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Viver mais e melhor? Estimativas de expectativa


de vida saudável para a população brasileira

Live longer and better? Estimates of healthy life


expectancy in the Brazilian population

¿Vivir más y mejor? Cálculos de esperanza de vida


saludable para la población brasileña

Mirela Castro Santos Camargos 1

Marcos Roberto Gonzaga 2

Abstract Resumo

1 Escola de Enfermagem, This study analyzed differences in healthy life ex- O objetivo deste estudo foi analisar as diferenças
Universidade Federal de
Minas Gerais, Belo Horizonte,
pectancy in the elderly based on three health di- nas estimativas de três variantes da expectati-
Brasil. mensions in Brazil from 1998 to 2008: disability- va de vida saudável dos idosos no Brasil de 1998
2 Centro de Ciências Exatas
free life expectancy, healthy life expectancy based para 2008: expectativa de vida livre de incapa-
e da Terra, Universidade
Federal do Rio Grande do on self-rated health, and chronic disease-free life cidade funcional, com percepção de saúde boa e
Norte, Natal, Brasil. expectancy. The Sullivan method was used, com- livre de doenças crônicas. Empregou-se o méto-
bining life tables from the Brazilian Institute of do de Sullivan, combinando as tábuas de vida
Correspondência
M. R. Gonzaga Geography and Statistics (IBGE) and interval es- do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
Departamento de Demografia timates of the prevalence of functional disability, (IBGE) para 1998 e 2008 e estimativas intervalares
e Ciências Atuariais, Centro
self-rated health, and chronic diseases according das prevalências de incapacidade funcional, per-
de Ciências Exatas e da Terra,
Universidade Federal do Rio to the Brazilian National Household Sample Sur- cepção de saúde e doenças crônicas da Pesquisa
Grande do Norte. vey (PNAD, 1998 and 2008). Besides the increase Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD 1998
Campus Universitário Lagoa
Nova, Natal, RN
in life expectancy, the study showed significant e 2008). Além do aumento da expectativa de vida,
59078-970, Brasil. and similar increases in disability-free life ex- observaram-se aumentos significativos e similares
mrcs.roberto@gmail.com pectancy and healthy life expectancy based on da expectativa de vida saudável nas dimensões
self-rated health at almost all ages. Women had de percepção do estado de saúde e incapacidade
higher life expectancies than men, but expected funcional em quase todas as idades. As mulheres
to live longer with poor health, regardless of the apresentaram maiores expectativas de vida, se
indicator used to measure health. Although the comparadas aos homens, porém esperaram viver
studies measured health differently (making por mais tempo com saúde ruim, independente-
comparisons difficult), women showed a consis- mente do indicador utilizado para mensurar saú-
tent disadvantage in healthy life expectancy. de. Mesmo que a forma de mensurar saúde possa
variar entre os estudos, dificultando comparações,
Active Life Expectancy; Health Status; Aged é notável a desvantagem feminina em relação à
expectativa de vida saudável.

Expectativa de Vida Ativa; Nível de Saúde; Idoso

Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 31(7):1460-1472, jul, 2015 http://dx.doi.org/10.1590/0102-311X00128914


ESTIMATIVAS DE EXPECTATIVA DE VIDA SAUDÁVEL 1461

Introdução Outro possível mecanismo que implicaria


em aumentos no número de anos com morbi-
A expectativa de vida ao nascer no Brasil para am- dade relaciona-se com possíveis alterações na
bos os sexos que era de menos de 50 anos nos distribuição das causas de incapacidade 5. Um
anos 1950 passou para 74,8 anos em 2013 1. Nesse declínio na mortalidade por doenças letais teria
mesmo período, as taxas de mortalidade infantil como consequência uma população sobreviven-
passaram de 135,0 óbitos por mil nascidos vivos, te com altos riscos de morbidade crônica e inca-
em 1950, para 15,0, em 2013 1. Ao alcançar a idade pacidade relacionada, o que levaria a uma mu-
de 60 anos em 1950, as pessoas esperavam viver, dança na distribuição de causas de incapacidade
em média, por mais 15 anos 2. Já, em 2013, esse e aumento na prevalência, ou seja, a incapacida-
tempo médio a ser vivido passou a ser cerca de 20 de deixa de ser consequência de doenças letais
anos para os homens e 23 anos para as mulheres. e passa a ser o resultado de doenças associadas
Uma das implicações dessa acentuada redu- com a idade ou com o estilo de vida. Evidências
ção da mortalidade no Brasil, em comparação desse mecanismo seriam os processos incapa-
com as reduções históricas ocorridas nos países citantes causados por certos tipos de doenças,
mais desenvolvidos, refere-se ao efeito desse pro- como diabetes 5.
cesso nas condições de saúde da população idosa Assim, à luz das hipóteses de compressão/ex-
de hoje, ou seja, população de coortes que, na pansão da morbidade, aumentos da expectativa
infância, estiveram expostas a altas taxas de mor- de vida aos 60 anos podem ser acompanhados
bidade e mortalidade. Os possíveis efeitos esta- por aumentos ou decréscimos tanto nos anos
riam conectados às hipóteses de compressão ou vividos com algum tipo de condição crônica ou
expansão da morbidade 3. De acordo com a hipó- incapacidade relacionada quanto nos anos vi-
tese de compressão da morbidade, a idade média vidos livre de incapacidade. Então, é pertinente
de início da condição crônica ou incapacitante considerar uma análise conjunta de aumentos
pode aumentar mais rapidamente que a expec- na expectativa de vida aos 60 anos, aqui conside-
tativa de vida, levando a uma redução do tempo rada como expectativa de vida total a partir dos
médio de vida vivido com enfermidade 3,4,5. 60 anos, com mudanças nas duas componentes
Ao contrário da compressão da morbidade, desse aumento: expectativa de vida saudável e
a hipótese de expansão da morbidade relaciona- não saudável aos 60 anos.
se a uma visão mais pessimista no processo de Na análise da expectativa de vida saudável,
mudanças no padrão de morbimortalidade da em geral, são avaliados os dois componentes:
população. Essa hipótese sugere que as reduções anos vividos com saúde e vividos sem saúde,
na mortalidade, especialmente entre os ido- sendo que saúde pode ser analisada em diferen-
sos, estão associadas a períodos mais longos de tes dimensões. Por exemplo, uma expectativa de
morbidade da população sobrevivente 6,7,8,9. Os vida de 86 anos composta de 82 anos saudáveis
mecanismos (fisiológicos/epidemiológicos) por e 4 anos não saudáveis significaria que, em mé-
intermédio dos quais reduções na mortalidade dia, uma pessoa poderia esperar viver 4 anos sem
levam a aumentos no número de anos com mor- saúde durante todos os 86 anos. No entanto, os
bidade, tanto no nível individual quanto popula- anos sem saúde não seriam necessariamente os
cional, envolvem mudanças na taxa de letalidade últimos quatro anos consecutivos de vida 10.
da doença, na idade de início da doença e na dis- A tomada de decisões para formulação de po-
tribuição de causas de incapacidade. líticas na área de saúde, tanto para prevenção e
Como consequência de avanços tecnológi- controle quanto para definição de prioridades e
cos na medicina, pode ocorrer um aumento na previsão de demandas futuras, é feita com base
sobrevivência de pessoas convivendo com algu- em medidas resumo de saúde. Contrariamente à
ma condição crônica resultante da redução da mortalidade, os conceitos de saúde e morbidade
letalidade de certas doenças, provocando, assim, são de difícil definição. Os diferentes componen-
um aumento na prevalência de morbidades ou tes da morbidade como, por exemplo, doença,
incapacidade relacionada 9. Essa população so- estado funcional e percepção de saúde não evo-
brevivente, já fragilizada pela condição crônica luem, necessariamente, em sintonia 11. Defini-
incapacitante, vive por mais tempo com alguma ções ambíguas, indisponibilidade de métodos e
incapacidade, que tende a piorar com o aumento dados, assim como a falta de padronização só
da idade 5,9. Outro possível efeito desses avan- tendem a aumentar as dificuldades e complexi-
ços na medicina seria um adiamento da idade dades na definição da condição de saúde.
de início da doença e de suas complicações, que Assim como existem várias possibilidades
poderia impactar na progressão de doenças que para se definir saúde, há diferentes maneiras
surgem como consequência do processo de se- de se mensurar a expectativa de vida saudável.
nescência humana 10. Sendo assim, a forma como o estado de saúde é

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operacionalizado depende dos objetivos do pes- dronizados para a coleta de dados. Um desses
quisador e dos dados disponíveis. Diferentes for- esforços resulta na aplicação quinquenal do su-
mas de mensuração do estado de saúde podem plemento de saúde da PNAD.
conduzir a resultados também distintos no que Este estudo utiliza dados da PNAD dos anos de
se refere à expectativa saudável 12. 1998 e 2008 (http://www.ibge.gov.br) e as tábuas
O objetivo deste estudo foi estimar, para 1998 de vida completas (Tábuas completas de morta
e 2008, as seguintes variantes da expectativa de lidade, 1998. ftp://ftp.ibge.gov.br/, acessado em
vida saudável: (a) expectativa de vida livre de 11/Mar/2011. Tábuas completas de mortalida-
incapacidade funcional (EVLI), (b) expectativa de, 2008. http://www.ibge.gov.br/home/esta
de vida com percepção de saúde boa (EVSB) e tistica/populacao/tabuadevida/2008/default.
(c) expectativa de vida livre de doenças crônicas shtm, acessado em 11/Mar/2011), por sexo, pu-
(EVLDC). Além disso, com base em estimativas blicadas pelo IBGE para os mesmos anos. A uti-
intervalares para as prevalências nas três dimen- lização dos dados de 1998 e 2008 é interessante,
sões dicotômicas do indicador de saúde, foram pois permite a análise em dois pontos do tempo,
conduzidas análises sobre os diferenciais na com intervalo de dez anos.
mensuração da expectativa de vida saudável nos Implantada em 1967, a PNAD investiga,
anos de 1998 e 2008. anualmente, de forma permanente, caracterís-
No Brasil, apesar da inexistência de séries ticas gerais da população, de educação, trabalho,
históricas e de base populacional sobre infor- rendimento e habitação. Em 1998 e 2008, anos
mações de saúde, tem-se produzido, nas últimas considerados neste estudo, a PNAD teve um su-
décadas, alguns estudos cujo objetivo foi estimar plemento especial de saúde, que, dentre outras
a expectativa de vida saudável ou livre de inca- informações, permitiu obter os dados sobre in-
pacidade 12,13,14,15,16,17,18,19,20. Os suplementos capacidade funcional, doenças crônicas e auto-
de saúde da Pesquisa Nacional por Amostra de percepção de saúde.
Domicílios (PNAD), realizada pelo Instituto Bra- O estado de saúde utilizado para estimar a
sileiro de Geografia e Estatística (IBGE), vieram expectativa de vida saudável foi mensurado por
suprir, em parte, a demanda por dados de preva- meio de três indicadores dicotômicos: incapa-
lências de doenças crônicas, percepção do esta- cidade funcional, doenças crônicas e percep-
do de saúde e incapacidade funcional. ção de saúde. A PNAD oferece a oportunidade
Analisar as mudanças na expectativa de vi- de avaliar a capacidade funcional por meio de
da saudável considerando múltiplas dimensões sete perguntas, sendo uma para atividades de
desse indicador pode ser útil no planejamento vida diária (AVD) e seis para mobilidade. As AVD
de políticas públicas ao se pensar nas necessi- incluem tarefas simples, relacionadas ao cuida-
dades reais da população. Se comparada às me- do pessoal, sendo consideradas como impor-
didas de prevalência de determinada condição tantes indicadores de status de saúde dos ido-
de saúde, por exemplo, uma das vantagens é sos e frequentemente utilizadas para avaliar a
que esse indicador fornece uma medida de du- incapacidade funcional do indivíduo 21,22. Uma
ração, estimada por anos vividos com ou sem vez que avaliam o grau mais severo de limita-
saúde, e o tempo de cuidado necessário de dada ção dentro do espectro funcional 23, optou-se
população 14,21. por utilizar as AVD para medir a prevalência de
incapacidade funcional na população. Entre-
tanto, a PNAD combina apenas três atividades
Metodologia da vida diária em uma única pergunta, quando,
na escala original, utilizam-se seis AVD 24 em
Fonte de dados perguntas distintas. Isso pode fazer com que o
indicador de incapacidade esteja subestimado.
No Brasil, há uma escassez de pesquisas de ba- Ademais, por se tratar de uma medida objetiva
se populacional voltadas especificamente para em que uma limitação em apenas uma das seis
a análise da transição de saúde e do processo de atividades já revelaria uma situação de incapa-
envelhecimento populacional em que pese sua cidade severa, a combinação de três atividades
extrema importância para a avaliação das mu- dificulta qualquer comparação. Apesar das li-
danças no padrão de morbimortalidade da po- mitações na pergunta da PNAD, fez-se a opção
pulação em idades adultas e/ou avançadas. por utilizá-la dada a sua importância como me-
No entanto, há certo empenho, por parte da dida de incapacidade funcional. Assim, foram
iniciativa pública, na realização de pesquisas classificadas como apresentando incapacidade
domiciliares transversais consecutivas, de base funcional pessoas que relataram que não con-
populacional (com representatividade nacional), seguem ou que possuem pequena ou grande
assim como na manutenção de instrumentos pa- dificuldade para alimentar-se, tomar banho ou

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ESTIMATIVAS DE EXPECTATIVA DE VIDA SAUDÁVEL 1463

ir ao banheiro. Indivíduos que relataram não ter As três dimensões da expectativa de vida sau-
dificuldade foram classificados como livres de dável foram estimadas combinando a tábua de
incapacidade funcional. vida, com experiência de mortalidade corrente
No questionário da PNAD, foram incluídas da população em 1998 e 2008, e as estimativas
perguntas sobre 12 doenças crônicas: (1) doença pontuais e intervalares das prevalências de cada
de coluna ou costas; (2) artrite ou reumatismo; estado de saúde na população no mesmo perío-
(3) câncer; (4) diabetes; (5) bronquite ou asma; do. Assim, o número de anos a serem vividos em
(6) hipertensão (pressão alta); (7) doença do co- dado estado de saúde é estimado aplicando as
ração; (8) doença renal crônica; (9) depressão; prevalências de incapacidade funcional, doen-
(10) tuberculose; (11) tendinite ou tenossinovite; ças crônicas e percepção de saúde. A principal
e (12) cirrose. Cabia ao entrevistador esclarecer vantagem do método de Sullivan é a necessidade
que o problema deve acompanhar a pessoa por apenas de dados transversais 28. A expectativa de
um longo período de tempo, podendo ter fases vida saudável foi estimada separadamente para
agudas, momentos de piora ou melhora sensível, cada sexo, ano e indicador de saúde selecionado.
o que dá ao entrevistado a noção de que se trata A fórmula comum para estimar a expectativa
de uma doença crônica. Foram classificados co- de vida saudável (EVSx) é:
mo presença de doenças crônicas aqueles indiví-
duos que responderam sim em, ao menos, uma
patologia investigada.
A percepção do estado de saúde é avaliada Em que:
pelas opções de resposta: muito bom, bom, regu- EVSx: expectativa de vida saudável, que corres-
lar, ruim e muito ruim. A medida foi dicotomiza- ponde ao número médio de anos a serem vividos
da pela combinação das categorias “muito bom”, com saúde (livre de incapacidade funcional, livre
“bom” e “regular”, fazendo referência a uma boa de doenças crônicas ou com percepção da saúde
percepção de saúde, e em “ruim” e “muito ruim”, boa) a partir da idade x;
para referir uma percepção de saúde ruim. n π x : prevalência da condição de saúde (livre de
As prevalências de cada estado de saúde fo- incapacidade funcional, livre de doenças crôni-
ram estimadas separadamente por sexo e gru- cas ou com percepção da saúde boa) no grupo
po etário. A amostra considerada para análise é etário x a x+n;
n Lx
composta por pessoas de 60 anos e mais de ida- : pessoas-anos vividos de x a x+n, que cor-
de, sendo de 28.943 pessoas em 1998 e 41.269 responde ao total de anos vividos pela coorte no
em 2008. Da amostra de 1998, foram excluídos os intervalo;
casos sem declaração do estado de saúde, sen- lx: probabilidade de sobreviver até a idade x.
do três casos sobre percepção de saúde, 39 casos Já as EVCI, EVCDC e EVSR foram obtidas
sobre doenças crônicas autorreportadas e seis subtraindo da expectativa de vida total, respec-
casos sobre incapacidade funcional. Já, na amos- tivamente, a EVLI, a EVLDC e a EVSB. Ademais,
tra de 2008, não ocorreram casos sem declaração estimou-se a proporção de anos a serem vividos
de idade. em dado estado de saúde pela razão entre o nú-
Finalmente, tábuas de vida completas, publi- mero de anos a serem vividos em cada uma des-
cadas pelo IBGE, foram utilizadas para a estima- sas condições e o total de anos a serem vividos.
ção da expectativa de vida saudável. As tabelas de sobrevivência foram construí-
das separadamente para cada ano, sexo e estado
Métodos de saúde. O número de anos vividos dentro de
cada idade na tábua de vida foi distribuído se-
Por se basear em um planejamento de amostra- gundo a prevalência de incapacidade funcional,
gem probabilística complexa, as estimativas de doenças crônicas e percepção da saúde em cada
totais, médias ou proporções com os dados da grupo etário específico, pressupondo a mesma
PNAD são influenciadas não somente pelos pe- tábua de vida para todos os três grupos, ou seja,
sos amostrais, mas, também, pela estratificação mortalidade não diferencial segundo indicador
e conglomeração, sendo necessária a incorpo- de saúde avaliado. A opção por estimar as preva-
ração do desenho amostral para a obtenção de lências por grupos quinquenais teve como obje-
estimativas intervalares 25,26. Neste trabalho, uti- tivo minimizar possíveis erros de estimativas por
lizou-se o software Stata (Stata Corp., College Sta- idade simples.
tion, Estados Unidos) que utiliza, dentre outros
métodos, o de linearização de Taylor para esti-
mativas de variâncias em amostras complexas 25.
Foi empregado o método de Sullivan 27 para
estimar a EVLI, a EVLDC e a EVSB em 1998 e 2008.

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Resultados tas, artrite ou reumatismo e doença renal crônica


em todos os grupos etários para ambos os sexos.
Para análise do comportamento das variáveis de Para os homens, observaram-se reduções signi-
saúde entre 1998 e 2008, foram obtidas as esti- ficativas nas prevalências de bronquite ou asma
mativas intervalares, com 95% de confiança, das em quase todos os grupos etários. Já no caso das
prevalências em cada categoria de percepção mulheres, reduções significativas foram obser-
de saúde e em cada uma das doenças autorre- vadas, também, nas prevalências de doença do
portadas, por sexo e grupos de idade. Quanto à coração e depressão (exceto para os dois últimos
percepção de saúde, observaram-se aumentos grupos etários). Em contrapartida, aumentos
não significativos nas prevalências de saúde boa significativos foram observados para as preva-
e muito boa para os homens em quase todos os lências de câncer, diabetes e hipertensão arte-
grupos etários. Para as mulheres, as prevalências rial, também em todas as idades e para ambos
de saúde boa aumentaram significativamente. os sexos. As prevalências de cirrose, no caso dos
As prevalências de saúde regular tiveram com- homens, e de tendinite ou tenossinovite, no caso
portamento aproximadamente estável entre os das mulheres, tiveram aumentos significativos.
homens em todas as idades e reduções significa- Estimativas pontuais e intervalares para as
tivas para as mulheres nos três primeiros grupos prevalências de incapacidade funcional, doen-
etários. No outro extremo da escala de percepção ças crônicas e percepção ruim da saúde, por sexo
de saúde, foram observadas reduções significati- e idade, nos dois anos da pesquisa são apresen-
vas nas prevalências de saúde ruim entre as mu- tadas nas Tabelas 1 e 2. No geral, considerando
lheres em todas as idades. as estimativas pontuais, as prevalências de in-
No que se refere às doenças crônicas, obser- capacidade funcional, doenças crônicas e saúde
varam-se reduções estatisticamente significati- ruim são maiores para as mulheres nos dois anos
vas nas prevalências de doença de coluna ou cos- da pesquisa. As únicas exceções ocorrem nas

Tabela 1

Prevalências de incapacidade, doenças crônicas e saúde ruim para os homens por idade. Brasil, 1998 e 2008.

Grupos de idade (anos) 1998 2008


Prevalência IC95% Prevalência IC95%

Incapacidade
60-64 0,0842 0,0737-0,0946 0,0702 0,0628-0,0777
65-69 0,1069 0,0943-0,1195 0,0960 0,0862-0,1058
70-74 0,1264 0,1106-0,1422 0,1219 0,1093-0,1344
75-79 0,1795 0,1582-0,2008 0,1839 0,1668-0,2010
80 e mais 0,3175 0,2898-0,3453 0,3093 0,2866-0,3321
Doenças crônicas
60-64 0,6948 0,6792-0,7105 0,6793 0,6659-0,6927
65-69 0,7556 0,7395-0,7717 0,7046 0,6897-0,7195
70-74 0,7518 0,7325-0,7712 0,7530 0,7370-0,7690
75-79 0,7728 0,7492-0,7963 0,7566 0,7371-0,7760
80 e mais 0,7651 0,7399-0,7903 0,7635 0,7435-0,7835
Saúde ruim
60-64 0,1145 0,1030-0,1260 0,1095 0,1003-0,1187
65-69 0,1356 0,1223-0,1489 0,1144 0,1045-0,1243
70-74 0,1620 0,1451-0,1788 0,1410 0,1275-0,1546
75-79 0,2097 0,1873-0,2321 0,1781 0,1607-0,1954
80 e mais 0,2567 0,2306-0,2829 0,2340 0,2137-0,2542

IC95%: intervalo de 95% de confiança.


Fonte: PNAD dos anos de 1998 e 2008 (http://www.ibge.gov.br) e as tábuas de vida completas (Tábuas completas de
mortalidade, 1998. ftp://ftp.ibge.gov.br/, acessado em 11/Mar/2011. Tábuas completas de mortalidade, 2008.
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/tabuadevida/2008/default.shtm, acessado em 11/Mar/2011).

Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 31(7):1460-1472, jul, 2015


ESTIMATIVAS DE EXPECTATIVA DE VIDA SAUDÁVEL 1465

Tabela 2

Prevalências de incapacidade, doenças crônicas e saúde ruim para as mulheres por idade. Brasil, 1998 e 2008.

Grupos de idade (anos) 1998 2008


Prevalência IC95% Prevalência IC95%

Incapacidade
60-64 0,1030 0,0926-0,1134 0,0915 0,0829-0,100
65-69 0,1187 0,1071-0,1302 0,1150 0,1056-0,1244
70-74 0,1703 0,1552-0,1854 0,1594 0,1465-0,1723
75-79 0,2381 0,2161-0,2601 0,2226 0,2073-0,2380
80 e mais 0,3672 0,3426-0,3919 0,3881 0,3687-0,4075
Doenças crônicas
60-64 0,7932 0,7802-0,8061 0,7842 0,7732-0,7952
65-69 0,8206 0,8070-0,8341 0,8112 0,7997-0,8227
70-74 0,8452 0,8306-0,8598 0,8330 0,8208-0,8453
75-79 0,8669 0,8499-0,8840 0,8513 0,8370-0,8656
80 e mais 0,8458 0,8288-0,8628 0,8442 0,8311-0,8573
Saúde ruim
60-64 0,1383 0,1268-0,1498 0,1109 0,1025-0,1192
65-69 0,1478 0,1358-0,1599 0,1158 0,1060-0,1257
70-74 0,1820 0,1674-0,1967 0,1328 0,1216-0,1439
75-79 0,2232 0,2022-0,2443 0,1549 0,1413-0,1685
80 e mais 0,2504 0,2292-0,2716 0,1880 0,1731-0,2029

IC95%: intervalo de 95% de confiança.


Fonte: PNAD dos anos de 1998 e 2008 (http://www.ibge.gov.br) e as tábuas de vida completas (Tábuas completas de
mortalidade, 1998. ftp://ftp.ibge.gov.br/, acessado em 11/Mar/2011. Tábuas completas de mortalidade, 2008.
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/tabuadevida/2008/default.shtm, acessado em 11/Mar/2011).

prevalências de saúde ruim no grupo etário de 80 Ao se decompor a expectativa de vida total


anos e mais, em 1998, e nos três últimos grupos em duas componentes, saudável e não saudável,
de idade, em 2008. Já as estimativas intervala- considerando os indicadores incapacidade fun-
res para as prevalências de incapacidade e saúde cional e percepção de saúde, as mulheres apre-
ruim mostram que a desvantagem feminina não sentam um tempo médio maior de sobrevida
é estatisticamente significativa. Destaca-se, no ativa ou com boa saúde. Entretanto, apresentam
caso das prevalências por doenças crônicas, que também um tempo médio maior de sobrevida
a desvantagem feminina é significativa em todos com incapacidade ou com saúde ruim. Consi-
os grupos etários nos dois anos da pesquisa. derando uma análise dessas componentes em
Sobre as diferenças nas prevalências por se- termos proporcionais à expectativa de vida total,
xo, as reduções ou aumentos nas prevalências de verificamos uma mudança de cenário entre 1998
1998 para 2008 não foram estatisticamente sig- e 2008, quando o estado de saúde é mensurado
nificativas em qualquer grupo etário, em ambos pelo indicador de percepção de saúde. Nota-se
os sexos. que a proporção do tempo vivido com boa saúde
As Tabelas 3 e 4 apresentam as estimativas é maior para os homens em 1998 (aos 60 e aos
da expectativa de vida total (EV), EVLI, EVSB e 70 anos). Já, em 2008, o cenário é favorável às
EVLDC por idade em 1998 e 2008, em termos ab- mulheres em todas as idades. Ao considerarmos
solutos e relativos, para homens e mulheres, res- os indicadores de incapacidade funcional e de
pectivamente. Em 1998, ao completar 60 anos, as doenças crônicas, o cenário é sempre favorável
mulheres poderiam esperar viver, em média, 2,8 aos homens nos dois anos da pesquisa, em todas
anos a mais que os homens. Já, em 2008, a sobre- as idades.
vida média das mulheres é de cerca de 3,2 anos. Destaca-se certa similaridade nas estimativas
Essa maior sobrevida das mulheres também po- da expectativa de vida saudável nas dimensões
de ser observada aos 70 e aos 80 anos de idade. de percepção de saúde e incapacidade funcional.

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1466 Camargos MCS, Gonzaga MR

Tabela 3

Expectativa de vida total, livre de incapacidade funcional, com percepção de saúde boa e livre de doenças crônicas em termos absolutos e proporcionais para
homens por idade. Brasil, 1998 e 2008.

Ano e idade (anos) Expectativa de Expectativa de vida com Expectativa de vida livre de Expectativa de vida livre de
vida percepção de saúde boa incapacidade funcional doenças crônicas
Em anos Em anos % Em anos % Em anos %

1998
60 18,5 15,4 83,1 15,6 84,4 4,7 25,6
70 12,6 9,9 79,0 9,9 78,8 3,0 23,8
80 8,3 6,2 74,3 5,7 68,2 2,0 23,5
2008
60 19,5 16,5 84,7 16,5 84,8 5,3 27,3
70 13,3 10,8 81,2 10,5 78,7 3,2 24,2
80 8,9 6,8 76,6 6,2 69,1 2,1 23,6

Ano e idade (anos) Expectativa de Expectativa de vida com Expectativa de vida com Expectativa de vida com
vida percepção de saúde ruim incapacidade funcional doenças crônicas
Em anos Em anos % Em anos % Em anos %

1998
60 18,5 3,1 16,9 2,9 15,6 13,8 74,4
70 12,6 2,6 21,0 2,7 21,2 9,6 76,2
80 8,3 2,1 25,7 2,6 31,8 6,4 76,5
2008
60 19,5 3,0 15,3 3,0 15,2 14,2 72,7
70 13,3 2,5 18,8 2,8 21,3 10,1 75,8
80 8,9 2,1 23,4 2,8 30,9 6,8 76,4

Fonte: PNAD dos anos de 1998 e 2008 (http://www.ibge.gov.br) e as tábuas de vida completas (Tábuas completas de mortalidade, 1998. ftp://ftp.ibge.gov.
br/, acessado em 11/Mar/2011. Tábuas completas de mortalidade, 2008. http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/tabuadevida/2008/default.shtm,
acessado em 11/Mar/2011).

Nos dois anos, em todas as idades, em ambos os nificativas. Desse modo, levando-se, em conta,
sexos, a parcela do tempo médio vivido com boa o tipo de planejamento amostral das PNADs de
saúde é sempre maior que a parcela vivida com 1998 e 2008, foram obtidas estimativas pontuais
saúde ruim nos dois indicadores. Por outro lado, e intervalares para as prevalências da condição
quando consideramos a presença de, ao menos, de saúde nos três indicadores do estado de saúde.
uma doença crônica como indicador do esta- Intervalos de 95% de confiança (IC95%) para
do de saúde, observamos um cenário oposto. O as verdadeiras EVSB, EVLI e EVLDC foram esti-
maior tempo vivido na presença de, pelo menos, mados por sexo e idade para a população do Bra-
uma doença crônica reflete as altas prevalências sil em 1998 e 2008. Os resultados são mostrados
dessas enfermidades entre os idosos. na Figura 1. A primeira linha de gráficos mostra
O método de Sullivan combina informações as estimativas pontuais e intervalares das EVSB,
de prevalências da condição do estado de saúde EVLI e EVLDC aos 60 anos de idade para homens
com mortalidade para estimação da expectativa e mulheres. A segunda e a terceira linhas de grá-
de vida saudável. Embora os dados de mortalida- ficos mostram as mesmas estimativas aos 70 e 80
de sejam obtidos com base em registros e censos anos, respectivamente.
populacionais, as prevalências da condição de Observa-se que o aumento da EVSB É estatis-
saúde são provenientes de dados amostrais. As- ticamente significativo, em todas as idades anali-
sim, ao se analisar a evolução nas prevalências de sadas, tanto para homens quanto para mulheres,
estado de saúde, seja qual for a dimensão ou o in- haja vista que não se observa uma sobreposição
dicador utilizado, é importante avaliar, com rigor nas estimativas intervalares entre 1998 e 2008 em
estatístico, se as mudanças observadas são sig- cada sexo.

Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 31(7):1460-1472, jul, 2015


ESTIMATIVAS DE EXPECTATIVA DE VIDA SAUDÁVEL 1467

Tabela 4

expectativa de vida total, livre de incapacidade funcional, com percepção de saúde boa e livre de doenças crônicas em termos absolutos e proporcionais para
as mulheres por idade. Brasil, 1998 e 2008.

Ano e idade (anos) Expectativa Expectativa de vida com Expectativa de vida livre de Expectativa de vida livre de
de vida percepção de saúde boa incapacidade funcional doenças crônicas
Em anos Em anos % Em anos % Em anos %

1998
60 21,3 17,3 81,3 17,0 80,0 3,6 16,8
70 14,3 11,2 77,9 10,5 73,0 2,1 14,9
80 9,0 6,8 75,0 5,7 63,3 1,4 15,4
2008
60 22,7 19,5 85,8 18,0 79,5 4,0 17,6
70 15,5 13,0 83,7 11,2 72,3 2,4 15,7
80 9,9 8,1 81,2 6,1 61,2 1,5 15,6

Ano e idade (anos) Expectativa Expectativa de vida com Expectativa de vida com Expectativa de vida com
de vida percepção de saúde ruim incapacidade funcional doenças crônicas
Em anos Em anos % Em anos % Em anos %

1998
60 21,3 4,0 18,7 4,3 20,0 17,7 83,2
70 14,3 3,2 22,1 3,9 27,0 12,2 85,1
80 9,0 2,3 25,0 3,3 36,7 7,7 84,6
2008
60 22,7 3,2 14,2 4,7 20,5 18,7 82,6
70 15,5 2,5 16,3 4,3 27,7 13,1 84,6
80 9,9 1,9 18,8 3,9 38,8 8,4 84,4

Fonte: PNAD dos anos de 1998 e 2008 (http://www.ibge.gov.br) e as tábuas de vida completas (Tábuas completas de mortalidade, 1998. ftp://ftp.ibge.gov.
br/, acessado em 11/Mar/2011. Tábuas completas de mortalidade, 2008. http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/tabuadevida/2008/default.shtm,
acessado em 11/Mar/2011).

Os aumentos da EVLI, por sexo, são significa- tos. Para tal, foram empregadas, separadamente,
tivos em todas as idades, exceto no caso da EVLI informações de percepção de saúde, incapacida-
para as mulheres aos 80 anos em que, a rigor, as de funcional e presença de doenças crônicas. De
estimativas intervalares se sobrepõem. No caso modo geral, o que se observa nos trabalhos que
da EVLDC, os aumentos observados de 1998 a medem a expectativa de vida saudável é que não
2008 não foram significativos para ambos os se- existe uma uniformidade, afinal, mesmo que a
xos, em todas as idades. opção seja trabalhar com determinado indica-
Observa-se certa similaridade no padrão de dor, como, por exemplo, incapacidade funcio-
aumento, por sexo e idade, entre as estimativas nal, existem formas distintas para construí-lo. A
da EVSB e da EVLI. Nos dois indicadores, as es- opção por manter três tipos de indicadores na
timativas para as mulheres são mais elevadas presente análise serve para ilustrar as diferenças
que para os homens. Entretanto, no caso das es- e ampliar as possibilidades para a discussão de
timativas da EVLDC, observamos exatamente o saúde do indivíduo idoso.
oposto. As diferenças encontradas entre o número de
anos a serem vividos com saúde já eram espera-
das. Afinal, dependendo do indicador utilizado
Discussão para medir saúde, as prevalências podem variar
consideravelmente 22. No caso do presente estu-
Este estudo procurou mensurar e comparar ex- do, os indicadores de percepção de saúde e inca-
pectativas de vida saudável obtidas com base em pacidade funcional mostraram resultados muito
diferentes conceitos de saúde e em dois momen- próximos ao estimar a expectativa de vida sau-

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1468 Camargos MCS, Gonzaga MR

Figura 1

Estimativas intervalares da expectativa de vida livre de incapacidade funcional (EVLI), expectativa de vida com percepção de saúde boa (EVSB) e expectativa
de vida livre de doenças crônicas (EVLDC) por sexo e idade. Brasil, 1998 e 2008.

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ESTIMATIVAS DE EXPECTATIVA DE VIDA SAUDÁVEL 1469

dável para idosos, diferentemente do marcador A maior sobrevivência das mulheres, permi-
doenças crônicas. tindo que elas alcancem idades em que são mais
Pensando em saúde como ausência de doen- evidentes o surgimento de patologias crônicas e
ças, pode-se verificar que o número de anos vivi- suas consequências, seria o segundo fator expli-
dos livres de patologias era baixo, isso porque a cativo para essa diferença. Adicionalmente, exis-
prevalência de doenças crônicas entre os idosos te uma discussão que sugere que as condições de
é bastante elevada. Nas mulheres de 60 anos, por saúde das mulheres idosas seriam reflexo de con-
exemplo, as diferenças nas estimativas pontuais dições econômicas, sociais e culturais desiguais,
das EVBS e EVLI são quase cinco vezes maiores em diferentes fases do ciclo de vida 31,32. Cabe
que a EVLDC. lembrar que, historicamente, as mulheres têm
Para Ramos 29, no universo de saúde dos ido- assumido o papel de cuidadora do lar e das crian-
sos, a ausência de doenças é privilégio de pou- ças. Além disso, no mercado de trabalho, ainda
cos, e o completo bem-estar pode ser atingido persistem distorções salariais atribuídas, entre
por muitos, independentemente da presença ou outros fatores, as distinções entre os gêneros na
não de doenças. Segundo o autor, pouco impor- distribuição das diferentes ocupações, dotadas
ta saber que uma mesma pessoa é hipertensa, de status desiguais 33,34.
diabética, cardíaca e que toma remédio para de- Finalmente, outra explicação que pode ser
pressão. O importante é que, como resultante de apontada para o diferencial desfavorável às mu-
um tratamento bem-sucedido, ela mantém sua lheres seria o fato de que as mulheres, além de vi-
autonomia, é feliz, integrada socialmente e, para verem mais, procuram mais os serviços de saúde
todos os efeitos, é uma pessoa idosa saudável. e desenvolvem uma percepção muito mais agu-
Nesse ponto de vista, as medidas de saúde de çada em relação ao seu estado de saúde. Uma
acordo com a funcionalidade e percepção de saú- vez que as informações dessas pesquisas são, ge-
de poderiam ser consideradas mais adequadas. ralmente, entrevistas pessoais, é possível que as
No período analisado, as mulheres apresen- informações fornecidas pelas mulheres sejam,
taram maiores expectativas de vida, se compa- em média, mais precisas que as dos homens. É
radas aos homens, porém podem esperar viver possível, ainda, que elas tendam a ter diagnósti-
um tempo maior com saúde ruim, indepen- cos muito mais precoces e, portanto, vivem mais
dentemente do indicador utilizado para men- tempo com a doença e com restrições de ativida-
surar saúde. Isso corrobora estudos anteriores de em relação aos homens.
12,13,14,15,16,17,18,19,20,21, que, mesmo utilizando Entre 1998 e 2008, os resultados mostraram
medidas distintas para avaliar saúde, retrataram que ocorreu, concomitantemente aos ganhos na
vantagem dos homens em relação à expectativa expectativa de vida, um crescimento na EVSB em
de vida saudável. todas as idades analisadas e em ambos os sexos.
Estimativas das expectativas de vida livre de Já nos aumentos observados na EVLI, os ganhos
incapacidade e com percepção de saúde boa, só não foram significativos para mulheres de 80
obtidas pelo método de Sullivan com base nos anos. Nesse período, as alterações na EVLDC não
dados da Pesquisa Mundial de Saúde, que foi re- foram significativas para ambos os sexos, em ne-
alizada no ano 2003 com representatividade na- nhuma das idades analisadas.
cional, revelaram diferenciais por sexo que con- Não obstante, algumas limitações do pre-
figuram um cenário similar ao deste estudo 15. sente estudo devem ser consideradas. Primeira-
Essa desvantagem feminina na expectativa de mente, a opção por utilizar o método de Sullivan
vida com incapacidade é persistente até mesmo não permite que possíveis mudanças nas taxas
em subgrupos populacionais com diferentes ní- de mortalidade e nas condições de saúde sejam
veis de escolaridade 30. incorporadas às estimativas. Cabe lembrar que
A respeito da discussão sobre diferenças en- esse problema não é inerente ao método e sim à
tre os sexos em relação à expectativa de vida sau- construção de tabelas de sobrevivências de perí-
dável, podemos apontar algumas possíveis expli- odo. Estudos anteriores suportam a utilização do
cações. Primeiro, alguns estudos sugerem que as método de Sullivan e têm demonstrado que esse
altas taxas de mortalidade masculinas em idades é confiável, caso não existam mudanças repen-
mais jovens poderiam influenciar a composição tinas nas condições de saúde e mortalidade 35.
do grupo etário de homens idosos, em uma es- Como o período utilizado é relativamente curto,
pécie de seleção. Nesse caso, se comparado ao acredita-se que as estimativas são confiáveis e
grupo masculino de idosos, teríamos um grupo podem ser utilizadas.
feminino mais heterogêneo, composto por um Outra importante limitação, ao se comparar
número maior de idosas frágeis, o que poderia as informações sobre prevalência de doenças
refletir diretamente no número de anos vividos crônicas entre as PNADs de 1998 e 2008, refere-
com saúde comprometida 12,14,16,17,18,19. se à mudança na pergunta entre as duas pesqui-

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1470 Camargos MCS, Gonzaga MR

sas. Na PNAD 1998, adotou-se a pergunta “Tem fim, somente 4% das informações de 1998 e 3%
[determinada doença]?”. Já, em 2008, a pergunta em 2008 eram de pessoas que não residiam no
foi alterada por “Algum médico ou profissional domicílio. Percentuais semelhantes foram verifi-
de saúde já disse que você tem [determinada cados nas informações sobre incapacidade fun-
doença]?”. De acordo com Lima-Costa et al. 36, cional, tanto em 1998 quanto em 2008.
existe certa pertinência nessa mudança dada a Desse modo, observa-se que a maioria das in-
universalidade e a validade da pergunta feita em formações é fornecida pela pessoa de referência
2008. Ao responder que possuía determinada pa- ou morador do domicílio. Ademais, no que diz
tologia, em 2008, esperava-se que o entrevistado respeito às percepções sobre o estado de saúde e
tivesse um diagnóstico fornecido por um profis- doenças crônicas, é possível que não haja muita
sional de saúde, diferentemente de 1998, em que discrepância entre a percepção do terceiro in-
a pergunta era menos específica. Caso a diferen- formante morador do domicílio e da pessoa de
ça nas prevalências de doenças crônicas se de- referência. Já no caso de incapacidade funcional,
vesse apenas à mudança na forma de perguntar, é menos provável ainda que se verifique muita
poder-se-ia supor que as prevalências dessas pa- diferença entre esses dois tipos de informantes.
tologias reduziriam no período, já que a pergunta Ao se avaliar a incapacidade funcional, trabalha-
foi mais específica, mas isso não ocorreu. Uma se com a dificuldade ou inabilidade de realizar
provável explicação para o aumento nas preva- determinada tarefa. Trata-se de uma informa-
lências de patologias crônicas é a existência de ção concreta, mesmo sendo fornecida por um
algum viés de seleção no acesso aos serviços de informante, pois, afinal, esse informante saberá
saúde em 2008 em relação a 1998. Ou seja, nesse dizer se a pessoa de referência consegue ou não
caso, uma resposta positiva à pergunta em 2008 desempenhar aquelas atividades ou se possui di-
estaria correlacionada com o acesso aos serviços ficuldade. No caso das AVD, a percepção pode
de saúde. Contudo, é preciso cautela ao analisar ser facilitada, pois se tratam de tarefas básicas de
esses dados, e estudos completares são necessá- autocuidado.
rios para tal. Mesmo com essa limitação, fez-se a Além das limitações já destacadas, é impor-
opção de manter as três medidas de expectativa tante frisar que a PNAD é uma pesquisa que
de vida saudável para que o leitor possa decidir não foi desenhada especificamente para acom-
qual indicador utilizar, afinal, dependendo da si- panhar a saúde da população idosa. Por outro
tuação, saber a proporção de anos vividos na pre- lado, a pesquisa viabiliza uma análise do núme-
sença ou ausência de doenças crônicas também ro de anos a serem vividos com saúde em dois
é um dado interessante. pontos do tempo, empregando três indicadores
No que diz respeito à imprecisão nas respos- distintos.
tas, é pouco provável que a informação de tercei- Finalmente, retoma-se a uma pergunta que
ros comprometa as análises feitas neste estudo. norteou este trabalho e faz parte do título: “Viver
Nas informações sobre percepção de saúde e mais e melhor?”. Se considerarmos a percepção
doenças crônicas, a proporção de informações de saúde e a capacidade funcional, nesse período
fornecidas pela própria pessoa aumentou de de dez anos (1998 a 2008), concluiu-se que, ao
64% em 1998 para 71% em 2008, já a proporção completar 60 anos, os brasileiros poderiam es-
de terceiros informantes moradores do domicílio perar viver mais e ter um número maior de anos
diminuiu de 33% em 1998 para 26% em 2008. Por com saúde.

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ESTIMATIVAS DE EXPECTATIVA DE VIDA SAUDÁVEL 1471

Resumen Colaboradores

El objetivo de este estudio fue analizar los diferenciales M. C. S. Camargos contribuiu com a concepção do es-
en tres variaciones de esperanza de vida saludable de tudo, análise e interpretação dos dados, elaboração do
la población envejecida en Brasil, 1998 a 2008: espe- artigo e aprovação da versão final. M. R. Gonzaga co-
ranza de vida libre de incapacidad funcional, con per- laborou com a elaboração, análise e interpretação dos
cepción de buena salud y libre de enfermedades cró- dados e aprovação da versão final.
nicas. Fue usado el método de Sullivan, combinando
las tablas de vida del Instituto Brasileño de Geografía y
Estadística (IBGE) para 1998 y 2008 y cálculos por in-
tervalos de las prevalencias de incapacidad funcional,
percepción de salud y enfermedades crónicas de los
Estudios Nacionales por Muestra de Domicilios (PNAD
1998 y 2008) de esos años. Además del aumento de la
esperanza de vida, se observaron aumentos signifi-
cativos y similares de la esperanza de vida saludable
en las dimensiones de percepción del estado de salud
e incapacidad funcional en casi todas las edades. Las
mujeres presentaron mayores esperanzas de vida, en
relación a la de los hombres, sin embargo, esperan vi-
vir más tiempo con salud deteriorada, independiente-
mente del indicador utilizado para medir la salud. A
pesar de que la forma de medir la salud pueda variar
entre los estudios, es percibida una desventaja femeni-
na, en relación a la esperanza de vida saludable.

Esperanza de Vida Activa; Estado de Salud; Anciano

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