W. R. Bion
W. R. Bion
Nota do tradutor
1Felipe Ferreira De Nichile: psicólogo clínico, docente e supervisor clínico do curso de Formação em
Psicanálise no Centro de Estudos Psicanalíticos, mestre em psicologia clínica pelo núcleo Formações da
Cultura e Subjetividade pela PUC-SP e membro filiado ao instituto Durval Marcondes da SBPSP.
Consultório: Rua São Carlos do Pinhal, nº124, Bela Vista, São Paulo, CEP 01333-000 fone (11) 99915
8400.
Apresentação da versão em castelhano
Tentar escrever um prólogo para a versão castelhana deste livro de Bion não é uma
tarefa nada fácil. Não que eu me sinta influenciado pela complexidade de seu
desenvolvimento ou pela obscuridade de alguns de seus conceitos. O que mais sinto é a
dificuldade daquele que percebe a transcendência de uma obra de criação, seja artística
ou científica, e não consegue encontrar palavras adequadas para transmitir o enorme
impacto que recebeu. Se sua leitura me sugeriu a comparação com uma obra de arte,
digamos um estranho e ao mesmo tempo fascinante quadro que nos atrai intensamente,
mas que nos deixa meditando largamente para decifrar o seu sentido, não foi por uma
razão fortuita. É a sensação que a leitura de algumas passagens deste livro produziu não
somente em mim, mas também em outros leitores. Contudo, simultaneamente, quando
submergíamos em outros capítulos, sentíamos a admiração que desperta a precisão do
desenvolvimento de um conceito matemático, a profundidade de um pensamento
filosófico que abarca inquietudes básicas da vida, ou o rigor com o qual é exposto
determinado raciocínio lógico. Por alguma razão é um livro que se ocupa das
experiências emocionais que se atêm as teorias do conhecimento.
Bion nos adverte desde o início que utiliza certos termos como “função” e “fatores”
com uma deliberada ambiguidade, ainda que possam se prestar à confusão pelo fato
destas palavras permanecerem associadas com as matemáticas e com a filosofia, seu
propósito, precisamente, é que o leitor recorde e leve em conta estas ciências enquanto
percorre as páginas do livro. Pelo mesmo motivo, frequentemente intercala citações que
correspondem a estas ciências. Assinala, também, que o livro foi estruturado para ser
lido sem nos determos nas partes que resultam obscuras. Com toda honestidade admite
que a obscuridade de alguns pontos deve-se ao fato de não ter tido a capacidade de
esclarecê-los; contudo, estimula o leitor a seguir avançando na leitura “apesar da
penumbra de associações” e a buscar a gratificação do esclarecimento logrado, em
grande parte, pelo próprio esforço.
Bion propõe uma teoria das funções para ser aplicada a teoria e a prática psicanalíticas.
Sustenta que seu uso dará maior flexibilidade a teoria psicanalítica, por poder ser
aplicada às situações analíticas mais diversas, “sem prejudicar a permanência e a
estabilidade da estrutura da qual é parte”. Na prática a teoria das funções e
especialmente o que denomina teoria da função-alpha, possibilitaria formular
interpretações a um paciente para lhe mostrar de que modo tem sentimentos e não
consegue aprender com eles e tem sensações de que tampouco consegue aprender algo.
As interpretações derivadas destas teorias podem operar mudanças na capacidade de
pensar do paciente e, portanto, na sua capacidade de compreensão. A teoria da função-
alpha é apresentada como um instrumento ao trabalho psicanalítico para que seja
possível ao psicanalista trabalhar sem a necessidade de propor novas teorias
prematuramente, a função-alpha opera sobre as impressões sensoriais e as experiências
emocionais produzindo elementos-alpha, que podem ser armazenados e utilizados
posteriormente para criar pensamento onírico.
León Grinberg
Introdução
1. Como os problemas que são tratados neste livro são fundamentais em relação à
aprendizagem, já faz muito tempo que despertaram um interesse investigativo.
Na prática psicanalítica, particularmente com pacientes que apresentam sintomas
de transtornos de pensamento, observa-se que a psicanálise agregou uma nova
dimensão a estes problemas, quiçá, sua solução.
6. Se o leitor ler o paragrafo anterior novamente comprovará que ao optar pelo uso
do termo função, conservando este sua penumbra de associações, pode supor-se
que usarei o termo segundo as regras e convenções que os matemáticos e
filósofos aceitam, para regular seu uso. Se satisfaço esta expectativa dirão que
emprego o termo “apropriadamente”. Porém, se não correspondo a esta
expectativa (levantada pela penumbra das associações das quais eu não me
ocupo) dirão com razão que emprego o termo de modo equivocado. Fica, então,
em aberto para mim, concordar com o criticismo, ou explicitamente despojar o
termo de sua penumbra de associações, ou, aceitar que a conveniência de seu
uso está implicada nestas associações.
7. Na realidade não optarei por nenhuma das duas. Suponhamos que vejo um
homem caminhando. Posso dizer que seu caminhar é uma função de sua
personalidade e que a partir de uma investigação descubro que os fatores desta
função são seu amor por uma mulher e sua inveja de um amigo desta. Ou que os
fatores nesta função são seu amor por uma mulher e a inveja de um amigo desta.
Se prossigo na investigação, posso determinar que ao seu amor por esta mulher
se agrega a sua inveja do amigo desta, ou F (seu modo de caminhar) = A+C
(F=função, A= amor, C= inveja). Porém, talvez sinta que minhas observações se
aproximam à teoria kleiniana da identificação projetiva e que posso expressar
melhor minha opinião sobre os fatos se digo que a função de caminhar é um
sinal de que o paciente colocou dentro de si uma mulher que deseja e com a qual
se indentifica e um rival de quem tem inveja, mas com o qual também está
identificado, e que ambos os objetos são controlados por estarem presos em suas
pernas. Pouparei ao leitor de uma figura geométrica, expressando esta última
ideia “matematicamente”; contudo, lhe pedirei que reflita se de fato no capítulo
1 emprego os termos “função” e “fator” de modo equivocado. Entendo que este
uso possa confundir, contudo não estou de acordo que se possa afirmar que faço
um mau uso deste termo. No capítulo posterior sustento que o uso de ideias, e os
símbolos que as representam, está menos desenvolvido que o processo mediante
o qual as ideias evoluíram. Por esta razão estou disposto a aceitar o mal emprego
de uma ideia, ou seu símbolo ou ambos, porém, não estou de acordo que exista
um critério definitivo sobre esta questão. Na metodologia psicanalítica o critério
não deve depender de se um determinado uso é correto ou incorreto, se tem
significado ou se é verificável, senão de sua capacidade de fomentar o
desenvolvimento.
8. Não estou sugerindo que esta capacidade de promover tal desenvolvimento nos
provê de um critério absoluto: a teoria psicanalítica e sua prática, nos casos em
que o pensamento apresenta transtornos graves, assinalam a necessidade de uma
reformulação das ideias sobre a origem e natureza dos pensamentos e uma
reformulação paralela das ideias sobre os mecanismos mediante os quais é certo
que é necessário modificar nossos enfoques sobre os pensamentos e os
mecanismos do processo de pensar, é provável que esta modificação, se é tão
importante quanto o creio, também exija a modificação da forma pela qual
produzimos “pensamentos” e os métodos que empregamos ao usá-los. Meu
método de criar “fator” e “função” (e sua capacidade para representar uma
“realização”) não tem por que ser considerado necessariamente equivocado por
diferir dos métodos que são geralmente aceitos como os únicos que
correspondem a uma produção, natureza e uso dos conceitos corretos. Esta claro
para mim que o método não está livre de ser submetido ao exame crítico ao qual
a experiência psicanalítica ensinou que todo pensar deve ser submetido.
9. Os métodos que este livro apresenta não são definitivos. Mesmo quando me dei
conta de que são inadequados, frequentemente não foi possível melhorá-los.
Encontrei-me em uma posição semelhante a de um cientista que segue
empregando uma teoria que sabe que é imperfeita porque ainda não foi
descoberta outra melhor que a pudesse substituir.
SUMÁRIO DE TEMAS
O capítulo II é uma delimitação da área na qual quero usar os termos como parte de meu
equipamento de investigação.
O capítulo III inicia uma descrição estilizada de experiências emocionais, “realizações”,
das quais eu participei, e constituem o estímulo para a criação deste livro. Por
“estilizada” quero dizer que é conscientemente sofisticada, porque a falsificação que
implica empregar este método de apresentação é incomensuravelmente menor que a
produzida por qualquer outro, incluindo os assim chamados registros mecânicos. Estes
últimos oferecem um tipo de verdade que corresponde à fotografia, porém a forma
como este registro é levado a cabo, apesar da superficialidade da precisão no resultado,
já anteriormente levou a falsificação: isto está na própria sessão. A fotografia pode ser o
suficiente como fonte de verdade, contudo é preciso ressaltar que só se trata de um fonte
depois que esta foi captada pelo fotógrafo e seu aparato; de qualquer forma, o problema
de interpretar a fotografia permanece. A falsificação pelo registro é maior porque ele dá
verossimilhança para algo que já foi falsificado.
O capítulo 4 é uma breve descrição de algumas ideias que são discutidas ao longo do
livro.
Capítulo I
1 - Denominar uma ação pelo nome da pessoa da qual se pensa que esta ação é típica;
falar, por exemplo, de spunerismo, como se fosse uma função da personalidade de um
indivíduo chamado Spuner, é bastante comum na linguagem corrente. Aproveito este
uso para deduzir dele uma teoria das funções que resistirá a uma aplicação mais
rigorosa que a empregada nesta frase da linguagem corrente. Supondo que há fatores na
personalidade que se combinam produzindo entidades estáveis que eu denomino
funções da personalidade. O significado que atribuo aos termos “fatores” e “funções” e
o uso que lhes dou em seguida aparecem, contudo, uma explicação preliminar não será
excessiva.
6 – A função à qual me referi, por sua importância intrínseca, também serve para ilustrar
o uso que se pode dar a uma teoria das funções. Chamo esta função de função-alpha, de
modo que posso me referir a ela sem estar limitado, como estaria se empregasse um
termo mais rico em significados, por uma penumbra de associações que se dariam. Por
outro lado, o significado das teorias que aparecem como fatores devem ser conservados
e empregados o mais rigorosamente possível. Assumo que este significado foi
esclarecido de modo satisfatório pelos autores e demais pessoas que analisaram as
teorias com concepção crítica. A liberdade implícita no uso do termo função-alpha e a
concentração de precisão da expressão e do emprego em tudo o que se relaciona com os
fatores confere flexibilidade sem prejudicar sua estrutura. O uso que faço de uma teoria
que já existe poderia aparecer como se distorcesse o sentido que lhe dá o autor; onde eu
creio que seria necessário que fosse esclarecido, se não os esclareço, deve supor-se que
acredito estar interpretando a teoria do autor corretamente.
2 O termo “realização” é empregado no sentido que teria se disséssemos que a geometria euclidiana das
três dimensões tem as estruturas do espaço ordinário como uma de suas “realizações”. Esta expressão é
empregada de forma facilmente reconhecível em Algebric Proyective Geometry, Semple e Kneebone
(O.U.P., 1956), capítulo1, que trata do conceito de geometria.
Preferimos utilizar o termo “realização” para traduzir realization com o significado de materialização,
objetivação, concretização, ou seja, tornar real uma coisa. Nos apoiamos também de que Freud tenha
utilizado como sinônimos os termos realisierung e objektivierung, este último do alemão em que significa
objetivação.
3A expressão “sistema dedutivo” ou “sistema dedutivo científico” empregada desta forma compreende
qualquer aproximação ou aproximação projetada aos sistemas lógicos descritos, em Scientific
Explanation (C.U.P., 1955) capítulo II e seguintes.
7 – O termo função-alpha está propositalmente desprovido de significado, antes de
assinalar a área de investigação na qual me proponho a emprega-lo, devo considerar um
dos problemas concomitantes nesta investigação. Como o objeto deste termo sem
significado é o de prover à investigação psicanalítica de um equivalente da variável dos
matemáticos, uma incógnita que pode ser revestida com um valor que seu uso ajudou a
determinar, é importante que não se vá empregando prematuramente para comunicar
significados, pois estes significados prematuros podem ser precisamente aqueles que é
essencial excluir. Todavia, o mero fato de que o termo função-alpha seja empregado em
uma determinada investigação inevitavelmente leva a que este seja revestido com os
significados derivados das investigações que já foram levadas a cabo neste campo4.
Portanto, deve manter-se uma vigilância constante com o fim de impedir que isto
ocorra, ou que o valor do instrumento acabe prejudicado desde o início. A área de
investigação é aproximadamente aquela que está coberta pelos trabalhos aos quais irei
me referir no próximo capítulo.
Capítulo II
4 Ver The Logic of Scientific Discovery, K. R. Popper (Hurchinson, 1959), pg 35, na qual se dá um
excelente exemplo deste problema
5 “Observações sobre os dois princípios do funcionamento mental”, S. Freud. O critério com que foram
selecionadas as citações e referências que aparecem neste capítulo não foi tão rigoroso quanto considero
necessário para a aplicação em uma teoria científica ou como um fator em uma teoria das funções. O
propósito que tem aqui é o de limitar a área dentro da qual aplicarei o conceito de função alpha.
apreensão das impressões sensoriais e das qualidades do prazer e do desprazer são
ambas investigadas neste trabalho. Trato as impressões sensoriais, o prazer e o
desprazer como igualmente reais, portanto, descarto a diferenciação que Freud faz entre
o “mundo externo” e o prazer e o desprazer, por considera-la irrelevante ao tema da
apreensão. Refiro-me, todavia, à relação que existe entre o “princípio do prazer” e o
“princípio da realidade” e a escolha que um paciente pode fazer entre a possibilidade de
modificar uma frustração ou evadir-se dela.
Capítulo III
1 - Uma experiência emocional que ocorra durante o sonho, que elegi por razões que em
seguida veremos, não difere de uma experiência emocional que acontece no estado de
vigília, no qual as percepções da experiência emocional tem, em ambos os casos, que
ser elaborado pela função-alpha antes que possa ser utilizada para os pensamentos
oníricos.
7Manteremos o termo original splitting ao invés de traduzi-lo por dissociação ou divisão, devido ao fato
de que conceitualmente faz referência a um tipo específico de dissociação, de índole mais regressiva,
como Bion esclareceu em trabalhos anteriores. Seguimos os mesmos critérios para o termo splitt.
11 Emprego o termo “fenômenos” para expressar o que Kant denominou de qualidades secundárias e
primárias. A expressão “coisas em si” também coincide com a que Kant emprega para referir-se a objetos
que não são cognoscíveis para o gênero humano.
não consegue despertar. Dai a situação particular que se manifesta clinicamente quando
o paciente psicótico comporta-se como se estivesse precisamente neste estado.
Capítulo IV
2 – O princípio mais genérico da teoria é que para aprender com a experiência a função-
alpha deve operar sobre a captação da experiência emocional; os elementos alpha
surgem das impressões da experiência; portanto se convertem em algo estocável e
disponível para os pensamentos oníricos e para o pensamento inconsciente da vigília.
Uma criança que tem a experiência emocional chamada “aprender a caminhar” é capaz,
graças à função-alfa, de estocar esta experiência. Pensamentos que em um primeiro
momento tiveram que ser conscientes se convertem em inconscientes e desta forma a
criança pode realizar todo o pensar necessário para caminhar sem que ainda esteja
consciente disso. A função-alpha é necessária para pensá-lo e para a racionalização
consciente, e para relegar o pensamento ao inconsciente quando é necessário libertar a
consciência da carga de pensamento que decorre da aprendizagem de uma habilidade.
3 – Se existem somente elementos-beta, que não podem ser fatos inconscientes, não
poderá haver repressão, supressão ou aprendizagem. Isto dá a impressão de que o
paciente é incapaz de discriminar. Não pode deixar de captar todo estímulo sensorial;
todavia, tal hipersensibilidade não significa um contato com a realidade.
4 – Os ataques à função-alpha, estimulados pelo ódio ou a inveja, destroem a
possibilidade de que o paciente estabeleça um contato consciente, quer seja consigo
mesmo ou com qualquer outro como objetos vivos. Portanto, se refere a objetos
inanimados, ou ainda a lugares, quando normalmente deveria se referir a pessoas.
Porém, ainda que as descreva na forma verbal, o paciente vive estas pessoas como
presentes na forma material e não simplesmente representadas pelos seus nomes. Este
estado contrasta com o animismo, no qual os objetos vivos são revestidos com atributos
de morte
Capítulo V
1 – Devemos analisar agora o splitting forçado associado a uma relação perturbada com
o seio ou seus substitutos. O lactante recebe do seio leite e outras formas de bem estar
corporais; recebe também amor, compreensão, conforto. Suponhamos que sua iniciativa
é obstruída pelo medo da agressão, a sua própria ou a de outros. Se a emoção é muito
intensa, inibe o impulso do lactente de obter alimento.
2 – Teme-se tanto o medo, o ódio e a inveja que são tomadas as medidas necessárias a
fim de destruir a captação de todos os sentimentos, apesar de que isto não se diferencia
12 O termo inveja é empregado aqui para de modo geral nos referirmos aos fenômenos descritos em
detalhe por Melanie Klein em Inveja e Gratidão
verdadeiramente do ato de destruir a própria vida13. Se um sentido de realidade, forte o
bastante para impedir que as emoções o inundem, obriga o infante a continuar a se
alimentar, a inveja e o ódio experimentados numa situação que estimula o amor e a
gratidão acabam se tornando intoleráveis, e levam a um splitting que se diferencia
daquele splitting que tende a evitar a depressão. Diferencia-se do splitting provocado
por impulsos sádicos nos quais seu objeto e seu efeito é permitir ao lactante o que
posteriormente na vida será denominado de comodidades materiais, não admitindo a
existência de um objeto vivo do qual estes benefícios dependem. A inveja provocada
por um seio que está repleto de amor, compreensão, experiência e saber cria um
problema que encontra solução na destruição da função-alpha. Isto faz com que o seio e
o lactente pareçam inanimados, com as consequentes culpabilidade, temor ao suicídio,
temor ao crime, passados, presentes e iminentes. A necessidade de amor, compreensão e
desenvolvimento mental é desviada da busca pelo bem-estar material, dado que não
pode ser satisfeita. Do mesmo modo que se intensificam os desejos de um maior bem-
estar material, a ânsia por amor permanece insatisfeita, convertendo-se em uma
excessiva e mal dirigida voracidade (ganância).
3. Este Split (divisão) imposto em parte pela fome e o medo da morte por inanição e,
por outro lado, pelo amor, e o medo da inveja criminosa associada ao ódio, produz um
estado mental no qual o paciente procura de modo ganancioso toda e qualquer forma de
comodidade material; é ao mesmo tempo implacável e insaciável em sua busca de
saciedade. Como este estado tem sua origem em uma necessidade de libertar-se das
complicações emocionais que estão implicadas em tornar-se consciente da vida, e da
relação com objetos vivos, o paciente parece ser incapaz de experimentar gratidão ou
interesse, seja em si mesmo ou nos demais. Este estado implica a destruição de seu
interesse pela verdade. Como estes mecanismos fracassam em libertar o paciente de
suas dores e ele sente que isto é decorrente da carência de algo, sua busca pela cura
toma a forma de uma busca de um objeto perdido e termina numa dependência maior da
comodidade material, sendo a quantidade o elemento dominante e não a qualidade. Se
Capitulo VI
14 Preferimos traduzir o termo bizarre por estranho, por ser este o significado mais próximo. Os “objetos
estranhos” (bizarre objects) são o resultado das identificações projetivas patológicas pelas quais o objeto
é percebido como dividido em minúsculos fragmentos, cada qual contendo, porém, uma parte projetada
de si mesmo (self). Estes objetos estranhos são experimentados como carregados de grande agressividade.
Capítulo VII
O sonho constitui uma barreira contra os fenômenos mentais que poderiam invadir a
percepção que o paciente tem de que está conversando com um amigo e, ao mesmo
tempo, torna impossível que a percepção de que está conversando com um amigo
invada suas fantasias. A busca do psicótico de discriminar um do outro conduz ao
pensamento racional, que se caracteriza por uma peculiar falta de “ressonância”. O que
é dito de forma clara e inteligível tem somente uma dimensão. Não tem matizes de
significação. Convida quem está escutando a dizer: “e, portanto?”. Não tem a
capacidade de sugerir uma linha de pensamento.
3 – O “sonho” tem muitas das funções de censura e resistência. Estas funções não são
resultado do inconsciente, mas instrumentos mediante os quais o “sonho” cria e
diferencia consciência de inconsciência.
Capitulo VIII
1 - Agora irei transpor tudo aquilo que foi dito acerca do estabelecimento de um
consciente e um inconsciente e de uma barreira entre ambos para uma suposta entidade
que eu chamo de “barreira-de-contato”. Freud usou este termo para descrever a entidade
neurofisiológica posteriormente conhecida como sinapse. Neste mesmo sentido, de
acordo com a minha afirmação de que o homem tem que “sonhar” uma experiência
emocional corriqueira, tanto se esta ocorrer durante o dormir, quanto durante a vigília: a
função-alpha do homem, dormindo ou desperto, transforma as impressões sensoriais
relacionadas com uma experiência emocional em elementos-alpha, os quais, ao se
proliferarem, se aderem formando a barreira-de-contato. Esta barreira-de-contato, desta
forma, em contínuo processo de formação, marca o ponto de contato e a separação entre
os elementos conscientes e inconscientes e dá origem a uma distinção entre estes. A
natureza da barreira-de-contato dependerá da natureza da provisão de elementos-alpha e
de como estes se relacionam entre si. Podem aderir-se. Podem estar aglomerados.
Podem estar ordenados em sequência para aparentarem uma narrativa (pelo menos na
forma que a barreira-de-contato pode se apresentar em um sonho). Podem estar
ordenados logicamente. Podem estar ordenados geometricamente
16 “Diferenciação entre consciente e inconsciente”. Este emprego dos termos é típico da dificuldade de
aplicar termos ambíguos quando não se dispõe de termos mais precisos. Eu não quero dizer “o”
consciente ou “o” inconsciente, pois implicaria que se poderia pedir a um observador que distinguisse os
dois objetos. Contudo, não excluir essa matriz de significado porque quando os elementos são
diferenciados, alguns se convertendo em conscientes e outros em inconscientes, torna-se razoável dizer
que há um inconsciente se este conceito é útil.
da barreira-de-contato, de modo que em psicanálise continuam tendo a posição
fundamental que lhes foi designada por Freud.
Daqui para frente quero demonstrar como se usa a teoria das funções como um
instrumento para o trabalho analítico. Darei exemplos de background de experiências
emocionais (“realizações”) das quais a teoria foi abstraída e em seguida darei exemplos
de “realizações”, desconhecidas no momento em que a teoria foi abstraída, e que
posteriormente foi descoberto que se aproximavam desta. Lamentavelmente, o material
não se presta a uma explicação tão lógica sem produzir uma equívoca distorção dos
fatos. No próximo capítulo me dedicarei especialmente ao background da experiência
emocional da qual esta teoria foi abstraída. Trata-se de uma descrição dos elementos dos
quais foi feita a abstração, contudo, estes estão mesclados com tantos outros que é
impossível reclamar para esta descrição qualidades que geralmente são consideradas
essênciais em um trabalho científico.
Capítulo IX
3 – Neste sentido, esta situação não corresponde ao marco teórico que sugeri, ou seja, a
teoria de uma barreira-de-contato que deve a sua existência à proliferação de elementos-
alpha e que cumpre sua função de uma membrana que, pela natureza de sua composição
e sua permeabilidade, divide os fenômenos em mentais em dois grupos, dos quais um
realiza as funções da consciência e o outro as funções da inconsciência.
4 – Nesta nova situação há uma divisão de coisas, como se estivessem suspensas entre
paciente e analista, mas que não oferece resistência à passagem de elementos de uma
zona para a outra. Esta situação não se presta ao estabelecimento de consciente e
inconsciente e, portanto, pode levar a desenvolvimentos imperfeitos e anômalos de uma
capacidade de recordação e repressão. A diferença nos dois estados deriva das
diferenças entre uma barreira-de-contato composta de elementos-alpha e uma composta,
se é essa a palavra correta, de elementos-beta. Recordemos que estes últimos parecem
carecer da capacidade de se vincularem entre si. Clinicamente esta tela de elementos-
beta se apresenta a observação casual como impossível de ser distinta de um estado
confuso e, em particular, de qualquer uma desta classe de estados confusos que se
assemelham ao sonho, ou seja: 1) Uma produção de frases ou imagens desconectadas
que, se o paciente estiver dormindo, as tomaríamos, certamente como provas de que o
paciente sonhava; 2) Uma produção similar, contudo, expressa de uma forma que sugere
que o paciente simula que sonha; 3) Uma produção confusa que parece ser prova de
uma alucinação; 4) Similar ao anterior, porém sugerindo uma alucinação de sonho; não
há motivo para supor que o paciente sonhava que estava alucinado. Estes quatro estados
estão relacionados com o medo que a posição depressiva produz em um supereu
assassino e portanto, com a necessidade de ter uma experiência emocional na qual isso
pudesse ocorrer na presença do analista. Clinicamente, a tela de elementos beta a que
me refiro guarda uma marcada semelhança superficial com quaisquer destas quatro
classes e poderia supor-se que é idêntica a estas.
Capítulo X
1 – Graças à tela-beta, o paciente psicótico tem uma capacidade para provocar emoções
no analista; suas associações são os elementos da tela-beta, que tem o propósito de
provocar interpretações ou outras respostas que estão menos relacionadas à sua
necessidade de receber interpretações psicanalíticas do que com sua necessidades de
envolvê-lo emocionalmente18 . A teoria da contratransferência oferece uma explicação
somente parcialmente satisfatória, porque se ocupa da manifestação somente como um
sintoma dos motivos inconscientes do analista, e, portanto, deixa sem explicar a
contribuição do paciente. Em primeiro lugar, o paciente para os quais estas teorias
foram destinadas não emprega uma linguagem articulada; demonstra com evidente
sinceridade uma incapacidade para compreender seu próprio estado anímico, mesmo
quando este lhe é apontado. O emprego que faz das palavras é mais uma ação destinada
a “libertar o psiquismo de um acréscimo de estímulos”, do que uma linguagem. Em
segundo lugar, não se propõe manipular o analista do mesmo modo que o neurótico. Há
certa coerência nas características dos elementos-beta. A linguagem que devo empregar
para descrever uma situação dinâmica produz uma distorção porque a linguagem é um
método científico idealizado para o estudo do inanimado. Esta deformação afeta minha
afirmação de que certas características da tela-beta são congruentes. Seria mais correto
afirmar que uma situação dinâmica evolui e sua evolução se revela através do
aparecimento de uma característica particular como a que impregna um número cada
vez maior de elementos e lhe dá congruência. A substituição de uma barreira-de-contato
por uma tela-beta é um processo vivo. As observações do analista, por razões
relacionadas à natureza da mudança da posição esquizo-paranóide para a depressiva e
vice versa, traz para a situação analítica um elemento que faz com que seu
desenvolvimento pareça ser uma transição entre uma série descontínua de partículas ou
elementos e uma síntese destes mesmos elementos. Uma substitui à outra de um modo
análogo à substituição de um julgamento pelo outro quando examinamos uma figura
que ilustra a perspectiva reversível.
18 Isto sugere uma capacidade para a intuição que parece ser incompatível com as ideias correntes acerca
da insanidade. No entanto, trata-se de uma conduta intencional, o propósito será controlado, ditado pela
parte psicótica da personalidade.
A provocação inerente a tela-beta, quanto tem êxito, significa que o paciente está faminto de material
terapêutico genuíno, ou seja, de “verdade”, e portanto, aqueles impulsos que tendem à sobrevivência,
trabalham de modo sobrecarregado pela intenção de conseguir uma cura contando com um material
terapeuticamente pobre.
2 – O analisando traz mudanças que estão associadas com a substituição da função-
alpha, pelo que pode ser descrito como uma inversão da direção da função19. Ao invés
de impressões sensoriais sendo convertidas em elementos-alpha, para serem usados em
pensamentos oníricos e no pensar inconsciente da vigília, o desenvolvimento da
barreira-de-contato é substituída por sua destruição. Isto é levado a cabo pela inversão
da função-alpha, de tal modo que a barreira-de-contato e os pensamentos oníricos e o
processo do pensar inconsciente da vigília que constituem a matéria prima da barreira-
de-contato se convertam em elementos-alpha despojados 20 de todas as características
que os separam dos elementos-beta e são posteriormente projetados formando assim a
tela-beta.
19 A inversão de direção é compatível com o tratamento dos pensamentos por evacuação: ou seja, se a
personalidade carece de um aparelho que lhe permitiria “pensar” pensamentos, porém é capaz de tentar
libertar o psiquismo de pensamentos de modo bastante similar ao modo através do qual liberta a si mesma
do incremento de estímulos, então a inversão da função alpha pode ser o método empregado.
20 Despojar os elementos alpha das características que os diferenciam dos elementos beta é importante.
Um modelo disso nos é dado pela teoria segundo a qual a palavra é o nome de um sistema dedutivo
científico, por exemplo: “papai”. O sistema dedutivo científico consiste em uma série de hipóteses. O
sistema é uma afirmação de que certos elementos estão constantemente unidos. A conjunção e os
elementos conjuntos dependem da preconcepção (o conhecimento a priori do indivíduo) e das
“realizações” que indivíduo teve sucessivamente para aproximar a preconcepção e transformá-las em
concepção. A concepção por sua vez se converte em abstração, ou modelo, ao qual conforme se crê ou se
experimenta aproximam, todavia, mais “realizações”. São estas associações que agora o sistema dedutivo
científico define como constantemente conjuntas (e em decorrência desta afirmação, estão
constantemente conjuntas na mente do indivíduo) as que são despojadas da palavra, que é o nome do
sistema dedutivo científico, de modo que finalmente resta somente o nome “papai”. Não estou me
referindo ao valor social do nome “papai”, nem tampouco à versão social do sistema dedutivo científico
denominado por este nome. O aspecto que estou analisando é o que existe antes da publicação e que é
portanto próprio do indivíduo. É este aspecto de um fenômeno que poderia, para usar os termos de Kant,
ser denominado “qualidade secundária”, ao menos que houvesse provas, dadas pela publicação, da
universalidade que Kant atribuiu às qualidades primárias.
somado de vestígios do Eu e do Supereu. A inversão da função-alpha altera a estrutura
relacionada com a função-alpha.
Nota-se que a função-alpha pode ser considerada tal qual uma estrutura, uma parte do
aparelho mental que produz a barreira-de-contato. Por sua vez, a barreira-de-contato
pode ser considerada, tal qual o nome que lhe é dado sugere, como tendo as
características de uma estrutura. Isto é uma repetição do problema implícito na mútua
diferenciação entre o Eu, a consciência, e a função-alpha e vale a pena estudar as
implicações desta peculiaridade da investigação psicanalítica, ou seja, o emprego de
conceitos em relação a objetos que às vezes necessitamos considerar como se
estivessem relacionados com máquinas, ou seja, como se fossem inanimados, e às vezes
como se fossem funções, as quais, posto que estamos tratando com seres humanos e não
com máquinas, seguramente estão impregnados de características vitais. No caso do
emprego da função-alpha como uma incógnita, para que corresponda como uma
“realização” que está modificando o desconhecido em conhecido, os nomes que se dão
a estes objetos deveriam esclarecer se devemos observar o objeto quanto a sua natureza
como uma função, como uma estrutura ou como uma abstração.
Capítulo XI
Capitulo XII
3 – Há exemplos muito menos dramáticos e que ainda assim exigem certa perspicácia
por parte do analista a fim de discerni-los. É importante que o analista os observe. Ou
seja, que deveria observar e interpretar a operação da fantasia como um fenômeno
mental dedutível dos dados e também observar os sinais de que o paciente está
suficientemente adaptado à realidade para ser capaz de manipular o seu ambiente, de
modo que a fantasia da identificação projetiva pareça ser coerente com a realidade.
21 Seria impossível continuar se eu chamasse à atenção do leitor em todos os casos em que emprego
frases nas quais utilizo um modelo de forma implícita ou não explícita. Todavia, pode contribuir para a
elucidação do problema que está me preocupando ao introduzir tal interpretação ocasionalmente, como
faço aqui. O mesmo termo “bem estar” sugere tanto que o desenvolvimento metal quanto o físico
dependem do funcionamento eficiente de um sistema alimentar mental. Do mesmo modo o
desenvolvimento pode sugerir uma externalização oposta ao redobramento que sugere a internalização.
Algum leitor pode acabar inconscientemente afetado pelo termo bem estar, devido ao efeito de
concretização inerente ao modelo implícito, ainda que a teoria não fosse aquela com a qual simpatiza. Por
outro lado, pode não ficar inconscientemente afetado pelo modelo implícito no termo “desenvolvimento”.
Os que leram o livro de Fowler The Kings English estarão familiarizados com o problema, tal que este se
apresenta a quem deseja escrever bem (ver seus comentários sobre a metáfora no capítulo III). Nada
poderia acusar Fowler de tratar o problema de escrever bem com superficialidade; todavia, Fowler se
refere a este problema no cabeçalho de Airs e Graces (hábitos de conduta e linguagem não naturais,
adquiridos, que buscam impressionar e atrair pessoas). Para o psicanalista isto está mais próximo da raiz
ou fonte, ou matriz dos problemas acerca da capacidade de pensar e comunicar o pensamento do que se
relacionam com a possibilidade ou não, de obter qualquer conhecimento real.
mesma palavra, “amor”, podem significar coisas completamente distintas; todavia, esta
é a palavra que eu tenho para descrever parte do que creio que deve ser a experiência de
um lactente (incluindo a carência de amor). Resulta claro, então, que há duas fontes
principais de erro que surgem imediatamente: uma é o abismo semântico que deve ser
superado entre dois adultos que tratam deste problema, e a outra é a propriedade
científica de atribuir à experiência infantil uma experiência similar, modificada, porém,
ainda reconhecível.
7 – No que diz respeito ao leite, nós podemos assumir com certo grau de convicção,
algo que não sentimos em relação ao amor, de que um conduto alimentar o recebe e o
processa. O que recebe e processa o amor? A pergunta pode ser uma formulação
baseada em uma forma de pensar inadequada, e, portanto, passível de nos induzir a
erros, salvo se considerarmos aquilo que está acontecendo com a mãe. Tal qual o
lactente que recebe o leite e o metaboliza por meio do sistema alimentar, a mãe o provê
por meio do sistema glandular: todavia, muitas vezes o leite falta e esta dificuldade tem
sido atribuída às perturbações emocionais. Ainda assim, supõe-se que o lactente sofre de
transtornos digestivos que tem origem em uma perturbação emocional. Pode ser útil
supor que existe na realidade um seio psicossomático e um tubo alimentar
psicossomático infantil ao qual o seio corresponde22. O lactente necessita deste seio para
que possa receber a sua provisão de leite e de bons objetos internos. Não atribuo ao
lactente uma captação desta necessidade; contudo, atribuo a ele a captação de uma
necessidade não satisfeita. Podemos dizer que o lactente se sente frustrado se
supusermos a existência de certo aparelho por meio do qual é possível experimentar a
frustração. O conceito de Freud de consciência como “o órgão sensorial para a
percepção de qualidades psíquicas” nos provê deste aparelho.
8 – Na função de uma analista que trata um paciente adulto, eu consigo estar consciente
de algo que o paciente não está consciente. Do mesmo modo a mãe consegue discernir
um estado anímico em seu bebê antes que ele próprio esteja consciente disso, como, por
exemplo, quando o bebê dá sinais de precisar de comida antes mesmo de dar-se conta
disso. Nesta situação imaginária a necessidade do seio é um sentimento e este
22 O termo seio é aqui empregado com o significado que lhe deu Melanie Klein.
sentimento por si só é um seio mau; o lactente não sente que quer um seio bom, sente
porém que quer evacuar o seio mau 23.
9 – Suponhamos que o bebê é alimentado; a incorporação do leite, amor, calor, pode ser
sentido tal qual a incorporação de um seio bom. Sob a influência do seio mau,
inicialmente não enfrentado, o “incorporar” o alimento pode não se distinguir da
evacuação de um seio mau. Ambos, o seio bom e o mau são experimentados como
tendo o mesmo grau de concretude e realidade que tem o leite. Cedo ou tarde o seio
“desejado” é vivenciado como uma “ideia de um seio ausente” e não como um seio mau
presente. Podemos observar que o seio mau, ou seja, o desejado, porém ausente, é mais
provavelmente reconhecido como uma ideia do que o seio bom, que está associado com
aquilo que um filósofo chamaria de coisa-em-si, ou uma coisa-na-realidade, no sentido
de que um seio bom depende da existência do leite que o bebê realmente tomou. O seio
bom e o seio mau, um associado com o leite real que satisfaz a fome e o outro com a
não existência deste leite, devem ter, portanto, uma propriedade psíquica diferente. “Os
pensamentos são cansativos”, disse um de meus pacientes. “Não os quero”. Um
“pensamento“ é o mesmo que a ausência de uma coisa? Se não há alguma “coisa”,
“coisa nenhuma” é um pensamento que reconhecemos e é graças ao fato de que há
“coisa nenhuma” que reconhecemos que “isso” deve ser um pensamento? Antes de
analisar mais profundamente como é possível estabelecer esta diferença de qualidade,
irei hipotetizar outra situação. Suponhamos que o bebê foi alimentado, mas não se sente
querido. Novamente capta a necessidade de um seio bom e novamente esta
“necessidade de um seio bom” é um seio mau que precisa ser evacuado. Certas
situações diferentes deste tipo apresentariam problemas que exigem situações distintas;
em meu primeiro exemplo era possível supor que o bebê sentisse a necessidade do seio,
seio mau, seria evacuada enquanto defecava durante a mamada; neste caso associaria
um ato físico com um resultado que chamaríamos de uma mudança em seu estado de
animo de insatisfação para satisfação. Se for correto supor que o problema fundamental
está enraizado na discriminação da qualidade psíquica e se a consciência é
legitimamente considerada o órgão sensorial da qualidade psíquica, torna-se difícil
enxergar como surge a consciência. Obviamente, não será suficiente dizer que o bebê
23 Esta ideia pode ser compatível com o pronunciamento de Freud acerca do processo primário.
está consciente da qualidade psíquica e que transforma esta experiência emocional em
elementos-alpha, porque, como já dissemos, a existência de uma consciência e de uma
inconsciência depende de uma produção prévia de elementos-alpha pela função-alpha.
Devemos supor que o seio bom e o seio mau são experiências emocionais. O
componente físico, leite, mal estar produzido pela saciedade ou seu oposto, podem
imediatamente se revelarem aos sentidos e, portanto, devemos emprestar uma
prioridade cronológica aos elementos-beta sobre os elementos-alpha. A intolerância a
frustração pode estar de tal forma marcada pela função-alpha que se veria entorpecida
pela evacuação imediata de elementos-beta. O componente mental, amor, segurança,
ansiedade, diferentemente do somático, requer um processo análogo à digestão. Algo
que pode restar oculto pelo uso do conceito de elemento-alpha, mas ao que as
investigações psicanalíticas poderão valorizar. Por exemplo, quando a mãe ama o filho,
o que ela faz com isso? A partir dos canais físicos de comunicação tenho a impressão de
que o amor se expressa por meio do “ensonhamento” (reverie).
10 – Ainda que seja muito difícil penetrar na mente adulta em análise, é menos difícil do
que penetrar na mente de um lactente através de hipóteses especulativas; a investigação
da reverie no adulto pode nos facilitar um acesso a este problema. Podemos definir
reverie como a fonte psicológica que satisfaz as necessidades da criança de amor e
compreensão, que classe de órgão receptor psicológico é requerida se o lactente é capaz
de se beneficiar da reverie, como de fato é, graças à capacidade digestiva do sistema
alimentar, de beneficiar-se do seio e do leite que ele provê. Em outras palavras, supondo
que a função-alpha permite que o latente disponha daquilo que, de outro modo, somente
poderia ser evacuado como elementos-beta. Quais são os fatores desta função que se
relacionam diretamente com a capacidade de reverie da mãe?
24 “Contém”. Aceito o modelo implícito de “continente”, nesta e em outras partes em que necessário usar
termos como objetos “internos” e “externos”. Emprego este modelo com reticência, pois o considero mais
apropriado para o pensamento científico imaturo do que para o maduro. Todavia, a natureza deste
trabalho e a falta de uma linguagem adequada para um enfoque científico leva ao uso de modelos que as
vezes sabemos e em muitas outras supomos serem inadequados, porém inevitáveis dado não há outros
melhores.
25 “Seio mau”. Um dos problemas de metodologia que busco tratarestá aqui ilustrado, e há muitos outros
do mesmo tipo nestas páginas; todavia, não os assinalarei esperando que o leitor seja indulgente com as
deficiências da exposição.
Se me perguntarem o que quero dizer quando fala de “seio mau” somente posso contestar dizendo que
significa para mim a mesma coisa que significa para o bebê. Se me perguntarem o que é isso, posso dizer
que no curso da experiência empírica de uma análise o paciente demonstra certos sentimentos que eu
creio que ele está tentando me comunicar. Devo, por razões que fazem parte da análise, dizer
quais são estes sentimentos. Para fazê-lo posso recorrer a certo material, cuja a origem logo
descreverei, para construir um modelo. Comparo este modelo com o que está ocorrendo na
habitação e trago minha interpretação de que , entre outras coisas, o paciente sente que contém
um “seio mau”. Posso apresentar a imagem do lactante e do analista com eu assisto: assim, a)
penso que o bebê tem uma experiência emocional desagradável. B) penso que o bebê pensa que
contém um seio mau. A) penso que a experiência emocional dolorosa está associada com o fato
de que se juntam uma preconcepção e um elemento beta. B) dependendo da personalidade do
bebê, pode suceder que o bebê 1) expulse o elemento beta e sinta as bases para a incapacidade
de pensar. 2) aceite o elemento beta justaposto à preconcepção, tolere a frustração intrínseca e
deste modo esteja em processo de função alpha e da produção de elementos alpha. Trato o
problema das preconcepções no capítulo sobre hipóteses definitórias. Na prática analítica de
pacientes com transtornos de pensamento, o analista requer, se possível estabelecer um marco
referencial metodológico para si. Porém, e este é o nó da questão, deve também buscar formar
alguma ideia sobre como o lactante pensa que é um sentimento. Pois é evidente que nos
transtornos de pensamento algum problema ocorreu na vida infantil e que não está resolvido.
Porém, se estamos a um passo do absurdo de atribuir ao lactante ideias, pensamentos e
conceitos acerca do que um adulto chama de “sentimento”, que honrariam a Kant. Talvez a
resposta seja que somente Kant tem este tipo de problema e pode resolvê-los. Os que não são
Kant podem a) não ter esses problemas ou b) ter estes problemas e desenvolver transtornos de
pensamento.
ter um sentido de realidade, de ser dominado pelo princípio de realidade. Se tolerância à
frustração vai além de certo limite, começam a funcionar aos mecanismos onipotentes,
especialmente a identificação projetiva. Isto pode todavia ser considerado realista,
enquanto sugere a captação do valor de uma capacidade de pensamento como um meio
para suavizar a frustração quando predomina o princípio da realidade. Porém, sua
eficácia depende da existência da capacidade de reverie da mãe. Se a mãe falha, então
uma nova carga recai sobre a capacidade de tolerância a frustração do lactante, porque
agora sua capacidade de tolerância à frustração do pensamento em si é colocada a
prova. Estou agora supondo que a identificação projetiva é uma forma primitiva do que
posteriormente será a capacidade para pensar. Um lactante dotado de uma capacidade
marcada pela tolerância à frustração poderá sobreviver à penosa prova de ter uma mãe
incapaz de reverie e, portanto, incapaz de lhe prover com a satisfação de suas
necessidades mentais. Caso contrário, um lactante notoriamente incapaz de tolerar a
frustração não consegue sobreviver sem uma crise mesmo à experiência da identificação
projetiva com uma mãe capaz de reverie; nada que não seja um seio inesgotável poderia
ajudar e isso não é possível, inclusive pela falta de apetite, se não houver outra razão.
Deste modo enfocamos um tipo de vida mental não abarcada pelas teorias elaboradas
para a compreensão das neuroses. Não me proponho a continuar esta investigação
agora, exceto no que tem a ver com a função-alpha.
Capítulo XIII
1 – Para que seu uso seja efetivo, é preciso poder considerar a função-alpha como uma
constante, em virtude de sua posição, como uma incógnita. Ao mesmo tempo em que é
flexível, sua flexibilidade deriva do emprego de variáveis como fatores que podem ser
substituídos, conforme foi anteriormente explicado, por teorias e conceitos de valor
fixo. Os valores atribuídos às variáveis (os fatores) devem ser verdadeiramente
constantes para que, uma vez que seu valor tenha sido fixado, o significado da função-
alpha resulte também fixado. Na prática, uma aproximação da precisão somente seria
possível no sentido de que o fator deve ser claramente descrito ou, no caso de uma
teoria corretamente citada 26.
26Consideramos seu significado prático na análise sobre a antologia das teorias. É possível ter uma ideia
da magnitude do problema estudando o trabalho de J. O. Wisdow A methodological Approach to the
problem of Hysteria, lido na sociedade holandesa de psicanálise, Amsterdam, 16 de dezembro de 1957.
tendo o mesmo valor nas semanas que se seguem. No próximo grupo de sessões pode
tornar-se evidente que a crença de que um objeto mal existe se manifesta como
expressão de uma crítica invejosa a um bom objeto. Neste caso a formulação irá refletir
esta a mudança de fatores. Na semana seguinte a função-alpha pode ter deixado de ter
uma importância fundamental, e outros fatores e alguma outra função ter tomado seu
lugar. O princípio de aplicar a teoria das funções segue sendo o mesmo, qualquer que
seja a função e quaisquer que sejam os fatores dos quais esta é função.
3 – Como método para esclarecer algo para si mesmo, o analista precisa ter seu próprio
livro de teorias psicanalíticas, que ele pessoalmente utiliza com frequência, juntamente
com números de páginas e parágrafos que assegurem sua identificação.
Capítulo XIV
3 – Não há razão para que nenhuma destas afirmativas seja verdade; os sinais podem se
relacionar com os fatos de tal forma que impede que se tornem símbolos sem sentido, e
ao mesmo tempo podem ser suficientemente abstratos para assegurar que geralmente
são, e não de modo meramente casual, aplicáveis a situações emocionais reais.
Se o paciente é amistoso o vinculo pode ser representado por meio de A. não é uma
representação adequada porque é necessário registrar o estado da transferência. Arrogo-
me o esforço de dizer o que quero significar com isso registrando a transferência de
acordo com o sistema sugerido anteriormente (Cap. XIII, paragrafo 6).
Capitulo XV
Teoricamente, não vejo razão para lhe impedir que opte para este fim por qualquer
elemento de sua escolha, porém, na prática há muito a favor da escolha de um elemento
que tem sua importância derivada de outros aspectos de sua posição na afirmação total.
Obviamente é mais provável que um elemento que já tem tal importância suporte
cargas maiores do que outros que não tem a mesma importância. O vínculo A, O e C é
precisamente um elemento desta classe. Quando o analista escolhe seu sinal, deve sentir
que é o correto e cabe esperar que o mantenha constante. Se, em referência a ele , os
outros elementos pareçam tornar o enunciado incompatível consigo mesmo, os outros
elementos devem ser harmonizados e não alteradas as relações de A, O e C, a menos
que resulte claro de que foram escolhidos erroneamente ou que o analisando mudou;
neste caso toda o enunciado deve ser abandonado e deve-se começar novamente. Ver-
se-á que dou grande importância a eleição de A, O ou C, que prefiro escolher o sinal que
representa o vínculo como o elemento mais apropriado para receber a carga que desejo
que receba, contudo, não tenho dificuldades de conceber que possa haver boas razões
pelas quais um analista prefira construir seu enunciado “verdadeiro” baseado em algum
elemento diferente. Não creio que a escolha seja particularmente difícil para um analista
treinado e que pratica a psicanálise.
2 – A, O ou C devem ser estabelecidos de tal forma que o analista sinta que foi
estabelecido um ponto de referência. Fazendo isso, diminui-se o perigo de produzir um
sistema de abstrações, falta de background e somente sujeito a manipulações
engenhosas e arbitrárias.
Capítulo XVI
O vínculo C
3 – As dúvidas a cerca da capacidade humana para conhecer algo são à base das
investigações do filósofo da ciência; hoje em dia estas dúvidas são produzidas pela
inesgotável consciência de que a situação representada pelos termos abstratos X C Y é
idêntica a X A Y ou X O Y nas quais um ser animado intrinsicamente existe. Ou seja,
que na medida em que se introduz a maquinaria inanimada para deslocar o elemento
vivo, A O ou C deixam de existir. A psicanálise agregou significação ao problema com
que os filósofos da ciência têm estado associados e isto ocorreu por dois grupos
principais de razões: X tem força e se mostra em detalhe que tem a debilidade da qual
sempre se suspeitou quando se embarca em uma investigação de Y relacionada com a
capacidade de Y para entrar em contato com a realidade. Buscarei não me ocupar dos
problemas filosóficos implícitos, dado que estes já foram tratados por Kant, Hume e
seus sucessores. Quero ressaltar apenas que tudo o que foi dito sobre o problema do
conhecimento pode ser aplicado com a mesma força sobre a psicanálise e que a
psicanálise pode ser aplicada com particular força a estes problemas.
4 – A pergunta: “Como X pode conhecer algo?” expressa um sentimento: este parece ser
doloroso e inerente à experiência emocional que represento por X C Y. Uma experiência
emocional sentida como dolorosa pode dar início a uma tentativa de se evadir ou
modificar a dor de acordo com a capacidade da personalidade para tolerar a frustração.
Evasão ou modificação, de acordo com o ponto de vista expresso por Freud em seu
trabalho “Sobre os dois princípios do funcionamento mental”, tem como fim fazer
desaparecer a dor. Trata-se de realizar a modificação por meio do uso da relação X C Y
para que leve a uma relação em que X possua um conhecimento chamado Y – o
significado de X C Y por mim afastado no parágrafo 1. A evasão, por outro lado, é uma
tentativa de substituir o sentido “X possui um conhecimento chamado Y”, para que X C
Y não mais represente a experiência emocional dolorosa, mas aquela que seria
supostamente indolor.
5 – Tal manobra tem por fim não afirmar, mas negar a realidade, não representar uma
experiência emocional, mas representa-la mal, para que mais parecesse um êxito mais
do que a intenção de alcança-lo. A diferença entre a finalidade da mentira e da verdade
pode assim ser expressa como uma mudança no sentido de X C Y e estar relacionada
com intolerância a dor associada com o sentimento de frustração. O problema de
traduzir o “conhecimento” privado em público é o mesmo que existe ao representarmos
uma experiência emocional de modo distorcido, bem como é problemático representa-la
adequadamente. Na psicanálise de certos pacientes devemos nos interessar por seu
fracasso na tentativa de representar de modo distorcido experiências emocionais, ainda
que perante eles mesmos; é possível aumentar a compreensão do doente mental levando
em consideração seu fracasso para substituir uma representação distorcida dos fatos pela
representação que corresponde à realidade e, portanto, a esclarece. O motivo poderia ser
explicado por meio da afirmação de Freud de que “a alucinação foi abandonada
somente em razão da falta de gratificação esperada”. Será necessário examinar o
problema como se tivesse duas finalidades distintas: a primeira, interessada em
conhecer uma pessoa ou coisa, C na realidade. E a segunda interessada em evadir-se de
C e da experiência emocional que representa. O procedimento que proponho, como
parte de C com o fim de conhecer “X C Y” e o que isso representa, implica, portanto,
identificação com uma pessoa que vem para a análise. Implica, também, a abstração da
“realização” para produzir uma formulação que represente a “realização” e que portanto
poderia corresponder a “realizações” atualmente desconhecidas, e, portanto, representa-
las.
Capítulo XVII
3 – As razões para fazer um enunciado abstrato são estas: 1) o analista se sente impelido
a formular suas hipóteses básicas. 2) o analista pode detectar a partir do registro que tal
abstração possibilita qualquer tendência pela qual a bagagem teórica na qual se baseia
resulte inoperante; 3) evita-se que o analista perca de vista de onde provém seu
equipamento teórico dentro história da disciplina científica; 4) os que praticam a análise
estarão mais dispostos a ver que certas teorias consideradas até então como consagradas
de fato de converteram em redundantes ou foram desvirtuadas pela comprovação da
experiência; 5) se torna possível à correlação do enunciado abstrato com as
“realizações” das quais não derivou; 6) ajuda a estabelecer um padrão ao qual podem
ser referidas todas as outros enunciados, conforme exemplificaremos nas páginas
seguintes.
O processo de abstração ao qual conscientemente recorreu-se é essencial à experiência
emocional X C Y e não um procedimento acessório que possa ser simplesmente
descartado.
4 – Uma vez que tenha sido dada prioridade ao vínculo e acordado limitar sua
representação aos três sinais A, O e C, torna-se possível focalizar o problema da
representação considerando quais medidas seriam necessárias para estabelecer um
método exitoso para a representação distorcida. Como o processo de abstração não é
fortuito e não pode ser simplesmente descartado, devem ser tomadas medidas positivas
para que um indivíduo alcance o estado mental, que é observado em alguns psicóticos,
nos quais a capacidade para a abstração foi destruída. O valor, por exemplo, da palavra
cachorro, quando não se refere a um animal específico senão a classe, como método
para alcançar uma abstração e generalização, fica anulado, de modo que já não pode
mais ser usado como o nome de uma coisa, senão como a coisa-em-si, “as palavras são
coisas”. Em um sistema estruturado para representar o vínculo C é necessário à
introdução de elementos que possam representar a representação distorcida. Isto pode
ser feito simplesmente tomando emprestado da geometria algébrica o procedimento
pelo qual uma mudança de sinal, digamos de uma linha AB, representa uma mudança
no sentido da linha. C representa o vínculo que foi anunciado: -C representa o vínculo
constituído para NÃO compreender, ou seja, compreensão distorcida
(misunderstanding). Compreenderemos melhor as implicações disso se notarmos que -
A não é o mesmo que O, nem que – O é o mesmo que A.
5 – Pelo momento os fatores devem ser representados por uma referência de página e
linha àquela parte da literatura que proporciona a melhor definição do fator ao qual se
faz referência. A busca de sinais para representar fatores seguindo assim o procedimento
que foi adotado com A, O e C é prematuro, porque a substituição de um sinal por um
termo correntemente aceito produz um sistema formalizado, tão divorciado de seu
background que perde o significado, enquanto que conservando uma sistema de
referência de página e linha de background da “realização” do qual derivam as teorias
nunca se perde completamente de vista. Por outro lado, a formalização e a abstração
tem o efeito de eliminar aspectos que obscurecem a importância de relação de um
elemento com outro, ao eliminar o concreto e o particular. O uso de termos específicos
notáveis pela concretude de seus pensamentos, mesmo que conservando o background
do qual derivam, obscurecem o fato de que os termos concretos são variáveis cujo valor
depende do contexto no qual estão alocados. Isto significa que o essencial é encontrar
um grupo de sinais que representem uma “realização” de modo adequado e que
possibilitem mostrar a relação de um sinal com o outro - seu contexto.
Capítulo XVIII
2 – O problema não reside somente no uso de palavras já investidas com uma penumbra
de associações para descrever uma situação sem precedentes, senão que esta penumbra
de associações foi adquirida na busca do estabelecimento de uma relação mental com
objetos concretos. Esta busca, no desenvolvimento do indivíduo, é muito menos árdua
que a intenção de estabelecer uma relação mental com uma personalidade, quer seja a
do próprio indivíduo ou a de outra pessoa. Os sentidos apresentam à personalidade o
material sobre o qual irá trabalhar para produzir o que Freud chama de “captação
consciente ligada a estes”, ou seja, os dados sensoriais. Porém, torna-se difícil crer que
os dados sensoriais, como os entendemos de modo ordinário, pudessem aportar tão
valioso material quando o objeto dos sentidos é uma experiência emocional de uma
personalidade (a quem quer que possa pertencer). Os sentidos podem, em um estado de
temor ou ira, contribuir com dados que concernem às batidas do coração e fatos
similares, que nós costumamos entender como periféricos a um estado emocional.
Porém, não há dados sensoriais diretamente relacionados com a qualidade psíquica,
enquanto há dados sensoriais diretamente relacionados com objetos concretos. Os
sintomas hipocondríacos, portanto, podem ser sinais de uma intenção de estabelecer
contato com uma qualidade psíquica, substituindo a sensação física por dados sensoriais
de qualidade psíquica que estão ausentes. É possível que foi em resposta à captação
desta dificuldade que Freud sentiu-se disposto a postular a consciência como órgão
sensorial de qualidade psíquica. Não tenho qualquer dúvida acerca da necessidade de
algo na personalidade que faça contato com a qualidade psíquica.
27 É importante diferenciar a natureza das teorias, a teoria da função alpha é introduzida para que seja
possível ao analista trabalhar sem propor prematuramente uma teoria nova; a teoria de Freud da
consciência como órgão sensorial para a causalidade psíquica é parte da teoria psicanalítica reconhecida.
Capítulo XIX
28 O processo que o analista está ativando nos casos em que investiga perturbações do pensamento é
pensado para investigar o mesmo processo no paciente. O que os analistas chamam de fantasias são, pelo
menos em alguns casos, o que restou do que em algum momento foram os modelos quo analisando
formou para dar correspondência às suas experiências emocionais. Neste sentido o mito de Édipo é a
sobrevivência de um modelo idealizado para que correspondesse à experiência emocional de um lactante.
Se o caso apresenta uma perturbação do pensamento notar-se-á que o modelo jamais se formou
adequadamente. Como resultado disso, a situação edípica aparecerá mal estruturada ou não existirá. A
análise de tal paciente, se esta progredir, revelará intenções de formar este modelo.
impressão sensorial em elementos-alpha? Seria útil postular29 impressões sensoriais de
uma experiência emocional análogas às impressões sensoriais de objetos concretos. Se
tais impressões existem, devemos considerar se os elementos-alpha nos quais a função-
alpha transforma as impressões sensoriais em uma experiência emocional diferem dos
elementos-alpha nos quais a função-alpha transforma os dados sensoriais em um objeto
concreto, e sendo assim, em que radica a diferença. Freud sugeriu que o modelo para os
processos primários e secundários era o aparelho reflexo; a aplicação da teoria das
funções exige que primeiro se forme o modelo e posteriormente que se prove que pode
ser representado pela abstração teórica que foi chamada de vínculo, e se este pode
representar, e como, a “realização” que estimulou a produção do modelo. A função-
alpha representa algo que existe quando certos fatores operam em consonância. Supõe-
se que há fatores que operam em dita consonância , ou se não que, se por alguma razão
não o fazem, ou seja, se os fatores dos quais se dispõe não tem função-alpha, então a
personalidade é incapaz de produzir elementos-alpha e, portanto, incapaz de
pensamentos oníricos, consciência ou inconsciência, repressão ou aprendizagem da
experiência. Este fracasso é sério, porque para além dos prejuízos óbvios que a
incapacidade de aprender com a experiência acarreta, existe a necessidade da captação
de objetos concretos que se faz através das percepções sensoriais, porque a ausência de
tal captação implica em não ter verdade, e a verdade parece ser essencial para a saúde
psíquica. O efeito que dita privação pode ter na personalidade é análogo ao efeito que a
inanição pode ter no físico.
29 A postulação destes objetos pode ser objetada segundo expressa Frege, opondo-se a postulação de
“objetos lógicos”, pag 55, 56 em Grunlagen der Arithmetik. O psicanalista deve confiar que a experiência
emocional da análise revele os elementos que considere fatores da função alpha. Se pensa que alguns
destes fatores merecem ser descritos como análogos às impressões sensoriais de objetos concretos seria o
momento de formular as hipóteses definitórias corretas ou de lhes assinalar os termos já existentes que
pareçam ser o nome de tais hipóteses.
O analista está então na situação de alguém que , graças ao poder da percepção “binocular” e a
consequente correlação quer a posse de uma capacidade para o pensamento consciente e inconsciente lhe
confere, é capaz de formar modelos e abstrações que servem para elucidar a incapacidade do paciente
para fazer o mesmo.
Uma descrição mais detalhada disso corresponde à descrição da psicanálise clínica, na qual não posso
entrar aqui, exceto no que for necessário para ilustrar meu tema, ou seja, o problema do método do
analista na aprendizagem pela experiência.
para especular em que parte o aparelho psíquico atual se deflexiona para prover o
aparelho que é preciso para pensar. Freud, ao descrever o pensamento como o que provê
um método de restrição da descarga motora que havia se tornado necessária, diz
simplesmente que se desenvolveu da ideação. Ao referir-se à Interpretação dos sonhos,
Freud, influenciado pelo valor do aparelho reflexo como modelo para o aparelho
psíquico implicado no sonhar, desenvolveu sua teoria dos sistemas primário e
secundário à luz deste modelo 30.
4 – Ver-se-á que não compreendo a natureza da função-alpha e que a deixo como uma
abstração para ser usada como uma incógnita à qual é dado um valor somente no curso
da investigação psicanalítica31. Para isso, estou tratando se um problema diverso do que
foi investigado por Freud com suas teorias da ideação e seu modelo de um arco reflexo.
Estou supondo que existe um aparelho e que teve e tem, todavia, que sofrer a adaptação
às novas tarefas implícitas no enfrentamento com as exigências da realidade,
desenvolvendo uma capacidade para o pensamento. O aparelho que tem que sofrer esta
adaptação é aquele que originalmente toma conta das impressões sensoriais
relacionadas com o tubo digestivo.
Neste sistema, conforme pude compreender e expressar, nas palavras que pude deduzir,
ocorre o seguinte: o lactente capta a existência de um seio muito mau dentro de si, um
seio que “não está ali” e que por não estar provoca sentimentos dolorosos. Sente-se que
31Um processo similar aquele por meio do qual a preconcepção e a experiência de uma realização se
unem para estimular a gênese de uma concepção
este objeto é evacuado pelo sistema respiratório ou pelo processo de “engolir” um seio
que satisfaça. Este seio que se engole não se distingue de um “pensamento”, porém o
“pensamento” depende da existência de um objeto que seja efetivamente colocado
dentro da boca. Em certas condições que dependem de fatores da personalidade, o
processo de mamar e as sensações que o acompanham equivalem à evacuação de um
seio mau. O seio, a coisa em si, não se distingue de uma ideia na mente. A ideia de um
seio na mente, reciprocamente, não se distingue de uma coisa em si na boca. Estamos
nos circunscrevemos somente a duas situações, uma das quais é um seio real, que não se
distingue de um experiência emocional, que por sua vez é coisa em si, e o pensamento,
mas em um estado indiferenciado, e a outra, a terrível “necessidade-de-um-seio”, seio
mau que também é um objeto composto de experiência emocional e coisa em si, os dois,
todavia, indiferenciados, fica claro que nos aproximamos de um objeto que se parece
bastante com um elemento-beta. A “realização” e sua representação na mente não foram
diferenciadas. As características desta condição podem ficar mais claras se extraio
algumas de suas manifestações. Para isso, o lactante que tem uma “necessidade-de-um-
seio”, seio mau, pode evacuá-lo ao mamar. É obvio que isso requer uma relação
topograficamente próxima de um seio real. Pode evacuá-lo mediante o sistema
respiratório: não é necessário que haja sensações táteis para isso. Pode evacuá-lo ao ver
o seio real; por isso é necessário que o seio real esteja à vista, ou seja, em uma posição
na qual estar à vista é igual a estar no olho da mente e ambos são o mesmo que estar na
boca. Se todos estes fatos são evacuações da “necessidade-de-um seio”, seio mau, fica
claro que não se dispõe nem de um seio, o ”não seio” será vivido não somente como
mau em si mesmo, senão como pior, porque podemos dizer que é um testemunho
concreto de que este seio mau foi evacuado com êxito. Nesta situação, o termo correto
para descrever o objeto que o lactente vivencia seria um “objeto estranho ” mais do que
um elemento beta.
Capítulo XX
1 – Quando a evacuação de um seio mau leva a sentir sua presença externamente,
quando a evacuação ocorre, aparente pela sucção se um seio verdadeiro, as
consequências da evacuação não são dolorosas, tal qual aos métodos respiratórios e
outros. Isto estimula a inteiração entre o princípio da realidade e o princípio do prazer-
desprazer. Podemos sintetizar: 1) o processo de diferenciação entre a representação de
sua correspondente “realização”, o processo pelo qual a coisa em si pode ser distinta da
ideia (Bradey, 1,148), ou 2) os efeitos da correspondência entre a alimentação e o
pensar. O primeiro caminho leva diretamente a que tratemos a importância da abstração,
a qual, neste contexto, pode ser considerada como um aspecto da transformação, pela
função-alpha, de uma experiência emocional em elemento-alpha.
2 – A teoria kleiniana de que o lactante sente que evacuou seu mau objeto no seio,
combinada com a teoria de que a satisfação de uma necessidade possa ser sentida como
um aspecto da evacuação de uma necessidade, sendo esta necessidade um seio mau
(para empregar termos concretos) ou o que é denominado de elemento-beta (para
empregar uma abstração), representa um sentimento do lactante de que o seio é na
realidade um objeto mau evacuado e que, portanto, não pode distinguir-se de um
elemento-beta. Contudo, algo deve ocorrer se o bebê continua se alimentando. Está
implícito no processo descrito que a situação não pode ser reconhecida como objetiva.
Se existe um seio bom, um objeto doce, é porque este foi evacuado, produzido; o
mesmo ocorre com o seio mau, o seio do qual se precisa, o seio amargo, etc. Não pode
ser considerado nem como objetivo, nem como subjetivo. Destes objetos doces,
amargos, ácidos, se abstrai a doçura, o amargor e a acidez. Uma vez abstraídos podem
ser novamente aplicados; a abstração pode ser utilizada em situações nas quais uma
“realização”, não a “realização” original da qual foi originalmente abstraída, se
aproxima desta. Por exemplo, uma experiência emocional é associada com o seio, na
qual o lactante sente que há um objeto que existe independentemente dele mesmo e do
qual sente que pode depender para satisfazer seus sentimentos de fome; supondo uma
capacidade para abstração, o lactante pode sentir que pode separar um elemento da
experiência total, que é a crença de que existe um objeto que possa satisfazer suas
necessidades. A afirmação concreta poderia ser: existe um seio do qual é possível
depender para satisfazer sua fome de alimento; a abstração disso poderia ser: há algo
que pode e é dado a ele, quando ele o quiser.
5 – Eu devo ignorar que: 1), dado que é um enunciado cujos sistemas abstratos
derivados foram representações de “realizações” que geralmente se sente que são de
uma classe distinta das “realizações” que correspondem a 2, 4, 5 e ; 3 representa uma
“realização” que logo teremos que levar em conta. É peculiar, no entanto que as “as
realizações” que se aproximam desta relação tem uma similaridade superficial com as
realizações que se aproximam das representações derivadas de 1.
Capítulo XXI
32 O significado deste fenômeno varia de acordo com a emoção que acompanha a experiência. O paciente
pode crer que sua ação é uma evacuação, porém a natureza da crença depende de se ele se sente
agressivo, deprimido ou perseguido. Se sua ação é considerada pelo analista uma comunicação verbal
normal, o paciente não sabe “o que sente”, aparentemente a conduta do paciente se assemelha muito a um
estado onírico como o que descrevi no capítulo IX, par.4. é na verdade uma tela beta e não consegue
efetuar uma divisão dos pensamentos em conscientes e inconscientes. Se for um sonho verdadeiro a
situação analítica proporcionará uma prova da separação entre consciente e inconsciente, como a que
existe quando o paciente de identifica com o inconsciente e o analista com consciente ou vice-versa.
é equiparável ao que tem uma aproximação primitiva à abstração na qual a experiência
completa, por exemplo, o alimentar-se, pode ser usado como modelo para um problema
posterior. O defeito do modelo como instrumento reforça a necessidade de produzir
abstrações.
Capítulo XXII
34 Ver E. Money-Kirle, Man’s Picture of his World, cap.IV. o problema que ali se trata é o mesmo que se
discute aqui no campo restrito do método psicanalítico. Money-Kirle mostra que o homem tem que
enfrentar o problema nas tarefas que realiza através de sua vida.
2 – Suponhamos que o lactante repita uma experiência emocional na qual os elementos
seguintes estão constantemente unidos; ao ver um homem, a sensação de ser amado por
este, a sensação de necessitar deste homem, uma captação de que a mãe repita uma
frase: “Esse é o papai”. “Pa, pa, pa”, repete então a criança. “Este é o papai”, diz a mãe.
Da experiência emocional a criança abstrai certos elementos e quais estes são irá
depender em parte do lactante; estes elementos abstraídos recebem o nome de “papai” e
outras situações nas quais os mesmos elementos parecem estar unidos: assim se
estabelece um vocabulário. Esta não é uma descrição dos fatos; dou-lhe o status de um
modelo do qual abstraio uma teoria e espero descobrir que é uma representação a qual
corresponda alguma “realização”. A teoria que abstraio é “Papai” é o nome de uma
hipótese35. A hipótese chamada “Papai” é uma afirmação de que certos elementos estão
constantemente unidos.
3 – A criança agora encontra outra pessoa que também diz “pa-pa-pa”, contudo em
circunstancias que aparentemente não correspondem com as circunstâncias a que “pa-
pa-pa” está associado. Há um homem, porém, não é aquele que deveria ser. Todavia,
alguns elementos nesta nova situação correspondem a elementos em situações que a
criança considera “realizações” que correspondem à hipótese cujo nome é “Papai”. A
hipótese deve ser revisada para que represente as “realizações”. Pode ser abandonada
em favor de outra ou converter-se em um sistema de hipóteses, um sistema dedutivo
científico. As experiências continuam e o sistema dedutivo científico denominado
“Papai” se torna progressivamente mais complexo. Usando o modelo para abstrair uma
teoria, o indivíduo deve ser capaz de abstrair de uma experiência emocional elementos
que pareçam estar unidos, incluindo um elemento que é, ao mesmo tempo o nome da
teoria, ou hipótese ou sistema dedutivo científico; é também o nome da realização que
se crê se aproxime da teoria. Assim, “poltrona” é: 1) o nome dado a alguma coisa em si
como se supõe que exista na realidade: isto seguindo Kant, não pode ser conhecido36
por nós. 2) o nome dado ao fato selecionado. 3) o nome dado a uma seleção de
35 Ver Rosenfeld, H., On drug addiction, Jornal de psych-anal. Vol XLI, p.472, para obter um exemplo
que esclarece o problema que foi ilustrado por meio do modelo do uso do lactante do “papa”. Mesmo que
a apresente como ocorrida em um sonho, é típico de uma atitude mental não restrita ao sonho.
Até aqui somente foram utilizadas as palavras “Papai” e “poltrona”, como exemplos de
nomes de hipóteses; ou seja, de elementos abstraídos de uma situação emocional e aos
quais é dada coerência por meio de um nome.
4 – O uso do termo hipótese como um nome para o objeto que será descrito mais
frequentemente como um conceito é a expressão do problema apresentado por 3),
segundo emerge quando é investigado psicanaliticamente. O problema apresentado pela
teoria psicanalítica é a falta de uma terminologia adequada para descrevê-la, e neste
sentido se assemelha ao problema que Aristóteles solucionou supondo que as
matemáticas tratam de objetos matemáticos. É conveniente supor que a psicanálise trata
com objetos psicanalíticos e que o psicanalista deve se interessar na detecção e
observação de certos objetos ao conduzir uma análise. 3) descreve um dos aspectos
destes objetos. O emprego do termo “hipótese” provisoriamente, porque o significado
associado com o uso científico destes termos tem aspectos que são compartilhados pelo
objeto psicanalítico. A identificação de tal objeto depende de: a) a possibilidade de
encontrar um meio através do qual possa ser comunicado a natureza do objeto. Isto
implica o emprego dos próprios métodos que são objetos desta investigação e; b) o
equipamento mental que o observador possa sustentar; a) e b) são, portanto, esboços de
problemas sobre os quais estas investigações devem convergir.
5 – Dos elementos de uma “realização” somente alguns têm como seus correspondentes
dados sensoriais vinculados entre si como estando constantemente unidos. Estes
elementos e seus correspondentes dados sensoriais podem, portanto, ser considerados
como abstraídos da totalidade dos elementos na “realização”. Uma abstração posterior
tem lugar quando se dá aos elementos um nome que é percebido como diferente da
“realização” que representa. A abstração somente pode ocupar a função de uma
preconcepção. A generalização deve, portanto, poder particularizar; a abstração deve
poder concretizar. Implícito no termo “dar concretude a” está o modelo do qual deriva.
O modelo provê um background de significado que pode evitar que minha afirmação
esteja tão apartada da realidade de modo que se torne pouco apropriado para dar a
aparência de uma “realização’. Porém, a implicação, que é sua força, se torna uma
debilidade quando emprega um participante numa relação na qual o vínculo é menos C.
(Mais adiante o escreveremos “ – C”. Isso é analisado em detalhe no Cap. XXVIII).
Esta debilidade e seu aproveitamento em – C se torna evidente na análise do paciente
que parece incapaz de abstrair, o paciente para o qual as palavras são coisas – as coisas
que a palavra supõe representar, mas que este não consegue distinguir de seu nome e
vice-versa.
determina o valor da constante uma vez que este tenha sido identificado. Podemos
utilizar a constante desconhecida ϕ para representar uma preconcepção inata.
uma concepção. O elemento previamente não saturado {ε} junto com a constante
desconhecida ϕ compartilham um componente, que é o caráter inato da personalidade.
Representamos isso por meio de (M). O objeto psicanalítico pode então ser representado
através de ϕ {ε} (M). O valor de (M), como o de {ε}, será determinado pela experiência
emocional estimulada pela “realização”, ou seja, no modelo que foi apresentado como o
encontro com o seio. O valor do objeto psicanalítico ϕ {ε} (M) será então determinado
menos, este será determinado somente pelo contato com uma “realização”. A abstração
do objeto psicanalítico estará relacionada com a resolução das exigências do narcisismo
e social-ismo em conflito. Se a tendência é social, a abstração (+Y) estará relacionada
com o isolamento de qualidades primárias. Se a tendência é narcisista a abstração (-Y)
será substituída pela atividade apropriada a – C, que, todavia não foi tratada.
10 – C, ao que o analista está restrito, implica em abstração do objeto psicanalítico
representado por meio de {(Y) ϕ (ε) (Μ) }. A abstração deve poder servir como a
constante para que possa ocupar a função de uma incógnita e, ainda, em virtude do
objeto psicanalítico do qual se deriva, ter os atributos de uma preconcepção que tem,
diferentemente da preconcepção inata, uma penumbra de significado. Segue sendo uma
incógnita, contudo a variedade de valores que podem ser a ela empregados pela
identificação de (ε) é restrita. O termo conhecimento a priori somente pode ser aplicado
a objetos psicanalíticos onde ϕ é uma incógnita cujo valor pode ser determinado através
É necessário e deveria ser possível, encontrar hipóteses que possam ser utilizadas em
sistemas dedutivos científicos tanto como premissa, como hipóteses derivadas.
Podemos então concluir que estes sistemas dedutivos científicos abstraídos de
experiências emocionais podem acabar representando outras experiências emocionais
das quais não foram derivadas, mas as quais é possível observar que se aproximam do
sistema dedutivo científico representativo em questão. O sistema dedutivo científico
pode ser ainda mais abstraído para que se produza o equivalente a um cálculo algébrico
que o representaria.
Capítulo XXIII
2 – Esta descrição tem uma grande semelhança com a teoria psicanalítica das posições
esquizo-paranóide e depressiva esboçada por M. Klein. É usado o termo “fato
selecionado” para descrever o que o psicanalista deve experimentar no processo de
síntese. O nome de um elemento é utilizado para particularizar o fato selecionado, ou
seja, o nome daquele elemento na “realização” que parece vincular elementos que até
agora não haviam sido percebidos como conectados. As representações dos fatos
selecionados podem então ser vistas como tendo uma coerência similar se for possível
encontrar a representação apropriada para um numero selecionado de fatos. Os fatos
selecionados, juntamente com o fato selecionado que parece dar coerência a um número
de fatos selecionados, emergem de um objeto psicanalítico ou series de tais objetos, mas
não podem ser formulados de acordo com os princípios que regem um sistema dedutivo
científico. Deve-se trabalhar sobre os fatos selecionados através de processos racionais
conscientes antes que se possa criar tal sistema. Somente então é possível formular a
representação que reunirá os elementos de fatos selecionados coerentes em um sistema
dedutivo científico. No sistema dedutivo científico as hipóteses do sistema devem se
manter unidas por regras, porém estas não correspondem com aquilo que na
“realização” parece vincular os elementos cuja relação aparece revelada pelo fato
selecionado. Neste sentido, as regras que mantém as hipóteses unidas no sistema de
hipóteses, ou seja, o sistema dedutivo científico, são as regras da lógica. A relação entre
as hipóteses de um sistema dedutivo científico, ou seja, a conexão lógica entre estas que
se fez notar através do sistema dedutivo, é característica do pensamento consciente
racional, mas não da relação entre os elementos de uma “realização”, na qual os
fenômenos parecem se unir como resultado da descoberta de um fato selecionado. O
fato selecionado é o nome de uma experiência emocional, a experiência emocional de
um sentido de descoberta da coerência; sua significação é, portanto, epistemológica e
não devemos presumir que a relação de fatos selecionados é lógica. Os elementos que se
pensa estarem relacionados têm na realidade uma contraparte coisas em si. Devemos
supor que fatos relacionados representam uma coisa em si e de maneira similar que a
relação, a saber a relação lógica, entre os elementos no sistema dedutivo tem também
uma contraparte na realidade, uma coisas em si que se aproxima da lógica dedutiva?
5 – Qualquer experiência pode ser utilizada como “modelo” para alguma experiência
futura. Este aspecto da aprendizagem por meio da experiência está conectado e pode ser
idêntico ou a função que Freud atribui à atenção quando diz que esta deve “indagar
periodicamente o mundo exterior para que seus dados já lhes seja familiar quando surgir
uma necessidade interna urgente”. O valor de um modelo consiste em que seus dados
familiares estão disponíveis para satisfazer qualquer necessidade urgente, interna ou
externa. O fato selecionado precipita o modelo. Sente-se então que a coerência dos
elementos no modelo identificado com a “realização” pertence aos elementos da
“realização”.
6 – Antes que uma experiência emocional possa ser utilizada como modelo, seus dados
sensoriais devem ser transformados em elementos-alpha para serem armazenados e
tornarem-se disponíveis para a abstração. (Em – C o significado é abstraído, deixando
uma representação desnudada). A construção de modelos durante a experiência está
relacionada com o modelo necessário para essa experiência; a função-alpha durante a
experiência provê os elementos necessários para a construção de modelos em uma
experiência posterior; o modelo é precipitado durante a experiência para a qual o
modelo é necessário. Retiram-se elementos de seu arquivo mental para prover um
modelo que é uma aproximação ao acontecimento que ele irá esclarecer. A
personalidade abstrai da experiência os elementos que espera que se repitam e forma
sobre a base destes elementos o modelo que preservará algo da experiência original,
mas com flexibilidade suficiente para permitir a adaptação a experiências novas, mas
que se supõe similares. Abstrai elementos para construir um modelo, uma abstração ou
ambos. Usarei o termo modelo onde a construção é forjada para satisfazer uma
“necessidade urgente” de concretude. (Construção, forjar, o concreto. Estas três palavras
tem implicações dos modelos dos quais as palavras foram abstraídas. Deixou a
passagem como um exemplo da influência latente, ainda que notória nesse caso, do
modelo). Se um modelo for necessário, aqueles elementos serão abstraídos do arquivo
de elementos-alpha que têm, como as imagens visuais, uma reminiscência da
experiência emocional durante a qual se formou o elemento-alpha. Quanto mais são
empregados tais elementos, mais rígido se torna o modelo e mais restrita a sua
aplicação; a restrição é modificada se o modelo formado por uma combinação destes
elementos se submete então a posterior abstração. As abstrações necessitam, então,
serem combinadas de acordo com as regras da lógica. Este sistema de abstrações é o
sistema dedutivo científico.
Capítulo XXIV
3 – Uma formulação teórica que parece ser demasiado concreta e, ainda assim
demasiadamente abstrata tem que ser generalizada de tal modo que suas “realizações”
sejam mais facilmente detectadas, sem a companhia da debilidade, que muitas vezes se
dá nas matemáticas, de parecer uma arbitrária manipulação de símbolos. É possível
reter seus elementos concretos sem perder a flexibilidade tão essencial para a aplicação
psicanalítica? Se for possível fazê-la mais abstrata, ainda que talvez não encontremos
uma formula algébrica para representar um sistema dedutivo científico. Posteriormente
direi algo mais acerca desta possibilidade.
Capítulo XXV
1 – Podemos considerar o modelo como uma abstração de uma experiência emocional
ou como a concretização de uma abstração. Este último se assemelha à transformação
de uma hipótese em termos de dados empiricamente verificáveis. No grupo o mito pode
com direito ser considerado como algo que desempenha o mesmo papel na sociedade
que o modelo desempenha no trabalho científico do indivíduo.
2 – Como um exemplo de modelo tomo a história de uma criança que aprende a palavra
“papai”. Esta história não pretende ser um fato. É derivada da experiência de pacientes
em análise, observação de crianças, leituras dispersas, algumas delas filosóficas e de
outras fontes, em resumo, é derivada da experiência, minha experiência. É um artefato
composto de elementos que foram selecionados por mim por meio de meu arquivo de
experiências. Porém, foi formado para um propósito específico; a seleção e combinação
de elementos não é “fortuita”, mas feita para “explicar” ou esclarecer o problema da
abstração. Portanto, não tem valor como testemunho: seu valor reside na facilidade com
que pode ser comunicado e comparado com fatos. Por contraste, meu relato do paciente
que sente que as palavras são coisas não é um modelo, senão um exemplo: o que eu
descrevo pretende ser uma “realização”. Potencialmente, cada “realização” se aproxima
de uma abstração ou de um sistema dedutivo científico, mesmo quando aquele ao qual
corresponde ainda não tenha sido, todavia descoberto (Capítulo 20 [4,5,6]). Quando
confronto um modelo com uma “realização” pode acontecer de que eu obtenha o
esclarecimento que desejo; ou pode resultar tão pouco proveitoso que supõe que o
modelo não serve e o descarte. Os modelos são efêmeros e a este respeito diferem das
teorias; não tenho qualquer problema em descartar um modelo quer ele tenha cumprido
o meu propósito ou fracassado neste. Se um modelo resulta útil em várias ocasiões
diferentes, chega o momento de contemplar a possibilidade de transformá-lo em uma
teoria.
3 – O psicanalista pode construir tantos modelos quantos queira eleger do material à sua
disposição. É importante não confundir estas estruturas efêmeras com “realizações” por
um lado, ou teorias, do outro. O modelo cumpre uma função valiosa sempre que é
possível reconhece-lo pelo que ele é. Se o analista crê que está descrevendo um
acontecimento real, deve deixar isso claro, e não deve permitir que a distinção entre um
acontecimento, sobre cuja autenticidade existem testemunhos, e um modelo se torne
confusa. O mesmo vale para a distinção entre um modelo e uma teoria. Irei me referir às
dificuldades peculiares que perturbam o analista na tarefa de evitar a confusão ao fazer
a distinção entre teoria e modelo e entre modelo e a forma particular de uma teoria
conhecida como interpretação psicanalítica.
Capitulo XXVI
2 – Freud afirma que o pensamento provê um meio para restringir a descarga motora
(Sobre o Funcionamento); o pensamento já não estava dedicado para a liberação de um
acréscimo de estímulo, mas sim à adequada alteração da realidade. De acordo com isso ,
o pensamento é um substituto da descarga motora, mesmo que ele não determine que a
descarga motora cesse de funcionar como método de liberação do psiquismo de
acréscimos de estímulos. Porém, através da identificação projetiva, o pensamento
mesmo adquire a função que previamente havia sido confiada à descarga motora – ou
seja, liberar o psiquismo de acréscimos de estímulos; como a “ação” pode dirigir-se a
alterar o meio, dependendo da possibilidade da personalidade dirigir-se para a evasão da
frustração ou a sua modificação. “Pensar” pode ser considerado como o nome dado a
um modelo ou a uma abstração derivado de uma “realização”; com um paciente real o
problema é determinar o que é que representa para ele o termo pensar. Um indivíduo
pode querer dizer que estão usando os pensamentos e um pensamento é um seio que não
é bom, um seio “necessidade de seio”. O problema então seria enxergar como este
utiliza este “objeto”, especialmente se o paciente se sente incapaz de evacuá-lo, de
libertar-se destes acréscimos de estímulos internos.
5 – Se o paciente não pode “pensar” com seus pensamentos, isto significa que tem
pensamentos, mas que carece de um aparelho para “pensar” que lhe permitiria usar seus
pensamentos, pensa-los, por assim dizê-lo, o primeiro resultado é uma intensificação da
frustração porque falta o pensamento que deveria tornar “possível para o aparelho
mental suportar uma tensão incrementada durante a espera no processo de descarga”. As
medidas que o paciente toma para livrar-se dos objetos, os protopensamentos ou
pensamentos que são para ele inseparáveis da frustração, levaram então precisamente à
crise que desejava evitar, ou seja, a tensão, a frustração não aliviada pela capacidade de
pensamento. A falta de uma capacidade para o pensamento implica, portanto, em um
duplo fracasso. Deve-se a ausência de elementos-alpha e a falta de um aparelho para
utilizar os elementos-alpha quando estes existem. Este duplo fracasso adquire
significação na psicanálise do psicótico quando o paciente reestabelece a função-alpha e
portanto, sua capacidade de sonhar e, todavia, segue sendo incapaz de pensar. Portanto,
recorre à identificação projetiva como um mecanismo que se ocupa dos “pensamentos”.
Porém, se a função-alpha pode desenvolver-se há um aumento correspondente ao
predomínio do princípio da realidade e uma mudança correspondente à identificação
projetiva que perde algo de sua qualidade de fantasia onipotente e ganha através da
habilidade do paciente para lhe dar consistência.
9 – O primeiro requisito para o uso de uma teoria é que as condições sejam adequadas
para a observação. A mais importante destas condições é que o observador esteja
psicanalisado, para assegurar que suas próprias resistências e tensões internas tenham
sido reduzidas ao mínimo, pois, de outro modo, interfeririam na sua visão dos fatos,
tornando impossível a correlação por meio consciente e inconsciente. O próximo passo
do analista é fazer uso de sua atenção. Darwin assinalou que o juízo interfere na
observação. Todavia, o psicanalista deve intervir com interpretações e isso implica em
um exercício de julgamento. Um estado de reverie condizente com a função-alpha,
intromissão do fato selecionado e construção de modelos junto a uma bagagem limitada
a poucas teorias essenciais que tornem menos provável uma ruptura brusca da
observação, do tipo que Darwin pensava. Podem ocorrer várias interpretações ao
analista com um mínimo de perturbação da observação.
11 – Considerarei primeiro o modelo que deve ser construído pelo analista. O modelo é
produzido pelo analista como uma parte da construção de teorias e não é em si mesmo
uma interpretação exceto no sentido corrente do termo, do que está ocorrendo. A teoria
pertinente pode ser a teoria do Édipo; o analista deve determinar, a partir do material do
paciente, porque o está produzindo e qual deveria ser a interpretação correta. O modelo
faz a sua parte na determinação, permitindo ao analista equiparar o que o paciente está
dizendo realmente com a teoria ou teorias conhecidas pela psicanálise, tal como o
complexo de Édipo. O modelo coloca em relevo dois grupos de ideias, aquelas
relacionadas com o material do paciente e aquelas relacionadas com o corpo da teoria
psicanalítica.
Capítulo XXVII
Este capítulo irá se dedicar a construção de algumas teorias que achamos úteis. Tem
também por objetivo servir como exemplo do uso das teorias das funções e outras ideias
que foram apresentadas, e assim, se arrogar como um resumo dos pontos principais
tratados no livro.
O vínculo C
1 – A teoria das funções e a função-alpha não são parte de uma teoria psicanalítica. São
instrumentos de trabalho para que o psicanalista praticante possa facilitar problemas de
pensamento sobre algo desconhecido.
fator de ϕ.
6 – Desta teoria que descrevi, abstrairei, para usar como modelo, a ideia de um
continente no qual o objeto é projetado e o objeto que pode ser projetado no continente,
designarei este último como contido. A natureza pouco satisfatória de ambos os termos
assinala a necessidade de posterior abstração.
13 – Para resumir: a relação entre a mãe e o lactante descrita por Melanie Klein como
identificação projetiva é internalizada para formar um aparelho para a regulação de uma
preconcepção com os dados sensoriais da realização apropriada. Este aparelho é
representado por um modelo: o acasalamento da preconcepção com as impressões
sensoriais para produzir uma concepção. O modelo é por sua vez representado por ♂♀.
♀ se desenvolve por adição para produzir uma série de suportes que estão unidos. O
resultado é um retículo no qual os espaços são os suportes e os elos que formam as
malhas do retículo são emoções. Tomando emprestado de Tarski (Introdução à lógica:
Oxford, 1956, p.5) seu modelo de questionário com lacunas que devem ser preenchidas,
os suportes podem ser comparados com as lacunas do questionário. A estrutura do
questionário tem como seu equivalente os fios conectores do retículo.
20 – Até aqui descrevi uma abstração que denominei comensal; C depende deste tipo de
vínculo entre objetos através de todas as fases de atividade e crescimento mentais. Dado
que “+” e “.” representam emoções, é evidente que precisamos saber quais emoções são
compatíveis com uma relação comensal e, portanto, com C. O problema se esclarecerá
um pouco mais no capítulo posterior, em que tratarei de –C.
“♀” representa um estágio avançado em uma serie de estágios que começa com umas
poucas preconcepções relativamente simples e indiferenciadas, provavelmente
relacionadas com a alimentação, com a respiração e com a excreção.
palavras que são nomes para várias hipóteses que enunciam que certos dados sensoriais
estão completamente unidos. De começos relativamente tão simples o ♀” e ♂” abstrai
sucessivamente hipóteses mais complexas e finalmente sistemas de hipóteses completos
que são conhecidos como sistemas científicos dedutivos. Estes sistemas extremamente
complexos, ainda que dificilmente reconhecíveis em suas origens, retém, todavia, as
qualidades receptivas denotadas do ♀. Os fenômenos relacionados com as “realizações”
se multiplicam ao mesmo tempo em que as “realizações” ainda que limitadas ao
progresso da experiência de um homem, são, todavia, suficientemente multiplicadas
para revelar um universo em expansão ao que presumivelmente corresponde uma
“realização” em expansão. ♀” deve ter, portanto, um equivalente fenomenológico
representado pelo conceito de infinito.
Capitulo XXVIII
por meio de ♀ + ♂, onde + pode ser substituído por inveja. Empregando esta
formulação para representar o lactante e ao seio (para usar sinais menos abstratos) e
usando como modelo uma situação emocional na qual o lactante sente medo de estar
morrendo, o modelo que construí é o seguinte: o lactante dissocia e projeta seus
sentimentos de medo no seio, juntamente com a inveja e ódio pelo seio imperturbável. A
inveja impossibilita uma relação comensal. O seio em C moderaria o elemento do medo
no medo de morrer que havia sido projetado neste e o lactante, há seu tempo,
reintrojetaria uma parte de sua personalidade, agora tolerável e consequentemente
estimulante de crescimento. Em –C sente-se que o seio remove o elemento bom ou
valioso contido no medo de morrer e insere dentro do lactante o resíduo sem valor. O
lactante que começou com medo de estar morrendo acaba contento um terror sem nome.
6 – A violência da emoção que se associa com a inveja e que pode ser um dos fatores na
personalidade em que –C está em evidência, afeta os processos projetivos de tal forma
que se projeta muito mais que o medo de morrer. Na verdade, é como se virtualmente
toda a personalidade tivesse sido evacuada pelo lactante. O processo de despojo descrito
no parágrafo 5 é, portanto, mais grave por ser mais extensivo, que o que está implicado
no simples exemplo da projeção de um medo de morrer. Esta gravidade se transmite
melhor quando dizemos que a vontade de viver, necessária antes que possa existir o
medo de morrer, é parte é parte do bom que o seio invejoso removeu.
7 - Dado que a projeção realizada pelo lactante é também impedida pela inveja, à
projeção é sentida como um despojo invejoso do psiquismo da qual, em C, somente se
separaria o medo de morrer. Portanto, praticamente não há lactante que possa re-
introjetar ou no qual se possa inserir o medo de morrer que foi despojado. Em C, ♀ ♂
pode encontrar um habitat porque o lactante pode re-introjetar o par relacionado.
Contudo, -♀ e -♂ são devolvidos a um objeto que os encoberta com um pouco mais que
a aparência de um psiquismo.
10 - No que diz respeito à sua semelhança com o Supereu, -[♀♂] se mostra como um
objeto superior, que afirma sua superioridade encontrando falhas em tudo. A
característica mais importante é seu ódio a qualquer novo desenvolvimento na
personalidade, como se o novo desenvolvimento fosse um rival que deve ser destruído.
Portanto, o aparecimento de qualquer tendência a buscar a verdade, a estabelecer
contato com a realidade e, em resumo, ser científico, ainda que de uma forma bastante
rudimentar, é recebida por ataques destrutivos à tendência e pela reafirmação dá
superioridade "moral". Isso implica na afirmação da superioridade daquilo que, em
termos mais complexos, se chamaria de uma lei moral e um sistema moral sobre a lei
científica e o sistema científico.
11 - Enunciando o parágrafo anterior de outro modo, se é possível vê-lo como
implicando em uma intenção de manter um poder de despertar a culpa como uma
capacidade essencial. O poder de despertar a culpa é essencial e apropriado para a
operação da identificação projetiva na relação entre o lactante e seio. A peculiaridade
desta culpa radica em sua associação com a identificação projetiva primitiva implica na
culpa carecer de sentido. O -[♀♂] contrasta, portanto, com a consciência de que não se
presta a atividade construtiva.
15 – Finalmente, ainda que eu não vá desenvolver isso ainda, as teorias nas quais usei
os sinais C e – C é possível enxergar que representam “realização” em grupos. Em C o
grupo cresce pela introdução de novas ideias ou pessoas. Em – C a nova ideia (ou
pessoa) está privada de seu valor, e o grupo por sua vez se sente desvalorizado pela
ideia nova. Em C o clima é contundente à saúde mental. Em – C nem o grupo nem a
ideia podem sobreviver, em parte devido à destruição resultante da privação e em parte
devido ao produto do processo de despojar ou privar.