de fato ou apenas estão sendo mais divul- 11/9, em que os EUA facilitaram créditos para
gadas pela mídia? a luta contra o terrorismo, todos encontraram
héctor luis saint pierre O conceito de ”ter- terroristas no seu próprio quintal. Assim, o pre-
rorismo” é um dos mais usados por políticos sidente da Colômbia Uribe mudou o apelativo
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© Wilson Dias/ABr
governos para paralisar a oposição, o que não ramente terroristas.
torna terroristas nem esses exércitos nem es-
ses governos.
Não há critério objetivo para determinar que Hoje se publicitam muitos atos como sendo
Acima, cerca de 18 mil grupo é terrorista e qual não. O único critério terroristas sem discutir sequer se realmente são
militantes participam da
marcha de encerramento
é o de pertença à lista de grupos terroristas, terroristas e em função do que o são
do 5.º Congresso assim, terrorista será todo grupo incluído nessa
do Movimento dos lista. Mas quem define que grupos pertencem
Trabalhadores Rurais
Sem Terra (MST), a essa lista? Com que critérios? São critérios sérgio luiz cruz aguilar Se tratarmos pura-
Brasília, 14 de junho de definicionais do tipo “gênero próximo e dife- mente de “ações terroristas” a resposta é sim
2007.
rença específica” ou meramente políticos? Se – as ações terroristas cresceram nesse início
Ao lado, chegada de 23 são políticos obedecem ao capricho de quem? de século XXI. Mas a questão principal tal-
supostos colaboradores
de narcoterrorismo à Note-se que o grupo comandado por Bin vez seja, elas são praticadas como meio de
cidade de Lima, que Laden, considerado num momento “Guerreiros ação ou como um fim em si mesmas? Nesse
foram presos na VRAEM.
da Liberdade” pelos Estados Unidos, noutro caso teríamos que partir de um conceito de
momento passou a ser considerado “terrorista”, consenso sobre terrorismo para analisar os
muito embora mantivesse o mesmo ordena- inúmeros grupos existentes atualmente que
mento ideológico e táticas operacionais. Assim, utilizam a violência como forma de alcançar
hoje se publicitam muitos atos como sendo seus objetivos.
terroristas sem discutir sequer se realmente Aí temos o primeiro problema, a falta de
© Galeria del Ministerio de Defensa del Perú / Flickr
são terroristas e em função do que o são. consenso sobre o que é “terrorismo”. Surgido
O próprio Estado Islâmico, que cometeu no final do século XVIII, o termo se relacio-
abomináveis “atos terroristas”, hoje combate nava com o período em que a França esteve
com características convencionais: ocupação governada pelos jacobinos (agosto de 1792 –
de território, uniformes e bandeiras, arma- julho de 1794) e, consequentemente, com o
mento convencional, controla a lei e a ordem terrorismo de Estado. No entanto, a origem
nesse território... do termo já apresentava características co-
Suas práticas são inaceitáveis, mas de que muns ao entendimento atual: o “terrorismo”
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armado que desafia esses Estados por con-
ta da formação de um “contra-Estado”. Esse
“contra-Estado” seria construído sob as leis e
valores islâmicos – no caso do Boko Haram,
Al Shabaab e EI – ou sob a cultura e os va-
Bombardeamento
Islamabad Marriott era organizado, deliberado, sistemático e seu Hoje ainda há dificuldade de um consenso lores tuaregues que têm sido reprimidos por Mas, quando governos denominam esses Um militante do Estado
Islâmico carregando a
Hotel. Cerca de 35.000 objetivo e justificativa eram a criação de uma sobre o termo. Desde de 1996 discute-se na sucessivos governos no Mali. grupos simplesmente como “terroristas”, ou bandeira do grupo.
paquistaneses morreram
em ataques terroristas
“sociedade nova e melhor”. ONU uma resolução que conceitue terroris- Com base nesses exemplos, e em vários como “bandidos terroristas” como ouvi bas-
nos últimos anos. A partir daí, o termo foi associado a grupos mo, sem sucesso. Nos Estados Unidos, talvez outros com a Líbia e o Iêmen, pode-se afir- tante em um evento na África que tratou do
organizados que lutavam contra governos au- o país mais interessado em estabelecer meca- mar que esses grupos surgiram e cresceram terrorismo naquele continente ano passado,
toritários, como o Narodnaya Volya na Rússia nismos de prevenção e combate ao terrorismo, em países com graves problemas sociais, po- praticamente se excluem as outras questões,
– Vontade do Povo, em russo (fim do século diversos departamentos e agências apresentam líticos, econômicos e de segurança. Já a Al- focando apenas no combate mediante a uti-
XIX), a grupos nacionalistas como o Mlada definições próprias. -Qaeda deixou de utilizar o terrorismo como lização do aparato de segurança estatal, ou
Bosna – Jovem Bósnia, em servo-croata (iní- No entanto, mesmo com a falta de con- um meio de ação, passando a utilizá-lo como coletivo como no caso do Al Shabaab, que é
cio do século XX), retornou ao terrorismo de senso, há alguns pontos comuns na maior lógica, ou seja, o terror se converteu no obje- combatido pelas tropas da Missão da União
Estado com o nazismo, o fascismo e o socialis- parte dos conceitos: o uso ilegal ou ameaça tivo do grupo. Africana na Somália (AMISOM), do Boko
do uso da violência; civis ou propriedades co- Assim, o combate à Al-Qaeda se dá basi- Haram, contra o qual foi formada a Força
mo alvos; propósitos políticos dirigidos a uma camente usando o aparato de segurança dos Tarefa Conjunta Multinacional (Benin, Ca-
Hoje ainda há dificuldade de um consenso instituição (Estado, organização) de modo a Estados. No caso dos demais, se os conside- marões, Chade, Níger e Nigéria), e do EI,
sobre o termo. Desde 1996 discute-se na ONU uma compelir seus agentes a agir ou abster-se de rarmos insurgentes, as medidas militares e que é combatido pela coalisão internacional
resolução que conceitue terrorismo, sem sucesso agir de determinada forma; e provocação ou policiais deveriam vir acompanhadas de ações liderada pelos Estados Unidos, além da Rússia
manutenção de um estado de terror em uma nos outros campos – social, político, econômi- e de grupos locais.
população ou em um setor dela. co, etc. – que atuem nas causas do surgimento
mo soviético, para ser associado aos grupos de Dessa forma, poucos países como os Es- e crescimento desses grupos. uc Existe uma tendência mundial de amplia-
libertação nacional a partir da década de 1950 tados Unidos da América (EUA), de maneira Caso isso não aconteça, mesmo que esses ção ou recrudescimento de ações terro-
e, posteriormente, a grupos religiosos funda- unilateral, declaram determinados grupos co- grupos sejam derrotados militarmente, eles ristas? Onde? Por quais motivos?
mentalistas nas últimas décadas do século XX. mo terroristas. A lista divulgada em 2016 pelo não desaparecerão. Podem até trocar de no- héctor luis saint pierre A ampliação das ações
Para complicar ainda mais a questão, na Bureau de Contraterrorismo do Departamen- me, como normalmente acontece, mas parte terroristas leva à perda da sua eficácia, por is-
década de 1990 foi associado ao narcotráfico, to de Estado norte-americano, por exemplo, de seus militantes continuarão propensos a so acredito que elas continuarão a acontecer,
surgindo o termo “narcoterrorismo”. Dessa for- apresentou 59 grupos terroristas no mundo. usar a violência em prol de seus objetivos. mas de maneira mais precisa, espetacular e
ma, o termo “terrorismo” mudou de significado Isso gera um problema. Talvez aí esteja a explicação de por que es- surpreendente. As ações terroristas não têm
para acomodar vernáculos políticos e diferentes Uma coisa é atuar contra um grupo que se fenômeno tem crescido e se espalhado por eficácia em campos de batalha, mas em cida-
discursos em diferentes contextos e épocas. utiliza o terrorismo como “método de ação” várias regiões do globo. des totalmente alheias ao terror, o que satisfaz
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OS ENTREVISTADOS
Héctor Luis Saint Pierre
Licenciado em Filosofia pela Universidad Nacional de La Plata,
Argentina, realizou mestrado em Lógica, Epistemologia e Filosofia da
Ciência pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) em 1988.
Na mesma universidade concluiu o doutorado em Filosofia Política em
1996 e o pós-doutorado FAPESP/Universidade Autónoma de México
em 1999. Defendeu sua Livre-docência na Universidade Estadual
Paulista Júlio de Mesquita Filho, em 2002, com tese sobre “Formas
contemporâneas da violência Política”. Realizou seu Concurso de
Professor Titular em Segurança Internacional e Resolução de Conflitos
em 11/5/2011. Desde 10/2015 desempenha-se como coordenador
executivo do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais
da Unesp. Coordena a área de “Paz, Defesa e Segurança Internacional”
da Pós-graduação em Relações Internacionais “San Tiago Dantas”.
Fundador e líder do Grupo de Estudos de Defesa e Segurança
Internacional (GEDES) da Unesp. Participa como membro do Diretório
da Red de Seguridad y Defensa de América Latina (RESDAL). De 2012
a 2014 foi diretor institucional da Associação Brasileira de Estudos
de Defesa (ABED). Membro do Diretório da Associação Brasileira de
Relações Internacionais de 2013 a 2015 e coordenador da área de
Segurança Internacional, Defesa e Estratégia da ABRI. Membro do
Diretório da Associação Brasileira de Relações Internacionais ABRI e
coordenador da Área de Segurança Internacional, Defesa e Estratégia
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sença da imprensa internacional, mas tam- para prevenir e combater o terrorismo, o país
bém contará com a participação de atletas e faz parte dos tratados e organismos internacio-
algumas autoridades de países que, sim, são nais que tratam do tema, mas internamente
considerados inimigos pelos grupos terroristas. não se percebem ações rápidas que indiquem
As Forças Armadas brasileiras estão de a preocupação com o fenômeno.
sobreaviso desde há muito tempo e se pre- A Lei do Terrorismo foi sancionada em mar-
param intensamente para o caso, os sistemas ço e não há uma estrutura permanente anti e
de inteligência, vigilância e cibernética estão contra terrorismo, nem a definição da autori-
atentos e operantes. Mas sabem, como todos dade responsável em alto nível. No entanto,
sabemos, que nenhum sistema de seguran- os grandes eventos que ocorreram, como a
ça é perfeito, e que quem quer cometer um Conferência Rio+20, a Copa das Confede-
atentado está atento ao sistema e suas falhas rações, a Jornada da Juventude e a Copa de
para operar nelas. Mundo de futebol, e os Jogos Olímpicos que
Sabendo da preocupação e preparo do sis- serão realizados daqui a alguns meses fizeram
tema, o que cabe à população brasileira é cur- com que, dentro das medidas de segurança
tir o evento com tranquilidade; preocupar a adotadas, ou a serem adotadas, o tema terro-
sociedade com a possibilidade de falha não rismo ganhasse destaque.
resolverá a falha e propagará o terror, reali- Foi montada uma estrutura ad hoc para esses
zando assim o objetivo do terrorismo, sem ter
realizado nenhum esforço.
A América Latina não é alvo específico de nenhum
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sérgio luiz cruz aguilar A América Latina dos grupos chamados “terroristas” operando na
é uma região do mundo que tem se mantido atualidade nem nesta região reconhecem inimigos
afastada da ação terrorista internacional. Os declarados
atentados que ocorrem, com algumas exceções,
estão ligados a grupos internos, por exemplo,
Acima, soldados do objetivos – e os atos terroristas continuarão o Sendero Luminoso no Peru e os grupos que eventos sob a direção da Secretaria Extraor-
Exército brasileiro
durante uma parada para
fazendo parte dos problemas de segurança a atuam na Colômbia, cuja classificação como dinária de Segurança para Grandes Eventos
o Dia da Independência serem enfrentados. “terroristas” pode ser questionada. (SESGE) criada pela Presidência da Repúbli-
em Brasília.
No entanto, não podemos esquecer dos ca no Ministério da Justiça que, junto com o
Ao lado, os dois uc Dentro desse contexto mundial, quais atentados ocorridos em Buenos Aires. Eles Estado-Maior Conjunto do Ministério da De-
mascotes das Olimpíadas indicativos temos na América Latina e no não visaram o Estado ou a sociedade argen- fesa, assumiu a responsabilidade de planejar,
e Paralimpíadas
Rio/2016. Conhecidos Brasil especificamente? tina mas sim a comunidade judaica. Usando definir, coordenar, implementar, acompanhar
no mundo todo, Vinicius héctor luis saint pierre A América Latina esse exemplo, nenhum país estaria imune ao e avaliar as ações de segurança nesses eventos.
(alusão a Vinicius de
Moraes) e Tom (Tom não é alvo específico de nenhum dos grupos terrorismo. Nesse sentido, em qualquer um O órgão de coordenação máximo para a
Jobim), respectivamente. chamados “terroristas” operando na atualidade deles podem ocorrer atentados, o que coloca segurança da Copa do Mundo foi constituído
nem nesta região reconhecem inimigos decla- os governos e as agências responsáveis em por um chamado triunvirato, formado pelo Mi-
rados. Todavia, na região podem se apresentar constante estado de alerta. nistro Chefe da Casa Civil da Presidência da
alguns dos fatores favoráveis para a perpetração Além disso, como a prevenção e o combate República, o Ministro da Justiça e o Ministro
de um atentado, como a relativa liberdade de ao terrorismo necessitam de coordenação de da Defesa, assessorados pelo Ministro Chefe
movimento e a facilidade de acesso aos ma- esforços e de uma vasta cooperação interna- do Gabinete de Segurança Institucional da
teriais explosivos ou armas. cional, os países latino-americanos devem se Presidência da República, e operacionalmente
No caso do Brasil, deve-se somar a estas ligar de alguma forma aos esforços internacio- envolve inúmeras instituições em nível federal,
características a realização de um evento in- nais de ação contra esse fenômeno. estadual e municipal. Ou seja, o tema ganhou
© Divulgação/EBC
ternacional de grande porte, como é o caso O Brasil não tem o terrorismo como prioridade força em decorrência dos grandes eventos no
das Olimpíadas. Este espetáculo não apenas em sua agenda de segurança. Há um apoio do país e não por ser considerado importante na
representa um palco ideal pela pesada pre- governo brasileiro aos esforços internacionais agenda de segurança do Brasil.
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