e s u a s im p lic a ç õ e s
M u r r a y S id m a n
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COERÇÃO
E SUAS IMPLICAÇÕES
Murray Sidman
COERÇÃO
E SUAS IMPLICAÇÕES
Tradução
Maria Amália Andery
Tereza Maria Sério
Conseli .o editorial
Glauci Estela Sanchez
Tradução
Maria Amalia Andery
Tereza Maria Sério
Coordenação editorial
Glauce Estela Sanchez
ISBN: 87-87622-22-6
vii
poderiam algum dia m elhorar ain d a não havia se estabelecido. Ain
da era fácil en co n trar com panheiros, ou m esm o p esso as m ais ve
lhas, que acreditavam que a s coisas não precisavam se r do modo
como eram . E o final d a II G uerra M undial parecia, de algum modo,
m arcar u m possível recomeço. As forças realm ente g ran d es do mal
pareciam te r sido varridas do m apa: talvez pudéssem os agora conti
n u ar, livrando-nos do resto da violência sem sentido a que c a ra c te
risticam ente subm etíam os u n s aos outros. Mas não aconteceu deste
modo. Por que não?
A grande questão era: "Como fazer isto ?” Como fazer as m u
danças que n o ssa sociedade, ex au sta pela destru ição e pelo sofri
m ento, parecia p ro n ta p a ra fazer? A m aioria d as soluções propostas
envolvia m u d an ças em n o ssas instituições. P ara alguns, u m a nova
forma de governo era a resposta. O utros viam o progresso ap en as no
contexto de m u d an ças no sistem a econômico. O utros ain d a acredi
tavam que a educação era a chave. Mas havia u m a arm ad ilh a em
todas as propostas de reform a econôm ica, política ou educacional.
A quelas instituições, aqueles sistem as, não nos eram dados de fora,
prontos. Nós m esm os os fizemos. Q u aisq u er virtudes e fraquezas
que n o ssas instituições tivessem eram n o ssa s próprias v irtudes e
fraquezas.
Tornou-se claro que os problem as prim ários não estão em
nossas instituições, m as em nós. De algum modo tem os que nos
tran sfo rm ar se pretendem os co n stru ir sistem as que su sten te m coo
peração, solidariedade, ju s tiç a e, de form a m ais geral, abordagens
racionais aos problem as que inevitavelm ente surgem quan d o grande
núm ero de pesso as tem de com partilhar recu rso s lim itados.
Como vam os m u d a r a n ó s m esm os? M uitos tipos de propos
ta s tèm sido feitas. Há m uito tem po, antropólogos reconheceram que
como espécie ain d a não com pletam os n o ssa ad ap tação física à n o s
sa p o stu ra ereta, à alim entação m acia, ao prolongam ento da vida
por meio de m edidas san itárias e de m edicina preventiva. Sofremos
m u itas doenças e desconfortos porque n o ssa p o stu ra ereta não pro
vê su sten ta ção ad eq u ad a nem p a ra nossos órgãos internos, nem
p ara os arcos de nossos pés; n o ssa s dietas estão to rn an d o nossos
dentes b a sta n te desnecessários; m uitos processos im unológicos não
são m ais necessários p a ra nos proteger de m u d an ças am bientais e,
em vez disso, m anifestam -se como alergias e, com a própria saú d e
física desem penhando um papel cad a vez m enor n a determ inação da
duração de n o ssa s vidas, o envelhecim ento traz com ele ain d a novas
doenças. Alguns afirm am que restos de n o ssa h eran ç a física geram
sofrim ento e m iséria, m antendo-nos em lu ta u n s co n tra os outros.
viii
E les su g erem que o m u n d o se ria u m lu g a r m e lh o r se n o s liv rá s s e
m o s de to d o s aq u e le s com os q u a is é im possível conviver p o r c a u s a
do so frim en to físico. S u a s so lu çõ es in c lu e m m e lh o ria d a espécie p o r
m eio d a e u ta n á s ia ra d ic al, liv ran d o -se, em vez de p ro lo n g a r a vida,
d aq u e le s q u e n a s c e ra m com defeitos ou q u e os a d q u irira m p o rq u e
vivem d em ais.
E u ta n á s ia e x tre m a , elim in a n d o q u a lq u e r u m q u e so fra de
d eficiên cias p re s u m id a s , foi te n ta d a em la rg a e sc a la pelo m en o s
u m a vez. As te n ta tiv a s d o s n a z is ta s to m a r a m óbvios os h o rro re s
in e re n te s em d efin ir a rb itra ria m e n te o q u e é c o n sid e ra d o “d efic iên
c ia ”, em esp e cificar o q u e é “u m p ro b le m a ” e em d e te rm in a r o q u e é
“d esejáv el”. A p rá tic a re q u e r a s s a s s in a to s legalizados em la rg a e s c a
la e sem u m fin al à v ista. E lim in a r a p e n a s os id o so s e en ferm o s —
a q u e le s q u e n ão m a is geram e cria m c ria n ç a s — n ã o te ria efeito
so b re a evolução d a espécie. E se n ó s te n tá s s e m o s atin g ir a “p u re z a
g en é tic a” pelo o u tro lad o — elim in a n d o c ria n ç a s físic a e m e n ta lm e n
te d eficien tes — o p ro c e sso ev olucionário lev aria a in d a c e n te n a s de
g eraçõ es. E ste tem p o n ã o e s tá à n o s s a d isp o sição .
P ro p o sta s p a r a p ro d u z ir u m a esp écie m a is sa u d á v e l e talvez
m a is am igável p o r m eio de c ru z a m e n to s c o n tro la d o s têm o m esm o
p ro b lem a — n ã o tem o s tem p o su ficien te. A vanços m o d e rn o s n a g e
n é tic a in d ic a m q u e m u d a n ç a s rá p id a s to rn a r-s e -ã o p o ssív eis em u m
fu tu ro n ã o tã o d is ta n te . Q uão próxim o é e ste fu tu ro n ã o podem os
a in d a s a b e r com certeza. E sa b e m o s a in d a m en o s so b re com o g en es
e c o n d u ta se re la cio n am . Q ue tip o s de h e r a n ç a fa rão com q u e a p li
q u e m o s to d a n o s s a in telig ê n cia em n o s so s p ro b lem a s m ais crítico s?
Q u e tipo de m u d a n ç a s g en é tic as h ã o de n o s fazer re s p o n d e r à f r u s
tra ç ã o com a ra z ã o e n ã o com a a g re ssã o ? P odem os fazer clanes de
p ro fe sso re s q u e u s a r ã o m éto d o s positivos em vez de coercitivos p a r a
e n s in a r os jo v e n s? E a ss im p o r d ian te. M esm o q u e se prove se r
p o ssív el u s a r n o s s a c re sc e n te c o m p re e n sã o d a g en é tic a p a r a a c e le
r a r o p ro c esso evolucionário n o rm a lm e n te lento, n ã o e s tá claro, em
a b s o lu to , q u e d e sc o b rirem o s com o fazer isto v a n ta jo sa m e n te , a n te s
q u e n o s envolvam os n isto .
O que p o u co s têm co n sid erad o é a p o ssib ilid a d e de q u e p o d e
m o s fa zer m u d a n ç a s c o m p o rta m e n ta is se m a lte ra r n o s so s p ro c e sso s
biológicos o u n o s s a c a rg a g en ética. Nos ú ltim o s c in q ü e n ta a n o s a
a n á lis e c o m p o rta m e n ta l tem n o s e n s in a d o m u ito so b re com o o a m
b ien te in flu e n c ia o co m p o rta m e n to . D e n tro dos lim ites de n o s s a
h e r a n ç a biológica a tu a l, n o s s a c o n d u ta é fo rte m e n te c o n tro la d a pelo
s e u setting a m b ie n ta l e s u a s c o n s e q ü ê n c ia s a m b ie n ta is . E a an á lise
c o m p o rta m e n ta l ta m b é m tem n o s m o stra d o q u e au to c o n tro le é re a l-
ix
m ente controle am biental; é possível c o n stru ir m u d a n ças em nosso
proprio am biente de form a a produzir m u d an ças em nosso próprio
com portam ento. C ontrolar a n ó s m esm os é m u d a r o am biente de
m aneira tal que se m ude n o ssa própria co n d u ta e fazê-lo porque
isso m u d a n o ssa própria conduta. Há ta n ta s possibilidades de m u
dança, m esm o sem m anipulação genética, que alterar algum as das
relações críticas entre am biente e com portam ento é o único cam inho
prático a percorrer se realm ente quiserm os m u d a r n o ssa co n d u ta
an tes que seja tard e dem ais.
Um ponto de vista b a sta n te difundido m as erróneo afirm a
que ap en as alterações superficiais podem se r realizadas d esta m a
neira. M uitos ain d a acreditam que u m a análise d a s relações entre
n o ssa co n d u ta e nosso am biente não atinge n o ssa n a tu re z a real.
Nós gostam os de ver a nós m esm os como agentes independentes,
não como u m locus de variáveis controladoras. P ara m uitos o “eu
real” consiste daqueles sentim entos, p en sam en to s e anseios, os
m ais profundos, que ninguém m ais poderá seq u er conhecer. E isto é
verdade, ninguém m ais pode m esm o conhecer n o ssa “p esso a in te r
n a ” por meio de experiência direta. Tom ando isto como certo, deve
m os tam bém reconhecer que n a m edida em que se considera o resto
do m undo, o que eles podem ver é o “você real”. Isto é tu d o com que
os outros podem lidar. E o que eles podem ver, aquilo com o que
podem lidar, são n o ssa s ações. Podemos co n sid erar n o ssa pessoa
in tern a como nosso verdadeiro self, m as p a ra o restan te do m undo,
nós som os o que nós fazemos. Se pretendem os m u d a r n o ssas in te ra
ções u n s com os outros, terem os de m u d a r o que nós fazemos.
M udando n o ssa co n d u ta m udam os a nós m esm os.
E u tentei, neste livro, indicar um tipo crítico de m u d an ça
que te rá que ocorrer em n o ssa s interações sociais se quiserm os
m esm o fazer algo construtivo a respeito d a s m isérias que a tu alm e n
te infligimos u n s aos outros, se pretenderm os pelo m enos pospor a
atu al investida em direção ã extinção da espécie. Coerção não é a
raiz de todo mal, m as até que adotem os outros m odos, que não o
coercitivo, p a ra controlar a co n d u ta u n s dos outros, n en h u m m éto
do p a ra m elhorar fisicam ente n o ssa espécie im pedirá que o timer de
no ssa sobrevivência continue andando. U m a ciência do com porta
m ento desenvolvida pode m ais u m a vez d a r às p esso as de boa v o n ta
de razão p a ra otim ism o sobre n o ssas ch an ces de sobrevivência.
Agradecimentos
Agradecimento...................................................................................... xi
Prefácio..................................................................................................vii
Introdução................................................................................................... 17
Nós fazemos isso o tempo todo....................................... .......................... 17
Análise do comportamento........................................................................ 20
Análise do comportamento, punição, terapia e le i............................21
A complexidade da conduta desafia a análise............................................. 25
O laboratório pode nos dizer alguma coisa?.............................................. 27
Os não-humanos têm algo a nos dizer?............................................. 28
Nós já sabemos tudo?................................. ...................................... 30
xiii
CApÍTulo 5: l_AboRATÓRÍo de iyiarFíiyi ou estu Fa dE vidRO?........................ 65
A c o n d u ta pode s e r a n a lis a d a ? ..................................................................... 65
O q u e significa “fazer u m ex p erim en to ”? ................................................... 69
Do ra to à h u m a n id a d e ...................................................................................... 74
xiv
CApÍTulo 9: ApRENCÍEI\do POR meío cIa esquíva............................................. 146
O que m ais vem com a esq u iv a ? .................................................................... 149
Mantenha seu nariz longe de problem as .............................................. 149
Não balance a canoa ..................................................................................... 150
Mate-os to d o s .................................................................................................. 151
A prendizagem le n ta ............................................................................................. 152
Espere até que d o a ........................................................................................ 153
Destruição nuclear: ela é evitável? .......................................................... 154
Não pode acontecer comigo ........................................................................ 155
S u p e rstiç õ e s........................................................................................................... 156
E vitando o in e v itá v e l.......................................................................................... 157
F uga d a e s q u iv a ................................................................................................... 162
XV
CApÍTulo 1 4 : C oerção qera coerção............................................................. 220
A g re ssã o ................................................................................................................. 2 20
C o n tra c o n tro le ..................................................................................................... 2 24
Quem controla quem? .................................................................................. 228
xvi
Introdução
Análise do comportamento
Em b ases h u m a n itárias, m uitos têm questionado a desejabi-
lidade e a utilidade a longo prazo destes m étodos m uito utilizados de
controle com portam ental; ninguém gosta de ser punido e alg u n s não
gostam de p u n ir os outros. Mas, podem os fazer m elhor do que sim
plesm ente ap elar p ara nossos preconceitos sobre o que é bom ou
m au, A ciência d a análise do com portam ento contém u m corpo de
princípios e dados que podem prover algum a objetividade p a ra deci
dir sobre p u n ir ou não. A coerção tem sido intensivam ente investiga
d a no laboratório com portam ental, com fundos públicos — im postos
Coerção e s u a s im plicações 21
E agora que a an álise do com portam ento com eça a se am p liar erri
algum as d essas áreas (não todas — as fro n teiras ja m a is d esap arece
rão). os gritos ad q u iriram um tom de alarm e: “A plicando princípios
gerais ao com portam ento h u m a n o vocês nos desu m an izam !”
A astrono m ia tam bém já foi a c u sa d a de tira r a T erra do
centro de Universo e a biologia evolucionária de d e stru ir nosso s ta
tus como criação especial de Deus. E porque an a lista s do com porta
m ento bem -sucedidos estão identificando variáveis que controlam
algum as de n o ssa s co n d u tas m ais com plexas e apreciad as, o p úbli
co com eça a vê-los — como a outros cien tistas — como querendo,
eles m esm os, exercer controle. Eles to rn aram -se su bm etidos ao este
reótipo p o p u lar do cientista louco inclinado a controlar o m undo.
0 ambiente hosti!
A própria n atu re za d á o exemplo. O am biente físico c o n sta n
tem ente am eaça nos esm agar com frio, calor, chuva, neve, enchente,
terrem oto e fogo. Ele nos diz; “se você não quer congelar, co n stru a
um abrigo”: “c o n stru a rep resas, ou en ch en tes levarão de roldão su as
c a sa s”; “escassez está chegando, arm azene alim entos.” O bservar os
céus e e sc u ta r as previsões de tem po to rn aram -se q u ase u m a se
g u n d a natureza. E stam os sem pre lu tan d o com o am biente.
A natu reza, é claro, n u n c a nos diz o que tem os de fazer se
quiserm os evitar desconforto e catástrofe. Logicamente, não pode
mos atrib u ir intenções à natureza; sendo im pessoal, ela não pode
realm ente nos levar a c o n stru ir rep resas e a arm azen ar colheitas. E,
ainda assim , a experiência nos diz que as forças d a n atu re za d esa
barão sobre nós se não tom arm os precauções. N ossa co n d u ta segue
}eis gerais que são independentes do c ará ter pessoal ou im pessoal
daquele e d a intenção ou falta de intenção daquele que coage. Reagi
m os a sinais de alerta do am biente inanim ado ex atam en te como
fazemos com relação à coerção im posta por nossos com panheiros;
tendem os tam bém a personificar a n atu reza, ain d a que ap en as em
n o ssa linguagem .
D iante do poder esm agador d a n atu reza, aprendem os a ap re
ciar s u a s dádivas — os recu rso s que ela to rn a disponíveis ao enge
nho e ao dinam ism o e s u a beleza esto n tean te. Mas, ela cobra seu
preço por todas a s coisas, am eaçando tom ar com u m a m ão o que
deu com a outra. E scassez sem pre segue a fartu ra.
36 M urray S id m a n
pais irados ãilminam seus filhos; idéias iluminam nossas cabeças; a má sorte desaba
sobre nós; asnuvens da guerra se formam; oradores empolgados dizem palavras
incendiárias, finanças estão estourando, nossas forças armadas atacam como raios,
multidões explodemem violência.
Alertas de desprazer iminente, ou tempo catastrófico e outros desastres
naturais permitem-nos preparar defesas e desviar ou reduzir sua severidade; honramos
e recompensamos regiamente os profetas. A indústria da televisão, que cobra milhares
de dólares por segundo e considera o tamanho da audiência como árbitro supremo
de sucesso ou fracasso, dedica milhares de segundos por ano para previsões de
tempo. Ela nos fascina com mecanismos meteorológicos e técnicas de vídeo
maravilhosas e fabulosamente caras. A decisão de despender tal esforço, custo e
engenhosidade para relatar o tempo e, ao mesmo tempo, negligenciar a qualidade
e quantidade de programação em educação, ciências, política, dramaturgia e música
reflete prioridades da comunidade. A despeito de nossa esperança de supremacia,
permanecemos subservientes à natureza mesmo durante nosso lazer.
A comunidade hostil
Talvez a coerção física presente seja responsável também pela
aceitação geral da coerção social como um fato da vida. Tenho visto a
punição defendida como uma técnica de ensino para os incapazes
desenvolvimentalmente com o argumento de que qualquer método que não
envolva punição vai contra o princípio de normalização. “Normalização”
refere-se à noção, comumente bastante razoável, de que deveríamos trazer
de volta os deficientes para o convívio normal em vez de segregá-los. O
proponente da punição, neste caso, argumenta que a sala de aula sem punição
é um ambiente anormal, ao qual ninguém deveria ser exposto. Esta distorção
de uma noção basicamente decente vem, creio, de uma adaptação não-
percebida ao modelo coercitivo que a própria natureza nos fornece.
Na verdade, coerção social é aceita como natural. Habitantes das
grandes cidades do mundo tomam como certo que devem trancar suas portas,
colocar seus pertences no seguro, carregar uma carteira extra com algumas
poucas notas à mão, para quando se defrontarem com uma faca ou um
revólver, e trancar as portas de seus carros mesmo quando dirigindo, para
que um intruso não pule dentro do carro quando pararem em um sinal.
Nenhuma mulher e somente alguns homens incautos caminham depois que escurece no
40 M urray S id m a n
sem um registro de violência contra a criança por parte dos pais ou violência
contra os pais por parte de filhos. Temos a expectativa de ser alertados,
intimidados, ameaçados, empurrados e talvez espancados até mesmo por
aqueles que nos empregam, ensinam, protegem, governam ou amam. Ameaças
de punição, privação ou perda são práticas-padrão nos locais de trabalho e
salas de aula, estabelecem uma relação de dominação unidirecional entre
polícia e cidadão, fornecem as bases para atingir objetivos políticos e até mesmo
dão colorido para as interações mais íntimas dentro das famílias.
Em nosso trabalho, estamos acostumados a ser repreendidos por
trabalho malfeito e ignorados por trabalho bem-feito. Nós nos resignamos a
contribuições forçadas para instituições de caridade e mesmo para indivíduos
dos quais não cuidamos. A despeito das leis sobre campanhas eleitorais,
servidores municipais e estatuais estão bastante conscientes das conseqüências
emjogo por não contribuir para campanhas políticas. E segurança no trabalho
é sempre um problema na disputa trabalho-gerência.
Para muitos estudantes notas altas funcionam como recompensas
principalmente porque elas significam a esquiva de notas baixas. Milhões de
alunos fugiriam da escola imediatamente se a lei permitisse; mesmo na
faculdade, com estudantes pagando altas anuidades, professores que não exigem
presença esperam somente que uma fração dos estudantes matriculados
realmente compareça às aulas. Desde a escola primária e durante todo o
caminho, passando pelo colegial, professores preocupam-se mais com técnicas
coercitivas para manter a disciplina do que com métodos efetivos de instrução.
Punimos crimes mas apenas toleramos a legalidade. Supõe-se que a
virtude é sua própria recompensa, mas dentro do código legal, a virtude ser
sua própria recompensa significa simplesmente que ela nos mantém fora da
prisão. E nossa polícia, para a qual deixamos nossa segurança e proteção, é
ensinada a realizar sua tarefa por meio de intimidação, força e punição; ela
passou a representar um poder a ser temido, uma instituição anteriormente
benevolente que agora demanda subserviência.
Com cínico divertimento, observamos nossos legisladores enquanto se
atacam uns aos outros, em revanche por rebelião contra a liderança ou votos
discordantes. Nos escalões mais altos do governo, indivíduos procuram con
solidar seu poder ou prestígio desacreditando rivais, mesmo ao custo de com
prometer questões de princípio e segurança nacional.
42 M urray S id m a n
Controle comportamental
Aqueles m esm os críticos que condenaram B. F. S kinner por
querer aca b ar com o controle coercitivo — que ao produzir fuga
origina o conceito de liberdade — tam bém condenaram a ciência do
com portamento, que havia revelado claram ente que a coerção é indese-
Coerção e s u a s im plicações 45
lar m ais freqüentem ente sob certas condiçoes e m enos freq ü en te
m ente em o u tra s ? ”
0 que é coerção?
Na linguagem cotidiana, ser coagido é ser compelido sob jugo
ou am eaça a fazer algo “co n tra n o ssa vo n tad e”. M as an alistas do
com portam ento afirm am que todo nosso com portam ento é controla
do e, n este sentido, tu d o que fazemos é “co n tra n o ssa vontade”.
“Ju g o ” e “am eaça”, en tretan to , se aproxim am de u m a definição com-
portam ental de coerção; esses term os se referem a classes de conse
qüências, reais ou potenciais, que controlam nosso com portam ento.
G enericam ente falando, h á três tipos de relações controladoras entre
conduta e conseqüências; reforçam ento positivo, reforçam ento neg a
tivo e punição. Controle por reforçam ento positivo é não-coercitivo;
coerção en tra em cena quan d o n o ssas ações são controladas por
reforçam ento negativo ou punição.
então este reforçador não virá. “Se com portam ento 1, então conse
qüência, m as se com portam ento 2, então não-co n seq ü ên cia.” O re
forçador segue um ato m as não um outro e assim é contingente ao
ato crítico.
Professores dão n o tas altas (presum ivelm ente estas são re-
forçadores) contingente a resultados altos — e não baixos — em
exames; som ente oferecemos boas referências a sócios ou em prega
dos se eles agiram de m aneiras que julgam os am igáveis, cooperati
vas e produtivas: respondem os com afeto ao afeto, m as não (u su al
mente) à hostilidade; dam os vários sinais de aprovação à s crianças
cujas ações são co n sisten tes com — e não conflitantes com — p rá ti
cas da com unidade e nossos próprios padrões de co n d u ta. C ontin
gências de reforçam ento são u m a fonte fu n d am en tal de controle
com portam ental. Em bora contingências de reforçam ento controlem
com portam ento, elas não precisam ser sinônim o de coerção. De fato,
algum as pessoas consideram q u alquer tipo de controle como coerci
tivo. Porque coerção perm eia n o ssa cultu ra, elas têm sido incapazes
de conceituar controle em q u aisq u er outros term os. Coerção envolve
a aplicação de conseqüências, m as conseqüências que cham am os de
coercitivas diferem de form a im portante daquelas que até aqui tem os
cham ado de reforçadoras.
Se quiserm os en ten d er ou influenciar processos complexos
como motivação, m em ória, aprendizagem , percepção, interação so
cial, desenvolvim ento da personalidade, cognição e linguagem , um
prim eiro passo é identificar contingências de reforçam ento que são
fu ndam entais p ara cada u m deles. Ao fazer isso, descobrirem os vá
rios tipos de contingências de reforçam ento e eles fornecerão a base
para um a definição formal de coerção. C onseqüências não são os
únicos tipos de eventos que influenciam a conduta, m as s u a classifi
cação nos perm ite se p a ra r influências coercitivas de não-coercitivas.
a punição fará, tem os que ver por nós m esm os. O que vemos no
laboratório e a to d a n o ssa volta no m undo cotidiano não é conforta
dor.
Controle por meio de reforçam ento positivo, então, não é
coercitivo; controle por meio de reforçam ento negativo e punição é. A
m aioria das pesso as entende reforçam ento negativo e punição sem
dificuldades. “É assim que o m undo é.” Reforçam ento positivo fre
qüentem ente parece m ais difícil de com preender. M uitas pessoas
vêem reforçadores positivos ap en as como algo valioso que pode ser
retirado e, d esta forma, úteis p ara coagir o u tro s a se com portarem
como elas gostariam . P ara elas. reforçadores positivos são apenas
algo a se r tom ado de volta diante de u m com portam ento in ad eq u a
do; u m a criança que age m al à m esa é obrigada a não com er sobre
mesa; um aluno desaforado deve fazer sacrifício d u ra n te o recreio;
um legislador que vota co n tra seu partido perde a liderança. P u n i
ção por meio da rem oção de reforçadores positivos é bem -com preen-
dida.
O utro m au u so de reforçam ento positivo é deliberadam ente
criar os tipos de privações que to rn am os reforçadores efetivos: pri
sioneiros prim eiro são colocados em solitária e, então, se perm ite a
eles ter contatos sociais como reforçam ento por docilidade; prim eiro
subm etidos à privação extrem a de alim ento, eles podem, então, ob
te r alim ento em retribuição por subserviência. Liberdade e alim ento
parecem reforçadores positivos, m as quando eles são contingentes à
cessação de privações artificialm ente im postas, s u a efetividade é um
produto de reforçam ento negativo; eles se to m am in stru m en to s de
coerção.
E p a ra o u tro s, refo rçam en to positivo é a p e n a s um sonho
“... irreal; o m undo não funciona d esta m an eira”. Alguns professores
Consideram -no até m esm o ruim , “n a d a além de su b o rn o ”, e em vez
de proverem conseqüências positivas qu an d o seu s alu n o s ap ren
dem. eles ap en as os p unem quando eles falham . A prender, em vez
de to m a r-se um reforçador por si m esm o, funciona p a ra m uitos
alunos e e stu d an tes como u m a ro ta de fuga. Não seria su rp reen d en
te que m uitos deles considerem “ap ren d er por ap ren d e r” u m concei
to não-fam iliar.
Dedicam os m uito de n o ssas vidas a elim inar ou prevenir
estresses atu ais e fu tu ro s que a n atu re za e a sociedade nos impõem.
Lutam os p a ra selecionar cursos de ação que aju d arão a nos libertar
dos m uitos tipos de restrições físicas, governam entais e sociais a
que estam os con stantem ente subm etidos. Realidades físicas deter
m inam como podem os nos m an ter protegidos dos elem entos da na-
62 M urray S id m a n
tureza, n o ssa s leis dizem -nos como nos m a n ter fora d a prisão e
costum es sociais codificam as fronteiras com portam entais que nos
perm item desviar da c en su ra de nossos vizinhos. Freqüentem ente,
tem os poucas opções disponíveis p a ra prevenir ou evitar desprazer
ou situações perigosas. F reqüentem ente, som os forçados a ações
que consideram os n ão -n atu rais, desagradáveis, ou fora de hora, de
form a a fugir ou esquivar de p ressões físicas e in terp esso ais com uns
e extraordinárias.
Tam bém aceitam os algum a coerção reconhecendo que neces
sitam os de lei e de seu cum prim ento p ara m an ter interações civiliza
d as entre pessoas com in teresses conflitantes e que reg u lam en ta
ções de saú d e e segurança, em bora caras e freqüentem ente inconve
nientes, são proteções necessárias co n tra os poucos que d escu id a
dam ente colocariam em risco os dem ais. E ntretanto, au to -in teresse
algum as vezes p roduz algum as contradições e stra n h a s. Votamos
contra leis que regulam entam o cinto de seg u ran ça em autom óveis
considerando-as coercitivas, m esm o que aceitem os leis que nos fa
zem p a ra r d ian te de u m sinal vermelho; com panhias de cigarro
com batem leis an titab ag istas ro tu lan d o -as como coercitivas, em bora
aceitem sem q u estio n ar as proibições co n tra vender arsênico e o u
tros venenos sem receita; com unidades lutam co n tra o serviço de
ônibus escolar considerando-o coercitivo, em bora ab a n d o n a r o servi
ço de ônibus signifique coagir crian ças que pertencem a m inorias a
freqüentar escolas abaixo do p adrão e coagir todas a s crian ças a um
am biente social restrito.
F reqüentem ente coagidos à ação (ou inação), m u itas vezes
nos descobrim os tam bém u san d o coerção pfira com pelir outros a
agir como querem os que façam. Ao controlar o u tra s pessoas coerciti^
vãm ente, privam os e m agoam os ou am eaçam os privá-las e m agoá
las quando fazem coisas que consideram os indesejáveis; param os de
privar, m a ch u car e am eaçar som ente quando elas agem diferente
m ente, fazendo o que consideram os aceitável. N aturalm ente, é u m a
experiência com um que algum as coisas feitas pela prim eira vez sob
com pulsão se dem onstram tão prazerosas ou valiosas que, su b se
qüentem ente, as perseguim os por elas m esm as. A prender pelo
aprender pode em ergir m esm o a p artir de u m começo coercitivo, se
. descobrirm os que as coisas que aprendem os capacitam -nos a fazer
m ais do que ap en as esquivar de punição na escola. Novas h ab ilid a
des, desde a leitu ra até o raciocínio, abrem m uitos novos cam inhos
p ara reforçam ento positivo. Ê u m a infelicidade que esta descoberta
seja tão freqüentem ente deixada ao acaso. P ara m uitos, a tra n sfo r
m ação d a aprendizagem de u m m ecanism o de fuga p ara u m a fonte
de reforçam ento positivo jam ais ocorre.
Coerção e s u a s im plicações 63
derretim ento d as cam adas de gelo fará d esap arecer n o ssa s civiliza
ções costeiras. A educação tem talvez aguçado n o ssa consciência do
perigo, m as não tem fornecido soluções. Evitarem os esse desastre
global som ente aprendendo a m anejar nosso próprio com portam ento
e o com portam ento dos outros — tam bém em escala global.
A tecnologia m oderna tem originado novos problem as. E sta
m os arm azenando lixo radioativo em containers que garan tid am en te
vazarão daqui a algum as gerações. A publicidade tem ajudado a
expor o problem a, m as a indignação pública d as pessoas h o n rad as
não ê suficiente p a ra resolvê-lo. Uma ciência de análise do com por
tam ento, consideravelm ente m ais avançada do que ela é atu alm en te,
terá que descobrir como podem os fazer com que tais conseqüências
rem otas influenciem o com portam ento atu a l de solução de proble
m as.
Um conflito cad a vez m aior en tre as restrições biológicas e
econôm icas tem intensificado a influência coercitiva do am biente
sobre a condição h u m an a. A população do m undo está se ex p an d in
do em u m a tax a que excede de m uito a su a produtividade. Provo
cando um rápido aum ento no núm ero daqueles que n a d a têm. Nem
um alto interesse ilum inado, nem u m sentido de fraternidade têm
sido capazes de m elhorar a resu ltan te m iséria da h u m an id ad e. Será
necessário u m a ciência d a análise do com portam ento altam ente de
senvolvida p ara n o s m o strar como aju d ar outros a aplicar as infor
m ações tecnológicas que já possuím os, p ara criar condições de vida
que suportem o crescim ento da população.
As superp o tên cias duelam no O riente Médio realizando m a
n obras p a ra o acesso continuado ao petróleo necessário p ara a so
brevivência de su a s m áq u in as m ilitares. O esgotam ento d as reservas
de energia d a T erra am eaça fazer explodir um conflito internacional
que provavelm ente term in ará em u m holocausto n uclear. Podemos
depender de nosso in stin to de sobrevivência ou colocar n o ssa fé no
espírito e intelecto h u m an o s p ara co rtar este im pulso suicida? Con
siderações econôm icas têm nos im pedido de d a r alta prioridade p ara
o desenvolvim ento de novas fontes de energia. O dinheiro a p a re n te
m ente vence o medo.
O d esastre n u clear com que nos defrontam os é de u m tipo
que ja m a is experienciam os e é provável que serem os capazes de
experienciã-lo ap en as u m a vez. A despeito de s u a m agnitude, o fato
de ser rem oto lhe d á som ente u m fraco controle sobre n o ssas ações.
A im ediaticidade dos gastos econômicos e dos tran sto rn o s dá a estas
conseqüências consideravelm ente m ais poder sobre n o ssas co n d u
tas do que o m ais destrutivo m as tam bém m ais d ista n te conflito
Coerção e s u a s im plicações 69
que fazem o m undo operar do modo como ele opera e que nos fazem
agir do modo como o fazemos.
Pilotos de teste voam em novos tipos de aviões com sucesso,
em sua prim eira tentativa, ainda que ap en as m odelos te n h am sido
testados previam ente n a s condições artificialm ente con tro lad as de
um túnel de vento. Uma lei básica que govem a o m ovim ento dos
corpos em queda poderia ser verificada apenas em u m vácuo, u m a
condição artificial que não existe em lugar algum da T erra com
exceção dos laboratórios. Ainda assim , a descoberta d essa lei tornou
finalmente possível enviar pessoas à n o ssa Lua e explorar as frontei
ras externas de nosso universo. A ciência da genética, que se origi
nou com o estudo de p la n tas e flores, chegou a u m a nova tecnologia,
mais rápida e até m esm o m ais confiável que o acasalam en to seleti
vo, para “m a n u fa tu ra r” novas variedades de anim ais; é possível, por
exemplo, fazer clones de vacas que são m áq u in as incrivelm ente efi
cientes de produção de leite. N ossa com preensão dos m ecanism os de
hereditariedade e stá a ponto de produzir u m a ciência aplicada da
genética h u m a n a que já e stá originando tem ores sobre novos tipos
de controle com portam ental. Os produtos da p esquisa de laboratório
alteraram profundam ente a existência h u m an a. Em bora possam os
deplorar m u itas das m u d an ças, não podem os ter dúvidas de que os
resultados de procedim entos refinados de laboratório são aplicáveis
em outros lugares; a torre de m arfim não é tão isolada do resto do
mundo como m uitos gostariam que acreditássem os.
Pode-se legitim am ente p erg u n ta r se estam os corretos em ex
trapolar de p esq u isas de laboratório bem -sucedidas em física, q u í
mica e biologia p ara a p esq u isa com portam ental; tem os o direito de
assum ir que a pesquisa com portam ental é capaz de aplicações bem-
sucedidas porque a s o u tras o foram? Claram ente, esta suposição
não tem necessidade lógica. E, ain d a assim , cad a u m a d a s o u tras
ciências já esteve n a m esm a posição. Em todos os casos, a su p o si
ção de que os dados de laboratório eram extrações da experiência
cotidiana, a despeito de seu sta tu s lógico incipiente, recebeu ju stifi
cação em pírica.
Felizmente, os pioneiros do laboratório de com portam ento,
criticam ente cônscios do precedente histórico, aceitaram a su p o si
ção de que s u a ciência, tam bém , provaria ser aplicável à vida coti
diana. Tivemos confirm ação suficiente d esta suposição p a ra conti
n u ar a cam in h ar em frente. F racassos em áreas específicas ainda
podem estar por vir, m as negar arb itrariam en te am bos, o progresso
já feito e a possibilidade de m ais progresso, é colocar-se voluntaria-
74 M urray S íd m a n
Do rato à humanidade
Em um laboratório de com portam ento isolam os no sso sujeito
— digam os, u m rato — em u m espaço relativam ente confinado,
isolado de sons estran h o s, com luz, te m p eratu ra e um idade co n s
ta n te s e mobiliado ap en as com os iten s relevantes ao procedim ento
experim ental. O que pode esta c ria tu ra in telectu alm en te lim itada,
vivendo em um espaço ecológica e socialm ente estéril possivelm ente
pode nos dizer sobre a co n d u ta h u m a n a? E sboçar algum as das
considerações que su ste n ta m tais arran jo s experim entais h á de nos
auxiliar a ilu stra r s u a utilidade.
A ntes de iniciar um estudo, todo pesq u isad o r tem de decidir:
“O que vou olhar?” Nosso prim eiro im pulso pode ser observar so
m ente ações que têm “validade de face”: se quiséssem os m elhorar o
desem penho de cavalos de corrida poderíam os confinar nosso e s tu
dos à pista; um a preocupação com criatividade poderia nos levar a
a n alisar com positores de m úsica; u m in teresse em coerção poderia
nos induzir a investigar prisões. M uitos p esquisadores observam
ap en as essas form as exatas de com portam ento que os interessam .
Tais estu d o s podem levar a inform ações in teressa n tes e
úteis. Por outro lado, e s ta abordagem ap aren tem en te d ireta a longo
prazo lim itará severam ente nosso entendim ento, até m esm o de p ro
blem as práticos altam en te específicos. U sar validade de face como
critério p a ra decidir o que observar e m edir inibe o desenvolvim ento
de u m a ciência do com portam ento por criar m iniciências in d e
pendentes. E ncontram os especialistas em psicologia de todas as coi
sas, de xadrez a sexo, de program ação de com putadores a doença,
m ental, e não podem os fazer generalizações além d as fronteiras de
cada área. C ursos universitários proliferam , m atrícu las e direitos
au to ra is rolam . Os alunos, infelizm ente, não obtêm u m a descrição
sistem ática da co n d u ta h u m a n a que p u d essem aplicar a m u itas de
su a s preocupações, seja diante do problem a do m anejo de um cava
lo, seja diante do problem a de m an ejar a si próprios.
U m a altern ativ a p a ra e stu d a r ações que parecem im p o rtan
tes por si m esm as é fazer exatam ente o oposto. Selecionar u m a
am o stra arbitrária, algum a ação que, porque é delim itada e artificial,
não sofre de q u aisq u er d as lim itações e restrições im postas por
nosso julgam ento pessoal sobre validade de face. O ganho potencial
é que a au sên cia de ta is restrições pode to m a r a am o stra arb itrária
Coerção e s u a s im plicações 75
cuidadosos, m as, certam ente, m uito do que eles ap ren d eram como
u m a conseqüência do código de H am m urabi orientou-se p ara su a
própria sobrevivência, em vez da sobrevivência de seu s pacientes.
Efeito colateral é um term o que freqüentem ente se refere a
conseqüências não-p reten d id as e su p o stam en te pouco im portantes
ou im prováveis de drogas, m as, como todos sabem os, os efeitos
colaterais de u m a droga freqüentem ente são s u a característica m ais
im portante. Morfina, u m a bênção quan d o elim ina u m a dor in su p o r
tável, tam bém escraviza seu s u su ário s. Talidom ida, que dim inuia a
n á u se a m a tern a d u ran te os prim eiros m eses de gravidez, tin h a um
trágico efeito colateral; no nascim ento, m uito depois de a m ãe ter
p arado de to m ar a droga, a crian ça algum as vezes tin h a u m ou m ais
braços e p ern as parcialm ente desenvolvidos e seriam ente deform a
dos. T om ou-se um fato com um que efeitos colaterais perigosos p ro
voquem a retirad a de circulação de drogas que foram introduzidas
no m ercado sem testes adequados.
Os efeitos colaterais da punição tam bém , longe de serem
secundários, freqüentem ente têm significação com portam ental con
sideravelm ente m aior que os esperados “efeitos p rincipais”. Punição
e o u tras form as de coerção, como m u itas drogas, tam bém foram
introduzidas em n o ssa c u ltu ra sem testes adequados. Talvez u m a
avaliação m ais com pleta d as p ráticas coercitivas tam bém fará com
que elas sejam retirad as d a lista dos aprovados.
R esultados de testes estão agora disponíveis. A ciência d a
análise do com portam ento provê u m a descrição d as conseqüências
da coçrçào racional, siste-ijiãtica. M uitos dos efeitos colaterais d a
punição foram isolados p lanejadam ente e estu d ad o s no laboratório,
não como fenôm enos secundários, m as como processos im p o rtan tes
por si m esm os.
Juga
algum as vezes lim itada; tendem os a ver o que querem os ver. P ortan
to, os pais podem p recisar da aju d a de um observador não-envolvido.
O observador pode recom endar que eles respondam às confidências
de s u a filha com afetuoso interesse, m as sem bisbilhotar; que eles
m ostrem não ap en as seu s tem ores em relação ao seu bem -estar,
m as su a confiança em s u a integridade e capacidade de julgar. Se
m odular s u a atenção a tran sfo rm ar um reforçador negativo em um
reforçador positivo, eles descobrirão que a co n d u ta de s u a filha
m uda. D esligar-se de seu s pais, afastar-se deles e evitar com unica
ção não m ais será reforçador. Em vez disso, ela in terag irá m ais
freqüentem ente, com partilhando experiências, confidenciando, con
fiando, m udando de fuga e esquiva p a ra aproxim ação.
Infelizmente, m u itas pessoas en co n tram reforçam ento positi
vo cada vez m ais raram en te à m edida que saem d a infância. Para
algum as, é raro m esm o d u ran te a infância. A m edida que m in h a
história da coerção se desdobrar, ela m o strará que este triste estad o
de coisas tem au m en tad o enorm em ente a d em an d a por psicólogos
clínicos, psiquiatras, assisten tes sociais, an alistas aplicados do com
portam ento e o u tro s profissionais. M antendo o olho aberto p ara
reforçadores negativos, cad a um de nós se to m a rá capaz de com
preender m elhor e, talvez, aju d a r u n s aos outros.
Reforçamento negativo gera fuga. Q uando encontram os u m re
forçador negativo fazemos tudo que podemos p ara o desligarmos, p ara
escapar dele. Se o encontram os novamente, faremos o que funcionou
antes. Reforçadores negativos tam bém podem ser usados como p u n i
dores. Uma m aneira de p u n ir pessoas é atingi-las com reforçadores
negativos como u m a conseqüência de algo que ten h am feito. (Como
vimos a outra m aneira de p u n ir é reü rar reforçadores positivos.)
Reforçadores negativos e punidores, portanto, são os m es
mos eventos funcionando de m an eiras diferentes. Podem os fazer
choques desaparecerem — reforçam ento negativo; ou podem os to
m ar choques — punição. Reforçam ento negativo to m a u m a ação
m ais provável, punição u su alm en te to rn a u m a ação m enos provável.
Se u m bebê p á ra de ch o rar quando o pegam os no colo — reforça
m ento negativo — responderem os aos seu s choros su b seq ü en tes
pégando-o no colo; m as se pegar a crian ça no colo faz com que ela
' grite ainda m ais — punição — tentarem os algum a o u tra coisa.
Punição e reforçam ento negativo, quando trazidos à cena
pelo m esm o evento, to rn am -se ligados em um círculo vicioso. Um
choque do qual fugimos tam bém pune o que quer que ten h am o s
feito antes do choque. Ainda que possam os p a ra r o choro d a cria n
ça, tam bém terem os cuidado p ara não fazer b aru lh o s altos que
Coerção e s u a s im plicações 107
9{otas defuga
Desligando-se
F reqüentem ente desligam os o que qu er que nos desagrade. A
rrienos que m ás notícias dem andem ação im ediata, tendem os a fugir
tom ando-nos cegos ou surdos a elas. Algum as vezes tran cam o s o
am biente coercitivo ligando-nos em literatu ra, teatro e filmes de
"escape”. Mesmo reforçadores negativos e p u nidores suaves, m as
persistentes, podem to rn ar h ab itu al a fuga. Tendo u m pai ou esposo
que fala incessantem ente, aprendem os a "fechar nossos ouvidos”,
balançando a cabeça ou assentindo ocasionalm ente, m as escutando
pouco. N algum a m edida, vemos e ouvimos ap en as aquilo que q u ere
114 M urray S id m a n
tos que to d a decisão gera. E, natu ralm en te, “deixar Zé fazer isso"
tam bém significa que m ais tard e “Zé pode levar a cu lp a”.
Fazer nada. A fuga da solução de problem as to rn a-se ain d a
m ais reforçadora quando u m a decisão e rrad a poderia produzir c a
tástrofe. A possibilidade de holocausto n u clear parece ter paralisado
os líderes das nações. C onfrontados com estoques de arm as n u clea
res cad a vez m aiores, eles olham em o u tra direção. A rm as n u cleares
estão se tornando crescentem ente m ais acessíveis a indivíduos que
possivelm ente não poderiam com preender seu potencial destrutivo e
que, portanto, não hesitariam em u sá-las. Elas tam bém estão se
to rn an d o disponíveis p ara terro ristas, cu ja existência m arginal lhes
dá p o u ca razão p a ra tem erem su a própria destruição. A inda assim ,
n o sso s líderes fingem que a catástrofe não pode acontecer. Ou, caso
p udesse, eles afirm am que a possibilidade seria rem ota; “não h á
u m a em ergência”. Um movimento errado pode trazer um d esastre
tão enorm e que não realizar qualquer m u d a n ça parece o cam inho
m ais seguro. Portanto, eles co n tin u am a am eaçar u n s aos outros
com destruição; o único elem ento novo é que a am eaçada destru ição
de algum modo to m a-se m ais e m ais total.
A chantagem n u clear que poderia se seguir a q u alq u er d e
sarm am ento u n ilateral im pede cada nação de d a r esse passo. O
medo de proliferação n u clear n ão -d etectad a im pede acordos de d e
sarm am en to m ultinacionais. De q u alq u er modo, a im possibilidade
de restringir o crescim ento do conhecim ento científico e de en genha
ria rapidam ente to rn aria obsoletas as provisões técnicas de qualq u er
acordo lim itado. Portanto, está fadada ao fracasso q u alq u er coisa
que não seja a total desistência de todas as aplicações d estru tiv as
desse conhecim ento. Mas, u m a desistência total não teria significa
do sem um m onitoram ento irrestrito de todos os p aíses signatários.
Incapazes de su p e ra r as dificuldades p ráticas que tal com prom isso
total colocaria, líderes nacionais fingem que sabedoria convencional
será suficiente p a ra fazer com que este problem a totalm ente incon-
vencional desapareça.
E assim eles n ad a fazem. F u g a da realid ad e e d a r e s p o n s a
bilidade co n tin u am . A diplom acia in tern acio n al to rn a -se u m enig
m a sem sentido, repleto de p ro n u n cia m en to s e p o s tu ra s de au to -
superioridade, com dem onstrações cuidadosas de pêlos eriçados,
grunhidos, ranger de dentes e b atid as de pés. O perigo de lim itar a
proliferação de arm as n u cleares faz com que nossos líderes ignorem
o perigo m aior de deixar que ela continue. R ecusando-se a agir
agora, iludindo-se, acreditando que eles ain d a não têm que fazer su a
escolha, eles n a realidade escolheram . S u a decisão foi a de autodes-
Coerção e s u a s implicações 117
Desistindo
Um outro tipo de b a rra de fuga que m uitos aprendem a
p ressio n ar é parecida com a b a rra de desligar. Em vez de sim ples
m ente desligar-se, eles realm ente desistem . D esistir, com s u a m ui
ta s n u a n c e s de significado, é Mm im portante problem a social de
118 M urray S id m a n
fome. Perm itir que choques ocorram an tes de fazer algo a seu resp ei
to significa desconforto, dor ou d esastre. Muito de nosso com porta
m ento negativam ente reforçado, p o rtanto, parece su sten ta d o pela
prevenção em vez da cessação dos choques d a vida.
E sta é a b ase p a ra a d istin ção en tre fuga e esquiva. Algo
ruim tem que acon tecer realm ente an tes que p o ssam o s fugir; ao
fugir, colocam os u m fim a u m a situ ação ruim . E squiva im pede que
um evento indesejado aconteça, em prim eiro lugar. E squiva bem -
sucedida m antêm afastados os choques, to rn an d o a fuga desn eces
sária.
Esquiva, então, é u m a o u tra form a de reforçam ento negativo.
A coerção n ão som ente gerará e s u s te n ta rá diferentes tipos de fuga,
m as tam bém fará com que nos esquivem os. Nós n ecessariam en te
não esperam os receber um choque an tes de agir; algum as vezes
agimos an tes do tempo. No en tanto, a despeito de s u a ap aren te
orientação p a ra o futuro, a esquiva realm ente acab a sendo com por
tam ento de fuga. E stu d o s de laboratório têm m ostrado que a esquiva
bem -sucedida de choques fu tu ro s é u m a conseqüência secu n d ária
da fuga de choques que já foram experienciados.
As causas da esquiva
O laboratório expõe u m conjunto de características d a e sq u i
va que seriam difíceis ou im possíveis de observar de q u alq u er o utro
modo. Ele aju d a a esclarecer algum as interações en tre esquiva, fuga
e punição que são críticas p a ra a com preensão d a coerção.
Em um tipo de experim ento u m a luz fraca ocasionalm ente
ilum ina a caixa de u m rato de laboratório. O anim al receberia um
choque breve se deixasse a luz ficar acesa por cinco segundos, m as
ao p ressio n ar u m a b a rra ele pode desligar a luz e cancelar o choque.
A luz é um sinal de aviso útil. Pressionando a b a rra em tem po, o
anim al pode evitar o choque e por um fim ao sinal. Se o anim al não
p ressio n a a b a rra dentro de cinco segundos, ele recebe um breve
choque assim que o sinal de aviso term ina. Algum tem po depois, a
luz reaparece e, novam ente, ou o sujeito receberá u m choque depois
de cinco segundos ou p ressio n ará a b a rra e m a n terá o choque longe.
O ciclo repete-se de novo e de novo: prim eiro, u m período de
escuro, u m tem po seguro e, então, u m a luz fraca, um sinal de aviso.
O aniiriàl pode p ressio n ar a b a rra dentro de cinco segundos, term i
n a r o sinal, im pedir o choque e e n tra r em u m período seguro, com e
çando u m novo ciclo. Se o anim al não p ressio n a a b a rra dentro de
cinco segundos após o início d a luz, ele recebe u m breve choque, o
Coerção e s u a s im plicações 137
* Nós podem os, com certeza, ap ren d er por meio de regras, em vez de
e sp e rar p o r conseqüências. Uma criança não tem de se r atro p elad a por
u m carro p a ra ap ren d er que não deve correr n a rua: u m aviso será
suficiente p a ra m antê-la n a calçada. Esquiva governada por regras,
com um ente observada fora do laboratório, não req u er que realm ente
experienciem os os choques, m as o seguir as regras precisa, em princípio,
ser estabelecido por contato com contingências. Análise de laboratório
revela as contingências b ásicas das quais nós derivam os as regras.
Coerção e s u a s im plicações 139
ajuda. E u ainda estou deprim ido, m as agora não me incom oda.” Não
mais trêm ulo, sentindo dor, chorando, o paciente, en tretan to , pode
ainda p a s s a r todo o dia n a cadeira de balanço, evitando com suces
so choques reais ou im aginários.
A pessoa que padece de ansiedade é talvez u m a esposa es
pancada, ou um m em bro do grupo cad a vez m ais reconhecido de
idosos m altratad o s? Ou ela experienciou recentem ente u m a série de
mortes n a família, fracassou n o s negócios, p asso u por hum ilhações
pessoais e doenças físicas? Q ualquer um de u m a série de eventos,
reais ou im aginários, pode tê-la convencido de que o m u n d o externo
é m uito perigoso p a ra se av en tu rar nele. E, então, ela descobre que
sua família, em bora exasperada e m agoada com s u a indiferença,
ainda h á de su p o rtá-la e cu id ará dela. A família poderia ter feito
mais por ela sendo insensível, fazendo-a sa ir d aq u ela cadeira, recu
sando-se a servir de in stru m en to p ara a enferm idade? Se, em vez de
tentar a b ra n d a r s u a an g ú stia interna, seu te ra p e u ta se co n cen tras
se em te n ta r identificar os choques e os reforçadores que estavam
m antendo su a au sên cia de com portam entos, algum a coisa poderia
ter sido feita p ara colocá-la de pé e m ovendo-se novam ente.
N aturalm ente, esquiva não é sem pre ruim ; freqüentem ente
ela é útil. Se devemos sobreviver, tem os que ap ren d er a nos esquivar
de situações potencialm ente perigosas. C rianças não devem tocar no
fogão quente, sa ir da calçada p ara a ru a, p a tin a r no gelo fino ou ir
embora com estran h o s. Todos devem ap ren d er quan d o falar e q u a n
do perm anecer em silêncio, quando av an çar e qu an d o retroceder.
Esquiva útil conduziu à noção de ansiedade útil e ã concepção de
que a ansiedade não deve sem pre ser elim inada. A prendem os m uitos
tipos de esquiva útil, não por meio da experiência real com os cho
ques que evitamos, m as por meio do controle verbal de pais, profes
sores e parceiros. Uma criança que perm anece n a calçada, n a verd a
de não é atropelada por carros, m as e stá realm ente esquivando de
repreensões e o u tra s indicações de desaprovação de seu s pais. Dado
um am biente fam iliar onde predom ina reforçam ento positivo, tais
punições, fracas ou fortes, provavelm ente não devem produzir crian
ças an sio sas ou m edrosas.
E ntretanto, como veremos, m uitos dos efeitos colaterais da
coerção, conceituados por psicólogos clínicos e p siq u iatras como
formas de ansiedade, envolvem atos de esquiva que são d esn ecessá
rios, irrealistas ou não-adaptativos. Ao considerar se a punição fu n
ciona, tem os de levar em conta esses efeitos colaterais. Portanto,
esquiva tem sido um tópico de grande in teresse p ara aqueles que
lidam profissionalm ente com patologia com portam ental. E ntretanto,
144 M urray S id m a n
Aprendizagem lenta
C ontingências de esquiva, então, im postas a u m a nação, ci
dade, escola, sala de aula, hospital, fábrica, loja ou família, estab ele
cem o rígido controle que caracteriza a tirania. Vítimas da tirania,
vivendo sob am eaça constante, raram en te cau sam su rp resas. Esqui-
Coerção e s u a s im plicações 153
va, entretanto, não é sem pre fácil de en sin ar, m esm o p a ra um tira
no. Q uanto m ais forte e m ais freqüente os choques que tom am os,
mais rapidam en te aprenderem os e m ais p ersisten tem en te c o n tin u a
remos a p ressio n ar n o ssa barra. E ntretan to , algum as vezes, falhas
no pressio n ar n o ssa b a rra de esquiva podem ap en as raram en te tra
zer um a punição forte. Nesse caso, podem os "aprender n o ssa lição”
lentam ente. Com choques infreqüentes, pode p a s s a r u m longo perío
do an te s que possam os sab er se ou não estam os sendo bem -su ced i
dos em dim inuir a q u an tid ad e de punição que obtem os. Podemos ter
que tom ar m uitos choques an tes que possam os e sta r certos de que
estam os fazendo algum bem p ara nós mesm os.
Superstições
T entar en sin ar estabelecendo contingências de esquiva pode
trazer um outro resultado problem ático. D iferentem ente de ações
que produzem um óbvio reforçador positivo ou fuga de um punidor,
esquiva bem -sucedida im pede que algo aconteça e, portanto, parece
não produzir qualquer efeito im ediato, ela parece sem propósito. Um
observador, fundam entado em estu d o s de laboratório, conhece a
relação precisa en tre ação e choque, m as a falta de feedback. im edia
to pode obscurecer a situação p ara o sujeito. Como resultado, o ato
de esquiva pode se to m a r b a sta n te diferente daquilo que o professor
pretendia. Por exemplo, sujeitos verbalm ente com petentes podem
perguntar: “O que exatam ente im pede o choque de vir? E u realm en
te te n h o que pressio n ar a b a rra ou ê suficiente me aproxim ar dela?”
A ú n ica m a n eira de descobrir seria se aproxim ar da barra, m as não
pressioná-la.
Sujeitos sob a am eaça de punição forte provavelm ente n u n c a
tentariam fazer o teste. Uma vez que eles pressio n am a b a rra q u a n
do q u er que se aproxim am dela, nem u m dos dois atos ja m ais é
punido; portanto eles acabam em itindo am bos. De fato, am bos po
dem ser necessários — eles certam ente não podem p ressio n ar a
b a rra sem estar perto dela — m as eles não têm qualq u er m an eira de
saber se a sim ples aproxim ação seria suficiente. Ainda pior, eles
podem e sta r b a sta n te convencidos de que u m a ação é crítica quando
ela é realm ente irrelevante. Como alguns sujeitos, por exemplo, em
Coerção e s u a s im plicações J57
vez de sim plesm ente sen tar e p ressio n ar a b arra, eles correm em
volta d a caixa, cancelando choques ao p ressio n ar a b a rra cada vez
que p assam por ela. Eles podem até se vangloriar: "Rapaz, eu desco
bri! Tudo que eu tenho a fazer é ser rápido com os pés, apertando
aquele botão cada vez que passo por ele e eles me deixam em paz.”
Eles terão obtido a liberdade dos choques desem penhando u m ritual
q uase que com pletam ente desnecessário que e n tre tan to “funciona”.
E m bora a esquiva de choque nos en sin e a cu m p rir ordens, a
especificação de como exatam ente cu m p rir ordens pode ser im preci
sa. Com tal falta de precisão, contingências de esquiva podem en si
n a r consideravelm ente m ais do que é desejável, sobrecarregando-
nos com excesso de bagagem com portam ental. É verdade que refor-
çam ento positivo tam bém , p articu larm en te quando imprevisível,
pode fortalecer o que quer que aconteça de estarm o s fazendo ex ata
m ente an tes que v en h a u m reforçador. Nós então incorporam os a
ação irrelevante ao nosso com portam ento aprendido. Esticam os n o s
so braço e, a distância, retiram os a bola de boliche d a valeta: b ate
mos n a m adeira p a ra d ar sorte, a noiva veste algum a coisa velha,
algum a coisa nova, algum a coisa em p restad a e algum a coisa azul.
Mas em u m a situação de reforçam ento positivo, não somos
punidos por te sta r as contingências reais, por te n ta r novas opções.
Portanto, podem os ap ren d er a d escarregar o excesso de bagagem.
Com esquiva, é m uito perigoso fazer qu aisq u er testes. Quão freqüen
tem ente um falante com pulsivo p ára o tem po suficiente p a ra desco
b rir se seu s ouvintes discordam dele? Q uantos em pregados obse
quiosos p ararão de beijar os pés de seu s chefes p a ra descobrir se
então serão despedidos? Apenas crianças que ain d a não ap ren d e
ram a lição, continuam ente testarão os lim ites p a ra ver com o que
elas podem se safar. Q uando usam os contingências de esquiva p ara
e n sin ar filhos, alunos, em pregados, prisioneiros, cidadãos ou escra
vos o que eles devem e o que não devem fazer, é altam en te provável
que nós tam bém estejam os sobrecarregando-os com superstições,
ritu ais e com pulsões.
Evitando o inevitável
Como vimos, o próprio su cesso da esquiva g aran te que ela
finalm ente enfraquecerá e cessará. É n ecessária a punição p ara
conseguir que comecemos a nos esquivar e, m ais tarde, é necessário
um lapso ocasional, com u m a retom ada de punição, p ara m an ter a
esquiva funcionando. E sta sem ente congênita de s u a própria d es
truição tem sido ch am ad a o paradoxo d a esquiva. Se nos esquiva
158 M urray S id m a n
mos com tanto sucesso que os choques jam ais voltam a ocorrer, a
esquiva finalmente se enfraquece e precisamos experienciar o ch o
que de novo antes que o ato de esquiva seja reinstalado.
O paradoxo da esquiva revela u m a diferença crítica entre
reforçamento positivo e reforçamento negativo por esquiva. Com a
esquiva, sucesso origina fracasso; o comportamento enfraquece e
parará a não ser que outro choque o traga de volta. Com reforça
m ento positivo, sucesso origina m ais sucesso; o com portam ento
continua. Se a única razão p ara u m aluno estu d ar for impedir a
reprovação, um fracasso eventual, ou quase fracasso, será n ecessá
rio para mantê-lo estudando. Um aluno que estuda por cau sa das
opções que um a nova aprendizagem tom a disponíveis p arará apenas
se os produtos da aprendizagem se tom arem irrelevantes. Se cidadã
os m antêm -se n a lei apenas porque isto os m antêm fora da cadeia,
eles eventualm ente excederão o limite de velocidade, roubarão em
sua declaração de imposto de renda, darão ou aceitarão caixinhas
ou pior. Cidadãos que se m antêm n a lei por cau sa dos benefícios de
participar de u m a com unidade ordenada não se defrontarão com
tentações cíclicas de b u rlar a lei.
Uma vez aprendida, a esquiva é inerentem ente cíclica. De
pois de receber um choque, trabalham os assiduam ente para m anter
choques distantes. Então, gradualm ente nos tom am os m ais descui
dados, esperando mais e mais antes de pressionar nossa barra;
finalmente um outro choque vem, nos levando de novo a esquivar
eficientemente. Os intervalos entre choques podem se to m ar b a s ta n
te longos, particularm ente, se antes evitamos choques por longos
períodos com sucesso, m as falhas ocasionais no esquivar são n eces
sárias para m anter a esquiva funcionando.
O paradoxo da esquiva to m a possível um tipo de controle
coercitivo que é horrível até mesmo de se p en sar sobre ele. Uma vez
que tenham os nos tom ado tão eficientes na esquiva que choques
vêm apenas raram ente, o paradoxo da esquiva to m a disponível um a
poderosa arm a para qualquer um interessado em nos m anter no
caminho da esquiva. Se eles tiverem controle sobre o choque, podem
eliminar completamente a função adaptativa de nosso com porta
mento de esquiva e, assim, estranham ente, torná-lo ainda m ais for
te.. ’ ■ ■
Remover seu componente realista original pode to m ar a e s
quiva em u m a preocupação que a tudo consome. O experimento
básico tem um sujeito esquivando de choques pressionando u m a
barra; cada vez que ele pressiona, garante um período livre de cho
que de duração variável e imprevisível, algumas vezes alguns seg u n
Coerção e s u a s im plicações 1 bd
quer relação com q u alquer coisa que eles realm ente fizessem ou
deixassem de fazer. Porque as contingências originais haviam gerado
o com portam ento de esquiva requerido — docilidade — os su b se
qüentes choques não-contingentes m antiveram essa form a de esq u i
va acontecendo. Um observador de fora, ou um historiador, podia
ver que su a quieta m arch a p ara o forno era inútil. A m u d a n ça n as
regras aconteceu sem aviso, entretanto, e aqueles que estavam a
ponto de serem assassin ad o s estavam sim plesm ente fazendo o que
as contingências originais os havia ensinado como sendo necessário
para a sobrevivência.
A penas raram en te encontram os controle por punição não-
contingente sendo praticado em situações ab ertas a escrutínio p ú
blico. Mas se quiserm os olhar, podem os ver este tipo de controle
mais próximo de casa. Ele ocorre m ais freqüentem ente em in stitu i
ções p ara onde enviam os aqueles que não querem os ver in tro m eten
do-se em n o ssas vidas cotidianas, p esso as que confiam os a “g u a r
diães". Esquiva é um produto característico do controle coercitivo
em prisões, cadeias, “escolas” p ara retardados, “h o sp ita is” p a ra os
m entalm ente doentes e casas de “repouso" p ara os idosos. N atu ral
mente. assa ssin a to s em m a ssa não ocorrem n estas instituições, m as
encontram os outro s tipos de punições severas u sad as, prim eiro,
para intim idar os in tern o s a ad q u irir form as de esquiva que to m am
o trabalho dos guardiães m ais sim ples e que, então, são aplicadas
não-contingentem ente p ara m an ter a docilidade, cooperação e “re s
peito pela au to rid ad e”.
Em prisões, o confinam ento em solitárias, a rem oção de p ri
vilégios, ab u so físico que não deixa m arcas, e olhar p a ra o outro
lado quando intern o s atacam u n s aos outros são m aneiras-padrão
de p u n ir qualquer um que am eace a seg u ran ça dos carcereiros.
Confinam entos, privação, ab u so s e falha em proteger os internos
uns dos outros, adm inistrados por infrações sem im portância, ou
por n en h u m a razão aparente, tam bém são p ráticas-p ad rão ; estes
choques arbitrário s reduzem eficientem ente sérias violações d a s re
gras. Em instituições p ara retardados, doentes m en tais e idosos,
pessoal sobrecarregado e sem treinam ento ainda u s a violência física,
abuso verbal e isolam ento social não-contingente p a ra reduzir a
disrupção de s u a própria rotina diária.
O casionalm ente, tais práticas cham am a aten ção de um g ru
po de defesa dos direitos hu m an o s ou de u m jo rn alista. O clam or
público su b seq ü en te produz nova legislação, edifícios m odernos ou
um a m u d an ça n a equipe da instituição. À m edida que o problem a
desaparece m ais u m a vez d as vistas do público, a s velhas p ráticas
162 M urray S id m a n
Fuga da esquiva
C ertam ente podem os controlar co n d u ta estabelecendo con
tingências de esquiva, conseguindo que pessoas evitem punição.
Mas, tal controle tam bém produz todos os efeitos colaterais d a p u n i
ção. Uma vez que nossos prisioneiros, alunos, pacientes ou filhos
tenham aprendido a se esquivar de punição severa, a fuga au to m a
ticam ente ain d a se to rn a m ais reforçadora que a esquiva. Se for
possível p ara eles ir em bora, eles irão.
E ste resultad o é fam iliar p a ra todo m undo; as p esso as estão
sem pre fugindo das prisões e de o u tras instituições. Freqüentem ente
lemos sobre fugas de escolas p a ra retard ad o s e reagim os com pena;
tendem os a a trib u ir estas ações ap aren tem en te n ão -ad ap tativ as à
falta de inteligência do fugitivo. O nom e “escola”, en tretan to , quando
aplicado a tais instituições é m uito freqüentem ente um eufemismo.
A sociedade, em bora ocasionalm ente preocupada com o am biente
físico em s u a s escolas p ara retardados, não m onitora o que é en si
nado ali ou como é ensinado. Por c a u sa da equipe freqüentem ente
m al trein ad a e da au sên cia de prestação de co n tas pública, os resi
dentes de tais “escolas” aprendem a ad ap tar-se a contingências de
esquiva que os funcionários estabelecem p ara su a própria conve
niência. Eles aprendem pouco m ais. Fuga deste am biente nem sem
pre indica pouca inteligência. Tam bém pode rep resen tar u m ajuste
perfeitam ente racional a controle coercitivo. Deveríamos ver a fuga
dos retard ad o s como gritos, não por piedade, m as por ajuda.
, Q uando lemos que u m assassin o condenado fugiu da p en i
tenciária e é perigoso e que e stá n a lista dos “m ais pro cu rad o s”,
podem os nos perg u n tar por que alguém escolheria a existência in se
gura e necessariam en te breve de u m anim al caçado, em vez da
relativa seg u ran ça da prisão. Interpretam os a escolha do fugitivo
como evidência adicional de s u a depravação. O casionalm ente estare
mos corretos. Ainda assim , em m uitos desses casos, podem os razoa
velm ente su p o r que as contingências de esquiva dentro d a prisão
èrajn tão severas que to rn aram a fuga, ain d a que tem porária e
provável de term in ar em morte, um poderoso reforçador. N atu ral
m ente, n o ssa su sp e ita algum as vezes seria infunda, m as este é o
prim eiro lugar p ara onde olhar procurando u m a explicação. Coerção
d esum ana, proibida por lei, é, no entanto, tão predom inante n as
Coerção e s u a s im plicações 163
Esquiva adaptativa
P arte de nossos com portam entos m ais úteis são de esquiva:
nos preparam os p ara extrem os de te m p eratu ra vestindo-nos p e sa d a
m ente no inverno e levemente no verão; evitam os acidentes de au to
móveis "dirigindo defensivam ente”; evitam os de nos qu eim ar u san d o
um crem e protetor; prevenim os infecções colocando soluções a n ti
sépticas em cortes e arranhões; m antem os d istân cia d as superfícies
quentes de fogões e lareiras; evitam os o esquecim ento "am arrando
um b arb an te no dedo”; im pedim os fracassos en saian d o u m desem
penho no palco ou u m a apresentação de negócios; fazemos seguros
166 M urray S id m a n
e in v e s tim o s em fu n d o s d e a p o s e n ta d o r ia s . E s ta s s ã o a s a ç o e s d e
p e s s o a s q u e “s ã o p re v e n id a s" e “m a n tê m o c o n tro le ".
Estas características de personalidade não explicam nossas ações. As causas
de nossa antevisão devem ser encontradas nas contingências de esquiva arranjadas
pelo nosso ambiente. Pessoas prevenidas já conhecem diretamente, ou por instrução
verbal, os “choques” dos quais agora se esquivam tão efetivamente; ou
contingências de esquiva em geral têm regulado suas vidas de tal maneira que
elas agora automaticamente se preparam para o pior.
Alguns choques vêm tão raramente que mesmo esquiva útil é difícil de
aprender ou manter. Muitos gastam todos os seus centavos, incapazes de colocar
de lado qualquer quantia para os inevitáveis “dias difíceis”; milhões ainda fumam,
a despeito da perspectiva de doença fatal; ainda é comum encontrar mulheres
grávidas bebendo álcool, fumando e tomando outras drogas, despreocupadas
com os danos causados em seus filhos por nascer; obesidade permanece sendo
um problema nacional, ainda que seja altamente conelacionada com diabetes e
hipertensão e de ser um convite para a morte prematura.
Alguns de nós que nos descobrimos incapazes de economizar, de parar
de fumar, de desistir das drogas ou de perder peso freqüentemente suspiramos
por e desejamos um autocontrole mais forte. Entretanto, o problema real não é
um controle fraco pelo se//-mas um controle fraco pelo ambiente. O que
precisamos não é fortalecer nossa vontade interior, mas rearranjar o ambiente
externo, fortalecendo as contingências de esquiva, ou provendo outros
reforçadores para o comportamento que desejaríamos ter.
Nossos amigáveis gerente de banco, vendedor de seguros e contador
condenam nossa imprevidência como fraqueza de caráter. Eles poderiam nos
ajudar mais reconhecendo o problema pelo que ele é, não um traço irremediável
de personalidade, mas uma esquiva fraca que pode ser remediada. Médicos,
tam bém , n ão são trein ad o s p ara reco n h ecer e an alisar problem as
com portam entais, assim, pacientes que não conseguem seguir suas
recomendações sobre dietas, drogas e medicação deixam-nos desamparados.
Em vez de prescrever uma dose de autocontrole, médicos fariam melhor
apelando para o ambiente social do paciente — amigos e família — em busca
de apoio para obediência. Contadores e médicos não foram ensinados como
obter mudanças comportamentais e, de qualquer maneira, diriam que não
têm tempo suficiente para tanto. Mas manter-se sem ciência da natureza
comportamental do problema não atende aos interesses de seus clientes e pacientes.
Coerção e s u a s im plicações 167
as punições por participação não podem ser elim inadas. Uma parte
im portante d a solução do problem a, então, deve ser to rn a r a esquiva
m ais difícil.
Algum as com unidades retiraram o poder dos rep resen tan tes
eleitos de intervir em favos de qualquer um selecionado como ju r a
do. R aram ente elas foram tão longe a ponto de re tira r esse poder de
todas a s autoridades, eleitas ou indicadas, de modo que aqueles
com influência política, financeira ou social ain d a podem se m an ter
não-envolvidos. P ara im pedir a esquiva do serviço por meio de solici
tações políticas, pressões sociais ou sim plesm ente corrupção a s co
m unidades terão que elim inar as vias de influência.
Elas tam bém terão de to m a r o u tras form as de evasão mais
difíceis. Por exemplo, tendo sido cham ado p a ra com por o jú ri, pode-
se facilm ente não p articipar em qualquer caso p articu lar fazendo
com que um advogado de defesa ou prom otor desconfie de su a
im parcialidade. Pode-se arg u m en tar oposição à p en a capital, crença
em que estupro sem pre é provocado pela vítima, ser a favor ou
contra o m ercado, e s ta r convencido de que televisão in cita a violên
cia, afirm ar que in san id ad e não é desculpa p a ra o assassin ato , já ter
form ado u m a opinião sobre o caso, ou ser filosoficam ente u m a n a r
quista. U m a vez que se te n h a sido acu sad o p o r cau sa dos problem as
que tal viés provocará, freqüentem ente se está livre de ch am ad as
posteriores. P ara to m a r esta ro ta de esquiva m enos vantajosa, aq u e
les cham ados p a ra p articip ar do jú ri poderiam ser requisitados a
m an ter-se disponíveis por u m período fixo de tempo. Então, ainda
que recu sad o s em u m caso p articu lar, eles não poderiam ir em bora
antes daqueles que se perm itiram ser selecionados.
O que é “anormal”?
J á deveria ser evidente que a crise com portam ental é um
resultado direto de processos de controle norm ais; co n d u ta anorm al,
tam bém , é regida por leis. Assim como a pesq u isa sobre reações
coiporais norm ais a ataq u es virais levou à possibilidade de prevenir
a influenza, a pesquisa sobre aju stam en to s com portam entais n o r
m ais ao controle coercitivo tem levado à possibilidade de m elhorar
algum as form as de doença m ental.
C laram ente, m uitos fatores podem co n tribuir p ara a doença
m ental e qualquer caso p articu lar requer a consideração de todas as
possibilidades: sociais e individuais, in tern as e externas. Mas no
final, vem os doença m ental n a conduta. C om preender e fazer algo
sobre a anorm alidade requer análise com portam ental. Q uando efe
tuam os essa análise, freqüentem ente descobrim os que as leis do
controle coercitivo, atu an d o por meio de contingências de punição,
fuga e esquiva, fornecem bases efetivas p ara tratam en to .
E m bora u m a com preensão do cará ter ordenado do com porta
m ento p o ssa trazer a prevenção e a c u ra de m u itas doenças m en
tais, m uitos p siq u iatras e psicólogos agem como se tal com preensão
não fosse possível. P ara definir anorm alidade eles não especificam
processos com portam entais m as, em vez disso, u sam grosseiros cri
térios estatísticos. Eles vêem com su sp eita e ten tam c u ra r qualquer
ação que se desvie do usual.
P ara onde nos teria trazido a m edicina científica se tivesse
considerado a influenza anorm al apenas porque era relativam ente
rara? A lógica teria nos dito, então, que o problem a da influenza
poderia ter sido resolvido do modo m ais duro — livrando-se dela —
194 M urray S id m a n
Coerção e a consciência
Origens da consciência
As raízes da consciência estão no controle coercitivo. Punição
real ou am eaçada nos en sin a o significado de "ruim ’'. Tendo sido
Coerção e s u a s im plicações 199
Consciência e controle
Monitorar todas as ações de todas as pessoas não é apenas
repugnante por princípio, m as é tam bém impossível. Apenas d u ra n
te a infância a completa supervisão é m ais ou menos factível e o
desenvolvimento da consciência é u m dos principais objetivos do
treinam ento e educação iniciais. Quando a supervisão direta se to r
na impossível, confiamos n a consciência p ara m anter a integridade
de nossos direitos e liberdades.
Após u m a breve “lua de mel”, quando impomos poucas re s
trições sobre as crianças, começamos a ensiná-las o que é permitido
e o que não é. Estabelecemos limites. Quase sempre o fazemos
punindo-as quando elas ultrapassam os limites. Raram ente lhes
damos algo bom simplesmente por perm anecerem dentro dos lim i
tes, simplesmente nos refreamos de puni-las. Cientes de que os
jovens ainda não aprenderam todos os caminhos da civilização — ou
seus perigos — pais, professores e o público em geral m antêm os
olhos constantem ente abertos sobre eles, não apenas p ara proteger
sua saúde e segurança, m as tam bém para eliminar sinais de deso
bediência, descortesia, desordem, agressão, furto ou destruição de
propriedade e linguagem "feia”. D urante a adolescência, a vigilância
se to m a de algum a m aneira ainda mais cerrada; a emergente sex u a
lidade coloca o adolescente em contato com novos tabus.
Restrições durante a infância e a adolescência, um tem a co
m um h a poesia e no romance, é quase universal. Inculcamos a cons
ciência cedo, quando o controle direto é factível, punindo toda condu
ta que não está de acordo com nossos padrões. Como o animal de
laboratório que pressiona su a barra porque é punido por fazer q u al
quer outra coisa, as pessoas, também, aprendem a pressionar q u ais
quer barras que não lhes tragam choques. Qualquer ação não-puni-
da se tom a segura; todas as outras vão para o saco intitulado “cons
ciência”.
Assim como o animal de laboratório, que gasta todo seu tem
po esqUivando-se de choques, pessoas que têm um a consciência forte
Coerção e s u a s im plicações 203
Supressão condicionada
No experim ento básico, o sujeito, m ais u m a vez um rato de
laboratório, aprende a obter alim ento pressionando u m a b arra; mas,
como m uito de nosso próprio trabalho, o trabalho do anim al é pago
Coerção e s u a s im plicações 209
apenas ocasionalm ente; ele não obtém alim ento toda vez que p re s
siona a b arra. Algumas vezes ele pode tra b a lh a r por cinco m inutos
sem sucesso, algum as vezes por dois m inutos, o u tra s p o r apenas
dois segundos. Na média, u m a vez a cad a 30 segundos ele obtém
alim ento quand o pressiona a b arra, m as o tem po en tre tentativas
bem -sucedidas é imprevisível. E ste esquem a m antém o sujeito tra
balhando estavelm ente, u m requisito im portante porque vam os pro
cu rar por variações em s u a taxa norm al de trab alh o quando um
choque inevitável o am eaça. P ara que n o ssas observações sejam
confiáveis precisam os de u m a linha de b ase de produtividade e s tá
vel, da qual possam os m edir q u aisq u er afastam entos.
Agora, en q u an to o sujeito e stá trab alh an d o por seu alimento,
ligamos um sinal, u m tom que d u ra um m inuto. Ao final do m inuto,
assim que o tom cessa, um breve choque (um décimo de segundo)
aparece. D iferentem ente do choque que o sujeito pode prevenir, este
é inevitável, n a d a que o sujeito p o ssa fazer o m a n terá longe. Em bora
desam parado co n tra o choque im inente, o sujeito pode co n tin u ar a
pressionar a b a rra d u ra n te o tom e o alim ento ain d a virá como
antes.
O nde vemos isto fora do laboratório? O chefe nos ordena
para irm os, dentro de cinco m inutos, a s u a sala p a ra explicar n o ssa
decrescente curva de vendas. E stam os livres p a ra co n tin u ar ligando
para clientes e assim fazer n o ssas v endas au m en tarem , ou p ara
conversar com a secretária, ou p a ra beber u m copo de água, m as
estam os n a m esm a posição que o anim al, confrontados com um
choque inevitável. E speram os não en co n trar este tipo de situação
com freqüência, N enhum a restrição física é colocada sobre nós e,
ainda assim , com relação ao choque, não tem os opções; não h á
m aneira de fugir ou esquivar.
No laboratório, depois do tom e do breve choque, p assa-se
um intervalo de duração imprevisível an tes que o sinal ap areça de
novo. Uma vez que ele volte, ele perm anece por u m m inuto e term i
na com o choque inevitável. De quando em quando, o sujeito expe-
riencia este paream ento entre tom de u m m inuto e choque breve,
mas pode co n tin u ar a obter alim ento d u ran te e en tre os sinais de
aviso.
Uma vez que o anim al n ad a pode fazer em relação ao choque
im inente, poder-se-ia esp erar que ele sim plesm ente se m antivesse
trabalhando p a ra viver, d u ran te os sin ais de u m m inuto. Se ele
pudesse falar, ele sim plesm ente poderia dizer: “A vida é assim ; por
que lu ta r contra o m undo?” M as não é isto que u su alm en te aconte
ce, o sujeito não tra ta o sin al de aviso com tal resignação filosófica.
210 M urray S id m a n
com sucesso. Não podem os perder de v ista as cau sas: (1) os sinais
de aviso p ara (2) choques inevitáveis, sobrepostos a (3) u m a linha de
b ase de atividade positivam ente reforçada.
A reação do sujeito ao sinal de aviso de choque inevitável é
tão d esad ap tad a q uanto qualquer com portam ento visto no laborató
rio. A ansiedade — o pânico e a cessação de todo com portam ento
produtivo — ê contraproducente, levando o sujeito a p erd er todo o
alim ento que teria ganho se co n tin u asse a tra b a lh a r d u ra n te o sinal
de aviso.
Agressão
Os estud o s de laboratório que tem os visto até aqui investiga
ram os efeitos d a coerção sobre indivíduos em am bientes que não
incluíam outros sujeitos. Agora com pliquem os u m pouco o arranjo,
colocando um segundo sujeito ao lado do prim eiro. Veremos algum a
coisa nova. Se aplicarm os u m choque em ap en as u m dos dois su jei
tos, este a tacará o outro. A agressão não é nem ritu alística, nem
m om entânea: se não separarm os os dois, o ataq u e term in ará com
um assassin ato .
Agressão induzida por punição tem sido en co n trad a em m u i
ta s espécies, incluindo a n o ssa própria. O atacan te e o atacado nem
m esm o precisam ser da m esm a espécie: u m cam undongo que rece
beu um choque atacará u m rato, um rato a tacará um gato.
Felizmente, podem os investigar agressão induzida por coer
ção sem realm ente fazer com que os sujeitos tentem m a ta r u n s aos
outros. Isto porque se n en h u m ser vivo estiver por perto, um sujeito
que recebeu um choque m orderá objetos inanim ados. Portanto, e s
Coerção e s u a s im plicações 221
Como nosso apêndice, que supostamente uma vez teve uma função útil,
o mecanismo inato de agressão induzida por punição e privação é um anacronismo
evolucionário; ele não mais provê uma vantagem para a sobrevivência e, ao
contrário, envenena seu hospedeiro. A ciência transformou a guerra em um
instrumento de autodestruição. Ela também nos deu o conhecimento técnico
necessário para eliminar a fome e a pobreza que têm freqüentemente instigado a
agressão internacional. A informação pode agora ser transmitida com tal
velocidade que a ignorância não é mais uma desculpa para o conflito. A tecnologia
agrícola tomou possível que todos no mundo tenham alimento suficiente. Materiais
e tecnologia de construção colocaram a habitação adequada ao alcance de todos.
Fome e ausência de habitação tornaram-se tragédias desnecessárias. A análise
científica do comportamento, embora esteja longe de prover todas as respostas de
que necessitamos, mostrou como ensinar efetivamente e como influenciar a conduta
não-coercitivamente. Com tais recursos construtivos disponíveis, a civilização
não pode se dar ao luxo de reações automáticas e impensadas às pressões coercitivas.
Contracontrole
A longo prazo, o controle coercitivo continua a funcionar somente se
o controlador tiver uma população cativa. Mas, mesmo se os punidos forem
confinados ou restringidos fisicamente e não puderem escapar, a coerção
inevitavelmente produz um de seus mais proeminentes efeitos colaterais:
contracontrole. Se as pessoas não podem fugir ou esquivar-se, elas descobrirão
uma outra maneira de acabar com punições ou ameaças de punição; elas
aprenderão como controlar seus controladores. Alunos que são punidos por
não aprenderem suas lições, rapidamente aprendem como lidar com a situação.
Seu contracontrole pode ou não envolver agressão aberta: eles fingem doenças,
ou realmente tomam-se doentes; eles copiam de outros alunos; eles distraem
outros alunos e disruptam toda a situação de aprendizagem, tornando
impossível para o professor distingui-los; ou, em uma direção aparentemente
oposta, um estudante explora sua personalidade envolvente, “jogando charme”
e desviando o professor de uma avaliação válida de seu desempenho; ou,
como parece estar acontecendo cada vez mais freqüentemente, alunos atacam
fisicamente o professor. Se o professor é muito forte, ou as autoridades muito
poderosas para que os alunos os enfrentem, à noite eles destroem ou ateiam
fogo n a escola. V andalism o na escola, um a m ed id a de
Coerção e s u a s im plicações 2 25
Criaturas do momento
Por que acreditam os tão fortem ente n a punição? Por que
controlam os os outros levando-os a fugir ou esquivar de punição?
, Sem pre que quiserm os conhecer as razões de qualquer conduta, a
prim eira questão a fazer é; “Qual é o reforçador?’’ Q ual é o nosso
pagam ento por p u n ir e am eaçar pu n ir? Se puderm os en co n trar o
reforçador, terem os dado um enorm e passo n a direção da com preen
são de nossa própria conduta e, então, de fazer algo por ela.
232 M urray S id m a n
“Coerção é fácil” •
U m a ação p u n id a p ára im ediatam ente, aju d an d o a criar a
ilusão de que a punição realm ente cum pre su a tarefa. Um tapa
ligeiro, um grito, ou ap en as u m gesto ou olhar am eaçador podem ser
suficientes p a ra fazer com que crianças, cônjuges ou alu n o s in ter
rom pam o que estão fazendo. Com um esforço mínimo, u m refém
aprisionado, um oficial assassin ad o ou u n s poucos cidadãos depor
tados ou baleados m antêm -se instituições, com unidades e nações
n a linha.
A curto prazo, a punição é freqüentem ente o cam inho fácil,
m as “fácil” é u m a coisa relativa. Em bora Bobby F isher fizesse p are
cer fácil participar de um cam peonato de xadrez e M artina Navratilo
va jo g a r tênis, não é fácil p ara nós im itá-los. Coisas feitas por espe
cialistas sem pre parecem fáceis, m as geralm ente eles trab alh am
duro p ara fazê-las parecer assim . É possível, tam bém , influenciar
com portam entos de m aneiras não-punitivas e fazer isto p arecer fá
cil, m as aprender como fazê-lo exige trabalho. Punição é fácil no
Coerção e s u a s im plicações 233
Um princípio norteador
J á que o predom ínio do controle coercitivo nos leva a aceitar
a punição e a am eaça como n a tu ra is e inevitáveis, m u itas vezes
im aginam os que n o ssa ú n ica opção é o não-controle. E sta incom
preensão básica do controle com portam ental é um motivo p ara o
fracasso geral d a sociedade n a exploração e no desenvolvim ento de
alternativas p ara a coerção. Ao descobrirm os e an alisarm o s as ori
gens do com portam ento cada vez m ais complexo, som os obrigados a
concluir que a au sên cia do controle é u m a ilusão. A associação de
influências hereditárias, biológicas, de p esso as e de lugares m ode
lam tudo o que fazemos. A opção de escolha entre o controle coerci
tivo e o não-controle não e stá disponível. U m a vez que ten h am o s nos
libertado do mito do não-controle, opções g en u ín as realm ente se
evidenciam. Que tipo de controle querem os? C onstruirem os u m am
biente social coercitivo ou não-coercitivo?
Reforçam ento negativo, reforçam ento positivo e punição são
trê s fontes poderosas de controle com portam ental. Os reforçadores
negativos fortalecem q u aisq u er ações que os façam cessar ou d esa
parecer. Os reforçadores positivos fortalecem q u aisq u er ações que os
te n h am produzido. O único aspecto benéfico que o reforçam ento
negativo nos proporciona é u m sentim ento de alívio; algum a coisa
ruim cessou ou foi-se em bora. O reforçam ento positivo nos deixa
com algo que desejam os, ou em condição de fazer ou obter algo
vantajoso, com com portam entos e recu rso s que nos ocupam produ-
248 M urray S id m a n
tivam ente e com sentim entos que não são de alívio, m as de satisfa
ção. Som os punid o s quando acontece algum a coisa que seria n eg ati
vam ente reforçadora se pudéssem os cessá-la — talvez o chefe que
nos repreende após chegarm os a tra sa d o s ao trab alh o — ou quando
perdem os algo que seria positivam ente reforçador se pudéssem os
produzi-lo — o pagam ento d as d u a s h o ras que o chefe descontou.
Coerção é controle por meio de reforçam ento negativo e p u n i
ção. O reforçam ento positivo realm ente controla com portam ento ta n
to q u an to a coerção. Mas ele pode nos en sin ar novas form as de agir
ou m a n te r aquilo que já aprendem os, sem criar os su b p ro d u to s
típicos da coerção — violência, agressão, opressão, depressão, infle
xibilidade em ocional e intelectual, auto d estru ição e destruição dos
dem ais, ódio, doenças e estado geral de infelicidade. N orm alm ente
punim os com o intuito de evitar u m a co n d u ta que consideram os
prejudicial, perigosa ou indesejável por o u tras razões. Justificam os
a coerção em nom e da educação, da civilização, d a m oralidade e da
defesa própria. “É de pequenino que se torce o pepino”; “aqui se faz
e aqui se paga": “é preciso com er o pão que o diabo am asso u p ara
ser digno do reino dos céu s”; “olho por olho, dente por d en te”; “quem
com ferro fere, com ferro será ferido.”
É claro que tais técnicas são com pletam ente coercitivas. Elas
são b asead a s n a privação socialm ente im p o sta e n a fuga e esquiva
que tal privação gera.
A punição por meio de choques ou de privação to m a a fuga
reforçadora. Se privam os prisioneiros, alunos, crian ças ou outros de
s u a s necessidades, direitos e privilégios b ásicos p a ra criar reforça-
dores, esses reforçadores são negativos e não positivos. Eles podem
servir tem porariam ente p a ra m an ter a ordem em pavilhões p en iten
ciários, quartéis e salas de aula, m as tam bém produzirão os efeitos
de longo prazo do controle coercitivo.
Contudo, a privação de fato contribui p ara a efetividade dos
reforçadores positivos: tem os pouco in teresse p o r com ida logo após
u m a boa refeição, m as a com ida influencia poderosam ente n o ssas
ações quando a h o ra d a refeição se aproxim a: o apetite sexual dos
m arinheiros, após u m a longa viagem no m ar, é lendário: em bora os
indivíduos variem m uito, o que fazem p ara g a n h a r dinheiro e o que
fazemos com o dinheiro ganho depende m uito da q u an tid ad e de
dinheiro que já possuím os. E ntretan to , em bora a privação to rn e os
reforçadores positivos m ais fortes, ain d a assim não é necessário
im por privações deliberadam ente p a ra fazer u so de reforçadores po
sitivos. N inguém tem o suficiente de tudo; geralm ente não é neces
sário m uito extra p a ra descobrir os reforçadores que já são eficientes
sem privação adicional.
M inha preocupação aqui ê o u so da privação como in s tru
m ento de coerção. Em certos casos extrem os, a privação por um
breve período pode produzir conseqüências desejáveis que n ão são
possíveis de algum a o u tra forma. Depois que todos os ou tro s já
desistiram ain d a se pode conduzir u m a criança re ta rd a d a no cam i
nho d a aprendizagem efetiva. Primeiro, deixe-a com fome, então, use
o alim ento como reforçador p ara algum com portam ento básico,
como com er sozinho ou seguir in stru çõ es sim ples. Uma vez que a
criança te n h a aprendido esses com portam entos, poder-se-á d esen
volver outros reforçadores e su sp e n d er a privação de alim ento. Em
casos de retardo extrem o, ou quando u m tratam en to an terio r incom
petente tornou u m a criança insensível aos m étodos-padrão de in s
trução, ta n to a criança como a com unidade ach arão a privação
tem porária benéfica.
Mesmo n essas ocasiões, u sa-se a privação ap en as p ara a u
m e n tar a atratividade de u m reforçador positivo e n ão p a ra p u n ir o
com portam ento insatisfatório. Uma vez que a criança ap ren d a a l
gum com portam ento adaptativo, rapidam ente se interrom pe a priva
ção, sem am eaçar utilizá-la novam ente. R etirar alim ento, b en s, pri-
258 M urray S id m a n
* Uma vasta literatura técnica m ostra que os erros não são u m a parte
necessária do processo de aprendizagem, m as os analistas do
com portamento ainda não ofereceram este m aterial em um a linguagem
mais acessível p ara leigos. A modelagem do com portamento — ensinar
novo com portamento reforçando gradualm ente aproximações sucessivas
ao que é desejado — pode transform ar o método de tentativa e erro em
tentativa e sucesso no ensino de habilidades m otoras tais como a
produção de sons em instrum entos m usicais ou a pronúncia de palavras.
O ensino de seqüências longas de ações tais como am arrar sapatos,
soletrar palavras ou program ar com putadores pode avançar sem erros se
o professor parte do final da seqüência e trab alh a de trás p ara frente.
Com a modelagem am biental habilidosa — ensinar novas relações entre
com portamento e ambiente, m udando gradativam ente o am biente de
formas familiares para desconhecidas — as crianças podem aprender
sem erros a copiar, escrever e dizer as letras do alfabeto; estudantes de
m edicina podem aprender a e stru tu ra básica do sistem a nervoso sem
cometer nenhum erro, de modo que a princípio acharão difícil acreditar
Coerção e s u a s im plicações 261
que realm ente estão aprendendo algo. Procedim entos que estabelecem
relações de eqüivalència entre palavras faladas, palavras escritas e
figuras proporcionam às crianças vocabulários sim ples de leitu ra e de
linguagem que n u n c a foram explicitam ente en sinados e que elas utilizam
corretam ente m esm o n a prim eira vez. E n sin a r sem erros é u m a área
ativa de pesquisa, com novos m étodos e aplicações em rápido desenvol
vimento.
262 M urray S id m a n
A polícia: d e que lado está? A auto rid ad e que cum pre a lei em
u m a sociedade é a polícia. As forças policiais m unicipais, estad u a is
e federais são. geralm ente, in stru m en to s de coerção. Salvo algum as
exceções, as principais tarefas a elas a trib u íd as são am eaçar de
co n tra-ataq u e q u alq u er pessoa te n ta d a a desviar-se de nossos p a
drões legais de paz e decência e aplicar a força da rep ressão contra
q ualquer um que realm ente se desviar.
O governo cada v=z m ais freqüentem ente solicita auxílio poli
cial p ara proteger segm entos ricos e poderosos d a sociedade das
pessoas q ue são m enos favorecidas. C ontra um cenário de pobreza,
preconceito racial e outros problem as sociais complexos, a coerção
policial em m u itas regiões está se to rn an d o m ais severa e violenta do
que erá. E à m edida que a contraviolência dos pobres, despossuídos
e dos jovens idealistas aum en ta, a polícia tam bém está sendo levada
a agir m enos seletivam ente, tendendo a tra ta r q u alq u er encontro
com ó público em geral como am eaça em potencial p a ra s u a própria
segurança.
Coerção e s u a s im plicações 267
paz. As pom bas acu sam as águias de cau sar, em vez de im pedir, as
guerras, e a s águias acu sam a s pom bas de irrealism o, de sim ples
m ente pedir a autodestruição.
C ertam ente, n en h u m país pode fechar os seu s olhos à possi
bilidade de ataq u e por u m outro e, ain d a assim , a noção de força
superior tem , ela m esm a, se to m ad o irrealista; várias nações têm
agora explosivos nucleares suficientes p a ra d e stru ir todo m undo. É
realm ente im praticável te n ta r influenciar o u tras nações não-coerciti-
vam ente? A analogia d a pom ba-e-águia tem u m segundo sentido
curioso. É igualm ente n a tu ra l ser q u alq u er dos dois tipos de p á s s a
ro e am bos têm valor, m as as pom bas parecem ser sobreviventes,
enquanto que as águias são u m a espécie em extinção.
Reforçam ento positivo, em bora não gere a inim izade e a con-
tra-ag ressão que vem a trá s da coerção, ê, en tretan to , u m a co n tin
gência; não significa d a r tu d o em tro ca de nada. P ara serem efetivos,
reforçadores positivos devem ser contingentes à co n d u ta e à s cir
c u n stâ n c ia s em que a co n d u ta ocorre. Em bora não-coercitivo, a
m enos que o m au uso o transform e em reforçam ento negativo, refor
çam ento positivo ain d a é controle com portam ental.
Como vimos, o d a r não-contingente tam bém é u m a form a de
controle e pode se r destrutivo, gerando com portam ento que não é de
interesse p a ra ninguém . D ar incondicionalm ente não é o oposto de
coerção. Se pais dão a seu s filhos tudo o que eles querem in d e
p en d en tem en te de como eles agem, as crian ças não aprenderão
n a d a de útil p a ra si m esm as, p a ra seu s pais ou p a ra a sociedade em
geral. Uma nação dando a u m a o u tra tudo o que e sta o u tra quer,
independentem en te do que esta faça, não conseguirá que a que
recebe funcione produtivam ente ou pacificam ente n a sociedade
m undial. D ar não-contingente não significa generosidade; produz
seu s próprios efeitos colaterais destrutivos.
Por outro lado, o paradoxo da esquiva (Capítulo 9) im pedirá
q ualquer política coercitiva de m anutenção da paz de se r com pleta
m ente bem -sucedida; ninguém pode co n tin u ar se esquivando p ara
sem pre sem receber u m choque ocasional. Intim idação por meio de
a rm a s n ucleares sofre de u m a desvantagem especial. Q uando o cho
que inevitável vier, ele colocará um fim em todc. a co n d u ta h u m an a.
Por e ssa razão, u m a política exeqüível p a ra intim idação m ú tu a re
. quereria a restrição de arm am entos p ara arm as m enos destrutivas.
Mesmo com u m a paz que m an ten h am o s pela intim idação m ú tu a, o
desarm am ento n u clear seria necessário. Um conflito arm ado ocasio
nal que não d e stru a todo m undo poderia então servir como o lem-
278 M urray S íd m a n
seu térm ino tão temido. O resto do m undo não pode ser resp o n sab i
lizado pela coerção ali p raticad a pelo governo branco, ain d a assim
nosso fracasso em exercer u m a influência efetiva ajudou a g aran tir
que os dias d a m inoria b ra n c a — seja no poder ou fora dele — estão
contados. Violência sem perdão não é m ais evitável. R ealm ente o
governo será tom ado por aqueles que não têm habilidades p a ra o
governo, o comércio por aqueles que são tecnológica e gerencialm en-
te não-treinados e a educação por aqueles que não receberam ed u
cação. E porque os E stados Unidos foram percebidos como a nação
m ais capaz de im pedir que tu d o isto acontecesse, perm anecerão, no
futuro previsível, como um objeto de ódio n aq u ela p arte do m undo.
Talvez n e n h u m estrangeiro p u d esse ter im pedido o sofrim ento dos
negros sul-africanos, m as não podem os ignorar a possibilidade de
que técnicas com portam entais m ais efetivas poderiam ter im pedido
a tragédia que é im inente. Precisava te r acontecido? E sta experiên
cia horrorosa levar-nos-á a te n ta r alternativas?
vernos e das m ais influentes igrejas perm item ser levados com os
olhos vendados p ara ru d es negociações onde discutem pagam ento
com raptores hostis e que os desprezam . A m ídia coloca as negocia
ções no palco central do m undo: ap en as as finais de futebol am eri
cano e de futebol internacional obtêm ta n ta publicidade.
Im agine o sentim ento de poder e grandeza no peito dos terro
rista s à m edida que se vêem e ouvem seu s feitos discutidos de canal
em canal e de página em página da mídia. O que deve significar para
p esso as que o m undo tra to u com desprezo superior, descobrir que
eles foram capazes de virtualm ente v arrer do m ap a a in d ú stria do
tu rism o in ternacio n al sim plesm ente detonando algum as poucas
bom bas em aeroportos? Há m an eira m ais sim ples de to rn ar conheci
da s u a existência do que ra p ta r e m a ta r alg u n s poucos indivíduos
sem defesa, ou p la n tar u m a bom ba relógio ou m etralh ar um in d u s
trial ou político im portante? Os feitos de q u alq u er herói receberam
m ais reconhecim ento?
Negociando e pagando resgate e fornecendo publicidade ili
m itada, governos e m ídia têm estado su prindo reforçam ento positivo
que garan te a continuidade do terrorism o. Talvez seja m uito tarde
agora para governos utilizarem reforçam ento positivo como deveriam
ter u sad o originalm ente p a ra criar alternativas aceitáveis como
m eios de protesto ou p a ra to rn a r o protesto desnecessário. D ada a
polarização atu al, pode ser que governos não ten h am q u alq u er esco
lha a não ser contracoerção violenta p a ra p a ra r o terrorism o.
O reforçam ento do terrorism o pela m ídia trouxe de volta o
ressurgim ento de u m a velha am eaça, a cen su ra. E ssa solução p ara
o problem a d a m ídia é im pensável. A livre com unicação de notícias e
opinião é u m a d as m ais fortes proteções que um povo pode ter
contra aqueles que atingiriam seu s objetivos por meio de coerção.
No entanto, o contínuo apoio da m ídia ao terrorism o está tornando
difícil p ara cidadãos conscientes m a n ter s u a oposição à censura.
Aqueles que prefeririam , por o u tras razões, ver n o ssa s fontes de
inform ação am ord açad as já estão fazendo b aru lh o n e s s a direção,
apontando como justificação a exploração bem -sucedida d a mídia
pelo terrorism o.
O reconhecim ento de seu papel no reforçam ento dos ato s de
terrorism o e de seu próprio perigo deveria, portanto, en g en d rar um a
certa auto-restrição responsável por p arte da mídia. A desculpa de
que toda notícia tem de ser p u b licada ê paten tem en te falsa; jam ais
foi possível rela tar tu d o e editores sem pre tiveram de escolher o que
publicar. O problem a real é que a m ídia n u n c a desenvolveu critérios
p a ra decidir o que rela tar e o que não dizer. C onsiderar as conse-
288 MurraySidman
comum de atribuir notas “pela curva”. Alunos com o resultado mais alto na
prova recebem A, mesmo que só acertem 50% das questões; e assim, um resulta
do tão baixo quanto 25% de acerto provavelmente terá uma nota que permite
passar. D ar notas a alunos apenas em relação uns aos outros, abandonando
qualquer pretensão de que suas notas signifiquem competência, toma possível
ao sistema passar para diante um número “respeitável”. A maior parte do
reforçamento em educação é negativo — fuga de notas baixas e punições asso
ciadas; o pouco reforçamento positivo que o sistema provê não é contingente a
aprender.
* Três livros n e sta área são especialm ente com preensíveis, relevantes e
instrutivos. Um trabalho germinal sobre m étodos efetivos de in stru ção é:
B. F. Skinner. The technology o f teaching. Nova lorque: A ppleton-C entury,
Crofts, 1968. Um sistem a que aplica a m aioria dos princípios conhecidos
de reforçam ento positivo n a educação e que ac resc en ta alguns novos
elem entos criativos foi introduzido por Fred S. Keller em um artigo
intitu lad o “Good-bye, teach er...’’, u m a frase tom ada d a bem conhecida
canção de liberdade can tad a pelas crianças ao final do ano escolar. Este
artigo, ju n to com outros de interesse, pode ser encontrado em: F. S.
Keller, Summers and sabbaticals. C ham paign, Illinois: R esearch Press,
1977. Um outro livro, fino em núm ero de páginas, m as p en e tran te em
su a crítica, grande em s u a h u m an id ad e e generosidade, é u m clássico
a in d a não-descoberto: F. S. Keller, Pedagogue’s progress. Ele pode ser
obtido n a ABA, 260 Wood Hall, W estern Michigan University, Kalamazoo.
MI 49008. '
292 MurraySidman