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Nés entramos na paisagem por volta dos anos 1964-1966, com
cautela e diplomacia. O mais importante foi ter experiéncia de gedgrafo,
diretamente associado & paisagem e a andlise naturalista do geossistema.
Confusao rapidamente corrigida, mas tesponsavel por alguns mal-
entendidos. Em 1970, um chamado do Ministério da Cultura encomenda
ao CIMA-CNRS uma pesquisa fovografica sobre as paisagens graniticas
do Sidobre (sudoeste do Macica Central) ameagado pela explotacao de
pedreiras. Nossa resposta, em 1972, insiste sobre os riscos ecoldgicos e
econémicos, sociais e culturais, que atingem a evolugao das paisagens...
com grande surpresa de uma administrago (era anterior & criacao do
Ministério do Meio Ambiente) mais habituada a classificar uma capela
romana do que a intervir numa Paisagem em conflito. Em 1978, a
publicagao conjunta de um artigo tedrico e de uma monografia do Sidobre
constitui uma primeira tentativa para recolocar a dimensao Paisagistica
numa abordagem ambiental. A criagao, em 1992, do Instituto Tulousiano
de Paisagem (ITP), interdisciplinar e sobretudo interprofissional, tinha
Por principal objetivo sair do discurso vazio ¢ de inserir a paisagem na
gesto do meio ambiente e da organizacdo/gestiio dos tertitérios.
A paisagem tornowse a tepresentagdo mais familiar e mais
concreta do meio ambiente. A este tt tulo, ela constitui uma incomparavel
ferramenta de didlogo e de projeto para a organizagio/gest’io (legislago
paisagistica), assim como um formidével caminho para a formagio
pedagégica. Na condigao de conservat suas tafzes territoriais. Em 1994,
nés redigimos nesse sentido o parecer do Conselho Econémico e Social
do Médio-Pirineus sobre “A paisagem, uma ferramenta para_a
organizagao/gestao! do territério”. A paisagem tornou-se muito
importante para ser reduzida unicamente ao paisagismo.
" Aménagement: estamos tradusindo por “organizagzojeestio”.213
A PAISAGEM ENTRE A NATUREZA E A
SOCIEDADE
Por que debater ainda sobre a banal paisagem? Trata-se, por
cscrapulo disciplinar, de preservar o objeto antiquado que é, ao mesma
tempo, o cenério de uma geografia confinada? Trata-se de submeter-se a
onda ecoldgica que invade a andlise social? Ou de responder a uma
pergunta ainda confusa e ambfgua e a novas questdes sobre as relagGes
que a sociedade mantém com o espago? Trata-se de refletir sobre um dos
aspectos das relagdes entre natureza e cultura no centro da combinagao
social? Ou, entéo, de atacar uma no¢ao ideologicamente opaca,
aproveitada e aviltada pelo discurso dominante das mass media ¢ pela
pritica tecnocrata? O problema da paisagem estd centrado hoje em todas
estas questOes e muitas outras ainda. Todas estas interrogagées e todos
estes elementos dispares so na verdade indissociaveis, mas, por enquanto,
inextrincaveis.
A questo da paisagem parece freqiientemente 0 tipo do debate
impossfvel, até um falso debate. Futilidade cientifica, no entanto,
existéncia material e cultural quotidiana e inelutavel. Uma contradigao
que justifica, por si sd, este esbogo metodolégico. Por que a paisagem
terd sido esvaziada tanto da problemética social quanto da problematica
naturalista? E bem verdade que a paisagem nao é responsabilidade de
nenhum especialista, e é menos ainda uma disciplina cientifica
constitufda, Nao existe uma “ciéncia da paisagem”, no sentido amplo
do Terno. E sem davida {amnis Havera’ Seria preciso considerar a
partir de qual axiomdtica e com gual ineeadclogis?A IDEOLOGIA DA PAISAGEM — A EMERGENCIA E A
REJEICAO
Partir de uma definigao analitica e tigorosa da paisagem seria
supor o problema resolvido, e ele o seria apenas de um modo unilateral,
Paisagem, uma palavra viva, quotidiana, que cada-um-usa ‘come-quet,-e
que pode parecer fora di da, insipida, ou romantica demais. Precisanos
nos deixar guiar pelo emprego social, sua brusca Tenovacao que faz
dela uma palavra forte ¢ mobilizadora, uma palavra-chave da sociedade
atual. As Mass media, 0 discutso politico-tecnocratien, o vocabulatie
cientifico, em seguida, multiplicam as referéncias a uma paisagem
proteiforme, indeterminada, indeterminével. Paisagem, paisagistico,
etiquetas de garantia coladas em qualquer produto & venda: casa de
campo, bairro novo, escri térios, espaco verde... ou publicacao cientifica,
Na melhor das hipsteses, a palavra sé esta Patticipando da indefinigao
publicitaria. Seria fécil detectar o esnobismo e a desonestidade de tal
pratica, entre uns e outros, Construtores ou pesquisadores... Formou-se
uma ideologia da paisagem? Ou a Paisagem participa da_confusio da
ideologia dominante? Mas a emergéncia social da Paisagem une-se A
onda ecolégico-ambiental que varte a sociedade de consumo. Farta d
contradigoese de-suairredutivel globalidade, a paisagem tornow-se um
desafio politico: sua andllise Cientffica se coloca tanto em termos dé saber
quanto de poder. =
A recusa em considerar a Paisagem como um objeto de pesquisa
explica-se melhor agora. Arguimentos cientificos Ihe sao opostos._Por
sua complexidade, por sua transgressao do campo natural pata 0 campo
social, ela afasta de sias categorias cientificas tradicionais: isto nao é um
conceito € nunca poderd-serNenhum método conhecido_poderia ser
aplicado a uma Nogao tao confusa e¢ castica, pois a paisagem ¢ apenas
um aglomerado de objetos dispares e muito complexos que tém
individualmente sobre ela a vantagem de uma existéncia cientifica
baseada em disciplinas conhecidas, da geologia & arquitetura. Acima de
tudo, a paisagem limita-se ao visivel, portanto, ao Perceptivel: ela é apenas
a aparéncia das.coisas, 0s mecanismos sendo, quanto.a-eles,-invisfveis,
Acrescentemos a isto alguns argumentos politicos: a paisagem torna-se
entao um produto de Tecuperacao ou de agitagdo, uma operagao