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A Mágica da Vida (crônicas reunidas de Fernanda Leite Bião) 1

A MÁGICA DA VIDA
CRÔNICAS REUNIDAS

Fernanda Leite Bião


http://construcoesdaalma.wordpress.com

Belo Horizonte
Novembro de 2010
(última atualização)
A Mágica da Vida (crônicas reunidas de Fernanda Leite Bião) 2

A mágica da vida

A mágica da vida talvez seja buscar as possibilidades.


Mágica de mistério, mistério, o não conhecido ou mesmo desconhecido.
Sempre há o que se retirar da cartola. Coelho, lenço, vida, possibilidades.
Possibilidades, condição do que é possível, do que pode acontecer ou
mesmo do que faz a riqueza de alguém, clama o nosso querido e amigo
dicionário1.
Assim, não espere para amanhã para buscar realizar a mágica do possível
em sua vida.
A vida já exprime uma porção de incertezas, de movimentos e de
possibilidades de se fazer. Construir-se no infinito do finito – você.
Caminhe mais rápido, se desejar.
Caminhe mais lento, se precisar.
Não olhe somente os obstáculos – podem ser pedacinhos de pedras que
você transformou em montanhas.
Os labirintos são desafios para a alma, para que não se canse.
Pegue sua bolsa de tesouros. Temos os nossos. Busque o mapa da sua
existência (seus projetos), desenhe seu roteiro (suas metas e objetivos) e comece
a sua grande viagem.
Quando chegar, me avise!

1INSTITUTO ANTÔNIO HOUAISS. Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa. Rio


de Janeiro: Objetiva, 2009. 1 CD-ROM.
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“[...] – Eu não posso brincar contigo – disse a raposa. – Não me


cativaram ainda.
– [...] Que quer dizer „cativar?‟.
[...] – É algo quase esquecido – disse a raposa. – Significa „criar
laços‟...
[...] – Que é preciso fazer? – perguntou o pequeno príncipe.
– É preciso ser paciente – respondeu a raposa. – Tu te sentarás um
pouco longe de mim, assim, na relva. Eu te olharei com o canto do
olho e tu não dirás nada. A linguagem é uma fonte de mal-entendidos.
Mas, cada dia, te sentarás mais perto...” [...]
(Trecho do diálogo entre a raposa e o Pequeno Príncipe. In: SAINT-
EXUPÉRY, Antoine de. O pequeno príncipe. 48. ed. Rio de Janeiro:
Agir, 2009, p. 64-67. Tradução de Dom Marcos Barbosa.)

Cativar

Na parábola de “O Pequeno Príncipe” (Capítulo XXI), de Antoine de


Saint-Exupéry, o menininho se aproxima devagar, percebido é por ela – a
senhora raposa. Faceiramente, munida de experiências marcantes da sua vida,
ela se esconde, tem medo de ser caçada.
Mais passos são percebidos e os olhos da tal senhora estão ligados
naquela criatura que se aproxima.
O menino percebe também um movimento e questiona quem seja. Assim
começa o diálogo – estrutura de comunicação necessária ao estabelecimento de
relações.
Em passos lentos, entre a necessidade de se esconder e de se mostrar, a
permissão ao contato acontece. Um olhar curioso, um sorriso como sinal de
intimidade e a capacidade de escolher começar, ou seja, recomeçar, de um novo
começo sobre o conhecimento aprendido.
Sempre é tempo de experimentar novas possibilidades e novos olhares.
Foi assim que a raposa medrosa permitiu ao menino curioso se aproximar. O
medo dela se torna o prazer de tê-lo consigo e a curiosidade dele se torna o
princípio fundante para um novo olhar sobre a vida.
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‒ Tu me cativas, menininho?
‒ Cativar, senhorinha?
‒ Sim, pois te esperarei. Tu virás?
‒ Sim. Quero aprender a arte de brincar ‒ disse o menino.
A brincadeira é um jogo simbólico para a compreensão da vida. Uma fala
representada por expressões de uma liberdade diferente.
Brincar de conquistar, brincar de cativar.
Olhos brilham e os corações se tocam. A respiração individual circunda
no mesmo raio de espaço, tornando-se uma manifestação de relação.
Claro que preciso do outro. Do outro que também sou eu. Do outro que
fui e do outro que serei.
A importância do outro está associada ao ato de cativar, de aproximar, de
compartilhar vivências e de florescer afetos.
Uma vez que o coração é tomado pela energia da presença de alguém,
jamais terá o mesmo pulsar.
De pulinhos, esconderijos e aproximações, senhora raposa e o menininho
passaram a se amar.
Do ato à vontade ou será da vontade ao ato?
É preciso movimento, persistência e a permissão do nascimento da
vontade, para se estar junto a outrem. Vontade é o combustível para que o ato se
torne realidade.
De ato em ato, o amor, que era só um desejo, um sonho, torna-se
palpável, singular.
Conquistar é para as coisas. Nós, seres humanos, queremos é ser
cativados!
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Sonoridades do mundo e da alma

O barulho do mundo externo, tão encantador e promissor, por vezes


abafa os sons que ressoam da alma.
São tantas ofertas, tantas luzes, sons variados, em contraponto às
necessidades de autoconhecimento, de auscultar, no silêncio da palavra, os
próprios sentimentos (medo, coragem, amor, amizade, respeito, ódio) e assumir
a possibilidade de vivê-los.
Enquanto os sentidos são bombardeados pela hiperatividade do
cotidiano, perguntas teimam em não calar: – Afinal, onde estamos? O que
estamos fazendo aqui? Para que e por quê?
O tempo e o espaço são dimensões do próprio viver, das experiências do
perceber e do sentir, e a agilidade, o imediatismo da atualidade, nos faz
questionar qual é o lugar que em nos encontramos e se a nossa presença existe
de fato, ou se é mais uma ilusão frente às nossas reais necessidades.
Quantas vezes estamos presentes-ausentes em nossas tarefas, com
pessoas, em lugares variados?
Nosso corpo pode até estar lá, mas onde anda a nossa mente?
A corporeidade, embora seja um possível lugar de manifestação
psicofisiológica, não abarca toda a dimensão da hereditariedade espiritual:
somos filhos do sagrado, em meio a condições profanas da existência.
Para transcender o momento em que nos encontramos, é preciso,
primeiro, reconhecer o próprio lugar e o tempo em que se insere cada
singularidade. Isso inclui a todos nós.
Venha! Vamos caminhar agora por uma estrada.
Em meio a esta ponte rústica, olhemos para trás.
O que você vê?
Eu vejo luzes e manifestações variadas de vida, de mundanidade.
Olhemos para frente, ainda em meio à ponte.
O que você vê?
Eu vejo uma estradinha, onde tem flores e ramagem seca.
Lá na frente tem um mundo a ser descoberto.
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Com certeza, terá luzes e outras manifestações, mas pode ser uma
percepção diferente, se eu estiver presente de verdade.
O segredo não é fugir de onde você está nem temer as ofertas que lhe
serão expressas, mas conhecer a si mesmo a ponto de saber escolher, para
crescer e transcender.
Permita-se visitar o seu porão interior. Revisite a sua história de vida.
Muitos buscam fora aquilo que está, em segredo, guardado em si.
Todos os tesouros, como dizem as lendas, estão escondidos, à espera de
um(a) grande desbravador(a), que possa descobri-los.
Para isso, é preciso um mapa (razão), uma bússola (coração), estar atento
aos sinais da vida (intuição) e grande disposição para realizar a missão (força de
vontade).
Trabalho, tenho certeza que vai dar, mas quem disse que seria fácil?
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O desenvolver da doçura

A vida é um processo contínuo de florescimento e crescimento.


Semelhante ao desenvolvimento de uma planta, também, nós, humanos,
já fomos a semente em terra fértil, esperando o momento de ensaiar os
primeiros movimentos, para apontar fora da dimensão mãe-terra.
Em constantes possibilidades de vir-a-ser, moldados pelas experiências e
pelos atravessamentos do mundo a nossa volta, vamos amadurecendo
lentamente ou rapidamente, o que nos permite maiores expressões de doçura ou
amargura, medo ou coragem, amor ou ódio.
A doçura é a expressão da semente que, ao seu tempo, buscou aproveitar
todas as oportunidades e aprendizados, de forma sensata e sem pressa para o
possível amadurecimento.
Todas as vezes em que arrancamos o fruto verde da árvore da vida, a
possibilidade é que o seu sabor não seja o mesmo, que seu crescimento seja
precoce e sua vida um pouco mais curta.
É preciso prestar atenção nos sinais da própria existência!
Assim:

Tudo neste mundo tem seu tempo,


cada coisa tem sua ocasião.
Há um tempo de nascer e tempo de morrer,
tempo de plantar e tempo de arrancar,
tempo de matar e tempo de curar,
tempo de derrubar e tempo de construir.
Há tempo de ficar triste e tempo de se alegrar,
tempo de chorar e tempo de dançar,
tempo de espalhar pedras e tempo de ajuntá-las,
tempo de abraçar e tempo de afastar.
Há tempo de procurar e tempo de perder,
tempo de economizar e tempo de desperdiçar,
tempo de rasgar e tempo de remendar,
tempo de ficar calado e tempo de falar.
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Há tempo de amar e tempo de odiar,


tempo de guerra e tempo de paz.2

2 Versos inspirados no Livro do Eclesiastes (3.1-8)


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No ir e vir do cotidiano

No ir e vir do cotidiano, somos convidados a participar da trama da vida.


Em meio aos caminhos tortuosos, aos desafios constantes e aos campos floridos
somos impelidos a construir a nossa própria história.
Marcados por mitos, cultura, condicionamentos, valores e crenças,
seguimos como um lápis que realiza contornos, que modifica roteiros e
transcende a percepção da vida, buscando o sagrado imerso no profano.
Muitas pessoas acreditam em Deus, falam em Deus e seguem a Deus.
Outras buscam na natureza (sol, o verde, os animais) essa relação com o Ser
Supremo.
Não sei precisar o que é certo ou errado, mas, afinal, será que alguém
sabe?
Às voltas com esses questionamentos sobre a presença do sagrado nas
crenças e valores humanos, uma ideia se aconchega em mim.
Será que Deus não passeia por meio das pessoas, será que Sua
manifestação não faz também parte de nossos comportamentos no dia a dia,
juntos aos semelhantes, nos ambientes e instituições sociais (família, escola,
trabalho, amigos).
Quando paramos para reparar todos os movimentos do nosso planeta,
observamos que há no seu funcionamento uma harmonia que ora se encontra
em descompasso. Hoje presenciamos certa fragmentação nesse equilíbrio. A
Terra tem se manifestado bastante, entre sons e movimentos constantes, entre
ruídos assustadores, águas avassaladoras, a batida do seu coração em desalinho.
Será que a Terra também não é uma entidade viva, que, assim como nós,
precisa de afeto, de cuidado, para não adoecer?
Questões que sugerem reflexões a todos os habitantes, a todas as pessoas
que se alimentam e se agregam a essa entidade viva planetária.
Se o sagrado pode estar na natureza, se o sagrado pode estar reagindo
com fúria, ante o desrespeito e a violência praticados no Planeta, será que o
sagrado, será que Deus não poderia se manifestar a nossos semelhantes, por
intermédio de nós? Não só as visitações a templos sagrados, mas no
recolhimento ao sacro templo do nosso coração. No diálogo fraterno ou mais
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sério com pessoas da própria convivência. No cuidado com a natureza (reciclar,


não desperdiçar, não acumular para além das necessidades). Na ausência do
respeito a si próprio, não permitindo manifestações dos sentimentos (alegria,
medo, raiva, tristeza). Nos alertas do organismo humano para os
comportamentos prejudiciais à saúde biopsicofísica (má alimentação, falta de
descanso, desgaste físico, mental e emocional provocado por vícios e outras
condutas patológicas).
A vontade de conhecer me impele a pensar e procurar respostas nas
pessoas sobre elas mesmas e a presença do sagrado em suas vidas.
Como seres que vivem envoltos na matéria, precisamos de concretudes,
de matérias palpáveis que nos reservem certa segurança, que nos permitam
caminhar pela vida, desenvolver os projetos que temos a realizar, cultivar as
crenças que queremos confirmar, passar pela morte que procuramos vencer ou
transcender e pela vida que buscamos mudar todos os dias, todas as horas, no
correr dos minutos e segundos.
Olhe ao seu redor. Você não está só. Existe uma diversidade que
atravessa a sua vida. São corpos diferentes, são cores diferentes, são lugares
diferentes, individualidades próprias dentro da pluralidade do todo. Você é
muito diferente: apesar das semelhanças com seus pares, possui
particularidades que o tornam singular e distinto dos demais.
Mesmo que façamos parte de uma classificação humana, devemos
questionar a nossa humanidade (o quanto nossos comportamentos são
saudáveis e assertivos ou o quanto são patológicos, violentos ou passivos em
demasia), a presença do sagrado em nós, nos movimentos que fazemos e que
alteram as nossas experiências, o nosso porvir e marcam os horizontes dos
diferentes seres que habitam o mesmo lugar que habitamos. São eles pais, mães,
irmãos, amigos, colegas, esposos, namorados, inimigos, desconhecidos.
Não espere uma manifestação milagrosa, para que você possa fazer
modificações em sua vida. Comece agora, seja você também o sagrado presente
na sua existência. Reavalie suas crenças e verdades, ouça o outro que está ao seu
lado, perceba os sinais da vida nos pequenos detalhes, faça uma avaliação do seu
dia, dos seus comportamentos, das suas reações e das reações das pessoas em
sua volta. Se errar, não tenha medo de recomeçar. O recomeço é um convite a
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dar concretude a possibilidades e potenciais que poderão ser tornar realizações


futuras e gerar crescimento a você e ao outro.
Deus nos deixou um legado – a vida! – que repousa ou floresce, a
depender de um só movimento, um consentimento vindo de uma só pessoa –
você!
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Ciranda da Vida

Já parou para perceber para onde e em que convergem suas energias e os


apelos que tocam sua alma e seu coração?
Uma imensidão de informações, de contatos rápidos, de imagens, de
odores e gestos desfilam, em meio aos sentidos humanos, nas 24 horas que
contam os nossos dias.
Feixes luminosos, ondas sonoras, guloseimas radicais fazem parte do
cotidiano e inauguram sempre comportamentos novos em prol dessa sedução.
Seduzem a criança, seduzem o jovem, o adulto e o ancião. Seduzem pelas janelas
do corpo que permitem contato, mas que navegam nas ilusões.
Platão já falava de sua caverna. E qual será a caverna em que vivemos nos
dias atuais?
Se uma criança é pobre e vive em estado de vulnerabilidade social e
econômica, ela com certeza terá de enfrentar mais cedo uma rotina de trabalho
e, possivelmente, terá de abdicar de estudos e estará sujeita a vivenciar,
precocemente, a sorte ou o azar de uma experiência que, segundo a percepção
humana e social, seria apropriada ao tempo caracterizado como adultez.
Por outro lado, uma criança mais favorecida social e economicamente
terá de enfrentar uma rotina de atividades variadas, considerando o seu perfil
socioeconômico, a imposição, pelos adultos, de tarefas que podem vir a
contribuir para uma ascensão social e econômica (ou manutenção de
determinado status socioeconômico) e, digo mais, a necessidade de disputar a
corrida nesse mercado de trabalho monstruoso por quem estamos subjugados.
Tarefas excessivas que, também segundo uma visão social, fazem parte da vida
dos adultos propriamente ditos.
Ah, a juventude! Momento especial da vida. Onde tudo posso, mas quase
nada faço do que me é idealizado. Contardo Calligaris, na obra “A adolescência”
(São Paulo: Publifolha, 2000), fala com grande sabedoria sobre o fenômeno
caracterizado como “moratória” – um tempo em que é possível perceber que o
aprendizado mínimo está assimilado. Seus corpos, que se tornaram desejantes e
desejáveis, poderiam amar, copular e gozar, assim como se reproduzir.
Poderiam assumir qualquer tarefa de trabalho e começar a levá-los na direção
de invejáveis sucessos sociais ou não. Entretanto, nesse momento, são barrados
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pelos pais e pela sociedade, por não serem considerados ainda capazes para
assumir tanta responsabilidade, caracterizando, assim, a moratória.
Uma moratória para a juventude. Acrescento um pouquinho mais: uma
moratória para as juventudes.
E será que são todas? Nem todas as juventudes são iguais ou mesmo
parecidas. Cada jovem vive uma história de vida marcada por contextos,
oportunidades, necessidades e sentidos. A única possibilidade de
homogeneidade entre um Ser jovem e outro Ser jovem poderá ser encontrada no
olhar do adulto, um pouco que saudoso e até invejoso quando caracteriza o
jovem de “problema”, “aborrecente” e mais um bocado de adjetivos que andam
passeando por aí.
Assim, percorremos um percurso e chegamos à vida adulta.
Tanta correria!
Uma exclamação bem posta para uma vida em que a vida exige vida.
Vida para dar conta das obrigações cotidianas, vida para sempre ter
consciência de que estamos “devendo” algo a alguém ou a alguma imposição
social.
Encerra-se o ensino médio, adentra-se o reino da universidade (após se
trilhar o percurso, permeado de angústia e sofrimento, de escolher uma
profissão, diante das possibilidades sociais e econômicas reais). Mais adiante, já
estamos pensando em se formar logo e cuidar da vida profissional.
No final da graduação vem à angústia de novo:
“Será que terei emprego? Preciso fazer uma especialização, mas quem
sabe um mestrado. Ah, meu Deus, eu não sei. Bem, quem sabe outra
graduação?”
Uma imensidão de ideias me assomam e me assombram também. Isso
sem falar nas inúmeras competências exigidas por aí, que deixam qualquer
super homem e super mulher no chinelo.
Assertividade, proatividade, dinamicidade, saber enfrentar desafios e
pressão. E lá vem alguém me perguntar se já me casei. Pensa bem, com esse
tanto de coisas a pensar, até me esqueci de namorar. É mesmo, será que algum
dia eu vou casar?
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E lá vem toda aquela história novamente. Casou. E os filhos? Vem o


primeiro, cadê o segundo? É sempre uma cobrança em cima de outra cobrança.
E a vida segue.
Já ouvi dizer, muitas vezes, que é na velhice que as pessoas começam a
pensar na religião, em algo transcendente. Seria uma época em que as pessoas
se permitem, finalmente, pensar nisso, já sem a preocupação com a
sobrevivência da família. (Claro, há muitas pessoas que, mesmo idosas,
permanecem provedoras de suas famílias.)
Isso tudo é uma grande provocação, para pensarmos em fases
existenciais e em processos de uma vida. Poderia dizer muitas outras coisas,
mas creio que essas já são materiais para uma boa reflexão. Diante de tudo isso
a pergunta que fica é: “A que horas vou cuidar de mim, afinal?”
O dicionário nos revela que cuidar tem como acepção: “reparar”, “atentar
para”, “prestar atenção em”. Existem inúmeras outras definições, mas hoje
vamos nos ater a essas.
Pare um pouco. Sossegue sua mente do ruído exterior. Preste atenção em
você. Há quanto tempo você não se olha no espelho, não escreve na sua agenda,
naquelas páginas em que as datas já venceram, “coisas” que gostaria de
melhorar em você e na sua vida?
Como anda o seu relacionamento amoroso? Quanto tempo não lê, por
prazer, um livro e não assiste a um filme no cinema?
Você pensou em todas essas fases desde o seu nascimento até sua futura
morte?
Sabe uma coisa bacana que eu descobri outro dia? Pode ser que você
ainda não tenha descoberto, por isso vou compartilhar: aprendi que tesouros
não se podem guardar, temos de dividi-los. Riqueza não se define pela
quantidade de bens que acumulamos, mas pela capacidade de multiplicá-los,
dividindo-os ou os compartilhando.
Para que a vida possa ser vivenciada de maneira que não deixemos nada
sem vida, nós, adultos, devemos trazer todas as fases para o momento presente.
Ser criança, ser jovem e ancião no momento agora.
Não é preciso parar de comer guloseimas nem deixar de assistir a filmes
infantis, de comprar a roupa bonita e paquerar seu namorado, seu marido. Ao
mesmo tempo, não é preciso buscar o transcendente somente na velhice. O
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grande tesouro da vida é sabermos ocupá-la de todas essas tarefas presentes em


todas as fases e períodos, no aqui-agora.
Aí você me pergunta: “Como fazer?” E eu vou lhe dizer:
“Não sei, mas confie em sua habilidade infanto-juvenil de criar e recriar.
A vida que não é mera sobrevivência pode ser possível, desde que use os seus
sentidos para ir além do ver, ouvir, comer e sentir. Saia da sua caverna. Use-os
para perceber os sinais e vivê-los plenamente. Deixe sua energia fluir!”
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Ventania

Fenômeno constante e presente, insinua-se, renovada, uma dança


silenciosa que, lentamente, volta a balançar todo o meu ser e sua integralidade,
no compasso de trovões agitados e assustadores ou na cadência de uma canção
leve e tenra. Sempre constante.
Em sua agitação, assemelha-se às tempestades violentas ou a águas
diáfanas que movimentam toda a estrutura da vida. Fazem-me não aceitar e
questionar o meu lugar na existência.
De maneira leve e rasteira, permite um silêncio nem sempre calado de si,
eco seco de uma inquietação angustiante que demanda, quase sempre, conexões
constantes de mares calmos ou revoltos. Ondulações incessantes.
Os ventos da mudança transbordam em meu ser a possibilidade de
conhecer minha própria história (recente e longínqua). Lembro realizações e
frustrações, medos e esperanças. Repenso os caminhos escolhidos, as escolhas
realizadas e as oportunidades questionadas.
Vejo-me escalar um monte. Ao pé da montanha, ergo a cabeça ao alto.
Para alcançar o objetivo, diviso o tempo, o tamanho do obstáculo e as
estratégias. No coração, batidas exprimem sons característicos aos sentimentos
e emoções despertadas, em diálogo com minhas tarefas, desejos e necessidades.
Existe uma graduação de aprendizado na experiência a ser vivida. Quanto
mais perto do chão, mais grosseira é a atmosfera em que me encontro. O peso
dos acessórios carregados é enorme. Porém, não posso me desfazer deles, logo
eles que me trazem alguma segurança, que, reconheço, é, no momento,
necessária. A segurança de ter em que me apoiar. Recordo dos valores, crenças e
regras aprendidas, companhias constantes, ao longo da inconstância da vida.
São como os meus equipamentos. Nesse momento ainda não posso abandoná-
los de todo, embora sinta desejo de fazê-lo.
Subo mais um pouco. O corpo já se ressente dos movimentos bruscos que
uma escalada pode proporcionar.
Enquanto tomo fôlego, penso na partida e no ponto final. A corda balança
na montanha. Sou um pêndulo. Preciso me movimentar.
Aos poucos, sinto o meu corpo desfilar sobre um caminho possível. A
esperança de chegar, finalmente, ao cume desejado expande a minha alma,
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desperta em mim uma força que desconhecia. Aproximo-me do meu destino.


Sinto que a esperança que cultivei, questionada nos dias sombrios, foi o facho de
luz diante da escuridão da incerteza.
Posso olhar para baixo sem constrangimento e para cima com mais
alguma coragem. Estou quase lá, sigo com a consciência tranquila.
Existe um momento em nossa caminhada em que a dor busca abrigo em
nós. O sofrimento entra pelos aposentos do nosso ser sem nos pedir licença.
Escolhas são realizadas. Enquanto contemplamos as perdas e ganhos que cada
escolha traz consigo, por vezes, esquecemos que, descuidados, abrimos a porta a
visitantes, queridos ou indesejáveis. Quando damos conta, pode ser tarde para
expulsar o sofrimento que chamamos de intruso. Confusos com gritos e
respostas que circulam na atmosfera vivida, sentimos a necessidade de recolher
em sacolas respostas esparsas que circulam ao redor. Em processo de evolução,
caminhamos tateando em meio a esperanças e esforços de organizar a própria
vida e dar sentido à existência.
Visões do porvir nem sempre vem a ser o exato prenúncio do futuro, mas
precisamos perseverar, projetando no devir nossos projetos, que fazem a vida
valer a pena ser vivida.
Uma lágrima desce no rosto com marcas das experiências de vida.
O mundo é um palco de representações e papéis sociais. Nem sempre
gostamos de todos, mas temos de escolher alguns e caminhar.

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