JINTA-FEIRA SANTA
Pela manhã de qui nta-feira, primeiro dia dos pães ázi mos,
esta ndo Jesus em Betânia ou provavelmente a caminho de
Jerusalém, os d iscípulos perg u ntaram onde celebrariam a
Páscoa . O Senhor encarregou Ped ro e João dos p repara
tivos: Ide à cidade, à casa de um tal, e dizei-lhe: O Mestre
manda dizer-te: Meu tempo está próximo. É em tua casa que
celebrarei ,1 Páscoa com meus discípulos ( Mt 26, 18). Ele vos
mostrará no andar superior uma grande sala mobiliada, e ali
Fazei os preparativos ( Lc 2 2 , 1 2 - 1 3 } . Os dois d iscíp u los
o b ed ecera m e a co ntece u tudo co m o Jesus h a v i a d ito ;
assim a ceia foi prepa rada na casa daquele homem bem
aventura d o .
24
minha mesa no meu Reino e vos senteis em tronos, parajulgar
as doze tribos de fsraei (Lc 22, 28-30 ) .
25
daquele homem por quem o Filho do Homem é traído/O trai
dor pensa que tri u nfa e que g a n h ará a m igos e d i n h e i ro,
mas na realidade ca m inha em di reção ao tormento eterno
q u e seria melhor para esse homem que jamais tivesse
nascido! ( Mt 26, 24).
Desco berto pelo s i n a l d e m o l h a r o pão n o p rato,
J udas sem nenhum em baraço perguntou : Mestre, serei eu?
( Mt 26, 2 5 ) . O Senhor com voz baixa, para q ue os ou tros
não ouvisse m, respondeu : Tu o d i sseste, q u e q u e r dizer
sim, seg u ndo o modo de falar dos h ebreus.
O SENHOR INSTITUI O
SACRAMENTO DA EUCARISTIA
28
v i n h o , a fi m d e ser n osso sacrifíci o l i m po e agradável a
Deus.
Jesus Cristo está realmente no Sacramento da Euca
risti a, fornecendo a cada u m , o seu Corpo como verdadeira
comida e o seu Sangue como verdadeira bebida . Por amor,
Jesus deixou o alimento q u e fortalece a nossa esperança,
d esperta a nossa memória, aco m p a n h a a nossa sol idão,
socorre as nossas n ecess i d ades. A E ucaristia é testemu
n h o d e sa lvação e rea lização das pro messas contidas na
Nova Aliança. Preocupado com o futuro da Ig reja e às por
tas da paixão e morte, n ã o fazia outra coisa senão rezar
e ord e n a r tudo de modo q u e n u nca fa ltasse o A l i m e nto
eucarístico até o fi nal dos tempos.
Os a póstolos estava m todos atentos, para ver o que
aconteceria na nova cerimôn i a . O Senhor vestiu a túnica
que tinha tirado, sentou-se outra vez à mesa e, como se
fos s e co m e ç a r u m a n o v a c e i a , m a n d o u os a p ósto l o s
reclinarem com Ele.
29
aquele que o enviou. Se compreenderdes bem estas coisas,
sereis felizes se as praticardes ( Jo 13, 1 2 - 1 7 ) .
O S e n h o r n ã o perdia n e n h u m a oca s i ã o p a ra d e
monstrar a Judas a tristeza que causava a traição, q ueria
mostrar que não partiria enganado para a morte, mas por
que queria: Disse- vos que sereis felizes, mas não digo de
todo� porque conheço bem os que escolht: De qualquer forma
há de cumprir-se a Escritura: o que come à minha mesa há
de me trair. Digo isto agora e com tempo, antes que aconteça,
para que, quando o virdes cumprido, acrediteis no que vos
disse que sou (Jo 1 3, 1 8- 1 9 ) .
Todos olhavam su rpreendidos, nota ndo n o seu rosto
e na sua atitude que faria algo g rande e fora do com u m . O
Senhor tomou o pão ázimo, daqueles q ue tin ham sobrado
da primeira ceia , leva ntou os olhos ao céu para seu Pai,
para que vissem q ue d 'Eie vinha o poder d e realizar u m a
obra t ã o grande. D e u graças p o r todos o s benefícios que
tinha recebido e, especi a l m e nte, por a q u i l o q u e n a q u ele
momento realizava por todos. Sagrou o pão com palavras
novas, a fi m d e prepara r os a pósto los para a gra nd iosa
n ov id a d e . Pa rtiu o pão de modo q u e todos p u d essem
comê-lo e consagrou-o com as suas palavras. O Pão conver
teu -se no seu Corpo, contin uava com a p a rênci a e sabor
de pão, mas agora era o seu próprio Corpo que estava pre
sente. As p a l a v ra s com que consag ro u o pão d a v a m a
30
entender cla ra m e n te q u a l era a co m i d a q u e l h e s dava :
Tomai e comei, isto que vos dou é meu Corpo, o mesmo que
há de ser entregue na cruzpor vós e pela salvação do mundo.
Deu a cada um o pão consagrado e todos o tomaram e co
mera m . Sabiam o que rea l mente estava acontecendo, por
que o Salvador d isse com palavras bem cla ras.
Havia sobre a mesa u m cálice de vinho misturado com
um pouco de água . Tomou o Senhor o cálice em suas mãos,
deu graças ao Pai , santificou com uma nova benção, consa
g rou-o com suas palavras e a q u ele v i n ho converteu-se no
seu S a n g u e . Aq uele mesmo sangue q u e corria pelas suas
veias, estava rea l mente presente ta mbém naquela taça . As
palavras com que tinha consag rado o vinho fora m tão claras
que os a póstolos entenderam bem o que lhes dava a beber:
Bebei todos deste cálice, porque este é o meu Sangue com o que
confirmo a Nova Aliança_- o mesmo Sangue que derramareipor
vós na cruzpara que vos sejam perdoados ospecados.
O S e n h o r p rete n d i a q u e o Sacrifício perd u rasse n a
Ig reja até o fi nal dos tempos, por isso também d e u o poder
de consagrar o Vinho e o Pão aos a pósto los, e que esse po
der fosse transmitido até sua volta, quando julgará o m u ndo.
O rdenou expressa mente que q u a ntas vezes se celebrasse
o sacrifício, o fizessem em sua memória. Deixava entre os ho
mens u m legado valiosíssi m o : o seu Corpo e o seu Sangue,
e todos os teso uros d a g raça que mereceu com a Paixão.
Deste modo, perpetuava s u a presen ça e ntre nós.
31
O Pão e u ca rístico está d esti n a d o a o sustento dos
homens que vão como pereg ri nos pelo mundo. É tão g ran
de e forte o fogo do seu amor, q ue faz os homens santos.
As palavras divinas devem ser recebidas com fé e com todo
o agradecimento, porque foi o próprio Senhor quem d isse :
Tomai e comei, isto é o meu corpo. Bebei todos deste cálice
que é o meu sangue.
Como poderemos retribuir o g rande benefício? Com
todo afeto do coração, di zendo: Veja Senhor, este é o meu
corpo; ofereço na dor, na doença, no cansaço, na fadiga e
n a penitê n ci a ; este é o m e u s a n g u e , ofe reço para s u a
g lória ; esta é m i n h a a lma q u e q uer obed ecer e m t u d o a
sua vonta d e .
O S e n h o r se reu n i u c o m o s d i s c í p u l o s q u e o
esperavam, e aco m pa n hado por eles, s a i u de casa . E ra
noite . Deixou pa ra trás a i n g rata cidade q u e não o ti nha
reconhecido e subiu em direção ao Monte das Oliveiras, do
outro lado da torrente do Cedron, onde costu mava rezar
39
de noite. E n q u a nto ca m i n h ava, olh a ndo a todos, disse :
Todos vós vos escandalizareis de mim esta notte, e fugireis,
e me deixareis sozinho quando virdes o que me vai acontecer.
O Senhor fa lava sobre o q u e fazia sofrer o seu coração ;
mostrava anteci pada mente, como verdadeiro Deus, o q u e
havia de acontecer. Para a n imá-los dizia q u e morreria por
sua própria vontade e voltaria para perdoá -los, pois sabia
o q u e iria acon tec� q u e não fica ria surpreendido por se
escandalizarem e fugirem. Há muito tempo o Profeta Zaca
rias profetizou : Ferirei o pastor e as ovelhas do rebanho serão
dispersas. Jesus contava q u e se tornariam fugitivos, porém
duas coisas iriam consolar: Eu ressusCitarei ao terceiro dia,
e depois de ressusCitado, esperarei por vós na Galiléia, e ali
me vereis, e ao ver-me, vos enchereis de alegria.
O Sen hor tin ha repreendido duas vezes Pedro pela
excessiva impetuosidade. Confiava em si m esmo mais do
que devia e alardeava dia nte de todos que n u nca a ba ndo
naria o Mestre, mesmo se fosse necessário ser preso e mor
rer. E agora voltava com a mesma suficiência, a rmado com
uma espada para, se necessário, defender o Senhor. Pedro
não tinha considerado que Jesus se referia a todos quando
disse : Todos vos escandalizareis de mim. Pensava que ele
era uma exceção ; não reparou que J esus sempre dizia a
verdade, nem que ele era fraco. Por isso protestou e disse :
Ainda que todos se escandalizem de ti, eu, porém, nunca! (Me
1 4 , 29). P e d ro d iz i a o q u e senti a . A ele d i reta m e n te o
1-0
Senhor profetizou: Em Verdade te digo: hoje, nesta mesma
noite, antes que o galo cante duas vezes, três vezes me terás
negado ( M e 14, 3 0 ) . Ped ro não podia acreditar, parecia que
o s i m ples fato de não m a n ifesta r a sua d eterm inação d e
segu i-lo até o fi m já era uma traição. Por isso insistiu : Mes
mo que seja necessário morrer contigo, jamais te negarefl ( Mt
26, 3 5 ) . Os outros apóstolos diziam o mesmo, com seme
l hante vang lóri a .
Conversa ndo chegara m a o vale profundo e som brio,
chamado Vale do Cedron ( cf. 2Rs 23, 4). Na parte mais pro
funda passava um riacho seco, por Isso era chamado tam bém
de Torrente do Ced ro n ( cf . J r 3 1, 40 ) . D o o u tro l a d o da
torrente, à esq uerda, no declive do Monte das Oliveiras, fica
va o H o rto d o G etsê m a n i . P o r s e r u m l u g a r s o l i t á r i o e
afa stado, o Senhor tinha escolhido m u i tas vezes para orar.
Ao passar pelo vale e pela torrente, os discípulos esforçavam
em parecerem coraj osos, mas é d e su por que estivessem
a n g u stiados e co m medo . O vale e ra escuro e a to rren te
profu nda e as á rvo res fro n d osas, a longavam-se som b ras
n e g ra s p e l o s p e n h a scos e co n ca v i d a d e s do m o n te ; a
solidão e o silêncio era m g randes; a noite estava fechada e
era muito tard e . H á m ulto tempo J u da s t i n ha parti d o .
Ti n h a m fa lado de tra ições, d e desonra, de tortu ras
e de morte . O efeito que tudo i sto pode produzir, no meio
daquela escura solidão, no ânimo de uns homens fracos e
i n defesos e ra notóri o .
41
Chegando à en tra d a d o h o rto, Jesus -ordenou q u e
ficassem a l i . Enca rrego u-os de velar e que não adorme
cesse m, porq u e i ria fazer suas o ra ções, e pa ra q u e não
ca (ÍÍem em tentação, que fizessem o mesmo.
42
semos ser redi mid os; sofreu a dor no seu corpo e sofreu
tristeza e a ngústia na sua a l m a . Demo nstrou que era u m
verdadeiro h o m e m ao sofrer, ao sentir e ao comove_r-se.
Não foi menos Redentor ao padecer fome, sede, cansaço
e fadiga no seu corpo, como também não foi menos Reden
tor ao padecer tristeza, m e d o e a n g ústia na sua a l m a .
Quando u m homem sofre u m a terrível dor física e tem a o
seu alcance u m remédio eficaz e não o uti liza , dizemos que
este homem sofre porque q uer. Do mesmo modo, o Senhor
podia suprimir imediatamente a dor do seu corpo e d a sua
alma, mas não usou de seu poder divino, portanto, é certo
que sofreu porq ue desejou. E esse foi , talvez, o desamparo
de que se q ueixou na cru z : Meu Deus, meu Deus, por que
me abandonaste? (Mt 27, 46).
Uma das razões pela q ua l Jesus Cristo q u is sofrer a
dor no seu corpo e na sua a l m a foi para demonstra r q u e
era u m verdadeiro homem, com a nossa mesma natureza ,
q ue sentia como n ós a tortura e os i nsultos, que não era
"de bronze e de ped ra" (d. Jó 6, 1 2 ) .
Q u a n d o sentimos a força das ten tações n ã o deve
mos desa n i m a r e pensar q ue perdemos a graça de Deus.
Estes senti m en tos não são pecados, mas man ifestações
da debilidade natural do homem. O Senhor q u is sentir esta
fraq ueza, fa zendo-se igual a nós - exceto no pecado -,
para q ue nós nos fi zéssemos iguais a Ele, na fortaleza e
n a o b e d i ê n c i a à v o n t a d e d e D e u s . C o m o d i z S a n to
43
Ambrósio: Não devem ser considerados valentes, os que mais
fendas recebem, mas os que mais sofrem por elas. Quis o
Senhor pa rticipa r como nós das dores do corpo e tam bém
das tristezas da alma, porque qua nto mais partici passe dos
nossos males, mais participantes nos fa ria dos seus bens.
Tomou a minha tristeza - diz Santo Ambrósio - para me
dar a sua alegria_- com meuspassos desceu à morte, para que
com os seus passos eu subisse à vida.
Tomou o Senhor a s n ossas enfermidades para q u e
fossemos curados, castigou a si mesmo pelos nossos peca
dos, para q ue recebêssemos o perdão. Curou a nossa so
berba com as suas h u m i l h ações; a nossa gula, bebendo
fel ; a nossa sensualidade, com a sua dor e a sua tristeza .
Por outros motivos que u ltrapassam o con hecimento
h u ma no, nosso Senhor m i sericordioso e amoroso, q u is ser
a çoitado, esbofeteado, coroado de espinhos, ter os pés e
mãos perfu rados, como ta mbém perm itiu que os enviados
das trevas o a tormentassem e a tristeza se a poderasse
do seu coração .
49
igrejas era mais importa nte que seu cansaço e as perse
gu ições que sofria, podemos i maginar como seria o sofri
mento do Senhor, q u e t i n h a u m a caridade infin itamente
maior q ue o a póstolo e desejava sa lva r a todos, mesmo
que fosse com a própria vida; que a mava tanto aos homens
e sabia a grande desgraça que é perder a a m izade de Deus
e fica r privado para sem p re de sua presença e a mor. Só
Ele podia entristecer-se no fu ndo da alma pelas ofensas a
Deus, q u e ocasionariam a condenação etern a .
N osso Senhor ti n h a tomado como s e fossem seus
todos os pecados e estava disposto a pagar pessoalmente
todas as d ívidas pera n te o Pa i ofendido.
51
Viu que m u itos não reco nheciam, outros não a preciavam
e que vários não agradeciam seu esforço em nosso favor;
e q u e, m e s m o d e p o i s de d e rra m a r o seu sa n g u e p a ra
limpar nossa i m u ndice, m u itos terminariam na condenação
eterna. Seu coração foi ferido de tal maneira que é i m pos
sível descrever com palavra s . Sentia o novo pecado dos
homens : o desprezo pelo seu amor. A ingratidão d ilacera
m u ito mais quando provêm dos cristãos, pois estes rece
beram as maiores provas de amor.
Jesus sentiu uma m istu ra de dor e consolação, quan
d o seus discípu los l utava m contra as tentações. V i u sua
mortificação e pen itência ; as perseguições, i njúrias e humi
l h a ções que sofreri a ; o tra b a l h o , o cansaço e a d o r, e
m u itas vezes o m a rtíri o . Pre v i u o padeci mento de seus
s e g u i d o res, que seri a m p e rseg u i d os por causa d e seu
nome e de sua doutri n a . O Senhor tom o u tudo para si e
isto dilacerava seu coração.
Quando Saulo perseguia os cristãos, disse : Por que
me persegue? De forma a náloga, viu as pedras que mata
ram o diácono Estevão, o fogo que queimou Lourenço. As
t r i b u lações dos sa ntos fo ra m a s s u m i d a s p o r C ri sto . O
sofrimento de Corpo M ístico, q u e é a Igreja, são os sofri
me ntos do seu p ró p rio corpo . Ele q u e conhecia t u do e
compreendia melhor que ni nguém a dor, em suas orações
ofereceu tudo ao Pa i .
52
A ORAÇÃ O NO J-IORTO
55
GOTAS DF SA NGUE
jESUS É PR ESO
64
com pancadas d e rrubava m-no, e d e pois levantavam-no
brutalmente.
Levaram-no a residência de Ca ifás, sumo sacerdote.
Era ta mbém presidente do conselho que se chamava Si né
d rio, loca l onde se reuniam setenta e dois juízes. Era por vol
ta da meia-noite, porque depois da ceia, quando Judas saiu
"era noite". Jesus t i n ha conversado durante um longo tem
po, su bido ao horto, orado e só depois foi preso; tinha-se pas
sado m uito tempo. Os juízes e anciãos daquele povo, esta
vam tão obcecados que, para não perderem tempo e conde
narem o Senhor, reu n i ram-se mesmo sendo tarde da noite.
E ntrou Jesus em Jerusa l é m , grande Sacerdote da
Nova Aliança, para oferecer a sua vida em sacrifício agra
dável a Deus pela redenção do mundo. O processo come
çou na casa do sumo pontífice, onde estava m reu nidos a
sua espera, os sacerdotes e doutores da lei. Antes, porém,
os soldados leva ra m -no a casa de Anás, sogro de Caifás.
Honrando ass i m , sog ro e genro, e desonrando o Senhor.
Anás enviou-o preso ao sumo sacerdote Caifás (Jo 18, 24 ) , a
quem competia conduzir o processo . Caifás foi quem deu
aos judeus o conselho: Con vém que um só homem morra
em lugar do povo (Jo 18, 14). Ele que tinha dado o conselho,
estava d isposto a executá-lo. Na sua casa a contecera m
todas as coi sas q u e se contam desta noi te .
Em bora , depois da prisão n o horto, todos o s d iscí
p u los ten h a m fu g i do e deixado Jesus. Preocupado p a ra
65
onde levariam o seu S e n l1 o r, mesmo com medo, Pedro
seguia-o de longe ( M t 2 6 , 58 ) . Ta m bém o seg u i a ou tro
discípulo, que ti nha certa a m izade com o sumo sacerdote.
C h e g a n d o a casa de C a i fá s , e n trou J es u s e toda
aq uela comitiva que voltava do horto; p rovavelmente ou
tros se i ncorporaram atraídos pelo alvoroço pelas ruas da
cidade.
Entrando, logo dispensariam o tribuno e os soldados
romanos com uma quan tia generosa . Fechariam as portas
para evitar curi osos, com isso ficariam somente os j u ízes
e as pessoas i m porta ntes no processo . Vig i a nd o a porta
estava uma criada, o o u tro d i scípulo, por ser conhecido,
conseg uiu entrar. Ao notar q u e Pedro tinha ficado de fora,
ju nto à porta, o d iscípulo ped i u e a porteira deixou-o en
trar. Naquela noite, a verdade tão perseguida seria negada
por Pedro.
Levaram o Sen h o r na presença do pontífice . Pedro
e o outro d iscípu lo estavam presentes e teste m u n ha ra m
o ocorrido. O pontífice, j unto com os sacerdotes e doutores
da lei , exa m i navam o processo contra J esus. Pela manhã
pretendiam real izar outro conselho, este pleno e legítimo;
o processo noturno seria u m a p reparação para poderem
encontrar provas e condenar o Senhor à morte. Conside
ravam-no um farsante e a g itador, p regador de mentiras
contra a Lei e a tradiçã o . O sumo sacerdote examinou pri
meiro sobre os discíp u los; q uem e quantos era m ; depois
66
s o b re a d o u t ri n a q u e e n s i n a v a , p a ra tenta r e n co ntra r
alguma mentira ou erro.
O Sen hor nada d isse sobre os d i scípulos, todos ti
nham fugido escandalizados e envergonhados, e Pedro que
estava presente, atemorizado, não fa laria em sua defesa.
Considerando a razão das perg u ntas, bastari a responder
sobre sua doutrina, que sendo boa e de Deus, não poderia
reu n i r discípulos para uma causa perversa . Assim respon
deu : Faleipublicamente ao mundo. Ensinei na sinagoga e no
templo, onde se reúnem os judeus, e nada falei às ocultas
(Jo 18, 20), vocês poderi a m suspeitar, se a doutrina é noci
va, se eu falasse escondido, mas nada d i sse em seg redo.
Nas vezes q u e fa lei a sós com meus d i scípu los, foi p a ra
explica r as pa rá bolas, nada fa lei de diferente ou pa ra se
ocultar, pelo contrário, era exatamente para que pudessem
entender e assim transmitir a todos. Sendo assi m, por que
me interroga? Pergunta àqueles que ouviram o que lhes disse.
Estes sabem o que ensinei (Jo 18, 2 1 ), nestes acreditareis
mais do q u e a m i m .
U m d o s servos não gostou d a resposta , d ita com
tanta verdade e serenidade, parecia que faltava com res
peito e rebaixava o sumo sacerdote; esbofeteando firme
mente Jesus, disse : É assim que respondes ao sumo sacer
dote? (Jo 18, 22 ) .
O Senhor não perdeu a serenidade, a pesar d a violên
cia feita por u m sim ples servo na presença de todos. Além do
67
insu lto e da agressão, dava a entender que a resposta não
era verdadeira, e nem q u e sua doutrina era divi na. Não seria
h u mildade se calar dia nte deste ultraje . Calmamente, Jesus,
mostrou ao ag ressor q u e a vio lência fe ita e a om issão do
pontífice eram i nj ustas, n ã o havia motivo a l g u m p a ra lhe
bater. Se o j u lga mento fosse justo, com petia a penas ouvir
a s teste m u n h a s e d e p o i s dar a s e n te n ç a , mas como o
julgamento nascia do ódio e da i nveja, jamais seria i m parcia l .
Jesus respondeu ao servo : Se falei ma� prova-o, mas
se falei bem, por que me bates? (Jo 1 8 , 2 3 ) . N e n h u m a
resposta podia s e r m a i s a certada, j u sta e oportuna . Por
ter agred ido Cristo, este ca nalha mereceria que a terra se
a b risse e o tragasse. Mas Deus foi paciente, em vez de
castigar, venceu pela bondade.
O Senhor estava disposto a oferecer seu próprio cor
po para ser imolado na cruz. Por isso, não deu a outra face,
como tinha ensinado, além d isso é melhor responder com
a verdade, que oferecer a outra face por orgulho, vaidade
ou aparência. A humildade está no interior, não n u ma ati
tude extern a .
Se o processo fosse justo, a resposta do Senhor teria
sido correta e a ceita . M a s o j u lg a m ento estava viciado na
ra iz, os j u ízes eram i m parciais e d issi mulados. A inveja e o
medo de que os romanos destruíssem o tem plo fez com que
todos estivessem com o veredicto de morte pronto. Os prín
cipes dos sacerdotes e todo o conselho procuravam um falso
68
testemunho contra .Jesu� a fim de o levarem à morte (Mt 26,
59). Seria necessário mentir, porq ue na vida do Senhor não
encontra ri a m nenh u m pretexto p a ra condená-l o . M u i tos
esta va m d ispostos a d a r fa lsos teste m u n hos, a l g u n s por
medo, outros pa ra ficarem bem com os sacerdotes. Todos d i
ziam mentiras e contradições; falavam que Jesus tinha pacto
com o demônio, q u e não respeitava as festas, q ue era g lutão
e beberrão, que era a m igo dos publicanos e pecadores, q u e
incitava o n ã o pagamento do im posto, que blasfemava . Con
tudo disseram u m a verdade : q u e era Fi lho de Deus.
Os fa lsos testem un hos, como não estavam ensaia
dos e se contradizi a m , não foram convincentes para con
denar Cristo . Apresentaram-se mais duas fa lsas testemu
nhas, que declararam : Este homem disse: Posso destruir o
templo de Deus e reedificá-lo em três dias (Mt 26, 6 1 ) . Ouvi
mo-lo dizer: Eu destruirei este templo, feito por mãos de ho
mens, e em três dias edificarei outro, que não será fe1to por
mãos de homens ( M e 1 4 , 5 8 ) . E ra evidentemente fa lso,
Jesus não disse que podia ou destruiria o templo, mas que,
q u ando fosse destru ído, constru iria o utro "não feito por
mãos dos homens", ele falava do templo do seu corpo (Jo 2,
2 1 ) . Isto sign ificava que quando morresse, ressuscitaria
em três dias. Mesmo d i storcendo as pa lavras, ainda não
tinham provas suficientes para o condenarem à morte.
69
O SfNNOR [ CONDENA DO
72
Os servos dos sacerdotes, ao ouvirem a sentença ,
cuspiram-lhe então na face, bateram-lhe com os punhos e
deram-lhe tapas ( M t 26, 6 7 ) . Ta mbém os sacerdotes do
Si nédrio batera m e insu lta ra m Jesus.
Estavam convencidos que o castigo era merecido,
pois Cristo suportava bem. Então, se aproveitaram para
vingar as críticas feitas em público sobre seus vícios e erros.
Levanta ndo-se enfu recidos das cadeiras, em que estavam
indigna mente como j u ízes, começaram a bater-lhe.
Depois, despediram-se e com binaram uma nova reu
nião pela manhã, onde o processo e a execução da senten
ça seri a m validados.
O sumo sacerdote retirou -se ao seu aposento, dei
xando Jesus em poder dos guardas e criados; estes o leva
ram a um comparti mento menor e ficaram a noite toda com
ele. Divertindo-se escarneciam dele e davam-lhe bofetadas
( Lc 22, 63), cuspiram-lhe então na face (Mt 26, 67). Estes
homens vis emporcalhavam aquela face divina que os pró
prios anjos desejavam contemplar ( l Pd 1 , 1 2 ) .
M a ltrata ra m , ferira m , batera m , dera m pontapés e
socos . Depois, cobriam-lhe os olhos ( Lc 22, 64) , taparam
aqueles olhos pa ra qual nenhuma criatura lhe é invisívei ( H b
4, 1 3 ) . Co ntin u a v a m a d a r bofetadas e como tinha fa ma
de p rofeta, escarneci a m - se : advinha, ó Cristo: quem te
bateu? ( Mt 26, 68) . E injuriaram-no ainda de outros modos
(Lc 22, 6 5 ) .
73
Vendaram-lhe a face para se ocultarem ao seu olhar.
Condenara m-se a n u nca mais ver Jesus com os ol hos da
fé . Não devemos estranhar a maldade destes homens . Nós
t a m b é m fa z e m o s o m e s m o : p e c a m o s e c o m n o s s a s
h i pocrisias, logo qu e remos ta par os o l h os d e Deus, para
que não veja a nossa m a ldade.
Há muito tempo uma profecia mencionava o sofrimen
to voluntári o : Aos que me feriam, apresentei as espáduas, e
as faces àqueles que me arrancavam a barba; não desviei o
rosto dos ultrajes e dos escarros (Is 50,6) . Mesmo assim,
causa grande admiração a mansidão, a paciência e a forta
leza com que o Senhor sofreu tudo.
Provavelmente os guardas, durante a jornada de vi
gia daquela noite, se a lternaram nas a g ressões, enquanto
alguns d esca nsava m , o utros chegavam com novas zom
barias. O Senhor não pode dorm i r, sofreu d u ra nte tod a à
noite . Para os cegos da sinagoga, o amanhecer n unca che
gou, pois ficara m na escuridão para sempre .
AS NEGAÇÕES D E PEDRO
79
benefícios q ue ti nha recebido e os privilégios que tinha pe
rante os outros com panheiros. O j u ra mento que proclamou
dia nte de todos, queimava-lhe as entranhas. Foi tanta dor
que, por mu ito tem po, toda manhã quando o galo ca nta va ,
chorava amargamente, lem brando-se deste momento . São
Marcos escreveu "começou a chora r", como se fosse a pe
nas o começo de u m longo pranto, durante m uito tempo.
O olhar d e Jesus toco u - l h e n o fu ndo de sua a l m a .
Como n ã o pode retrata r-se publica mente de s u a covardia,
d esatou a chorar de a rrependi mento. Com a queda, ficou
mais h u m i lde e menos confia nte em s i , não colocou mais
e m risco sua d e b i l i d a d e . Experiente e n s i n o u aos outros
como evitar ocasiões de pecar, e que a forta leza vem de
Deus.
Não pedi u perdão imediata mente. Pensou em lançar
se aos pés do Senhor, suplicando perd ã o . Mas, pareceu
l h e muito atrevimento consegu i r um perdão tão rápido, tal
vez conseguisse com lágrimas e mortificações. Ficou ca lado
e não a p resentou n e n h u m a descu l p a , somente c h o ro u ,
lavando com lágrimas s u a culpa. Foi para fora do palácio,
para chorar em paz, buscando consolação na Virgem Maria,
refúgio dos pecadores. Onde mais poderia buscar conso
lo? Contar sua tristeza e a m a rg u ra? Ela o confortou com
firme espera nça de alcançar o perdão de seu Filho.
O Senhor perm itiu que a pedra fundamental d a Ig reja
pecasse e fra q u ejasse, para e n s i n a r q u e n i ng u ém deve
80
ter a presunção de confiar em si mesmo, pois mesmo u m
apóstolo cheio de privi légio e a mor, ca i u .
Tomemos como aviso o q ue d iz São Paulo: Portanto/
quem pensa estar de pé veja que não caia ( 1Cor 10, 1 2 ) .
Devemos a prender com o q u e aconteceu a Pedro, n unca
duvidar de Deus, mesmo q u a ndo esta mos perdidos, pois
a pesa r do pecado ser e norme, g raças à s suas lágri mas e
a sua pen itência, voltou à a mizade com Cristo. Foi confir
mado como príncipe dos apóstolos, cabeça da Igreja, Pastor
do reb a n h o de C risto e d epositário das ch aves do reino
dos céus.
Comenta Santo Agostin h o : Atrevo-me a dizer que é
proveitoso para os soberbo� cairnum pecado claro e evidente,
pelo qualse vejam como são pecadore� poisjá tinham pecado
com a sua soberba. Pedro se viu mais pecador quando chorou
a sua culpa/ do que quando presumia sua fidelidade.
Outra razão fornece São Gregório : A misericórdia que
o Senhor usou para aquele que seria Pastor da Igreja/
aprendesse por si mesmo como de via compreender as
fraquezas alheias e compadecer-se delas/ foigrande e digna
de ser sempre recordada: O Senhor olha para seu amigo que
o negou para salvá-lo/ e para dar-lhe a mão para que não se
perca. Assim o Senhorfoipiedoso com ele/ para que ele o fosse
com as ovelhas do rebanho que lhe confiaria, para que não
desamparasse ninguém por muito enfermo/ revoltado ou
perdido que possam estar.
81
CR I S TO I'A VI: CL- U POIU \ M OR A OS HOM ENS
87