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JORNAL de PSICANÁLISE 46 (85), 159-164.

2013

Experiência em grupo:
notas sobre o estilo de Bion,
transmissão e método de leitura

Adriana Salvitti1

Resumo: A autora apresenta algumas características do estilo de Bion, articulando


a sua estratégia retórica à transmissão da psicanálise. Utiliza o livro Experiências
com grupos (1961/1975) para expor como a narrativa das suas observações
clínicas também pretende ser um modo de reproduzir uma atmosfera emocional.
Através de uma linguagem performativa, Bion envolve o leitor na criação de um
grupo ampliado, e assim encontra uma forma de comunicar e de disseminar as
suas ideias, estimulando um pensamento clínico. Esse livro também é utilizado
pela autora para delinear um método de leitura e de interpretação de textos.
Palavras-chave: estilo, transmissão, linguagem performativa, grupo

Na década de 1940, Bion explorou de modo bastante original as tensões


emocionais presentes em grupos terapêuticos. As suas descobertas foram publi-
cadas naquele período e, posteriormente, reunidas no livro Experiências com
grupos (1961/1975). No prefácio à edição brasileira do livro, essas experiências
e as suas elaborações teóricas, tomadas no conjunto da obra de Bion, são iden-
tificadas como “o ponto de partida de uma fonte de conhecimentos que forne-
ceu ao Autor vários elementos para o exercício de uma atividade criadora, que
o situa como o psicanalista mais discutido da atualidade” (Bion, 1961/1975).
Ainda segundo o editor seria possível encontrar, “em estado nascente, conceitos
que hoje já nos são familiares” (Bion, 1961/1975).
Tomando a obra de Bion em um sentido diacrônico, são frequentes os co-
mentadores deste autor que consideram haver muito mais continuidade entre os
trabalhos de Bion com grupos e com seus pacientes individuais do que poderia
fazer crer uma visão purista dos mesmos. Um trabalho parece ter contribuído
para o outro, e o próprio livro de Bion sobre grupos representa uma tentativa de
o autor estabelecer aproximações teóricas entre essas descobertas e a psicanálise
individual.
A abordagem de Bion aos grupos foi marcada pelo início de sua for-
mação como psicanalista, especialmente com o atendimento de pacientes

1 Pós-doutoranda no Instituto de Psicologia da usp; membro filiado do Instituto de Psicanálise


“Durval Marcondes” da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, sbpsp. Apoio fapesp.
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JORNAL de PSICANÁLISE 46 (85), 159-164. 2013

psicóticos, mesmo que os achados de cada uma dessas áreas requeressem um


desenvolvimento conceitual próprio. Os fenômenos não são rigorosamente os
mesmos; porém, há um interesse comum e recorrente na obra do autor pelas
dimensões mais arcaicas da experiência humana no contato com o outro. A esse
interesse comum se soma a necessidade de Bion discutir o método envolvido na
observação dessas dimensões, estabelecer as condições de possibilidade da ob-
servação e seus entraves. Essa discussão ganhou uma grande complexidade em
sua obra, principalmente por ser apresentada de modo entrelaçado à temática
da transmissão da psicanálise em trabalhos científicos. Essa última temática
está referida à transmissão daquilo que se observou das experiências, à forma
de transmiti-las dentro e fora da sessão, bem como à transmissão do método
de observação. Bion encontrará diferentes maneiras de problematizar e de lidar
com essas questões em sua obra. Por ora, cabe dizer que no momento inaugural
do pensamento do autor com grupos, havia uma expectativa de que o seu pro-
cedimento inovador fosse explicitado.
Provocado pela crença presente em seus grupos terapêuticos e entre os
seus pares de que ele tinha uma técnica própria, passível de ser objetificada,
aplicada e reproduzida, Bion responde a isso tentando aproximar o leitor de
uma experiência. Dá notícias da atmosfera emocional presente nos grupos, e
das imagens, analogias e lembranças que lhe ocorriam ao observar certos fenô-
menos. No diálogo com o leitor, Bion utiliza um estilo retórico semelhante ao
usado por Freud em alguns trabalhos. Escreve tendo em mente alguém crítico e
desconfiado de sua conduta, de suas descobertas e colocações, tal qual reagiam
os membros de seus grupos.
Mais do que tentar convencer o leitor de suas posições ou eliminar des-
confianças, a estratégia de Bion parece ser a de promover um debate balizado
por referências teóricas diversas (como Freud e Aristóteles), combinadas ao
material das sessões. A ideia é que a partir dessa discussão o leitor poderia
“chegar às suas próprias conclusões” (Bion, 1961/2004, p. 40). Essa estratégia
não significa que Bion escreve o livro como uma resposta direta às expectativas
e desconfianças do leitor, mas certamente pretende incitar a participação ati-
va do mesmo, tanto intelectual quanto emocional. Bion diz: “pode ser útil se
eu tentar oferecer ao leitor alguma explicação de comportamento que pode, a
essa altura, intrigá-lo tanto quanto intriga o grupo” (Bion, 1961/2004, p. 31).
E ainda: “Muitas questões devem ter ocorrido ao leitor. Ele deve pensar que
a minha atitude em relação ao grupo é artificialmente ingênua, e certamente
egoísta” (Bion, 1961/2004, p. 31). E, com seu tom caracteristicamente irônico,
deduz: “Se minha descrição do que é estar em um grupo do qual sou membro
for de todo adequada, o leitor terá experimentado alguma apreensão, acolhido
algumas objeções e reservado muitas questões para discussão futura” (Bion,
1961/2004, p. 39).

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Experiência em grupo | Adriana Salvitti

Como sugere o título, Experiências com grupos tem a experiência como


mote e a ela é conferida uma grande amplitude de significado. Trata-se da ex-
periência vivida nos grupos por seus membros, incluindo Bion, e da experiência
emocional provocada no leitor, seja pelo desassossego com a narrativa, seja pe-
las evocações acerca do que significa estar em grupo. Assim, o comportamento a
ser explicado por intrigar tanto o leitor quanto o grupo não é somente o do ana-
lista. É também o comportamento do grupo e do próprio leitor. Diferentemente
da tradução para o português, onde se lê: “pode ser útil tentar oferecer ao
leitor alguma explicação de meu comportamento” (Bion, 1961/1975, p. 23,
grifo meu), no trecho original, em inglês, não há indicação do pronome pos-
sessivo: “it may be useful if I try to offer the reader some explanation of beha-
viour which may, by this time, puzzle him as much as it does the group” (Bion,
1961/2004, p. 31).
Esse caráter vago e escorregadio a respeito do sujeito do discurso pode
ser notado em diferentes trabalhos e constitui uma das marcas de seu estilo.
Uma hora Bion pode estar fazendo menção ao paciente e, no mesmo momento,
parecer que a referência é sobre o analista ou sobre o próprio leitor. Isso gera
certo atordoamento, mas também faz ver que Bion está tentando comunicar
algo que é comum a todos eles (ou a todos nós), seja em sua teoria sobre grupos
ou, mais tarde, em sua teoria do pensar. Assim, o que está em pauta nem sempre
é o paciente e sua psicopatologia, mas a descrição de estados emocionais e de fe-
nômenos bastante primitivos, relacionados ao florescimento e à deterioração da
mente. A limitação do homem para usar a sua capacidade de pensar levará Bion
a estabelecer um intrigante paralelismo entre o cientista e o psicótico: ambos
lidam de modo eficiente com o inanimado e carecem de um aparato para pensar
a vida. Daí o contínuo compromisso de Bion em discutir e promover o método
psicanalítico, e em explicitar o processo de pensar as experiências emocionais 2.
O título em inglês de seu livro sobre grupos é Experiences in Groups
(em grupos) e não with groups (com grupos). Isso indica um posicionamento
que ocorre desde dentro de uma experiência, em que se descobre e se apren-
de a partir dela, tal como revela o título de outro livro seu, Learning from
Experience (Bion, 1962/1991). Este último também foi erroneamente traduzido
por O aprender com a experiência (Bion, 1962/1966), pois seria mais correto
dizer Aprendendo da experiência, ou a partir da experiência. Desse modo seria
contemplada uma participação que ocorre desde dentro, e que está em processo
(indicada pelo uso do gerúndio). Ademais, o verbo learn não quer dizer apenas
aprender, mas também descobrir. Esse significado retira a conotação pedagógi-
ca que ele acaba tendo em português.

2 Em Aprendendo da experiência, Bion diz: “Confrontado com as complexidades da mente hu-


mana o analista deve ser prudente em seguir até mesmo um método científico aceito; a debili-
dade deste último pode estar mais próxima à debilidade do pensar psicótico do que um exame
superficial chegaria a admitir” (Bion, 1962/1991, p. 14).
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A temática da experiência será articulada a um estilo característico de


Bion, em que o objetivo não é só explicar os seus conceitos e usar a linguagem
como representação de ideias. O objetivo é utilizar o seu potencial performati-
vo a fim de implicar o leitor e mostrar o que Bion quer comunicar, fazendo o
significado acontecer no processo de leitura. Esse estilo ganha contornos cada
vez mais pronunciados nos textos em que há um interesse do autor em especi-
ficar a natureza do objeto de investigação psicanalítico, e sua possibilidade de
transmissão.
Convocar a participação do leitor e implicá-lo de modo ativo na leitura
por meio da narrativa de suas experiências acaba se tornando uma estratégia
de transmissão. Bion cria com o leitor um grupo ampliado, no qual intenciona
comunicar as suas ideias e disseminar um pensamento clínico. A narrativa de
experiências não visa a ser uma prova das descobertas de Bion, nem mesmo
uma demonstração, pois, a rigor, ele reconhece a impossibilidade de fazer o lei-
tor ver o que ele viu. A maneira que Bion encontra para transmitir a pertinência
de suas observações é trazendo o leitor para dentro de uma experiência.
Em seu livro sobre grupos, ao apontar a maneira como os membros coo-
peram anonimamente entre si para satisfazer a necessidade de obter segurança,
proteção e de se reproduzir, Bion diz:

Não multiplicarei exemplos de trabalho em equipe como característica da men-


talidade grupal, principalmente porque não posso, no momento, encontrar ne-
nhum método de descrevê-la. Deverei me apoiar em exemplos fortuitos, à medida
que eles ocorrerem … a fim de dar ao leitor uma ideia melhor do que quero dizer;
porém, suspeito de que nenhuma ideia real pode ser obtida fora de um grupo ele
mesmo. (Bion, 1961/2004, p. 52, grifo meu)

Considerando o interesse de Bion pela transmissão da psicanálise em suas


diferentes vertentes, combinado ao uso de uma estratégia retórica que procura
envolver o leitor, retomamos de outra perspectiva a citação do editor brasileiro
de Experiências com grupos apresentada no começo. Se a obra de Bion pode ser
vista em um sentido diacrônico, sendo o seu trabalho inicial fonte de concep-
ções futuras, como diz o editor, pensamos os textos de Bion também no sentido
sincrônico. O próprio texto, seja ele de que período for, pode ser origem de
irradiação para outros textos, sejam eles posteriores ou mesmo anteriores. Um
texto se torna, ainda, fonte disparadora de associações entre diferentes sujeitos
do discurso, tal como ocorre quando Bion se utiliza de ambiguidades e im-
precisões, provocando uma polifonia intencional. Trata-se de uma perspectiva
intertextual de leitura e interpretação, em que um texto gera remissões a outros,
num movimento ampliado de ligação e de trânsito entre ideias. Não se trata de
estabelecer ligações aleatórias, nem de opor a essa leitura uma compreensão

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Experiência em grupo | Adriana Salvitti

cronológica. Trata-se de dar ouvidos e, no limite, conferir pensabilidade às res-


sonâncias e evocações estimuladas e esperadas por Bion de seu leitor.
Assim, é possível tirar proveito das características do estilo de Bion e
compreender desde dentro de uma experiência as suas concepções sobre o méto-
do e as suas teorias de observação. Isso ocorre pois o seu objetivo não é apenas
esclarecer ideias e explicar conceitos, mas é também estabelecer ambiguidades,
provocar remissões, despertar experiências e gerar significados.

Experiencia en grupo: apuntes sobre el estilo de Bion, la transmisión y el método


de la lectura
Resumen: La autora presenta algunas características del estilo de Bion,
articulando su estrategia retórica a la transmisión del psicoanálisis. Utiliza el
libro Experiencias con grupos (1961/1975) para exponer cómo la narrativa de
las observaciones clínicas de Bion también intenta ser una manera de reproducir
una atmósfera emocional. A través de un lenguaje performativo, Bion involucra
al lector en la creación de un grupo ampliado, y así encuentra una manera
de comunicar y difundir sus ideas, estimulando el pensamiento clínico. Este
libro también es utilizado por la autora para delinear un método de lectura e
interpretación de textos.
Palabras clave: estilo, transmisión, lenguaje performativo, grupo

Experience in group: notes on Bion’s style, transmission of psychoanalysis and


reading method
Abstract: The author presents some characteristics of Bion’s style, articulating his
rhetorical strategy with the transmission of psychoanalysis. The book Experiences
in Groups (Bion, 1961/2004) is used to show how the narrative of Bion’s clinical
observations is also intended as a way of reproducing an emotional atmosphere.
Through a performative language, Bion involves the reader in the creation of an
enlarged group, and so finds a way to communicate and to disseminate his ideas
promoting a clinical thinking. This book is also used by the author to outline a
method of reading and interpreting texts.
Keywords: style, transmission of psychoanalysis, performative language, group

Referências
Bion, W. R. (1966). Os elementos da psicanálise: inclui O aprender com a experiência. Rio de
Janeiro: Zahar. (Trabalho original publicado em 1962)
Bion, W. R. (1975). Experiências com grupos. Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original
publicado em 1961)
Bion, W. R. (1991). Learning from Experience. Londres: Karnac. (Trabalho original publicado em
1962)
Bion, W. R. (2004). Experiences in Groups and Other Papers. Nova York: Routledge. (Trabalho
original publicado em 1961)

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JORNAL de PSICANÁLISE 46 (85), 159-164. 2013

Adriana Salvitti
Rua Professor Pedro da Cunha, 65
05010-020 São Paulo, SP
Tel: 11 99874-2898
adrianasalvitti@gmail.com

Recebido em: 3/11/2013


Aceito em: 19/11/2013

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