1988 pela Lei nº 8.080/90 demonstra um reforço político na concretização do

prevenção e cura (tratamento), a assistência individual e a atenção coletiva, a promoção e a proteção em relação
à recuperação e à reabilitação da saúde (PAIM, 2009, p. 31)”.
34
“O Sistema Único de Saúde implica ações e serviços federais, estaduais, distritais (DF) e municipais, regendo-
se pelos princípios da descentralização, com direção única em cada esfera de governo, do atendimento integral,
com prioridade para as atividades preventivas, e da participação da comunidade, que confirma seu caráter de
direito social pessoal, de um lado, e de direito social coletivo, de outro. É também por meio dele que o Poder
Público desenvolve uma série de atividades de controle de substâncias de interesse para a saúde e outras
destinadas ao aperfeiçoamento das prestações sanitárias (DA SILVA, 2005, p. 831)”.
35
“Ao se referir às ações e serviços de saúde prestados por pessoas naturais ou jurídicas, poder ser interpretada
como capaz de interferir na medicina liberal e na medicina empresarial, por exemplo. Do mesmo modo, ao
contemplar entidades jurídicas de direito público ou privado, essa regulação poder se dirigir a serviços e ações de
saúde realizados por fundações públicas, instituições filantrópicas e empresas privadas, como as que
comercializam planos de saúde (PAIM, 2009, p. 52)”.

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direto à saúde, consolidando a maior política de inclusão social no setor da saúde do Brasil ao
possibilitar o exercício da cidadania sanitária36.
É dever do Estado promover as condições indispensáveis para o exercício do direito
fundamental à saúde pelos cidadãos, compreendendo, assim, as ações de planejamento
financeiro e orçamentário na execução de políticas públicas37, não excluindo os deveres dos
cidadãos, da família, das empresas e da sociedade.
Nesse plano de consolidação da saúde pública e da nova proposta de política em saúde
mental no cenário brasileiro ao longo dos anos 1990, o Ministério da Saúde editou Portarias,
de caráter administrativo, a fim de promover a reinserção da pessoa em sofrimento psíquico
no convívio social, enquanto tramitava no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 3.657/89,
que assumiu diversas nuances jurídicas ao longo do processo legislativo, em virtude das
negociações políticas, distanciando-se cada vez mais da proposta original.
Nessa acepção, o Senado Federal, em 1996, adotou a Resolução nº 46/199 da
Organização das Nações Unidas (ONU)38, como paradigma orientador da normogênese da lei
federal da Reforma Psiquiátrica brasileira, assumindo uma postura tímida diante da
mobilização da Luta Antimanicomial, no âmbito social, e das propostas de radicalização e
rupturas com o sistema hospitalocêntrico.
É inegável os avanços, na prática do cuidado em saúde mental, iniciados já na década
de 1990, enquanto se discutia no legislativo federal o dispositivo jurídico regulamentador da
nova política nacional de saúde mental39. Entretanto, até a aprovação e promulgação da Lei da

36
“Embora o direito à saúde tenha sido difundido internacionalmente, desde a criação da Organização Mundial
da Saúde (OMS), em 1948, somente quarenta anos depois o Brasil reconheceu, formalmente, a saúde como
direito social. Como referido anteriormente, antes de 1988 somente os trabalhadores com carteira de trabalho
assinada e em dia com as contribuições pagas à previdência social tinham garantido por lei o direito à assistência
médica, através dos serviços prestados pelo INAMPS (PAIM, 2009, p. 41)”.
37
Entendidas como políticas econômicas e sociais, de caráter preventivo, visando à redução de riscos de doenças
e outros agravos, além de determinar a garantia de acesso universal e igualitário aos serviços de saúde (art.
2°,§1º da Lei nº 8.080/90).
38
Editado em 17 de dezembro de 1991, os Princípios para a Proteção das Pessoas com Doença Mental e para
Melhoramento dos Cuidados em Saúde Mental foram regulamentados através da Resolução nº 46/119.
39
Em que pese a Segunda Lei Federal de Assistência Médico-Legal - Decreto nº 24.559 de 3 de julho de 1934
assinado por Getúlio Vargas – ter vigência, à época da discussão legislativa federal sobre o Projeto de Lei nº
3.657/89 foram editadas no território brasileiro diversas leis estaduais em sentido contrário à materialidade do
Decreto nº 24.559/34, a saber: Rio Grande do Sul ( Lei nº 9.716 de 7 de agosto de 1992); Ceará ( Lei nº 12.151
de 29 de julho de 1993); Pernambuco ( Lei nº 11.065 de 16 de maio de 1994); Rio Grande do Norte ( Lei nº
6.758 de 4 de janeiro de 1995); Minas Gerais ( Lei nº. 11.802 de 18 de janeiro de 1995); Paraná ( Lei nº 11.189
de 9 de novembro de 1995); Distrito Federal ( Lei nº 975 de 12 de dezembro de 1995) e Espírito Santo ( Lei nº
5.267, de 10 de setembro de 1996).

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Reforma Psiquiátrica (Lei nº 10.216/01), a transição para uma nova assistência psiquiátrica no
território brasileiro ocorreu a partir de Portarias Ministeriais, no âmbito institucional,
inclusive após a consolidação do dispositivo normativo federal.
Antes da edição normativa do dispositivo jurídico da Reforma Psiquiátrica, o
Coordenador de Saúde Mental, à época, Domingo Sávio Nascimento Alves assinou Portarias
na década de 1990. A primeira delas foi a Portaria nº 189 de 19 de novembro de 1991, que
aprovava a inclusão de grupos e procedimentos da tabela SIH-SUS, na área de saúde mental –
hospitais psiquiátricos, ao considerar a necessidade de melhoria na qualidade da atenção às
pessoas portadoras de transtornos mentais por meio da diversificação de métodos e técnicas
terapêuticas, visando à integralidade da atenção a esse grupo.
Já a Portaria nº 224, de 29 de janeiro de 1992, apresentava diretrizes normativas do
serviço em saúde mental contendo princípios da saúde pública como a universalidade,
hierarquização, regionalização e integridade das ações, além de normas para o atendimento
ambulatorial, sobre o funcionamento dos Núcleos/ Centros de Atenção Psicossocial
(NAPs/CAPs) e normas para atendimento hospitalar. Em 10 de novembro de 1999, a Lei
federal nº 9.867 criou e regulamentou o funcionamento de Cooperativas Sociais.
As Cooperativas Sociais foram constituídas com a finalidade de inserir as pessoas em
desvantagem no mercado econômico, por meio do trabalho, fundamentam-se no interesse
geral da comunidade em promover a pessoa humana e a integração social dos cidadãos, e
incluem entre suas atividades (art. 1º da Lei nº 9.867/99). Nesse sentido, para efeito dessa lei,
considerou-se como pessoa em desvantagem, inclusive, os deficientes psíquicos e mentais, as
pessoas dependentes de acompanhamento psiquiátrico permanente e os egressos de hospitais
psiquiátricos (art.3º, II, da Lei nº 9.867/99).
Outro documento normativo importante nesse processo, assinado em 2 de dezembro
de 1999, foi a Resolução nº 298 do Conselho Nacional de Saúde (CNS) que constituiu a
Comissão de Saúde Mental com o objetivo de assessorar o plenário na formulação de políticas
públicas, tendo em vista a necessidade de ampliar e resguardar os direitos das pessoas com
transtornos, em consonância com a Carta de Princípios e Direitos de Cidadania dos Portadores

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de Transtornos Mentais (1991).Criou-se também os Serviços Residenciais Terapêuticos


(SRTs) em Saúde Mental, em 11 de fevereiro de 2000, através da Portaria nº 10640.
Ainda na década de 1990, ocorreu a II Conferência Nacional de Saúde Mental, em
Brasília, entre os dias 1 a 4 de dezembro de 1994, que teve como marco conceitual de
discussão e debate o tema da Atenção Primária e Cidadania. Ademais, discutiu-se também a
Atenção à Saúde Mental e a Municipalização – financiamento, gerenciamento, vigilância,
trabalhadores de saúde e sua organização. Sugeriu-se, no campo dos debates em Direito e
Legislação, a revogação do Decreto nº 24.559 de 1934, ao lado dos temas de Direito Civil e
Cidadania, Direitos Trabalhistas, Drogas e Legislação e Direitos dos Usuários.
De acordo com Roberto Tykanori Kinoshita (1987), o Decreto de 1934 foi formulado
por meio de justificativas técnico-científicas, segundo uma ideologia eugenista que tinha por
objetivo promover a purificação da raça brasileira ao considerar a doença mental como uma
degenerescência moral. Assim, o saber psiquiátrico e sua construção epistemológica se
encontrariam vinculado às práticas institucionais, às propostas econômicas e às políticas de
organização e regulação social. De modo crítico, Jurandir Freire Costa (2006) afirma que
desde a data de promulgação do Decreto de 1934 até os primeiros protestos contra a situação
da assistência mental brasileira, escoou-se aproximadamente um século.
Observado esse silêncio sócio-político e decorridos 12 anos desde a proposição inicial
do Projeto de Lei Paulo Delgado (PL nº 3.657/89), em 6 de abril de 2001, finalmente foi
promulgada a Lei nº 10.216/01 que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas
portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. A
partir de então, as políticas públicas em saúde mental assumiriam uma expressão singular,
direcionadas à luta pela inclusão de novos direitos para os sujeitos em sofrimento mental,
tendo por ideário básico, segundo Mauricio Lougon (2006), as denúncias e críticas ao modelo
assistencial asilar baseado em internações hospitalares, como também às empresas privadas
do setor, chamadas de “indústria da loucura”.

40
Posteriormente, através da Portaria nº 3.090, de 23 de dezembro de 2011 ocorreu a alteração, inclusive
dispondo sobre a Rede de Atenção Psicossocial, sobre repasse de recursos e incentivo de custeio e custeio
mensal para implantação e/ou implementação e funcionamento dos Serviços Residenciais Terapêuticos.

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De acordo com Janaína Lima Penalva da Silva (2007), a partir dessa alteração
legislativa, houve a inserção de um novo direito fundamental na Carta Magna de 1988: o
direito à singularidade41 do portador de sofrimento mental. De fato, o sofrimento psíquico
não é sinônimo de periculosidade, de irracionalidade, de incapacidade civil, tampouco
impedimento para o exercício de cidadania42. Desse modo, o direito à saúde mental entendido,
sobretudo, como preservação e conservação da integridade psíquica do indivíduo assegura a
não discriminação em face do ordenamento jurídico43.
É possível observar através da hermenêutica do texto jurídico da Lei nº 10.216/01, a
presença de normas jurídicas materialmente constitucionais como aquelas que preveem, por
exemplo, a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental contra a discriminação
(art.1º), a tomada de conhecimento, por ocasião do atendimento em saúde mental, dos direitos
da pessoa portadora de transtorno mental (art. 2º, caput), a proteção da honra, da dignidade e
da imagem do usuário (art. 2º, I a IX).
Nesse sentido, ficou demarcada a inescusável responsabilidade do Estado na
promoção da saúde mental pública em âmbito nacional com a participação da sociedade e da
família (art. 3º). Como parte dessa construção, a internação, em qualquer de suas
modalidades, assumiu caráter excepcional cabendo apenas quando os recursos extra-
hospitalares se mostrarem insuficientes (art. 4º). Assim, o tratamento passou a ter como
finalidade permanente a reinserção social do paciente em seu meio, devendo inclusive, nos
casos de regime de internação, ser assegurada a presença de equipe multidisciplinar na
assistência terapêutica composta por serviços médicos, de assistência social, psicológicos,
ocupacionais, de lazer, e outros (art. 3º,§§ 1º e 2º).

41
Significa o direito a ter respeitada uma condição de vida em sofrimento mental, um direito que exige que os
portadores de sofrimento mental sejam tratados com igual respeito e consideração mesmo diante de toda
diferença que a loucura representa (DA SILVA, 2007, p. 126).
42
Trata-se não apenas de desfazer o aparato e a cultura manicomiais ainda hegemônicas no cenário psiquiátrico,
mas, sobretudo construir uma nova maneira de a sociedade lidar com a loucura. A desconstrução do manicômio
implica necessariamente reinventar não só a psiquiatria, mas a própria sociedade em que vivemos. A instituição
psiquiátrica (no seu sentido mais amplo: conceitos, práticas, normas, estabelecimentos assistenciais, dispositivos
legais, corporações profissionais – ou seja, o modo instituído de tratar os loucos) é extremamente reveladora dos
impasses e contradições que atravessam a sociedade (BEZERRA, 1992).
43
Afirma Menelick de Carvalho Netto (2005) que o reconhecimento da diferença específica como direito à
igualdade, em relação aos portadores de sofrimento mental, sempre esteve autorizado pela afirmação dos
princípios de igualdade e liberdade; nós, que não éramos capazes de ver a injustiça até então perpetrada. Dessa
sorte, é que a explicitação mediante lei demonstra o patamar alcançado da nossa comunidade de princípios no
mais fiel cumprimento da Constituição.

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A norma federal também definiu a contrario sensu instituições com características


asilares: todas aquelas desprovidas dos recursos mencionados no §2º e que não assegurem aos
pacientes os direitos enumerados no parágrafo único do art.2º (art. 3º, §3º). Ou seja, se ainda
houver instituições com a ausência das garantias dos direitos fundamentais da pessoa em
sofrimento psíquico, trata-se de um asilo, em outras palavras, de um manicômio.
Em casos específicos de paciente há longo tempo hospitalizado, deve existir uma
política de alta planejada e reabilitação psicossocial assistida (art. 5º), a fim de assegurar sua
reinserção na comunidade política. Entendida como secundária, a internação psiquiátrica
somente será realizada mediante laudo médico circunstanciado que caracterize os seus
motivos (art. 6º, caput).
Quanto aos tipos de internação psiquiátrica, a controvérsia permanece quanto à
internação involuntária (art. 6º, II), sobretudo, acerca da constitucionalidade de tal dispositivo,
à luz da Carta Magna de 1988. Foi também admitida a internação voluntária (art. 6º, I), nessa
hipótese, a pessoa que solicitou sua internação ou que a consentiu, deve assinar, no momento
da admissão, uma declaração de que optou por esse regime de tratamento (art. 7º).
O término da internação voluntária deve ser solicitado por escrito, seja pelo paciente,
seja por determinação do médico assistente (art. 7º, parágrafo único). Quanto ao fim da
internação involuntária, ela também deve ser solicitada por escrito do familiar ou do
responsável legal, ou quando estabelecido pelo especialista responsável pelo tratamento. É
oportuno observar que a internação voluntária ou involuntária somente será autorizada pelo
médico devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina (CRM) onde se localize o
estabelecimento. Assim, em relação à internação compulsória (art. 6º, III), o legislador
ordinário não apresentou especificações territoriais (art. 8º).
A internação psiquiátrica involuntária deverá, no prazo de 72 horas, ser comunicada ao
Ministério Público Estadual pelo responsável técnico do estabelecimento no qual tenha
ocorrido, devendo esse procedimento ser adotado inclusive quando da respectiva alta (art.
8º,§1º). No que se refere à internação compulsória (art. 6º, III), ela deverá ser determinada
pelo juiz competente, de acordo com a legislação vigente, levando em conta as condições de
segurança do estabelecimento, quanto à salvaguarda do paciente, dos demais internados e
funcionários (art. 9º).
Há prazo para outras ocorrências, tais como a comunicação sobre evasão,
transferência, acidente, intercorrência clínica grave e falecimento realizada pelo

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estabelecimento de saúde mental aos familiares, ou ao representante legal do paciente, bem


como à autoridade sanitária responsável, no prazo máximo de 24 horas da data da ocorrência
(art.10). Em respeito à dignidade e à cidadania da pessoa em sofrimento psíquico, as
pesquisas científicas para fins diagnósticos ou terapêuticos não poderão ser realizadas sem o
consentimento expresso do paciente, ou de seu representante legal, e sem a devida
comunicação aos conselhos profissionais competentes e ao Conselho Nacional de Saúde (art.
11).
A lei federal nº 10.216/01 no art.12 estabeleceu que o Conselho Nacional de Saúde
(CNS), no âmbito da sua atuação, criaria a Comissão Nacional para acompanhar a
implementação da Reforma Psiquiátrica. Todavia, somente em 14 de julho de 2007, ou seja,
após transcorrer, aproximadamente, 6 anos através da Resolução nº 377 do CNS, tal comissão
foi criada. Por fim, o art.13 determinou a vigência da nova política nacional em saúde mental
a partir da publicação da Lei da Reforma Psiquiátrica.
Entre os dias 11 a 15 de dezembro de 2001, em Brasília, foi realizada a III Conferência
Nacional de Saúde Mental com o tema Cuidar, sim. Excluir, não. Nela buscou-se ampliar a
discussão sobre a Reforma Psiquiátrica, a fim de aprofundar a consolidação da nova política
em saúde mental emergente ao debater sobre acesso, qualidade, humanização e controle
social. Destacou-se, nesse campo, a reorientação do modelo de assistência em saúde mental,
recursos humanos, financiamento, acessibilidade e cidadania44.

44
No início dos anos 2000, após a III Conferência Nacional em Saúde Mental, diversas Portarias Ministeriais
foram editadas a fim de criar e consolidar a Política Nacional em Saúde Mental. Em 31 de janeiro de 2002, a
Portaria n.251 estabeleceu diretrizes e normas para a assistência hospitalar em psiquiatria, reclassificando os
hospitais psiquiátricos, ao definir a estrutura, a porta de entrada para as internações psiquiátricas na rede do SUS
e instituir o Programa Nacional de Avaliação dos Serviços Hospitalares (PNASH/Psiquiatria). Já em 19 de
fevereiro de 2002, através da Portaria nº 336 foi regulamentado o funcionamento dos Centros de Atenção
Psicossocial. No dia 30 de abril de 2002, a Portaria n.816 criou o Programa Nacional de Atenção Comunitária
Integrada a Usuários de Álcool e outras Drogas. Por fim, em 26 de dezembro de 2002, a Portaria n. 2.391/GM
regulamentou o controle das internações psiquiátricas involuntárias (IPI) e voluntárias (IPV). No ano de 2003, a
fim de promover a efetividade do direito social à moradia, em 31 de julho foi criada a Lei nº 10.708 que institui
o Programa de Volta para Casa e o benefício do auxílio-reabilitação psicossocial para usuários egressos de
internações. Em 14 de outubro de 2004, a Portaria nº 2.197 instituiu a Política Nacional a Atenção Integral a
Usuários de Álcool e outras Drogas. No ano de 2005, dois documentos foram editados, a Portaria n. 245, de 17
de fevereiro, que destinou incentivo financeiro para implantação de Centros de Atenção Psicossocial e a Portaria
nº 336, de 19 de fevereiro, que estabeleceu as modalidades de Centro de Atenção Psicossocial e equipe mínima.
Em 4 de junho de 2009, a Portaria nº 1.190 estabeleceu o Plano Emergencial de ampliação do Acesso ao
Tratamento e Prevenção em Álcool e outras Drogas. Em 25 de agosto de 2009, foi promulgado o Decreto nº
6.949 que promulgou a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo
Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de 2007. Em 20 de maio de 2010, o Decreto nº 7.179 criou o Plano
Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas. Em 6 de dezembro de 2010, a Portaria nº 3.796 institui o
Colegiado Nacional de Coordenadores de Saúde Mental. Já em 30 de dezembro de 2010, a Portaria nº 4.279

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Ao longo da primeira década do século XXI, como demonstrado acima, a Política


Nacional de Saúde Mental brasileira foi se consolidando e permitindo cada vez mais a
inclusão social da pessoa em sofrimento psíquico como sujeito de direitos no âmbito da
comunidade política. A realização da IV Conferência Nacional de Saúde Mental, nos dias
entre 27 de junho a 01 de julho de 2010, em Brasília, foi importante para a manutenção dos
avanços construídos coletivamente no campo social e institucional e para a discussão mais
ampla e complexa sobre os desafios nos campos político, social, psíquico e econômico. Para
isso, estabeleceu-se os seguintes eixos temáticos: (a) Políticas Sociais e Políticas de Estado:
pactuar caminhos intersetoriais, (b) Consolidar a Rede de Atenção Psicossocial e fortalecer os
Movimentos Sociais e (c)Direitos Humanos e Cidadania como desafio ético intersetorial.

estabeleceu diretrizes para a organização da Rede de Atenção à Saúde. Nessa data, editou-se a Portaria nº 4.279
que estabeleceu diretrizes para a organização da Rede de Atenção à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde
(SUS). Após a realização da IV Conferência Nacional em Saúde Mental, o Decreto nº 7.508 de 28 de junho de
2011, regulamentou a Lei nº 8.080/90 para dispor sobre a organização do Sistema Único de Saúde – SUS, o
planejamento da saúde, a assistência à saúde e a articulação interfederativa. Em 7 de julho de 2011, a Portaria nº
1.600 reformulou a Política Nacional de Atenção às Urgências e institui a Rede de Atenção às Urgências no
SUS. Em 21 de outubro de 2011, a Portaria nº 2.488 aprovou a Política Nacional de Atenção Básica. Em 23 de
dezembro de 2011, a Portaria nº 3.086 tratou sobre o financiamento dos Centros de Atenção Psicossocial.
Também na mesma data, diversas portarias foram editadas, como a Portaria nº 3.090 que alterou a Portaria nº
106/2000, dispondo sobre o repasse de recursos de incentivo de custeio e custeio mensal para implantação e/ou
implementação e funcionamento dos Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT), a Portaria nº 3.088 que instituiu
a Rede de Atenção Psicossocial, além da Portaria n. 3.099 que estabeleceu recursos a serem incorporados ao teto
financeiro anual da Assistência Ambulatorial e Hospitalar de Média e Alta Complexidade referentes ao novo tipo
de financiamento dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPs). Em 25 de janeiro de 2012, a Portaria nº 121
institui a Unidade de Acolhimento. Ainda nesta data, a Portaria nº 122, definiu a composição, o processo de
trabalho e o financiamento das equipes dos Consultórios na Rua no âmbito da Atenção Básica, além disso, a
Portaria nº 123 definiu os critérios de cálculo do número máximo de equipes de Consultório na Rua por
Município. Em 26 de janeiro, a Portaria nº 132 instituiu incentivo financeiro de custeio para o componente de
Reabilitação Psicossocial – trabalho e renda, empreendimentos solidários e cooperativas sociais. Nessa mesma
data, a Portaria nº 13º redefiniu o CAPS AD III e os incentivos financeiros. Ademais, a Portaria nº 131
incentivou financeiramente o custeio dos Serviços de Atenção em Regime Residencial, incluídas as
Comunidades Terapêuticas. Em 31 de janeiro de 2012, a Portaria nº 251 estabeleceu diretrizes e normas para a
assistência hospitalar em psiquiatria, reclassificando os hospitais psiquiátricos e internações psiquiátricas. Nessa
data, a Portaria nº 148 tratou sobre o funcionamento e habilitação do Serviço Hospitalar de Referência. Em 29 de
fevereiro de 2012, a Portaria nº 349, alterou a Portaria nº 148 com a criação do Serviço Hospitalar de Referência
juntamente com a Portaria nº 1.615, de 26 de julho, que alterou a Portaria nº 148. Em 22 de agosto de 2012, a
Portaria nº 856 criou a Unidade de Atenção em regime residencial e Comunidade Terapêutica. Também nesta
data, a Portaria nº 854 alterou a tabela de procedimentos. Em 17 de setembro de 2012, a Nota Técnica nº 854
tratou sobre instrumentos de informação. Já em 21 de setembro de 2012, a Portaria nº 953 incluiu na Tabela de
Habilitação do SCNES Serviços Hospitalares de Referência para a atenção a pessoas com sofrimento ou
transtorno mental incluindo aquelas com necessidades de saúde decorrentes do uso de álcool e outras drogas. Em
24 de julho de 2013, a Portaria nº 1.516 alterou o conhecimento da Comissão Intergestores Bipartite (CIB) da
Portaria nº 148, juntamente com a Portaria nº 3.091 publicada em 13 de dezembro de 2013. Já a Portaria nº 1.966
de 10 de setembro de 2013 promoveu a mudança do custeio do CAPS AD III e CAPS III. Em 2014, a Portaria nº
2.840 de 29 de dezembro criou o Programa de Desinstitucionalização integrante do componente Estratégias de
Desistitucionalização da Rede de Atenção Psicossocial (RAPs), no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), e
instituiu o respectivo incentivo financeiro de custeio.

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No caminho de promover a autonomia, a independência e emancipação das pessoas


em sofrimento psíquico, o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/15) com base na
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, da ONU 45 e seu protocolo
facultativo ratificado na forma do artigo 5º, parágrafo 3º da Constituição da República
Federativa do Brasil, estabeleceu diretrizes e normas gerais, bem como os critérios básicos
para assegurar, promover e proteger o exercício pleno em condições de igualdade dos direitos
fundamentais individuais e sociais pelas pessoas com deficiência, inclusive aquelas que
possuem impedimentos de longo prazo de natureza mental, o qual poderia obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas
(artigo 2º da Lei nº 13.146/15).
Sendo assim, a previsão do direito à saúde mental, orientada pelo Estatuto da Pessoa
Deficiente deu maior alcance aos direitos e às garantias previstos na Lei da Reforma
Psiquiátrica. Afirma Eduardo Mourão Vasconcelos (2016) que em relação ao ponto de vista
das entidades internacionais que tratam sobre as políticas de saúde mental no mundo, a
Declaração dos Direitos das Pessoas com Deficiência (2007) da Organização das Nações
Unidas, assumida no Brasil na forma do Decreto nº 6.949 de 2009 com status de Emenda
Constitucional tem norteado e estimulado os processos de reforma psiquiatra nos países
signatários.

3. O RETROCESSO NA “NOVA” POLÍTICA EM SAÚDE MENTAL E A CARTA DE


BAURU (2017)

Entretanto, desde a exoneração no dia 11 de dezembro de 2015, Roberto Tykanori


Kinoshita, médico psiquiatra e professor da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP),
da Coordenação Nacional da Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas e a controversa e
polêmica nomeação de Valencius Wurch, médico psiquiatra, pelo então Ministro da Saúde,
Marcelo Castro, o quadro das estratégias em saúde mental com lugar privilegiado no

45
Conforme afirma Lívia Barbosa Pereira (2013), a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e
seu Protocolo facultativo constitui o mais recente documento internacional de proteção aos direitos das pessoas
com deficiência. É a primeira convenção do milênio, adotada na Organização das Nações Unidas (ONU) em 13
de dezembro de 2006, em reunião da Assembleia Geral na comemoração do Dia Internacional dos Direitos
Humanos A Convenção foi originalmente proposta pela Delegação do México, na Assembleia Geral da ONU em
2001, quando se formou um Comitê responsável pelos trabalhos e pela sua construção. Atualmente, a Convenção
conta com 153 assinaturas e 110 ratificações, e seu Protocolo Facultativo com 90 assinaturas e 63 ratificações.

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tratamento terapêutico em comunidade tornou-se não mais o locus principal do tratamento


psiquiátrico, porém foi marcado pelo retorno aos modelos hospitalocêntrico e biomédico na
análise da complexidade do campo da saúde mental, identificados, sobretudo, nas escolhas de
natureza administrativa da gestão e na preferência política das decisões da pasta do Ministério
da Saúde. Sob fortes pressões do Movimento da Luta Antimanicomial e outras entidades
profissionais, o Ministro da Saúde substituto, José Agenor Álvares, exonerou Valencius Wuch
no dia 06 de maio de 2016.
Em 10 de fevereiro de 2017, ocorreu a nomeação de Quirino Cordeiro Junior, médico
psiquiatra e professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo
(FCMSCSP) e da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), pelo atual Ministro da
Saúde, Ricardo Barros. Com o apoio dos setores conservadores em saúde mental, como a
Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e da Federação das Comunidades Terapêuticas
(FCT), Quirino propôs uma nova diretiva em saúde mental, contrária à construção histórica da
Luta Antimanicomial, através da aprovação da Resolução nº 32 de 14 de dezembro de 2017.
Na ocasião da apresentação da nova proposta em saúde mental, ele obteve o apoio do
Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (CONASS) e do Conselho Nacional de
Secretarias Municipais de Saúde (CONASSEMS), com voto contrário do Conselho Nacional
da Saúde (CNS) que pediu o debate público, já que a decisão da Comissão Intergestores
Triparte (CIT) desconsiderou os avanços da Reforma Psiquiátrica ao longo dos 30 anos.
Na análise da Resolução nº 32/2017, cuja ementa afirma estabelecer diretrizes para o
“fortalecimento” da Rede de Atenção Psicossocial (RAPs), verifica-se a criação de novos
dispositivos como Unidade de Acolhimento- Adulto/ Infanto-juvenil (art.1º, item 4)46,
Unidades de Referências Especializadas em Hospitais Gerais (art.1º, item 7), Equipe
Multiprofissional de Atenção Especializada em Saúde Mental (art.1º, item 9) e Hospitais
Psiquiátricos Especializados. No sentido de consolidar as mudanças, tal resolução afirma que
realizará a habilitação e o incentivo de todos os serviços da RAPS que estejam “tecnicamente
aprovados” pela Coordenação-Geral de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas (art. 2º).
Há também a previsão de um pacto a fim de promover diretrizes clínicas para linhas
de cuidados na RAPs (art. 3º), bem como critérios de acompanhamento e monitoramento da
rede, com metas, indicadores qualitativos e quantitativos, estimulando ainda a adequada

46
Tal dispositivo encontra previsão no art. 9º, II da Portaria nº 3.088/11.

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regulação do acesso dos usuários aos diferentes pontos de atenção da rede (art. 4º). Entretanto,
curiosamente, não se apresentou a explicação dos “parâmetros” científicos para a medição na
avaliação técnica da saúde mental.
Outro impasse se refere à proibição de qualquer ampliação da capacidade já instalada
de leitos psiquiátricos em hospitais especializados (art. 5º). Observa-se que além de não
promover a extinção progressiva dos leitos psiquiátricos, o presente documento mostra-se
favorável a sua manutenção. Ademais, a criação da Equipe Multiprofissional de Atenção
Especializada em Saúde Mental, ao que parece, prestará serviços de média complexidade em
nível ambulatorial e hospitalar compreendendo inclusive serviços de urgência e emergência.
Em princípio, tal iniciativa não parece contrária à Rede de Atenção Psicossocial,
entretanto ao analisar a Portaria nº 3.088/11, é possível verificar que o ponto de atenção da
RAPs na atenção psicossocial é o Centro de Atenção Psicossocial (art. 7º, caput da Portaria nº
3.088/11) e não a unidade hospitalar, tampouco os eventuais serviços ambulatoriais e
emergenciais prestados (art. 5º da Portaria nº 3.088/11). Observe que também nos CAPs há a
previsão de equipe multidisciplinar (art. 7º, § 1º da Portaria nº 3.088/11) nas diversas
modalidades, em razão da necessidade do atendimento psiquiátrico (art. 7º, § 4º da Portaria nº
3.088/11).
Em relação aos usuários de álcool e outras drogas, a Resolução nº 32/2017 como
solução buscou estabelecer a criação de nova modalidade de Centro de Atenção Psicossocial
(CAPs AD IV), com funcionamento 24 horas, prestando assistência de urgência e emergência
para ofertar “linhas de cuidado em situações de cenas de uso de drogas, especialmente o crack
(cracolândia)”, de forma multiprofissional e intersetorial (art. 7º). Todavia, o CAPs AD III, já
presente na RAPs, possui a mesma disponibilidade de funcionamento, conjugando a
reintegração social do usuário ao território. Curiosamente, a nova proposta não explicou “as
linhas de cuidado” ofertadas nas cracolândias, por exemplo, onde há explícitas situações de
uso de drogas, sem violentar física e mentalmente as pessoas em sofrimento psíquico em
situação de rua, já que a política de redução de danos, ao que parece, não encontra assento
nessas novas diretrizes.
Como promessa de desinstitucionalização de pacientes moradores em hospitais
psiquiátricos através dos Serviços de Residências Terapêuticas (SRTs), a Resolução nº
32/2017 buscará dar maior flexibilidade para a gestão municipal, bem como fortalecer e
apoiar técnica e financeiramente o processo, além de habilitar 200 SRTs até o final de 2018

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(art. 8º). Uma aporia diante do privilégio que a presente resolução oferece ao sistema
hospitalocêntrico, ao desconsiderar inclusive a previsão da Portaria nº 3.090/11, ANEXO I –
Das Diretrizes do funcionamento dos Serviços Residenciais Terapêuticos que já apresenta o
tratamento terapêutico no local de habitação dos usuários.
Além disso, de acordo com o art. 2º, § 3º da Portaria nº 3.090/11, os SRTs I e II
devem manter-se como unidades de moradia, inseridos na comunidade, devendo estar
localizados fora dos limites de unidades hospitalares gerais ou especializadas, estando
vinculados à rede de serviços de saúde.
Ainda em proposta contrária a extinção dos leitos psiquiátricos, o art. 9º da Resolução
nº 32 tem a iniciativa de ampliar a oferta de leitos hospitalares qualificados para a atenção a
pessoas com transtornos mentais e/ou com necessidades decorrentes do uso do crack, álcool e
outras drogas. Curiosamente, o monitoramento sistemático da taxa de ocupação mínima das
internações em Hospitais Gerais deverá servir para o pagamento integral do procedimento
como forma de incentivo (art. 9º, III). Ainda em relação ao financiamento, há a proposta de
reajuste do valor das diárias para internação em hospitais especializados de forma escalonada,
em relação aos atuais níveis, conforme o porte do Hospital (art. 9º, IV).
Por fim, assumiu-se o compromisso no financiamento de pesquisas que subsidiem a
implantação de Programas de Prevenção ao Uso de Álcool e Outras Drogas para adolescentes
e jovens (art.10º). Além disso, buscou-se o fortalecimento da parceria e o apoio intersetorial
entre o Ministério da Saúde, Ministério da Justiça, Ministério do Desenvolvimento Social e
Ministério do Trabalho em relação às Comunidades Terapêuticas (art.11º), em evidente
demonstração do interesse de incluí-las na RAPs47.
Firmou-se também o compromisso de promover ações de prevenção ao suicídio, por
meio de parcerias com Estados e Municípios, bem como instituições que atuam nesta área
(art.12). A Resolução nº 32 entrou em vigor em 14 de dezembro de 2017 (art.13),
enfraquecendo a Política Nacional de Saúde Mental48.

47
Atualmente, a Portaria nº 3.088/11 prevê os serviços de atenção em regime residencial, entre os quais as
Comunidades Terapêuticas, destinada a promoção de serviços contínuos de saúde, de caráter residencial
transitório até 9 meses com necessidades clínicas estáveis decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas
(art. 9º, II). Assim, na presente estrutura a Comunidade Terapêutica tem utilização secundária e temporária, não
cabendo elencá-la inclusive como dispositivo principal na RAPs.
48
É importante considerar a Nota Pública da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PGR-
00505982/2017), do Ministério Público Federal, emitida no dia 13 de dezembro de 2017 apresentando críticas
quando à “nova” política em saúde mental.

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Atento aos eventuais retrocessos no campo da saúde mental que, infelizmente, se


confirmaram como demonstrado acima, o Movimento dos Trabalhares em Saúde Mental
(MTSM), nos dias 8 e 9 de dezembro de 2017, realizou o Encontro em Bauru- São Paulo, e
editou, coletivamente, uma nova Carta. Inicialmente, recordou-se o compromisso da
denúncia do papel de agentes de exclusão designados aos trabalhadores em saúde mental.
Novamente, a defesa intransigente dos direitos humanos e da cidadania dos chamados
de loucos. A reafirmação de que a Luta Antimanicomial faz parte da luta por uma
transformação social ampla e verdadeira. (CARTA DE BAURU, 2017). Assim, discutir saúde
mental é discutir o exercício político dos saberes e práticas psiquiátricas.
Reafirmou-se o manicômio mais uma vez como forma de opressão da sociedade ao
lado do comprometimento irrevogável de uma sociedade sem manicômios: Uma escolha foi
feita e decidimos a nossa direção: rumo à uma sociedade sem manicômios (CARTA DE
BAURU, 2017).
À época da primeira Carta de Bauru, destacou-se o tempo fecundo da afirmação da
democracia brasileira nos movimentos e nas ruas. Ao tomar a palavra, as pessoas em
sofrimento psíquico defenderam seu direito de viver, trabalhar, conviver e criar nos espaços
das cidades. A Luta Antimanicomial permanece sustentada, unida e organizada em
movimento social composto por trabalhadores, estudantes, usuários e familiares (CARTA DE
BAURU, 2017).
Destacou-se na luta a construção do projeto de lei antimanicomial e sua aprovação no
Congresso Nacional, bem como o desafio da implementação do Sistema Único de Saúde
(SUS) nos anos 1990. Nesse sentido, uma nova Política Nacional de Saúde Mental foi
construída, a partir da mobilização social em quatro Conferências Nacionais49.
Nesse documento foi destacada a desconstrução do modelo asilar no tratamento em
saúde mental, a partir da redução de leitos em hospitais psiquiátricos, com a implantação dos
Centros de Atenção Psicossocial (CAPs), exercendo no território o cuidado em liberdade50.

49
“Realizamos marchas, manifestações, passeatas, ofertando à sociedade brasileira o alegre sabor da liberdade
(CARTA DE BAURU, 2017)”.
50
“Inventamos novos serviços e redes, arranjos e experiências, que gritam com voz forte a potência deste
cuidado. Combatemos a cada dia o manicômio em suas várias formas, do hospital psiquiátrico à comunidade
terapêutica, incluindo o manicômio judiciário; e a lógica manicomial que disputa o funcionamento de todos os
espaços do viver. Gravamos, em corpos e mentes, a certeza de que toda a vida vale a pena, a ser vivida em sua
pluralidade, diversidade e plenitude. Temos orgulho das conquistas que garantiram a transformação da atenção
pública em saúde mental em todos os quadrantes de nosso país: milhares de CAPS, ações na atenção básica, o

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Em que pese não constar expressamente na Carta de Bauru (1987), o compromisso de


construir uma política de cuidado estendida às pessoas em uso de álcool e outras drogas, tal
programa foi implementado, ao longo dos anos, como uma política para as pessoas,
antiproibicionista e pela legalização do uso, na perspectiva da redução de danos, produzindo
uma atenção intrinsicamente conectada com a defesa de seus direitos (CARTA DE BAURU,
2017).
Outra ênfase no processo de luta na construção do campo em saúde mental pública,
presente na Carta de Bauru (2017), refere-se ao cuidado à infância e à juventude51.
Associado às discussões sobre as práticas e saberes do dispositivo psiquiátrico,
apresentou-se um panorama do cenário político atual, destacando o período de globalização e
hegemonia da ideologia neoliberal que aprofundou as desigualdades sociais, sobretudo, nos
países periféricos – como no Brasil52.
Recordou-se no texto da Carta, o atual período de graves retrocessos e riscos
crescentes à democracia brasileira, principalmente, na não implementação de políticas
públicas garantidoras dos direitos sociais previstos na Carta Política de 1988. Entretanto, a
memória dos anos de livre e amoroso cuidado são indeléveis e duradouros, destaca a Carta de
Bauru (2017)53.

Programa de Volta Pra Casa, novos modos de trabalhar e produzir, múltiplos projetos de arte, cultura, economia
solidária, geração de trabalho e renda e protagonismo (CARTA DE BAURU, 2017)”.
51
“Com a exigência do cuidado para a infância e juventude, enfrentamos a medicalização das crianças e a
criminalização dos jovens. A presença protagonista de crianças e adolescentes e seus familiares nesse Encontro é
um marco histórico e indica a importância da continuidade e avanço das políticas públicas de saúde mental
intersetoriais para crianças e adolescentes na perspectiva do cuidado sem controle, garantindo seu direito à voz
para a construção de uma sociedade livre de manicômios. Cuidar da infância e da adolescência em liberdade é
fundamental na nossa luta (CARTA DE BAURU, 2017)”.
52
“Nestes 30 anos, entretanto, o mundo viveu a globalização e a hegemonia da ideologia neoliberal, produzindo
uma gritante desigualdade: 1% da população mundial tem mais riquezas que os outros 99%. Isto conduziu a uma
ruptura do pacto civilizatório contido na Declaração Universal dos Direitos Humanos: quando os interesses do
capital tudo dominam, não há direito que se respeite nem vida que tenha valor. No Brasil, um processo de
redução das desigualdades sociais, iniciado nos anos 2000, foi brutalmente interrompido pelo golpe de 2016;
golpe que resultou, dentre tantos outros efeitos deletérios, na ampliação do processo vigente de privatização e na
redução de recursos para as políticas públicas sociais, como moradia, transporte, previdência, educação, trabalho
e renda e saúde. Vivemos um violento ataque ao SUS, com a diminuição do financiamento e a desfiguração de
seus princípios de universalidade, equidade e integralidade. Nossa democracia, ferida, vive hoje, sob constante e
forte ameaça. Precisamos fortalecer a luta por um processo de educação permanente, por nenhum serviço a
menos, nenhum trabalhador a menos e nenhum direito a menos (CARTA DE BAURU, 2017)”.
53
“Acesa e viva, mantém-se a nossa disposição de lutar contra tudo aquilo que é intolerável para a dignidade das
pessoas e nefasto para o seu convívio enquanto iguais: a exploração e a ganância, o manicômio e a tortura, o
autoritarismo e o Estado de exceção. Tecemos laços de afeto e de solidariedade que nos acolhem na dor e nos
protegem no abandono - sustentando o delicado equilíbrio da esperança em nossos corações. Portanto,
prosseguimos, com o mesmo empenho tenaz, na luta por uma sociedade sem manicômios. Não podemos deixar

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Ancorados sob o paradigma da liberdade, a Luta Antimanicomial apresentou a


necessidade urgente de articulação com os movimentos feministas, negro, LGBTTQI
(Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Queers e Pessoas Intersex), movimento
da população em situação de rua, por trabalho, moradia, indígena entre outros, a fim de
construir lutas conjuntamente (CARTA DE BAURU, 2017). Em face da atual conjuntura
política e econômica do Brasil, na declaração final da Carta de Bauru (2017) consta a
necessidade de reafirmação e radicalização do posicionamento antimanicomial54 como a
origem de um novo lema: “nenhum passo atrás: manicômio nunca mais!”, encerrando com o
anterior: “por uma sociedade sem manicômios”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Duas cartas55, dois documentos, um compromisso: a liberdade. Poder-se-ia


compreendê-las a partir das diversas dimensões sobre o tempo, a fim de verificar o seu
cumprimento. Todavia, fato é que toda carta encerra uma promessa, um desejo, uma vontade.
Nesse sentido, é necessário analisar o contexto sócio-histórico de ambos desejos, expressos
em vivas palavras, de modo coletivo, para melhor apreensão do continuum e das eventuais
disrupturas ao longo da efetividade política do campo da saúde mental pública brasileira.
Vontade e perseverança como virtudes presentes em ambos os documentos pela
manutenção da vida e do vivente, em respeito à diversidade existencial na forma plena.
Vontade como potência para agir e desconstruir práticas e saberes excludentes e
discriminatórios e saudar à vida e a perseverança na existência, a partir da vida ao desejar à
individuação e à singularidade existencial na comunidade política.
A ebulição político-social que marcou a Carta de Bauru (1987), sob o clima do
processo de construção da abertura democrática e da esperança de dias melhores e mais

de frisar o avanço do conservadorismo e da criminalização dos movimentos sociais, defendemos a diversidade


sexual e de gênero, as pautas feministas, a igualdade racial. Somos radicalmente contra o genocídio e a
criminalização da juventude negra, a redução da maioridade penal, a intolerância religiosa e todas as formas de
manicômio, que seguem oprimindo e aprisionando sujeitos e subjetividades (CARTA DE BAURU, 2017)”.
54
“É preciso sustentar que uma sociedade sem manicômios reconhece a legitimidade incondicional do outro
como o fundamento da liberdade para todos e cada um; que a vida é o valor fundamental; que a sociedade sem
manicômios é uma sociedade democrática, socialista e anticapitalista (CARTA DE BAURU, 2017)”.
55
Refiro-me às Cartas de Bauru (1987; 2017).

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justos, sobretudo, do ponto de vista da igualdade material, provocou profundas alterações na


estrutura sanitária da história brasileira, tal como a Carta Política de 1988, consolidando os
direitos e garantias fundamentais dos cidadãos.
Hoje, em tempos de obscurantismo político e defasagem das políticas públicas
garantidoras de direitos sociais, a Carta de Bauru (2017) apresenta-se como um instrumento
de resistência e luta pela consolidação da cidadania da pessoa em sofrimento psíquico.
Antecipadamente, a Luta Antimanicomial se posicionou de modo crítico a “nova” política em
saúde mental, na certeza de que, tal como foi no passado acima demonstrado, as sombras do
porvir estão diante dos nossos olhos, sob as nossas mãos e nossos pés, às imagens.

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Revista Diorito, v. 2. n. 1. Jan./Jun.2018. 120


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Recebido em 19.12.2017
Aprovado em 29.12.2017

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