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SST NOS FRIGORÍFICOS

ASCOM/MPT-RS

38 REVISTA
38 REVISTA PROTEÇÃO
PROTEÇÃO MAIO // 2017
MAIO 2017
EM RITMO
LENTO
Diferente da rapidez exigida nas linhas de produção dos frigoríficos,
o processo de adequação das empresas aos requisitos da NR 36
ainda é lento, expondo os colaboradores a diversos riscos laborais
Reportagem de Raira Cardoso

Recente operação deflagrada pela Polícia a embalagem das carnes, o trabalhador


Federal em março desse ano, intitulada é exposto a ambientes insalubres,
Carne Fraca, chamou a atenção do mundo baixas temperaturas, umidade, agentes
para os frigoríficos brasileiros, mais biológicos, ferramentas cortantes, além
propriamente para a qualidade da carne do ritmo acelerado de trabalho nas linhas
produzida no Brasil e comercializada dentro de produção, que exige repetitividade
do país e no exterior. Maior exportador de movimentos, e pode acarretar muitos
mundial de carne bovina e frango, e segundo adoecimentos osteomusculares. A amônia
maior produtor, perdendo apenas para os também tem sido uma grande vilã dos
Estados Unidos, o Brasil produziu em 2016 frigoríficos, cujos vazamentos prejudicam
mais de 25 milhões de toneladas de carnes, tanto os trabalhadores quanto o entorno da
sendo que 25% desse volume teve como empresa.
destino as exportações. Nesta reportagem faremos um balanço sobre
Agora, esse grande volume de produção como anda o cenário nacional em relação à
levanta outro questionamento importante: SST nos estabelecimentos responsáveis pelo
com está a qualidade dos cuidados à saúde abate e processamento de carnes, discutindo
e segurança oferecidos aos trabalhadores sobre sua evolução desde a regulamentação
do setor? Levando em consideração todo da NR 36 e o que ainda falta para a total
o processo produtivo, desde o abate até adequação dessas plantas.
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SST NOS FRIGORÍFICOS
De acordo com dados do IBGE (Institu-

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to Brasileiro de Geografia e Estatística),
no ano passado, o Brasil bateu seu recor-
de no abate de frangos, atingindo a marca
de 5,9 bilhões, além de ter contabilizado
42,3 milhões de suínos e 29,7 milhões de
cabeças de gado. Enquanto os estados da
Região Sul lideram na produção avícola e
suína, o Mato Grosso continua liderando
o ranking no abate de bovinos, seguido
de perto pelo Mato Grosso do Sul, Pará,
São Paulo e Goiás.
O grande crescimento do setor frigorí-
fico ao longo dos anos e seu importante
papel na economia do país impulsionou
sua modernização no que se refere à tec-
nologia e à automação, mas a realidade é
que a maior parte dos processos que leva
a proteína animal à mesa dos consumido-
res ainda conta com a mão de obra do tra-
balhador. Até o último levantamento da
RAIS para o ano de 2015, essa demanda
era realizada por 463.205 colaboradores,
espalhados pelos 4.303 estabelecimen- Fatores de riscos diversos podem comprometer a saúde dos trabalhadores

tos ativos dentro do território nacional. desses colaboradores está vigente des- dos nos frigoríficos, em geral, são per-
As atividades desenvolvidas por esses de 2013, mas a quantas será que anda meados por fatores de riscos diversos
trabalhadores durante o abate e proces- a implantação dessas exigências no dia que exercem grande influência no com-
samento de carnes, que em sua grande a dia dentro dos frigoríficos? E será que prometimento da saúde e segurança dos
maioria acontecem no mesmo local, vão elas têm sido capazes de neutralizar os trabalhadores.
desde o sacrífico do animal, a sangria, perigos desses ambientes, que englobam Para a tecnologista da Fundacentro
escaldagem e depenagem (no caso das uma série de riscos ocupacionais listados Maria Muccillo, que acompanha o tra-
aves), evisceração, cortes, desossa até a pelo Ministério do Trabalho? balho da Força-Tarefa de Adequação
embalagem e expedição do produto final. das Condições de Saúde e Segurança no
A regulamentação referente aos cuidados PERIGOS Trabalho em Frigoríficos realizada pelo
à saúde e segurança durante o trabalho Os ambientes de trabalho encontra- Ministério Público do Trabalho no Rio
Grande do Sul, a organização do trabalho
no setor chega a ser perversa, sob o co-
PRINCIPAIS AUTUAÇÕES mando de uma exigência exacerbada de
produção diária, frente aos parâmetros
Confira abaixo os 10 principais motivos sem dispositivos de parada de emergência;
científicos e legais dos aspectos psicofi-

de autuações nos frigoríficos brasileiros no Ausência de pausas psicofisioló-
ano de 2015, segundo dados do Sistema siológicos do ser humano. “O cenário é
gicas;
hostil pela presença de baixas tempera-


Federal de Inspeção do Trabalho:
Relatório anual do PCMSO sem

1º Ausência de dispositivo que possi- turas, umidade, repetitividade de movi-


dados da evolução clínica e epide-
bilite a abertura sem muito esforço mentos, cadência acelerada, exigência
miológica dos trabalhadores ou ausência de
das portas de câmaras frias pelo interior/ de esforço muscular intenso, ritmos cada
medidas administrativas/técnicas a serem
ausência de alarme ou outro dispositivo de adotadas na comprovação do nexo causal vez mais desumanos, mobiliários e postos
comunicação no interior de câmaras frias; entre as alterações detectadas nos exames de trabalho inadequados, máquinas ain-

2º Inexistência de mecanismos para a e a atividade exercida; da em desacordo com dispositivos pre-


detecção precoce de vazamentos Ausência de barras de apoio pa- vistos na NR 12, sistema elétrico às ve-
nos pontos críticos, acoplados a sistema ra os pés; zes deficitário, presença de amônia com


de alarme, quando da utilização de amônia; sistema de controle que em alguns casos
Materiais e produtos erguidos/ar-

3º Inexistência de no mínimo um as- mazenados/carregados de forma também apresenta defeitos, passível de


sento para cada três trabalhadores; frequente localizados próximos ao solo ou vazamentos e, para completar o cenário,

4º Ausência de chuveiros ou sprinklers acima dos ombros; a monotonia e fatores psicossociais sig-

10º
acima dos grandes vasos de amô- Ausência de rodízios de ativi- nificativos”, lista a técnica de Segurança
nia; dades. do Trabalho.

5º Trilhagem aérea, esteiras transpor- Paulo Barros de Oliveira, médico do


tadoras, roscas sem fim ou nórias Fonte: SFIT/2015 Trabalho que participou da primeira ten-
tativa de normatização das condições de

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trabalho para o setor em 2005, que partiu relata. Ele chegou a entrar em contato

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da então Comissão Nacional de Ergono- com os patrões do estabelecimento, que
mia do Ministério do Trabalho, e também se negaram a alterar seu modo de traba-
um dos membros pioneiros do grupo que lho, pois temiam que isso fosse afetar os
atuou na criação da NR 36, cita ainda a resultados da produção.
falta de autonomia e de reconhecimen- A partir daí, a entidade desencadeou
to dos trabalhadores de frigoríficos, que uma campanha em nível nacional, que
têm seu ritmo de trabalho imposto pela acabou não chamando a atenção dos ór-
máquina e, em sua grande maioria, não gãos públicos ligados às questões traba-
têm o seu serviço valorizado. “O especia- lhistas, conforme o esperado. Siderlei
lista em Medicina do Trabalho, psiquia- conta que essa foi a gota d’água que le-
tria e psicanálise Christophe Dejours já vou a Contac a realizar uma denúncia em
nos dizia há décadas que o sofrimento âmbito internacional. “Fizemos uma re-
mental tem relação, entre outros mo- vista em inglês em que denunciamos que
tivos, com falta de autonomia e de re- o frango que estava chegando na Europa
conhecimento. Quais frigoríficos estão causava mutilação nos trabalhadores bra-
atentos a este enfrentamento? Quem sileiros e o distribuímos na sede da OIT,
está trabalhando com a organização e a em Genebra, durante um encontro que
gestão do trabalho para mitigar os efei- reuniu representantes de 162 países”. A
tos destas agressões? ”, indaga. Confor- ação, que foi acompanhada pelo masco-
me ele, parte importante dos corpora- te da campanha, um homem vestido de
tivos ainda vê o investimento em SST frango empurrando um trabalhador em
como custo. uma cadeira de rodas, deu o que falar. A
iniciativa pode até ter gerado represálias
ESFORÇO inicialmente, mas fomentou a discussão
Setor lidera estatísticas de doenças do trabalho,
Antes de avaliar como as questões de que já existia no Brasil e que, mais tar-
saúde e segurança estão sendo tratadas de, gerou a NR 36 (Segurança e Saúde possível observar importantes melhorias
nos frigoríficos, o presidente da Contac no Trabalho em Empresas de Abate e nas condições de Saúde e Segurança do
CUT (Confederação Brasileira Democrá- Processamento de Carnes e Derivados), Trabalho nos estabelecimentos respon-
tica dos Trabalhadores nas Indústrias da publicada com a Portaria nº 555, em abril sáveis pelo abate e processamento de
Alimentação), Siderlei de Oliveira, per- de 2013. carne no país. “As empresas frigoríficas e
cebe a importância de relembrar a pri- suas representações investiram nos últi-
meira vez em que se chocou com os pe- INVESTIMENTOS mos anos dezenas de milhões de reais em
rigos trazidos pelo setor. “Há 15 anos eu Quatro anos mais tarde, todos os pra- prol da SST, proporcionando, por exem-
estava em cima de um palanque quando zos estabelecidos na norma para ade- plo, a adequação de inúmeros postos de
notei várias pessoas na plateia com fai- quação por parte dos empregadores já trabalho, inclusão de pausas durante as
xas brancas amarradas no braço. Des- se esgotaram e, de acordo com o consul- jornadas e investimentos para controle
cobri um diagnóstico em comum: pulso tor técnico da ABPA (Associação Brasi- dos fatores de risco”, relata. Segundo
aberto. Logo deduzi que aquela situação leira de Proteína Animal – entidade que ele, também foram realizados seminá-
só podia estar vinculada a alguma doença nasceu da junção da União Brasileira de rios, workshops, reuniões e cursos para
ocupacional. Mas o médico do Trabalho Avicultura e da Associação Brasileira da orientação de empregadores e seus ges-
da empregadora daqueles trabalhadores Indústria Produtora e Exportadora de tores quanto às medidas necessárias para
desconhecia esse diagnóstico como de- Carne Suína), Moacir Cerigueli, que tam- garantir um ambiente seguro e saudável.
sencadeado por atividade profissional. bém é representante dos empregadores Heiler Natali, procurador do Trabalho
Nem mesmo o Secretário de Saúde do na Comissão Nacional Tripartite Temá- e coordenador do projeto de Adequação
município tinha conhecimento do que tica responsável por acompanhar a im- das Condições de Saúde e Segurança no
eram as Lesões por Esforço Repetitivo”, plementação da NR 36 nos frigoríficos, é Trabalho em Frigoríficos em nível nacio-
nal, cuja iniciativa já ajuizou uma série de
ações civis públicas nos estados em que a
atividade frigorífica se faz mais presente,
concorda que a legislação trouxe enor-
mes avanços. Segundo ele, sua imple-
mentação, que antes era vista com maus
olhos por parte do segmento econômico,
hoje é encarada como uma oportunidade
para a efetivação de medidas capazes de
reduzir as taxas de absenteísmo e rotati-
vidade de mão de obra, ainda abundante
no setor. A adequação nos postos de tra-

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ação muito corriqueira no setor, segundo
a também auditora fiscal do Trabalho, é
a subnotificação. “Apesar das empresas
apresentarem um percentual elevado de
trabalhadores submetidos a ritmo de tra-
balho imposto e acentuado, expostos a es-
forços repetitivos e posturas inadequadas,
já com queixas importantes de dor osteo-
muscular e mesmo com afastamentos su-
cessivos de curta duração ou já afastados
junto ao INSS, recebendo auxílio-doença,
elas não reco­nhecem a natureza ocupa-
cional na maioria dos casos e deixam de
emitir a CAT (Comunicação de Acidente
de Trabalho)”, em descumprimento à Lei
nº 8.213/91.
Segundo a auditora fiscal do Trabalho
Renata Matsmoto, que atua no estado de
São Paulo, essa realidade pode ser per-
cebida nos números apresentados pela
Previdência Social em 2014, levando em
consideração os CNAEs mais represen-
tativos do setor: Abate de Reses, Exceto
Suínos (1011); Abate de Suínos, Aves e
Outros Pequenos Animais (1012); e Fa-
principalmente, osteomusculares
bricação de Produtos de Carne (1013). O
balho, segundo ele, tem acarretado a di- setor apresentou um total de 19.821 aci-
minuição de posturas inadequadas, além dentes, sendo que destes, 5.861 geraram
da adoção de assentos ergonômicos. “Em incapacidades com mais de 15 dias, 257
que pese tais avanços e ainda a previsão incapacidades permanentes e 30 óbitos.
expressa na própria NR 36 (item 36.14.6) Na Tabela da página 42, Estatísticas do
no sentido de que o ritmo imposto ao tra- setor, confira os números de acidentes
balho deve respeitar patamares seguros, de trabalho, incapacidades permanen-
o fato é que a ausência de previsão obje- tes e óbitos nos últimos cinco anos para
tiva destes patamares, de um modo geral, estes mesmos CNAEs. No somatório dos
havia levado os frigoríficos a deixar esta 670 CNAEs contabilizados, estes aciden-
questão de lado, também sob a equivo- tes representaram aproximadamente 3%
cada premissa de que a redução do rit- do total. “O que reflete as inadequadas
mo individual impactaria na redução do condições de trabalho de muitas empre-
volume de produção, o que normalmente sas do setor. Até setembro de 2016, já fo-
não tem sido constatado, dada a ampla ram notificados via CAT 11.142 acidentes,
possibilidade de adoção de alternativas sendo 26 fatais e 590 graves. Deste total,
que evitem que isso ocorra”, observa. 9.936 foram típicos, 492 foram doenças
ocupacionais e 984 foram acidentes de
ADOECIMENTOS trajeto”, informa.
Ainda assim, a médica do Trabalho June Embora a última reunião da Comissão
Rezende, membro da CNTT por parte do Nacional Tripartite Temática da NR 36
Governo, avalia que a situação encontrada em âmbito nacional tenha ocorrido em
nos frigoríficos permanece preocupante. 2015, o trabalho continua nos estados,
“O setor está liderando as primeiras po- muito por parte da fiscalização do Minis-
sições das estatísticas de adoecimento tério do Trabalho e do Ministério Público
no trabalho, principalmente em relação do Trabalho. Outra conquista foi o Anexo
ao adoecimento osteomuscular, além de 2 – Requisitos de Segurança Específicos
apresentar incidência importante de per- para Máquinas Utilizadas nas Indústrias
das auditivas, frequência elevada de aci- de Abate e Processamento de Carnes e
dentes com máquinas e equipamentos Derivados Destinados ao Consumo Hu-
e acidentes ampliados em decorrência mano, da NR 36, publicado pela Portaria
do vazamento de amônia em seus siste- n° 511/2016, fruto do trabalho de uma
mas de refrigeração”, afirma. Outra situ- subcomissão da CNTT.

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SST NOS FRIGORÍFICOS
Entre avanços e estagnação postos de trabalho que possibilitam a al-
ternância e ela não é feita, visto que a
produtividade em pé costuma ser maior.
Enquanto alguns itens da NR 36 são priorizados, outros são negligenciados “Também, as dimensões de vários pos-
tos de trabalho, especialmente onde são
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utilizadas facas (desossas, cortes, acaba-


mento) ainda são insuficientes para o mo-
vimento seguro do trabalhador, havendo
muita proximidade entre os colaborado-
res”. Por outro lado, ele tem notado que
a situação dos estrados utilizados para
adequar a altura do plano de trabalho e
as passarelas e plataformas para trabalho
em altura estão sendo aplicadas correta-
mente. Ainda assim, visitou estabeleci-
mentos em que as plataformas elevadas
não contavam com guarda-corpo e os tra-
balhadores que atuavam a mais de dois
metros de altura não utilizavam os EPIs
necessários.

CARGAS
O manuseio, levantamento e transporte
de produtos e cargas apresentam maiores
desafios nos frigoríficos de suínos e bovi-
Adequação dos postos de trabalho e alternância de postura ainda são desafios a serem vencidos nos. Conforme Mauro Muller, auditor fis-
Todo ambiente de trabalho sujeita seus com a base mostram-se imprescindíveis”, cal do Trabalho do RS e representante do
trabalhadores a algum tipo de risco, que avalia. Em relação aos mobiliários e postos governo na Comissão Nacional Tripartite
dependerá muito da atividade que o cola- de trabalho, por exemplo, em que a norma Temática, responsável por acompanhar
borador exerce e da indústria em que ele prevê alternância da posição do trabalha- a implantação da NR 36 nas empresas,
está inserido. Para extinguir ou ao menos dor de pé e sentada, sempre que possível, existe nessas atividades a exigência de
mitigá-los dentro dos frigoríficos, a Nor- ele afirma ter encontrado problemas para posturas de torção do tronco e de flexão
ma Regulamentadora 36 passou a vigorar uma aplicação adequada. “Às vezes nem irregular da coluna (abaixamento). “Ela
em 2013. Ao todo, ela conta com 16 itens mesmo os assentos são preparados para ocorre na deposição das caixas ou em-
e 216 subitens, além do anexo publicado as baixas temperaturas dos frigoríficos, balagens de produtos na altura do chão,
em 2016, que pretende padronizar e regu- sendo ainda de inox puro”, conta. produtos com peso muito acima de 20kg,
larizar as máquinas utilizadas nas indús- Em Minas Gerais, a situação é pareci- como sacos de 50kg ou carcaças de 100kg
trias de abate e processamento de carnes da. Conforme o auditor fiscal do Traba- sendo suportadas manualmente pelo tra-
e derivados. Grande parte da redação da lho Francisco Reis, ainda existem vários balhador. Também durante o levantamen-
norma busca combater a preocupante in-
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cidência das Lesões por Esforço Repeti-


tivo e Doenças Ocupacionais Relaciona-
das ao Trabalho (LER/DORT), que ainda
assombram os colaboradores do setor.
Segundo o que tem presenciado o au-
ditor fiscal do Trabalho Bruno Sales, que
participa de fiscalizações em frigoríficos
do Mato Grosso do Sul, as questões er-
gonômicas são justamente o ponto mais
sensível para empresas que, no seu en-
tendimento, demonstram pouco empe-
nho em fazer mudanças. “Tudo o que diz
respeito à ergonomia ainda tem tramitado
muito devagar nos frigoríficos e de forma
bastante precária e incompleta. Nessa se-
ara, em verdade, parece-me necessária
uma efetiva reconstrução e absorção da
importância desse tema por parte da alta
direção dos frigoríficos. Canais de diálogo Manuseio, levantamento e transporte podem ocasionar torção do tronco e flexão irregular da coluna

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to de cargas acima da altura do ombro do nar jamais poderá produzir um diagnós-

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colaborador e na movimentação manual tico interdisciplinar”, pontua o médico
de cargas acima dos limites recomenda- do Trabalho.
dos para jornada de oito horas, em que o Também são as AETs que avaliarão a
máximo é de 10 mil quilos por trabalha- adaptação das condições de trabalho às
dor”, explica. Uma das soluções que ele características psicofisiológicas dos tra-
tem visto em vários estabelecimentos para balhadores e subsidiarão as demais me-
evitar essa exposição é a utilização de pa- didas e adequações necessárias, confor-
leteiras elétricas ou empilhadeiras para o me previsto na NR 17. O auditor fiscal do
transporte de cargas com mais de 500kg. Trabalho da SRTE/MT José Almeida de
Para avaliar a compatibilidade do es- Jesus conta que chegou a visitar estabe-
forço físico dos trabalhadores com a sua lecimentos no Mato Grosso que nem se-
capacidade de força é essencial que o quer possuíam o documento. Outros ti-
empregador elabore uma Análise Ergonô- nham um parecer ergonômico incorreto,
mica do Trabalho. O problema, segundo que nada ajudava a melhorar a situação
o médico do Trabalho e AFT aposenta- dos trabalhadores.
do Paulo Barros de Oliveira, desde 2005
envolvido com a prevenção neste setor, MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS
é a grande quantidade de AETs (Análises Na recepção e descarga de animais nos Medidas de proteção para serra fita estão em discussão
Ergonômicas do Trabalho) fracas, sem frigoríficos, Muller ainda percebe a neces- rança Específicos para Máquinas Utiliza-
qualificação, que se encontra diariamen- sidade de se limitar o tempo de trabalho das nas Indústrias de Abate e Processa-
te nos frigoríficos. Para ele, falta aos em- de cada funcionário durante a jornada mento de Carnes e Derivados Destinados
pregadores entenderem que contratar o no descarregamento manual das caixas ao Consumo Humano, da NR 36, o AFT
serviço de corpo técnico e consultoria de frango, para evitar a fadiga e a exaus- percebe avanços nessa área. “No novo
com menor preço também significa con- tão. No caso da carne bovina e suína, ele anexo conseguimos regulamentar três ti-
tratação de menor qualidade. “Com isso, percebe a necessidade de cobertura das pos de máquinas para o setor frigorífico:
não estou afirmando que o preço caro áreas externas de trabalho, visando a pro- a máquina automática para descourear e
resulte necessariamente em trabalho de teção dos trabalhadores das intempéries. retirar pele e película, a máquina aberta
qualidade, mas certamente um preço que Coordenador da subcomissão respon- para descourear a pele e a membrana e
sequer pagaria um trabalho interdiscipli- sável pelo Anexo 2 – Requisitos de Segu- a máquina de repasse de moela”, conta.
O procurador do Trabalho e coordena-
dor do projeto de Adequação das Condi-
OS PERIGOS DA AMÔNIA ções de Saúde e Segurança no Trabalho
Um dos riscos que ultrapassa os muros balhadores nas Indústrias da Alimentação), em Frigoríficos em nível nacional, Heiler
dos frigoríficos, podendo também causar Siderlei de Oliveira, representante dos tra- Natali, também percebe progressos. “Tem
problemas para os moradores do entorno, balhadores na CNTT, esse é um dos maio- sido cada vez mais comum constatar in
é a amônia, um produto químico perigoso, res problemas do setor. “Cada vez mais fi- loco a adequação de máquinas e equipa-
corrosivo para a pele, olhos, vias aéreas su- camos sabendo de vazamentos de amônia mentos aos preceitos da NR 12, evitando
periores e pulmões, que pode levar à morte nos frigoríficos, com muitos trabalhadores assim uma série de interdições que antes
e é utilizado no sistema de refrigeração dos atingidos. O que acontece é que estabele- eram rotineiras”, relata. Em contrapon-
frigoríficos. Frente ao importante risco, a NR cimentos velhos estão sendo comprados
to, o AFT Francisco Reis garante que é
36 instituiu uma série de medidas para pre- pelas grandes empresas, mas elas não re-
comum empresas que instalam as prote-
venir o vazamento de amônia, ou controlá- novam as tubulações”, pondera. Segundo
lo, caso aconteça. Mas, de acordo com o ele, o agente também é abortivo e, nesse
ções adequadas somente durante a ação
auditor fiscal do Trabalho Mauro Muller, que caso, basta as gestantes aspirarem uma fiscal. “Muitas vezes, a empresa mantém
também faz parte da bancada do Governo quantidade pequena. as máquinas desprotegidas, pois algumas
na Comissão Nacional Tripartite Temática Como solução, o procurador do Trabalho destas proteções implicam em perda de
responsável por acompanhar a implementa- do Rio Grande do Sul, Ricardo Garcia, cita produtividade”, revela.
ção da NR 36 nas empresas, pouco se tem a substituição da amônia pelo etileno glicol, Embora entenda que a ideia central da
evoluído nesse sentido. “Não encontramos que não teria nenhuma agressividade à saú- NR 12 é proteger as zonas de risco das
quase nenhuma medida implantada em re- de dos trabalhadores. “Em uma planta nova máquinas, para o consultor técnico da
lação ao sistema de monitoramento de va- no município de Seberi/RS eles já utilizam o ABPA (Associação Brasileira de Proteína
zamento de amônia, destacando-se a falta glicol. Mas existem outras opções”, afirma.
Animal) Moacir Cerigueli, representante
de sensores de detecção de vazamentos, Para ele, a forma mais adequada de sanar
dos empregadores na CNTT da NR 36, es-
bem como a inexistência de painel de con- o risco seria a proibição do uso de amônia
trole, previstos na norma”, revela. nos estabelecimentos e a introdução de
ta premissa da norma se tornou imprati-
outras opções, que deveriam constar na cável para diversos setores dos frigorífi-
SUBSTITUIÇÃO NR 36. “Claro que essa é uma modificação cos. “Um exemplo clássico é a máquina de
Para o presidente da Contac CUT (Con- que exige investimentos e um longo prazo, serra fita, muito comum nos frigoríficos
federação Brasileira Democrática dos Tra- mas é uma tendência necessária”, conclui. e açougues brasileiros. A NR 12, inicial-
mente, simplesmente impediu o uso des-

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e ferramentas disponibilizados para os volvimento das LER/DORTs nos colabora-
colaboradores do setor, o AFT notou que dores que realizam a desossa de frango,
a maioria dos estabelecimentos tem con- por exemplo, que chegam a realizar de
seguido manter um sistema de afiação e 80 a 120 movimentos por minuto, quase
troca das facas, o que diminui os esforços quatro vezes mais do que o recomendado.
dos trabalhadores nas tarefas de corte. “A pausa faz com que o desgaste causado
Ainda assim, considera um desafio estu- pela repetição seja combatido pelo orga-
dar, testar e implantar ferramentas es- nismo, visto que permite a recomposição
pecíficas e adequadas às atividades, que dos fluídos que lubrificam as articulações.
não obriguem o trabalhador a fazer uso Ainda há uma certa instabilidade, lugares
excessivo de força, pressão, preensão, que suprimem as pausas, situações que
flexão, extensão ou torção dos segmen- precisam ser resolvidas, mas todos os fri-
tos corporais. goríficos têm adotado a medida”, explica.
De acordo com ele, o ideal mesmo é que
PAUSAS a cada 50 minutos de esforço repetitivo,
Uma das exigências da NR 36 que mais o trabalhador pare de oito a 10 minutos
tem tido sucesso quanto a sua implanta- para que o líquido sinovial volte a ser pro-
ção na rotina dos frigoríficos no país, se- duzido. O que, na norma, só está previsto
na subcomissão da NR 36 gundo a maioria dos entrevistados desta em jornadas que ultrapassem 9h58min,
ta máquina, que passou a ser interditada reportagem, são as pausas psicofisiológi- excluído o tempo de troca de uniforme e
junto com outras que possuem caracterís- cas, previstas para os trabalhadores que de deslocamento até o setor de trabalho.
ticas similares na Região Sul, sendo que desenvolvem atividades diretamente no Segundo Reis, as pausas psicofisioló-
em muitos outros estados o seu uso era processo produtivo, ou seja, desde a re- gicas foram um grande avanço trazido
permitido sem problemas”, critica. cepção até a expedição, setores em que pela norma. “Antes as jornadas de traba-
Justamente as medidas de proteção são exigidas repetitividade e/ou sobrecar- lho eram contínuas em grande parte dos
para a máquina serra fita estão sendo ga muscular estática ou dinâmica do pes- frigoríficos e o empregado não tinha um
discutidas pela subcomissão da NR 36 e, coço, ombros, dorso e membros superio- repouso muscular durante a jornada, au-
segundo Muller, ela será acrescentada na res e inferiores. Conforme o procurador mentando muito a possibilidade de lesão
norma assim que for concluída a discus- do Trabalho do RS, Ricardo Garcia, essa osteomuscular”. Pelo que pode observar
são tripartite. Quanto aos equipamentos medida é essencial para prevenir o desen- o AFT, a obrigatoriedade das pausas foi

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SST NOS FRIGORÍFICOS

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SST NOS FRIGORÍFICOS
O representante dos trabalhadores na Para um controle eficaz de todos esses

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CNNT lembra ainda do frio intenso a riscos, é essencial que as empresas im-
que os colaboradores têm de conviver, plantem um sistema de gestão de SST,
visto que a maior parte dos estabeleci- que seja integrado aos níveis gerenciais
mentos é mantida entre 10 e 12 graus, e com a participação dos trabalhadores.
já tendo visto algumas inclusive a 20 Frente a isso, o AFT Francisco Reis per-
graus negativos, ou calor, em pontos cebe uma grande dificuldade de integra-
específicos como a escaldagem; o ris- ção das empresas. “O maior problema
co químico oferecido principalmente talvez seja o fato da equipe de Saúde e
pela amônia que é utilizada no sistema Segurança dos frigoríficos ainda não ser
de refrigeração dos frigoríficos (Leia parte integrante da equipe de gestão da
mais no box Os perigos da amônia, na empresa, não tendo poder de decisão.
página 46); e os riscos biológicos pelo Médicos, engenheiros, ergonomistas,
contato com animais antes de serem também costumam desenvolver seu tra-
considerados livres de contaminação balho de forma compartimentada, sem
por bactéria, no começo do processo um trabalho conjunto e convergente”,
produtivo dos frigoríficos, e que po- avalia. Realidade essa que pode ser per-
dem causar as chamadas zoonoses. cebida, segundo o AFT José de Almeida,
“Também precisamos considerar a do Mato Grosso, pela falta de CAT, exem-
grande incidência das LER/DORTs e plo do descaso das empregadoras. “Che-
dos transtornos psíquicos, como de- guei a fiscalizar um frigorífico em que o
pressão, síndrome do pânico e ansie- responsável simplesmente pegou o PPRA
dade, que, juntos somam mais de 85% de um ano e colocou no outro, sem fazer
das doenças relacionadas ao trabalho um monitoramento. Há uma necessidade
vistas nos frigoríficos. Além dos aci- de gerenciamento de riscos e até de uma
Pausa e rodízio: urgência na adoção dentes mecânicos, em que as quedas cultura de gestão de risco ocupacional vi-
bem aceita até pelas empresas, que não são as mais comuns”, informa. sando a eliminação”, destaca.
adotavam medidas concretas diante do
grande número de empregados afasta-
dos e doentes.
Contudo, Garcia observa uma situação
Boas práticas reconhecidas
um pouco diferente em relação ao rodízio Iniciativas têm colaborado para melhoria dos ambientes
de atividades durante a jornada de traba-
lho. “Excepcionalmente, uma ou outra Sem dúvida, a publicação da NR 36 foi tali, os frutos mais visíveis destas ações
empresa faz o rodízio, mas é mais com- um passo importante rumo à efetivação foram a aprovação da Súmula do Tribu-
plexo que isso. O rodízio tem que ser feito de melhores condições de segurança e nal Superior do Trabalho de nº 438, pu-
de forma que o trabalhador saia de uma saúde para os funcionários de frigorí- blicada em 2012, que implantou o inter-
atividade que ofereça determinado risco ficos brasileiros, mas o avanço de fato valo para recuperação térmica do empre-
para outra em que este esteja ausente. precisa ser visto no dia a dia de trabalho gado submetido a trabalho contínuo em
Por exemplo, alguém que está cortando dos estabelecimentos. Para garantir que ambiente artificialmente frio, e, no ano
frango, com forte repetição dos membros isso aconteça, diversas iniciativas públi- seguinte, a NR 36. “Tornar visível o adoe-
superiores, durante duas horas, deveria cas foram elaboradas. Boas práticas das cimento decorrente da sujeição a um rit-
exercer função que não exigisse repeti- empresas também têm sido evidenciadas mo de trabalho incompatível com a con-
ção pelas duas horas seguintes”, explica. durante as fiscalizações. dição humana, sob jornadas medievais e
Em âmbito nacional, o Projeto Nacio- em bancadas e postos de trabalho total-
GERENCIAMENTO DE RISCOS nal de Adequações das Condições de mente inadequados despertou o senso
A exposição a ruído, que além de seus Trabalho em Frigoríficos foi criado em comum para a necessidade de se discu-
efeitos auditivos, apresenta os efeitos ex- 2011 pelo Ministério Público do Traba- tir o tema com profundidade”, justifica.
tra auditivos, tais como, elevação de ní- lho visando contribuir para a diminuição Desde então, uma série de ações civis
vel de estresse, maior tensão muscular das doenças ocupacionais e acidentes de públicas foram ajuizadas e adequações
e hipertensão arterial, ainda é um obs- trabalho no setor de abate e processa- foram feitas. Segundo ele, esse resultado
táculo nos frigoríficos. Conforme expli- mento de carnes, por meio de inspeções, se deu também por meio de audiências
ca o médico do Trabalho da Contac CUT Termos de Ajustamento de Conduta e públicas e inúmeras reuniões de trabalho
(Confederação Brasileira Democrática desenvolvimento de ações preventivas, com a representação dos trabalhadores, a
dos Trabalhadores nas Indústrias da Ali- repressivas e pedagógicas voltadas para Contac (Confederação Brasileira Demo-
mentação) Roberto Ruiz, a nória, aquela a regularização das questões trabalhistas crática dos Trabalhadores nas Indústrias
linha de produção aérea onde a carne do no setor de frigoríficos. da Alimentação) e a ABPA (Associação
animal é pendurada, é um dos processos Conforme o coordenador dessa inicia- Brasileira de Proteína Animal), que de-
que mais expõe o trabalhador ao barulho. tiva, o procurador do Trabalho Heiler Na- senvolveram projetos próprios para a

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Trabalho do Estado de São Paulo, Renata
ACERVO FIEMG

Matsmoto. Segundo ela, a SRTE/SP reali-


zou nos últimos anos, desde a publicação
da NR 36, em 2013, 188 fiscalizações no
setor frigorífico que emprega hoje mais de
61 mil trabalhadores somente no Estado
de SP, ainda que a falta de profissionais
dificulte a atuação.
No Paraná, são mais de 90 mil funcio-
nários no setor, atuando em sua maioria
em frigoríficos de abate de frangos, onde o
trabalho também tem sido árduo, confor-
me a AFT June Rezende. “Nestas fiscaliza-
ções foram interditadas muitas máquinas
e equipamentos por estarem em situação
de iminente risco de acidentes, além de
algumas atividades de trabalho interdita-
das em função de risco de adoecimento.
Não há dúvida de que nosso trabalho me-
lhorou muito após a Norma Regulamenta-
dora 36, que foi somada ao investimento
Juntamente com outras entidades, a ABPA se empenha na capacitação das empresas e trabalhadores
do Ministério do Trabalho na capacitação
capacitação dos gestores das empresas tadual, que se faz ainda mais necessária de auditores fiscais para atuarem em fri-
e dos trabalhadores. com a atitude reativa da maioria das em- goríficos”, constata.
presas. “Infelizmente observamos que os Roberto Mendes, AFT que atua em
FISCALIZAÇÃO empregadores, muitas vezes, esperam a Goiás, afirma que não tem visto grandes
Em parceria com o MPT, a Auditoria fiscalização para daí providenciarem a re- melhorias no setor de frigoríficos, visto
Fiscal do Trabalho, por sua vez, tem de- gularização do ambiente de trabalho. Es- que, segundo ele, a política de pouco in-
sempenhado um papel muito importante te comportamento das empresas deveria vestimento na área de Saúde e Seguran-
na adequação dos frigoríficos em nível es- ser revisto”, pondera a auditora fiscal do ça do Trabalho ainda impera. “Inspecio-

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SST NOS FRIGORÍFICOS
CARNE & OSSO
Produção brasileira que ganhou diversos a mão amarrada na cama de tanta dor que
prêmios, denunciando a realidade de traba- sentia”, descreve outra trabalhadora do se-
lho nos frigoríficos do país para o mundo, o tor, igualmente impossibilitada de trabalhar.
documentário Carne & Osso foi lançado em Conforme o jornalista Carlos Juliano Bar-
2011. Na época, os jornalistas da ONG Re- ros, um dos diretores do documentário, toda
pórter Brasil visitaram diversas empresas, a equipe que participou do projeto fez uma
flagrando histórias como a da Valdirene, vasta pesquisa antes das gravações para
que trabalhou 11 anos no abate de frangos, se inteirar sobre o trabalho nos frigoríficos,
principalmente no setor de desossa, e teve mas nada que a preparasse para o que es-
os nervos do braço atrofiados, inutilizando tava por presenciar. “Os colaboradores tra-
o seu uso. “Eu trabalhei 11 anos e nunca balham em uma velocidade muito elevada,
coloquei um atestado para levar um filho no um ritmo muito intenso. Na época não havia
médico. Mesmo assim, quando ia na enfer- pausas, isso veio a acontecer depois, com
maria e dizia que estava com dor, eles não a NR 36. E no caso dos bovinos, a gente
acreditavam. Fui adoecendo, adoecendo, sentia ali também, muitas vezes, ambien-
até que eu não aguentei mais”, conta. Mes- tes completamente insalubres, os traba-
mo doente, ela teve que se demitir e hoje lhadores lidando diretamente com sangue
toma doses diárias de morfina para ameni- de animais, sem qualquer tipo de proteção.
zar o sofrimento. Enfim, a constatação em campo foi bastan-
Outra realidade relatada no filme foi a do te impactante”, relembra.
“Doutor Diclofenaco”, médico do Trabalho da O documentário completo está disponível
empresa que receitava o remédio para todos online. Para mais informações acesse o site
que se queixassem. “Precisava dormir com http://carneosso.reporterbrasil.org.br.

namos a maioria dos grandes e médios de trabalho. Essas adequações variam de


frigoríficos e alguns pequenos no esta- acordo com a disponibilidade da empresa
do. Em todos os casos foram aplicadas em investir nestas questões. Em alguns
dezenas de autos de infração”, observa. casos, realizamos apenas o treinamen-
Nesses casos, sempre um relatório das to dos trabalhadores para uma redução
fiscalizações é enviado ao MPT, que to- significativa dos riscos envolvidos”, ex-
mará as providências necessárias no sen- plica Diogo dos Reis, um dos pesquisa-
tido de coibir a continuidade das práticas dores do projeto.
infracionais, seja por meio da assinatura Como exemplo, ele cita a adequação
de um TAC ou Ação Civil Pública. do ritmo de trabalho firmado com um
frigorífico de SC. No setor de rependu-
GESTÃO ERGONÔMICA ra do frango resfriado, os trabalhadores
Um projeto desenvolvido na Universi- penduravam em média 21,4 frangos por
dade Federal de Santa Catarina também minuto, somando 56 ações técnicas e 23
tem contribuído para a implementação pontos no check list OCRA, que quanti-
de boas práticas nas empresas. Intitulado fica os riscos associados aos movimen-
“Sistema Integrado de Gestão Ergonômi- tos repetitivos dos membros superiores,
ca e Vigilância em Saúde em Empresas sendo esta atividade considerada de al-
de Abate e Processamento de Carnes”, o to risco, com estimativa de que 22% dos
programa consiste inicialmente no levan- trabalhadores desenvolveriam distúrbios
tamento e análise de dados das condições osteomusculares. “O acordo prevê que
de trabalho nas unidades produtivas do até setembro de 2018, a empresa deve
setor. Primeiramente os pesquisadores adequar o ritmo para 12 frangos por mi-
da universidade acompanham os agentes nuto e 35 ações técnicas, o que equiva-
públicos de fiscalização em suas visitas e le a 13 pontos no check list OCRA, com
avaliam o trabalho desenvolvido. Depois estimativa de ocorrência de patologias
esses resultados são apresentados aos para aproximadamente 10% dos traba-
auditores fiscais do Trabalho e aos re- lhadores expostos”, conforme Diogo. Em
presentantes das empresas, juntamente paralelo, o grupo também está desenvol-
com propostas de melhoria. “Já coleta- vendo pesquisas para o estabelecimento
mos e analisamos dados em pelo menos de parâmetros técnicos mais objetivos
30 frigoríficos do país e em todos eles fo- para avaliação da insalubridade por frio.
ram implementadas melhorias, incluindo
medidas organizacionais das atividades CAPACITAÇÕES

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A Associação Brasileira de Proteína cialmente ao setor frigorífico, são ofere- busca por melhorias e a tendência de se
Animal (entidade que nasceu da jun- cidos seminários para formação dos tra- atingir um viés mais prevencionista no
ção da União Brasileira de Avicultura balhadores quanto às diretrizes da NR futuro. “É um ponto de partida, um ca-
e da Associação Brasileira da Indústria 36. Em nível nacional, a entidade realiza minho, uma grande via a percorrer, mas
Produtora e Exportadora de Carne Su- encontros com representantes dos 27 es- com passos consistentes sendo dados”,
ína), em parceria com a ABIEC (Asso- tados. Depois, cada um deles promove a conclui Sales.
ciação Brasileira das Indústrias Expor- capacitação para os coordenadores dos Tendo sido, sem dúvida, um grande ga-
tadoras de Carnes) e outras entidades, sindicatos e estes trabalharão com os co- nho para o setor de frigoríficos, a NR 36
tem desenvolvido diversos seminários e laboradores na base. “Por isso é impor- conseguiu abordar boa parte dos riscos e,
workshops para seus associados, fomen- tante que o trabalhador conheça o seu nesses últimos quatro anos, as empresas
tando a conscientização das empresas e sindicato”, salienta o presidente da en- têm se movimentado a caminho da ade-
a implantação de novas soluções em prol tidade, Siderlei de Oliveira, coordenador quação. O maior problema, segundo os
das melhorias dos ambientes laborais nos da bancada dos trabalhadores na CNTT. profissionais que acompanham o dia a dia
frigoríficos. De acordo com o consultor dos estabelecimentos de abate e proces-
técnico da ABPA, Moacir Cerigueli, que APOSTAS samento de carnes, é que o ritmo dessa
também representa os empregadores na Em âmbito privado, Paulo Barros de caminhada ainda é muito lento e guiado
Comissão Nacional Tripartite Temática Oliveira, médico do Trabalho e auditor apenas pelas ações da fiscalização. Le-
da NR 36, para esse ano estão programa- fiscal aposentado, lembra a implantação vando em consideração o déficit de au-
dos nove seminários de SST, que já estão de um processo automatizado de alimen- ditores fiscais do Trabalho encontrado
acontecendo em diversas cidades brasi- tação de caldeira por toras de madeira no no país, ainda pode-se esperar que mui-
leiras. “Destaco ainda, a constituição de frigorífico Pampeano, do Grupo Marfrig. tos trabalhadores adoeçam nesse pro-
programas de capacitação e treinamen- A mudança interferiu positivamente na cesso de implantação de medidas para
to, como a série 100% Seguro, que traz diminuição do cansaço e sofrimento dos um ambiente de trabalho mais seguro e
vídeos exclusivamente produzidos para a trabalhadores. saudável. Sem contar os que ficam com-
indústria frigorífica do Brasil, feitos pela O auditor fiscal do Trabalho Bruno Sa- pletamente incapacitados ou até perdem
ABPA, ABIEC e SESI. Ao todo são 50 pro- les, com atuação no Mato Grosso do Sul, a vida devido aos perigos que permeiam
grametes com legendas em português, destaca também uma iniciativa da JBS, os frigoríficos.
inglês e espanhol, em linguagem simples que constituiu uma equipe própria espe- É essencial que órgãos públicos e enti-
direta e de fácil entendimento, que tra- cializada e voltada à resolução das ques- dades de trabalhadores e empregadores
tam de questões variadas sobre a Saúde e tões de SST. “Esse grupo visita rotineira- se unam para exigir e contribuir no pro-
Segurança no Trabalho nos frigoríficos”. mente as diversas unidades espalhadas cesso de melhoria das empresas, apoian-
Essa produção está disponível em www. pelo país e apresenta as providências do e divulgando também aquelas que já
sesi.org.br/cemporcentoseguro . que deram certo em outras localidades estão fazendo um bom trabalho. O que se
A Contac CUT (Confederação Brasi- àquelas que ainda estão com problemas espera, nesse caso, é que o ditado popular
leira Democrática dos Trabalhadores nas relevantes. Desse modo, procura replicar se cumpra e que a união faça a força, tra-
Indústrias da Alimentação), também tem soluções e tornar permanente sua gestão ga modificações e melhore as condições
se comprometido com a qualificação pro- ambiental ocupacional”, destaca. Embora de todos esses colaboradores que se de-
fissional. Dentro do projeto 'Da Terra ao ainda perceba a prevalência de um cará- dicam ao setor que é hoje um dos maiores
Prato', em uma vertente voltada espe- ter corretivo, o AFT afirma ser visível a atores da economia nacional.

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